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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
71/1990, de 27.09.1990
Data do Parecer: 
27-09-1990
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Defesa Nacional
Relator: 
PADRÃO GONÇALVES
Descritores e Conclusões
Descritores: 
DEFICIENTE DAS FORÇAS ARMADAS
INCAPACIDADE GERAL DE GANHO
Conclusões: 
1 - O exercicio de instrução militar com uso de minas anti-carro constitui actividade com risco agravado enquadravel no n 4 do artigo 2, referido ao n 2 do artigo 1 do Decreto-Lei n 43/76, de 20 de Janeiro;
2 - A qualificação como deficiente das Forças Armadas e a aplicação do respectivo regime, segundo o Decreto-Lei n 43/76, exige um grau minimo de incapacidade geral de ganho de 30%;
3 - O acidente que afectou o soldado(...) ocorreu em actividade militar correspondente a descrita na conclusão 1, mas, como so lhe determinou um grau de incapacidade de 15%, não devera aquele militar ser qualificado deficiente das Forças Armadas.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Secretário de Estado Adjunto
do Ministro da Defesa Nacional,

Excelência:

1.

Determinou V. Ex.a. a remessa a esta Procuradoria- -Geral da República do processo relativo ao soldado NM (...), (...), a fim de ser submetido ao parecer previsto no nº 4 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro.
Cumpre emiti-lo.

2.

Da consulta do auto de averiguações por acidente em serviço, oportunamente instaurado, e demais documentação junta, extraem-se, com interesse, os seguintes factos:
O acidente de que resultou a incapacidade do soldado David Costa ocorreu no dia 8 de Março de 1989, cerca das 15H00, durante a instrução da especialidade de sapadores do 1º T/89, ministrada pelo 2º Sarg. de Engª Nóbrega;
O acidente ocorreu pela deflagração de uma mina anti-carro m/974-2, real (1, de origem espanhola, sobre a qual estava a ser ministrada a instrução;
A deflagração deu-se pelo facto de o 2º Sarg. Nóbrega, durante a instrução, ao pretender convencer os instruendos de que a mina não rebentava com o peso de um homem, visto só rebentar com uma pressão superior a 300 Kg., saltou sobre a mesma, já espoletada e já armada;
Porém, contrariamente a tal indicação, esse tipo de minas explode a uma pressão entre 150 e 200 Kg., o que veio a acontecer;
Da deflagração resultaram ferimentos graves para o instrutor - dos quais veio a falecer -, e ferimentos menos graves para todos os soldados recrutas instruendos, incluindo o soldado recruta David Costa;
Presente à JHI/HMR-1, em 27 de Outubro de 1989, foi o soldado David Costa considerado incapaz de todo o serviço militar, com 15% de desvalorização, por acuidade visual diminuída tendo a Comissão Permanente para Informação e Pareceres da Direcção do Serviço de Saúde do Estado Maior do Exército emitido parecer, em 7 de Maio seguinte, no sentido de que o motivo pelo qual a JHI/HMR-1 considerou a incapacidade do soldado (...) resultou das lesões sofridas no acidente ocorrido em 8 de Março de 1989;
Por despacho de 5 de Junho último, do Brigadeiro Director do Serviço de Pessoal, por subdelegação do General Ajudante-General, após delegação recebida por este do General Chefe do Estado-Maior do Exército, foi homologado o referido parecer da CPIP/DSS, tendo ainda o acidente em causa sido considerado como ocorrido em serviço e por motivo do seu desempenho;
Por despacho de 19 de Dezembro de 1989 do Comandante da RMN fora o acidente em questão considerado resultante de actividade militar com risco agravado, equiparado às situações constantes do nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 43/76, mas, porque tal qualificação cabe ao Ministro da Defesa Nacional, após parecer desta Procuradoria-Geral da República, foi o processo remetido para tal fim.

3.

Dispõe o nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 43/76:
"2. É considerado deficiente das forças armadas portuguesas o cidadão que:
No cumprimento do serviço militar e na defesa dos interesses da Pátria adquiriu uma diminuição na capacidade geral de ganho;
quando em resultado de acidente ocorrido:
Em serviço de campanha ou em circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha, ou como prisioneiro de guerra;
Na manutenção da ordem pública;
Na prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública; ou
No exercício das suas funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores;
vem a sofrer, mesmo "a posteriori", uma diminuição permanente, causada por lesão ou doença, adquirida ou agravada, consistindo em:
Perda anatómica; ou
Prejuízo ou perda de qualquer órgão ou função;
Tendo sido, em consequência, declarado, nos termos da legislação em vigor:
Apto para o desempenho de cargos ou funções que dispensem plena validez; ou
Incapaz do serviço activo; ou
Incapaz de todo o serviço militar".
Acrescenta-se no artigo 2º, nº 1, alínea b), do mesmo diploma legal:
"1. Para efeitos da definição constante do nº 2 do artigo 1º deste decreto-lei, considera-se que:
a) (...)
b) É fixado em 30% o grau de incapacidade geral de ganho mínimo para o efeito da definição de deficiente das forças armadas e aplicação do presente decreto-lei".

E esclarecem os nºs 2, 3 e 4 do mesmo artigo 2º.
"2. O "serviço de campanha ou campanha" tem lugar no teatro de operações onde se verifiquem operações de guerra, de guerrilha ou de contraguerrilha e envolve as acções directas do inimigo, os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade terrestre, naval ou área de natureza operacional.
"3. As "circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha" têm lugar no teatro de operações onde ocorram operações de guerra, guerrilha ou de contraguerrilha e envolvem os eventos directamente relacionados com a actividade operacional que pelas suas características implicam perigo em circunstâncias de contacto possível com o inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade de natureza operacional ou em actividade directamente relacionada, que, pelas suas características próprias, possam implicar perigosidade.
4. "O exercício de funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores", engloba aqueles casos especiais, aí não previstos, que, pela sua índole, considerado o quadro de causalidade, circunstâncias e agentes em que se desenrole, seja identificável com o espírito desta lei (redacção rectificada no Diário da República, I Série, 2º Suplemento, de 26/6/76).
A qualificação destes casos compete ao Ministro da Defesa Nacional, após parecer da Procuradoria-Geral da República".

4.

Este corpo consultivo tem interpretado as disposições conjugadas dos artigos 1º, nº 2, e 2º, nº 4, do Decreto-Lei nº 43/76 no sentido de que o regime jurídico dos deficientes das Forças Armadas, para além das situações expressamente contempladas no primeiro preceito - de serviço de campanha ou em circunstâncias com ela relacionadas, de prisioneiro de guerra, de manutenção da ordem pública e de prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública -, só é aplicável aos casos que, "pelo seu circunstancialismo, justifiquem uma equiparação, em termos objectivos, àquelas situações de facto, dado corresponderem a actividades próprias da função militar ou inerentes à defesa de altos interesses públicos, importando sujeição a um risco que excedendo significativamente o que é próprio do comum das actividades castrenses, se mostra agravado em termos de se poder equiparar ao que caracteriza aquelas situações paradigmáticas".
"Assim implica esse regime não só que o acidente tenha ocorrido em serviço, mas também que a actividade militar que o gera envolva, por sua natureza, objectiva e necessariamente, um risco agravado em termos de poder equiparar-se ao que decorre em situações de campanha ou a elas por lei igualadas" .
De harmonia com tal entendimento o Conselho Consultivo tem qualificado, sem divergências, como actividade militar com risco agravado, equiparável nomeadamente à situação tipificada no primeiro "item" do nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 43/76, a realização de exercícios e actividades militares que impliquem a utilização de fogos reais e o manejo ou rebentamento de explosivos, nomeadamente granadas e minas .
O risco agravado derivará, em regra, da probabilidade de o militar ser atingido não só pelos estilhaços provenientes da explosão - estilhaços do material em contacto directo com o explosivo como daquele que é de seguida impulsionado - como pelo efeito de "sopro" e até do "som" do rebentamento, pondo em perigo a sua integridade física e a saúde.

5.

Subsumindo ao enquadramento jurídico a matéria de facto apurada, atrás relatada, e excluídas as hipóteses de aplicação directa do nº 2 do artigo 1º, há que ponderar se ela pode ser valorada como consubstanciando uma actividade a que é inerente um risco agravado, idóneo para a equiparar a qualquer das situações contempladas naquele normativo.
A resposta é manifestamente afirmativa.
De facto, o soldado David Costa, aquando do acidente, estava integrado num grupo de instruendos que procediam a uma sessão de instrução, devidamente programada e autorizada, com a finalidade de os treinar para a utilização de explosivos (no caso minas anti-carro), numa antevisão concreta de situações típicas da actividade castrense. Era necessário o contacto directo com tais explosivos, o seu manejo - visando, especialmente, a sua detecção e neutralização -, e não se assinala da sua parte qualquer violação de regras de segurança , configurando-se, pois, como se tem ponderado em casos afins , uma situação de risco agravado da qual adveio o acidente e as consequentes lesões que lhe provocaram a constatada incapacidade.

6.

Mas o regime e qualificação como deficiente das forças armadas pressupõe, conforme resulta do artigo 2º, nº 1, alínea b), do Decreto-Lei nº 43/76, um grau mínimo de incapacidade geral de ganho, resultante do acidente, de 30%.
Visou-se com a fixação da referida percentagem a equiparação dos deficientes das Forças Armadas aos acidentados laborais, "terminando com a inconsequência do Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio, que, não fixando limite àquela diminuição de capacidade, permitia a qualificação de militares portadores de incapacidades insignificantes, em contradição com os objectivos fundamentais do diploma" .
Ora, como o soldado (...)apenas sofreu diminuição de capacidade geral de ganho de 15%, certo é não dever ser qualificado deficiente das Forças Armadas nem beneficiar da aplicação do respectivo regime .


CONCLUSÕES:
7.

Termos em que se conclui:
1º - O exercício de instrução militar com uso de minas anti-carro constitui actividade com risco agravado enquadrável no nº 4 do artigo 2º, referido ao nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro;
2º - A qualificação como deficiente das Forças Armadas e a aplicação do respectivo regime, segundo o Decreto-Lei nº 43/76, exige um grau mínimo de incapacidade geral de ganho de 30%;
3º - O acidente que afectou o soldado (...) ocorreu em actividade militar correspondente à descrita na conclusão 1ª, mas, como só lhe determinou um grau de incapacidade de 15%, não deverá aquele militar ser qualificado deficiente das Forças Armadas.




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(1Segundo se refere nos autos, "a instrução estava a ser ministrada com uma mina real, por falta de material inerte e de quadros auxiliares de Instrução" (folhas 19).
Anotações
Legislação: 
DL 43/76 DE 1976/01/20 ART1 N2 ART2 N1 B N2 N3 N4.
Referências Complementares: 
DIR ADM * DEFIC FFAA.
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