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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
116/1990, de 20.12.1990
Data do Parecer: 
20-12-1990
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Defesa Nacional
Relator: 
HENRIQUES GASPAR
Descritores e Conclusões
Descritores: 
DEFICIENTE DAS FORÇAS ARMADAS
RISCO AGRAVADO
RISCO ESPECIFICO
Conclusões: 
1 - O Decreto-Lei nº 319/84, de 1 de Outubro, ampliou o elenco dos beneficiarios do regime instituido pelo Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, abrangendo nele, entre outros, os cidadãos portugueses que, como elementos pertencentes as corporações de segurança ou similares existentes nos antigos territorios ultramarinos, ou como meros civis, se tenham deficientado conformemente ao definido nos artigos 1º e 2º deste ultimo diploma;
2 - Beneficiam tambem do regime referido na conclusão anterior os individuos que, a data da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 319/84, tivessem pendente processo de conservação ou aquisição da nacionalidade portuguesa;
3 - O acidente ocorrido em 1/Julho/73, na ex-Provincia da Guine que vitimou o soldado-miliciano (...), foi produzido em circunstancias meramente ocasionais, provenientes de um acto voluntario e isolado de terceiro, sem relação com qualquer risco especifico proprio da actividade militar, não sendo, por isso, enquadravel no disposto no nº 4 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/76 de 20 de Janeiro, com referencia ao artigo 1º, nº 2, deste diploma legal.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Secretário de Estado Adjunto do
Ministro da Defesa Nacional,

Excelência:



1.


A fim de ser emitido parecer a que se refere o nº 4 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, determinou Vossa Excelência o envio à Procuradoria-Geral do processo respeitante ao acidente de que foi vítima o soldado milícia nº 1087/73, (...).
Cumpre, pois, emiti-lo.


2


. Do processo extrai-se, com relevo, a seguinte matéria de facto:
- No dia 1 de Julho de 1973, na via pública, junto a um café - "snack-bar" em CUMARÉ, na ex-Província da Guiné, o soldado milícia (...), que se dirigia para o aquartelamento existente nas proximidades, onde recebia treino militar, foi atingido em consequência de rebentamento de uma granada de mão-defensiva.
- O engenho foi lançado por um militar para junto de um grupo de indivíduos naturais da ex-Província, que se encontravam no exterior do referido estabelecimento, na sequência da discussão entre um elemento do grupo e o referido militar, provocando mortos e feridos.
- O militar que lançou a granada encontrava-se na ocasião sob forte perturbação psicológica e emocional.
- Do acidente resultaram ferimentos no soldado milícia (...) que determinaram em 27/SET/1973 a transferência para o HMP.
- A JHI/HMP, em 22/FEV/74 considerou o referido militar "incapaz do exercício das suas funções", e em sessão de 16/ABRIL/74 a Junta de Saúde da ex-Província da Guiné atribuiu-lhe uma desvalorização de 30% por "lesão do nervo ciático popliteu externo bilateral".
- Por despacho de 27/JANEIRO/75 do Comdt. do CTI da Guiné o desastre sofrido pelo soldado milícia foi considerado como não ocorrido em serviço.
- Na sequência de requerimento de 24/AGOSTO/86 para revisão do processo a fim de que o "acidente fosse considerado como ocorrido em serviço de campanha", a JHI/HMP, em sessão de 10/FEV/87 considerou o referido militar "incapaz de todo o serviço militar" e apto parcialmente para o trabalho com uma desvalorização de 35,6%.
- A CPIP/DSS, no Parecer 93/87, de 12 de Março, considerou que o motivo pelo qual a JHI julgou o referido militar incapaz para o exercício das suas funções resultou das lesões sofridas no acidente ocorrido em 1/JULHO/77, na Guiné; este parecer foi homologado, por despacho de 12/AGOSTO/87 do Brigadeiro DSJD, com o aditamento de "em serviço".
- Em requerimento de 14 de Fevereiro de 1990, o soldado milícia Baldé solicitou nova revisão do processo, pretendendo a qualificação do acidente como ocorrido em campanha, e alegando os "condicionalismos da situação de guerra então decorrente na altura do sinistro que o vitimou".
- Por despacho de 2 de Março de 1990, publicado no Diário da República, II Série, nº 75, de 30 de Março de 1990, foi conservada a nacionalidade portuguesa a (...).

3.


Interessa, antes de mais, como questão prévia, verificar se o requerente reúne os pressupostos exigidos pelo Decreto-Lei nº 319/84, de 1 de Outubro, para a qualificação de deficiente das Forças Armadas (assim,.se interpretando, o requerimento para a revisão do processo, em que apenas se solicita que o "acidente seja considerado" como acto derivado do serviço de campanha).
Dispõe o mencionado Decreto-lei nº 319/84, no que releva:
....................................................
"Artigo 1º - Aos cidadãos portugueses que como elementos pertencentes a corporações de segurança e similares ou como civis, colaborando em operações militares de apoio às Forças Armadas nos antigos territórios do ultramar, adquiriram uma diminuição da capacidade geral de ganho em resultado de acidente ocorrido nas condições definidas nos artigos 1º e 2º do Decreto-Lei nº 43/76, de 10 de Janeiro, é reconhecido o direito à percepção de uma pensão de invalidez, bem como ao gozo dos direitos e regalias constantes das disposições aplicáveis dos artigos 4º, 5º, 10º, 11º, 12º, 13º,14º, 15º e 16º do mesmo diploma.
Artigo 2º 1 - A qualificação dos casos previstos no artigo anterior compete ao Ministro da Defesa Nacional, o qual poderá ouvir a Procuradoria-Geral da República, após instrução dos respectivos processos pelo ramo das Forças Armadas ao serviço do qual foi adquirida a deficiência.
2 - A instrução dos processos regular-se-á pela legislação aplicável aos deficientes das Forças Armadas (DFA).
3 - A qualificação referida no nº 1 deverá ser requerida pelos interessados no prazo de 3 meses após a entrada em vigor do presente diploma.
4 - Os indivíduos que à data da entrada em vigor deste diploma tiverem pendentes processos de conservação ou aquisição da nacionalidade portuguesa poderão requerer a qualificação prevista no nº 1, no prazo referido no número anterior a partir da data do reconhecimento ou da obtenção da nacionalidade.
.....................................................".
"O diploma pretende contemplar os "cidadãos portugueses", elementos pertencentes a corporações de segurança e similares ou civis, que, colaborando em operações de apoio às Forças Armadas nos antigos territórios do Ultramar, adquiriram uma diminuição da capacidade geral de ganho em resultado de acidente ocorrido nas condições definidas nos artigos 1º e 2º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro.
O diploma vai ainda abarcar indivíduos para quem passou a ser necessária, com a descolonização e a ascensão à independência dos territórios onde tinham nascido, uma apreciação individual tendente à conservação ou à aquisição da cidadania portuguesa - cfr. o disposto no decreto-Lei nº 308-A/75, de 24 de Junho.

Por isso se dispõe no nº 4 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 319/84 que os indivíduos que, à data da entrada em vigor do diploma, tiverem pendentes processos da conservação ou aquisição da nacionalidade portuguesa, podem requerer a sua qualificação como deficientes das Forças Armadas, no prazo de três meses a partir da data do reconhecimento ou da obtenção da nacionalidade" (1.

O prazo previsto no artigo 1º, nº 3 do Decreto-Lei nº 319/84 foi renovado através do Decreto-Lei nº 267/88, de 1 de Agosto - podendo ser de 90 dias contados desde a data da entrada em vigor deste diploma.

4.


Referindo-se, embora sem demonstração documental, que o requerente tinha pendente processo para conservação da nacionalidade portuguesa, passa-se a examinar o fundo da questão, na perspectiva em que o parecer é solicitado, isto é, sobre a eventual subsunção do acidente às situações de risco agravado equiparável, previstas no artigo 2º, nº 4, do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro.

Dispõe este diploma:
Artigo 1º,
1. (...)
2 - É considerado deficiente das forças armadas portuguesas o cidadão que:
No cumprimento do serviço militar e na defesa dos interesses da Pátria adquiriu uma diminuição na capacidade geral de ganho;
quando em resultado de acidente ocorrido:
Em serviço de campanha ou em circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha, ou como prisioneiro de guerra;
Na manutenção da ordem pública; ou
Na prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública; ou
No exercício das suas funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores;
vem a sofrer, mesmo a posteriori, uma diminuição permanente, causada por lesão ou doença, adquirida ou agravada, consistindo em:
Perda anatómica; ou
Prejuízo ou perda de qualquer órgão ou função;
tendo sido, em consequência, declarado, nos termos da legislação em vigor:
....................................................
Incapaz de todo o serviço militar".
3 - Não é considerado DFA o militar que contrair ou sofrer doenças ou acidentes intencionalmente provocados pelo próprio, provenientes de acções ou omissões por ele cometidas contra ordens expressas superiores ou em desrespeito das condições de segurança determinadas por autoridades competentes, desde que não justificadas".

Artigo 2º
(Interpretação de conceitos contidos no artigo 1º)
"1. Para efeitos da definição constante do nº 2 do artigo 1º deste decreto-lei, considera-se que,
a) .................................................
b) É fixado em 30% o grau de incapacidade geral de ganho mínimo para o efeito da definição de deficiente das forças armadas e aplicação do presente decreto-lei".
"2. O "serviço de campanha ou campanha" tem lugar no teatro de operações onde se verifiquem operações de guerra, de guerrilha ou de contraguerrilha e envolve as acções directas do inimigo, os eventos decorrentes de actividade indirecta do inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade terrestre, naval ou aérea de natureza operacional.
"3. As "circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha" têm lugar no teatro de operações onde ocorram operações de guerra, guerrilha ou de contraguerrilha e envolvem os eventos directamente relacionados com a actividade operacional que pelas suas características impliquem perigo em circunstâncias de contacto possível com o inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade de natureza operacional, ou em actividade directamente relacionada, que pelas suas características próprias possam implicar perigosidade.
"4. "O exercício de funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores" engloba aqueles casos especiais, aí não previstos que, pela sua índole, considerado o quadro de causalidade, circunstâncias e agentes em que se desenrole, seja identificável com o espírito desta lei" (2.

Há, então, que apreciar se o acidente é enquadrável no 'item' respeitante às situações de exercício de funções e deveres militares, de que resulte, necessariamente, risco agravado às restantes situações previstas expressamente.
Este Conselho tem entendido que o regime jurídico dos deficientes das Forças Armadas, fundado no nº 2 do artigo 1º, explicitado pelo artigo 4º do artigo 2º, do Decreto-Lei nº 43/76, abrange somente casos que pelo seu circunstancialismo justifiquem uma equiparação, em termos objectivos, às outras situações de facto, descritas no artigo 1º (de serviço de campanha ou em circunstâncias com ele relacionadas, de prisioneiro de guerra, de manutenção da ordem pública e da prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública), por corresponderem a actividades próprias da função militar ou inerentes à defesa de altos interesses públicos, importando sujeição a um risco que excede significativamente o que é próprio do comum das actividades militares e que se mostra agravado em termos de se poder equiparar ao que caracteriza aquelas situações paradigmáticas.

Assim, implica esse regime não só que o acidente tenha ocorrido em serviço, mas também que a actividade militar que o gera envolva, por sua natureza, objectiva e necessariamente, um risco agravado em termos de poder equiparar-se ao que decorre em situações de campanha ou a elas por lei igualadas (3 (4.

Deste modo, se o acidente ocorrer num contexto de circunstâncias fortuitas ou ocasionais, por negligência da própria vítima ou por acto proveniente de terceiro, embora qualificável como ocorrendo em serviço, não pode ser considerado com nível de relevância circunstancial e causal necessário à aplicação do regime especial previsto para os deficientes das Forças Armadas (5.

4. Da matéria de facto recolhida relativamente ao quadro de circunstâncias em que se verificou o acidente que vitimou o ex-soldado milícia S(...), é possível concluir que o evento não ocorreu em situação de risco agravado previsto no artigo 1º, nº 2, e artigo 2º, nº 4, do Decreto-Lei nº 43/76.

Com efeito, relativamente ao referido ex-soldado milícia, ocorreu num quadro circunstancial perfeitamente ocasional, no momento e por causa dos acontecimentos de raiz imediatamente pessoal, que tiveram como protagonistas, na via pública, junto a um "snack-bar", um elemento do Exército Português e elementos naturais da Guiné.

Derivou, pois, de acto de terceiro, motivado por determinantes pessoais (acto praticado sob forte perturbação emocional e psicológica), e, por isso, sem ligação a qualquer risco específico próprio da actividade militar. Nas circunstâncias referidas, o risco era idêntico para todos quantos no momento da ocorrência circulavam pela via pública em que o evento aconteceu.

Assim, o acidente que vitimou (...)não cabe na previsão legal.


CONCLUSÃO:

5


Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:
1ª - O Decreto-Lei nº 319/84, de 1 de Outubro, ampliou o elenco dos beneficiários do regime instituído pelo Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, abrangendo nele, entre outros, os cidadãos portugueses que, como elementos pertencentes às corporações de segurança ou similares existentes nos antigos territórios ultramarinos, ou como meros civis, se tenham deficientado conformemente ao definido nos artigos 1º e 2º deste último diploma.
2ª - Beneficiam também do regime referido na conclusão anterior os indivíduos que, à data da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 319/84, tivessem pendente processo de conservação ou aquisição da nacionalidade portuguesa;
3ª - O acidente ocorrido em 1/Julho/73, na ex-Província da Guiné que vitimou o soldado-milícia S(...), foi produzido em circunstâncias meramente ocasionais, provenientes de um acto voluntário e isolado de terceiro, sem relação com qualquer risco específico próprio da actividade militar, não sendo, por isso, enquadrável no disposto no nº 4 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, com referência ao artigo 1º, nº 2, deste diploma legal.




______________________________________________

(1Citou-se do Parecer deste Conselho nº 60/87, votado na sessão de 8 de Outubro de 1987.

(2Redacção rectificada conforme Diário da República, I Série, de 26-6-76.

(3Cfr. sobre a caracterização do "serviço de campanha", v.g., o Parecer nº 145/79, de 7 de Fevereiro de 1980, no Diário da República, II Série, nº 254, de 3 de Novembro de 1980, e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 301, pág. 187.

(4V.g. os Pareceres nº 55/87, de 29 de Julho de 1982, e nº 80/87, de 28 de Novembro de 1987, homologados, reflectindo orientação uniforme desta instância consultiva.

(5Cfr., entre outros, o Parecere nº 159/82, de 9 de Dezembro de 1982.
Anotações
Legislação: 
DL 319/84 DE 1984/10/01 ART1 ART2.
DL 267/88 DE 1988/08/01.
DL 43/76 DE 1976/01/20 ART1 N2 N3 ART2 N4.
Referências Complementares: 
DIR ADM * ADM PUBL * DEFIC FFAA.
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