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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
35/1993, de 27.01.1994
Data do Parecer: 
27-01-1994
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério das Finanças
Relator: 
FERREIRA RAMOS
Descritores e Conclusões
Descritores: 
APOSENTAÇÃO
PROCESSO DE APOSENTAÇÃO
DESLIGAMENTO DE SERVIÇO
PROMOÇÃO
CÁLCULO DA PENSÃO
INTERPRETAÇÃO DA LEI
LACUNA
ANALOGIA
FIXAÇÃO DA APOSENTAÇÃO
CARGO PARA APOSENTAÇÃO
CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES
RESOLUÇÃO
REMUNERAÇÃO
ALTERAÇÃO
EXERCÍCIO DE FUNÇÕES
TERMO
Conclusões: 
1 - O regime da aposentação fixa-se com base na lei em vigor e na situação existente à data em que se verifique o facto que lhe deu causa (artigo 43 do Estatuto da Aposentação);
2 - É irrelevante qualquer alteração de remunerações ocorrida posteriormente à data a que se refere o n 2 do artigo 33 (artigo 43, n 3, do mesmo Estatuto);
3 - Face às conclusões anteriores, a remuneração mensal a considerar para o cálculo da pensão é a que corresponder à categoria ou cargo do subscritor à data do acto determinante da aposentação, sendo irrelevante que entre esta data e a desligação do serviço se tenha verificado um aumento de remuneração por promoção do subscritor.
Texto Integral
Texto Integral: 
SENHOR SECRETÁRIO DE ESTADO DO ORÇAMENTO,
EXCELÊNCIA:
 
 
1
Na Provedoria de Justiça foi analisada a questão de saber se, nos casos em que o funcionário é promovido na sua carreira já posteriormente ao facto determinante da aposentação mas antes de ser desligado do serviço, sendo-lhe abonado o consequente aumento da remuneração, deve o último cargo a que ascendeu relevar no cálculo da pensão (Recomendação de 18 de Março de 1993, Proc. R. 2970/88).
Dirigida a respectiva Recomendação ao Senhor Presidente do Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos, foi entendido que não deveria ser aceite a Recomendação do Senhor Provedor de Justiça «no sentido de se considerar no cálculo da pensão de aposentação o cargo a que o interessado ascendeu por promoção ocorrida entre a realização da junta médica que declarou a sua incapacidade e a comunicação dos resultados daquela» (parecer de 31 de Março de 1993).
Como Vossa Excelência concordou com a decisão do Conselho de Administração da Caixa de solicitar a audição deste Conselho Consultivo, cumpre emitir parecer.
 
2
O estudo da questão submetido à nossa apreciação prende-se decisivamente com alguns preceitos do Estatuto da Aposentação (E.A.) (1), cujo conteúdo interessa desde já conhecer, pois assim melhor se compreenderão as diferentes tomadas de posição que nos propomos extractar de seguida.
«Artigo 33º
(Limites da contagem)
1. Na contagem final do tempo de serviço para a aposen-tação considerar-se-ão apenas os anos e os meses completos de serviço (redacção do Decreto-Lei nº 191-A/79, de 25 de Junho).
2. Para efeitos do nº 1 contar-se-á o tempo decorrido até à data em que se verificar:
a) Qualquer dos factos previstos no nº 1 do artigo 43º;
b) ...........................................................................................».
«Artigo 43º
(Regime da aposentação)
1. O regime da aposentação fixa-se com base na lei em vigor e na situação existente à data em que:
a) Se profira despacho a reconhecer o direito a apo-sentação voluntária que não dependa de verifica-ção de incapacidade;
b) Seja declarada a incapacidade pela competente junta médica, ou homologado o parecer desta, quando lei especial o exija;
c) O interessado atinja o limite de idade;
d) ............................................................................................
2. ......................................................................................................
3. É irrelevante qualquer alteração de remunerações ocorri-das posteriormente à data a que se refere o nº 2 do artigo 33º».
«Artigo 44º
(Cargo pelo qual se verifica a aposentação)
1. O subscritor é aposentado pelo último cargo em que esteja inscrito na Caixa.
2. ...................................................................................................».
«Artigo 99º
(Termo do serviço)
1. As resoluções a que se refere o artigo 97º serão desde logo comunicadas aos serviços onde o subscritor exerça funções.
2. Com base nesta comunicação, o subscritor é desligado do serviço, ficando a aguardar aposentação até ao fim do mês em que for publicada a lista dos aposentados com a inclusão do seu nome.
3. ...................................................................................................».
 
3
3.1. Entende o Senhor Provedor de Justiça que, na situação em apreço, os artigos 43º, nº 1, e 44º, nº 1, do E. A. se revelam incompatíveis: a aplicação de qualquer deles obsta à eficácia do outro.
«Com efeito, para se respeitar o artigo 43º, nº 1, calculando a pensão com base na situação do funcionário, não se atende ao artigo 44º, nº 1, porquanto, tendo aquele subido de categoria ulteriormente a este facto, já ele não é aposentado pelo último cargo que efectivamente lhe foi atribuído e pelo qual, na sua qualidade de funcionário ainda no activo, deve descontar para essa Caixa».
 
3.1.1. O artigo 99º fornece, porém, um contributo para a solução deste «aparente problema», ao prescrever que as resoluções serão desde logo comunicadas aos serviços.
«Face a este regime, é legítimo concluir que, tanto o artigo 43º, nº 1, como o artigo 44º, nº 1, foram redigidos no pressuposto de que entre a data da resolução que origina a aposentação e a sua comunicação ao serviço para desligamento do funcionário medeia um período que, pela sua reduzida dimensão, torna improvável que nele ocorra uma promoção, com o consequente abono de vencimentos superior ao que, até aí, foi auferido. Só neste quadro de raciocínio podem os dois preceitos em causa ser simultaneamente aplicados».
Ou seja: o legislador, ao partir do princípio de que as resoluções são desde logo comunicadas ao respectivo serviço para efeito de desligamento do funcionário, não previu uma mudança de categoria funcional entre esses dois momentos.
 
3.1.2. Estamos, assim, perante um caso omisso, a ser resolvido segundo a norma que o intérprete criaria se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema: por aplicação desta norma e tendo em conta que se trata de matéria que interfere com direitos sociais, impondo a interpretação no sentido mais favorável ao cidadão, «a solução do problema deve passar pela revisão do cálculo da pensão em termos de nele ser incluído o vencimento do último cargo em que o funcionário foi efectivamente empossado e por ele remunerado».
Solução esta que não infringe os artigos 43º, nº 3, e 33º, nº 2, alínea a), pois as alterações de remuneração neles visadas serão as que correspondem aos «aumentos gerais de vencimentos», não englobando «as que resultam de promoção a outro cargo».
 
 
3.2. O referido parecer da Caixa discorda do entendimento expresso na Recomendação.
 
3.2.1. Desde logo, por ele não definir de forma satisfatória o âmbito de aplicação da solução proposta.
«Como é praticamente impossível uma comunicação imediata dos resultados de uma junta médica, por exemplo, é sempre possível, assim o queiram os serviços, promover o funcionário no dia seguinte ao da apresentação à junta. Ora, nessas situações, a comunicação foi ou não feita «desde logo»'? Quer dizer: aplica-se ou não se aplica o nº 1 e o nº 3 do artigo 43º? Mas se a comunicação for feita após uma semana? E após um mês?».
 
3.2.2. A Recomendação, diz-se, não avança um critério operativo que permita distinguir satisfatoriamente os casos em que o artigo 43º se não aplica e aqueles em que há lugar à sua aplicação.
«Resultado que, todavia, não deve surpreender: é que tal critério pressupõe a possibilidade de dar um conteúdo quantitativo ao conceito indeterminado do artigo 99º. Ora, na realidade, ao recorrer a tal conceito, o legislador não quis referir-se a um período temporal, a concretizar quantitativa-mente pelo intérprete, antes se limitou a impor à Caixa um especial dever de celeridade, a cumprir nomeadamente através da comunicação da resolução no mais curto espaço de tempo que as circunstâncias do caso permitirem».
Por outro lado, não parece metodologicamente aceitável interpretar os conceitos indeterminados do artigo 43º à luz do conceito indeterminado do artigo 99º: pelo contrário, a tarefa de preenchimento deste conceito indeterminado é que deve apoiar-se, «até prova em contrário», na fórmula clara do artigo 43º.
 
3.2.3. Da letra da lei - artigos 43º e 33º - resulta ser irrelevante para o cálculo da pensão qualquer alteração da remuneração ocorrida posteriormente à «declaração de incapacidade pela junta médica competente».
«O regime explica-se claramente a partir da inserção sistemática: se o artigo 43º dispõe que o regime da aposentação é determinado pela situação de facto e de direito existente à data de determinados acontecimentos, a sequência lógica tem de ir no sentido da irrelevância dos factos posteriores, desde logo dos factos posteriores que poderiam ser em abstracto relevantes para o cálculo da pensão, a saber, a alteração do tempo de serviço e a alteração da remuneração (artigo 46º). Daí que o nº 2 do artigo 33º determine a irrelevância do tempo de serviço posterior; e daí que o nº 3 do artigo 43º determine a irrelevância das alterações de remuneração posteriores».
Irrelevância esta que abrange - segundo a letra da lei (que não distingue) e a ratio legis exposta - todas as alterações verificáveis, qualquer que seja a sua natureza ou fundamento: à face do princípio da irrelevância dos factos posteriores, não se compreende, nomeadamente, «a razão pela qual uma alteração de remuneração por efeito de uma promoção deverá relevar, mas já não relevará uma alteração de remuneração com outro fundamento».
 
3.2.4. Por seu turno, a solução contida no nº 1 do artigo 44º é «uma especificação ou decorrência deste princípio de fixação do regime da aposentação em função da situação de facto e de direito verificada em determinadas datas. Nessas datas, a que correspondem as diversas alíneas do nº 1 do artigo 43º, o subscritor encontra-se inscrito na Caixa por um determinado cargo e é esse cargo, não o que anteriormente exerceu, nem o que posteriormente venha porventura a exercer, que releva para a aposentação».
A celeridade, expressa no conceito indeterminado «desde logo» - contido no artigo 99º - visa precisamente «evitar que se acentue a desconformidade entre a situação real do interessado e aquela que, nos termos do artigo 43º, pode ser considerada para efeitos de aposentação, quer no plano da remuneração, quer no plano do tempo de serviço».
 
 
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4.1. A interpretação tem por objecto descobrir, de entre os sentidos possíveis da lei, o seu sentido prevalente ou decisivo (2) .
 
O limite da interpretação é a letra, o texto da norma (3).
A apreensão literal do texto, ponto de partida de toda a interpretação, é já interpretação, embora incompleta, pois será sempre necessária uma «tarefa de interligação e valoração que escapa ao domínio literal» (4).
Nesta tarefa de interligação e valoração que acompanha a apreensão do sentido literal, intervêm elementos lógicos, apontando a doutrina elementos de ordem sistemática, histórica e racional ou teleológica.
Segundo a doutrina tradicional, o intérprete, socorrendo-se dos elementos interpretativos acabados de referir, acabará por chegar a um dos seguintes resultados ou modalidades de interpretação: interpretação declarativa, interpretação extensiva, interpretação restritiva, interpretação revogatória e interpretação enunciativa.
Na interpretação declarativa, o intérprete limita-se a eleger um dos sentidos que o texto directa e claramente comporta, por ser esse aquele que corresponde ao pensamento legislativo (5).
Ou seja: há interpretação declarativa quando o sentido da lei cabe dentro da sua letra, quando o intérprete fixa à norma, com o seu verdadeiro sentido, o sentido ou um dos sentidos literais, nada mais fazendo que declarar o sentido linguístico coincidente com o pensar legislativo (6).
A interpretação declarativa pode ser restrita ou lata, segundo toma em sentido limitado ou em sentido amplo as expressões que têm vários significados: tal distinção, como adverte FRANCESCO FERRARA (7), não deve confundir-se com a interpretação extensiva ou restritiva, pois nada se restringe ou se estende quando entre os significados possíveis da palavra se elege aquele que parece mais adaptado à mens legis.
A interpretação restritiva aplica-se quando se reconhece que o legislador, posto se tenha exprimido em forma genérica e ampla, quis referir-se a uma classe especial de relações, e «tem lugar particularmente nos seguintes casos: 1º se o texto, entendido no modo tão geral como está redigido, viria a contradizer outro texto de lei; 2º se a lei contém em si uma contradição íntima (é o chamado argumento ad absurdum); 3º se o princípio aplicado sem restrições, ultrapassa o fim para que foi ordenado» (8).
 
4.2. Na perspectiva dinâmica da sua aplicação, a custo se poderá distinguir, no plano metodológico, entre interpretação e integração do Direito (9): aquela e esta, em face do caso concreto, podem exigir procedimentos metodológicos igualmente complexos, como o recurso a inferências analógicas e a princípios e valores jurídicos gerais (10).
Como escreve KARL LARENZ, a interpretação da lei e o desenvolvimento judicial do Direito não devem ver-se como essencialmente diferentes, mas só como distintos graus do mesmo processo de pensamento (11).
No entanto, na perspectiva (mais estática) da exposição tradicional, tal distinção costuma ser feita, sendo usual a indicação de dois critérios diferentes para definir a linha de fronteira entre os planos de interpretação e da integração do Direito.
Para uns, a indagação do Direito praeter legem inicia-se no extremo limite que separa a interpretação extensiva (da norma jurídica) da aplicação analógica (da mesma norma). A primeira limitar-se-ia a estender a aplicação da norma a casos não previstos pela sua letra mas compreendidos pelo seu espírito; ao passo que a segunda leva a aplicar a norma mesmo a situações que já nem sequer são abrangíveis pelo «seu espírito».
Para outros, entra-se no domínio da indagação e aplicação do Direito praeter legem logo que a situação a regular não seja susceptível de ser abrangida por qualquer interpretação da norma com uma correspondência, ainda que mínima, no enunciado ou fórmula verbal da mesma norma (teoria da alusão) (12).
Como ensina DIAS MARQUES (13), é necessário que a lei, depois de devidamente interpretada, não comporte a solução do problema, pois é óbvio que se o caso estiver contemplado em algum preceito legal, ainda que extensivamente interpretado, não chega a surgir lacuna: vistas as coisas sob este ângulo, importa reconhecer que o problema da interpretação tem sempre a natureza de questão prévia a respeito do da integração e que não é lícito passar a este quando para aquele tenha sido obtida uma solução positiva.
Uma lacuna é uma incompletude insatisfatória no seio de um todo. Aplicado ao Direito, o conceito de lacuna significa que se trata de uma incompletude insatisfatória no seio do todo jurídico (14) .
Incompletude insatisfatória porque representa uma falta ou falha em algo que tende para a completude. Pode, assim, dizer-se, com a doutrina alemã, que uma lacuna é uma «incompletude contrária a um plano» e, tratando-se de uma «lacuna jurídica», que ela consiste numa «imperfeição contrária ao plano do Direito vigente, determinada segundo critérios extraídos da ordem jurídica global».
Para ENGISH, as lacunas são deficiências do Direito positivo, apreensíveis como faltas ou falhas de conteúdo de regulamentação jurídica para determinadas situações de facto em que é de esperar essa regulamentação e em que tais falhas postulam e admitem a sua remoção através de uma decisão judicial jurídico-integradora (15) .
Como escreve BAPTISTA MACHADO (16), existirá uma lacuna quando a lei (dentro dos limites de uma interpretação ainda possível) e o direito consuetudinário não contêm uma regulamentação exigida ou postulada pela ordem global - ou melhor: não contêm uma resposta a uma questão jurídica.
 
4.3. Após sublinhar que a definição de lacuna jurídica tem sido motivo de muitas dúvidas e controvérsia, BIGOTTE CHORÃO (17) fornece uma série de explicações complementares de grande interesse:
a) Essa definição, supõe que a ausência de regulamentação respeita a uma verdadeira questão jurídica. O que se situa no espaço ajurídico (rechtsfreirer Raum) ou «extramuros da cidadela jurídica» está fora de causa [...];
b) Para que se verifique uma lacuna em sentido próprio é ainda necessário que a falta de regulamentação seja contrária ao plano ordenador do sistema jurídico. Não basta, pois, que a situação se possa considerar, em abstracto, susceptível de tratamento jurídico, mas é preciso que este seja exigido pelo ordenamento jurídico concreto. Bem pode acontecer, com efeito, que certo caso não encontre cobertura normativa no sistema, sem que isso frustre as intenções ordenadoras deste. Razões político-jurídicas ponderosas podem estar na base da abstenção do legislador. Esses «silêncios eloquentes da lei» não têm de ser supridos pelo juiz, ainda que este, porventura, em seu critério, entenda o contrário. Diz-se, por isso, que tais faltas de regulamentação constituem lacunas impróprias (de lege ferenda, de jure constituendo, político-jurídicas, criticas, etc.), que even-tualmente poderão vir a desaparecer em futuros desenvolvimentos do sistema, a cargo dos órgãos compe-tentes» [Sublinhados nossos].
 
 
4.4. Há, assim, casos em que a inexistência de regulamentação pode corresponder a um plano do legislador ou da lei, e então a mesma não representa uma «deficiência» que o intérprete esteja autorizado a superar. Como diz ENGISH, «uma tal inexistência planeada de certa regulamentação» (propriamente uma regulamentação negativa) surge quando uma conduta, cuja punibilidade nós talvez aguardemos, «consciente e deliberadamente não é declarada como punível pelo Direito positivo. Se esta impunidade nos cai mal, podemos falar na verdade de uma «lacuna político-jurídica», de uma «lacuna crítica», de uma «lacuna imprópria», quer dizer de uma lacuna do ponto de vista de um futuro Direito mais perfeito («de lege ferenda»); não, porém, de uma lacuna autêntica e própria, quer dizer de uma lacuna no Direito vigente («de lege lata») (18).
Ora, uma lacuna de lege ferenda apenas pode motivar o poder legislativo a uma reforma do Direito, mas não o intérprete a um preenchimento da dita «lacuna». A colmatação das lacunas pelo intérprete pressupõe uma lacuna de lege lata (19).
Há, assim, que distinguir entre lacunas da lei e falhas de política legislativa. A faceta de valoração que deve servir como base para a distinção é diferente em cada situação.
Num caso é a intenção reguladora e a teleologia imanente à própria lei; no outro são «pautas» de uma crítica, no plano da política legislativa, dirigida à lei (20).
4.5. Nos termos do nº 1 do artigo 10º do Código Civil, o julgador deverá aplicar, por analogia, aos casos omissos as normas que directamente contemplem casos análogos - e só na hipótese de não encontrar no sistema uma norma aplicável a casos análogos é que deverá proceder de acordo com o nº 3 do mesmo artigo.
Segundo BAPTISTA MACHADO, «dois casos dizem-se análogos quando neles se verifique um conflito de interesses paralelo, isomorfo ou semelhante e de modo que o critério valorativo adoptado pelo legislador para compor esse conflito de interesses num dos casos seja por igual ou maioria de razão aplicável ao outro» (cfr. nº 2 do artigo 10º) (21).
O caso omisso tem de ter sempre alguma diversidade em relação ao caso previsto. É relativamente semelhante, mas é também relativamente diverso. O que a analogia supõe é que as semelhanças são mais fortes que as diferenças. Há um núcleo fundamental nos dois casos que exige a mesma estatuição. Se esse núcleo fundamental pesar mais que as diversidades, pode afirmar-se que há analogia (22) .
Ou seja, é sempre através de uma valoração, dirigida à descoberta da essência daquela situação, que se pode chegar à afirmação de que existe analogia.
O recurso a analogia como primeiro meio de preenchimento das lacunas justifica-se por uma razão de coerência normativa ou de justiça relativa, recondutível ao princípio da igualdade: tratar igualmente aquilo que é igual. Ou, como escreve BAPTISTA MACHADO, os «casos semelhantes ou conflitos de interesses semelhantes devem ter um tratamento semelhante». A isso acresce ainda uma razão de certeza do Direito, uma vez que é muito mais fácil obter a uniformidade de julgados pelo recurso, com as devidas adaptações, à norma aplicável a casos análogos do que remetendo o julgador para critérios de equidade ou para os princípios gerais do Direito.
 
 
5
5.1. A aposentação é voluntária - quando tem lugar a requerimento do subscritor, nos casos em que a lei a faculta - ou obrigatória, quando resulta de simples determinação da lei ou imposição da autoridade competente (artigo 36º, nº 3, do E.A.).
O processo de aposentação decorre na Caixa Geral de Aposentações e visa essencialmente:
¾ averiguar se os funcionários e agentes candidatos à aposentação preenchem efectivamente todos os requisitos exigidos na lei;
¾ fixar o tempo de serviço contável para tal efeito, se o mesmo não foi já efectuado em processo de contagem prévia;
¾ fixar o início da data da aposentação e o montante da pensão respectiva, se o candidato preencher os requisitos (23).
 
 
5.2. O processo de aposentação é instaurado com base em requerimento do interessado, quando se trate de aposentação voluntária, ou em comunicação do serviço de que o mesmo dependa, no caso de ser obrigatória (artigo 84º, nº 1).
Assim se inicia uma tramitação processual que culmina, uma vez concluída a instrução, na resolução final a proferir pela Administração da Caixa «sobre o direito à pensão de aposentação e sobre o montante desta, regulando definitivamente a situação do interessado» (artigo 97º, nº 1).
Esta resolução é «desde logo» comunicada aos serviços onde o subscritor exerça funções e, com base nessa comunicação, o subscritor é desligado do serviço, ficando na situação de aguardando aposentação (aposentando) - a auferir uma pensão transitória de aposentação - até ao fim do mês em que for publicada a lista dos aposentados com a inclusão do seu nome (artigo 99º, nºs 1 e 2).
No dia 1 do mês seguinte ao da publicação oficial da lista dos aposentados em que se inclua o seu nome, verifica-se então a passagem do interessado à situação de aposentação (artigos 73º e 100º).
 
 
5.3. Assim sendo, sempre se verificará um período de tempo mais ou menos longo entre o momento da desligação do serviço (aguardando aposentação) e o momento da resolução final da Caixa e, também, entre aquele e o da passagem à situação de aposentação.
E não só: pela própria natureza das coisas, face ao iter processual atrás delineado, também decorre um lapso de tempo entre o facto gerador do processo de aposentação e a desligação do serviço.
Por seu turno, entre aquele facto e a desligação do serviço interpõe-se o acto determinante da aposentação (podendo verifi-car-se a existência de um período de tempo para além deste acto durante o qual tem lugar a «situação anómala» (24) de o funcionário continuar a prestar obrigatoriamente serviço e a perceber o vencimento).
 
 
5.4. Compreende-se agora melhor que o legislador, para a fixação do regime de aposentação, pudesse considerar relevante um de vários momentos: resolução final do processo de aposentação (artigo 97º), passagem à situação de aguardando aposentação (artigo 99º), passagem á situação de aposentação (artigos 73º e 100º), o facto determinativo da aposentação.
Ora, resulta clara e seguramente do transcrito artigo 43º que, regra geral, o legislador manda atender á data do facto gerador da aposentação, certamente por considerar que, na generalidade dos casos, todas as condições estão verificadas em data bastante antecedente à daquelas ocorrências. Atendeu-se, pois, ao momento em que se completaram todas as condições determinativas da aposentação - e que não é o mesmo para as diversas modalidades -, afastando, portanto, os factos verificados posteriormente à época da aposentação, definida esta em função do dia em que ocorreu o acto que lhe deu causa (25).
Assim, se a aposentação se funda em incapacidade, é a data da sua declaração pela junta médica que fixa o «limite de facto e de direito» a considerar (artigo 43º, nº 1, alínea b)).
Se a aposentação é requerida pelo interessado e não depende de verificação de incapacidade (artigo 43º, nº 1, alínea a)), poderia atender-se à data do requerimento.
Todavia -pondera SIMÕES DE OLIVEIRA (26) -, «a lei considerou conveniente uma verificação administrativa do direito de requerer a aposentação, tal como não se contentou com a data em que o interessado se incapacitou, exigindo ulterior declaração desta incapacidade. Por isso e porque entre a data do requerimento (como a da ocorrência da incapacidade) e a da resolução do processo de aposentação pode decorrer ainda largo tempo (inclusivamente achando-se o funcionário em serviço com mais tempo aproveitável para a aposentação e podendo sobrevir outras alterações relevantes) será sempre a resolução que reconheça o direito de requerer a aposentação a marcar a data decisiva».
5.5. De entre as várias datas abstractamente atendíveis para a fixação do regime de aposentação, o legislador optou, pois, deliberada e conscientemente, pela data do acto que a determine (inspirando-se na solução consagrada no artigo 430º, § 6º, do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino (27) (28)).
E, em sintonia e coerência, proclamou dois princípios que decorrem logicamente da opção tomada:
¾ na contagem final do tempo de serviço para a aposenta-ção atende-se (apenas) ao tempo decorrido até à data do seu acto ou facto determinante (artigo 33º, nº 2, alínea a));
¾ irrevelância de qualquer alteração de remunerações ocorrida posteriormente a essa data (artigo 43º, nº 3).
Portanto, no tocante a dois factos/elementos atendíveis para o cálculo da pensão - tempo de serviço e remuneração - o legislador declarou a sua irrelevância quando ocorridos posteriormente a certa data.
Quer dizer: a lei manda «desprezar» na contagem final do tempo de serviço qualquer período de tempo posterior à data do facto determinante da aposentação, embora o legislador não ignorasse que pode dar-se o caso de o funcionário ser obrigado a continuar a prestar serviço após aquela data.
Retenha-se, por outro lado, que o citado nº 3 do artigo 43º não parece consentir que se distinga consoante a «fonte» ou «causa» da alteração de remunerações, reportando-se genericamente a «qualquer» alteração.
 
6
Muitas foram as vezes em que este corpo consultivo foi chamado a pronunciar-se sobre a interpretação dos preceitos do Estatuto da Aposentação mais implicados no presente parecer.
As conclusões sempre foram no sentido de que o regime da aposentação se fixa com base na lei em vigor e na situação existente à data em que se verique o facto que lhe deu causa, sendo irrelevantes quaisquer alterações de remunerações ocorridas poste-riormente a essa data (29).
Mais especificamente, houve mesmo o ensejo de apreciar situações em que se registou alteração de remunerações entre a data do facto determinante da aposentação e a data da desligação do serviço (situação que na consulta está em causa).
Nuns casos, essa alteração decorria de diplomas de actualização de vencimentos entretanto publicados (30); noutros, resultou da criação de diuturnidades pelo Decreto-Lei nº 330/76, de 7 de Maio (31); e no parecer nº 114/77, a «superior remuneração» correspondia a «promoção» a outra categoria.
Concluiu-se neste último parecer:
1º Nos termos do artigo 43º, nº 1, alínea a), do Estatuto da Aposentação, o escriturário-dactilógrafo que em 16 de Setembro de 1975 requereu a sua aposentação voluntária, ao abrigo do preceituado no artigo 37º do mesmo diploma, e a quem foi reconhecido o correspondente direito por despacho de 11 de Novembro de 1975 da Caixa Geral de Aposentações, deverá ser aposentado tendo em conta a remuneração que, nesta última data, recebia e a lei então em vigor.
 
2º É irrelevante, para efeitos da aposentação daquele escriturário, que, depois do despacho a que se alude na anterior conclusão mas antes da resolução proferida no respectivo processo de aposentação, nos termos do artigo 97º, do mesmo Estatuto, haja transitado para categoria a que corresponde remuneração superior».
 
 
7
Chegou o momento de tomar posição sobre o dissídio interpretativo que está na base desta consulta.
Não descortinamos - convém referi-lo - motivação válida para abandonar a orientação desde há muito sustentada neste Conselho.
Por isso, nas considerações desenvolvidas ao longo do parecer deixámos desde logo transparecer que propendemos para a interpretação defendida no parecer da Caixa (32), pese embora o respeito que nos merece a tese oposta.
 
7.1. A solução contida na Recomendação do Senhor Provedor de Justiça assenta no pressuposto de que existe um caso omisso carecido de regulamentação, a integrar nos termos do nº 3 do artigo 10º do Código Civil.
Ora, se bem pensa, no caso em análise não existe uma verdadeira lacuna.
Do oportunamente exposto sobre este tema (cfr. ponto 4.), conclui-se que para se poder afirmar a existência de uma lacuna não basta deparar com uma situação que se possa considerar, em abstracto, susceptível de tratamento jurídico, sendo ainda necessário determinar se ela deve ser juridicamente regulada - tem, pois, de se encontrar algum indício normativo que permita concluir que o sistema jurídico requer a consideração e solução daquela situação (33).
O que, em nossa opinião, se não verifica na situação que nos ocupa.
Consoante se ponderou no citado parecer nº 90/86, «o carácter de generalidade e abstracção das normas jurídicas e a própria necessidade de certeza do direito obrigam o legislador a uma hierarquização de valores, tendo como resultado a exclusão de situações que, podendo, à partida, apresentar-se como merecedo-ras de tutela, não foram, na hipótese contempladas. Sendo dever do intérprete presumir, como princípio, que o legislador elaborou um sistema completo, não pode ele recuperar aquelas situações sem risco de grave subversão das regras da hermenêutica».
7.2. Estamos, pois, perante um problema de interpretação.
Decisivamente em causa, as normas dos artigos 33º, nº 2, alínea a), e 43º, nºs 1 e 3.
Delas resulta claramente que o legislador elegeu, de entre as vários possíveis, a data do acto determinante como a relevante para definir o regime da aposentação.
A opção por aquela data não pode deixar de entender-se como valendo para a definição de todo o regime da aposentação.
E, como se disse, (cfr. ponto 5.5.), logo o legislador cuidou de proclamar, com logicidade, a irrelevância dos factos posteriores a essa data no concernente a tempo de serviço (artigo 33º, nº 2, alínea a)) e a remunerações (artigo 43º, nº 3).
Sublinhe-se agora que, no tocante ao tempo de serviço prestado ulteriormente à data do acto determinante, o legislador não hesitou em o declarar não contável, apesar de se tratar de uma situação de verificação muito mais frequente que a alteração de remunerações (sobretudo se esta decorre de uma promoção, como é o caso da consulta).
Como oportunamente pusemos em destaque, o nº 3 do artigo 43º reporta-se genericamente a «qualquer» alteração, sem distinguir a sua natureza ou fonte, pelo que redundaria numa interpretação restritiva - que nem a letra nem a ratio legis autorizariam - excluir do âmbito da sua previsão alterações de remuneração emergentes de uma promoção (34) .
7.3. A interpretação que se vem defendendo, em consonância, como vimos, com a orientação uniforme deste Conselho, corresponde também ao entendimento perfilhado por SIMÕES DE OLIVEIRA, como resulta, nomeadamente, das seguintes passagens:
¾ Após referir que o artigo 47º distingue entre remunera-ção-base e remunerações acessórias, escreve de seguida: «Quanto à primeira, é de considerar o montante que legalmente corresponde ao cargo no momento relevante para a aposentação (V. artigo 43º)» (35).
¾ em anotação ao artigo 50º, considera: «os dois últimos anos a que o artigo se reporta são os que precedem o momento a que o artigo 43º dá relevância final. Durante tal período várias hipóteses podem dar-se: a) O subscritor exerceu sempre o mesmo cargo. Então é indiferente que a respectiva remuneração se mantenha igual, ou que haja uma reforma de ordenados a alterá-la ou o adicionamento ou supressão de uma remuneração complementar, pois sempre será aplicável o regime do artigo 47º - remuneração em vigor na data que interessa à aposentação. [...] c) O subscritor, depois de exercer um cargo, foi investido noutro com remuneração permanen-te superior, mas, à data relevante para a aposentação, a lei (ou a Administração ao abrigo dela) já igualara as remunerações de ambos os cargos. Igualmente se mantém a aplicação exclusiva da regra do artigo 47º, nº 1. d) O subscritor exerceu dois ou mais cargos diferentes e as suas remunerações permanentes, tivessem sido ou não iguais, são desiguais à data a que se reporta o artigo 43º ...» (Sublinhados de nossa autoria) (36) .
 
 
7.4. Em abono deste nosso entendimento poderá ainda apelar-se, segundo cremos, ao disposto no artigo 4º, nº 1, do Decreto-Lei nº 52/75, de 8 de Fevereiro, do seguinte teor:
«A remuneração mensal a considerar para efeitos de cálculo da pensão é a que respeitar à categoria ou cargo do agente à data em que ocorrer o facto ou acto determinante da aposentação, qualquer que seja o título legal do seu desempenho» (37).
 
E o argumento sai reforçado se tivermos presente que o objectivo confessado deste diploma foi harmonizar, em determinados aspectos, os regimes da aposentação (e da pensão de sobrevivência) dos servidores civis do Estado em serviço nos territórios ultramarinos com os vigentes no continente e ilhas (do preâmbulo).
 
 
7.5. Por último, refira-se que ao entendimento que vimos sustentando, também parece conduzir, se bem pensamos, a solução defendida por JOÃO ALFAIA a propósito da questão de saber qual o momento em que se inicia a situação de desligação do serviço aguardando aposentação: momento até ao qual é contado o tempo de serviço para efeitos de aposentação (artigo 33º, nº 2)? Momento do recebimento, pelos serviços, da comunicação da resolução da Caixa (artigo 99º, nº 2)? Publicação da desligação do serviço (artigo 100º, nº 2)?
Na verdade, embora lhe reconheça uma certa «dissonância», aquele autor acaba por adoptar uma solução que passa pela conciliação dos artigos 33º, nº 2, e 99º, nº 2, nos seguintes termos:
«No momento - variável consoante os factos determinantes da aposentação - em que deixa de haver contagem de tempo de serviço para efeitos de aposentação (nº 2 do artigo 33º) verifica-se segundo julgamos a cessação da situação de subscritor ou pelo menos dos seus efeitos [...].
Esta última hipótese abre-nos caminho à conciliação do disposto no citado artigo 33º, nº 2, com o preceituado no nº 2 do artigo 99º: De harmonia com a letra deste último, a situação de desligação do serviço verifica-se a partir do momento em que é recebida pelos serviços a que o funcionário ou agente pertence, a comunicação da resolução da Caixa nesse sentido; mas tal desligação do serviço produz efeitos retroactivos à data em que cessou a contagem de tempo de serviço para efeitos de aposentação» (Sublinhados nossos) (38) (39).
 
 
7.6. Na Recomendação do Senhor Provedor de Justiça entende-se que, na situação em apreço, os artigos 43º, nº 1, e 44º, nº 1 se revelam incompatíveis: a aplicação de qualquer deles obsta à eficácia do outro (40).
Recorde-se o seu conteúdo.
«O regime da aposentação fixa-se com base na lei em vigor e na situação existente à data em que: ...» (artigo 43º, nº 1).
«O subscritor é aposentado pelo último cargo em que esteja inscrito na Caixa» (artigo 44º, nº 1).
 
7.6.1. Interessará antes de mais sublinhar - já que tal especificação não foi feita nem na Recomendação, nem no parecer da Caixa - que o nº 1 do artigo 44º se refere expressamente ao último cargo pelo qual o subscritor esteja inscrito na Caixa.
Manda-se, pois, atender ao cargo pelo qual o subscritor está inscrito e não ao cargo que anteriormente exerceu ou àquele que ulteriormente venha, porventura, a exercer.
Ora, esse último cargo será, em regra, o cargo de que o subscritor é titular e que exerce à data do facto determinante da aposentação.
Na verdade, encontrando-se já pendente o processo de aposentação, só muito dificilmente se compreenderá a inscrição de um subscritor em cargo a que foi promovido posteriormente àquela data (do facto determinante da aposentação) (41).
Significa o exposto que a questão em análise só interessará naqueles limitados casos em que se verifique, após o momento relevante para a aposentação, inscrição em cargo diferente, que confira maior remuneração.
 
7.6.2. Como quer que seja, afigura-se que o transcrito artigo 44º, nº 1, não assumirá um papel decisivo na dilucidação da questão que nos foi posta, nem, por outro lado, contraria a solução que perfilhamos.
Na verdade, atente-se que uma coisa é o cargo pelo qual se verifica a aposentação (artigo 44º) e outra é a remuneração mensal relevante para o cálculo da pensão de aposentação (artigo 47º).
E se a parte final do nº 1 deste artigo 47º, ao falar em remunerações «que respeitem ao cargo pelo qual o subscritor é aposentado», remete para aquele artigo 44º, sempre restaria demonstrar a que momento relevante se há-de reportar o último cargo a que alude o artigo 44º.
Como se disse, este preceito não manda atender ao último cargo efectivamente exercido, mas ao último cargo pelo qual o subscritor está inscrito.
Mas inscrição à data do facto determinante da aposentação ou da desligação do serviço?
Face ao direito constituído e à correcta interpretação do complexo normativo que o E.A. dedica à matéria (42), pensa-se que a opção pelo primeiro termo da alternativa é a solução correcta, assim se excluindo a (aparente) incompatibilidade entre os nºs 1 dos artigos 43º e 44º.
É o que resulta de tudo quanto, a propósito, se discorreu, não sendo despiciendo recordar de novo o disposto no nº 1 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 52/75 (cfr. ponto 7.4.): a remuneração mensal atendível para o cálculo da pensão é a que respeitar à categoria ou cargo do subscritor à data do facto determinante da aposentação.
 
Conclusão:
8
Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:
1ª O regime da aposentação fixa-se com base na lei em vigor e na situação existente à data em que se verifique o facto que lhe deu causa (artigo 43º do Estatuto da Aposentação);
2ª. É irrelevante qualquer alteração de remunerações ocorrida posteriormente à data a que se refere o nº 2 do artigo 33º (artigo 43º, nº 3, do mesmo Estatuto);
3ª. Face às conclusões anteriores, a remuneração mensal a considerar para o cálculo da pensão é a que corresponder à categoria ou cargo do subscritor à data do acto determinante da aposentação, sendo irrelevante que entre esta data e a desligação do serviço se tenha verificado um aumento de remuneração por promoção do subscritor.
 


(1) Aprovado pelo Decreto-Lei nº 498/72, de 9 de Dezembro, tem sofrido várias alterações.
(2) Na exposição que vai seguir-se acompanharemos quase textualmente o parecer nº 61/91, publicado no «Diário da República», II Série, nº 274, de 26/11/92.
(3) Sobre a matéria, cfr. KARL LARENZ, Metodologia da Ciência do Direito, 2ª ed., tradução, p.p. 369 e segs. e 399-400; BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 4ª reimpr., Coimbra, 1990, p.p. 183-188; FRANCESCO FERRARA, Introdução e Aplicação das Leis, tradução de Manuel Andrade, 2ª ed., 1963, p.p. 138 e segs.; JOSÉ OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito, Introdução e Teoria Geral, 4ª ed., Revista Editorial Verbo, 1987, p.p. 345 e segs.; JOÃO DE CASTRO MENDES, Introdução ao Estudo do Direito, Lisboa 1984, p.p. 252-255.
(4) JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, ob. e loc. cits.
(5) BAPTISTA MACHADO, ibidem p. 185.
(6) JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, JOÃO CASTRO MENDES e FRANCESCO FERRARA, ob. cit. e loc. cit., p.p. 348, 252 e 174, respectivamente.
(7) Ob. e loc. cits., págs. 147-148.
(8) FRANCESCO FERRARA, ibidem, pág. 149.
(9) Nos desenvolvimentos que se seguem acompanharemos de muito perto os pareceres nºs 90/88, 10/91 e 73/91, de 9/3/89, 21/3/91 e 9/1/92, publicados no «Diário da República», II Série, nºs 129, de 6/6/89, 172, de 28/7/92, e 111, de 14/5/92, respectivamente.
(10) J. BAPTISTA MACHADO, ob. cit., p. 192 e segs..
(11) Ob. cit., p. 443.
(12) J. BAPTISTA MACHADO, loc. cit. p. 193.
(13) Introdução ao Estudo do Direito, Lisboa, 1979, págs. 268-269.
(14) KARL ENGISH, Introdução ao Pensamento Jurídico, 6ª ed., trad. de J. Baptista Machado, Fundação Calouste Gulbenkian, p. 276.
(15) KARL ENGISH, loc. cit., págs. 279 e segs.
(16) Ob. e Loc. cits., págs. 194 e segs.
Cfr. também OLIVEIRA ASCENSÃO, loc. cit., págs. 347 e segs..
(17) Temas Fundamentais de Direito, Livraria Almedina, Coimbra, 1986, págs. 231 e segs.
(18) Por outras palavras: nem todos os «silêncios» da lei são lacunas, havendo silêncios que são significativos, traduzindo, por isso, uma «resposta» da lei a certa questão de direito.
Nem sempre existe uma lacuna onde a lei se cala, pois há silêncios eloquentes da lei (KARL LARENZ, ob. e loc. cits,, pág. 428).
(19) KARL ENGISH, ob. e loc. cits., págs. 281-282.
(20) KARL LARENZ, ob. e loc. cits., págs. 452 e segs.
O autor remata com a afirmação de que, se a lei não está incompleta, mas defeituosa, então o que está indicado é não uma integração de lacunas, mas, em última instância, um desenvolvimento do Direito superador da lei.
(21) Ob. e loc. cits., pág. 202.
(22) Cfr. OLIVEIRA ASCENSÃO, loc. cit., pág. 424; BIGOTTE CHORÃO, loc. cit., págs. 242 e segs.; KARL LARENZ, loc cit., págs. 461 e segs.
(23) JOÃO ALFAIA, Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público, 2º vol., Livraria Almedina, Coimbra 1988, pág. 1072.
(24) JOÃO ALFAIA, loc. cit., pág. 1053.
(25) SIMÕES DE OLIVEIRA, Estatuto da Aposentação, 1973, págs. 118 e 119.
(26) Loc. cit., pág. 119.
(27) Redacção do Decreto nº 49165, de 2/8/69.
Na respectiva anotação, FERREIRA SEMEDO, Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, 3ª edição, 1973, pág. 482, escreveu: «Outra inovação muito importante foi a da fixação do regime jurídico da aposentação conforme o acto que a determine. Deixou de haver flutuação de critérios e dúvida a este respeito».
(28) No acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2/11/75 (in Acórdãos Doutrinais, nº 205, pág. 37) ponderou-se que o direito à fixação da pensão, pelo regime vigente à data do acto determinativo da aposentação, reconduz-se a uma pura situação jurídica objectiva - só com o acto de fixação efectiva da pensão se pode gerar uma situação jurídica subjectiva (cfr., também os pareceres nºs 39/70, no D.G. de 3/12/70, 45/77, no «Diário da República», de 3/5/78, 82/77, no Bol. nº 277, pág. 82, 37/80, de 10/7/80, e D.R. de 20/1/78, 30/83, no D.R. de 28/6/84 e 50/83, no Bol. nº 337, pág. 121.
Ou seja: uma coisa é o direito subjectivo ou situação jurídica do aposentado ao recebimento da pensão e outra é o direito abstracto e geral dos funcionários à aposentação, susceptível de ser modificado pela lei.
(29) Cfr., entre outros, os pareceres nº 40/77, no «Diário da República», II Série, de 5/9/77, e Bol., nº 277, pág. 42, nº 82/77, no Bol. nº 82, pág. 82, nº 114/77, no «Diário da República», de 21/10/77 e Bol. nº 277, pág. 82, nº 171/77, de 10/11/77, nº 240/77, de 24/11/77, nº 17/78, no Bol. nº 286, pág. 99, nº 213/79, no Bol. nº 277, pág. 62, nº32/80, no Bol. nº 302, pág. 108, nº 73/80, no «Diário da República», de 15/1/81, e Bol. nº 303, pág. 46, nº 198/80, no Bol. nº 330, pág. 272, nº 19/81, no «Diário da República» de 28/12/82 e nº 58/83, no «Diário da República» de 10/9/84 e Bol. nº 337, pág. 121.
(30) Pareceres nºs 171/77 e 240/77.
(31) Pareceres nºs 40/77, 82/77 e 240/77.
(32) Em despacho de concordância exarado sobre este parecer, consignou-se: «De resto, desde que o Estatuto da Aposentação entrou em vigor (1973) sempre foi seguida orientação diferente da sustentada na Recomendação, não existindo qualquer caso decidido pelos tribunais contra tal orientação».
(33) OLIVEIRA ASCENSÃO, loc. cit., pág. 361.
(34) Como se defende na Recomendação, ao considerar que os normativos em causa visam (apenas) os aumentos gerais de vencimentos, não abrangendo os que resultam de promoção a outro cargo.
(35) Loc. cit., pág. 125.
(36) Loc. cit., pág. 130.
Cfr., ainda, a passagem transcrita no ponto 5.4.
(37) A natureza regulamentar do Decreto nº 52/75 fez surgir a questão da sua ilegalidade, na parte em que contrariava o regime do EFU, este aprovado por Decreto, com força de Decreto-Lei - o Decreto nº 46982.
Porém, na parte que aqui nos interessa (artigo 4º), a eventual ilegalidade daquele diploma foi sanada pelo Decreto-Lei nº 568/75, de 4 de Outubro, que mandou retrotrair a 1 de Janeiro de 1973 (data da entrada em vigor do actual E.A.) a vigência do citado artigo 4º (para maiores desenvolvimentos cfr. Parecer nº 58/83).
(38) Loc. cit., pág. 1049.
(39) «A desligação do serviço retroage à data do facto ou acto determinante da aposentação» (artigo 444º, § 1º, do E.F.U.).
(40) Em nosso entender, nenhum elemento interpretativo aponta para que os artigos 43º, nº 1, e 44º, nº 1, pressuponham que «entre a data da resolução que origina a aposentação e a sua comunicação ao serviço para desligamento do funcionário medeia um período que, pela sua reduzida dimensão, torna improvável que nele ocorra uma promoção» (cfr. ponto 3.1.1.).
(41) A inscrição efectua-se mediante boletim a preencher pelo respectivo serviço (artigo 3º).
Segundo SIMÕES DE OLIVEIRA, loc. cit., pág. 27, as mudanças de situação dentro do mesmo serviço, designadamente por transferência ou promoção, não importam a remessa de novo boletim, se a anterior situação já tornara obrigatória a remessa do boletim dando lugar à inscrição inicial do interessado como subscritor.
(42) Numa dada perspectiva poder-se-á justificar se recorde aqui a afirmação de KARL LARENZ: se a lei não está incompleta, mas defeituosa, então o que está indicado é não uma integração de lacunas, mas, em última instância, um desenvolvimento do direito superador da lei (cfr. nota 21). 
Anotações
Legislação: 
EA72 ART33 ART43 ART44 ART99 ART100.
EFU66 ART430 ART444.
DL 52/75 DE 1975/02/08 ART4 N1.
DL 568/75 DE 1975/10/04.
Jurisprudência: 
AC STA DE 1975/11/02 IN AD 205 PAG37.
Referências Complementares: 
DIR ADM * FUNÇÃO PUBL * PENSÕES / DIR CIV * TEORIA GERAL.*****
* CONT REFPAR
P000901986
P000401977
P000821977
P001711977
P002401977
P000171978
P002131979
P000321980
P000731980
P001981980
P000581983
Divulgação
Número: 
DR116
Data: 
19-05-1994
Página: 
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