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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
87/1991, de 14.05.1992
Data do Parecer: 
14-05-1992
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Justiça
Relator: 
GARCIA MARQUES
Descritores e Conclusões
Descritores: 
MATERNIDADE
PROTECÇÃO DA MATERNIDADE
FALTAS
FALTAS INJUSTIFICADAS
FUNCIONARIO PUBLICO
Conclusões: 
1 - As faltas para assistencia a menores de dez anos, doentes, previstas no nº 1 do artigo 13º da Lei nº 4/84, de 5 de Abril, regem-se, por força do estabelecido no nº 1 do artigo 53º do Decreto-Lei nº 497/88, de 30 de Dezembro, pelo disposto na citada Lei (artigos 13º e 18º) e no Decreto-Lei nº 135/85, de 3 de Maio (artigos 10º, nºs 1 e 2, e 11º);
2 - As faltas a que se refere a conclusão anterior, que são consideradas, para todos os efeitos, como prestação efectiva de trabalho, salvo quanto a remuneração, não podem exceder o numero de trinta em cada ano;
3 - Atento o regime juridico que lhes corresponde, as faltas a que se faz referencia nas conclusões anteriores, ao contrário das faltas para assistencia a outros familiares, previstas no artigo 23º da Lei nº 4/84, não são equiparáveis as faltas por doença do próprio trabalhador - artigos 10º, nºs 1 e 3, do Decreto-Lei nº 135/85;
4 - Consideram-se injustificadas as faltas por motivos não previstos no nº 1 do artigo 19º do Decreto-Lei nº 497/88 - artigo 71º, nº 1, do Decreto-Lei nº 497/88;
5 - As faltas cujos motivos estão previstos no nº 1 do artigo 19º do Decreto-Lei nº 497/88 só se consideram justificadas desde que seja observado o respectivo condicionalismo legal;
6 - Devem ser consideradas injustificadas as faltas dadas para prestar assistência a filhos menores de 10 anos, nos termos e para os fins previstos no artigo 13º, nº 1, da Lei nº 4/84, desde que excedam o limite de 30 dias por ano.
Texto Integral
Texto Integral: 
SENHOR MINISTRO DA JUSTIÇA,

EXCELÊNCIA:




A (...), técnica superior de 2º classe, a prestar serviço no Gabinete de Gestão Financeira (GGF), requereu a Vossa Excelência "a formulação de directiva no sentido da reposição da legalidade" relativamente ao entendimento dos serviços segundo o qual as faltas dadas por si nos dias 2, 3 e 4 do passado mês de Outubro de 1991 para prestar assistência inadiável e imprescindível a sua filha menor de dois anos de idade não podiam ser justifica-das com esse fundamento, atendendo ao facto de, no ano civil em causa, já haver excedido o período de trinta dias fixado para esse efeito no artigo 13º da Lei nº 4/84, de 5 de Abril.

Tendo Vossa Excelência solicitado parecer a este Conselho Consultivo, cumpre emiti-lo.


2.


2.1. Consta do requerimento apresentado o seguinte:

"A fim de prestar assistência inadiável e imprescindível a sua filha (...), de 30 meses de idade, que adoeceu de forma preocupante no dia 1 de Outubro corrente, a peticionária faltou ao serviço nos seguintes dias 2, 3 e 4 (4ª, 5ª e 6ª feiras), situação que justificou com a apresentação nos serviços de documento justificativo da doença de sua filha (atestado médico) no terceiro dia da sua ausência.

Ao apresentar-se ao serviço na 2ª feira seguinte, 7 de Outubro, a signatária foi informada na Secção de Pessoal e Aprovisionamento do mesmo Gabinete de Gestão Financeira que, ao longo do corrente ano, tinha excedido o período de 30 dias de faltas para assistência a filho menor de 10 anos doente, razão pela qual, em relação às faltas dadas nos referidos 3 dias de ausência, teria que substituir o atestado médico apre-sentado por um outro que certificasse doença própria, ou seja, como se tais faltas tivessem sido dadas por doença de si própria e não de sua filha, a fim de evitar que as mesmas fossem consideradas injustificadas".

Prosseguindo, diz a requerente estranhar um tal entendimento, "por lhe parecer juridicamente errado e absurdo" e "por se lhe afigurar uma prática ilegal a de apresentar um atestado médico falso para cobrir uma realidade a que, em sua opinião, a lei dá adequado tratamento".

2.2. A interpretação jurídica sustentada pela requerente em abono da tese que propugna é, em linhas gerais, a seguinte:

O nº1 do artigo 53º do Decreto-Lei nº 497/88, de 30 de Dezembro, que estabelece o regime de férias, faltas e licenças dos funcionários e agentes da Administração Pública, prevê que "as faltas para assistência a familiares doentes regem-se pelo disposto na Lei nº 4/84, de 5 de Abril, e no Decreto-Lei nº 135/85, de 3 de Maio;

Atendendo aos dois referidos diplomas, importará considerar o disposto no nº1 do artigo 13º da Lei nº 4/84, segundo o qual "os trabalhadores têm direito a faltar ao trabalho, até 30 dias por ano, para prestar assistência inadiável e imprescindível, em caso de doença ou acidente a filhos, adoptados ou a enteados menores de 10 anos", e, bem assim, o estabelecido no nº1 do artigo 10º do Decreto-Lei nº 135/85, que regulamentou, no âmbito da Administração Pública, a Lei nº 4/84, nos termos do qual "as faltas para assistência a menores doentes previstas no artigo 13º da Lei nº 4/84 (...), são consideradas como prestação efectiva de trabalho";

A compatibilização de tais normativos implica, segundo a requerente, que, até 30 dias por ano, as faltas dadas sejam consideradas como prestação efectiva de trabalho, mas que, a partir desse limite, não beneficiando embora dessa protecção legal, o trabalhador ficará abrangido pelo regime geral de faltas por doença do próprio (trabalhador), previsto no Decreto-Lei nº 497/88;

Entende a requerente que só assim se dá verda-deiro conteúdo à expressão "têm direito" contida no nº1 do artigo 13º da Lei nº 4/84, bem como à previsão legal segundo a qual tais faltas, até 30 dias por ano, "são consideradas como prestação efectiva de trabalho". Do mesmo passo, defende que só por esta via se alcança a protecção da maternidade e da paternidade, enquanto valores sociais eminentes, e se dá expressão aos direitos e deveres fundamentais neste domínio consagrados na Constituição;

Defende, por fim, que o entendimento perfilhado pelos Serviços é meramente literal, não obede-cendo aos princípios de interpretação fixados no artigo 9º do Código Civil.

2.3. O G.G.F., pronunciando-se sobre o requerido, opinou não ser possível a justificação das faltas dadas pela requerente, uma vez que, no ano civil em causa, já havia esgotado o período de 30 dias fixado no artigo 13º da Lei nº 4/84, de 5 de Abril.
Ouvida a Auditoria Jurídica, em parecer de 28 de Outubro do ano transacto, pronunciou-se no sentido do indeferimento da pretensão da exponente. Foi sobre esse parecer que Vossa Excelência, em 14 de Novembro, se dignou exarar despacho solicitando parecer a esta instância consultiva.


3.

3.1. Foi, desde logo, na primeira lei social portuguesa - o Decreto de 10 de Fevereiro de 1890 (ratificado pela Lei de 7 de Agosto de 1890) - que se incluíram normas de protecção da maternidade da mulher trabalhadora (1).


O Decreto-Lei nº 19478, de 19 de Março de 1931, estabeleceu que se consideram faltas justificadas para os funcionários do sexo feminino, casados, os períodos de maternidade durante 8 dias antes do parto e 15 dias depois, mas a resolução do Conselho de Ministros de 7 de Julho de 1934 (in "Diário do Governo", 1ª Série, nº 164, de 14 de Julho de 1934) veio esclarecer que as funcionárias nessas condições não eram abonadas do vencimento nesse período se a ele não tivessem direito quando doentes.

O § único do artigo 508º do Código Administrativo estabeleceu, por seu turno, que "os funcionários do sexo feminino podem faltar até quinze dias no período da maternidade", faltas estas que não implicavam perda de vencimento (artigo 509º) (2) .

O período de faltas foi aumentado para 30 dias pelo artigo 5º do Decreto-Lei nº 42800, de 11 de Janeiro de 1960, estabelecendo o seu § único que "as faltas a que se refere este artigo não darão lugar a perda de quaisquer direitos ou regalias do respectivo funcio-nário e, até ao limite de quinze, não serão desconta-das na licença graciosa".


Por sua vez, o nº 2 do Decreto-Lei nº 49031, de 27 de Maio de 1969, veio dispor que nas licenças para férias seriam descontadas as faltas do ano civil anterior, com excepção, entre outras, das faltas justificadas nos termos do corpo do artigo 5º do Decreto-Lei nº 42800, ou seja, justamente, as faltas por maternidade.

Para os trabalhadores em geral, a alínea c) do nº1 do artigo 118º do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei nº 49408, de 24 de Novembro de 1969, veio assegurar às mulheres o di-reito de "faltar até sessenta dias consecutivos na altura do parto sem redução do período de férias nem prejuízo da antiguidade...”.

Seguiu-se o Decreto-Lei nº 112/76, de 7 de Fevereiro, (3) cujo artigo 1º dispunha, no nº1, o seguinte: "É concedido a todas as trabalhadoras o direito de faltar durante noventa dias no período da maternidade, os quais não poderão ser descontados para quaisquer efeitos, designadamente licença para férias, antiguidade ou aposentação".

No preâmbulo deste diploma afirmou-se o reconhecimento do direito a medidas específicas relativas à Maternidade, entendida como função social assumida pela colectividade, e o direito da criança que nasce a uma relação profunda com os outros, especificamente com aqueles que podem, na actual estrutura social, projectar nela uma vontade de vida que a faça crescer".


Preocupações bem patentes no articulado do diploma, onde, para além de se garantir (directamente ou através da previdência social) um subsídio pecuniário ou a retribuição correspondente ao período de faltas, se previa, no artigo 3º, que, em caso de hospitalização da criança a seguir ao parto, a licença por maternidade poderia ser interrompida até à data em que cessasse o internamento e retomada a partir de então até final do período.

3.2. Estas preocupações tiveram consagração constitucional no artigo 68º da Lei Fundamental, que, na sua redacção originária, dispunha o seguinte:

“1. O Estado reconhece a maternidade como valor social eminente, protegendo a mãe nas exigências específicas da sua insubstituível acção quanto à educação dos filhos e garantindo a sua realização profissional e a sua participação na vida cívica do país.

2. As mulheres trabalhadoras têm direito a um período de dispensa do trabalho, antes e depois do parto, sem perda da retribuição e de quaisquer regalias".

No âmbito da vigência da redacção primitiva do texto constitucional de 1976, escrevia LEONOR BELEZA que "a Constituição nega às mulheres um estatuto especial, excepto no que respeita à maternidade. É este, no fundamental, o sentido das disposições constitucionais quanto aos cidadãos do sexo feminino (4) .

Entretanto, o artigo 68º da Constituição, por virtude das alterações que lhe foram introduzidas pela revisão constitucional de 1982, deixou de ter especificamente por objecto (e como epígrafe) a maternidade, para, como corolário lógico do princípio da igualdade de direitos e deveres dos cônjuges quanto à capacidade civil e à manutenção e educação dos filhos (artigo 36º, nº3, da CRP), passar a referir-se, em termos perfeitamente equivalentes, à paternidade e à maternidade. Justifica-se, pois, que procedamos à sua transcrição, na redacção dada pela primeira revisão constitucional:

“1. Os pais e as mães têm direito à protecção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível acção em relação aos filhos, nomeada-mente quanto à sua educação, com garantia de realização profissional e de participação na vida cívica do país.

2. A maternidade e a paternidade constituem valores sociais eminentes.


3. As mulheres trabalhadoras têm direito a um pe-ríodo de dispensa do trabalho, antes e depois do parto, sem perda da retribuição e de quaisquer regalias" (5) .

Refira-se, a finalizar esta incursão pelos normativos constitucionais que integram o artigo 68º do texto fundamental, a alteração introduzida no nº3 pela revisão de 1989, preceito que passou a dispor o seguin-te: "As mulheres trabalhadoras têm direito a especial protecção durante a gravidez e após o parto, incluindo a dispensa do trabalho por período adequado, sem perda da retribuição ou de quaisquer regalias" (6)

3.3. Como se reconheceu no já citado parecer nº 162/88, tendo presente o princípio da igualdade dos cônjuges (7) e o correspondente tratamento, em paridade, da paternidade e da maternidade (artigos 68º da C.R.P. e 1º e 2º da Lei nº 4/84), o juízo sobre a constitucionalidade de medidas legislativas que sejam tomadas exclusivamente em relação à mãe justifica que se distinga entre aquelas medidas que, por natureza, somente à mulher são aplicáveis, daquelas outras de que ambos os pais podem beneficiar.


As primeiras, entre as quais se podem enumerar a protecção do trabalho durante a gravidez e após o parto, a possibilidade de descanso e de recomposição física por altura deste e o direito à diminuição do horário de trabalho para amamentar o filho são compatíveis e conformes com o princípio da proibição das discriminações, constante do nº 2 do artigo 13º do texto constitucional (8) .

Já assim não será relativamente às segundas, ou seja, quanto aquelas de que ambos os pais podem beneficiar, sendo, de resto, aconselhável que o façam, uma vez que é inegável a importância da intervenção do pai, não só em termos de igualdade dos homens e das mulheres, mas também relativamente ao melhor desenvolvimento dos filhos.

A propósito da protecção da maternidade no que tem de biológico e a respeito da articulação da dimensão social da maternidade com o estatuto da mulher, poderá ler-se na longa justificação preambular do Projecto de Lei nº 5/III, o seguinte:

"O Estado está vinculado a proteger a maternidade no que ela contém de biológico (gravidez, parto, amamentação) - o que é incontestável e não decorreu como novo do texto constitucional -, mas também, de igual forma, a proteger a maternidade no que ela tem de social, através de medidas tendentes a permitir às mães o acompanhamento e educação dos filhos pequenos em condições tais que garantam a sua “realização profissional e a sua participação na vida cívica do País. Este o aspecto verdadeiramente inovador da lei fundamental".


"Com a nova redacção que neste ponto lhe foi introduzida em 1982 por proposta do PCP, o texto constitucional ficou a consagrar inequivocamente a plena igualdade jurídica da mulher e do homem em todos os aspectos decorrentes da sua qualidade de pais. Igualdade de direitos, igualdade de obrigações. A anterior referência constitucional à insubstituível acção da mãe em relação ao filho foi agora acrescentada a qua-lificação da relação pai-filho como igualmente insubstituível" (9).

3.4. Já LEONOR BELEZA, debruçando-se sobre a primitiva redacção do artigo 68º do texto constitucional, que, recorde-se, apenas qualificava a acção da mãe como insubstituível, lamentava nos seguintes termos a referida opção da lei fundamental: "A insubstituibilidade da acção da mãe, afirmada na Constituição, pode ser posta em confronto com a intervenção da sociedade em geral ou com a do pai. No que respeita à sociedade, já outras disposições da Constituição referem o primado da intervenção dos pais (x) . A novidade do nº 1 do artigo 68º é a qualificação da acção da mãe como insubstituível em contraposição com a do pai.

Esta afirmação é susceptível de controvérsia, é peri-gosa porque não refere quaisquer limites - parece que se considera que em qualquer idade dos filhos a acção da mãe é igualmente insubstituível - e é inconveniente porque, numa sociedade em que o peso dos estereotipos tradicionais é tão forte, contribui para a conservação dos mesmos".

E acrescenta o seguinte: "Foi pena aliás que não se tivesse antes referido a acção insubstituível dos pais - e até o valor social da paternidade, isto é, da função dos pais (2x). Não só assim esta disposição estaria mais de acordo com o nº3 do artigo 36º, como corresponderia ao reconhecimento da importância da intervenção directa do pai na educação dos filhos, o que é hoje pacificamente aceite, e isso sim representaria vontade de mudança relativamente à situação actual da sociedade portuguesa" (10) .



Já vimos como tais considerações viriam a encontrar tradução no texto do artigo 68º da CRP após a primeira revisão constitucional.


3.5. Pode ler-se no preâmbulo do Projecto de Lei nº 272/III sobre "protecção da maternidade e da paternidade", apresentado pelo PS e pelo PSD, que "é por toda a parte reconhecido que o excesso discriminatório na protecção social da mulher trabalhadora reduz perigosamente o seu efectivo acesso ao mercado do trabalho. Daí que no presente projecto se tenha empenhadamente procurado a justa medida protectora, sem cair em excessos desprotegentes.

Duas preocupações dominantes presidiram ainda à elaboração deste projecto: a redução da discriminação entre o pai e a mãe, até ao justo limite da diferenciação biológica; a consideração de que também aqui há que talhar o fato à medida do pano, ou seja, a dimensão das acções protectoras à capacidade económica e financeira da sociedade e das empresas para absorvê-las sem risco.

A primeira preocupação, decorrente de uma fundamental exigência da Constituição, traduz-se em diversas me-didas de protecção do pai.

A segunda traduz-se na não consagração de algumas regalias que, sendo desejáveis em si, poderiam pôr em causa a exequibilidade, e nessa medida, o êxito, do conjunto do sistema"(11) .

Tendo presente que o Projecto de Lei nº 272/III viria a converter-se na Lei nº 4/84, teremos a oportunidade de ponderar acerca de algumas das alterações que viriam a ser-lhe introduzidas.



4.


4.1. A Lei nº 4/84 desdobra-se ao longo dos seus vinte e seis artigos, por cinco capítulos: Capítulo I, epigrafado "Princípios gerais": artigos 1º a 3º; Capítulo II, sob a epígrafe "Protecção da saúde": artigos 4º a 7º; Capítulo III, intitulado "Protecção ao trabalho": artigos 8º a 18º; Capítulo IV, subordinado à epígrafe "Regimes de segurança social e acção social": artigos 19º a 22º; e Capítulo V sobre "Disposições finais", a partir do artigo 23º.

Justifica-se uma chamada de atenção para os dois primeiros artigos, sob a epígrafe "paternidade e maternidade" (artigo 1º) e "igualdade doa pais" (artigo 2º).

Depois de, no artigo 1º, se reproduzir o conteúdo do nº 2 e de parte do nº 1 do artigo 68º da CRP, o artigo 2º estabelece o seguinte:

"1. São garantidos aos pais, em condições de igualdade, a realização profissional e a participação na vida cívica do País (12) .

2. Os pais são iguais em direitos e deveres quanto à manutenção e educação dos filhos (13) .

3. Os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres funda-mentais, para com eles, e sempre mediante decisão judicial.

4. São garantidos às mães direitos especiais relacionados com o ciclo biológico da maternidade".

Os normativos por que se desdobra o artigo 2º representam, na esteira dos princípios constitucionais consagrados do reconhecimento da eminente dignidade social da maternidade e da paternidade, aliás, em parte reproduzidos no artigo 1º, o desenvolvimento de alguns corolários do princípio da igualdade dos pais: tal é o caso da garantia que lhes é dada de realização profissional e de participação na vida cívica (nº1); e do reconhecimento de direitos e deveres iguais quanto à manutenção e educação dos filhos (nº2) . Para além disso, a proibição da separação dos filhos em relação aos pais, a que se refere o nº3, representa uma manifestação da eminência do valor social da maternidade e da paternidade. Por fim, a garantia atribuída às mães de direitos especiais relacionados com o ciclo biológico da maternidade (nº4), longe de poder configurar-se como uma violação do princípio da igualdade dos pais, representa o reconhecimento da aplicação de medidas que, por natureza, somente à mulher podem ser aplicadas - protecção do trabalho durante a gravidez e o parto; possibilidade de descanso e de recomposição física por altura deste; direito a diminuição do horário de trabalho para amamentar o filho - cfr., v.g., o artigo 68º, nº3, da CRP, e os artigos 4º, nºs 1 e 2, 9º, 12º e 17º da Lei nº 4/84.

4.2. Atenta a economia da consulta, importa que nos debrucemos com particular atenção sobre algumas disposições que integram o Capítulo III, sobre a protecção ao trabalho.


Definindo o âmbito de aplicação do referido capítulo, estabelece o artigo 8º que o mesmo se aplica aos trabalhadores abrangidos pelo regime de contrato individual de trabalho, incluindo os trabalhadores agrícolas e do serviço doméstico, bem como os trabalhadores da administração pública central, regional e local, dos institutos públicos, dos serviços públicos com autonomia administrativa e financeira e das demais pessoas colectivas de direito público, qualquer que seja o vínculo.

Não se justifica, em face da especialidade da consulta, considerar agora o conteúdo dos artigos 9º, acerca do "direito da mulher à dispensa de trabalho" (14), 10º, sobre o "direito do pai a dispensa do trabalho", 11º, relativo à "adopção" e 12º, sob a epígrafe "dispensas para consultas e amamentação".

Concentremo-nos, pois, no artigo 13º, o qual, sob a epígrafe "faltas para assistência a menores doentes", estabelece o seguinte:

1. Os trabalhadores têm direito a faltar ao trabalho, até 30 dias por ano, para prestar assistência inadiável e imprescindível, em caso de doença ou acidente, a filhos, adoptados ou a enteados menores de 10 anos.


2. Em caso de hospitalização, o direito a faltar estende-se ao período em que aquela durar, se se tratar de menores de 10 anos, mas não pode ser exercido simultaneamente pelo pai e pela mãe ou equiparados".

O preceito transcrito justifica as seguintes observações fundamentais (15) :

a) as previsões contidas nos seus dois números são aplicáveis quer às mães, quer aos pais;

b) as faltas previstas em qualquer dos seus números representam o exercício de um direito, o qual terá a duração máxima de 30 dias, na hipótese prevista no nº 1, estendendo-se a todo o período que durar a hospitalização, no caso a que se refere o nº 2;

c) a finalidade expressamente prevista para as faltas a que se refere o nº 1 consiste na prestação de "assistência inadiável e imprescindível, em caso de doença ou acidente".

4.2.1. Atenta a sua intencionalidade, próxima da do artigo 13º, justificar-se-á transcrever também o artigo 14º, sob a epígrafe "licença especial para assistência a filhos". Aí se estabelece o seguinte:


"1. O pai ou a mãe trabalhadores têm direito a interromper a prestação do trabalho pelo período de 6 meses, prorrogáveis, até ao limite máximo de 2 anos a iniciar no termo da licença por maternidade, para acompanha-mento do filho.

2. O exercício do direito referido no número anterior depende de pré-aviso dirigido àque-la entidade patronal até 1 mês do início do período de faltas, não podendo o período referido no número anterior ser interrompido

Atentar-se-á, porém, em que a previsão deste artigo, contrariamente à do artigo 13º, não depende necessariamente de doença (ou acidente) do filho, visando antes o seu acompanhamento.

Tendo ainda presente a criação de condições de maior alívio (ou facilidade) por parte dos trabalhadores, pais de filhos menores de 12 anos, o artigo 15º concede-lhes o direito a trabalhar em horário reduzido ou flexível em condições a regulamentar.

De particular saliência se reveste o artigo 18º que, sob a epígrafe "regime das faltas e das dispensas" estabelece que "as faltas ao trabalho previstas nos artigos 9º, 10º, 11º e 13º não determinam perda de quaisquer direitos, sendo consideradas, para todos os efeitos, como prestação efectiva do trabalho, salvo quanto à remuneração" (sublinhado agora).

Duas outras disposições merecem também uma específica menção: os artigos 20º ("subsídio em caso de assistência a menores doentes") e 23º ("outros casos de assistência à família") (16) .

De acordo com o primeiro, em caso de faltas dadas ao abrigo do artigo 13º, e quando não houver lugar a remuneração, é atribuído, pelas instituições de segurança social, um subsídio pecuniário, de montante não superior ao subsídio por doença do próprio trabalhador ou trabalhadora, dependen-te de condição de recursos, e a alargar progressivamente, na medida das possibilidades.

Por sua vez, o artigo 23º estabelece que "os trabalhadores têm direito a faltar ao trabalho, até 15 dias por ano, quando se trate de prestar as-sistência inadiável e imprescindível em caso de doença, ao cônjuge, ascendentes, descendentes maiores de 10 anos e afins na linha recta".

4.2.2. Vejamos, sucintamente, as afinidades e as dissemelhanças entre as previsões do nº 1 do artigo 13º e do artigo 23º.

Começando pelas primeiras, pode constatar-se que em qualquer dos normativos se prevê a existência de um direito de que são titulares os trabalhadores. Direito cujo objecto consiste na possibilidade legal de faltar ao trabalho com a finalidade de prestar assistência inadiável e imprescindível a familiares doentes.





Todavia, constatam-se entre as citadas disposições legais, as seguintes diferenças essenciais:

a) Os beneficiários da assistência prevista no nº1 do artigo 13º são os filhos, adoptados ou enteados menores de 10 anos.
Diversamente, no artigo 23º, os destinatá-rios dos referidos cuidados são os cônjuges, os ascendentes e os descendentes maiores de 10 anos e afins na linha recta. Ou seja, os familiares mencionados no nº1 do artigo 13º são, teoricamente, de entre todos, os mais carecidos de assistência por parte dos titulares do referido direito;

b) Como consequência do que se deixou reflectido, é diferente o limite de faltas que os trabalhadores em apreço têm o direito de dar em cada ano: até 30 e até 15, respectivamente;

c) As faltas a que se refere o artigo 23º não se aplica o regime das faltas previstas no artigo 13º, já que estas últimas não determinam perda de quaisquer direitos, sendo consideradas, para todos os efeitos, como prestação efectiva do trabalho, salvo quanto à remuneração - cfr. artigo 18º, já citado.

Ver-se-ão os desenvolvimentos que, do ponto de vista das consequências jurídicas, deri-varão desta diferença de regimes;


d) Adicional, e secundariamente, dir-se-á que a hipótese de assistência em caso de acidente não está contemplada, ao menos ",expressis verbis" na previsão do artigo 23º, ao contrário do que acontece ao nº1 do artigo 13º.

4.3. Como se disse, o Decreto-Lei nº 135/85 regulamenta a Lei nº 4/84, na parte em que é aplicável aos trabalhadores da administração central, regional e local, qualquer que seja o vínculo e o tempo de serviço prestado, independentemente do desempenho de funções em regime de tempo completo ou parcial e por tempo indeterminado ou a prazo (artigo 1º) (17) .

Revestem-se de particular importância, pelo que se transcrevem, os artigos 10º ("faltas para assistência a menores doentes e à família") e 11º ("justificação e controle das faltas para assistência a menores e à família").

Estabelece o artigo 10º:

1. As faltas para assistência a menores doentes previstas no artigo 13º da Lei nº 4/48 [...], são consideradas como prestação efectiva de trabalho.


2. As faltas referidas no número anterior entram no cômputo das que, nos termos da lei, podem implicar o desconto do vencimento de exercício (18) .

3. As faltas para assistência a familiares previstas no artigo 23º da Lei nº 4/84 (...), são equiparadas, para todos os efeitos, às faltas por doença do próprio".

Podem, a propósito deste artigo, anotar-se os seguintes apontamentos:

a) O disposto no nº1 reafirma o conteúdo do artigo 18º da Lei nº 4/84, na medida em que já aí se dispunha que as faltas ao trabalho previstas no artigo 13º eram consideradas, para todos os efeitos, como prestação efectiva de trabalho (salvo quanto a remunerações);

b) Todavia, ao estabelecer, no nº2, que as faltas em apreço entram no cômputo das que podem implicar o desconto do vencimento de exercício (nº2), vai ao encontro da excepção contida no segmento final do citado artigo 18º da Lei nº 4/84, na medida em que se ressalvam os efeitos "quanto à remuneração";

c) Por sua vez, o nº3 equipara, para todos os efeitos, as faltas para assistência a familiares previstas no artigo 23º da Lei nº 4/84 às faltas por doença do próprio" (19) .


Resulta, assim, com clareza, do regime jurídico fixado pela Lei nº 4/84 e pelo Decreto-Lei nº 135/85 que as faltas ao trabalho para assistência a menores de 10 anos (as previstas no artigo 13º, nº 1, da Lei), contrariamente ao que acontece com as faltas para assistência a familiares previstas no artigo 23º do mesmo diploma, não são equiparadas, para todos os efeitos, às faltas por doença do próprio.

E isto porque o regime específico que lhes cabe é o que resulta dos artigos 18º da Lei nº 4/84 e dos nº 1 e 2 do artigo 10º do Decreto-Lei nº 135/85.

Corroborando esta ilação está a eliminação, na Lei nº 4/84, do preceito que, no Projecto de Lei nº 272/III, constituía o nº2 do artigo 18º, segundo o qual "as faltas dadas ao abrigo do artigo 13º são consideradas, para todos os efeitos, como faltas por doença do próprio trabalhador" (20) .


Ou seja, o legislador pretendeu fazer corresponder às faltas previstas no nº 1 do artigo 13º da Lei nº 4/84, à semelhança das faltas previstas nos artigos 9º, 10º e 11º do mesmo diploma, um regime particularmente privilegiado, uma vez que não determinam perda de direitos, sendo consideradas, para todos os efeitos, salvo quanto à remuneração, como prestação efectiva do trabalho (21) .

Já quanto às faltas para assistência a familiares pre-vistas no artigo 23º da Lei nº 4/84 equiparou-as expressamente para todos os efeitos às faltas por doença do próprio (22) .


Estabelece, enfim, o artigo 11º o seguinte:

"1. A justificação e controle das faltas para assistência a menores de 10 anos e outros familiares, a que se referem os artigos 13º e 23º da Lei nº 4/84 (...), deverão ser feitas em termos idênticos aos previstos na lei para as faltas por doença do próprio trabalhador.

2. O atestado médico justificativo da doença do familiar deve mencionar expressamente que o doente necessita de acompanhamento ou assistência permanente com carácter inadiável e imprescindível.


3. O atestado médico referido no número anterior deve ser entregue com uma declaração do traba-lhador da qual conste que é ele o familiar em melhores condições para a prestação do acompanhamento ou assistência e a indicação da sua li-gação familiar com o doente".

O preceito justifica duas breves notas:

a) Trata-se de um artigo que compreende a justificação, não só das faltas previstas no artigo 13º, mas também das previstas no artigo 23º. A circunstância de, quanto a umas e outras, se estabelecer que a respectiva justificação deve ser feita em termos idênticos aos previstos para as faltas por doença do próprio (23), não colide com a conclusão a que se chegou de que só as faltas previstas no artigo 23º é que são equiparadas, para todos os efeitos, às faltas por doença do próprio;

b) A exigência formulada no nº2 consubstancia a materialização de um pressuposto do exercício do direito de faltar, expressamente formulado no nº1 do artigo 13º e no artigo 23º da Lei nº 4/84.


4.4. Para se ultimar a apreciação dos normativos legais aplicáveis à situação em apreço, falta ponderar o Decreto-Lei nº 497/88, diploma que, já se disse, estabeleceu o regime de férias, faltas e licenças dos funcionários e agentes da Administração Pública.


Detenhamo-nos, antes do mais, na norma do artigo 19º que, no nº1, desenha o elenco das "faltas justifica-das", começando por prescrever que se consideram justificadas as faltas que enuncia, "desde que observado o respectivo condicionalismo legal".

Entre elas, figuram as faltas:

..........................................................

"b) Por maternidade ou paternidade";

........................................................................

m) Para assistência a familiares;
......................................” (sublinhado agora).


Não tem aplicação, "in casu", o disposto no nº2, uma vez que, relativamente às faltas que nos interessa considerar (as destinadas a assistência a familiares, ou, mais precisamente, a filhos menores de 10 anos), encontram-se legalmente previstos os procedimentos de justificação das faltas - cfr. artigo 11º, nº1, do Decreto-Lei nº 135/85.

Depois de os artigos 21º, 23º e 24º disporem, respectivamente, para as faltas por maternidade ou paternidade, faltas para consultas pré-natais e amamentação e faltas por adopção, que (todas elas) se regem pelo disposto na Lei nº 4/84 e no Decreto-Lei nº 135/85, idêntica previsão vamos encontrar, para as faltas para assistência a familiares, no artigo 53º, nº1, segundo o qual "as faltas para assistência a familiares doen-tes regem-se pelo disposto na Lei nº 4/84, de 5 de Abril, e no Decreto-Lei nº 135/85, de 3 de Maio"(24) .

Ou seja, as faltas a que se refere o artigo 13º, nº1, da Lei nº 4/84, para assistência a filhos menores de 10 anos, doentes, regem-se, por força do estabelecido pelo nº1 do artigo 53º do Decreto-Lei nº 497/88, pelo disposto na citada Lei (artigos 13º e 18º) e no Decreto-Lei nº 135/85 (artigos 10º, nºs 1 e 2, e 11º).

4.5. No âmbito das medidas de protecção à maternidade, paternidade e adopção, faz ainda sentido salientar as que, embora consentâneas com os princípios informadores dos direitos sociais consagrados na Lei nº 4/84, permitam satisfazer da melhor forma as actuais necessidades dos beneficiários dos regimes de segurança social privados da sua remuneração em virtude de faltas ao trabalho determinadas pelo nascimento de filhos, pela adopção de menores e pelo acompanhamento dos descendentes que se encontrem doentes. Estamos a fazer apelo às medidas previstas no Decreto-Lei nº 154/88, de 29 de Abril.

Assim, de acordo com o artigo 14º, os períodos de concessão dos subsídios correspondem aos períodos de duração das licenças não remuneradas previstas nos artigos 9º, 10º e 13º da Lei nº 4/84.


E, atento o disposto no artigo 1º, "o subsídio para assistência a descendentes doentes é atribuído até ao limite máximo de 30 dias, em cada ano civil, por cada descendente".


5.


5.1. Estamos, pois, em condições de tomar posição sobre a substância da consulta.

A análise da legislação aplicável conduz à conclusão de que não assiste razão à requerente quando pretende que, para além do limite dos 30 dias por ano, o trabalhador pode continuar a faltar para assistência a filhos menores (de 10 anos), doentes, ficando abrangido pelo regime geral para as faltas por doença do próprio trabalhador, previsto no Decreto-Lei nº 497/88, com todos os seus efeitos.

Como estabelece a alínea a) do nº1 do artigo 71º do Decreto-Lei nº 497/88, consideram-se injustificadas "todas as faltas por motivos não previstos no nº1 do artigo 19º".

Ora, as faltas discriminadas neste nº1 só se consideram justificadas "desde que observado o respectivo condicionalismo legal".

E, atenta a disposição (no caso, nuclear) do nº1 do artigo 13 da Lei nº 4/84, é inequívoco o reconheci-mento do direito a faltar ao trabalho até 30 dias por ano, para prestar assistência inadiável e imprescindível em caso de doença ou acidente a filhos menores de 10 anos.

Assim se justificando que, por força da alínea m) do nº 1 do artigo 19º do Decreto-Lei nº 497/88, tais faltas sejam consideradas como faltas justificadas. Desde que (é o proémio do nº1 do citado artigo 19º que o diz) observado o condicionalismo legal respectivo, ou seja, desde que não ultrapassem o limite dos 30 dias por ano.

5.2. A requerente deixa-se impressionar fundamentalmente por duas ordens de considerações: por um lado, pelo facto de o nº1 do artigo 10º do Decreto-Lei nº 135/85 estatuir que as faltas em apreço são consideradas como prestação efectiva de trabalho e, por outro, pela circunstância de a lei estipular um limite temporal para este tipo de faltas.

5.2.1. Quanto à primeira questão, para além de se sa-lientar que o citado princípio de "equivalência" já figurava no artigo 18º da Lei nº 4/84, diploma que o Decreto-Lei nº 135/85 se limita a regula-mentar no âmbito da Administração Pública, sempre se dirá que, para outros tipos de faltas mencio-nadas no artigo 19º do Decreto-Lei nº 497/88, está expressamente consignado por lei o princípio de equiparação a serviço efectivo.

É o que acontece, por exemplo, relativamente às faltas por casamento, por nascimento e por falecimento de familiar ou equiparado - cfr. os artigos 20º, nº 2, 22º, nº 4, e 26º, nº 3, do referido Decreto-Lei nº 497/88.

Paralelamente, sempre que pretendeu consagrar a equiparação do regime legal de certo tipo de faltas às faltas por doença do próprio, a lei fê-lo expressamente. Foi o que aconteceu, como já se viu, com as faltas previstas no artigo 23º da Lei nº 4/84, por força do nº 3 do artigo 10º do Decreto-Lei nº 135/85, e é também o caso, por exemplo, do regime aplicável às faltas para reabilitação profissional, com a ressalva quanto à perda do vencimento de exercício - cfr. artigo 50º, nº 6, do Decreto-Lei nº 497/88.

Como já se viu com suficiente detalhe, dentro do conceito de faltas para assistência a familiares doentes, o legislador distinguiu, quanto ao conteúdo e efeitos do respectivo regime jurídico, as faltas para assistência a familiares menores de 10 anos - artigo 13º da Lei nº 4/84 e as faltas para assistência a outros familiares artigo 23º da mesma lei , conferindo àquelas uma particular protecção, não apenas por virtude do limite de um período de tempo mais dilatado (30 dias no pri-meiro caso e 15 dias no segundo), mas também pela diversidade de tais efeitos - no primeiro caso serão consideradas como prestação efectiva de trabalho e no segundo são apenas equiparadas às faltas por doença do próprio (artigo 18º da Lei nº 4/84, e artigo 10º, nºs 1 e 2, do Decreto-Lei nº 135/85).

5.2.2. Como se disse, a requerente mostra-se também impressionada pelo facto de a lei estabelecer um limite temporal para este tipo de faltas - os referidos 30 dias por ano.

Mas, como bem salienta a Auditoria Jurídica, no seu parecer, "se bem que um qualquer limite temporal encerre, em si mesmo, algo de arbitrário, a verdade é que a sua fixação e incontroversa e não pode ser desvirtuada por uma qualquer interpretação que se pretende extrair de um diploma que o visa regulamentar".

E, como também se observa no citado parecer: “acresce que o pensamento do legislador contempla o que deve ser considerado como uma "normalidade" de situações e não casos manifestamente excepcionais. Ora deve entender-se, em sede de interpretação da lei, que o legislador considerou como razoável e normal que, em cada ano civil, o número de faltas para assistência a filhos menores de 10 anos não deve exceder os 30 dias".

Sempre acrescentaremos que, ainda que da aplicação do regime legal exposto e da observância do citado limite, possam advir consequências de con-creta iniquidade, não pode é permitir-se que o intérprete se substitua ao legislador, fixando um regime que não tem na lei o menor suporte textual.

É que, se é certo, como a requerente sustenta, que os cânones hermenêuticos não podem impor que a interpretação se deva cingir à letra da lei (nº 1 do artigo 9º do Código Civil), não pode, porém, ser considerado pelo intérprete "o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso" – nº 2 do citado artigo 9º.

5.2.3. De qualquer modo, sempre se constatará que ou-tras soluções continuam a ser viáveis, no caso de já ter sido atingido o limite de 30 dias de faltas.

Sem considerar a previsão, a cobrir as situações teoricamente mais graves, de hospitalização do menor, caso em que os familiares terão o direito de faltar durante o período em que aquela durar (artigo 13º, nº2, da Lei nº 4/84), há o recurso à possível licença para acompanhamento do filho (artigo 14º) ou ao trabalho em horário reduzido ou flexível (artigo 15º, ambos da Lei nº 4/84).

É, no entanto, claro que não é juridicamente possível, em casos como o da consulta, obviar à impossibilidade de obter a justificação das fal-tas para assistência a menores doentes, através da substituição do atestado médico, para o efeito apresentado, por outro que certificasse doença própria. Tem, nesse ponto, razão a requerente, uma vez que, nesse caso, a declaração de doença própria seria falsa, fazendo incorrer o seu autor no crime de passagem de atestado falso previsto e punido no artigo 234º, nº1, do Código Penal. E no mesmo crime incorreria o funcionário ou agente que o utilizasse (nº4 do citado artigo).

5.2.4. Impõe-se, assim, concluir que a consequência resultante do facto de o número de faltas dadas para assistência a filhos menores exceder o nú-mero de 30 em cada ano será a sua injustificação, a qual, para além dos efeitos cominados no nº2 do artigo 71º do Decreto-Lei nº 497/88 (perda das remunerações correspondentes aos dias de ausência, falta de contagem para efeitos de antiguidade e desconto nas férias), pode dar lugar a consequências disciplinares para o funcionário, desde que verificado o condicionalismo do nº1 do artigo 71º do Estatuto Disciplinar (ED), aprovado pelo Decreto-Lei nº 24/84, de 16 de Janeiro (25) .

Todavia, atento o nº 2 do referido artigo 71º do ED, "o disposto no número anterior não prejudica que o dirigente máximo do serviço considere, do ponto de vista disciplinar, justificada a ausência, se o funcionário ou agente fizer prova de motivos atendíveis".

Estas considerações permitem concluir que a apre-sentação de um requerimento, justificativo da doença de um filho, menor de dez anos, poderá constituir fundamento bastante para que o dirigente máximo do serviço considere justificada a ausência do ponto de vista disciplinar.



6.


Termos em que se extraem as seguintes conclusões:

1ª. As faltas para assistência a menores de dez anos, doentes, previstas no nº 1 do artigo 13º da Lei nº 4/84, de 5 de Abril, regem-se, por força do estabele-cido no nº 1 do artigo 53º do Decreto-Lei nº 497/88, de 30 de Dezembro, pelo disposto na citada Lei (artigos 13º e 18º) e no Decreto-Lei nº 135/85, de 3 de Maio (artigos 10º, nºs 1 e 2, e 11º);

2ª. As faltas a que se refere a conclusão anterior, que são consideradas, para todos os efeitos, como prestação efectiva de trabalho, salvo quanto à remuneração, não podem exceder o número de trinta em cada ano;

3ª. Atento o regime jurídico que lhes corresponde, as faltas a que se faz referência nas conclusões anteriores, ao contrário das faltas para assistência a outros familiares, previstas no artigo 23º da Lei nº 4/84, não são equiparáveis às faltas por doença do próprio trabalhador - artigos 10º, nºs 1 e 3, do Decreto-Lei nº 135/85;

4ª. Consideram-se injustificadas as faltas por motivos não previstos no nº 1 do artigo 19º do Decreto-Lei nº 497/88 - artigo 71º, nº 1, do Decreto-Lei nº 497/88;

5ª. As faltas cujos motivos estão previstos no nº 1 do artigo 19º do Decreto-Lei nº 497/88 só se consideram justificadas, desde que seja observado o respectivo condicionalismo legal;

6ª. Devem ser consideradas injustificadas as faltas dadas para prestar assistência a filhos menores de 10 anos, nos termos e para os fina previstos no artigo 13º, nº 1, da Lei nº 4/84, desde que excedam o limite de 30 dias por ano.


NOTAS:


(1)Cfr. JOSÉ BARROS MOURA, "Notas para uma introdução ao direito do trabalho", Lisboa, 1980, pág. 120.
Na presente síntese, relativa à consagração legislativa da "protecção da maternidade", acompanhar-se-ão os pareceres nºs 103/82, de 22 de Julho de 1982, publicado no "Boletim do Ministério da Justiça", nº 326, pág. 244, e 162/88, de 23 de Fevereiro de 1989, inédito.
(2)Apesar de o § único do artigo 508º do C.A. não exigir que as funcionárias fossem casadas, ao contrário do que constava no Decreto nº 19478, LOPES NAVARRO (“Funcionários Públicos", pág. 148) sustentava que tal requisito era indispensável, "pois o contrário equivalia implicitamente a permitir um comportamento deficiente, por parte dos funcionários públicos do sexo feminino, em oposição com o sistema de organização e protecção da família, estabelecido nos artigos 11º e seguintes da Constituição Política".
(3)Diploma que seria revogado pelo Decreto-Lei nº 135/85 [artigo 40º, nº1, alínea c).
(4)"O Estatuto das Mulheres na Constituição (artigos 13º, nº2, 36º, nº2, 52º, alínea c), 53º, 54º, alínea c), 67º, alíneas b) e d), e 68º), in "Estudos sobre a Constituição", vol. I, págs. 63 e ss.
(5) Atente-se no disposto pela alínea c) do nº2 do artigo 59º da Constituição na sua actual redacção, segundo a qual incumbe ao Estado "a especial protecção do trabalho das mulheres durante a gravidez e após o parto
(6) Os nºs 1 e 2 não sofreram alterações.
(7) No âmbito do referido parecer analisam-se alguns normativos de instrumentos convencionais, sendo de salientar a Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra as mulheres, a Declaração aprovada pela Assembleia Geral da ONU, em 7 de Novembro de 1967, e a Resolução 70(15), de 15 de Maio de 1970, adoptada pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa sobre "protecção social das mães solteiras e dos seus filhos".
(8) Sobre o princípio da proibição das discriminações, vejam-se GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, "Constituição da República Portuguesa Anotada", 2ª edição, 1º volume, 1984, anotação VI ao artigo 13º, página 150.
(9)O Projecto de Lei nº 5/III, sobre "a protecção e defesa da maternidade", apresentado pelo PCP, encontra-se publicado no "Diário da Assembleia da República", II Série, nº1, de 1 de Junho de 1983, e representou o retomar do Projecto de Lei nº 307/11, cuja apreciação constituiu objecto da informação-parecer nº 32/82, de 22 de Março de 1983.
No seu preâmbulo pode ler-se que nele se preconizam as medidas de protecção da maternidade e simultaneamente dirigem-se essas medidas exclusivamente à mãe "quando se trata de maternidade-reprodução" e consagram-se direitos a exercer tanto pelo pai como pela mãe, "quando se trata de garantir a prestação de cuidados a filhos menores que possam e devam ser exercitados quer pela mãe quer pelo pai".
(x)Ver os nºs 5 e 6 do artigo 36º e a alínea c) do artigo 67º.
(2x)Já que a língua portuguesa não comporta vocábulo semelhante ao inglês "parenthood".
(10)Cfr. loc. cit., pág. 87 e 88.
(11)Cfr. "Diário da Assembleia da República", II Série, nº 77, de 25 de Janeiro de 1984.
(12) Cfr. parte final do nº1 do artigo 68º da CRP.
(13) Cfr. artigo 36º, nº3, da CRP.
(14)Sobre a "licença por maternidade deverá ter-se presente a orientação deste corpo consultivo, segundo a qual a lei equipara a serviço efectivo o período de faltas por motivo de maternidade - cfr., v. g., o parecer nº 134/77, de 28 de Julho de 1977, publicado no "Boletim do Ministério da Justiça", nº 278, págs. 24 e ss. Veja-se também, no mesmo sentido, o parecer nº 51/80, de 28 de Agosto de 1980, no B.M.J. nº 304, páginas 185 e ss.
(15)Limitaremos tais apontamentos à situação, que é a da consulta, de assistência a filhos menores de 10 anos.
(16)Os artigos 20º e 23º estão integrados no Capítulo IV "Regimes de segurança social e acção social", e no Capítulo V "Disposições finais", respectivamente.
(17)Por sua vez, o Decreto-Lei nº 136/85, da mesma data, regulamenta a Lei nº 4/84, na parte em que é aplicável aos trabalhadores abrangidos pelo regime jurídico do contrato individual de trabalho.
(18)Cfr. o artigo 5º do Decreto-Lei nº 353-A/89, de 16 de Outubro.
(19) Cujo regime consta actualmente dos artigos 27º e seguintes do Decreto-Lei nº 497/88, de 30 de Dezembro, diploma que revogou o Decreto nº 19478, de 18 de Março de 1931, salvo os artigos 2º, 3º, 16º e 28º, e o Decreto-Lei nº 49031, de 27 de Maio de 1969, salvo os artigos 2º, 3º, 4º, 19º e 20º - cfr. artigo 108º, nº2.
(20)Atentar-se-á no facto de que o texto final do articulado, tal como foi aprovado na especialidade pela Comissão de Saúde, Segurança Social e Família, incluiu a seguinte alteração ao nº2 do artigo 18º, aceite por unanimidade: "As faltas dadas ao abrigo do artigo 13º são consideradas para efeitos de subsídio como faltas por doença do próprio trabalhador" - cfr. D.A.R., I Série, nº 86, de 10 de Fevereiro de 1984.
(21)Saliente-se, como já se referiu, que este corpo consultivo vem sustentando de há muito que é legalmente equiparável a serviço efectivo o período de faltas dadas por uma funcionária por motivo de maternidade - cfr. nota (14).
(22)Acerca do regime das faltas justificadas por doença do próprio no âmbito da vigência do Decreto com força de lei nº 19478, do Código Administrativo, e do Decreto-Lei nº 49031, cfr. JOÃO ALFAIA, "Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público", Almedina, Coimbra, vol. I, pág. 612 e ss.
(23)Cfr., designadamente, os artigos 28º e 29º do Decreto-Lei nº 497/88.
(24)Não assume relevo, na inteligência do parecer, a situação prevista no nº2 do artigo 53º. Vejam-se, quanto a ela, o artigo 14º da Lei nº 4/84 e os artigos 12º a 17º do Decreto-Lei nº 135/85.
(25)Nos termos do qual "sempre que um funcionário ou agente deixe de comparecer ao serviço durante 5 dias seguidos ou 10 dias interpolados sem justificação, será pelo imediato superior hierárquico levantado auto por falta de assiduidade".
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART13 N2 ART36 N3 N5 N6 ART59 N2 C ART67 ART68.
L 4/84 DE 1984/04/05 ART1 ART2 ART4 N1 N2 ART8 ART9 ART12 ART13 N1 ART14 ART15 ART17 ART18 ART20 ART23.
CADM36 ART508 PARUNICO ART509.
CCIV66 ART9. EDF84 ART71 N1 N2. LCT69 ART118.
DL 497/88 DE 1988/12/30 ART19 ART21 ART23 ART24 ART53 N1 ART71 N1 A N2.
DL 135/85 DE 1985/05/03 ART1 ART10 N1 N2 ART11.
DL 353-A/89 DE 1989/10/16 ART5.
DL 154/88 DE 1988/04/29 ART9 ART10 ART13 ART14 ART15.
DL 112/76 DE 1976/02/07 ART1 N1 ART3.
DL 49031 DE 1969/05/27 N2.
DL 42800 DE 1960/01/11 ART5 PARUNICO.
DL 19478 DE 1931/03/19. RCM DE 1934/07/07 IN DG IS DE 1934/07/14.
Referências Complementares: 
DIR ADM * FUNÇÃO PUBL.
Divulgação
Número: 
DR216
Data: 
18-09-1992
Página: 
55
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