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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
82/1990, de 00.00.0000
Data de Assinatura: 
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Defesa Nacional
Relator: 
LUCAS COELHO
Descritores e Conclusões
Descritores: 
DEFICIENTE DAS FORÇAS ARMADAS
INCAPACIDADE GERAL DE GANHO
Conclusões: 
1 - O exercicio de instrução militar com uso de mina anti-carro e um tipo de actividade com risco agravado enquadravel no nº 4 do artigo 2º, referido ao nº 2 do artigo 1º, do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro;
2 - A qualificação como deficiente das Forças Armadas e a aplicação do respectivo regime, segundo o citado Decreto-Lei nº 43/76, exige um grau minimo de incapacidade geral de ganho de 30% (artigo 2º, nº 1, alinea b));
3 - O acidente de que foi vitima o Soldado (...), ocorreu em actividade militar correspondente a descrita na conclusão 1ª, mas determinou-lhe um grau de incapacidade de 20%, o que impede a sua qualificação como deficiente das Forças Armadas.
Texto Integral
Texto Integral: 
SENHOR SECRETÁRIO DE ESTADO ADJUNTO

DO MINISTRO DA DEFESA NACIONAL,


EXCELÊNCIA:





I



Para emissão do parecer a que se refere o nº 4 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, determinou Vossa Excelência o envio à Procuradoria-Geral da República do processo respeitante ao acidente de que foi vítima o Soldado NM (...), (...).


Cumpre emiti-lo.



II



Da consulta do auto de averiguações oportunamente instaurado extraem-se, com interesse os seguintes factos:


- no dia 8 de Março de 1989, cerca das 15 horas, o Soldado Recruta (...) recebia instrução da especialidade de Sapadores de Engenharia, integrado num Pelotão da CI do Regimento de Engenharia de Espinho, a qual era ministrada pelo 2º Sargento NÓBREGA, e incidia sobre minas;

-em determinada altura, pretendendo o instrutor demonstrar que a mina anti-carro m/974-2 (Expal-C-3), usada na instrução (1 , só rebentava com uma pressão superior a 300 kg., saltou sobre a mesma, já espoletada e armada;

-porém, contrariamente a tal indicação, esse tipo de minas explode a uma pressão entre 150 e 200 kg, o que veio a suceder;

-da deflagração resultaram ferimentos graves no próprio instrutor - dos quais lhe adveio a morte já no hospital - e nos instruendos que assistiam à instrução, de capacete na cabeça, formados em U e à distância de cerca de 3 metros, nomeadamente no Soldado (...), traduzidos em " surdez mista direita e surdez de percepção esquerda com zumbidos";

-submetido à JHI/HMR-1, em sessão de 30.01.90, foi aquele recruta considerado incapaz de todo o serviço militar, apto para o trabalho e para angariar meios de subsistência com 20% de desvalorização (IPP)/INI), decisão homologada superiormente em 7.05.90;

-por seu turno, a CPIP/Direcção do Serviço de Saúde, emitiu parecer no sentido de que a referida desvalorização de 20% proveio das lesões sofridas no acidente ocorrido em 8.03.89, parecer homologado em 7.6.90, declarando-se que "o acidente ocorreu em serviço e por motivo do seu desempenho".

O Chefe do Estado-Maior do Exército é de opinião que este militar não tem todas as condições para ser considerado DFA, na sequência de idêntico entendimento do General Ajudante-General.



III



Importa conhecer o direito aplicável.


Dispõe o nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 43/76:

"2. É considerado deficiente das forças armadas portuguesas o cidadão que:

No cumprimento do serviço militar e na defesa dos interesses da Pátria adquiriu uma diminuição na capacidade geral de ganho;

quando em resultado de acidente ocorrido:

Em serviço de campanha ou em circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha, ou como prisioneiro de guerra;

Na manutenção da ordem pública;

Na prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública; ou

No exercício das suas funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores;

vem a sofrer, mesmo "a posteriori", uma diminuição permanente, causada por lesão ou doença, adquirida ou agravada, consistindo em:

Perda anatómica; ou

Prejuízo ou perda de qualquer órgão ou função;

tendo sido, em consequência, declarado, nos termos da legislação em vigor:

Apto para o desempenho de cargos ou funções que dispensem plena validez; ou

Incapaz do serviço activo; ou

Incapaz de todo o serviço militar".


E acrescenta-se no artigo 2º, nº 1, alínea b):

"1. Para efeitos da definição constante do nº 2 do artigo 1º deste decreto-lei, considera-se que:

a) (...)

b) É fixado em 30% o grau de incapacidade geral de ganho mínimo para o efeito da definição de deficiente das forças armadas e aplicação do presente decreto-lei".


Os nºs 2, 3 e 4 do mesmo artigo 2º esclarecem:

"2. O "serviço de campanha ou campanha" tem lugar no teatro de operações onde se verifiquem operações de guerra, de guerrilha ou de contraguerrilha e envolve as acções directas do inimigo, os eventos decorrentes de actividade indirecta de inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade terrestre, naval ou aérea de natureza operacional.

"3. As "circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha" têm lugar no teatro de operações onde ocorram operações de guerra, guerrilha ou de contraguerrilha e envolvem os eventos directamente relacionados com a actividade operacional que pelas suas características implicam perigo em circunstâncias de contacto possível com o inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade de natureza operacional ou em actividade directamente relacionada, que pelas suas características próprias possam implicar perigosidade.

"4. "O exercício de funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores", engloba aqueles casos especiais, aí não previstos, que, pela sua índole, considerado o quadro de causalidade, circunstâncias e agentes em que se desenrole, seja identificável com o espírito desta lei (redacção rectificada no "Diário da República", I Série, 2º Suplemento, de 26/6/76).


A qualificação destes casos compete ao Ministro da Defesa Nacional, após parecer da Procuradoria-Geral da República".



IV



O grau de incapacidade geral de ganho mínimo de 30% constitui condição imprescindível para a qualificação de deficiente das forças armadas, como prescreve a alínea b) do nº 1 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/76, atrás citado.


Nem sempre assim aconteceu, porquanto na vigência de diplomas anteriores, com idênticos objectivos, não se encontrava estabelecido tal limite mínimo.


Como se afirmou em anteriores pareceres, trata-se de um requisito claramente expresso com a finalidade de "permitir o enquadramento como deficientes das forças armadas dos militares ou equiparados que tenham sido vítimas de uma diminuição da capacidade física ou psíquica de carácter permanente, de certa relevância, atingindo as respectivas capacidades de ganho, colocando-os em dificuldades profissionais e sociais". E observou-se que a fixação desse mínimo visou equiparar, neste aspecto, os deficientes das forças armadas aos acidentados do trabalho, por este modo se "terminando com a inconsequência do Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio, que, não fixando limite mínimo àquela diminuição de capacidade, permitia a qualificação de militares portadores de incapacidades insignificantes em contradição com os objectivos fundamentais do diploma" (2 . Ressalvam-se, porém, as situações de qualificação automática - artigo 18º, nº 1, do Decreto-Lei nº 43/76 -, o que não é o presente caso.


Deste modo, o grau de incapacidade de 20% atribuído ao sinistrado torna legalmente inviável a qualificação como deficiente das Forças Armadas.


Não obstante, e à semelhança do que vem constituindo procedimento usual deste Conselho, sempre se abordará, ainda que sumariamente, a questão da qualificação do acidente.



V



Este corpo consultivo tem interpretado as disposições conjugadas dos artigos 1º, nº 2, e 2º, nº 4, do Decreto-Lei nº 43/76 no sentido de que o regime jurídico dos deficientes das Forças Armadas, para além das situações expressamente contempladas no primeiro preceito - de serviço de campanha ou em circunstâncias com ela relacionadas, de prisioneiros de guerra, de manutenção da ordem pública e de prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública -, só é aplicável aos casos que, "pelo seu circunstancialismo, justifiquem uma equiparação, em termos objectivos, àquelas situações de facto, dado corresponderem a actividades próprias da função militar ou inerentes à defesa de altos interesses públicos, importando sujeição a um risco que excedendo significativamente o que é próprio do comum das actividades castrenses, se mostra agravado em termos de se poder equiparar ao que caracteriza aquelas situações paradigmáticas".


Assim implica esse regime não só que o acidente tenha ocorrido em serviço, mas também que a actividade militar que o gera envolva, por sua natureza, objectiva e necessariamente, um risco agravado em termos de poder equiparar-se ao que decorre em situações de campanha ou a elas por lei igualadas" .


De acordo com tal doutrina, seguida por este Conselho Consultivo, tem-se entendido qualificar como actividade militar com risco agravado, equiparável nomeadamente à situação tipificada no primeiro item do nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 43/76, a realização de instrução ou exercícios militares que impliquem o uso de minas, armadilhas, granadas de mão ou outros engenhos explosivos (4 .


Não sofre dúvida a perigosidade em abstracto associada ao uso de uma mina anti-carro, dado o objectivo a que se destina - "destruir ou avariar veículos, matar ou incapacitar pessoal".


As autoridades militares reconheceram que a instrução estava devidamente programada e que foram observadas as normas de segurança sobre requisição e transporte de material. Ter--se-á o instrutor exposto mais do que as suas funções exigiam, apesar da sua habilitação específica e experiência anterior, criando um risco do qual foi a primeira e principal vítima?


Verifica-se, como quer que seja, no caso concreto, um risco agravado nos termos da disposição referida.


Simplesmente, a incapacidade geral de ganho cifrada em 20%, neste momento, inviabiliza a qualificação do sinistrado como deficiente das Forças Armadas, porque é inferior ao mínimo estabelecido na lei (5 .



CONCLUSÕES:

VI



Do exposto se conclui:

1º - O exercício de instrução militar com uso de mina anti-carro é um tipo de actividade com risco agravado enquadrável no nº 4 do artigo 2º, referido ao nº 2 do artigo 1º, do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro;

2º - A qualificação como deficiente das Forças Armadas e a aplicação do respectivo regime, segundo o citado Decreto-Lei nº 43/76, exige um grau mínimo de incapacidade geral de ganho de 30% (artigo 2º, nº 1, alínea b));

3º - O acidente de que foi vítima o Soldado NM (...), (...), ocorreu em actividade militar correspondente à descrita na conclusão 1ª, mas determinou-lhe um grau de incapacidade de 20%, o que impede a sua qualificação como deficiente das Forças Armadas.




(1 Segundo se refere nos autos, "a instrução estava a ser ministrada com a mina real, por falta de material inerte e de quadros auxiliares de Instrução" (folhas 19).

(2 Parecer nº 115/78, de 6.07.78, publicado no "Diário da República", I Série, nº 244, de 23.10.78, pág. 6414, cujos termos foram retomados, mais recentemente, nos pareceres nº 113/87, de 28.04.88, não publicado, e nº 153/88, de 2.02.89, aguardando homologação.

Cfr. ainda os pareceres nºs 207/77, de 27.10.77, e 51/87, de 17.06.87, ambos homologados e o último publicado no "Diário da República", I Série, nº 219, de 23.04.87, pág. 11559, nos quais se versou a matéria deste limite mínimo de incapacidade.

(4 A título meramente exemplificativo, e com particular incidência sobre minas e armadilhas, podem ver-se os pareceres nºs 187/76, de 16.12.76, 179/76, de 13.01.77, 278/77, de 9.02.78, 209/78, de 19.10.78, 141/79, de 11.11.79, 164/80, de 23.10.80, homologados e não publicados, 48/81, de 28.01.82, homologado e publicado no "Diário da República", II Série, nº 196, de 25.08.82, 34/86, de 17.07.86, não homologado, 11/89, de 23.02.89, e 19/90, de 5.04.90, homologados e não publicados.

(5 Na exposição antecedente transcreveu-se, quase textualmente, o recente parecer nº 80/90, de 27 de Setembro de 1990, aguardando homologação.
Anotações
Legislação: 
DL 43/76 DE 1976/01/20 ART1 N2 ART2 N1 B N2 N3 N4.
Referências Complementares: 
DIR ADM * DEFIC FFAA.
Divulgação
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