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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
41/1992, de 11.02.1993
Data do Parecer: 
11-02-1993
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
PGR
Entidade: 
Procurador(a)-Geral da República
Relator: 
PADRÃO GONÇALVES
Descritores e Conclusões
Descritores: 
FUNDO DE TURISMO
INSTITUTO PÚBLICO
FUNDAÇÃO PÚBLICA
COMPANHIA DE SEGUROS
ASSEMBLEIA GERAL
PRESIDENTE
COMISSÃO DE SERVIÇO
ADVOCACIA
ACUMULAÇÃO
ACUMULAÇÃO DE CARGOS
CARGO PÚBLICO
ALTO CARGO PÚBLICO
ACTIVIDADE PRIVADA
INCOMPATIBILIDADE
PESSOAL DIRIGENTE
ESTATUTO
REMUNERAÇÃO
AUTORIZAÇÃO
MEMBRO DO GOVERNO
INSTITUTO DE PROMOÇÃO TURÍSTICA
SERVIÇO PERSONALIZADO
ICEP
Conclusões: 
1 - O regime de incompatibilidades previsto na Lei n 9/90, de 1 de Março, pretendeu contribuir para a dignificação do exercício do mandato dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, mediante a interdição de acumulação indevida de cargos e outras actividades profissionais ou de funções públicas;
2 - O cargo de Presidente da Comissão Administrativa do Fundo do Turismo é um alto cargo público, cabendo na previsão da alínea j) do n 1 do artigo 1 da Lei n 9/90, como presidente de "instituto público autónomo";
3 - O Dr. (...) titular do cargo referido na conclusão anterior, desde 10 de Fevereiro de 1989, beneficia do regime transitório fixado no n 2 do artigo 8 da Lei n 9/90, na redacção da Lei n 56/90, de 5 de Setembro, podendo exercer, cumulativamente, (mas apenas) até ao fim do respectivo mandato, as actividades subsumíveis na alínea a) do artigo 2 da Lei n 9/90, desde que permitidas pelo regime de incompatibilidades fixado pelo artigo 9 do Decreto-Lei n 323/89, de 26 de Setembro;
4 - A referida alínea a) do artigo 2 da Lei n 9/90 abrange, na sua previsão, o exercício da advocacia;
5 - Nos termos do n 3 do artigo 9 do Decreto-Lei n 323/89 o exercício da advocacia por parte do pessoal dirigente - caso do titular referido na conclusão 3 - depende de autorização pelo membro do Governo competente;
6 - O cargo de Presidente do extinto Instituto de Promoção Turística era subsumível na alínea j) do n 1 da Lei n 9/90 como "presidente de instituto público autónomo";
7 - A norma da alínea a) do artigo 2 da Lei n 9/90, bem assim do n 1 do artigo 9 do Decreto-Lei n 323/89, apenas proíbem, com as ressalvas aí previstas, a acumulação de cargos, funções ou actividades remunarados;
8 - Nos termos das disposições citadas na conclusão anterior, o Dr.
(...) podia exercer, cumulativamente, os cargos referidos nas conclusões 2 e 6, desde que um deles não fosse remunerado, como sucedia com o segundo cargo;
9 - O cargo de Presidente da Assembleia Geral da Companhia de Seguros Bonança, S. A. cabe na previsão da alínea b) do artigo 2 da Lei n 9/90, por corresponder à integração em corpo social de "segurança";
10- Não estando as situações previstas na referida alínea b) ressalvadas pelo n 2 do artigo 8 da Lei n 56/90, não pode o Dr.
(...), titular do cargo referido na conclusão 2, exercer cumulativamente o cargo referido na conclusão anterior.
Texto Integral
Texto Integral: 
SENHOR CONSELHEIRO PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA,
EXCELÊNCIA:



1.

Um assessor do Gabinete de Vossa Excelência apresentou a seguinte informação:
"1. O Senhor Dr. (...) depositou nesta Procuradoria–Geral, em 29 de Junho de 1990, a declaração de inexistência de incompatibilidades e impedimentos, nos termos do artigo 6º da Lei nº 9/90, de 1 de Março (originariamente artigo 9º), relativa ao cargo de Presidente da Comissão Administrativa do Fundo de Turismo.
"Em anexo a essa declaração enviou cópias das cartas em que solicitou, a duas sociedades, a suspensão da remuneração relativa a avença pela prestação de serviços jurídicos.

"2. Em 15 de Outubro de 1991, solicitou esta Procuradoria–Geral da República, ao referido titular, a apresentação de idêntica declaração face à titularidade do cargo de Presidente do Instituto de Promoção Turística.
"A declaração deu entrada nos serviços a 24 de Outubro de 1991.
"Dela resulta ter o Dr. (...) tomado posse em 21 de Dezembro de 1990 e ainda que desempenha as seguintes funções:
Presidente da Assembleia Geral da Companhia de Seguros Bonança, S.A. Advocacia.
"Invoca o titular, nas observações, estar abrangido pelo disposto no artigo 8º, nº 2, da Lei nº 56/90, de 5 de Setembro (x).
"No ofício de remessa da declaração o Dr. (...) informou que a mesma não foi enviada em momento anterior "[...] uma vez que o despacho que me nomeou para o exercício do cargo de presidente do Instituto de Promoção Turística ter considerado serem tais funções uma extensão das de Presidente do Fundo de Turismo e, como tal, sem remuneração".
"3.1. Da análise desta declaração foi comunicado ao titular, atento o disposto no artigo 2º, alíneas a) e b), da Lei nº 9/90, de 1 de Março, a existência de situações de incompatibilidade.
"Em causa está o exercício remunerado de outra actividade profissional e a integração em corpo social da seguradora.
"3.2. Solicitado a comunicar o que tivesse por conveniente, o Senhor Dr.(...) esclarece a sua situação nos seguintes termos:
a) Exercício remunerado da outra actividade profissional.
o exercício de advocacia já tinha lugar enquanto Presidente da Comissão Administrativa do Fundo de Turismo, ao abrigo do regime transitório previsto na Lei nº 9/90;
a interpretação do despacho pelo qual é nomeado Presidente do Instituto de Promoção Turística leva a que o regime de incompatibilidades aplicável a este cargo seja ainda o regime transitório estabelecido na Lei nº 9/90;
b) Integração em corpo social da Seguradora
Foi eleito em 31 de Outubro de 1990 para o cargo de Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Companhia de Seguros Bonança, S.A.;
A inexistência de qualquer incompatibilidade, segundo julga saber, teria radicado nos seguintes pressupostos:
i. Vigência do regime transitório da Lei nº 9/90, então aplicável ao signatário enquanto Presidente da Comissão Administrativa do Fundo do Turismo;
ii. O entendimento de que a alínea b) do artigo 2º da Lei nº 9/90 apenas se aplica a empresas concessionárias de serviços públicos ou intervenientes em contratos com o Estado e demais pessoas colectivas de direito público, o que não sucedia com a Companhia de Seguros Bonança, S.A.
.................................................................................................
"5.1. Vejamos a primeira situação: exercício de advocacia.
"Contrariamente ao informado quando da declaração relativa ao cargo de Presidente da Comissão Administrativa do Fundo de Turismo, afirma-se agora, expressamente, que esse exercício já tinha lugar na pendência da titularidade desse cargo.
Tendo a nomeação ocorrido antes da entrada em vigor da Lei nº 9/90, tal exercício encontra-se pois excepcionado face ao disposto no artigo 8º, nº 2, da referida lei, na redacção dada pela Lei nº 56/90, de 5 de Setembro.
"5.2. O efeito obtido no ponto anterior é também retirado pelo exponente, face aos termos em que foi nomeado Presidente do Instituto de Promoção Turística.
"Transcrevemos o Despacho Conjunto da Presidência do Con-selho de Ministros e Ministério do Comércio e Turismo (x1):
"Considerando que os fins institucionais prosseguidos pelo Fundo de Turismo e pelo Instituto de Promoção Turística possuem áreas de convergência e de complementariedade;
"Considerando que as duas instituições desempenham uma importante função no apoio financeiro a acções promocionais visando a exportação do turismo português;
.........................................................................................................
"Considerando que, em função do exposto, configura-se de re-levante interesse público que as funções de direcção e gestão das duas instituições se reúnam num só dirigente, determina–se:
1. Ao abrigo do nº 4 do artigo 6º do Decreto–Lei nº 402/86, de 3 de Dezembro, e da al. a) do nº 4 do artigo 5º do Decreto–Lei nº 323/89, de 26 de Setembro, é nomeado, em comissão de serviço, Presidente do Instituto de Promoção Turística, o Licenciado (...).
2. O exercício do cargo a que se refere a presente nomeação far-se-á em acumulação com o exercício das funções de Pre-sidente da Comissão Administrativa do Fundo do Turismo, considerando-se aquela como uma extensão do mandato em curso e objecto do Despacho Conjunto A-14/89-XI, portanto não remunerada.
3. ................................................................................................"
"Retiremos as proposições essenciais, explícita ou implici-tamente presentes neste despacho:
O Dr. (...) foi nomeado, em comissão de serviço, Presidente da Comissão Administrativa do Fundo de Turismo, pelo Despacho Conjunto A-14/89-XI, de 10 de Fevereiro de 1989 (x2);
Esta comissão de serviço é de três anos, renovável (x3);
Assim sendo, datando ela de 10 de Fevereiro de 1989, terminaria a 10 de Fevereiro de 1992;
O despacho que procede à nomeação para o cargo de Pre-sidente do Instituto de Promoção Turística, ao invocar determinadas disposições legais (x4), e ao considerar a no-meação como uma extensão do mandato em curso e objecto do Despacho Conjunto A-14/89-XI, como que parece "reno-var" esta última comissão de serviço, assinalando-lhe, tam-bém por esta via, um novo prazo de três anos: a extensão do mandato há-de entender-se ainda reportada à vertente temporal.
"Os efeitos decorrentes deste último despacho quanto à titula-ridade dos dois cargos (regime de acumulação e conjugação dos prazos de "ambas" as comissões de serviço), suscitam, pois, fundadas dúvidas quanto à sua legalidade, tendo presente os pressupostos legais de ambas as nomeações.
"É questão que, pela sua complexidade e especial melindre, necessita de acréscimo de legitimidade interpretativa, pelo que se sugere a audição do Conselho Consultivo.
"A solução a obter terá reflexos imediatos quanto à projecção, defendida pelo titular, do regime excepcional da Lei nº 9/90, no exercício do cargo de Presidente do Instituto de Promoção Turística.
"5.3.1. Outra situação é, como referimos, a titularidade da pre-sidência da Assembleia Geral da Companhia de Seguros Bonança, S.A..
"Afirma-se que a eleição teve lugar na primeira reunião da seguradora em causa, após a sua transformação em sociedade anónima, ou seja, em 31 de Outubro de 1990.
"Também aqui se apela ao regime transitório estabelecido no artigo 8º, nº 2, da Lei nº 9/90.
"Só que aqui, em nosso entender, e salvo melhor opinião, sem qualquer razão.
"O regime transitório ressalva a aplicação do estabelecido na alínea a) do artigo 2º, relativamente a determinados cargos e, no caso presente, até ao fim do respectivo mandato.
"Ora uma primeira consideração que se adianta, sem preocupações de precedência lógica, é que sempre seria duvidoso que a norma em causa possibilitasse não só a manutenção de situações adquiridas antes da entrada em vigor da lei, mas que autorizasse ainda, dentro do quadro temporal do mandato, o surgir de novas situações.
Mas o que se nos afigura decisivo é o facto de a norma tran-sitória apenas se dirigir à alínea a) do artigo 2º – exercício remunerado de quaisquer actividades profissionais ou de função pública que não derive do cargo e exercício de actividades de representação profissional.
"Ou seja, a incompatibilidade alicerçada na previsão da alínea b), a que agora está em causa, não beneficia de qualquer regime de transição.
"5.3.2. Adianta, no entanto, o Dr. (...), um segundo argumento no sentido da não aplicabilidade da alínea b) (do referido artigo 2º):
"Relembremos o disposto nesta alínea:
"A integração em corpos sociais de empresas ou sociedades concessionárias de serviços públicos, instituições de crédito ou parabancárias, seguradoras, sociedades imobiliárias ou quais-quer outras empresas intervenientes em contratos com o Esta-do e demais pessoas colectivas de direito público".
"O preenchimento desta previsão conduz a uma situação de incompatibilidade para os titulares elencados no artigo 1º da Lei nº 9/90. Para o titular um entendimento possível é que a alínea apenas cobre as empresas concessionárias de serviços públicos ou as empresas intervenientes em contratos com o Estado e demais pessoas colectivas de direito público, o que não seria o caso da Companhia de Seguros Bonança, S.A..
"É uma interpretação que não podemos acompanhar.
"Temos como seguro que o legislador não quis reduzir o es-pectro das empresas a esses dois núcleos, pois caso fosse essa a sua intenção a expressão do seu pensamento assumiria a forma defendida pelo titular.
"O que ele claramente estabeleceu foi a impossibilidade de integração em corpos sociais das seguintes empresas:
empresas ou sociedades concessionárias de serviços pú-blicos.
instituições de crédito ou parabancárias.
seguradoras.
sociedades imobiliárias.
quaisquer outras empresas intervenientes em contratos com o Estado e demais pessoas colectivas de direito público.
"O legislador na busca da transparência e imparcialidade da acção dos titulares de cargos públicos, e tendo essas ideias como principal referência, não deixa de fazer jogar outros valores, cujo respeito, para a prossecução daquelas, concorrem.
"É o caso, nomeadamente, da subordinação do poder económico ao poder político democrático, princípio constitucionalmente consagrado (artigo 80º, alínea a)), e que não é alheio à autonomização de empresas como as instituições de crédito ou parabancárias, seguradoras e sociedades imobiliárias.
"Assim sendo, o Dr. (...), parece incorrer numa situação de incompatibilidade nos termos do artigo 2º, alínea b), da Lei nº 9/90, ao desempenhar o cargo de Presidente da Assembleia Geral de uma seguradora, enquanto titular do cargo de Presidente da Comissão Administrativa do Fundo de Turismo.
"5.3.3. Esta última afirmação merece um segundo momento de reflexão.
"A alínea b) não distingue, no que concerne nomeadamente às empresas seguradoras, entre empresas controladas por enti-dades públicas e empresas privadas.
"Dir-se-á, desde logo, que não distinguindo o legislador, ao intérprete tal via estará vedada, sendo certo que o legislador não poderia olvidar a realidade económica existente nesse sector de actividade.
"5.3.4. Por outro lado, a Companhia de Seguros Bonança, E.P., foi transformada em sociedade anónima de capitais públicos, pelo Decreto–Lei nº 278/90, de 12 de Setembro.
"Posteriormente, o Decreto–Lei nº 140/91, de 10 de Abril, veio a aprovar a alienação de 60% do capital social da Bonança, S.A..
"Coube finalmente à Resolução de Conselho de Ministros nº 14/91, de 8 de Maio, aprovar a regulamentação dessa alienação.
"Operou-se, pois, uma transformação importante da sociedade: onde antes só existiam capitais públicos, agora existe ou pode existir relevante participação social privada.
"Ou seja, tudo aponta para a manutenção do juízo de in-compatibilidade formulado a final do ponto 5.3.2.".

Tendo Vossa Excelência acolhido a sugestão formulada no sentido de ser ouvido este corpo consultivo, cumpre emitir o parecer em vista.

2

2.1. MARCELLO CAETANO definiu incompatibilidade como a "impos-sibilidade legal do desempenho de certas funções públicas por indiví-duo que exerça determinadas actividades ou que se encontre em alguma das situações, públicas ou particulares, enumeradas na lei".
Depois de afirmar que as incompatibilidades ou são comuns a todas as funções públicas ou especiais de certo cargo ou função, classificou–as aquele autor em naturais e morais por um lado, e absolutas e relativas por outro.
Definiu incompatibilidades naturais "as que resultam da impossi-bilidade material de desempenhar simultaneamente dois cargos ou duas actividades dentro das mesmas horas de serviço, em diferentes localidades ou dentro da mesma hierarquia", e, morais, "as que re-sultam da necessidade de impedir que o agente possa ser suspeito de utilizar a função pública para favorecer interesses privados em cuja dependência se encontrasse, em virtude de prestar serviços remune-rados a particulares ou por estar ligado por laços de parentesco a quem possa influir na marcha dos negócios públicos, para seu proveito pessoal".
Caracterizou, finalmente, as incompatibilidades absolutas e relativas, respectivamente, como sendo "as que não podem ser removidas, forçando o funcionário a optar por um dos cargos incompatíveis", e "as que podem ser removidas mediante obtenção de autorização, dada pela autoridade competente, para o exercício dos dois cargos ou de um cargo e de uma actividade privada ..." [1].
As normas que prevêem sobre incompatibilidades funcionais em relação aos titulares de cargos políticos e da administração pública, cominam-lhes deveres de natureza negativa que constituem limites à acumulação. Se a incompatibilidade não for legalmente susceptível de remoção, vedada está a possibilidade de acumulação [2].
A motivação das normas legais sobre incompatibilidades relativas ao exercício de cargos assenta, fundamentalmente, na ideia de que duas ou mais funções não podem ser exercidas, convenientemente, pela mesma pessoa.
A este propósito referiu-se, em parecer deste corpo consultivo: "pretende-se, em resumo, proteger a independência das funções e, do mesmo passo manter na acção administrativa a normalidade, objectividade e serenidade que lhe deve imprimir o cariz indiscutível do interesse geral e que mais não é do que a afloração, no Estado democrático de direito, do princípio segundo o qual os agentes públicos não devem encontrar-se em situação de confronto entre o interesse próprio, de natureza pessoal, e o interesse do Estado ou dos entes públicos que representam e lhes cumpre defender" [3].

2.2.1.O artigo 269º da Constituição da República Portuguesa esta-belece, a propósito de acumulação e incompatibilidades, o seguinte:
"1. No exercício das suas funções, os trabalhadores da Admi-nistração Pública e demais agentes do Estado e outras entidades públicas estão exclusivamente ao serviço do interesse público, tal como é definido, nos termos da lei, pelos órgãos competentes da Administração.
.........................................................................................................
4. Não é permitida a acumulação de empregos ou cargos públicos, salvo nos casos expressamente admitidos por lei.
5. A lei determina as incompatibilidades entre o exercício de empregos ou cargos públicos e de outras actividades" [4].

O referido normativo constitucional não proíbe, em absoluto, seja a acumulação de cargos públicos, seja a acumulação de car-gos públicos com actividades privadas. Estabelece, tão só, no que concerne à acumulação dos cargos públicos, que a regra é a proibição e a permissão a excepção, deixando para a lei ordiná-ria o estabelecimento do regime das incompatibilidades entre o exercício de empregos ou cargos públicos e de outras actividades.

2.2.2. Por outro lado, o artigo 120º da Constituição da República Por-tuguesa, na versão resultante da Lei Constitucional nº 1/89, de 8 de Julho, que se reporta ao estatuto dos titulares de cargos po-líticos, estabelece, sob o nº 2, que "A lei dispõe sobre os deveres, responsabilidades e incompatibilidades dos titulares de cargos políticos, bem como sobre os respectivos direitos, regalias e imunidades".
Até à publicação da Lei nº 9/90, de 1 de Março, inexistia a definição do regime de incompatibilidades no exercício de cargos políticos, a que o citado artigo 120º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa se refere.

2.2.3. A Lei nº 9/90 sobre incompatibilidades de cargos políticos e altos cargos públicos resultou de um projecto de lei aprovado, por unanimidade, pela Assembleia da República na sua sessão de 24 de Outubro de 1989. Esse diploma correspondeu a um texto alternativo elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, a partir do Projecto de Lei nº 277/V, apresentado pelo Partido Socialista, restrito às incompatibilidades dos membros do Governo [5].
Sobre as razões que determinaram a previsão das incompatibi-lidades dos altos cargos públicos - a par dos cargos políticos ­, na referida Lei, afirmou-se no parecer nº 26/90, de 28 de Julho de 1990, não publicado, deste corpo consultivo:
"Subjacente a este alargamento, continuou a estar a preocu-pação de evitar, também para os altos cargos públicos, a colisão entre os interesses público e privado, mediante a interdição da acumulação indevida de cargos e outras actividades profis-sionais ou funções, através do seu exercício em prejuízo do interesse colectivo. Pretende-se – e essa é a "ratio" da lei –, contribuir para a dignificação do exercício do mandato dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, "evitando a osmose entre o interesse público e privado" e salvaguardando, assim, o interesse público como valor superior da colectividade".
Não obstante a redacção final ter merecido a adesão gene-ralizada dos diversos grupos parlamentares, o PSD apresen-tou, logo em 26 de Abril seguinte, o Projecto de Lei nº 524/V, que visou alterar algumas disposições da Lei nº 9/90 [6].
O referido Projecto de Lei deu origem à Lei nº 56/90, de 5 de Setembro, que revogou os artigos 9º a 11º e alterou os artigos 1º, 3º a 7º e 8º da Lei nº 9/90.

2.2.4 Dispôs a Lei nº 9/90, de 1 de Março, com início de vigência 60 dias após a sua publicação (artigo 12º):

"Artigo 1º
(Âmbito)
1. São considerados titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, para os efeitos da presente lei:
.......................................................................................................

j) Gestor público ou presidente de instituto público autónomo; [7].
k) Director-Geral ou equiparado [8].
2. ..................................................................................................

"Artigo 2º
(Incompatibilidades)

A titularidade dos cargos enumerados no artigo antecedente implica, durante a sua pendência, para além das previstas na Constituição, as seguintes incompatibilidades:
a) O exercício remunerado de quaisquer outras actividades profissionais ou de função pública que não derive do seu cargo e o exercício de actividades de representação profissional;
b) A integração em corpos sociais de empresas ou sociedades concessionárias de serviços públicos, instituições de crédi-to ou parabancárias, seguradoras, sociedades imobiliárias ou quaisquer outras empresas intervenientes em contra-tos com o Estado e demais pessoas colectivas de direito público;
.......................................................................................................".

2.3.3. A Lei nº 56/90, como já se disse, veio dar nova redacção a algumas das disposições da Lei nº 9/90, importando realçar, para além da relativa ao artigo 1º, nº 1, alíneas j) e k), a nova redacção do artigo 8º, que assim ficou:

"Artigo 8º
(Regime transitório)

1. ..................................................................................................
2. Os titulares, aquando da entrada em vigor da presente lei, dos cargos referidos na alínea g) do nº 1 do artigo 1º, bem como, até ao fim do respectivo mandato, os então titulares dos cargos referidos nas alíneas i), j), l) e m), não estão abrangidos pelas incompatibilidades referidas na alínea a) do artigo 2º, continuando sujeitos ao regime de incompatibilidades vigente à data da entrada em vigor da presente lei.
3. ...............................................................................................".

E dispôs a Lei nº 56/90 no seu artigo 3º:
"1. O nº 2 do artigo 8º da Lei nº 9/90, de 1 de Março, é apli-cável aos presidentes e membros do conselho de admi-nistração de sociedades anónimas de capitais exclusiva-mente públicos, aos vogais da direcção de institutos pú-blicos autónomos, e aos subdirectores–gerais e equipa-rados, titulares de tais cargos à data da publicação da presente lei.
2. Os efeitos da presente lei reportam-se à data da entrada em vigor da Lei nº 9/90, de 1 de Março, quanto aos titulares de cargos já abrangidos por aquela lei.
3. Quanto aos restantes titulares, a presente lei só produz efeitos no prazo de 60 dias após a sua publicação".
3
3.1. O Dr. (...) foi nomeado, em comissão de serviço, Presidente da Comissão Administrativa do Fundo de Turismo, produzindo essa nomeação efeitos a partir de 10 de Fevereiro de 1989 (data do despacho).

3.1.1.O Fundo de Turismo foi criado pela Lei nº 2082, de 4 de Junho de 1956 (Base XVI), ficando a sua gerência confiada a uma comissão administrativa, dotada de autonomia administrativa, composta de um presidente e de dois vogais (Base XIX).
O Decreto–Lei nº 49266, de 26 de Setembro de 1969, promulgou o novo regime de funcionamento do Fundo de Turismo, vindo a sofrer alterações introduzidas pelos Decretos-Leis nºs 223/71, de 27 de Maio, 631/74, de 18 de Novembro, 40/80, de 14 de Março, 36/83, de 25 de Janeiro, 341/87, de 21 de Outubro e 203/89, de 22 de Junho.

Nos termos daquele Decreto–Lei nº 49266, na redacção do Decreto–Lei nº 36/83:
"Artigo 1º
1 A comissão administrativa é o órgão que assegura a di-recção e a gestão do Fundo de Turismo, exercendo as com-petências fixadas por lei ou superiormente delegadas pelo membro do Governo com tutela sobre o sector do turismo.
2 A comissão administrativa é composta por 1 presidente e 2 vogais, sendo o presidente e um dos vogais nomeados pelo membro do Governo com tutela sobre o sector do turismo e o outro pelo Ministro de Estado e das Finanças e do Plano, por um período de 3 anos, renovável.
.......................................................................................................".

"Artigo 2º
1. Os membros da comissão administrativa terão direito à remuneração a fixar por despacho conjunto do Ministro de Estado e das Finanças e do Plano e do membro do Governo com tutela sobre o sector do turismo.
2. ...............................................................................................".

3.1.2. A fisionomia jurídica do Fundo de Turismo foi traçada no parecer nº 14/85, de 11-11-85 [9], deste corpo consultivo, e reafirmada no parecer nº 30/86, de 3 -7-86 [10].
Depois de se distinguir entre a administração directa e in-directa do Estado e de se enunciarem os principais critérios uti-lizados pela doutrina para caracterizar as pessoas colectivas de direito público e de analisar as disposições legais, respeitantes ao Fundo de Turismo, desde a sua criação pela Base XVI da Lei nº 2082, de 4 de Junho de 1956, e de se salientar a autonomia administrativa de que goza, sem embargo da apertada tutela a que se encontra sujeito, disse-se no parecer nº 14/85:
" ... o Fundo de Turismo dispõe de amplas receitas (incluindo participação em impostos, como é o caso do jogo), receitas a aplicar segundo os termos referidos expressamente na lei.
"Face aos poderes conferidos aos órgãos de gerência do Fundo de Turismo, nomeadamente para praticar actos jurídicos, tais como ampla capacidade de recepção de receitas diversas ligadas à exploração do turismo e de rendimentos de bens próprios, realização de contratos, em especial de empréstimo, capacidade de estar em juízo, a doutrina não tem hesitado em classificar o Fundo de Turismo como instituto público, mais precisamente como fundação pública (x5). Ainda que dito de modo algo incidental, é a própria lei que refere o Fundo de Turismo como detentor de "personalidade jurídica e autonomia (x6) ".

3.1.3. Deve, pois, concluir-se que o Dr. (...), como Presidente da Comissão Administrativa do Fundo de Turismo – órgão que assegura a direcção e a gestão desse instituto público (artigo 1º, nº 1, do Decreto–Lei nº 49266) –, ficou abrangido pela disciplina da Lei nº 9/90, de 1 de Março, na qualidade de "presidente de instituto público autónomo" (alínea j) do nº 1 do artigo 1º) [11].
Essa qualidade não vem referida na citada Informação – talvez por ser demasiado evidente –, não se vendo que outra possa coexistir [12].
E não foi posta em causa a sujeição do Dr. (...) à disciplina do referido diploma legal.
As dificuldades são de outra ordem.

3.2.1. Ao apresentar, em 29 de Junho de 1990, a sua declaração de inexistência de incompatibilidades e impedimentos, relativa ao referido cargo de Presidente da Comissão Administrativa do Fundo de Turismo, o Dr. (...) juntou có-pias de duas cartas dirigidas à Companhia de Seguros Bonança e ao Banco Pinto & Sotto Mayor solicitando "a suspensão da re-muneração relativa à avença pela prestação de serviços jurídicos".
Não referiu o exercício da advocacia. Mas vê-se da declaração que apresentou posteriormente, relativa ao cargo de Presidente do Instituto de Promoção Turística, que terá continuado a exercer advocacia, o que a Lei nº 9/90, na sua redacção originária, não permitia – visto o regime transitório (artigo 10º, nº 2) apenas beneficiar os titulares das alíneas f) – "Governador e vice-governador civil" – e h) – "Presidente e vereador a tempo inteiro das câmaras municipais" –, mas veio a permitir, com efeitos a partir da entrada em vigor da Lei nº 9/90, nos termos do nº 2 do artigo 8º, introduzido pela Lei nº 56/90: o referido ti-tular de alto cargo público previsto na alínea j) do nº 1 do artigo 1º poderia, até ao fim do respectivo mandato, exercer qualquer das actividades referidas na alínea a) do artigo 2º, onde cabe, o exercício da advocacia – como "actividade profissional" –, [13] des-de que permitido pelo regime de incompatibilidades vigente à data da entrada em vigor dessa mesma Lei nº 9/90.

3.2.2. O regime de incompatibilidades vigente à data da entrada em vigor da Lei nº 9/90 (30 de Abril de 1990), relativamente ao pessoal dirigente [14], caso do Dr. (...), como Presidente da Comissão Administrativa do Fundo de Turismo, estava – como ainda está – fixado no referido Decreto–Lei nº 323/89, de 26 de Setembro, que assim dispõe, no seu artigo 9º:
"1. O pessoal dirigente exerce funções em regime de exclusividade, não sendo permitido, durante a vigência da comissão de serviço, o exercício de outros cargos ou funções públicas remunerados, salvo os que resultem de inerências ou de representação de departamentos ministeriais ou de serviços públicos e, bem assim, do exercício de fiscalização ou controlo de dinheiros públicos.
2. O disposto no número anterior não abrange as remunerações provenientes de:
........................................................................................... [15].
3. Não é permitido o exercício de actividades privadas pelos titulares de cargos dirigentes, ainda que por interposta pessoa, excepto em casos devidamente fundamentados, autorizados pelo membro do Governo competente, o qual só será concedido desde que a mesma actividade não se mostre susceptível de comprometer ou interferir com a isenção exigida para o exercício dos mencionados cargos.
4. A violação do disposto neste artigo constitui fundamento para dar por finda a comissão de serviço, nos termos da alínea a) do nº 2 do artigo 7º".

Como decorre do nº 3 deste artigo 9º, o Dr. (...) só poderia exercer a advocacia, nos termos do nº 2 do artigo 8º da Lei nº 9/90, na redacção da Lei nº 56/90, conjugado com o nº 3 do artigo 9º do Decreto–Lei nº 323/89, se devidamente autorizado pelo membro do Governo competente, facto que não vem esclarecido na referida Informação [16].


3.3. Por Despacho Conjunto publicado em 3 de Dezembro de 1990, o Dr. (...) foi nomeado, em comissão de serviço, e em acumulação com as funções atrás referidas, Presidente do Instituto de Promoção Turística, tendo tomado posse em 21 do mesmo mês.

3.3.1. O Instituto de Promoção Turística foi criado na Presidência do Conselho de Ministros (artigo 1º, nº 1, do Decreto–Lei nº 402/86, de 3 de Dezembro), sendo um "instituto com personalidade jurídica dotado de autonomia administrativa e financeira e de património autónomo" (artigo 1º, nº 2), com as seguintes atribuições (artigo 2º, nº 1, do mesmo diploma legal):
a) Executar a política definida para o turismo em matéria de promoção;
b) Difundir e defender, por todos os meios, a imagem de Portugal como destino turístico;
c) Orientar, coordenar, realizar e fomentar, por todos os meios, a promoção do turismo nacional no País e no estrangeiro;
d) Representar o turismo português no estrangeiro;
e) Coordenar todas as acções destinadas a promover o turismo português no estrangeiro que sejam realizadas com o dispêndio de dinheiros públicos ou com a participação destes".

Eram [17] órgãos do Instituto: "a) O Presidente; b) O Conselho Administrativo; c) O Conselho de Coordenação Promocional" (nº 1 do artigo 5º).
Nos termos do nº 1 do artigo 6º do referido diploma ao presidente incumbia "a direcção e gestão do IPT", sendo o presidente equiparado, para todos os efeitos legais, a director–geral, e nomeado "nos termos da lei geral" (nº 4 do mesmo artigo 6º).
O Decreto–Lei nº 179/92, de 17 de Agosto, extinguiu o Instituto de Promoção Turística, sendo as atribuições e competências cometidas a este Instituto transferidas para o Instituto do Comércio Externo de Portugal, criado pelo Decreto–Lei nº 115/82, de 14 de Abril.

3.3.2. Era o Instituto de Promoção Turística um instituto público [18], da espécie "serviço personalizado" [19], se bem que não importe muito a sua exacta qualificação, dada a citada doutrina do parecer nº 76/91 (cfr. nota 11).
Deste modo, o titular do cargo de Presidente do referido Instituto estava abrangido pela disciplina da Lei nº 9/90, a dois títulos: como presidente de "instituto público autónomo" – alí-nea j) – e como "equiparado" a Director–Geral – alínea m) do nº 1 do artigo 1º, na redacção da Lei nº 56/90.
Daí que o Dr. (...) tenha apresentado a respectiva declaração de inexistência de incompatibilidades, em 24 de Outubro de 1991.
Essa declaração levantou sérias dúvidas no Gabinete de Vossa Excelência, como se vê da referida Informação, dúvidas que começam, desde logo, com a legalidade e efeitos (temporais) do despacho de nomeação para tal cargo.
A extinção do referido Instituto e a consequente cessação do exercício do cargo de Presidente desse Instituto veio prejudicar a apreciação da questão posta, nessa parte.
Mas, porque situações como a exposta podem repetir-se, importa proceder a uma breve análise da legalidade das mesmas.

3.4. Dispõe a Constituição da República, no já citado nº 4 do artigo 269º, que "não é permitida a acumulação de empregos ou cargos públicos, salvo nos casos expressamente admitidos por lei".
Em conformidade com esta norma fundamental, o já referido nº 1 do artigo 9º do Decreto–Lei nº 323/89 – aplicável ao caso, por se tratar de pessoal dirigente – (apenas) proíbe "o exercício de outros cargos ou funções públicas remunerados, salvo os que resultem de inerências ou de representação de departamentos ministeriais ou de serviços públicos [...]".
E o artigo 2º, alínea a) da Lei nº 9/90 (apenas) proíbe – aos titulares dos cargos enumerados no artigo antecedente – "o exercício remunerado de quaisquer outras actividades profissionais ou de função pública que não derive do seu cargo [...]", para além das incompatibilidades previstas na Constituição.
Isto é, esta última norma apenas proíbe – como a anteriormente citada – a acumulação de cargos, funções ou actividades remunerados, salvo nas situações ("inerências", "função pública que derive do cargo") pre-vistas nesses normativos.
Assim sendo o Dr. (...) poderia exercer os dois referidos "altos cargos públicos", desde que um deles não fosse remu-nerado, como não era, tal como se diz no Despacho Conjunto da Presi-dência do Conselho de Ministros e Ministério do Comércio e Turismo.


3.5. Ao apresentar a sua declaração de inexistência de incompatibilidades e impedimentos, relativamente ao cargo de Presidente do Instituto de Promoção Turística, o Dr. (...) declarou que exercia a advocacia e, ainda, as funções de Presidente da Assembleia Geral da Companhia de Seguros Bonança, S.A..
A cessação do exercício daquele cargo, por extinção do referido instituto, veio simplificar a questão posta: o Dr. (...), pelo exercício de (apenas) um alto cargo público – Presidente da Comissão Administrativa do Fundo de Turismo –, à data da entrada em vigor da Lei nº 9/90, está sujeito à disciplina dos artigos 2º e 8º, nº 2, da Lei nº 9/90 – esta última disposição na redacção da Lei nº 56/90 – como se nunca tivesse exercido o outro cargo (extinto) de Presidente do Instituto de Promoção Turística.

3.5.1 Assim sendo, quanto ao exercício de advocacia, mantém–se o que se disse no nº 3.2.2., nada havendo a acrescentar.

3.5.2. Quanto ao exercício das funções de Presidente da Assembleia Geral da Companhia de Seguros Bonança, S.A., a partir de 31 de Outubro de 1990, é evidente o acerto da posição defendida na Informação em apreço: o Dr. (...) não beneficia, nessa parte, do regime transitório previsto no nº 2 do artigo 8º da Lei nº 9/90 – redacção da Lei nº 56/90 –, que não ressalva o exercício de tais funções, estando, por isso, impedido de as exercer.

De facto:
3.5.2.1. A alínea b) do artigo 2º da Lei nº 9/90 prevê a integração em cargos sociais de diversas entidades, diversas pessoas colectivas, e, entre elas "as seguradoras".
Ao referir-se a "seguradoras" – tal como, aliás, a "instituições de crédito ou parabancárias" – aquela norma não distingue entre entidades públicas e privadas, abrangendo, pois, todas as "seguradoras", visto não haver razões para restringir o seu campo de aplicação.
Não se oferecem dúvidas de que a expressão final "intervenientes em contratos com o Estado e demais pessoas colectivas de direito público" se reporta apenas a "quaisquer outras empresas" – que não as anteriormente citadas –, limitando, assim, o âmbito de aplicação da norma (apenas) relativamente a essas "outras empresas".
Não tem, pois, fundamento algum a tese do declarante de que aquela norma apenas se aplica a "empresas conces-sionárias de serviços públicos ou intervenientes em con-tratos com o Estado e demais pessoas colectivas de direito público".
De onde se deve concluir que aquela alínea b) abrange na sua previsão o cargo de Presidente da Assembleia Geral da seguradora "Companhia de Seguros Bonança, S.A." [20].

3.5.2.2. A regra (transitória) do nº 2 do citado artigo 8º da Lei nº 9/90 apenas ressalva certos titulares de altos cargos públicos das incompatibilidades referidas na alínea a) do artigo 2º da Lei nº 9/90, até ao fim do respectivo mandato.
Assim sendo, é evidente não beneficiar o declarante do regime transitório previsto naquele artigo 8º, nº 2, que, como se viu, não ressalva as situações previstas na alínea b) do mesmo artigo 2º, caso da integração do declarante na Assembleia Geral da Companhia de Seguros Bonança, S.A., como Presidente.
Como resulta de todo o exposto, chegar-se-ia às mesmas conclusões caso se mantivesse o exercício (não remunera-do) do cargo de Presidente do Instituto de Promoção Turística.


4
Termos em que se conclui:
1º O regime de incompatibilidades previsto na Lei nº 9/90, de 1 de Março, pretendeu contribuir para a dignificação do exercício do mandato dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, mediante a interdição de acumulação indevida de cargos e outras actividades profissionais ou de função pública;
2º O cargo de Presidente da Comissão Administrativa do Fundo do Turismo é um alto cargo público, cabendo na previsão da alínea j) do nº 1 do artigo 1º da Lei nº 9/90, como presidente de "instituto público autónomo";
3º O Dr. (...), titular do cargo referido na conclusão anterior, desde 10 de Fevereiro de 1989, beneficia do regime transitório fixado no nº 2 do artigo 8º da Lei nº 9/90, na redacção da Lei nº 56/90, de 5 de Setembro, podendo exercer, cumulativamente, (mas apenas) até ao fim do respectivo mandato, as actividades subsumíveis na alínea a) do artigo 2º da Lei nº 9/90, desde que permitidas pelo regime de incompatibilidades fixado pelo artigo 9º do Decreto–Lei nº 323/89, de 26 de Setembro;
4º A referida alínea a) do artigo 2º da Lei nº 9/90 abrange, na sua previsão, o exercício da advocacia;
5º Nos termos do nº 3 do artigo 9º do Decreto–Lei nº 323/89, o exercício da advocacia por parte do pessoal dirigente – caso do titular referido na conclusão 3ª – depende de autorização pelo membro do Governo competente;
6º O cargo de Presidente do extinto Instituto de Promoção Turística era subsumível na alínea j) do nº 1 da Lei nº 9/90, como "presidente de instituto público autónomo".
7º A norma da alínea a) do artigo 2º da Lei nº 9/90, bem assim a do nº 1 do artigo 9º do Decreto–Lei nº 323/89, apenas proíbem, com as ressalvas aí previstas, a acumulação de cargos, funções ou actividades remunerados;
8º Nos termos das disposições citadas na conclusão anterior, o Dr. (...) podia exercer, cumulativamente, os cargos referidos nas conclusões 2ª e 6ª, desde que um deles não fosse remunerado, como sucedia com o segundo cargo;
9º O cargo de Presidente da Assembleia Geral da Companhia de Seguros Bonança, S.A. cabe na previsão da alínea b) do artigo 2º da Lei nº 9/90, por corresponder à integração em corpo social de "seguradora";
10º Não estando as situações previstas na referida alínea b) ressalvadas pelo nº 2 do artigo 8º da Lei nº 9/90, na redacção da Lei nº 56/90, não pode o Dr. (...) titular do cargo referido na conclusão 2ª, exercer cumulativamente o cargo referido na conclusão anterior.



(x) Existe lapso irrelevante nesta menção.
A referência deve-se entender como reportada à Lei nº 9/90, de 1 de Março, na redacção da Lei nº 56/90.

(x1) Publicado no "Diário da República", II Série, nº278, de 3 de Dezembro de 1990.

(x2) Dos Ministros das Finanças e do Comércio e Turismo, publicado no "Diário da República", II Série, nº46, de 24 de Fevereiro de 1989. A nomeação foi feita por urgente conveniência de serviço, produzindo efeitos desde a data do despacho.

(x3) Artigo 1º, nº 2, do Decreto–Lei nº 49266, de 26 de Setembro de 1969, na redacção do Decreto–Lei nº 341/87, de 21 de Outubro.

(x4) Decreto–Lei nº 402/86, de 3 de Dezembro, artigo 6º, nº 4 e Decreto–Lei nº 323/89, de 26 de Setembro, artigo 5º, nº 4, alínea a).
O primeiro diploma cria o Instituto de Promoção Turística e a norma em causa determina a equiparação do presidente a director-geral, remetendo a sua nomeação para os termos da lei geral.
O segundo diploma veio estabelecer o novo estatuto do pessoal dirigente.

[1] "Manual de Direito Administrativo", tomo II, Coimbra, 1983, págs. 720 a 722.
Cfr. os pareceres deste Conselho Consultivo nºs 61/84, de 20 de Dezembro de 1984, e 75/89, de 22 de Fevereiro de 1990, aquele publicado no "Boletim do Ministério da Justiça", nº346, págs. 54 a 87, e este não publicado.

[2] JOÃO ALFAIA, "Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público", vol. 1º, Lisboa, 1985, págs. 171 e segs.

[3] Parecer nº 100/82, de 22 de Julho de 1982, publicado no "Diário da República", II Série, de 25 de Junho de 1983, e no ""Boletim do Ministério da Justiça", nº326, págs. 224 e segs.

[4] O nº 1 corresponde, sem alteração, ao nº 1 do artigo 269º do texto resultante da 1ª Revisão Constitucional e, com alteração, ao nº 1 do artigo 270º da versão originária. Os nºs 4 e 5 correspondem, sem alteração, aos nºs 4 e 5 do artigo 269º resultante da 1ª revisão e aos nºs 4 e 5 do artigo 270º na versão originária.

[5] O Projecto de Lei nº 277/V encontra-se publicado no "Diário da Assembleia da República", V Legislatura, 1ª Sessão Legislativa (1987-1988), II Série, nº 91, de 9 de Julho de 1988.

[6] O Projecto de Lei nº 524/V está publicado no D.A.R., V Legislatura, 3ª Sessão Legislativa, II Série-A, nº 35, de 26 de Abril de 1990.
Veja-se o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, no D.A.R., II Série–A, nº 38, de 5 de Maio de 1990, pág. 1272, e a discussão, na generalidade, do referido projecto de lei, no D.A.R., I Série, nº 71, de 5 de Maio findo, págs. 2391 e seguintes.

[7] A Lei nº 56/90 substituiu esta alínea j) pelas actuais alíneas j) e l), do seguinte teor:
"j) Presidente de instituto público autónomo, de empresa pública ou de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos;
l) Gestor público, membro de conselho de administração de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos e vogal da direcção de instituto público autónomo, desde que exerçam funções executivas".

[8] A Lei nº 56/90 substituiu a alínea k) – do nº 1 do artigo 1º da Lei nº 9/90 – pela actual alínea m), com a seguinte redacção:
"m) Director-Geral e subdirector-geral ou equiparado".

[9] Não homologado.

[10] Publicado no "Diário da República", II Série, de 17/9/86.

(x5) Cfr. Alberto Xavier, "Manual de Direito Fiscal, I" (reimpressão), 1981, págs. 341/42, que coloca o Fundo de Turismo a par do Fundo do Teatro, e do (ora extinto) Fundo de Fomento da Habitação, etc.. Cfr. também ANTÓNIO BRAZ TEIXEIRA, "Princípios de Direito Fiscal", Coimbra, 1979, pág. 172.

(x6) Dispõe-se no artigo 2º do Decreto–Lei nº 545/74, de 19 de Outubro: "A superintendência atribuída à extinta Secretaria de Estado da Informação e Turismo, relativamente ao Fundo de Turismo e ao Centro Nacional de Formação Turística e Hoteleira, é exercida pela Secretaria de Estado do Comércio Externo e Turismo, sem prejuízo da personalidade jurídica e autonomia conferida a estes serviços, nos termos da legislação em vigor a eles respeitante".

[11] No parecer nº 76/91, de 5/12/91, deste corpo consultivo, a solicitação de Sua Excelência o Procurador-Geral da República, foi concluiu-se:
"O conceito "instituto público autónomo", usado nas alíneas j) e l) do nº 1 do artigo 1º da Lei nº 9/90, de 1 de Março, na redacção da Lei nº 56/90, de 5 de Setembro, abrange, na sua previsão, todas as espécies de "institutos públicos" - "serviços personalizados", "fundações públicas" e "estabelecimentos públicos", independente-mente do grau e tipo de autonomia de que efectivamente disponham –, só não abrangendo as "empresas públicas" em virtude de estas estarem expressa e especificamente previstas nos mesmos preceitos legais".

[12] Em ofício de 29 de Junho de 1990, em que declara não estar abrangido por qualquer incompatibilidade prevista na Lei nº 9/90, o Dr. (...) reconhece ser o Fundo de Turismo um "instituto público autónomo".

[13] No parecer nº 54/90, de 11 de Outubro de 1990, deste corpo consultivo, concluiu-se que "o conceito de actividade profissional previsto na alínea a) do artigo 2º da Lei nº 9/90, de 1 de Março (alterado pela Lei nº 56/90, de 5 de Setembro), circunscreve-se às actividades profissionais privadas".
E escreveu-se no corpo do parecer:
"O conceito "profissão", independentemente da perspectiva de análise – económica, filosófica, psicológica ou outra –, tem evoluído, a par da permanente transformação da realidade sócio–económica, no sentido de cada vez maior abertura.
"A actividade profissional já não é apenas aquela que é quotidianamente exercida no tempo pleno institucionalizado, com o escopo de provisão as necessidades de existência do respectivo agente. À condição profissional basta a realização regular de trabalho, enquadrada em determinado posto ou função, no âmbito de consecução de certo objectivo final".

[14] Artigo 2º, nº 1, do Decreto–Lei nº 323/89, de 26 de Setembro:
"Considera-se dirigente o pessoal que exerce actividades de direcção, gestão, coordenação e controlo nos serviços ou organismos públicos referidos no artigo anterior".
O artigo 1º, nº 1, do referido diploma diz que este estabelece o "estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, local do Estado e regional, bem como, com as necessárias adaptações, dos institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos".

[15] Não interessam à economia do parecer as excepções previstas neste nº 2.

[16] Por não caber no âmbito do parecer solicitado não se cuida de averiguar a possível incompatibilidade do exercício de advocacia, face ao Estatuto da Ordem dos Advogados.

[17] Diz-se "eram" em virtude de o Instituto de Promoção Turística ter sido extinto pelo Decreto–Lei nº 179/92, de 17 de Agosto.

[18] Os "institutos públicos, como se sabe, integram a "administração estadual indirecta", que FREITAS DO AMARAL – "Curso de Direito Administrativo", vol. I, 1987, pág. 305 – define, de um ponto de vista subjectivo ou orgânico, como "o conjunto das entidades públicas que desenvolvem, com personalidade jurídica própria e autonomia administrativa e financeira, uma actividade administrativa destinada à realização de fins do Estado".

[19] "Os "serviços personalizados" – diz FREITAS DO AMARAL , ob. cit., pág. 320 –, são os serviços administrativos a que a lei atribui a natureza de institutos públicos.
"São serviços a quem a lei dá personalidade jurídica e autonomia para poderem funcionar como se fossem verdadeiras instituições independentes. Não o são, todavia: já ficou dito que nestes casos existe mais uma aparência do que uma realidade: estes serviços são verdadeiramente departamentos do tipo "direcção-geral", aos quais a lei dá personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira só para que possam desempenhar melhor as suas funções".

[20] Nos termos do artigo 6º dos Estatutos da Companhia de Seguros Bonança., S.A., anexos ao Decreto–Lei nº 278/90, de 12 de Setembro, "são órgãos sociais a assembleia geral, o conselho de administração e o conselho fiscal".
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART120 ART269.
L 9/90 DE 1990/03/01 ART1 ART2 ART8 ART10 N2.
L 56/90 DE 1990/09/05 ART3.
L 2082 DE 1956/06/04 BXVI BXIX.
DL 49266 DE 1969/09/26 ART1 ART2.
DL 223/71 DE 1971/05/27.
DL 545/74 DE 1974/10/19 ART2.
DL 631/74 DE 1974/11/18.
DL 40/80 DE 1980/03/14.
DL 402/86 DE 1986/12/03 ART1 N1 N2 ART2 N1 ART5 ART6 N4.
DL 341/87 DE 1987/10/21.
DL 203/89 DE 1989/06/22.
DL 323/89 DE 1989/09/26 ART1 ART2 ART9.
DL 278/90 DE 1990/09/12 ART6. DL 179/92 DE 1992/08/17.
Referências Complementares: 
DIR ADM * ADM PUBL * FUNÇÃO PUBL.
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