Simp English Español

Está aqui

Dados Administrativos
Número do Parecer: 
75/1989, de 08.02.1990
Data do Parecer: 
08-02-1990
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Maioria
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações
Relator: 
FERREIRA RAMOS
Descritores e Conclusões
Descritores: 
FUNCIONÁRIO PÚBLICO
INCOMPATIBILIDADE
ACUMULAÇÃO DE CARGOS
ACUMULAÇÃO DE ACTIVIDADE PRIVADA
AUTORIZAÇÃO
IMPEDIMENTO
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
Conclusões: 
1 - Só existe incompatibilidade entre o exercicio de empregos ou cargos publicos e o de actividades privadas quando a lei o determinar;

2 - Salvo o disposto no nº 2 do artigo 32º do Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro, o exercício em acumulação de actividades privadas carece de autorização prévia do membro do Governo competente, a qual só pode ser concedida se se verificarem as condições enunciadas nas várias alíneas do nº 3 do mesmo preceito;

3 - Releva de matéria de facto a questão de saber se do exercicio normal das funções de técnico responsável pela exploração das instalações eléctricas do Palácio de S. Bento e do edificio da Assembleia da Republica sito em Lisboa, na Rua de S. Bento, nºs 148-150 - actividade a ser exercida ao abrigo de um contrato de prestação de serviços, nos termos do Decreto Regulamentar nº 31/83 de 18 de Abril - pode ou não resultar ingerência, directa ou indirecta, nas obras e fornecimentos que a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, no exercício das suas atribuições, aí venha ou possa vir a realizar e, consequentemente concluir pela existencia ou não da incompatibilidade definida no artigo 119º, nº 2, do "Regime de Pessoal dos Serviços do Ministério da Habitação e Obras Publicas", aprovado pelo Decreto-Lei nº 183/80, de 4 de Junho;

4 - Se se concluir que aquela actividade de técnico responsável pela exploração das instalações eléctricas não é legalmente incompatível, o seu exercício carecera sempre de autorização prévia do membro do Governo competente, a qual só pode ser concedida se se verificarem as condições enunciadas nas alineas b), c) e d) do nº 3 do artigo 32º do Decreto-Lei nº 427/89.
Texto Integral
Texto Integral: 
SENHOR SECRETÁRIO DE ESTADO DA HABITAÇÃO
E TRANSPORTES INTERIORES,

EXCELÊNCIA:

1

Pretende a Assembleia da República celebrar um contrato de prestação de serviços com técnicos que assumam a responsabilidade pela exploração das instalações eléctricas do Palácio de S. Bento e do edifício sito em Lisboa, na Rua de S. Bento, nºs 148/150.

Com interesse na celebração desse contrato apresentaram-se dois engenheiros electrotécnicos pertencentes ao quadro da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (DGEMN), exercendo funções na Direcção Regional de Edifícios de Lisboa.

Dada, porém, a sua qualidade de funcionários públicos, suscitaram-se dúvidas sobre a possibilidade de celebração do contrato com tais outorgantes.

Vossa Excelência dignou-se solicitar o parecer deste Conselho Consultivo que, por isso, cumpre emitir.


2

2.1. O Estatuto do Técnico Responsável por Instalações Eléctricas do Serviço Particular foi aprovado pelo Decreto Regulamentar nº 31/83, de 18 de Abril (1)

2.1.1. O Estatuto regulamenta a actividade dos técnicos responsáveis no que diz respeito à elaboração de projectos, à execução e à exploração de instalações eléctricas de serviço particular (artigo 1º).

O conceito de técnico responsável é dado pelo artigo 2º:

“1. Consideram-se técnicos responsáveis por instalações eléctricas os indivíduos que, preenchendo os requisitos fixados no presente Estatuto, podem assumir a responsabilidade pelo projecto, pela execução ou pela exploração das referidas instalações.

2. É permitida a acumulação das qualidades de técnico responsável previstas nos artigos 4º, 5º e 6º do presente Estatuto" (2) .


Para o exercício da sua actividade, o técnico responsável deverá estar inscrito na Direcção-Geral de Energia, nas condições estabelecidas no capítulo III.

As atribuições gerais dos técnicos responsáveis define-as o artigo 12º:

"1. Dentro da esfera da sua competência, os técnicos responsáveis pelo projecto, pela execução ou pela exploração de instalações eléctricas respondem por tudo o que se prenda com os aspectos ,técnicos e regulamentares.

2. Sem prejuízo dos aspectos técnicos e regulamentares referidos no número anterior, sempre predominantes em qualquer tipo de instalação eléctrica, deverão os técnicos procurar a solução mais económica para as instalações.

3. Na sua qualidade de representantes dos proprietários das instalações eléctricas por que são responsáveis, devem os técnicos, a solicitação da fiscalização do Governo ou dos distribuidores públicos de energia eléctrica, satisfazer todos os pedidos de esclarecimento, incluindo os referentes a eventuais alterações ou correcções ao projecto".



2.1.2. Especificamente sobre o técnico responsável pela exploração, dispõem:

"Artigo 15º
(Inspecções da instalação eléctrica)

1. O técnico responsável pela exploração deverá inspeccionar a instalação eléctrica com a frequência exigida pelas características da exploração, no mínimo 2 vezes por ano, a fim de proceder às verificações, ensaios e medições regulamentares. As 2 inspecções obrigatórias devem ser feitas, uma durante os meses de Verão e outra durante os meses de Inverno.

2. O número de inspecções, para além das 2 anuais obrigatórias a que se refere o número anterior, deve constar do contrato de Prestação de serviços (anexo IV) e ter em conta a sua complexidade e a perigosidade da sua exploração.

3. Além das inspecções indicadas nos números anteriores, o técnico responsável deverá efectuar visitas técnicas a solicitação justificada da entidade exploradora.

Artigo 16º
(Instalações irregulares)

1. Sempre que o técnico responsável pela exploração detectar deficiências anti-regulamentares, delas dará conhecimento, por escrito, à entidade exploradora da instalação, com vista à sua eliminação dentro de um prazo compatível com a importância e natureza daquelas, que para o efeito fixará. Quando as deficiências colidam notoriamente com a segurança de pessoas e coisas, devem ser rapidamente eliminadas.

2. Se, nos casos referidos na parte final do número anterior, findo o prazo fixado, a entidade exploradora não tiver eliminado as deficiências indicadas pelo técnico, deverá este dar conhecimento do facto à fiscalização do Governo.

Artigo 17º
(Ampliações das instalações)

As ampliações da instalação eléctrica carecem do parecer favorável do técnico responsável pela exploração nos aspectos relacionados com as disposições regulamentares de segurança e com as boas regras da técnica".

Registe-se, por último, o disposto no artigo 23º:

"1. A entidade exploradora da instalação eléctrica e o técnico responsável estabelecerão entre si um programa das tarefas a desempenhar e o respectivo calendário e celebrarão, obrigatoriamente, um contrato escrito de prestação de serviços (anexo IV).

2. No caso de o técnico responsável pertencer ao quadro técnico da entidade exploradora das instalações, o contrato de prestação de serviços referido no número anterior poderá constituir um complemento do seu contrato normal de trabalho, sem prejuízo da sua autonomia".

2.2. A compreensão e um mais fácil acompanhamento da exposição que se seguirá (no ponto 3) só ganharão com a imediata transcrição de algumas das normas que vão ser objecto de ulterior referência.

2.2.1. Artigo 119º, nº 2 do Regime de Pessoal dos Serviços do Ministério da Habitação e Obras Públicas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 183/80, de 4 de Junho (3) :

"O exercício de qualquer actividade no âmbito do MHOP é incompatível com a ingerência directa ou indirecta nas obras e fornecimentos que se realizam nos respectivos organismos".

2.2.2. Do Decreto-Lei nº 204/80, de 28 de Junho (4) - aprovou a Lei orgânica da DGEMN -, o artigo 1º:

"A Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (DGEMN) é um organismo executivo do Ministério da Habitação e Obras Públicas que tem por finalidade assegurar o planeamento e estudo, projecto, execução e apetrechamento de obras nos seguintes domínios:

a) Dos edifícios de todo o património do sector público do Estado, quando não exceptuado por lei, existentes ou a construir, visando a sua conservação e a obtenção de adequadas instalações para serviços públicos;

b) Dos imóveis classificados, com vista à salvaguarda e revitalização dos bens culturais, nomeadamente dos monumentos, dos conjuntos históricos e dos sítios;

e o artigo 2º:

"À DGEMN incumbe:

.................................................................................................................................

f) Elaborar ou promover a elaboração dos estudos e projectos dos empreendimentos, colaborando com as entidades destinatárias no estabelecimento dos respectivos programas preliminares;



g) Promover a realização de obras, nomeadamente de construção, ampliação, remodelação e conservação;

..................................................................................................................................

i) Pronunciar-se sobre as obras que os serviços utentes possam realizar directamente ao abrigo da lei;

..................................................................................................................................

2.2.3. Artigo 1º do Decreto-Lei nº 370/83, de 6 de Outubro:

"1. Nenhum titular de órgão da administração central, regional e local ou dos institutos ou empresas públicas podem intervir em processo administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado:

a) Quando nele tenha interesse, por si, como representante ou como gestor de negócios de outra pessoa;

b) Quando tenha intervindo como perito ou mandatário ou haja dado parecer sobre questão a resolver".

3

O processo instrutor dá-nos conta de diferentes tomadas de posição, que passaremos a enunciar, embora sucintamente.

3.1. As dúvidas quanto à possibilidade de celebração de um contrato de prestação de serviços entre a Assembleia da República, na qualidade de entidade exploradora das instalações eléctricas, e os mencionados engenheiros electrotécnicos, na qualidade de técnicos responsáveis pela exploração, foram desde logo suscitadas pelos serviços da Assembleia da República e transmitidas ao Director-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (ofício nº 3 138, de 4/4/89).

3.2. Na Assessoria Jurídica da DGEMN foi elaborada a informação nº 5/89, de 20 de Abril de 1989, na qual se entendeu que "aqueles técnicos, podendo actuar, ou actuando como agentes desta Direcção-Geral, naquelas obras, não podem efectuar o referido contrato ... . verificando-se, por isso, a incompatibilidade prevista na alínea a) do nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 370/83, visto que dele iriam beneficiar economicamente, tendo interesse nele", preceito aplicável não apenas aos, titulares dos órgãos nele mencionados, mas também aos restantes funcionários.

3.3. Reagiram os interessados, dizendo não caber nas atribuições da DGEMN" inspeccionar as instalações eléctricas na fase de exploração", sendo esta a actividade que se propõem desenvolver ao serviço da Assembleia da República e que "será exercida fora das horas normais do serviço e sem prejuízo para este, até porque de acordo com o nº 1 do artigo 15º do Decreto Regulamentar nº 31/83, as instalações serão inspeccionadas, normalmente, duas vezes por ano, além de que, por norma, essas inspecções têm de ser efectuadas fora das horas de funcionamento normal da Assembleia da República, em virtude de se ter de desligar a energia para execução dessas mesmas inspecções".

3.4. Chamada de novo a pronunciar-se, a Assessoria Jurídica da DGEMN (informação nº 8/89, de 16 de Maio) reafirmou a aplicabilidade ao caso concreto da alínea a) do nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 370/83, mais concluindo que do exercício normal das funções de técnico responsável pela exploração das instalações eléctricas dos edifícios em causa pode resultar - face ao disposto nos artigos 1º, nº 1, alínea a), e 2º, alínea g), do Decreto-Lei nº 204/80, e 16º, nº 1, e 17º, do Decreto Regulamentar nº 31/83 - ingerência indirecta nas obras ali efectuadas ou a efectuar pela DGEMN, verificando-se, assim, "o impedimento do nº 2 do artigo 119º do Decreto-Lei nº 183/80".

3.5. O Director-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, após manifestar "dúvidas quanto à exacta aplicabilidade das disposições indicadas no referente a constituírem impedimento à contratação de técnicos da Direcção-Geral para assegurarem a responsabilidade de exploração das instalações eléctricas da A.R.", ponderou ainda que "embora a actividade não constitua ingerência nas obras ou fornecimentos a cargo da Direcção-Geral, poderá o exercício daquelas funções constituir interferência com a actuação dos serviços o que será de evitar", pelo que submeteu o assunto à consideração de Vossa Excelência, sugerindo a audição da Auditoria Jurídica do MOPTC.

3.6. Aqui viria a ser produzida, por um consultor jurídico, a informação nº 136/89, de 20 de Junho, firmando conclusões contrárias às da informação da Assessoria Jurídica da DGEMN.

Na verdade, defende-se a possibilidade de os referidos engenheiros serem partes no contrato de responsabilidade técnica de exploração das instalações eléctricas em causa, visto não ser aplicável à situação o Decreto-Lei nº 370/83 e também se não verificar a incompatibilidade prevista no nº 2 do artigo 119º do Regime de Pessoal aprovado pelo Decreto-Lei nº 183/80.

Com efeito - argumenta-se - a questão (só) cairia na alçada do referido Decreto-Lei nº 370/83 "se os agentes técnicos em causa estivessem a desempenhar funções na Direcção-Geral de Administração e Informática da Assembleia da República e fossem co-contratantes no contrato de responsabilidade técnica de exploração das instalações eléctricas. Só assim existiria impedimento. No entanto, eles não pertencem a essa direcção-geral mas à dos Edifícios e Monumentos Nacionais que não é o serviço que vai contratar. E não indo contratar, os engenheiros técnicos não podem ser colocados numa posição de intervenção que ponha em causa o princípio da imparcialidade".

E também se não verifica a incompatibilidade do nº 2 do artigo 119º, porquanto esta norma "se destina a todos aqueles que, pertencendo a este Ministério, tenham ingerência nas obras e fornecimentos a realizar nos respectivos organismos do mesmo ministério", pretendendo-se, assim, "evitar que alguém, pelo facto de desempenhar uma actividade no Ministério, possa desse modo do facto se aproveitar para influenciar contratações de que viria a beneficiar".

Afirma-se, finalmente, a inexistência de normas na lei orgânica da DGEMN que apontem qualquer incompatibilidade, na medida em que não figura entre as atribuições daquela direcção-geral o desempenho de tarefas objecto da contratação.

3.7. Discordando desta informação, o Auditor Jurídico viria a subscrever, em separado, o seu parecer datado de 10 de Agosto, sugerindo a eventual audição da Procuradoria-Geral da República.

Este parecer manifesta a sua concordância com as conclusões da informação nº 8/89 da Assessoria Jurídica da DGEMN, e no que especificamente concerne ao citado nº 2 do artigo 119º, interpreta-o "como reportando-se às actividades e às obras não (só) dentro ou no interior do Ministério mas antes àquelas que são da sua competência ainda que respeitem a departamentos ou organismos não integrados ou dependentes do MOPTC".

4

A questão submetida à consideração deste corpo consultivo consiste em saber se é legalmente possível a celebração de um contrato de prestação de serviços previsto no Decreto Regulamentar nº 31/83, de 18 de Abril, entre a Assembleia da República, como primeiro outorgante e na qualidade de entidade explorada das instalações eléctricas do Palácio de S. Bento e do prédio sito em Lisboa, na Rua de S. Bento, nºs 148/150, e dois engenheiros electrotécnicos, funcionários do quadro da DGEMN, como segundos outorgantes e na qualidade de técnicos responsáveis.

Fundamentalmente, está assim em causa saber se existe uma incompatibilidade entre o exercício das funções de engenheiro electrotécnico do quadro da DGEMN e o da actividade de técnico responsável pela exploração de instalações eléctricas.

Por isso que o presente parecer deva mover-se, por excelência, no domínio das acumulações e incompatibilidades

Incompatibilidade é a impossibilidade legal do desempenho de certas funções públicas por indivíduo que exerça determinadas actividades ou se encontra em alguma das situações, públicas ou particulares, enumeradas na lei (5) .

Por outras palavras: denomina-se incompatibilidade a impossibilidade de desempenhar, além do cargo correspondente ao lugar ocupado, outras funções (privadas), ou de ocupar outro lugar (público).

As incompatibilidades - que geram, em relação aos funcionários ou agentes, por elas atingidas, deveres negativos, ou seja a omissão de preenchimento de novo lugar ou desempenho de outras funções - constituem, assim, um limite em relação à matéria das acumulações. Isto é, a acumulação só poderá verificar-se quando não há incompatibilidade ou esta pode ser removida; logo que haja incompatibilidade ou ela não possa ser removida, não poderá haver acumulação (6) .


Há incompatibilidades que são comuns a todas as funções públicas, enquanto outras são especiais de certo cargo ou função; podem ainda qualificar-se em naturais e morais e em absolutas e relativas.

São incompatibilidades naturais as que resultam da impossibilidade material de desempenhar simultaneamente dois cargos ou duas actividades dentro das mesma horas de serviço, em diferentes localidades ou dentro da mesma hierarquia.

As incompatibilidades morais são as que resultam da necessidade de impedir que o agente possa ser suspeito de utilizar a função pública para favorecer interesses privados em cuja dependência se encontrasse em virtude de prestar serviços remunerados a particulares ou estar ligado por laços de parentesco a quem possa influir na marcha dos negócios públicos para o seu proveito pessoal.

As incompatibilidades absolutas são as que não podem ser removidas, forçando o funcionário a optar por um dos cargos incompatíveis; as incompatibilidades relativas são aquelas que podem ser removidas mediante a obtenção de autorização, dada pela entidade competente, para o exercício dos dois cargos ou de um cargo e de uma actividade privada, podendo esta autorização ser condicionada, de modo a garantir o desempenho do cargo ou cargos públicos sem prejuízo para a administração.


5

À temática das acumulações e incompatibilidades conferiu o legislador dignidade constitucional, dispondo o artigo 270º da Constituição de 1976 (redacção originária) (7)

"1. Os funcionários e agentes do Estado e das demais entidades públicas estão exclusivamente ao serviço do interesse público, tal como é definido, nos termos da lei, pelos órgãos competentes da Administração.

.........................................................................................................

4. Não é permitida a acumulação de empregos ou cargos públicos, salvo nos casos expressamente admitidos por lei.

5. A lei determina as incompatibilidades entre o exercício de empregos ou cargos públicos e o de outras actividades".

Por variadíssimas vezes a problemáticas das acumulações e incompatibilidades foi estudada neste corpo consultivo, cujo parecer nº 251/78 (8) extraiu, entre outras, as seguintes conclusões:


“1ª. A regra constitucional que proíbe as acumulações (artigo 270º, nº 4, da Constituição da República) é restrita a empregos ou cargos públicos, podendo a lei permitir acumulações só quando isso for de interesse público (cfr. nº 1 do citado artigo 270º);

2ª. A restrição referida na conclusão anterior não significa que a acumulação de um emprego ou cargo público com uma actividade privada seja livremente consentida, pois esta acumulação só é possível em termos da sua conciliação com o interesse público, que será apreciada através do esquema das incompatibilidades a estabelecer pela lei, nos termos do nº 5 do artigo 270º do ordenamento constitucional;

3ª. É regra no direito administrativo português (artigo 23º, § 3º, nº 2, do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis e do Estado) que, para além dos casos de incompatibilidade expressamente previstos e regulados pela lei, há sempre incompatibilidade relativa entre o desempenho de um emprego ou cargo público e qualquer outra actividade, dependendo então o exercício desta última de autorização do Ministro respectivo".

5.1. Para tanto, o citado parecer sublinhou o particularismo da função pública, encarada não somente como construção jurídica mas também como realidade sociológica, o qual decorre, nomeadamente, do facto de o Estado não ser um “patrão" como os demais.

Daí a sujeição do funcionário a várias obrigações, de entre as quais importa agora referir a de consagrar toda a sua actividade à Administração e a proibição correlativa dos cúmulos de actividades (9) .

Com esta obrigação pretende-se significar que o funcionário público, em princípio, deve o seu tempo de trabalho à Administração, isto é, o trabalho na Administração é um trabalho exclusivo que não deve comportar possibilidades de cúmulos: nem de vários cargos públicos nem de um emprego público com uma actividade privada.

Na verdade, - prossegue o parecer nº 251/78 - na grande maioria dos países reconhece-se que é difícil ter bons funcionários se não estão à disposição da Administração com carácter de permanência; além de que o exercício de uma actividade privada pode atentar contra a sua independência e imparcialidade, sem esquecer que o desempenho de diferentes cargos ou actividades pelo mesmo agente constitui factor negativo em matéria de emprego na medida em que deixa de libertar postos de trabalho a que poderiam ter acesso desempregados com as necessárias habilitações e capacidade.

Ideia que VICTOR SILVERA e SERGE SALON (10) desenvolvem sugestivamente, ao considerarem que o correcto e eficiente desempenho de um cargo da função pública exige que o respectivo agente lhe dedique todo o seu tempo e todo o seu interesse, não devendo distrair-se com outras actividades capazes de afectar o exercício daquele, tanto pela limitação do tempo que se exige lhe seja dedicado como pela concorrência de outros interesses, senão opostos pelo menos capazes de afectar o que deve presidir ao exercício da função, diminuindo ou eliminando o zelo, a independência ou a imparcialidade que deve nortear o seu exercício.


Porém, considerações de vária ordem, desde logo as que se prendem com as remunerações da função pública, conduzem a derrogações ao princípio da interdição dos cúmulos, sem que tal postule que a regra deixe de ser a proibição de acumular diferentes funções públicas na pessoa do mesmo agente.

5.2. Ponderando e aqui o parecer nº 251/78 acompanha o parecer nº 142/78, votado na sessão de 13 de Julho de 1978, - que do nº 4 do transcrito artigo 270º resulta que a proibição das acumulações é restrita a cargos ou empregos públicos, logo de seguida se acentua que isto não quer significar que a acumulação de um cargo ou emprego público com um emprego ou actividade privada sejam livremente consentidos.

Na verdade, - diz-se - a regra constitucional sobre acumulações tem de ser interpretada e aplicada tendo sempre presente o comando do nº 1 do citado preceito constitucional, "de tal modo que, por um lado a lei só poderá admitir a acumulação de empregos ou cargos públicos, quando isso for de interesse público e, por outro lado, o desempenho contemporâneo de um cargo ou emprego público e de qualquer actividade privada só será possível em termos da sua conciliação com o mesmo interesse público, que será apreciada através do esquema das incompatibilidades a estabelecer pela lei, nos termos do nº 5 do artigo 270º.


Ora, à face do citado preceito da lei constitucional pode, em princípio, um agente da Administração exercer, a par do seu cargo, qualquer outra actividade ou emprego privados, cedendo, porém, essa regra logo que a lei ordinária definir actividades ou situações que impeçam quem nelas se encontrar de exercer o cargo ou emprego público, assim estabelecendo as incompatibilidades a que alude o nº 5”.

Face ao exposto, os referidos pareceres entenderam ser decisivo, para se afirmar a existência de incompatibilidades entre duas actividades, averiguar se alguma disposição legal define expressamente qualquer incompatibilidade entre o seu exercício, uma vez que só há incompatibilidade quando a lei o estabeleça.

5.3. Ao tempo dos dois pareceres que temos vindo a acompanhar vigorava o Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, aprovado pelo Decreto-Lei nº 32 659, de 9 de Fevereiro de 1943. Com base no seu artigo 23º, § 3º, nº 2, aqueles pareceres concluíram pela existência da regra, no direito administrativo português, de que, para além dos casos de incompatibilidade expressamente previstos e regulados na lei, havia sempre incompatibilidade entre o desempenho de um cargo ou emprego público e qualquer outra actividade.

A publicação do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei nº 191-D/79, de 25 de Junho, veio, no entanto, pôr em causa o acerto da regra extraída do artigo 23º, § 3º, nº 2, do Estatuto precedente.

Aquela norma deixava de figurar no novo Estatuto Disciplinar, e este substituía-lhe diverso preceito cominando a pena de inactividade aos funcionários ou agentes que salvo nos casos previstos por lei, acumularem lugares ou cargos públicos ou exercerem por si ou por interposta pessoa, actividades privadas, quando esse exercício se mostre incompatível com os deveres legalmente estabelecidos" (artigo 24º, nº 2, alínea d), com sublinhado nosso).

A inovação seria analisada no Parecer nº 122/80, de 6 de Novembro de 1980 (11) permitindo concluir pela possibilidade de acumulação de um emprego ou cargo público com uma actividade privada desde que não existisse incompatibilidade estabelecida na lei ou essa acumulação se não mostrasse incompatível com os deveres legalmente estabelecidos.
E isto, em regra, sem dependência de autorização prévia ministerial ou de superior hierárquico, contudo correcta e aconselhável para obviar ao risco de que um juízo de valor sobre a incompatibilidade, reservado certamente à esfera própria do funcionário, não seja por este exercido em termos conflituantes com o que vier a presidir à concepção da entidade detentora do poder disciplinar.

5.4. Mas a edição do actual Estatuto disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei nº 24/84, de 16 de Janeiro, obrigaria ainda a afeiçoar a doutrina deste corpo consultivo aos imperativos decorrentes de reformulados preceitos (12) .

Na verdade, o artigo 24º nº 1, alínea c), vinha agora punir com suspensão os funcionários e agentes que “exercerem por si ou por interposta pessoa, sem prévia participação e ou autorização do superior hierárquico - estando obrigados a fazê-la ou a obtê-la -, actividades privadas" (sublinhados nossos).

E o artigo 25º, nº 2, alínea d), passava a cominar a pena de inactividade aos funcionários e agentes que, “salvo nos casos previstos na lei, acumularem lugares ou cargos públicos ou exercerem, por si ou interposta pessoa, actividades privadas depois de ter sido reconhecida, em despacho fundamentado do dirigente do serviço a incompatibilidade entre essa actividade e os deveres legalmente estabelecidos" (sublinhado nosso).

Coube ao Parecer nº 61/84, de 20 de Dezembro de 1984 (13) elaborando e reflectindo a nova disciplina, protagonizar a nova posição do Conselho, com particular incidência na vertente das acumulações de funções públicas e privadas.

Assim, duas consequências era possível extrair, liminarmente, do cotejo entre os sucessivos regimes disciplinares.


Por um lado, tornava-se agora claro que o exercício de actividades privadas não autorizadas só constituía infracção disciplinar se o funcionário estivesse obrigado a obter autorização prévia. Mas esta obrigação não resultava directamente do Estatuto, havendo de buscar-se nos diplomas reguladores dos serviços, de modo a excluir-se ainda a incompatibilidade relativa geral entre o exercício de cargos públicos e quaisquer outras actividades, que, até ao Estatuto de 79, pudera este Conselho afirmar com base no artigo 23º, § 3º, nº 2 do Estatuto de 43.

Por outro lado, diferentemente do que o artigo 24º, nº 2, alínea d), do Estatuto de 1979 permitira sustentar, o actual Estatuto apenas sanciona o exercício de actividades privadas depois de reconhecida pelo dirigente do serviço, em despacho fundamentado, a incompatibilidade entre essas e os deveres legalmente estabelecidos (14) .

5.5. A partir destas coordenadas e precedendo elaboração e desenvolvimentos de que se pode aqui prescindir, pôde no Parecer nº 61/84 chegar-se ainda às conclusões seguintes:

- só existe incompatibilidade entre o exercício de empregos ou cargos públicos e de actividades derivadas quando a lei o determinar;

- não existe nenhuma regra geral, válida para todos os funcionários e agentes da Administração, que faca depender de autorização ministerial ou do superior hierárquico esse tipo de acumulação;

- não é admissível a concessão de autorização para o desempenho de actividades privadas e é ilícito esse desempenho quando normas legais e especiais as declararem absolutamente incompatíveis com o cargo público exercido, ou quando as mesmas sejam incompatíveis com os deveres legalmente estabelecidos aos funcionários (15) .

6

Sendo esta a posição actual do Conselho em matéria de incompatibilidades e acumulação de funções públicas e privadas, interessa considerar que, entretanto, foram publicados a Lei Constitucional nº 1/89, de 8 de Julho - que, todavia, deixou intocado o artigo 269º -, o Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, que estabeleceu princípios gerais em matéria de emprego público, remuneração e gestão do pessoal da função pública, e o Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro, que definiu o regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública.

6.1. Do Decreto-Lei nº 184/89 interessa-nos destacar o seu artigo 4º ("deontologia do serviço público" (16) e, sobretudo, o artigo 12º ("Princípio da exclusividade de funções"), do seguinte teor:

“1. O exercício de funções públicas é norteado pelo princípio da exclusividade.

2. Não é permitida a acumulação de cargos ou lugares na Administração Pública, salvo, quando devidamente fundamentada em motivo de interesse público, nas seguintes situações:

a) Inerência de funções;

b) Actividades de carácter ocasional que possam ser consideradas como complemento da actividade principal;

c) Actividades docentes em estabelecimentos de ensino cujo horário seja compatível com o exercício dos cargos.

3. O exercício de funções na Administração Pública é incompatível com o exercício de quaisquer outras actividades que:

a) Sejam consideradas incompatíveis por lei;

b) Tenham um horário total ou parcialmente coincidente com o do exercício da função pública;

c) Sejam susceptíveis de comprometer a imparcialidade exigida pelo interesse público no exercício de funções públicas.

4. A acumulação de cargos ou lugares na Administração Pública bem como o exercício de outras actividades pelos funcionários e agentes do Estado dependem de autorização, nos termos da lei".

Todavia, se bem interpretamos as normas do preceito transcrito, elas não implicavam alteração da doutrina que este Conselho tem vindo a firmar.

Na verdade, o nº 1 limita-se a concretizar o nº 1 do artigo 269º da Constituição da República, enquanto os nºs 2 e 3 explicitam e desenvolvem, respectivamente, os nºs 4 e 5 do mesmo normativo constitucional; por sua vez, o nº 4 remete para a lei a (eventual) necessidade de autorização.

6.2. Outrotanto já não sucede, porém, com o Decreto-Lei nº 427/89, cujo artigo 31º exige, em dados termos (nºs 4 e 5), autorização para a acumulação de funções ou cargos públicos - acumulação só permitida "quando devidamente fundamentada em motivo de interesse público e no disposto nos números seguintes" (nº 1).

No que especialmente concerne à "acumulação de funções privadas" - aspecto que aqui nos interessa destacar -, dispõe o artigo 32º:

"1 - O exercício em acumulação de actividades privadas carece de autorização prévia do membro do Governo competente, a qual pode ser delegada no dirigente máximo do serviço.

2 - O disposto no nº 1 não abrange a criação artística e literária e a realização de conferências, palestras, acções de formação de curta duração e outras actividades de idêntica natureza.

3 - A autorização referida no nº 1 só pode ser concedida se se verificaram as seguintes condições:

a) Se a actividade a acumular não for legalmente considerada incompatível;

b) Se os horários a praticar não forem total ou parcialmente coincidentes;

c) Se não ficarem comprometidas a isenção e a imparcialidade do funcionário ou agente no desempenho de funções;

d) Se não houver prejuízo para o interesse público e para os direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.

4 - A recusa de autorização para o desempenho de funções públicas em acumulação com actividades privadas carece de fundamentação, nos termos gerais".

Resulta claramente do preceito transcrito que o exercício em acumulação de actividades privadas passou a depender de autorização prévia, salvo o disposto no nº 2, autorização que só pode ser concedida se se verificarem as condições enunciadas no nº 3 do mesmo preceito.

Ou seja: O desempenho contemporâneo de um cargo ou emprego público e de qualquer actividade privada só será possível em termos da sua conciliação com o interesse público, a apreciar face ao estatuído no referido nº 3 do artigo 32º, assim se permitindo ao respectivo Ministro assegurar-se de que aquele desempenho não afecta a isenção, independência, dignidade ou eficiência com que o agente da Administração exerce o seu cargo e concluir ou não pela inocuidade desse desempenho em relação à função pública (17).


Como assim, há que reapreciar a doutrina deste Conselho Consultivo que, nesta parte, vinha concluindo - face aos textos legais então em vigor - que não existia regra geral, válida para todos os funcionários e agentes da Administração, que fizesse depender de autorização ministerial ou do superior hierárquico o exercício de empregos ou cargos públicos e o de actividades privadas.

Perante o actual quadro legal, impõe-se, na verdade, concluir que se voltou, de algum modo, ao sistema do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis e do Estado de 1943, podendo, pois, de novo afirmar-se que, para além dos casos de incompatibilidade expressamente previstos e regulados pela lei, há sempre incompatibilidade relativa entre o desempenho de um emprego ou cargo público e qualquer outra actividade (salvo o disposto no nº 2 do referido artigo 32º), dependendo então o exercício desta última de autorização do membro do Governo competente.


7

Estão coligidos os elementos que nos permitem encontrar a solução para a questão submetida à nossa apreciação.

7.1. Demonstrámos que para a acumulação de um cargo ou emprego público com um emprego ou actividade privada a regra é a permissão e a excepção a proibição ou, porventura melhor, só existe incompatibilidade entre o exercício de empregos ou cargos públicos e o de actividades privadas guando a lei expressamente o determinar.

Quer dizer: um agente da Administração, uma vez reunidas as condições definidas nas várias alíneas do nº 3 do artigo 32º do Decreto-Lei nº 427/89, pode exercer, a par do seu cargo, qualquer outra actividade ou emprego privados.

Por outras palavras: funcionando a teoria das incompatibilidades como limite à matéria das acumulações, a acumulação (no caso, entre a função pública e a actividade privada) será permitida na falta de disposição legal que defina expressamente qualquer incompatibilidade entre o seu exercício (sem esquecer, todavia, o que se dispõe nas referidas alíneas b) a d) do artigo 32º do Decreto-Lei nº 427/89).

Sendo assim, o caminho a seguir é averiguar da existência ou não de disposição legal que expressamente defina uma incompatibilidade entre as funções de engenheiro electrotécnico da DGEMN e a actividade de técnico responsável pela exploração de instalações eléctricas de que a Assembleia da República é proprietária.

7.2. Como vimos (pontos 3.2. e 3.4.), a Assessoria Jurídica da DGEMN entende que se verifica a incompatibilidade prevista no artigo 1º, nº 1, alínea a), do Decreto-Lei nº 370/83 e ainda a que estabelece o nº 2 do artigo 119º do Regime de Pessoal aprovado pelo Decreto-Lei nº 183/80, no que é acompanhada pelo Auditor Jurídico do MOPTC (cfr. ponto 3.7.).

Diferente entendimento foi sustentado por um consultor da Auditoria Jurídica (ponto 3.6.), para quem o Decreto-Lei nº 370/83 não é aplicável à situação em causa, não se verificando também a apontada incompatibilidade do artigo 119º, nº 2.

7.3. O Decreto-Lei nº 370/83 "clarifica e reforça as garantias de isenção e imparcialidade dos titulares de órgãos da administração central, regional e local, de institutos e de empresas públicas, condensando e clarificando normas hoje dispersas e suprindo a falta de outras" (nos termos do respectivo sumário no Diário da República), visando "concretizar o princípio da imparcialidade na acção da Administração Pública", assim preenchendo "um vazio no ordenamento jurídico-administrativo, dando cumprimento nomeadamente ao nº 2 do artigo 266º da Constituição da República", fazendo "parte do conjunto normativo destinado ao incremento da luta contra práticas impróprias por parte de entidades públicas" (do respectivo preâmbulo) (18) .

Como assim, definem-se no artigo 1º "casos de impedimento" estabelecendo-se no nº 1 que "nenhum titular de órgão da administração central, regional e local ou dos institutos ou empresas públicas pode intervir em processo administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado.
- quando nele tenha interesse, por si, como representante ou como gestor de negócios de outra pessoa (alínea a»;

- quando tenha intervindo como perito ou mandatários ou haja dado parecer sobre questão a resolver (alínea d» (19)

O artigo 2º disciplina a arguição e declaração do impedimento, devendo o titular do órgão "suspender a sua actividade no processo" logo que faça a comunicação a que se refere o nº 1 do artigo 2º ou tenha conhecimento do requerimento a que se refere o nº 2 do mesmo artigo (artigo 3º); declarado o impedimento do titular do órgão, será o mesmo substituído no processo pelo respectivo substituto legal, salvo se o superior hierárquico daquele resolver avocar a questão (artigo 4º, nº 1).

Os artigos 5º a 7º referem-se à escusa e suspeição, o artigo 8º ressalva a existência de lei especial, o artigo 9º estabelece a sanção para os actos ou contratos em que tiverem intervindo titulares de órgão impedido e, finalmente, o artigo 10º, define o que são "interessados no procedimento administrativo".

7.3.1. Afigura-se que do exposto resulta, com alguma clareza, que na previsão do referido texto legal se não enquadra a situação que nos ocupa, em que os funcionários da DGEMN são os próprios outorgantes no contrato de prestação de serviços a celebrar com a Assembleia da República (situação que se não confunde com a proibição de intervenção cominada no artigo 1º do diploma em causa)

Aliás, interessará considerar que na tese da Assessoria Jurídica estaríamos perante uma "incompatibilidade" genérica (ou de ordem geral) e absoluta, o que, numa certa perspectiva, não deixaria de contrariar a conclusão reiteradamente sustentada na matéria por este Conselho Consultivo (mesmo em pareceres emitidos posteriormente à publicação do Decreto-Lei nº 370/83 - cfr. pareceres nºs 61/84, 104/86, 45/87 e 100/87).

7.4. E verificar-se-á a incompatibilidade prevista no artigo 119º, nº 2, do "Regime de Pessoal dos Serviços do Ministério da Habitação e Obras Públicas" aprovado pelo Decreto-Lei nº 183/80 (20) ?

Recorde-se o seu conteúdo:

"O exercício de qualquer actividade no âmbito do MHOP é incompatível com a ingerência directa ou indirecta nas obras e fornecimentos que se realizam nos respectivos organismos".



7.4.1. Segundo o consultor jurídico da Auditoria, esta norma destina-se a todos aqueles que, pertencendo ao MOPTC, tenham ingerência nas obras e fornecimentos a realizar nos respectivos organismos daquele ministério.

Diferentemente, para o Auditor Jurídico ela reporta-se às entidades e às obras não (só) dentro ou no interior do MOPTC mas antes àquelas que são da sua competência, ainda que respeitem a departamentos ou organismos não integrados ou dependentes daquele ministério.

Por seu turno a Assessoria Jurídica entende que do exercício normal das funções de técnico responsável pela exploração das instalações eléctricas dos edifícios em causa pode resultar ingerência indirecta nas obras ali efectuadas ou a efectuar pela DGEMN.

Em sentido contrário se manifestou o Director-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais que logo considerou que aquela actividade não constitui ingerência nas obras ou fornecimentos a cargo da Direcção (despacho de 16/5/89, exarado na informação nº 8/89 da Assessoria Jurídica).

7.4.2. Importa tomar posição sobre a questão que ora nos ocupa.

À DGEMN - "organismo executivo do MHOP", segundo o artigo 1º, nº 1, do Decreto-Lei nº 204/80, de 28 de Junho (Lei Orgânica da DGEMN), e "serviço operativo" do MOPTC, nos termos do artigo 3º, nº 4, do Decreto-Lei nº 270/86, de 3 de Setembro (Lei Orgânica do MOPT) - incumbe promover a realização de obras, nomeadamente nos edifícios do património do sector público do Estado e nos imóveis classificados (cfr. artigos 1º e 2º do citado Decreto-Lei nº 204/80).

No exercício das suas atribuições, a DGEMN pode, pois, vir a realizar obras nos referidos edifícios da Assembleia da República, nomeadamente no domínio das respectivas instalações eléctricas.

Assim sendo, não está excluída a possibilidade de engenheiros electrotécnicos do quadro da DGEMN virem a intervir na realização dessas obras, no exercício das suas funções e enquanto funcionários daquela Direcção-Geral.

Todavia, se bem pensamos, para saber se a situação em apreço é ou não subsumível à norma do referido nº 2 do artigo 119º, torna-se necessário determinar se a actividade a que os engenheiros electrotécnicos se obrigam, nos termos de um contrato de prestação de serviços a celebrar ao abrigo do Decreto Regulamentar nº 31/83, de 18 de Abril, corresponde ou não, em concreto, a funções que exerçam ou venham a exercer no âmbito do respectivo conteúdo funcional, na veste de funcionários do quadro da DGEMN.

Assim sendo, afigura-se que releva de matéria de facto a questão de saber se do exercício normal das funções de técnico responsável pela exploração das instalações eléctricas nos edifícios em causa pode ou não resultar ingerência - directa ou indirecta - nas obras e fornecimentos que a DGEMN, no exercício das suas atribuições, aí venha ou possa vir a realizar, e, consequentemente, concluir se existe ou não a incompatibilidade definida no citado artigo 119º, nº 2.

8

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1ª. Só existe incompatibilidade entre o exercício de empregos ou cargos públicos e o de actividades privadas quando a lei o determinar.

2ª. Salvo o disposto no nº 2 do artigo 32º do Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro, o exercício em acumulação, de actividades privadas carece de autorização prévia do membro do Governo competente, a qual só pode ser concedida se se verificarem as condições enunciadas nas várias alíneas do nº 3 do mesmo preceito;

3ª. Releva de matéria de facto a questão de saber se do exercício normal das funções de técnico responsável pela exploração das instalações eléctricas do Palácio de S. Bento e do edifício da Assembleia da República sito em Lisboa, na Rua de S. Bento, nºs 148-150 - actividade a ser exercida ao abrigo de um contrato de prestação de serviços, nos termos do Decreto-Regulamentar nº 31/83, de 18 de Abril - pode ou não resultar ingerência, directa ou indirecta, nas obras e fornecimentos que a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, no exercício das suas atribuições, aí venha ou possa vir a realizar, e, consequentemente, concluir pela existência ou não da incompatibilidade definida no artigo 119º, nº 2, do "Regime de Pessoal dos Serviços do Ministério da Habitação e Obras Públicas", aprovado pelo Decreto-Lei nº 183/80, de 4 de Junho;


4ª. Se se concluir que aquela actividade de técnico responsável pela exploração das instalações eléctricas não é legalmente incompatível, o seu exercício carecerá sempre de autorização prévia do membro do Governo competente, a qual só pode ser concedida se se verificarem as condições enuncia das nas alíneas b), c) e d) do nº 3 do artigo 32º do Decreto-Lei nº 427/89.



(1) As instalações eléctricas de serviço particular referidas no Estatuto são as definidas no artigo 7º do Regulamento de Licenças para Instalações Eléctricas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 26 852, de 30 de Junho de 1936, e alterado pelo artigo 18º do Decreto-Lei nº 517/80, de 31 de Outubro (artigo 2º).
Todavia, enquanto não for regulamentada a actividade de técnico responsável por instalações eléctricas de serviço público, o exercício dessa actividade relativamente aos técnicos que não façam parte dos quadros de pessoal do respectivo distribuidor será regulado, na parte aplicável, pelo presente Estatuto (artigo 3º).

(2) Os artigos 4º, 5º e 6º - compreendidos no capítulo II, subordinado à epígrafe "competência dos técnicos responsáveis" - referem-se, respectivamente, aos técnicos responsáveis pelo projecto, pela execução e pela exploração.

(3) Diploma rectificado no Diário da República, I Série, nº 161, de 15/7/80, e nº 183, de 9/8/80.

(4) Cfr. rectificação publicada no Diário da República, I Série, nº 211, de 12/9/80.

(5) Cfr. MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, 9ª edição, tomo II, págs. 697 e segs..

(6) JOÃO ALFAIA, Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público, 1º volume, 1985, págs. 171 e segs..

(7) A 1ª revisão constitucional (cfr. artigo 269º) deixou intocados os nºs 4 e 5 deste preceito e as alterações introduzidas no nº 1 foram, sobretudo, de ordem formal; na 2ª revisão constitucional o artigo 269º não sofreu alteração.

(8) Publicado no Diário da República, II Série, nº 95, de 24/4/79, e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 288, pág. 176.

(9) Cfr. VICTOR SILVERA e SERGE SALON, La Fonction Publique et ses problèmes actuels, págs. 19, 107, 111 e segs.; FRANÇOIS GAZIER, La Fonction Publique dans le monde, págs. 150 e segs.; ROBERT CATHERINE, Le fonctionnaire français, pág. 92; ALAIN PLANTEY, Traité Pratique de la Fonction Publique, 3ª ed., Paris, 1971, tomo I, pág. 402; ANDRÉ DE LAUBADÉRE, Manuel de Droit Administratif, 6ª ed., Paris, 1960, pág. 268.

(10) Ob. cit., pág. 113.

(11) Publicado no Diário da República, II Série, nº 124, de 12 de Setembro de 1981, e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 309, pág. 54.

(12) Passamos a seguir o parecer nº 45/87, no Diário da República, II Série, nº 289, de 16/12/88.
Cfr., também, os pareceres nº 28/85, no diário da República, II Série, nº 270, de 23/11/85, nº 104/86, de 17/12/87, e nº 100/87, no Diário da República, II Série, nº 132, de 7/9/88.

(13) Publicado no Diário da República, II Série, nº 163, de 18 de Julho de 1985, e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 346, pág. 54.

(14) O Parecer não deixa de distinguir. Não é com o despacho que surge a infracção. Esta verifica-se antes e será, portanto, punível, embora com pena menos grave que a de inactividade, ficando esta reservada para os casos em que, à violação dos deveres funcionais pelo exercício da actividade privada reconhecida como incompatível, acresça o desrespeito pela injunção contida no despacho.

(15) Delineado o percurso doutrinal deste corpo consultivo, terá interesse conhecer as situações concretas que determinaram a sua audição em alguns dos referidos pareceres.
Assim, no parecer nº 251/78 concluiu-se que "o Senhor Secretário de Estado da Habitação podia incumbir e remunerar um funcionário do Fundo de Fomento de Habitação pela realização de um estudo técnico, contanto que este não correspondesse ao exercício do cargo, fosse executado fora do horário regulamentar do serviço e nesse sentido apontasse o interesse público".
No parecer nº 104/86 firmou-se a conclusão de que "não existe disposição legal que estabeleça uma incompatibilidade entre o exercício das funções de técnico superior do Instituto Nacional de Investigação das Pescas e o de actividades privadas no domínio da aquacultura, ou que faça depender a acumulação de autorização
Finalmente no parecer nº 100/87 extraiu-se a seguinte conclusão: “não existe, em princípio, incompatibilidade entre a acumulação das funções de médico veterinário municipal com as de director técnico administrativo de matadouros oficiais e entre estas funções e a actividade privada, desde que seja possível o cumprimento dos deveres gerais e específicos daqueles cargos públicos".

(16) Cfr. artigo 266º da Constituição da República.

(17) Refira-se que, por força do disposto no artigo 42º, os funcionários e agentes que se encontrem a exercer em acumulação funções públicas ou privadas sem a autorização prevista nos artigos 31º e 32º devem solicitá-la no prazo de 30 dias a contar da entrada em vigor do diploma em apreço.

(18) Embora numa primeira aproximação pudesse entender-se que o diploma se dirige aos titulares de órgãos, pensamos, tal como a Assessoria Jurídica, que ele se aplica também aos restantes funcionários (atente-se no disposto nos nºs 1 - "qualquer agente ou empregado" e 3 -"agente" - do artigo 2º).
Sobre o Decreto-Lei nº 370/83, veja-se o parecer nº 19/89, publicado no Diário da República, II Série, nº 132, de 9/6/89.

(19) Esta alínea d) é referida apenas no parecer do Auditor Jurídico.

(20) O nº 1 deste artigo 119º estabelece:
"O pessoal não poderá desempenhar funções alheias aos serviços, nem exercer, por si ou por interposta pessoa, qualquer ramo de comércio e indústria sem obter autorização do Ministro da Habitação e Obras Públicas".
Não obstante esta norma imediatamente preceder o nº 2 que é invocado nas várias informações e pareceres, nenhuma destas informações e pareceres lhe faz qualquer alusão, certamente por se considerar que este ponto não suscita dúvidas, não se compreendendo, pois, no âmbito da consulta.
Anotações
Legislação: 
DRGU 31/83 DE 1983/04/18 ART2 ART12 ART15 ART23.
DL 183/80 DE 1980/06/04 ART119 N2.
DL 204/80 DE 1980/06/28 ART1 ART2.
DL 370/83 DE 1983/10/06 ART1 ART2.
CONST76 ART266 ART269.
EDF43 ART23 PAR3 N2.
EDF79 ART24 N2 D.
EDF82 ART24 N1 C ART25 N2 D.
DL 184/89 DE 1989/06/02 ART4.
DL 427/89 DE 1989/12/07 ART31 AT32.
DL 270/86 DE 1986/09/03 ART3 N4.
Referências Complementares: 
DIR ADM * FUNÇÃO PUBL.
Divulgação
Número: 
DR127
Data: 
04-06-1991
Página: 
31
13 + 5 =
Por favor indique a resposta à questão apresentada para descarregar o pdf