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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
125/1990, de 10.10.1991
Data do Parecer: 
10-10-1991
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Maioria
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério do Plano e da Administração do Território
Relator: 
LOURENÇO MARTINS
Descritores e Conclusões
Descritores: 
CENTRO DE ESTUDOS E FORMAÇÃO AUTARQUICA
CONSELHO DIRECTIVO
ELEITOS LOCAIS
PRESIDENTE DA CAMARA MUNICIPAL
REGIME DE PERMANENCIA
REGIME DE TEMPO PARCIAL
REGIME DE EXCLUSIVIDADE
ACUMULAÇÃO DE CARGOS
INCOMPATIBILIDADE
PRINCIPIO DA IMPARCIALIDADE
Conclusões: 
1 - So e permitida a acumulação de empregos ou cargos publicos quando a lei expressamente o admitir - artigo 269, n 4, da Constituição da Republica - interpretando-se a lei mediadora de acordo com as regras adquiridas pela hermaneutica juridica;
2 - A norma do n 1 do artigo 3 da Lei n 29/87, de 30 de Junho, ao ressalvar do sistema de incompatibilidades o disposto em legislação especial, conjugada com o Decreto-Lei n 62/85, de 13 de Março, permitia que um presidente de camara em regime de não exclusividade fosse designado para exercer funções de membro do Conselho Directivo do Centro de Estudos e Formação Autarquica;
3 - Tal regime foi, porem, alterado pela Lei n 9/90, de 1 de Março - redacção ultima dada pela Lei n 56/90, de 5 de Setembro -, não sendo agora permitida a designação a que se refere a conclusão anterior, embora se mantenham as situações em curso nos termos do direito transitorio salvaguardado pelo artigo 8 daquela Lei.
Texto Integral
Texto Integral: 
SENHOR SECRETÁRIO DE ESTADO DA ADMINISTRAÇÃO

LOCAL E ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO,

EXCELÊNCIA:



1

Dignou-se Vossa Excelência solicitar o parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República sobre a seguinte questão:
"Existe ou não incompatibilidade entre o cargo de Presidente da Câmara Municipal e o de membro do Conselho Directivo do C.E.F.A. (Centro de Estudos e Formação Autárquica)"?
Não havia dúvidas no tocante à compatibilidade de funções do cargo de Presidente da Câmara com o de Presidente ou vogal do Conselho Geral do Centro de Estudos e Formação Autárquica durante o período transitório a que se refere o nº 2 do artigo 8º da Lei nº 9/90, de 1 de Março, na redacção da Lei nº 56/90, de 5 de Setembro. Daí que a consulta se tenha confinado aos membros do Conselho Directivo.

2

Para melhor compreensão das posições adiante defendidas, é evidente a utilidade de conhecer as disposições legais que estão em causa, quer as relativas às incompatibilidade dos eleitos locais, segundo a evolução legislativa última, quer as disposições atinentes do diploma que rege o Centro de Estudos e Formação Autárquica - de ora em diante designado abreviadamente por CEFA.
2.1. Incompatibilidades dos eleitos locais
2.1.1. Na vigência do Código Administrativo de 1940 dispunha o artigo 75º sobre incompatibilidades e acumulações:
"As funções de presidente e vice-presidente, quando remuneradas por meio de ordenado, são incompatíveis com o exercício de qualquer outra função pública retribuída e com a advocacia.
§1º. O Conselho de Ministros poderá permitir a acumulação de funções com outras para cujo exercício independente não esteja fixada retribuição bastante.
................................................".
2.1.2. A Lei nº 44/77, de 23 de Junho, estabeleceu um novo regime remuneratório para os titulares de cargos municipais - num quadro político-social, profundamente modificado - tendo revogado o disposto naquele artigo 75º (através do nº 2 do artigo 13º).
Nessa lei distingue-se entre vereadores em regime de permanência (artigos 1º, 2º e 3º) e vereadores que não se encontram em regime de permanência (artigos 5º e 8º).
Sobre incompatibilidades disse-se no artigo 1º:
"As funções de presidente da câmara, de comissão administrativa ou de vereador em regime de permanência são incompatíveis com a actividade de agente ou funcionário do Estado, de pessoa colectiva de direito público e de empresa nacionalizada".
2.1.3. Sucedeu-se-lhe a Lei nº 9/81, de 26 de Junho - que revogou a Lei nº 44/77 e suas actualizações -, repetindo a norma das incompatibilidades, expressis verbis, no nº 1 do seu artigo 4º.
Em outras normas convirá atentar, a saber:
- para efeito de remuneração, seu montante e regime (artigos 1º, 2º e 3º), previdência (artigo 5º), ajudas de custo (artigo 6º), subsídio de transporte (artigo 7º), senhas de presença (artigo 8º) e dispensa do exercício parcial de actividade profissional (artigo 10º), esta lei continua a distinguir entre presidente de câmara, de comissão administrativa ou vereador em regime de permanência e vereadores, vogais de comissão administrativa, membros de assembleia municipal em regime de não permanência;
- distingue-se também entre eleitos locais (em regime de permanência) que desempenham as suas funções em exclusividade e os que não as exercem em exclusividade (artigo 3º).
Não há qualquer referência a vereadores em regime de meio tempo ou tempo parcial, embora o exercício de funções em tempo incompleto fique suposto, nomeadamente pela alínea b) do nº 1 e nº 3 do artigo 3º, ao permitir a acumulação de funções autárquicas com o exercício de profissão liberal ou de qualquer outra actividade privada, e ao impor que as funções dos que as não exercem em exclusividade, sejam asseguradas "no decurso de parte do período de expediente público".

A figura do vereador "em regime de meio tempo" é instituída pelo Decreto-Lei nº 100/84, de 29 de Março - Lei das Autarquias Locais, que reviu a Lei nº 79/77, de 25 de Outubro, e foi alterada por ratificação pela Lei nº 25/85, de 12 de Agosto.

Sob a epígrafe "vereadores em regime de permanência" estipulou-se no artigo 45º:
"3. Poderá a câmara municipal, com respeito do disposto nos números anteriores, optar pela existência de vereadores em regime de permanência ou em regime de meio tempo, correspondendo 2 vereadores a meio tempo a 1 vereador em regime de permanência.
4. Cabe ao presidente da câmara escolher os vereadores em regime de permanência ou de meio tempo e fixar as suas funções e competência.
5. O subsídio a que têm direito os vereadores em regime de meio tempo corresponderá a metade do legalmente fixado para os vereadores em regime de permanência".
2.1.4. Aquela Lei nº 9/81 veio a ser substituída e revogada pela Lei nº 29/87, de 30 de Junho (1 - o Estatuto dos Eleitos Locais - como tal sendo considerados "os membros dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios e das freguesias".
Vejamos as disposições pertinentes.
Refere-se o artigo 2º ao "Regime do desempenho de funções", dizendo:
"1. Desempenham as respectivas funções em regime de permanência os seguintes eleitos locais:
a) Presidentes das câmaras municipais;
b) Vereadores, em número e nas condições previstas na lei;
2. A câmara municipal poderá optar pela existência de vereadores em regime de meio tempo, correspondendo dois vereadores em regime de meio tempo a um vereador em regime de permanência.
3. Os membros de órgãos executivos que não exerçam as respectivas funções em regime de permanência ou de meio tempo serão dispensados das suas actividades profissionais, mediante aviso ...
...........................................".
E no artigo 3º (incompatibilidades):
"1. Sem prejuízo do disposto em legislação especial, as funções desempenhadas pelos eleitos locais em regime de permanência são incompatíveis com a actividade de agente ou funcionário da administração central, regional ou local ou com o exercício da actividade de pessoa colectiva de direito público ou trabalhador de empresa pública ou nacionalizada.
2. ...........................................".
Há ainda normas diferenciadas:
- umas que apenas se referem aos eleitos locais em regime de permanência;
- outras que apenas se reportam ao regime de não permanência;
- outras que providenciam sobre o regime de permanência ou de meio tempo;
- algumas ainda em que se estatui sobre os eleitos locais sem distinção;
- finalmente, dois preceitos referindo-se ao regime de permanência e exclusividade (2 .
2.1.5. A mais recente intervenção legislativa corporizou-se na Lei nº 9/90, de 1 de Março - "Incompatibilidades de cargos políticos e altos cargos públicos" - alterada pela Lei nº 56/90, de 5 de Setembro.

Segundo a alínea i) do nº 1 do artigo 1º tal lei aplica-se ao
"Presidente e vereador a tempo inteiro das câmaras municipais".
Estipula-se no artigo 2º:
"A titularidade dos cargos enumerados no artigo antecedente implica, durante a sua pendência, para além das previstas na Constituição, as seguintes incompatibilidades:
a) O exercício remunerado de quaisquer outras actividades profissionais ou de função pública que não derive do seu cargo e o exercício de actividades de representação profissional;
b) A integração em cargos sociais de empresas ou sociedades concessionárias de serviços públicos, instituições de crédito ou parabancárias, seguradoras, sociedades imobiliárias ou quaisquer outras empresas intervenientes em contratos com o Estado e demais pessoas colectivas de direito público;
c) O desempenho de funções em órgão executivo de fundação subsidiada pelo Estado;
................................................".
E o artigo 4º - "Excepção" acrescenta:
"1. .............................................
2. Nos casos previstos nas alíneas e), f), g), i), j), l) e m) do nº 1 do artigo 1º, o disposto na alínea a) do artigo 2º não obsta ao exercício de funções de docente do ensino superior e de investigador científico ou similar, nos termos previstos à data da entrada em vigor da presente lei.
3. ..............................................
4. .............................................
5. Não é incompatível a participação dos titulares de cargos políticos referidos na alínea i) do nº 1 do artigo 1º nos órgãos sociais de empresas que prossigam fins de reconhecido interesse público local em que a respectiva autarquia ou associação de municípios participe, desde que o exercício de funções não seja remunerado.
6. Os vereadores em regime de meio tempo encontram-se sujeitos às incompatibilidades previstas na presente lei, com as seguintes excepções:
a) Não são aplicáveis as incompatibilidades previstas na alínea a) do artigo 2º e no nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87, de 30 de Junho;
b) É admissível a participação de vereadores em regime de meio tempo em órgãos sociais de empresa que prossiga fins de reconhecido interesse público local em que a respectiva autarquia ou associação de municípios participe e a remuneração percebida no exercício de tais cargos acumulada com a de vereador a tempo parcial não exceda a de vereador a tempo inteiro".
A infracção ao regime de incompatibilidades é sancionada com a perda do mandato, cuja verificação e aplicação passou a competir à câmara municipal - artigo 5º, nº 1, alínea a) e 3º, alínea b).
Importante ainda anotar o regime transitório previsto no artigo 8º:
"1. ............................................
2. Os titulares, aquando da entrada em vigor da presente lei, dos cargos referidos na alínea g) do nº 1 do artigo 1º, bem como, até ao fim do respectivo mandato, os então titulares dos cargos referidos nas alíneas i), j), l) e m), não estão abrangidos pelas incompatibilidades referidas na alínea a) do artigo 2º, continuando sujeitos ao regime de incompatibilidades vigente à data da entrada em vigor da presente lei.
3. ...........................................".

Os efeitos desta Lei reportam-se à data da entrada em vigor da Lei nº 9/90, de 1 de Março, quanto aos titulares de cargos já abrangidos por ela (artigo 3º da Lei nº 56/90).


2.2. Gestão do CEFA
2.2.1. Criado pelo Decreto-Lei nº 161/80,de 28 de Maio, na dependência do Ministério da Administração Interna, dotado de personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira, competia ao CEFA contribuir, através do ensino e da assessoria técnica, para o aperfeiçoamento e modernização da Administração Autárquica, sujeito ao regime de instalação pelo período de dois anos, prorrogável.

Tal regime veio a ser regulado pelo Decreto-Lei nº 76/82, de 4 de Março, estabelecendo-se a competência da comissão instaladora, do presidente e vice-presidente, bem como do conselho administrativo e conselhos consultivos (de criação facultativa), fixando-se-lhe a sua sede em Coimbra.

Se o presidente ou vice-presidente exercessem as funções em regime de exclusividade, seriam equiparados a director-geral e subdirector-geral, respectivamente, para efeitos de remuneração (artigo 11º, nº 1).

Os membros da comissão instaladora e do conselho administrativo, se prestassem funções em tempo parcial teriam direito a uma gratificação mensal (artigo 11º, nº 2).

Através do Decreto-Lei nº 105/83, de 18 de Fevereiro, estipulou-se que o administrador do CEFA exerceria funções em tempo completo, sendo nomeado em comissão de serviço.
2.2.2. Pôs-se fim ao regime de instalação mediante a aprovação do diploma orgânico do CEFA, o Decreto-Lei nº 62/85, de 13 de Março, optando-se por um sistema de "gestão participada entre a administração central e local" (do preâmbulo).

órgãos do CEFA são o conselho geral, o conselho directivo, o conselho administrativo e os conselhos consultivos (artigo 3º), mantendo-se as características de "instituto público dotado de personalidade jurídica e de autonomia administrativa, financeira e pedagógica".

Importa atentar especialmente em algumas disposições.

Nos termos do artigo 4º:
"1. O conselho geral é composto por 23 membros, sendo 14 designados pela Associação Nacional dos Municípios Portugueses, 7 pelo Ministro da Administração Interna e 2 pelas organizações representativas dos trabalhadores da administração local.
2. O mandato dos membros do conselho geral tem a duração do mandato dos titulares dos órgãos das autarquias locais e é renovável.
3. O conselho geral é presidido por um dos seus membros que seja ou tenha sido presidente de câmara, eleito em reunião do conselho por um período correspondente ao mandato dos titulares dos órgãos das autarquias locais, renovável.
4. ...........................................".
Cabe ao Conselho Geral propor ao Ministro da Administração Interna (3 a nomeação e exoneração do presidente, vice-presidente e vogais do Conselho Directivo (alínea b) do artigo 5º).
Sobre este diz-se no artigo 7º:
"1. O conselho directivo é o órgão de gestão do CEFA e é composto por 1 presidente, 2 vice-presidentes e 2 vogais, nomeados pelo Ministro da Administração Interna, sob proposta do conselho geral, por um período correspondente ao mandato dos titulares dos órgãos das autarquias, renovável.
2. ...........................................".
E quanto a remunerações:
"Artigo 22º
(Membros do conselho geral)
1. Os membros do conselho geral têm direito a uma gratificação por reunião correspondente à ajuda de custo diária de presidente de câmara de município urbano de 1ª classe.
2. O presidente do conselho geral, além das gratificações a que se refere o número anterior, tem direito a um subsídio mensal para despesas de representação equivalente a 25% do vencimento do director-geral".
"Artigo 23º
(Membros do conselho directivo e administrador)
1. Quando o presidente, os vice-presidentes e os vogais do conselho directivo exercerem as suas funções em regime de exclusividade, serão equiparados, respectivamente, a director-geral, a subdirector-geral e a director de serviços para efeitos de remuneração.
2. Os membros do conselho directivo, quando exerçam as suas funções em regime de tempo parcial, terão direito a uma gratificação mensal correspondente a 50% do vencimento que lhes caiba nos termos do número anterior.
3. O administrador exerce as suas funções em regime de tempo completo e é equiparado, para efeitos de remuneração, a subdirector-geral".
Pelo Decreto-Lei nº 192/86, de 17 de Julho, introduziu-se uma ligeira alteração (ao artigo 11º) da qual se regista apenas que ao ser fixada uma gratificação a um representante da Direcção-Geral da Contabilidade Pública aparece também reportada ao vencimento de titular de órgão de autarquia local.

Vejamos agora mais de perto os antecedentes da consulta.

3

Encontram-se em dois estudos enviados: um do Inspector-Geral da Administração do Território (4 , o outro, do Presidente do CEFA (5 .
Impõe-se, assim, conhecer o essencial daqueles dois trabalhos.
3.1. Sendo o do Inspector-Geral de âmbito mais alargado (6 , dele respigámos apenas o que se mostra em conexão com o tema das incompatibilidades, na evolução legislativa mais recente.
Depois de algumas observações gerais sobre as incompatibilidades em confronto com as inelegibilidades e impedimentos com alusão à doutrina e ao Parecer nº 61/84, deste Corpo Consultivo, debruça-se especificamente sobre as incompatibilidades dos eleitos locais (7 .
Abordados alguns aspectos, agora sem interesse, do Decreto-Lei nº 701-B/76, de 29 de Setembro - regime eleitoral para os órgãos das autarquias locais - analisa o Estatuto dos Eleitos Locais, aprovado pela Lei nº 29/87, de 30 de Junho, e a Lei nº 9/90, de 1 de Março, alterada pela Lei nº 56/90, de 5 de Setembro.
Merece-lhe especial atenção a terminologia - que não tem sido uniforme - de "eleitos locais em regime de permanência", agora substituída pela de "Presidente e vereador a tempo inteiro".

De jure constituendo haveria que distinguir entre "regime de permanência" e de "não permanência" e vereadores "em regime de tempo inteiro" e de "meio tempo" (rectius, diríamos, de tempo parcial). Os eleitos em "regime de permanência" poderiam ser chamados a qualquer momento ao exercício das suas funções, enquanto os segundos - "não permanência" - só contribuiriam para a formação da vontade do órgão de que são membros no seio de reuniões ou actos a que concretamente fossem chamados.

Vereadores "a meio tempo" seriam "todos aqueles, em regime de permanência (sublinhado agora), que exerceriam as suas funções dentro de um período de tempo concretamente determinado e "a tempo inteiro" todos aqueles que exerceriam sem limitações de tempo, devendo as funções de uns e outros ser exercidas no decurso do período de expediente público".

Daí que - continua - os vereadores "a meio tempo" e os vereadores "a tempo inteiro" fossem sempre vereadores "em regime de permanência".

E tais distinções nada teriam a ver com o regime de exclusividade ou não exclusividade, porquanto um vereador "a meio tempo" pode exercer exclusivamente as suas funções e, ao invés, um vereador "a tempo inteiro" pode não as exercer em exclusividade (8 .

Porém, o legislador, em sua opinião, desvirtuou o rigor dos conceitos.

No artigo 45º do Decreto-Lei nº 100/84, de 29 de Março, opôs o regime de permanência ao regime de meio tempo, dando àquele o significado de regime de tempo inteiro, o mesmo fazendo no artigo 2º da Lei nº 29/87, de 30 de Junho. Logo, o "regime de meio tempo" não está abrangido no conceito de "regime de permanência".

No entanto, este Corpo Consultivo "continua a entender que "os vereadores em regime de meio tempo" são eleitos locais em "regime de permanência", designadamente para efeitos do disposto no nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87, de 30 de Junho" (9 .

Ora, o legislador, "coerentemente consigo próprio", veio contrariar a posição defendida pelo Conselho Consultivo, na alínea b) do nº 1 do artigo 1º da Lei nº 9/90, de 1 de Março, ao mencionar apenas o Presidente e vereadores a tempo inteiro como os únicos eleitos locais abrangidos pelas incompatibilidades aí previstas para os titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, e não também o vereador a meio tempo.

De modo que a tese que considera como eleitos locais "em regime de permanência" apenas o Presidente e os vereadores da câmara municipal a tempo inteiro e já não os vereadores a meio tempo - como pretende o Conselho Consultivo - é a que coloca em sintonia a Lei nº 29/87 (nº 1 do artigo 3º) com a Lei nº 9/90 (alínea b) do nº 1 do artigo 1º) e a que está na lógica da evolução legislativa.

Esta é, aliás, confirmada pela Lei nº 56/90, que alterou a citada Lei nº 9/90.

Aí se repete - alínea i) do nº 1 do artigo 1º - que só o presidente e vereador a tempo inteiro são considerados titulares de cargos políticos para efeito desse diploma.

Mas no regime excepcionatório do vigente nº 6 do artigo 4º foi introduzida uma norma respeitante aos vereadores em regime de meio tempo, excluindo-os das "incompatibilidades previstas na alínea a) do artigo 2º e no nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87.
Prossegue:
"Se o legislador entendesse que os "vereadores a meio tempo" são também eleitos locais " em regime de permanência", como entende o Conselho Consultivo da PGR e se os quis(esse) submeter ao regime das incompatibilidades da Lei nº 9/90,, então, na alínea i) do nº 1 do artigo 1º, vinha (devia?) apenas referir-se a "Presidente e vereadores em regime de permanência" e depois, no nº 6 do artigo 4º, não tinha necessidade de vir a dizer expressamente que os "vereadores a meio tempo" estavam sujeitos às incompatibilidades previstas no diploma, apenas fixando as excepções a tal regime que fossem aplicáveis.
"Em vez disso, o legislador continuou, no diploma, a utilizar as expressões "vereador a tempo inteiro" e "vereador a meio tempo" e a afastar expressamente estes últimos das incompatibilidades que no nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87 tinha fixado para os eleitos locais "em regime de permanência". Isto é, conhecendo a posição que a PGR vinha assumindo quanto a este último dispositivo legal, quis, em relação a ela, fazer uma interpretação autêntica e considerar que os "vereadores a meio tempo" não são, segundo a sua perspectiva, eleitos "em regime de permanência", já que aplica esta expressão com o significado "a tempo inteiro".
E, nesta parte, mais adiante, acrescenta:
"... poderemos, assim, concluir que só o Presidente e vereador a tempo inteiro das câmaras municipais está abrangido pelo regime das incompatibilidades fixado aos eleitos locais, quer pela Lei nº 29/87, quer pela Lei nº 9/90, na sua primitiva redacção ...".
Aprecia, depois, o conteúdo do regime vigente.
Ficar-nos-emos agora por aqui.

3.2. Ao Presidente do CEFA não terão escapado estas divergências de interpretação por banda da PGR e da Inspecção-Geral, e daí a presente consulta, posto que situada no plano concreto das incompatibilidades dos membros do Conselho Geral e do Conselho Directivo do CEFA.

Vejamos as razões da sua opinião, dirigida essencialmente ao período transitório ressalvado pela lei vigente (10 .

Em coerência com a ideia de "gestão participada" da administração central e local, "foram designados para o Conselho Geral e para o Conselho Directivo do CEFA vários presidentes de câmara com funções nos órgãos dirigentes da ANMP (Associação Nacional de Municípios Portugueses), nomeadamente o Presidente do Conselho Geral, por eleição dos seus pares, e os dois vice-presidentes e um vogal do Conselho Directivo, por nomeação do Ministro do Planeamento e da Administração do Território mediante proposta do Conselho Geral do CEFA".

Apresenta diferenças significativas o regime previsto na Lei nº 29/87 e na Lei nº 9/90.

No primeiro a incompatibilidade abrange quaisquer funções públicas de agente ou funcionário, remuneradas ou não e decorram ou não do cargo de presidente da câmara; no segundo a incompatibilidade abrange apenas o exercício de funções públicas remuneradas não derivadas do cargo de presidente de câmara.

Assim, no domínio da vigência da Lei nº 9/90 "não existe incompatibilidade entre a função de presidente de câmara e funções públicas gratuitas ou funções públicas remuneradas que derivem do cargo de presidente de câmara", sendo, sob este aspecto, mais severo o regime de 1987 de que o de 1990.
Passa a apreciar as situações concretas perante o regime vigente à data da entrada em vigor da Lei nº 9/90, isto é, o de 1987, ressalvado pelo nº 2 do artigo 8º (redacção da Lei nº 56/90).
3.2.1. O artigo 3º da Lei nº 29/87 exclui do seu âmbito os casos regulados em legislação especial.

Claramente o presidente do Conselho Geral do CEFA está excluído da incompatibilidade em face do nº 3 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 62/85, onde se estipula que deve ser um membro "que seja ou tenha sido presidente de câmara".

Idêntica conclusão racionalmente se tem de extrair para os vogais do Conselho Geral, quando se admite que o presidente seja eleito de entre os seus membros e que seja (possa ser) presidente de câmara. Nada na lei indica que os presidentes de câmara não eleitos para presidente do Conselho Geral se tenham de demitir ou se declare caduco o seu mandato.

Por conseguinte, um presidente de câmara pode ser presidente ou vogal do Conselho Geral do CEFA, de acordo com a legislação de 1987.
3.2.2. E membro do Conselho Directivo?

No parecer do Presidente do CEFA chega-se à mesma conclusão afirmativa, depois de afastados dois considerandos tidos por irrelevantes.

No regime legal de 1987 a remuneração ou a gratuitidade nada significam para a compatibilidade ou incompatibilidade do exercício dos cargos com o de presidente de câmara.

Também, por outro lado, é irrelevante argumentar com o nº 4 do artigo 269º da CRP, segundo o qual não é permitida a acumulação de cargos públicos, "salvo nos casos expressamente admitidos na lei", pelo que seria necessária uma declaração da lei directis et apertis verbis. Tal entendimento do texto constitucional parece "excessivo e injustificado", sendo antes de interpretar como necessária a existência de um fundamento ou base legal, colhido à luz dos cânones gerais da hermenêutica jurídica. O que o preceito constitucional exige é a interpositio legislatoris.
Relevantes serão, porém, as seguintes razões:
- enquanto o CEFA não funcionar na dependência exclusiva da ANMP e houver esta "administração concertada" parece acertado deixar ao Ministro da Tutela a possibilidade de, guiado pelo interesse público municipal, nomear para o Conselho Directivo um ou vários presidentes de câmara;
- sendo embora de índole diversa as funções no Conselho Geral - órgão de "orientação geral" - e no Conselho Directivo - órgão de gestão - nada justificaria que os presidentes de câmara pudessem de plano integrar o CG e de plano estivessem inibidos de fazer parte do CD, apenas porque estas funções exigem mais tempo e disponibilidade;
- por paridade de razão, tal como cabe à discrição da ANMP decidir quais os presidentes de câmara que vão integrar o CG o mesmo deve suceder quanto ao Ministro da Tutela para o CD.
E a praxis assim tem ditado, entendendo-se não haver obstáculo (incompatibilidade) à nomeação quer por força do artigo 3º da Lei nº 9/81 (que não ressalva a legislação especial) quer do artigo 3º da Lei nº 29/87.
Conclui o Presidente do CEFA:
"... os presidentes de câmara que são actualmente membros do Conselho Geral e do Conselho Directivo do CEFA estão dentro das exigências prescritas pelo artigo 3º da Lei nº 29/87".

4

4.1. Cumpre recordar que a consulta aparece formulada apenas em termos de se saber se há incompatibilidade entre o cargo de presidente de câmara municipal e o de membro do Conselho Directivo do CEFA (10 .

a preocupação do Presidente do CEFA, que parecia a dominante, quanto à regularidade das nomeações dos membros do Conselho Geral e Conselho Directivo em funções à data da entrada em vigor da Lei nº 9/90, sobrepor-se-ia agora a necessidade de esclarecimento das situações futuras (embora apenas quanto ao Conselho Directivo) (11 .

No entanto, não se poderá omitir que na Informação (12 em que Vossa Excelência se dignou concordar com o pedido de parecer se diz ter a Inspecção-Geral da Administração do Território aderido à interpretação do Presidente do CEFA quanto ao período transitório, mas apenas no que toca ao Presidente e vogal do Conselho Geral, o que já não seria líquido quanto aos membros do Conselho Directivo, sugerindo então a audição deste Corpo Consultivo.

Deste modo, parece que a resposta não poderá deixar de se estender ao período transitório .

Outro ponto, porém, merece particular atenção sendo que a sua adequada consideração remete para segundo plano a dissonância entre a interpretação deste Conselho atrás assinalada e a do Senhor Inspector-Geral, tornando-se desnecessária tal abordagem.

Na verdade, além a discussão centrava-se sobre os vereadores enquanto que na presente consulta a indagação sobre se existe ou não incompatibilidade se refere apenas aos presidentes de câmara.

Por conseguinte, considera-se que a consulta implica a resposta a duas questões:
- no regime anterior à Lei nº 9/90 (ressalvado para os titulares de mandatos em curso) os presidentes de câmara podiam ser nomeados membros do Conselho Directivo do CEFA?
- qual o regime, para os mesmos, em face da Lei nº 9/90?

4.2. Antes de prosseguir tentemos algumas precisões.

Do artigo 23º do Decreto-Lei nº 62/85 resulta que o presidente, os vice-presidentes ou vogais do Conselho Directivo do CEFA exercem as suas funções em regime de exclusividade ou em regime de tempo parcial.

Olhemos agora o modo como o presidente de câmara exerce as suas funções normais: segundo o estatuto dos eleitos locais o presidente da câmara exerce as suas funções sempre em permanência, distinguindo-se, porém, entre permanência com exclusividade ou sem exclusividade; a Lei de 1990 não estabelece distinção, neste aspecto.

Certo que um presidente de câmara em regime de exclusividade não poderia ser designado para o Conselho Directivo do CEFA também em exclusividade, por manifesta incompatibilidade natural.

Portanto só um presidente de câmara em regime de não exclusividade poderá ser nomeado para o Conselho Directivo do CEFA.

Vistas as coisas do lado do CEFA, o exercício de funções no Conselho Directivo em exclusividade também não será compatível com a manutenção das funções de presidente de câmara, pela contradição ínsita nos próprios termos.

Enfim, a hipótese em discussão só se coloca para um presidente de câmara cujo regime de não exclusividade lhe permita desempenhar em tempo parcial as funções de membro do Conselho Directivo do CEFA.

No Parecer nº 27/90 (13 procede-se ao confronto entre o conceito de "regime de permanência" e o de "regime de exclusividade".
Aí se afirmou:
"A citada Lei nº 44/87 não definia a "exclusividade" de funções autárquicas.
Deduzia-se, no entanto, do seu artigo 3º que "os presidentes das câmaras, de comissão administrativa e os vereadores em regime de permanência" podiam exercer outras (determinadas) funções e, caso não optassem "pelo exclusivo exercício das suas funções (autárquicas), (teriam) de assegurar a resolução dos assuntos municipais dependentes da sua competência no decurso de parte do período de expediente público" (nº 2).

A Lei nº 29/87 consagra um regime idêntico: como resulta do nº 1 do artigo 7º os eleitos locais em "regime de permanência" - (todos) os presidentes das câmaras municipais e os vereadores como tal designados (artigo 2º, nº 1) - poderão (e deveriam, em princípio) exercer exclusivamente as suas funções autárquicas, recebendo, nesse caso, a totalidade das remunerações previstas no artigo 6º, nºs 2 e 3; caso exerçam uma profissão liberal ou qualquer actividade privada perceberão 50% do valor da base da remuneração, devendo, neste caso, assegurar a resolução dos assuntos da sua competência no decurso do período de expediente público (nº 3 do referido artigo 7º).

Como se vê, "regime de permanência" e "regime de exclusividade" são conceitos diferentes. O regime de permanência pode ser exercido, ou não, em exclusividade (de funções).

Como se escreveu no citado parecer nº 83/86, o regime de permanência pressupõe, em princípio, a exclusividade de funções autárquicas. Mas apenas em princípio, pois os eleitos locais em regime de permanência podem não optar pelo exclusivo das suas funções (autárquicas), como seja quando exerçam cumulativamente uma profissão liberal ou qualquer actividade privada (artigo 7º, nº 1, alínea b)), actividades que poderão prejudicar significativamente o regular exercício das funções autárquicas".

5

Encaremos então a primeira questão.

5.1. Já vimos que para o Presidente do CEFA a designação de um presidente de câmara para membro do Conselho Directivo, no regime vigente à data da entrada em vigor da Lei nº 9/90, se apresentava como regular e legal; ponto de vista que, no entanto, não seria isento de dúvida para o Inspector Geral da Administração do Território, e daí a consulta.

Não são conhecidos, porém, os argumentos que contrariam aquela primeira tese, a qual se centra na interpretação do regime previsto na Lei nº 29/87, designadamente no nº 1 do artigo 3º.

A ressalva "sem prejuízo do disposto em legislação especial" é integrada permissivamente pela lei orgânica do CEFA?

Demos conta dos argumentos invocados - supra 3.2.2. para os quais se remete.
5.2. Por diversas vezes este Corpo Consultivo tem chamado a terreiro os princípios subjacentes ao regime das acumulações de funções e das incompatibilidades (14 , partindo do próprio texto constitucional (artigo 269º):
"1. No exercício das suas funções, os trabalhadores da Administração Pública e demais agentes do Estado e outras entidades públicas estão exclusivamente ao serviço do interesse público, tal como é definido, nos termos da lei, pelos órgãos competentes da Administração.
2. ..................................................
3. ..................................................
4. Não é permitida a acumulação de empregos ou cargos públicos, salvo nos casos expressamente admitidos por lei.
5. A lei determina as incompatibilidades entre o exercício de empregos ou cargos públicos e de outras actividades".
Por seu lado, diz o nº 2 do artigo 120º, também da CRP ("Estatuto dos titulares de cargos políticos"):

"A lei dispõe sobre os deveres, responsabilidades e incompatibilidades dos titulares de cargos políticos, bem como sobre os respectivos direitos, regalias e imunidades".

Em causa estará o respeito pelo próprio princípio da imparcialidade no exercício das funções por parte dos órgãos e agentes da Administração (artigo 266º, nº 2, da CRP).

Na óptica da consulta poderemos extrair os pontos mais salientes dos diversos pareceres emitidos sobre a temática das acumulações e incompatibilidades.
Há que acentuar, desde logo, o particularismo da função pública, encarado não apenas como construção jurídica mas também como realidade sociológica, impondo àqueles que servem o Estado o dever de lhe consagrar toda a sua actividade, proibindo-se os cúmulos. A capacidade e eficiência da Administração em grande medida dependerá da qualidade dos seus funcionários, do seu agir independente e imparcial, livre de peias decorrentes da miscigenação com outras actividades privadas e ainda da dedicação exclusiva do seu tempo às tarefas de um único cargo (15 .

No entanto, à regra da proibição de acumular diferentes funções públicas no mesmo agente ou de este exercer cumulativamente uma actividade privada são estabelecidas algumas derrogações.

Um outro tópico convém salientar, ao qual se refere o Parecer nº 61/84 (16 do seguinte modo:
"Da diferente temática legislativa utilizada nos transcritos nºs 4 e 5 (da Constituição) parece resultar que, enquanto para a acumulação de empregos ou cargos públicos a regra é a proibição e a excepção a permissão, para a acumulação de um cargo ou emprego público com um emprego ou uma actividade privada a regra seria a permissão e a excepção a proibição. Será, no entanto, mais rigoroso enunciar a distinção nestes termos: só é permitida a acumulação de empregos ou cargos públicos quando a lei expressamente o admitir; só existe incompatibilidade entre o exercício de empregos ou cargos públicos e o de actividades privadas quando a lei expressamente o determinar.
Com efeito ... o preceito constitucional não significa que passaram a ser livremente consentidas as acumulações de um cargo ou emprego público com um emprego ou actividade privada.
Na verdade, a regra constitucional sobre acumulação tem de ser interpretada e aplicada tendo sempre presente o comando do transcrito nº 1, de tal modo que, por um lado, a lei só poderá admitir a acumulação de empregos ou cargos públicos quando isso for de interesse público e, por outro lado, o desempenho contemporâneo de um cargo ou emprego público e de qualquer actividade privada só será possível em termos da sua conciliação com o mesmo interesse público que será apreciada através do esquema das incompatibilidades a estabelecer pela lei, nos termos do nº 5" (sublinhados agora).

5.3. Na "lei especial" que seria o Decreto-Lei nº 62/85 não se encontra, na verdade, uma disposição paralela à do nº 3 do artigo 4º (Conselho Geral).
Partilha-se, porém, a opinião de que o texto constitucional - "salvo nos casos expressamente admitidos por lei" (nº 4 do artigo 269º) - apenas exige que tenha havido mediação legislativa, sem que se imponha uma menção "directis et apertis verbis" da lei que afasta a incompatibilidade (17 .
Por outro lado,também não se duvida de que o CEFA "instituto público dotado de personalidade jurídica e de autonomia administrativa, financeira e pedagógica" - tendo como objectivo fundamental o "aperfeiçoamento e modernização da administração autárquica, através da formação dos seus agentes, da investigação aplicada e da assessoria técnica às autarquias locais" (artigo 2º, nº 1, do Decreto-Lei nº 62/85) prossegue um interesse público municipal de grande relevo.
Poderíamos mesmo interrogar-nos se seria concebível o funcionamento eficaz de um centro de estudos e formação deste tipo sem a intervenção activa dos autarcas de escalão mais elevado. Se as autarquias se apresentam como as destinatárias dessa acção de aperfeiçoamento e modernização pareceria, no mínimo, incongruente, que não desempenhassem aí, através dos seus mais lídimos representantes, um papel decisivo.
Argumentar-se-á em contrário que não se enquadrará facilmente na autonomia do poder local, salvaguardada pela Constituição, o desempenho de funções para as quais o presidente da câmara é nomeado por um membro do Governo.
No entanto, o próprio Conselho Geral integra sete membros designados pelo Ministro do Planeamento e da Administração do Território - um dos quais pode ser o eleito para presidente - sendo certo que todos tomam posse perante o Ministro (nº 4 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 62/85).
Aliás, embora ressalvando a sua autonomia, no artigo 244º, nº 3, da CRP, diz-se claramente que "a lei define as formas de apoio técnico e em meios humanos do Estado às autarquias locais", o que significa um certo entrelaçamento dos meios entre o Poder central e o local.
Tais dificuldades são reconhecidas logo no preâmbulo do diploma que rege o CEFA, onde se considera a solução como algo imperfeita uma vez que "é desejável que uma instituição desta índole venha a funcionar, à semelhança do que acontece na generalidade dos países europeus, na dependência exclusiva da Associação Nacional dos Municípios Portugueses".
Em termos de racionalidade - como salienta o Presidente do CEFA - não se vislumbra motivo, salvo a maior disponibilidade de tempo exigível pelo Conselho Directivo, para aceitar de plano um presidente de câmara no Conselho Geral e afastá-lo de plano no Conselho Directivo. Haveria que deixar ao critério da entidade que o designa a ponderação do circunstancialismo concreto em que cada presidente de câmara exerce funções, de modo a avaliar dessa disponibilidade, até porque, como frisámos, a situação só se coloca em relação a uma prestação de funções em tempo parcial.
Em suma, o interesse público aponta para a permissão da nomeação de um presidente de câmara para membro do Conselho Directivo do CEFA, não se vendo, em contrapartida, que possam ser feridos outros interesses que a incompatibilidade visaria proteger.
Considerações de unidade do sistema jurídico, bem como a presunção de que o legislador consagrou as soluções mais acertadas - artigo 9º, nºs 1 e 3, do Código Civil - apontam para uma resposta afirmativa a esta questão sendo verdade que os trabalhos preparatórios da Lei nº 29/87 não fornecem qualquer contributo.
A unidade do sistema traduzir-se-á na semelhança de interesses subjacentes à "gestão participada" do CEFA quer no Conselho Geral quer no Conselho Directivo, o que impulsionará uma participação idêntica por parte dos autarcas.
Não deixa, todavia, de impressionar a exigência imposta pelo nº 2 daquele artigo 9º - de que o pensamento legislativo tenha na lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso (18 .
Com efeito, mostram-se frágeis as referências implícitas dos artigos 4º, 5º, alínea b) e 7º, do Decreto-Lei nº 62/85, das quais se destaca o facto de se tomar como ponto de referência do período temporal do mandato, quer dos membros do Conselho Geral quer do Conselho Directivo, "o período correspondente ao mandato dos titulares dos órgãos das autarquias locais".
No entanto, o peso relativo da unidade do sistema e da protecção do interesse público municipal, aliado à ausência de risco visível de colisão com outros interesses protegidos pela lei, fazem-nos inclinar para a conclusão de que no regime anterior à Lei nº 9/90 um presidente de câmara podia ser designado membro do Conselho Directivo do CEFA.

6

Passemos à apreciação perante o regime actual, ou seja, após a publicação da Lei nº 9/90, alterada pela Lei nº 56/90.

Segundo o disposto nos artigos 1º e 2º da Lei nº 9/90, a titularidade do cargo de presidente de câmara municipal, como um dos cargos políticos aí mencionados, é incompatível com "o exercício remunerado de quaisquer outras actividades profissionais ou de função pública que não derive do seu cargo".
Afirmou-se no já aludido Parecer nº 54/90 que o objectivo daquela Lei "exuberantemente sublinhado na discussão parlamentar respectiva, é, além do mais, o de permitir a máxima dedicação dos titulares dos cargos políticos e dos altos cargos públicos ao exercício das respectivas funções, com isenção, rigor e transparência. A ideia força é no sentido do exercício exclusivo das funções inerentes àqueles cargos".
Por outro lado, no tocante à interpretação da expressão "outras actividades profissionais" concluiu-se:
"O conceito "actividade profissional" previsto na alínea a) do artigo 2º da Lei nº 9/90, de 1 de Março (alterada pela Lei nº 56/90, de 5 de Setembro), circunscreve-se às actividades profissionais privadas" (conclusão 1ª).
Sendo assim, haverá que indagar se a designação como membro do Conselho Directivo do CEFA configura uma actividade de função pública que não derive do cargo de presidente da câmara.
No mesmo Parecer nº 54/90 extraiu-se uma outra conclusão (2ª) do seguinte teor:
"Entende-se por actividade de "função pública" a que alude o citado artigo 2º, alínea a), da Lei nº 9/90, a que é desenvolvida no âmbito da administração central do Estado, incluindo os seus serviços personalizados e os fundos públicos, e a da administração pública local e regional".
Parece claro que as funções de membro do Conselho Directivo do CEFA não derivam, não se apresentam como decorrentes do cargo de presidente de câmara.
Mas a aproximação do cargo de membro do Conselho Directivo do CEFA ao conceito de função pública antolha-se como a mais adequada, já que aquele instituto público se apresenta como uma estrutura de natureza mista, "de gestão participada entre a administração central e local", tal como se salienta no exórdio do seu diploma orgânico.
Por outro lado, o estatuto do seu pessoal "é em tudo idêntico ao do pessoal dos municípios" (artigo 19º, nº 1).
A nosso ver, o novo regime de incompatibilidade de cargos políticos alterou a previsão do artigo 3º da Lei nº 29/87, deixando de se ressalvar a legislação especial aí prevista, no que toca aos presidentes de câmara municipal.

Confirma esta asserção o nº 6 do artigo 4º da Lei nº 9/90, na redacção da Lei nº 56/90, na medida em que veio excepcionar expressamente a situação dos vereadores em regime de meio tempo, declarando-os não abrangidos pelo disposto no nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87.
Não será, ao invés, o caso dos presidentes de câmara ou dos vereadores a tempo inteiro.
Poderá objectar-se que, apesar de tudo, estará de pé a ressalva do mencionado nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87 já que este diploma continua em vigor pois se aplica, como se acaba de ver, aos vereadores em tempo parcial.
Só que este raciocínio esquece o espírito restritivo subjacente ao novo sistema, que põe o acento no princípio da exclusividade do exercício de cargos políticos, amenizado embora pelo regime transitório a que se refere o artigo 8º, nº 2, até ao termo dos mandatos dos então titulares desses cargos políticos. Disposição transitória extremamente discutida na Assembleia da República e que bem denuncia, por seu lado, a mudança que se operava.

CONCLUSÃO:

7

Do exposto se extraem as seguintes conclusões:
1ª. Só é permitida a acumulação de empregos ou cargos públicos quando a lei expressamente o admitir - artigo 269º, nº 4, da Constituição da República - interpretando-se a lei mediadora de acordo com as regras adquiridas pela hermenêutica jurídica;
2ª. A norma do nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87, de 30 de Junho, ao ressalvar do sistema de incompatibilidades o disposto em legislação especial, conjugada com o Decreto-Lei nº 62/85, de 13 de Março permitia que um presidente de câmara em regime de não exclusividade fosse designado para exercer funções de membro do Conselho Directivo do Centro de Estudos e Formação Autárquica;
3ª. Tal regime foi, porém, alterado pela Lei nº 9/90, de 1 de Março - redacção última dada pela Lei nº 56/90, de 5 de Setembro -, não sendo agora permitida a designação a que se refere a conclusão anterior, embora se mantenham as situações em curso nos termos do direito transitório salvaguardado pelo artigo 8º daquela Lei.






(1Por sua vez alterada pelas Leis nºs 97/89, de 15 de Dezembro, e 1/91, de 10 de Janeiro.
(2Análise já efectuada no Parecer nº 41/89, de 12.10.89, publicado no Diário da República, II Série, nº 69, de 23.03.90, a que adiante se voltará.
(3A tutela do CEFA passou a ser exercida pelo Ministro do Planeamento e da Administração do Território - cfr. nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 130/86, de 7 de Junho (lei orgânica do MPAT) e artigo 2º, alínea e), do Decreto-Lei nº 329/87, de 23 de Setembro (lei orgânica do XI Governo Constitucional).
(4Comunicação apresentada no X Colóquio Nacional da ATAM, que teve lugar na Covilhã, de 28 de Setembro a 1 de Outubro de 1990, pelo Dr. NUNO SALGADO.
(5De 17.10.90, subscrito pelo Prof. A.M. BARBOSA DE MELO.
(6O título da comunicação é "Inelegibilidades, incompatibilidades e impedimentos dos titulares dos órgãos das autarquias locais: considerações gerais".
(7Parte IV.
(8Ponto 1.3.1, da Parte IV, da Comunicação.
(9Cita os Pareceres nºs 83/86, de 17.12.86, publicado no Diário da República, II Série, nº 110, de 14.05.87 e 41/89, já aludido na nota (2).
(10æ data da emissão do seu parecer, a Lei nº 9/90 já havia sido alterada pela Lei nº 56/90.
(10Ofício de 14.12.90, do Chefe do Gabinete.
(11O que apesar de tudo também já se salientara na parte final do parecer do Presidente do CEFA.
(12Nº 299/90, de 3.12.90, de um Adjunto do Gabinete de Sua Excelência o Secretário de Estado.
(13De 28.06.90, publicado no Diário da República, nº 59, II Série, de 12.03.91 - ponto 3.2.5.
(14No Parecer nº 55/86, de 8.10.87, publicado no Diário da República, nº 97, de 27.04.88, indicam-se - nota (2) - alguns exemplos. Depois, cfr. também os pareceres nºs 75/89, publicado no Diário da República, nº 127, II Série, de 4.06.91, de 22.02.90, 26/90, de 28.07.90, não publicado nem homologado, 54/90, de 11.10.90, publicado no Diário da República, nº 161, II Série, de 9.07.91, e 121/90, de 25.01.91, publicado no Diário da República nº 127, de 4.06.91.
(15O que é afirmado no nº 1 do artigo 12º do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho: "O exercício de funções públicas é norteado pelo princípio da exclusividade".
(16De 20.12.84, publicado no Diário da República, II Série, nº 163, de 18.07.85.
(17Repare-se, é a lei formal - Lei nº 28/87 - que ressalva a "legislação especial", parecendo aqui esconjurados os perigos da deslegalização.
(18Não constituirá argumento a consideração de que tem sido a prática seguida desde a instalação do CEFA, inclusivamente em face da Lei nº 9/81, porventura mais exigente que a Lei nº 29/87.
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART120 N2 ART244 N3 ART266 N2 ART269 N4.
CADM40 ART75.
L 44/77 DE 1977/06/23 ART1 ART13 N2.
L 9/81 DE 1981/06/26 ART1 ART2 ART3 ART4 N1 ART5 ART6 ART7 ART8 ART10.
LAL84 ART45.
L 25/85 DE 1985/08/12.
L 29/87 DE 1987/06/30 ART2 ART3 N1 ART6 N2 N3 ART7 N1.
L 97/89 DE 1989/12/15.
L 1/91 DE 1991/01/10. DL 192/86 DE 1986/07/17.
L 9/90 DE 1990/03/01 ART1 N1 ART2 ART4 ART8.
L 56/90 DE 1990/09/05. DL 161/80 DE 1980/05/28.
DL 76/82 DE 1982/03/04 ART11 N1 N2. DL 105/83 DE 1983/02/18.
DL 62/85 DE 1985/03/13 ART3 ART4 ART5 ART7 ART22 ART23.
Referências Complementares: 
DIR ADM * ADM PUBL * FUNÇÃO PUBL.
Divulgação
Número: 
DR116
Data: 
20-05-1992
Página: 
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