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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
32/1989, de 12.07.1989
Data do Parecer: 
12-07-1989
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Defesa Nacional
Relator: 
LUCAS COELHO
Descritores e Conclusões
Descritores: 
DEFICIENTE DAS FORÇAS ARMADAS
INCAPACIDADE GERAL DE GANHO
Conclusões: 
1 - O salto para viatura (camioneta) em movimento, circulando a uma velocidade de cerca de 25 a 30 quilometros horarios, com ajuda de bordo, em exercicio de instrução realizado na parada do quartel, não caracteriza uma actividade com risco agravado equiparavel as situações previstas no n 2 do artigo 1 do Decreto-Lei n 43/76, de 20 de Janeiro;
2 - A qualificação como deficiente das Forças Armadas e a aplicação do respectivo regime, segundo o Decreto-Lei n 43/76, exige um grau minimo de incapacidade geral de ganho de 30% (artigo 2, n 1, alinea b));
3 - O acidente que em 17 de Abril de 1963 vitimou o soldado NM (...),
(...), ocorreu em actividade militar correspondente a descrita na anterior conclusão 1 e determinou-lhe um grau de incapacidade de 20%, o que impede a sua qualificação como deficiente das Forças Armadas.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional,

Excelência:

I

A fim de ser submetido a parecer deste Conselho Consultivo, nos termos do artigo 2º, nº 4, do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, dignou-se Vossa Excelência determinar o envio, à Procuradoria-Geral da República, do processo respeitante ao soldado NM (...), (...).

Cumpre emiti-lo.



II

Dos elementos juntos a esse processo colhem-se, com interesse, os factos seguintes:

1.No dia 17 de Abril de 1963, na parada da Escola de Aplicação Militar de Angola situada na cidade de Nova Lisboa, durante uma aula de instrução de Ginástica de Aplicação Militar - saltos em camioneta - o soldado (...), ao subir para o veículo, que se deslocava à velocidade de 25 a 30 km/h, apesar de içando-se com ajuda de bordo, sofreu "fractura sub-troncateriana" do fémur, porventura devido ao impulso e à contracção a que o exercício obrigava, ou mesmo a ter batido com a perna no taipal da camioneta;

2.Submetido a intervenções cirúrgicas e presente em 2 de Outubro de 1964 à JHI/HML, foi julgado "incapaz de todo o serviço militar, apto para o trabalho e para angariar meios de subsistência", estando a aludida fractura "viciosamente consolidada";

3.Por despacho de 25 de Novembro de 1964 do Comandante da Região Militar de Angola, foi o acidente considerado em serviço, vindo a JHI/HML a atribuir-lhe ainda, em 20 de Janeiro de 1970, uma "desvalorização permanente parcial de 20%;

4.Em 27 de Fevereiro de 1986, requereu (...) ao Senhor Chefe do Estado-Maior do Exército a revisão do seu processo ao abrigo dos nºs 3 e 5, alínea a), da Portaria nº 162/76, de 24 de Março, e do nº 1 da Portaria nº 114/79, de 12 de Março;

5.Organizado o processo no D.R.M. de Viseu, veio a culminar em despacho do 2º Comandante, por delegação do Comandante, da Região Militar de Coimbra, de 9 de Março de 1987, que considerou o acidente como ocorrido em serviço e por motivo do seu desempenho;

6.Presente à JHI/HMP em 29 de Dezembro de 1987, esta declarou-o incapaz de todo o serviço, com uma desvalorização de 20%, por sequelas de fractura sub-troncateriana do fémur esquerdo, e a CPIP/DSS, em 16 de Novembro de 1988, foi de parecer que tal incapacidade e desvalorização resultou das lesões sofridas no acidente de 17 de Abril de 1963.

Importa apreciar estes factos à luz do direito aplicável.


III

1.O acidente é anterior à data da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, mas foi formulado o pedido de revisão nas condições previstas pelo nº 3 da Portaria nº 162/76, de 24 de Março, na redacção do nº 1 da Portaria nº 114/79, de 12 de Março.

É-lhe, pois, hipoteticamente aplicável aquele Decreto-Lei.

2.Dispõe o nº 2 do seu artigo 1º:

"2.É considerado deficiente das forças armadas portuguesas o cidadão que:

No cumprimento do serviço militar e na defesa dos interesses da Pátria adquiriu uma diminuição na capacidade geral de ganho;

quando em resultado de acidente ocorrido:

Em serviço de campanha ou em circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha, ou como prisioneiro de guerra;

Na manutenção da ordem pública;

Na prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública; ou

No exercício das suas funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores;

vem a sofrer, mesmo a posteriori, uma diminuição permanente, causada por lesão ou doença adquirida ou agravada, consistindo em:

Perda anatómica; ou

Prejuízo ou perda de qualquer órgão ou função;

tendo sido, em consequência, declarado, nos termos da legislação em vigor:

Apto para o desempenho de cargos ou funções que dispensem plena validez; ou

Incapaz do serviço activo; ou

Incapaz de todo o serviço militar".

E o artigo 2º, nº 1, alínea b):

"1.Para efeitos de definição constante do nº 2 do artigo 1º deste decreto-lei, considera-se que:

a)(...)

b)É fixado em 30% o grau de incapacidade geral de ganho mínimo para o efeito da definição de deficiente das forças armadas e aplicação do presente decreto-lei".

Os nºs 2, 3 e 4 do mesmo artigo 2º esclarecem, por seu turno:

"2.O "serviço de campanha ou campanha" tem lugar no teatro de operações onde se verifiquem operações de guerra, de guerrilha ou de contraguerrilha e envolve as acções directas do inimigo, os eventos decorrentes de actividade indirecta de inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade terrestre, naval ou aérea de natureza operacional.

"3.As "circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha" têm lugar no teatro de operações onde ocorram operações de guerra, guerrilha ou de contraguerrilha e envolvem os eventos directamente relacionados com a actividade operacional que pelas suas características impliquem perigo em circunstâncias de contacto possível com o inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade de natureza operacional, ou em actividade directamente relacionada, que pelas suas características próprias possam implicar perigosidade.

"4.O exercício de funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores", engloba aqueles casos especiais, aí não previstos que, pela sua índole, considerado o quadro de causalidade, circunstâncias e agentes em que se desenrole, seja identificável com o espírito desta lei.

A qualificação destes casos compete ao Ministro da Defesa Nacional, após parecer da Procuradoria-Geral da República".



IV

1.O condicionalismo definido nos nºs 2 e 3 do artigo 2º, do Decreto-Lei nº 43/76, imediatamente afasta qualquer possibilidade de relacionar directamente a factualidade antes descrita com o serviço de campanha (1 .

Resta o nº 4 do aludido normativo.

2.Este corpo consultivo tem interpretado as disposições conjugadas dos artigos 1º, nº 2, e 2º, nº 4, do mesmo diploma no sentido de que o regime jurídico dos deficientes das Forças Armadas, para além das situações expressamente contempladas no primeiro preceito - de serviço de campanha ou em circunstâncias com ela directamente relacionadas, de prisioneiro de guerra, de manutenção da ordem pública e de prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública -, só é aplicável aos casos que, "pelo seu circunstancialismo, justifiquem uma equiparação, em termos objectivos, àquelas situações de facto, dado corresponderem a actividades próprias da função militar ou inerentes à defesa de altos interesses públicos, importando sujeição a um risco que excedendo significativamente o que é próprio do comum das actividades castrenses, se mostra agravado em termos de se poder equiparar ao que caracteriza aquelas situações paradigmáticas.

"Assim implica esse regime não só que o acidente tenha ocorrido em serviço, mas também que a actividade militar que o gera envolva, por sua natureza, objectiva e necessariamente, um risco agravado em termos de poder equiparar-se ao que decorre em situações de campanha ou a elas por lei igualadas" (2 .


3.O exercício em que o requerente sofreu o acidente consistia no adestramento de saltos de e para viatura em movimento.

Na circunstância, a viatura seguia a uma velocidade
entre 25 e 30 quilómetros horários e o instruendo procedia ao salto para bordo, com ajuda do interior.

Poderá considerar-se que essa actividade envolve um
risco agravado susceptível de a equiparar a situações de campanha ou com estas directamente relacionadas, de harmonia com o disposto no artigo 2º, nº 4, do Decreto-Lei nº 43/76?

No parecer nº 35/78 deste Conselho (3concluiu-se que
o "salto de viatura em movimento, deslocando-se a velocidade uniforme de 25 km/h, realizado em exercício de instrução, não caracteriza uma actividade com risco agravado equiparável às situações previstas no nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro".

Ponderava-se, nomeadamente, apelando para anterior parecer (4 : "a preparação militar não se limita ao ensino e treino de armas. Importa, além disso, o desenvolvimento de qualidades pessoais, como sejam a coragem, a autodisciplina, a serenidade perante o risco. Para o efeito há que executar exercícios, individuais e em conjunto, que fomentem essas qualidades. É necessário, para uma correcta preparação, obrigar o instruendo a enfrentar situações de risco".

Acrescentando-se, na perspectiva específica do acidente então em análise, que "o salto de viatura em movimento nas circunstâncias descritas não envolve riscos superiores a exercícios de ginástica, como o salto de plinto em comprimento que já se entendeu não ser enquadrável naquele preceito legal" (5 .

A doutrina exposta foi retomada no parecer nº 14/82 (6, possibilitando a conclusão seguinte:

"O salto de viatura em movimento, circulando a uma velocidade de cerca de 20 a 30 km/h, numa estrada de terra batida, realizado em exercício de instrução, não caracteriza uma actividade com risco agravado equiparável às situações previstas no nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro."

Não se divisam razões válidas para alterar o entendimento deste corpo consultivo, aqui aplicável até, dir-se-ia, por excesso.


V

O regime e a qualificação como deficiente das Forças Armadas, segundo o Decreto-Lei nº 43/76, supõe, aliás, um grau mínimo de incapacidade geral de ganho, em resultado do acidente, de 30% (artigo 2º, nº 1, alínea b).

Visou-se, com a fixação desta percentagem, equiparar os deficientes das Forças Armadas aos acidentados do mundo laboral, "terminando com a inconsequência do Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio, que, não fixando limite mínimo àquela diminuição de capacidade, permitia a qualificação de militares portadores de incapacidades insignificantes, em contradição com os objectivos fundamentais do diploma" (7.

Ora o requerente (...) sofreu uma diminuição da capacidade geral de ganho cifrada em 20%, inferior ao mínimo legal, pelo que, também destoutra óptica, não pode ser qualificado deficiente das Forças Armadas - estando, de resto, excluída uma "qualificação automática" como tal (8 - , nem beneficiar da aplicação do respectivo regime (9.

Conclusão:


VI


Do exposto se conclui:

1ª.O salto para viatura (camioneta) em movimento, circulando a uma velocidade de cerca de 25 a 30 quilómetros horários, com ajuda de bordo, em exercício de instrução realizado na parada do quartel, não caracteriza uma actividade com risco agravado equiparável às situações previstas no nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro;

2ª.A qualificação como deficiente das Forças Armadas e a aplicação do respectivo regime, segundo o Decreto-Lei nº 43/76, exige um grau mínimo de incapacidade geral de ganho de 30% (artigo 2º, nº 1, alínea b));

3ª.O acidente que em 17 de Abril de 1963 vitimou o soldado NM (...), (...), ocorreu em actividade militar correspondente à descrita na anterior conclusão 1ª e determinou-lhe um grau de incapacidade de 20%, o que impede a sua qualificação como deficiente das Forças Armadas.





(1Cfr. sobre a caracterização de "serviço de campanha", v. g., o parecer nº 145/79, de 7 de Fevereiro de 1980, Diário da República, II Série, nº 254, de 3 de Novembro de 1980, e "Boletim do Ministério da Justiça", nº 301, págs. 187 e segs.

(2Dos pareceres nº 55/87, de 29 de Julho de 1987, e nº 80/87, de 19 de Novembro de 1987, homologados por despachos de Vossa Excelência, de 12 de Agosto de 1987 e 12 de Janeiro de 1988, inéditos, reflectindo orientação uniforme desta instância consultiva, mantida nos pareceres de mais recente data.

(3Votado em sessão de 6 de Abril de 1970, homologado por despacho de 18 de Abril de 1978 do Senhor Ministro da Defesa Nacional, mas não publicado.

(4Nº 52/76, de 21 de Julho de 1976, homologado por despacho, de 16 de Agosto de 1976, do Senhor Ministro da Defesa Nacional, e publicado no "Diário da República", nº 222, de 21 de Setembro do mesmo ano, pág. 6 342.

(5Parecer nº 30/77, de 2 de Março de 1877, "Boletim do Ministério da Justiça", nº 275, pág. 62. Também os exercícios em mesa alemã foram excluídos - parecer nº 79/77, de 5 de Maio de 1977, inédito.

(6De 27 de Janeiro de 1983, inédito.
Cfr. também o recente parecer nº 42/89, votado na sessão de 8 de Junho do corrente ano, em que, todavia, o exercício de salto de viatura se apresentava rodeado de particulares condicionalismos.

(7Parecer nº 115/78, de 6 de Julho de 1978, "Diário da República", II Série, nº 244, de 23 de Outubro de 1978.

(8Cfr. sobre o tema o parecer nº 18/89, de 29 de Março de 1989.

(9No mesmo sentido, além dos pareceres citados nas anteriores notas 7 e 8, ainda os pareceres nº 207/77, de 27 de Outubro de 1977, e nº 208/77, de 3 de Novembro de 1977, homologados e não publicados; nº 51/87, de 17 de Junho de 1987, "Diário da República", II Série, nº 219, de 23 de Setembro; nº 10/88, de 23 de Junho de 1988, inédito.
Anotações
Legislação: 
DL 43/76 DE 1976/01/20 ART1 N2 ART2 N1 B N2 N3 N4.
Referências Complementares: 
DIR ADM * DEFIC FFAA.
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