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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
70/1989, de 26.10.1989
Data do Parecer: 
26-10-1989
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Agricultura e Pescas
Relator: 
GARCIA MARQUES
Descritores e Conclusões
Descritores: 
CAÇA
CONCESSÃO DE ZONA DE CAÇA
REGIME CINEGÉTICO ESPECIAL
ZONA DE CAÇA ASSOCIATIVA
ZONA DE CAÇA TURÍSTICA
TAXA
IMPOSTO
INCONSTITUCIONALIDADE ORGÂNICA
DESLEGALIZAÇÃO
REENVIO NORMATIVO
LACUNA
INTERPRETAÇÃO DA LEI
INTEGRAÇÃO DA LEI
Conclusões: 
1 - São configuraveis como taxas as importancias a que esta sujeita a concessão das zonas de caça associativas e das zonas de caça turisticas, nos termos dos artigos 26, n 10, e 27, n 7, da Lei n 30/86, de 27 de Agosto (Lei da Caça) e dos artigos 80, n 2, e 81, n 8, do Decreto-Lei n 274-A/88, de 3 de Agosto (Regulamento a Lei da Caça);
2 - A criação dessas taxas merce das normas aludidas, bem como a previsão, que e feita, da fixação do seu montante por portaria do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação, não invade a esfera de competencia reservada da Assembleia da Republica, definida nos termos dos artigos 106 e 168, n 1, alinea i), da lei fundamental, não sendo, por isso, inconstitucional;
3 - As taxas devidas pela concessão de zonas de caça turisticas, a que se refere o n 8 do artigo 81 do Regulamento a Lei da Caça, tem um prazo de incidencia anual.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Secretário de Estado de
Agricultura,
Excelência:

1 .

Tendo sido suscitadas dúvidas, no Conselho Nacional da Caça e da Conservação da Fauna (CNC), acerca da constitucionalidade das taxas devidas pela concessão de zonas de caça associativas e zonas de caça turísticas, dignou-se Vossa Excelência, concordando com o proposto por um assessor do Gabinete, solicitar parecer urgente ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, sobre as seguintes questões:

a) Constitucionalidade das taxas a que se referem os artigos 80º, nº 2 e 81º, nº 8, do Decreto-Lei nº 274-A/88, de 3 de Agosto;

b) Âmbito de incidência temporal da taxa prevista no nº 8 do artigo 81º do citado Decreto-Lei.

Cumpre, pois, emitir parecer com a urgência que foi pedida.

2.

2.1. Justifica-se proceder à transcrição da parte útil da informação nº 68/89, sobre a qual Vossa Excelência exarou o já citado despacho.

Aí se pode ler o seguinte:

"1- 0 actual regime jurídico da caça prevê, ao lado do chamado regime cinegético geral, o regime cinegético especial que compreende zonas de caça nacionais (ZCN), zonas de caça sociais (ZCS), zonas de caça associativas (ZCA), e zonas de caça turísticas (ZCT) - (cfr. artigos 56º e seguintes do Decreto-Lei nº 274-A/88, de 3 de Agosto).

2- De acordo com o disposto no nº 2 do artigo 80º do citado Decreto-Lei, a concessão de ZCA está sujeita ao pagamento de uma taxa anual a fixar por Portaria do Ministro da Agricultura, Pescas e alimentação.

3- No mesmo sentido o nº 8 do artigo 81º determina que a concessão de ZCT está sujeita ao pagamento de taxas, não esclarecendo, porém, o prazo a que as mesmas respeitam.

4- Impõe-se, assim, a publicação urgente da Portaria do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação que dê cumprimento ao disposto no nº 2 do artigo 80º e no nº 8 do artigo 81º.

5- Acontece que tendo sido submetida a questão ao Conselho Nacional da Caça e da Conservação de Fauna -órgão consultivo do Governo regulado pelos artigos 114º e seguintes do Decreto-Lei nº 274-A/88, de 3 de Agosto - este levantou duvidas sobre a constitucionalidade das referidas taxas em virtude de não haver contraprestação por parte da Administração Pública".

2.2. A primeira questão colocada traz implícita a dúvida acerca da qualificação jurídica das "taxas devidas pela concessão de ZCA e ZCT". Com efeito, a vingar o entendimento da inexistência, nas situações em apreço, de qualquer contraprestação por parte da Administração Pública, os tributos em causa configurariam a natureza de impostos, pelo que a competência para a respectiva criação não pertenceria ao Governo, de quem emanou o Decreto-Lei nº 274-A/88, de 3 de Agosto.

A referida inconstitucionalidade orgânica decorreria da ofensa do disposto pelos artigos 106º, nº 2, e 168º, nº 1, alínea i), da Constituição, na redacção, quer da Lei Constitucional nº 1/82, de 30 de Setembro, quer da Lei Constitucional nº 1/89, de 8 de Julho (1) .

2.3. A segunda pergunta formulada na consulta reconduz-se à interpretação do nº 8 do artigo 81º do Decreto-Lei nº 274-A/88 (Regulamento à Lei da Caça), no que exclusivamente se refere ao âmbito da incidência temporal da taxa ali prevista. Isto porque, contrariamente ao que o artigo 80º, nº 2, dispõe, quanto às taxas a que estão sujeitas as concessões das ZCA, ao fixar-lhes um prazo anual, o nº 8 do artigo 81º é, nessa matéria, omisso, no que diz respeito às taxas (devidas pela concessão de ZCT.

2.4. A dilucidação das dúvidas que nos são apresentadas implica o cumprimento de um plano de trabalho que se pode analisar nas seguintes etapas fundamentais:

a) apreciação do regime jurídico da caça actualmente em vigor no que diz respeito às zonas submetidas a regime cinegético especial, mormente no que se refere às zonas de caça associativas (ZCA) e às zonas de caça turísticas (ZCT);

b) qualificação jurídica das "taxas devidas pela concessão de ZCA e ZCT", o que pressupõe uma ingressão previa na problemática relativa a noção jurídica de "taxa" e à sua distinção da figura do "imposto";

c) breve apreciação dos princípios constitucionais em vigor acerca do âmbito da reserva legislativa da Assembleia da República em matéria fiscal e sua aplicação ao caso vertente;

d) interpretação do nº 8 do artigo 81º do Regulamento à Lei da Caça, no que se refere à definição do âmbito de incidência temporal da taxa ali prevista.

3.

3.1. Não obstante não lhe ser feita referência na informação que acompanhou o despacho de solicitação do parecer, torna-se Indispensável começar por analisar os preceitos essenciais da Lei da Caça (Lei nº 30/86, de 27 de Agosto), no que exclusivamente se revelar útil para a economia da consulta (2) (3) .

3.1.1. A caça é considerada um recurso natural renovável, cujo património e conservação são de interesse nacional (artigo 3º, nº 1), pelo que um dos princípios básicos a que está subordinada a política relativa ao património cinegético consiste na sujeição da gestão de tais recursos (cinegéticos) a normas de ordenamento, com o fim de garantir a sua continuidade e a manutenção dos equilíbrios biológicos (artigo 3º, nº 2, alínea a)). As normas que acabamos de enunciar sobre a "política da caça" (4) bem como as que definem as atribuições do Estado em matéria de caça, constantes do artigo 4º (5), representam, nesta particular temática, a emanação do princípio constitucional vazado na alínea d) do nº 2 do artigo 66º da lei fundamental, segundo o qual incumbe ao Estado "promover o aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e a estabilidade ecológica" (6) .

Reflectindo, desde já, sobre a questão nuclear da consulta, ou seja, sobre a qualificação jurídica das taxas previstas nos artigos 80º, nº 2, e 81º, nº 8, do Decreto-Lei nº 274-A/88, fácil é constatar que, em matéria de caça, as contraprestações por parte do Estado são, pois, evidentes. Oportunamente se extrairão desta constatação as devidas consequências.


3.1.2. Seja-nos permitido, a título de parêntesis, aflorar algumas ideias-chave que se acham reflectidas na Lei de Bases do Ambiente (Lei nº 11/87, de 7 de Abril). Assim, depois de se enunciar a fauna como componente ambiental natural (artigo 6º, alínea f)), estabelece-se, no artigo 7º, o princípio segundo o qual o Estado poderá, em ordem a assegurar a defesa da qualidade apropriada das componentes

ambientais naturais, "proibir ou condicionar o exercício de actividades e desenvolver acções necessárias à prossecução dos mesmos fins, nomeadamente a adopção de medidas de contenção e fiscalização...". É assim que o artigo 16º, sob a epígrafe "fauna", não só prevê a "adopção de medidas de controle efectivo" para a protecção de fauna autóctone (nº 3), como, por outro lado, estabelece, no nº 4, que "os recursos animais, cinegéticos e piscícolas (...) serão objecto de legislação especial que regulamente a sua valorização, fomento e usufruição...".

Compreende-se, pois, que, na inventariação dos instrumentos da política do ambiente, se conte "a fixação de taxas a aplicar pela utilização de recursos naturais e componentes ambientais" - cfr. alínea r) do nº 1 do artigo 27º (7) .

3.1.3. Voltando à Lei da Caça, revelam-se de particular interesse algumas disposições do Capítulo IV sobre os regimes cinegéticos, mormente no que se refere ao regime cinegético especial que, como já se disse, pode incluir
zonas de caça nacionais (8) zonas de caça sociais (9), zonas de caça associativas (10) e zonas de caça turísticas (11) - artigos 19º, nº 6, da Lei da Caça e 58º, nº 1, do Decreto-Lei nº 274-A/88.

Sobre a criação das zonas de regime cinegético especial dispõe o artigo 20º da Lei. Tal compete ao Governo, ouvido o C.N.C., assumindo a forma de Decreto-Lei a das ZCN e a de portaria a das restantes zonas. A criação das ZCT fica ainda sujeita ao parecer favorável do membro do Governo responsável pelo turismo.

3.1.4. Vejamos as características ou requisitos essenciais das diferentes modalidades de zonas de regime cinegético especial.

Assim:

A) Zonas de caça nacionais:

São constituídas por tempo indeterminado em terrenos cujas características permitam a constituição de núcleos de potencialidades cinegéticas tais que justifiquem ser o Estado o único responsável pela sua administração, a qual está a cargo da Direcção-Geral das Florestas (DGF) - artigos 24º, nºs 1 e 4, da Lei e 77º, nº 4, do Regulamento em vigor.

Quanto ao regime de taxas nas ZCN, transcrevem-se os nºs 6 e 7 do artigo 24º da Lei da Caça. Estabelecem o seguinte: "6- 0 exercício da caça nas zonas de caça nacionais fica sujeito ao pagamento de taxas, sendo as receitas resultantes da exploração aplicadas na satisfação dos encargos da zona e os excedentes no fomento da caça em geral" (12) .

"7- Nas zonas de caça nacionais as taxas devidas pelos caçadores nacionais e estrangeiros residentes deverão ser inferiores às estabelecidas para estrangeiros não residentes, salvo reciprocidade de tratamento" (13) .

No concernente à matéria das taxas nas ZCN, e para além dos nºs 5 e 8 do artigo 77º, disposições praticamente decalcadas dos transcritos nºs 6 e 7 do artigo 24º da Lei da Caça, importa transcrever o nº 6 do citado artigo 77º do Regulamento em vigor (o Decreto-Lei nº 274-A/88). Dispõe que lias regras gerais de funcionamento e o valor das taxas devidas pela prática da caça nas ZCN serão definidos em portaria do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação" (14) .

B) Zonas de caça sociais


São as que visam proporcionar a todos os caçadores nacionais o exercício organizado da caça por tempo indeterminado e em condições especialmente acessíveis, competindo a sua administração à DGF, que também elaborará os respectivos planos de ordenamento e exploração. Na referida administração das ZCS participarão ainda as autarquias locais, comissões de compartes, federações regionais de caçadores e entidades gestoras dos terrenos abrangidos - artigos 25º, nºs 1 e 3, da Lei e 78º, nº 4, do Regulamento.

Nos termos do nº 6 do artigo 25º da Lei, o exercício da caça nas ZCS fica sujeito ao pagamento de taxas, estabelecidas oficialmente segundo critérios de razoabilidade, de forma que a receita cobrada anualmente não exceda 60% dos encargos verificados no mesmo período na respectiva zona, sendo o remanescente suportado pelo Estado.

Correspondentemente, o Decreto-Lei nº 274-A/88 disciplina a matéria, sem nada de inovador, nos nºs 6 e 7 do artigo 78º (15)

C) Zonas de caça associativas

São aquelas "cujo aproveitamento cinegético seja exercido por associações, sociedades ou clubes de caçadores que nelas se proponham custear ou realizar acções de fomento e conservação da fauna cinegética, nelas assegurando o exercício venatório" - artigo 26º, nº 1, da Lei da Caça.

As ZCA visam proporcionar aos associados das entidades mencionadas a prática da caça de forma regrada e racional, com observância das regras legais e das normas estatutárias e regulamentares, sendo concedidas a requerimento de associações de caçadores, por prazo certo e renovável (16) , enquanto se verificar o seu bom funcionamento e forem atingidos os fins para que foram concedidas - artigo 79º, nºs 1 e 2, do Regulamento em vigor.

Serão instaladas de preferência em terrenos dos sectores privado ou cooperativo, mas poderão sê-lo também, verificadas as condições previstas no nº 2 do artigo 26º da Lei, em terrenos do sector público - cfr. ainda o nº 3 do artigo 79º do Regulamento.

As áreas das ZCA podem ser limitadas em função do número de caçadores associados, das espécies a explorar e das potencialidades do terreno, podendo ser estabelecida a todo o tempo a existência de um mínimo de caçadores associados, com a fixação de uma dada percentagem constituída por caçadores residentes na região cinegética onde se situa a zona de caça - artigo 26º, nºs 3 e 4, da Lei, e artigo 79º, nº 5, do Regulamento.

Os nºs 6 e 7 do artigo 26º da Lei estabelecem limites da área correspondente a cada caçador e da área global da zona, consagrando-se, no nº 5, o princípio de que cada caçador não poderá participar em mais de duas ZCA.

Nos termos do nº 8 do mesmo artigo, e, bem assim, do nº 1 do artigo 80 do Regulamento, compete aos serviços da DGF a aprovação e fiscalização do cumprimento dos planos de ordenamento e de exploração que as associações devem submeter-lhe (17) -

Como pondera um anotador da legislação da caça, o nº 8 do artigo 26º da Lei da Caça "estabelece o princípio, já aflorado no artigo 4º, de que será o Estado a supervisionar todo o desenvolvimento e exploração cinegéticos, seja qual for o sistema utilizado" (18) Mais uma vez se evidencia a existência, neste domínio, de contraprestações por parte da Administração Pública.

Depois de o nº 9 estabelecer o impedimento de "fazer negócio" com este tipo de exploração da fauna cinegética, reservando o exercício da caça aos associados, apesar de permitir que o plano de exploração preveja a possibilidade de não associados caçarem na zona, a título gratuito, chega-se ao nº 10, segundo o qual "a concessão das zonas de caça associativas está sujeita ao pagamento de taxas" (19) .

Regulamentando este princípio prescreve o nº 2 do artigo 80º do Decreto-Lei nº 274-A/88 (20) que "a partir de 1995 ou do ano em que nelas se iniciar o exercício da caça, no caso, de ser em data posterior, as concessões de ZCA estão sujeitas ao pagamento de uma taxa anual, a fixar por portaria do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação" -sublinhado agora (20) .

Sem prejuízo de se deixarem para momento ulterior as ilações a extrair do regime fixado pela legislação citada, desde já se sublinha que a sede normativa originária da sujeição ao pagamento de taxas pela concessão das zonas de caça associativas assumiu mesmo a natureza de lei formal (21) . 0 Governo limitou-se tão somente a desenvolver por Decreto-Lei, numa regulamentação apenas iniciada, o referido princípio.

D) Zonas de caça turísticas

As ZCT são constituídas com observância dos já citados princípios constantes do artigo 20º da Lei da Caça, com vista ao aproveitamento turístico dos recursos cinegéticos, "garantindo , para além da exploração da caça, a prestação dos serviços turísticos adequados" - artigos 27º, nº 1, da Lei, e 81º, nº 1, do Regulamento.

A exploração de ZCT, cuja constituição será efectuada de preferência em terrenos dos sectores cooperativo ou privado (22) pode ser levada a cabo pelo Estado, pelas autarquias, por empresas turísticas, por sociedades dos titulares e gestores dos respectivos terrenos ou por outras entidades dotadas da necessária capacidade - artigo 27º, nºs 2 e 3, da Lei. Tal exploração é concedida por períodos renováveis (23) e a sua área poderá ser limitada em função do plano turístico regional, das espécies a explorar e das potencialidades cinegéticas do terreno - artigos 27º, nº 4, da Lei, e 81º, nº 2, do Regulamento.

0 exercício da caça é facultado, em igualdade de circunstâncias, a caçadores nacionais e estrangeiros (nº 6 do artigo 27º da Lei e nº 6 do artigo 81º do Regulamento), estabelecendo o nº 7 do artigo 27º da Lei da Caça que "a concessão de zonas de caça turísticas está sujeita ao pagamento de taxas" (24) .

Por sua vez, interessa transcrever, do Regulamento, os nºs 5, 7 e 8 do artigo 81º:

"5- Os planos de ordenamento e exploração e de aproveitamento turístico das ZCT serão apresentados à DGF, que os analisará e remeterá posteriormente à Direcção-Geral do Turismo para obtenção do necessário parecer do Ministro do Comércio e Turismo, o qual será proferido e transmitido à DGF no prazo máximo de 30 dias".

"7- 0 cumprimento dos planos de ordenamento e exploração será fiscalizado pela DGF, cabendo à Direcção-Geral do Turismo fiscalizar o cumprimento das obrigações relacionadas com os aspectos turísticos".

"8- A concessão de ZCT está sujeita ao pagamento de taxas, a definir em portaria do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação, que serão devidas a partir do ano em que se iniciar o exercício da caça" (25) .

Como facilmente se constata, resulta do disposto nos nºs 5 e 7 um conjunto de obrigações funcionais, a cargo de uma estrutura orgânica bipolar - as direcções-gerais das Florestas e do Turismo-, cuja competência decorre logicamente da natureza das zonas de caça que estamos a analisar. Tais prestações funcionais dos serviços compreendem a análise e parecer dos planos de ordenamento e exploração e de aproveitamento turístico das ZCT e a fiscalização do seu cumprimento, na dupla vertente cinegética e turística (26) .


Em óbvia conexão com a actividade dos referidos órgãos da Administração, é fixado o princípio de que a concessão das ZCT está sujeita ao pagamento de taxas, princípio que já fora estabelecido, como vimos, pelo nº 7 do artigo 27º da Lei da Caça (27) .

3.1.4. A sujeição da concessão das zonas de caça associativas e das zonas de caça turísticas ao pagamento de taxas estava já prevista no projecto de lei nº 15/IV, apresentado pelo PSD - cfr. artigos 29º, nº 11, e 30º, nº 6.

Também o projecto de lei nº 24/IV, apresentado pelo PS, previa que a concessão do direito à criação, ordenamento e exploração de uma zona de caça turística a qualquer autarquia, empresa pública, de economia mista ou empresa turística privada será feita mediante o pagamento de taxas, a fixar por regulamento - artigo 18º, nº 5 (28) .

Por sua vez, a proposta de lei da caça (proposta de lei nº l/IV) estabelecia o princípio segundo o qual a concessão das zonas de caça associativas e de zonas de caça turísticas estava sujeita ao pagamento de taxas, "das quais uma percentagem não superior a 25% revertia a favor das respectivas autarquias" (artigos 27º, nº 9, e 28º, nº 7). A eliminação do inciso final, que acaba de se colocar entre aspas, deveu-se aos trabalhos da Comissão da Agricultura e Mar, cujo relatório sobre a citada proposta de lei e sobre os Projectos de lei nºs 15/IV e 24/IV consta do "Diário da Assembleia da República", nº 69, de 28 de Maio de 1986.

Antes de concluir este ponto justificar-se-á uma referência ao facto de a criação das zonas de caça associativas marcar uma diferença substancial em relação às "coutadas" ou "coutos de caça" que estavam previstos na legislação anterior - cfr., nomeadamente, os artigos 111º e seguintes do Decreto nº 47847. Com efeito, contrariamente ao que acontecia nas coutadas, nas quais o direito de caçar era atribuído ao respectivo titular (cfr. artigo 113º do citado diploma), as disposições legais relativas às ZCA estabelecem que a caça existente em determinado terreno será explorada, não já (e apenas) pelo seu dono, mas sim por uma entidade legalmente constituída que reúna um grupo de caçadores -associação, sociedade ou clube.

Tal circunstância não impediu, porém, o Deputado Lopes Cardoso de criticar a proposta de lei e o projecto de lei apresentado pelo PSD por visar reintroduzir o regime de coutadas "que, a pretexto da defesa, protecção e fomento da caça, mais não são do que o suporte de privilégios inaceitáveis..." (29) . Assim, na opinião do referido Deputado, a proposta de lei do Governo e o projecto de lei nº 15/IV pretenderiam reintroduzir "de forma ínvia, o regime dos coutos, usando a falaciosa designação de zonas de caça associativas" (30) .

Por seu lado, o Secretário de Estado da Agricultura, em intervenção produzida na apresentação da proposta de lei, esclareceu que, com tal iniciativa, se pretendia alterar profundamente a lei vigente, "reconhecendo que o Estado não pode nem deve gerir sozinho o património cinegético mas sim desempenhar um papel arbitral de salvaguarda de diversos interesses, por vezes antagónicos, transferindo, sempre que possível, e em maior ou menor grau, a responsabilidade dessa gestão para outras entidades, nomeadamente particulares, permitindo a criação de receitas que interessem e beneficiem camadas vastas da população, proporcionando ao agricultor uma nova possibilidade de explorar a terra..." (31) .

4

4.1. No plano de análise que nos propusemos adoptar, é chegado o momento de proceder à qualificação das "taxas devidas pela concessão das ZCA e das ZCT".

Desde já se deixa consignado que tais tributos são efectivamente configuráveis como taxas.

Não porque como tal a lei os designe, uma vez que, como é sabido, o legislador emprega, por vezes, as expressões "imposto" e "taxa" sem um sentido técnico-jurídico rigoroso.


Como ainda muito recentemente se ponderou neste órgão consultivo, "a terminologia legal não é, a este respeito, fiável. Observa-se haver impostos que a lei denomina taxas (v.g., a taxa militar) e taxas que denomina impostos (v.g., o chamado imposto de justiça) (32) .

Daí que tenha recaído principalmente sobre a doutrina a tarefa de procurar distinguir as duas figuras, socorrendo-se de certas particularidades que, no sistema jurídico, as caracterizam. Assim, para Teixeira Ribeiro, o imposto define-se como "uma prestação pecuniária, coactiva e unilateral, sem o carácter de sanção, exigida pelo Estado, com vista à satisfação de fins públicos". Prestação pecuniária porque o imposto é uma prestação de dinheiro ou equivalente a dinheiro; coactiva, porque o seu montante é estabelecido por lei ou por força de lei; unilateral, porque ao pagamento do imposto não corresponde qualquer prestação por parte do Estado; sem carácter de sanção, porque o imposto não tem natureza de penalidade, como a multa.

4.2. Assim se distingue da taxa (33) segundo o mesmo Autor, uma vez que esta, sendo também uma prestação pecuniária, coactiva, já não é uma prestação unilateral, uma vez que o seu pagamento corresponde a uma contraprestação de um serviço por parte do Estado (34)

Para Sousa Franco, a taxa é "uma prestação pecuniária que pressupõe, ou dá origem, a uma contraprestação específica, constituída por uma relação concreta (que pode ser ou não de benefício) entre o contribuinte e um bem ou serviço público" (35)

Ou seja, tanto no imposto como na taxa encontram-se caracteres fundamentais comuns: são prestações em valor patrimonial, são receitas definitivas e não sancionatórias. Mas o imposto é uma receita unilateral, sem a existência de qualquer contrapartida específica, ao contrário do que acontece na taxa. Esta contrapartida específica não consiste necessariamente na percepção em concreto de um benefício, nem sequer presumido. Basta uma relação concreta com o funcionamento do serviço: nas custas judiciais, por exemplo, que são verdadeiras taxas, o contribuinte será, em princípio, a parte que decair.


Ainda segundo Sousa Franco, o critério de fixação das taxas assenta nas seguintes ideias basilares: a)- facilitar ou dificultar o acesso aos serviços públicos, segundo um critério puramente político; b)- proceder à justa distribuição dos encargos públicos. 0 que se pretende é, não cobrir o funcionamento do serviço, mas sim distribuir- os encargos públicos entre os cidadãos de harmonia com critérios de justiça. Daí que haja isenção de taxas, mas não de preços.

Quanto aos fundamentos da dívida da taxa, escreve o citado Autor: "A utilidade presumida não tem de ser procurada pelo contribuinte, mas há-de ser por ele necessariamente sentida como tal: basta que o tenha por destinatário individualizado (por exemplo, a taxa destinada a financiar uma fiscalização à qual o contribuinte está sujeito, que ele pode não desejar e de que apenas o público em geral seja beneficiário). Ainda que não seja sentida satisfação subjectiva (talvez haja mesmo sacrifício... a lei presume que o funcionamento do serviço, em relação concreta com certo contribuinte, cria utilidades sociais objectivas" (36) .

4.3. A jurisprudência administrativa portuguesa tem adoptado um conceito de taxa que não se afasta do elaborado pela doutrina, quanto aos seus elementos essenciais.

Pode citar-se, a propósito, o acórdão de 17 de Março de 1976, do Supremo Tribunal Administrativo, tirado em Tribunal Pleno, no qual, além do mais, se ponderou que é a unilateralidade ou falta de uma contraprestação específica ao contribuinte (relação salagmática) que permite distinguir os impostos das taxas, que, consistindo em prestações pecuniárias anteriormente estabelecidas, pagas pela utilização individual de bens semipúblicos (37) têm a sua contrapartida numa actividade do Estado especialmente dirigida ao respectivo obrigado, ainda que não solicitada por este ou não vantajosa para ele (38) .

Ou seja, e tal como se reconhece num outro aresto do mesmo Tribunal, de acordo com uma conceitualização que, entre nós, e nas suas linhas gerais, se pode considerar pacífica, é essencial à qualificação de taxa a existência de uma contraprestação por parte do ente público, constituída por uma actividade especialmente dirigida ao obrigado, ainda que essa actividade não seja por ele solicitada, nem venha a traduzir-se em benefício para o mesmo, como sucede, por exemplo, com o imposto de justiça (39) .

Atento quanto se escreveu, compreende-se que o "nexo sinalagmático" a que se aludiu não tenha que importar equivalência económica, mas antes equivalência jurídica (40) .


Como se pondera no já referido parecer nº 64/89, se é certo que as taxas são sempre receitas coactivas, a verdade é que as utilizações que lhes correspondem podem ser voluntárias ou obrigatórias".

E acrescenta-se que as utilizações obrigatórias ainda "podem ser ou não solicitadas".

Exemplificando-se, escreve-se o seguinte: "Actos de registo civil como os originados nos factos do nascimento e do óbito representam utilizações obrigatórias solicitadas. A chamada a juízo em veste de réu, mesmo no caso de revelia, cifrar-se-á numa utilização obrigatória não solicitada". Ou seja, "Para serem devidas taxas nem sempre é, pois, indispensável a efectiva utilização dos bens" (41)

Mas mesmo quando não seja indispensável a efectiva utilização dos bens, ainda assim a obrigação da taxa se encontra exclusivamente relacionada com tal utilização "a despeito de conveniências de cobrança justificarem o débito pela mera possibilidade de utilização",

"Daí, aliás, que se a efectiva utilização deixar de ter lugar após o pagamento da taxa (o estudante, solvidas as propinas, absteve-se de frequentar as aulas), nem por isso existirá direito à sua repetição" (42) (43) .


5.

Os elementos legislativos recenseados e as considerações a propósito produzidas já apontam com clareza no sentido da refutação do entendimento de que as taxas devidas pela concessão das ZCA e das ZCT poderiam configurar a natureza de impostos, sendo determinantes os argumentos de direito positivo respeitantes ao carácter bilateral ou sinalagmático da figura.

Com efeito, contrariamente às dúvidas levantadas pelo Conselho Nacional da Caça e da Conservação da Fauna, às "taxas" a que se referem os artigos 80º, nº 2, e 81º, nº 8, do Decreto-Lei nº 274-A/88 correspondem contraprestações por parte dos serviços da Administração Pública.

Bastará recordar as atribuições do Estado em matéria de caça, fixadas no artigo 4º da Lei da Caça, através das quais o Estado se assume como entidade supervisionadora do património e ordenamento cinegéticos. Sem preocupações de exaustão, enunciam-se outras disposições da Lei da Caça que claramente cometem aos serviços da Administração Pública importantes deveres funcionais na matéria. É o caso dos artigos 15º (proibição de actividades que possam prejudicar a fauna cinegética), 16º (fixação dos períodos venatórios), 18º, nº 2 (preservação das espécies), 20º (criação das zonas de regime cinegético especial), 28º (enclaves), 29º (criação de caça em cativeiro), 30º (campos de treino) e, muito concretamente, os normativos constantes dos capítulos VII e VIII, relativos, respectivamente, à responsabilidade criminal, contra-ordenacional e civil e à administração e fiscalização da caça. Revelam-se de especial importância, na definição dos deveres dos serviços da Administração Pública central, nesta matéria, os artigos 34º (competência do Governo), 35º (competência dos serviços do MAPA) e do artigo 38º (fiscalização da caça).

É, assim, compreensível que, no caso concreto que nos ocupa, a expressão "taxas" seja utilizada em sentido técnico-jurídico rigoroso. Atente-se, aliás, no uso que do conceito é feito no já citado artigo 27º, nº 1, alínea r), da Lei de Bases do Ambiente (44) .

Mais especificamente, quanto às taxas devidas pela concessão das ZCA e das ZCT, já se viu como à noção de contrapartida, de nexo sinalagmático, de correspectividade ou de relação individual e concreta com a Administração, emerge dos normativos definidores das obrigações funcionais dos serviços da Administração Pública na constituição e definição dos limites das zonas, dos planos de ordenamento e exploração e na respectiva fiscalização - cfr. artigos 26º, nºs 2, 6, 7, 8 e 9 e 27º, nºs 2, 3, 5 e 8, da Lei da Caça (45). Paralelamente, tenham-se presentes as estatuições dos artigos 79º, nºs 3, 4 e 5, 80º, nº 1 e 81º, nºs 4, 5 e 7, do Regulamento.
As taxas devidas pela concessão das zonas de caça associativas e turísticas são sem dúvida, prestações pecuniárias coactivas, sem carácter de sanção, mas não podem razoavelmente analisar-se como prestações unilaterais. Na base da sua criação existe um recurso natural, que é a caça, posto à disposição dos particulares contribuintes, sob certas condições, a serem preenchidas não só pelos utilizadores, mas também pelos próprios serviços públicos.

0 binómio constituído pelo próprio recurso natural (fauna cinegética), cujo aproveitamento racional incumbe, por força da própria Constituição, ao Estado (artigos 66º, nº 2, alínea d), e 9º, alínea e)), e pelo desempenho da multiplicidade de actividades de gestão, controlo e fiscalização, a cargo dos serviços públicos, com vista à preservação desse recurso natural, com salvaguarda da sua capacidade de renovação e tendo em vista a estabilidade ecológica, representa a contraprestação específica do pagamento das taxas em apreço.

Entre outros objectivos que prosseguem, atenta a natureza jurídica que lhes assiste, logra-se indirectamente, mediante a incidência das taxas, contribuir para disciplinar a procura de uma riqueza pública - a caça - por óbvias razões de evitar o seu extermínio e de salvaguardar e, se possível, valorizar esse património (46) .

6.

6.1. Feita a qualificação, como taxas, das contribuições a que se referem os artigos 80º, nº 2, e 81º, nº 8, do Regulamento à Lei da Caça, é chegado o momento de se extraírem as adequadas consequências quanto à primeira das questões colocadas na consulta.

Ainda que a sede normativa originária da criação dos referidos tributos não fosse, como é, uma lei formal (a Lei da Caça), a conclusão a que se chegou, ao recusar-se-lhes a qualidade de impostos, habilita a responder-lhe com
segurança. Com efeito, nem os preceitos citados do Decreto-Lei nº 274-A/88 sofrem de qualquer inconstitucionalidade, nem a criação e fixação dos montantes das taxas, nos termos estabelecidos pela citada normação, enfermam de qualquer vício resultante da eventual invasão da esfera de competência reservada da Assembleia da República.

Isto porque só os impostos, não as taxas, estão sujeitos a reserva de lei, constituindo, nos termos do artigo 168º, nº 1, alínea i), da Constituição (47) 1 matéria da competência reservada relativa da Assembleia da República.

Dispõe, com efeito, o citado preceito da lei fundamental:

"Artigo 168º
(Reserva relativa de competência legislativa)


1. É da exclusiva competência da Assembleia da República, salvo autorização ao Governo:

( ... )

i) Criação de imposto, e sistema fiscal

( .... ) “

A redacção desta alínea é idêntica a versão originaria de 1976 (artigo 167º, alínea o)). Importa, no entanto, conjugá-la com o disposto no artigo 106º, nº 2, igual nas redacções de 1976, 1982 e 1989.

"Artigo 106º
(Sistema fiscal)

1- ( ... )

2- Os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes.

3- ( ... )”

Como se observa no citado parecer nº 64/89, "a opinião largamente maioritária perante os normativos transcritos foi sempre, em sucessão temporal, a de que o domínio da reserva parlamentar abrange apenas a criação de impostos - entendido o termo na sua acepção técnico-jurídica estrita, de modo a excluir, designadamente, as taxas-, bem como a definição dos seus elementos essenciais".

E, um pouco adiante, acrescenta-se:

"Dominante, inclusivamente, o ponto de vista segundo o qual não devem as taxas reputar-se incluídas na reserva de lei formal, nem mesmo por via de subsunção ao conceito de sistema fiscal" usado nos artigos 106º, nº 1 (48) , e 168º, nº 1, alínea i) da Constituição revista em 1982" (X)

6.2. Na abordagem que efectuou, no parecer nº 30/81, a Comissão Constitucional respondeu a duas questões, cuja importância e interesse é desnecessário sublinhar no âmbito da presente consulta.

Foram as seguintes:

a) Pode o Governo criar taxas por decreto-lei?

b) É constitucionalmente admissível que um decreto-lei estabeleça que o montante de uma taxa seja fixado por portaria?

A ambas foi dada uma resposta afirmativa, em termos merecem, a nosso ver, ser conhecidos.

6.2.1. Assim, e quanto à primeira, escreveu-se no aludido parecer:

“Na verdade e diferentemente de outras Constituições que estabelecem de uma forma inequívoca que só o Parlamento tem competência para criar tributos, sejam eles impostos, sejam eles taxas ou ainda outras receitas públicas coactivas, através da lei formal, a actual Constituição (49) estabeleceu de forma mais limitada que o sistema fiscal seria estruturado por lei (artigo 106º, nº 1), cabendo exclusivamente à Assembleia da República a criação de impostos, determinando a respectiva lei "a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes" (artigos 106º, nº 2, e 167º, alínea o)]”.

"É sabido igualmente que o Governo tem na Constituição de 1976, como já tinha na precedente Constituição, competência legislativa originária, independente e concorrente com a da Assembleia da República, podendo fazer decretos-leis em matérias não reservadas ao Conselho da Revolução ou à Assembleia da República (artigo 201º, nº 1, alínea a))".

"Ora, em matéria de criação de taxas a actual lei fundamental omite qualquer referência a uma competência exclusiva da Assembleia da República".

Nestes termos, e depois de, na esteira da lição de Teixeira Ribeiro, se ter realçado a noção de "sistema fiscal" no seu sentido próprio de "sistema de impostos", o parecer conclui que o Governo pode criar taxas através de Decreto-Lei, no uso da sua competência legislativa própria (50) .

6.2.2. Mas porque, no caso da consulta, os preceitos em causa do Regulamento à Lei da Caça remetem para portaria do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação a fixação (ou definição) das taxas sob estudo, revela-se de interesse conhecer a resposta dada pelo parecer nº 30/81, da Comissão Constitucional, à segunda das questões enunciadas.

Resposta com a qual se concorda, embora sustentada em argumentos que não se podem hoje subscrever, como se verá.

Defendeu-se, de facto, o entendimento de que é constitucionalmente lícito que um decreto-lei preveja que a fixação de uma taxa seja feita por portaria". Tratava-se então de analisar, como questão prejudicial, se era formalmente inconstitucional uma norma de um Decreto-Lei, nos termos da qual o titular de cada registo de televisor ficava obrigado ao pagamento de uma taxa de utilização anual, a fixar por portaria (51) .

Reconhecendo-se que, através de tal norma, se operava uma verdadeira deslegalização da fixação do montante da taxa, relegando-se para certa forma regulamentar - portaria - tal fixação, concluía-se que, provindo esta do órgão competente para fazer os regulamentos necessários à boa execução de leis e emanada ao abrigo da norma contida em decreto-lei, "não se vê que a Portaria nº 225/81, de 28 de Fevereiro, seja inconstitucional ou ilegal, na medida em que expressamente o legislador operou uma deslegalização, "rebaixando" formalmente o grau hierárquico normativo no caso concreto".

Tal era possível, uma vez que a matéria deslegalizada não pertencia, como se viu, ao domínio legislativo "por natureza", visto tratar-se de uma taxa e não de um imposto (52) .

Importa, porém, analisar a questão em face do texto do actual artigo 115º da Constituição, inexistente na versão originária de 1976.

6.3. Esta questão já, por algumas vezes, mereceu a atenção do Conselho Consultivo, mormente na formulação teórica da compatibilização da norma deslegalizadora (ou de reenvio) com o disposto no nº 5 do artigo 115º da Constituição, preceito aditado pela Lei Constitucional nº 1/82 (53) .


6.3.1. Pelo interesse prático de que se reveste, dadas as afinidades da questão analisada com a matéria que concretamente nos ocupa, acompanhemos de perto o parecer nº 146/85.

Apreciava-se um anteprojecto de Decreto-Lei relativo à fixação de uma taxa para aposição ou verificação da apostilha prevista numa Convenção disposição que suscitava dificuldades Jurídicas correspondia o seguinte texto:

"1. Pela emissão da apostilha ou pela verificação de qualquer apostilha é cobrada, por documento, uma taxa única pagável em dinheiro, no montante de Esc. 250$00.

2. 0 montante previsto no nº 1 pode ser actualizado por portaria".

A dificuldade que este artigo suscitava prendia-se com a sua conformidade ao disposto no nº 5 do artigo 115º da Constituição:

"Nenhuma lei pode criar outras categorias de actos legislativos ou conferir a actos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos".


Uma vez que o artigo em causa do anteprojecto, depois de fixar a taxa, no nº 1, permitia que o seu montante fosse alterado (actualizado) por portaria, reconhecia-se que se desenhava um possível cenário que a doutrina costuma designar por "deslegalização".

Depois de se chamar à colação a tese sustentada por Gomes Canotilho, sublinhou-se o entendimento firmado pelo Conselho Consultivo no sentido de que a Constituição passou a proibir a deslegalização. E, a propósito, transcreveu-se uma das conclusões do já citado parecer nº 34/84, segundo a qual "o nº 5 do artigo 115º estabelece a proibição dos regulamentos delegados ou autorizados nas suas manifestações de regulamentos modificativos, suspensivos, revogatórios e derrogatórios".

Também se passou em revista a jurisprudência do Tribunal Constitucional, em situações exemplarmente semelhantes com a que era analisada no âmbito do parecer que estamos acompanhando (54) através da análise de arrestos que bem evidenciavam a alteração sofrida no tratamento da problemática da "deslegalização", por virtude da revisão constitucional de 1982 e, mais concretamente, por força do citado nº 5 do artigo 115º do texto fundamental.


6.3.2. Nestes termos, perguntava-se no citado parecer nº 146/85 como ultrapassar a dificuldade que o referido preceito constitucional veio levantar (55) .

Respondendo a essa dúvida, escreveu-se o seguinte:

"Desde logo, o obstáculo poderia ser superado com a eliminação do nº 2 do artigo 2º.

"Mas, assim, sempre que a actualização da taxa se mostrasse necessária ter-se-ía de recorrer a um diploma de igual força ao daquele que, pela vez primeira, veio fixá-la, ou seja a um decreto-lei.

"Pensa-se, no entanto, que não será necessário ir tão longe, e que o nº 5 do artigo 115º da Constituição não proíbe que a "lei" crie a taxa, relegando para uma portaria a fixação do seu montante, o que permitirá a sua actualização também por portaria.

Para uma correcta compreensão desta distinção, retome-se, brevemente, o Parecer nº 34/84:

"A busca do sentido e alcance do referido nº 5 do artigo 115º reclama que aqui se teçam mais algumas considerações sobre a chamada remissão normativa ou reenvio normativo ... ), que, no ensinamento de Eduardo Garcia de Enterria (X) . se verifica quando uma lei remete para uma formação ulterior, a cargo da Administração, a determinação de certos elementos normativos que complementam a ordenação que a própria lei reenviante (remetente ou delegante) estabelece".

"Dá-se, em tal hipótese, um fenómeno de auto-limitação da norma remitente (XX) que renuncia a regular na totalidade a matéria e chama outra norma para concluir ou completar essa regulação. Porém, o conteúdo do acto reenviado permanece estranho à vontade reenviante, não se verificando integração da norma reenviada na norma reenviante.

"Importa agora dizer que dessa proibição (estabelecida no nº 5 do artigo 115º) se excluem os reenvios ou remissões normativas que consistem no facto de a lei remeter para a Administração a edição de normas regulamentares executivas ou complementares da disciplina por ela estabelecida ( ... ).

"Através desta remissão normativa a lei prossegue dois objectivos:

- Autorização ou habilitação da Administração para editar regulamentos de execução e complementares (função habilitante);

- Execução ou complementação material da norma legal (função normativa).


6.3.3. Concluída a transcrição do parecer nº 34/84, prosseguiu-se no parecer nº 146/85, com a afirmação de que “parece, assim, admissível que um diploma legislativo, que crie uma taxa, reenvie a fixação do seu montante para uma portaria, como que autolimitando-se".

Com tais fundamentos, propôs-se para o artigo 2º a seguinte redacção:

"1. Pela emissão da apostilha ou verificação de qualquer apostilha já emitida, é cobrada, por documento, uma taxa única pagável em dinheiro.

2. 0 montante da taxa será fixado por portaria do Ministro da Justiça".

6.4. Reiterando-se o bom fundamento das considerações acabadas de transcrever, cumpre concluir que as normas a que se refere a consulta, ao remeterem para portaria a fixação das taxas devidas pela concessão das ZCA e das ZCT, não têm a ver com o fenómeno da deslegalização, representando antes uma hipótese de reenvio ou remissão normativa, não contrariando o preceituado no nº 5 do artigo 115º da Constituição (56) .

7.

Relembremos a segunda questão posta na consulta.


Considerando que o nº 2 do artigo 80º do Regulamento se refere expressamente ao pagamento de uma taxa anual quanto às concessões de ZCA, pretende-se saber qual o "âmbito de incidência temporal" das taxas a que está sujeita a concessão de ZCT, uma vez que o nº 8 do artigo 81º do referido Regulamento é omisso quanto ao prazo a que as mesmas respeitam.

A solução que, porventura, mais afoitamente acorrerá ao espírito é a de que não terá sido por acaso, mas sim intencionalmente, que o legislador, no nº 8 do artigo 81º, não fixou a incidência anual das taxas devidas pela concessão das ZCT. E, a ser exacta tal premissa, uma ilação cumpriria extrair: a de que, contrariamente ao que sucede com as taxas a que está sujeita a concessão das ZCA, cujo âmbito temporal de incidência seria sempre anual, as taxas devidas pela concessão de ZCT teriam um prazo de vigência que não seria (forçosamente) de um ano.

Numa tentativa de confortar esta solução poder-se-iam coligir dois argumentos adicionais. Por um lado, dir-se-ia que às diferenças subjacentes entre as zonas de caça associativas e turísticas deveriam corresponder taxas de montantes diferenciados para a sua concessão. Ora, um dos factores a ter em atenção para a determinação do montante global das taxas poderá ser, justamente, o âmbito da sua incidência temporal.

Por outro lado, argumentar-se-á com o facto de que, enquanto nas ZCA, a sujeição ao pagamento da taxa (anual) apenas ocorrerá a partir de 1995 ou do ano em que nelas se iniciar o exercício da caça, no caso de ser em data posterior (artigo 80º, nº 2), nas ZCT as taxas 'serão devidas a partir do ano em que se iniciar o exercício da caça (artigo 81º, nº 8).

Quer isto dizer que, no que se refere às ZCT, a sujeição ao pagamento das taxas poderá ter lugar antes de 1995, ao contrário do que sucede com as ZCA.

Reconhecer-se-á, todavia, a debilidade desta argumentação. Com efeito, a existência de alguma especificidade na configuração da estrutura e objectivos dos dois referidos tipos de zonas cinegéticas especiais, bem como a constatação de uma diferença de regime quanto à data a partir da qual serão devidas as taxas em apreço, não impõem como inevitabilidade a adopção de diferentes âmbitos temporais de incidência para as taxas a pagar pela concessão de ZCA e de ZCT (57) .

E a verdade é que, em sentido contrário, procedem fundamentos dignos de ponderação, extraídos do regime do Decreto-Lei nº 274-A/88, susceptíveis de permitirem a reconstituição do pensamento legislativo pela forma mais racional e razoável - (cfr. artigo 9º do Código Civil).

Razões que, a nosso ver, apontam para a conclusão de que não só as taxas relativas às ZCA, mas também as referentes às ZCT, têm um prazo de incidência anual.

Há, com efeito, uma norma do Regulamento que expressamente qualifica as taxas relativas às zonas de caça associativas e às zonas de caça turísticas como anuais. Trata-se da alínea d) do nº 2 do artigo 73º, preceito relativo à renovação da concessão das ZCA e das ZCT.


Depois de, no nº 1, se estabelecer que tal renovação deve ser requerida à DGF até 60 dias antes do termo do seu prazo de validade, prevê-se, na alínea d) do nº 2, que, não tendo sido cumprido o referido prazo, pode ainda assim ser requerida a renovação das concessões até 30 dias antes do termo deste prazo, com o pagamento de uma taxa de valor igual ao dobro da taxa anual respectiva".

Ainda que assim não se entendesse, à mesma conclusão nos conduziria a adopção das regras relativas ao regime da integração de lacunas por recurso à analogia - artigo 10º do Código Civil.

Com efeito, adoptando esse percurso, deveria preencher-se a lacuna do nº 8 do artigo 81º com base na duração temporal prevista para a taxa devida pela concessão das zonas de caça associativas, constante do nº 2 do artigo 80º. Tal aplicação analógica apoiar-se-ia em critérios teleológicas, bem vincados pela identidade do regime legal que se encontra desenhado para ambas as situações (58)


Com efeito, o primeiro caminho a seguir na integração dessa lacuna estaria no recurso à analogia com vista a encontrar tratamento para este caso, idêntico ao de hipóteses semelhantes.

Ora, nessa linha de raciocínio, deveria ser, na espécie, aplicável, o âmbito de incidência temporal previsto no nº 2 do artigo 80º do Regulamento, ou seja, o prazo anual (59) .

Como consideração final, subjacente a quanto se disse, recorda-se a perfeita identidade de texto das disposições matrizes nesta matéria, que são o nº 10 do artigo 26º e o nº 7 do artigo 27º da Lei da Caça (60)

Conclusão:

8.

Termos em que se conclui:

1ª - São configuráveis como taxas as importâncias a que está sujeita a concessão das zonas de caça associativas e das zonas de caça turísticas, nos termos dos artigos 26º, nº 10, e 279, nº 7, da Lei nº 30/86, de 27 de Agosto (Lei da Caça) e dos artigos 80º, nº 2, e 81º, nº 8, do Decreto-Lei nº 274-A/88, de 3 de Agosto (Regulamento à Lei da Caça);

2ª- A criação dessas taxas mercê das normas aludidas, bem como a previsão, que é feita, da fixação do seu montante por portaria do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação, não invade a esfera de competência reservada da Assembleia da República, definida nos termos dos artigos 106º e 168º, nº 1, alínea i), da lei fundamental, não sendo, por isso, inconstitucional;

3ª - As taxas devidas pela concessão de zonas de caça turísticas, a que se refere o nº 8 do artigo 81º do Regulamento à Lei da Caça, têm um prazo de incidência anual.



(1) Na versão primitiva da Constituição de 1976, o princípio da sujeição da criação dos impostos à regra da reserva de lei formal decorria dos artigos 106º, nº 2, e 167º, alínea o).
(2) Acerca dos trabalhos preparatórios da Lei da Caça de 1986, vejam-se:
- Projecto de lei nº 15/IV, do PSD, no "Diário da Assembleia da República", II Série, nº 2, de 13 de Novembro de 1985;
- Projecto de lei nº 24/IV, do PS, no Diário da Assembleia da República, II Série, nº 3, de 15 de Novembro de 1985;
- Projecto de lei nº 68/IV, do deputado independente Lopes Cardoso, no Diário da Assembleia da República, II Série, nº 12, de 7 de Dezembro de 1985;
- Projecto de lei nº 74/IV, do deputado independente Ribeiro Teles, no Diário da Assembleia da República, II Série, nº 16, de 20 de Dezembro de 1985;
- Proposta de lei (do Governo) nº VIV, no Diário da Assembleia da República, II Série, nº 13, de 11 de Dezembro de 1985.
A lei veio a ser aprovada - cfr. Diário da Assembleia da República, I Série, nº 74, de 28 de Maio de 1986 - com votos a favor do PSD, PRD, CDS, deputados Ribeiro Teles (independente), António Campos e Alberto Avelino (PS) e votos contra do PS, PCP, MDP/CDE, deputado (independente) Maria Santos e a abstenção dos deputados António Barreto (PS) e José Azevedo (PRD).
(3) Quanto à legislação básica, reguladora do exercício da caça no nosso País, nas últimas décadas, antes da entrada em vigor da actual Lei da Caça, vejam-se os Códigos da Caça de 1930 (Decreto nº 18743, de 11 de Agosto de 1930) e de 1931 (Decreto nº 20199, de 12 de Agosto de 1931), o Decreto-Lei nº 23460, de 17 de Janeiro de 1934 e o respectivo Regulamento (Decreto nº 23461, da mesma data), o Código da Caça de 1967, integrado pela Lei nº 2132, de 26 de Maio de 1967 e pelo Decreto-Lei nº 47847, de 14 de Agosto de 1967 e ainda o Decreto-Lei nº 354-A/74, de 14 de Agosto.
(4) Nos termos do nº 3 do artigo 3º, o ordenamento cinegético integra o conjunto de medidas a tomar e as acções a empreender nos domínios da conservação, fomento e exploração racional da caça, com vista a obter e manter a máxima produtividade compatível com a potencialidade do ambiente, de harmonia com os limites impostos pelos condicionalismos económicos, sociais e culturais.
(5) De acordo com o artigo 4º, o Estado tem como atribuições em matéria de caça: zelar pelo património cinegético e promover o seu fomento; orientar o exercício da caça; e promover a participação das associações de caçadores, agricultores e outros cidadãos interessados na conservação, fomento e usufruto do capital cinegético no respectivo ordenamento.
(6) Princípio que decorre de uma das tarefas fundamentais do Estado, qual seja a de " ... defender a natureza e o ambiente, preservar os recursos naturais e assegurar um correcto ordenamento do território - cfr. artigo 9º, alínea e), da Constituição, na redacção saída da segunda revisão do texto fundamental.
(7) Sublinhado agora. Vejam-se ainda, da Lei de Bases do Ambiente, os artigos 2º, nº 1, alíneas d), e), m) e n), 5º, nº 2, alíneas a), b), d) e E) e 37º, nº 1.
(8) Artigos 24º da Lei da Caça e 58º, nº 2 e 77º do Regulamento.
(9) Artigos 25º da Lei e 58º, nº 3, e 78º do Regulamento.
(10) Artigos 26º da Lei e 58º, nº 4, 79º e 80º do Regulamento.
(11) Artigos 27º da Lei e 58º, nº 5, 81º e 82º do Regulamento.
(12) Disposição praticamente coincidente com o nº 5 do artigo 77º do Decreto-Lei nº 274-A/88.
(13) Disposição de conteúdo idêntico à do nº 8 do artigo 77º do Regulamento.
(14) A Lei da Caça foi objecto de regulamentação inicial através do Decreto-Lei nº 311/87, de 10 de Agosto, que viria a ser revogado pelo Decreto-Lei nº 274-A/88 (artigo 131º, nº 1). Quanto às taxas devidas pelo exercício da caça nas ZCN, cfr. o artigo 73º, nº 4, do referido diploma, o qual correspondia ao actual nº 6 do artigo 77º do Regulamento ora vigente.
(15) Cfr., no antecedente Regulamento à Lei da Caça, o nº 4 do artigo 74º.
(16) A exploração nas ZCA é concedida por períodos renováveis, no mínimo de seis e doze anos, conforme respeitem predominantemente à exploração de espécies de "caça menor" ou "maior" respectivamente -cfr. artigo 59º do Regulamento. Quanto aos conceitos de "caça maior e menor", vide o artigo 12, nºs 1, 2 e 3, do Regulamento e a lista I anexa a este diploma.
(17) Quanto aos planos de ordenamento e exploração, vejam-se os artigos 57º, nº 2, 66º e 67º, do Regulamento.
(18) Luís Alberto Lança, "Lei da Caça e Regulamento Anotados -Legislação Complementar", Almedina, Coimbra, 1989, anotação ao artigo 26º da Lei da Caça, pág. 35.
(19) Nos termos da alínea c) do artigo 45º da Lei, sob a epígrafe regulamentação", o Governo, no prazo de 90 dias, deveria regulamentar a lei em matéria de "criação, concessão e funcionamento das zonas de caça e respectivas taxas".
(20) Recorda-se ser este um dos dois normativos colocados à consideração deste corpo consultivo.
(20) No antecedente Regulamento - o Decreto-Lei nº 311/87 -, a matéria das taxas pela concessão de ZCA era disciplinada no nº 2 do artigo 75º e no artigo 76º, nos seguintes termos fundamentais:
a) tais taxas seriam definidas por portaria do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação - artigo 75, nº 2;
b) os concessionários de ZCA estariam isentos do pagamento de taxas durante os primeiros cinco anos após a entrada em vigor do diploma e, independentemente do referido prazo, durante os dois primeiros anos da concessão, quando as ZCA se constituíssem em terrenos sujeitos ao regime cinegético geral há mais de um ano - nºs 1 e 2 do artigo 76º.
(21) Constatação que é extensiva, como se verá, à concessão de zonas de caça turísticas, bem como, já se viu, também o é relativamente ao exercício da caça nas zonas de caça nacionais e nas zonas de caça sociais.
Oportunamente se verificará que, no caso concreto, em face da qualificação como taxas em sentido técnico-jurídico, dos tributos em apreço, se está fora do âmbito da reserva legislativa da Assembleia da República em matéria fiscal.
(22) Sem prejuízo de poderem ser constituídas em terrenos do sector público - cfr. nºs 2 e 8 do artigo 279 da Lei e nº 3 do artigo 81º do Regulamento.
(23) 0 período mínimo de constituição das ZCT é de 6 ou 12 anos, nos termos já expostos, supra, na nota (16), para as ZCA - cfr. artigo 59º do Regulamento.
(24) Cfr. o que se afirma na nota (21).
(25) Agora sublinhado. 0 nº 8 do artigo 81º é, justamente, como se disse, a segunda disposição legal cuja interpretação é objecto do pedido de parecer.
(26) A lei da Caça referia-se mais genericamente à aprovação dos referidos planos pelos serviços competentes (nº 5 do artigo 27º).
(27) No âmbito do antecedente Regulamento, cfr. o nº 5 do artigo 77º, segundo o qual as taxas de concessão das ZCT seriam definidas por portaria do MAPA.
(28) Vejam-se, por outro lado, do mesmo projecto, os artigos 16º, nº 8, e 19º, nº 4, in Diário da Assembleia da República, IV Legislatura, 1ª Sessão Legislativa, II Série, número 3, de 15 de Novembro de 1985. Quanto ao projecto de lei nº 15/IV, cfr. Diário da Assembleia da República, II Serie, número 2, de 13 de Novembro de 1985. Como resulta do parecer da Comissão de Equipamento Social e Ambiente, de 11 de Dezembro de 1985, foram estes os únicos projectos que baixaram à comissão - cfr. Diário da Assembleia da República, II Série, nº 16, de 20 de Dezembro de 1985.
(29) Cfr., Diário da Assembleia da República, I Série, número 17, de 20 de Dezembro de 1985, pág. 549.
(30) Sobre a possibilidade de criação de coutadas turísticas, cfr. o Decreto-Lei nº 733/74, de 21 de Dezembro.
(31) Cfr. Diário da Assembleia da República, 1ª Série, número 17, de 20 de Dezembro de 1985, pág. 554.
(32) Cfr. parecer nº 64/89, votado em 18 de Agosto de 1989, citando Teixeira Ribeiro, "Noção jurídica de taxa", "Revista de Legislação e de Jurisprudência", ano 117, nº 3727, pág. 291.
(33) Sobre a noção de taxa, particularmente em confronto com a noção de imposto, várias vezes se tem pronunciado este corpo consultivo -cfr., por exemplo, pareceres nº 130/58, de 30-5-1959, no Boletim do Ministério da Justiça, nº 89, pág. 358, nº 53/78, de 13-4-1978, no Diário da República, II Série, nº 136, de 16-6-1978 e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 281, pág. 117, nº 64/79 de 28-8-1980, no Diário da República, II Série, nº 16, de 20-1-1981, e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 305, pág. 81, nº 184/80, de 18-12-1980, no Diário da República, II Série, nº 187, de 17-8-1981, e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 306, pág. 138, nº 184/83, de 26-1-1984, no Diário da República, II Série, nº 85, de 10-4-1984, e no Boletim do Ministério da Justiça nº 338, pág. 151, nº 92/84, de 24-1-1985, no Diário da República, II Série, nº 89, de 17-4-1985 e no Boletim do Ministério da Justiça nº 346, pág. 98, nº 122/84, de 18-4-1985, no Diário da República, II Série, nº 227, de 2-10-1985, nº 15/86, de 24-4-1986, não homologado, nº 59/86, de 8-1-1987. no Boletim do Ministério da Justiça nº 366, pág. 152, nº 13/87, de 24-3-1988, no Diário da República, II Série, de 8-9-1988 e ainda o referido parecer nº 64/89, a aguardar homologação.
(34) Teixeira Ribeiro, "Lições de Finanças Públicas Coimbra, 1977, pág. 267.
(35) Sousa Franco, "Manual de Finanças Públicas e Direito Financeiro", Coimbra, 1986, pág. 491.
(36) Obra citada, págs. 497 e seguintes.
(37) Segundo Teixeira Ribeiro, "taxa é a quantia coactivamente paga pela utilização individualizada de bens semipúblicos" - "Noção jurídica de taxa", "Revista de Legislação e de Jurisprudência", Ano 117, nº 3727, pág. 291. Para este autor, bens semipúblicos são "bens públicos que, além de satisfazerem, como todos, necessidades colectivas, satisfazem necessidades individuais".
(38) Publicado nos "Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo", nº 178, págs. 1331 e seguintes.
(39) Acórdão de 27 de Junho de 1975, também do Tribunal Pleno, publicado nos "Acórdão Doutrinais", nº 169, págs. 124 e seguintes.
(40) Cfr. os já referidos pareceres nºs 59/86, 184/83 e 64/89.
(41) Como, em continuidade, se esclarece no parecer que estamos a acompanhar, será indispensável tal utilização efectiva se a solutio" ocorrer no momento da utilização ou posteriormente a esta (serviços de registo; tribunais). Não o será quando preceder a utilização (propinas universitárias; licenças).
(42) Cfr. citado parecer nº 64/89, ponto 1.2., "in fine", acompanhando Teixeira Ribeiro, "Noção...", pág. 293.
(43) Adoptando o entendimento oportunamente exposto na caracterização jurídica dos conceitos de "imposto" e "taxa", vejam-se ainda os pareceres da Comissão Constitucional nºs 30/81, 25/82 e 34/82, de 27 de Outubro de 1981, de 21 de Julho de 1982,e de 12 de Outubro de 1982, publicados, respectivamente, em "Pareceres da Comissão Constitucional", 17º volume, pág. 75, 20º volume, pág. 199, e 21º volume, pág. 139. Na mesma linha, veja-se também o acórdão do Tribunal Constitucional nº 29/83, de 21 de Dezembro de 1983, publicado no Boletim do Ministério da Justiça nº 338, págs. 201 e seguintes.
(44) Para caracterização das figuras da carta de caçador e das licenças de caça, previstas nos artigos 7º e 9º da Lei da Caça, veja-se o citado parecer nº 15/86.
(45) Isto não significa que as entidades concessionárias ou que administrem zonas de regime cinegético especial não sejam obrigados ao cumprimento de diversas obrigações (para além do pagamento das taxas devidas - alínea a) do nº 2 do artigo 71º, do Regulamento), mormente no âmbito da fiscalização e policiamento e da delimitação e sinalização da zona - cfr. alíneas b) e c) do referido preceito.
(46) Cfr. o artigo 74º, nº 1, alínea c), do Regulamento, que prescreve a extinção das concessões dos regimes cinegéticos especiais pela falta de pagamento da taxa, dentro de um certo prazo. Veja-se também o artigo 73º, nº 2, alínea d), do mesmo Regulamento acerca da renovação das concessões de zonas de caça associativas e turísticas.
(47) Na redacção resultante quer da primeira, quer da segunda revisão constitucional, em cujos textos o preceito apresenta a mesma formulação.
(48) 0 nº 1 do artigo 106º foi objecto de alteração de redacção no âmbito da revisão constitucional de 1989, em termos que, no entanto, não relevam para a economia do parecer.
(X) Os pareceres deste corpo consultivo nºs 53/78 e 64/80 pendem nesse sentido mas acabam por não assumir, no concreto aspecto, posição definitiva, desnecessária, de resto, à satisfação das consultas.
Peremptória já a Comissão Constitucional no parecer nº 30/81, págs. 99 e s., citando Teixeira Ribeiro - "a noção de sistema fiscal deve ser entendida no seu sentido próprio de "sistema de impostos" - e recenseando como única voz discordante, a de Nuno Sã Comes. A orientação vinha já do parecer nº 2/78, inventariado por Isaltino Morais, Ferreira de Almeida e Leite Pinto, Constituição da República Portuguesa Anotada e Comentada, Lisboa, 1983, pág. 329.
Também o Tribunal Constitucional se pronunciou recentemente, em significativos arestos, a favor da tese maioritária - acórdãos nºs 205/87 e 412/89, referenciados na nota anterior.
(49) Acerca do princípio da legalidade fiscal na Constituição de 1933, veja-se o parecer deste corpo consultivo nº 53/78 (ponto 6), e, bem assim, a parte final do ponto 20 do parecer da Comissão Constitucional que estamos a acompanhar.
(50) Já vimos, de resto, que as normas dos artigos 80º, nº 2, e 81º, nº 8, do Regulamento, pouco mais fazem do que definir a data a partir da qual as taxas são devidas e a remeter para portaria do Ministro da Agricultura a fixação dos respectivos montantes. o princípio-base de que a concessão das ZCA e das ZCT está sujeita ao pagamento de taxas, esse, figura na Lei da Caça - artigos 26º, nº 10, e 27º, nº 7.
(51) Tratava-se do artigo 8º, nº 1, do Decreto-Lei nº 401/79, de 21 de Setembro.
A Portaria concretizadora da referida estatuição viria a ser a portaria nº 225/81, de 28 de Fevereiro.
(52) Pronunciando-se também no sentido de ser claro que na reserva legislativa da Assembleia da República não se inclui a matéria de taxas, cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, "Constituição da República Portuguesa Anotada", 1985, 1º volume, pág. 464, anotação X ao artigo 106º, e 2º vol., pág. 201, anotação XIV ao artigo 168º.
(53) Cfr., v.g., os pareceres nº 20/83, de 21 de Julho de 1983, publicado no Boletim do Ministério da Justiça, nº 333, pág. 131 e no Diário da República, II Série, nº 257, de 8 de Novembro de 1983, nº 34/84, de 20 de Junho de 1984, publicado no Boletim do Ministério da Justiça, nº 341, pág. 96, e no Diário da República, II Série, nº 230, de 3 de Outubro de 1984, nº 146/85 e nº 27/88, ambos dirigidos ao Senhor Conselheiro Procurador-Geral da República.
(54) Cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 15/84, publicado no Diário da República, II Série, de 11 de Maio de 1984, 22/84, in Diário da República, II Série, de 21 de Maio de 1984 e 189/85, in Diário da República, II Série, de 31 de Dezembro de 1985.
(55) Sobre esta questão, veja-se também o já referido parecer nº 20/83, mormente o que se escreve a pág. 131 do Boletim do Ministério da Justiça, nº 333.
(X) "Legislacion Delegada, Potestad Regulamentaria y Control Judicial, 1970, págs. 149 e seguintes.
(XX) No dizer de Santi Romano, "Principi di Diritto Costítuzionale generale", citado por Garcia de Enterria.
(56) Disposição que manteve a mesma redacção no texto saído da segunda revisão constitucional.
(57) Parece poder concluir-se, tendo ainda presente o regime já instituído no precedente Regulamento à Lei da Caça - o Decreto-Lei nº 311/87 (artigo 76º, nºs 1 e 2) - que se visou, com a dilação prevista relativamente à vigência de aplicação das taxas pela concessão de ZCA, estimular com -tal benefício os respectivos concessionários (associações, sociedades ou clubes de caçadores).
(58) Atente-se, por exemplo, ainda, no disposto em mais dois preceitos do Regulamento - os artigos 63º e 74º, nº 1, alínea c).
No primeiro prevê-se, sem concretização, a redução de taxas até 50% de que poderão beneficiar as entidades gestoras de zonas de regime cinegético especial cujos planos de ordenamento e exploração contemplem medidas e acções de conservação de populações de espécies animais.
0 segundo prevê a extinção das concessões pela falta de pagamento de taxa no prazo de 60 dias após notificação do concessionário pela DGF".
Estas estatuições legais, para além de serem comuns concessão dos dois tipos de zonas de caça - associativas ou turísticas - compatibilizam-se melhor com o regime de taxas anuais do que com o de taxas únicas, de prazo igual ao período de concessão. Nesta hipótese (que, a verificar-se para as ZCT, poderia ter como suporte jurídico o recurso à norma a criar pelo intérprete por inexistência de caso análogo (artigo 10º, nº 3, do Código Civil)), o pagamento das taxas deveria ocorrer previamente à própria concessão das zonas, o que dificilmente se harmonizaria com a previsão dos citados normativos.
Com efeito, não estaria então ainda feita a prova do cumprimento dos requisitos condicionantes do benefício de redução da taxa, nem se poderia, em bom rigor, falar de extinção da concessão, uma vez que tal concessão ainda não teria ocorrido.
(59) Sobre as matérias da interpretação da lei e da integração de lacunas por analogia, cfr. os pareceres nº 40/86, de 9 de Outubro de 1986, publicado no Diário da República, II Série, nº 88, de 15 de Abril de 1987, nº 90/88, de 9 de Março de 1989, publicado no Diário da República, II Série, nº 129, de 6 de Junho de 1989, e nº 2/89, de 27 de Abril de 1989, a aguardar publicação e os muitos elementos doutrinais neles recenseados.
(60) É evidente o entendimento a que se chegou a propósito da incidência anual das taxas devidas pela concessão das ZCA e das ZCT não implica, de maneira nenhuma, que o montante dos referidos tributos seja igual ou, sequer, aproximado. Mas, nesse domínio, intervêem factores que obviamente ultrapassam a vertente jurídica.
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART66 N2 D ART168 N1 I ART115 N5.
DL 274-A/88 DE 1988/08/03 ART80 N2 ART81 N8.
L 30/86 DE 1986/08/27 ART24 N6 N7 ART25 N6 ART26 N10 ART27 N7.
L 11/87 DE 1987/04/07 ART6 F ART7 ART16 ART27 N1 E.
D 47847 DE 1967/08/14 ART111 ART113.
Jurisprudência: 
P CC 30/81 IN PCC VOL17 PAG75.
Referências Complementares: 
DIR CONST * ORG PODER POL / DIR FISC.
Divulgação
Número: 
DR108
Data: 
11-05-1990
Página: 
5033
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