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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
72/1988, de 07.07.1988
Data do Parecer: 
07-07-1988
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Defesa Nacional
Relator: 
GARCIA MARQUES
Descritores e Conclusões
Descritores: 
MILITAR
PENSÃO POR SERVIÇOS EXCEPCIONAIS E RELEVANTES
LOUVOR
CONDECORAÇÃO
CONDECORAÇÃO ESTRANGEIRA
MEDALHA COMEMORATIVA DE CAMPANHA
MEDALHA DE SERVIÇOS DISTINTOS
MEDALHA DE COMPORTAMENTO EXEMPLAR
MEDALHA DE MÉRITO MILITAR
ORDEM DO INFANTE D HENRIQUE
ORDEM MILITAR DE CRISTO
ORDEM DE AVIS
Conclusões: 
1 - O direito a pensão por serviços excepcionais e relevantes prestados ao Pais, ha-de resultar da pratica de actos demonstrativos de que o seu autor se tornou credor do reconhecimento nacional em razão da excepcionalidade e relevancia dos mesmos;
2 - Os factos constantes das notas biograficas e de assentos do requerente (...), General de Artilharia na situação de reserva, não satisfazem os requisitos definidos na conclusão anterior.
Termos em que este Conselho Consultivo emite parecer desfavoravel a pretensão.
Texto Integral
Texto Integral: 
SENHOR PRIMEIRO-MINISTRO,
SENHOR MINISTRO DAS FINANÇAS,

EXCELÊNCIAS:


1.

O General de Artilharia (...), na situação de reserva, requereu, ao abrigo do disposto pelo nº 1 do artigo 3º do Decreto-Lei nº 404/82, de 24 de Setembro, lhe seja concedida pensão por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País, baseando a sua pretensão nos "últimos quatro louvores que lhe foram concedidos e constam da sua folha de serviços, em especial os louvores concedidos pelo Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, por portarias de 13 de Agosto de 1976 e de 15 de Fevereiro de 1984".

O processo recebido integra também a respectiva folha de matrícula e o acórdão do Supremo Tribunal Militar, de 17 de Março de 1988 que, por unanimidade, emitiu parecer desfavorável à concessão da pensão no concernente à subsunção dos factos invocados no conceito de "feitos praticados em teatro de guerra" - artigos 3º, nº 1, e 28º do citado Decreto-Lei nº 404/82.

No entanto, e porque o requerente invocou para a concessão da pensão outros louvores cuja apreciação excede a respectiva competência, o Supremo Tribunal Militar considerou justificar-se que o pedido fosse também apreciado pela Procuradoria-Geral da República.

Cumpre, pois, emitir parecer nos termos do artigo 28º do Decreto-Lei nº 404/82.

2.

2.1 Importa, assim, e antes do mais, conhecer o teor dos louvores concedidos pelo Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, os quais determinaram, conforme se pode ler no requerimento, a concessão ao peticionante da medalha de ouro de serviços distintos com palma (portaria de 13 de Agosto de 1976) e da Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique (alvará de 22 de Fevereiro de 1984). 0 requerente foi ainda agraciado com a medalha de ouro de serviços distintos ("Diário da República", II Série, nº 55, de 7 de Março de 1981), com o grau de grande-oficial da Ordem Militar de Cristo (alvará de 4 de Dezembro de 1965) e com o grau de grande-oficial da Ordem Militar de Avis (alvará de 15 de Janeiro de 1970).

2.2 Como se pode ler na respectiva folha de matrícula, o requerente foi "louvado por Sua Excelência o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, pela forma excepcionalmente brilhante como desempenhou, durante dois anos, a difícil missão de Comandante do Sector de Cabinda, em acumulação com as absorventes responsabilidades de Governador do Distrito, e em que confirmou possuir muita competência, alto espírito de missão e grande aptidão para o comando de tropas ...“(1).

2.3 Posteriormente, foi o requerente novamente louvado pelo Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, "pela forma dinâmica e inteligente como vem desempenhando as funções de presidente da Comissão Directiva dos Serviços Sociais das Forças Armadas. Oficial general com uma brilhante folha de serviços e vastíssima experiência administrativa adquirida no desempenho de altas funções do Estado, no âmbito do Exército, tem o General (...) vindo a dar aos Serviços Sociais um forte impulso, colocando, mais uma vez ao serviço do País, nas forças armadas, todo o seu saber, dinamismo e capacidade directiva. Vivendo com inusitada intensidade os seus melindrosos problemas existentes nas forças armadas, no sector do apoio social, tem o general (...) obtido solução para os problemas mais agudos, ao mesmo tempo que se tem devotadamente esforçado por colocar os Serviços Sociais em condições de poderem intensificar e ampliar a sua acção em proveito de toda a família militar, designadamente no apoio a terceira-idade. São de assinalar os esforços que tem desenvolvido na construção, em Oeiras, de um complexo urbano de apoio a terceira idade, processo que tem progredido mercê da esclarecida persistência com que este oficial general se tem dedicado ~ sua concretização e solucionado os muitos e variados problemas ligados a este vultoso empreendimento. Por todos os motivos aqui referidos é justo e devido louvar a acção desenvolvida pelo General (...) nos SSFA, devendo os serviços prestados, na continuação da sua notável folha de serviços, ser considera dos extraordinários, relevantes e distintíssimos” (O.E. nº 7 – 2ª série de 7ABR81).

2.4 "Louvado pelo Exmº Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas pelas excepcionais qualidades profissionais e humanas que continua revelando no exercício das suas funções de presidente dos Serviços Sociais das Forças Armadas. Contando com a sua já longa e vasta experiência, obtida através de uma carreira brilhantíssima ao serviço das Forças Armadas e do País, procurou, desde a sua tomada de posse, dar uma nova orientação à actuação dos Serviços Sociais, indo ao encontro das reais necessidades dos seus beneficiários, perscrutando as suas carências e construindo uma filosofia de apoio cujos frutos se evidenciam na imagem que os Serviços Sociais vão vendo constantemente prestigiada. Para o efeito, dedicou-se, com todo o seu entusiasmo e saber, à tarefa de reformulação e actualização da antiquada legislação em vigor, à redacção de normas de procedimentos mais simples e funcionais e à definição mais clara e mais extensa dos apoios e benefícios a conceder a todos os beneficiários com especial relevância para os mais carenciados".

....................................................................................................................

"Não se limitando à área de Lisboa, procedeu à aquisição dos terrenos e determinou a elaboração dos respectivos projectos, já concluídos, para a construção dos complexos sociais do Porto e de Coimbra, aguardando unicamente condições de financiamento para poderem ser lançadas as respectivas obras de construção. Dotado de uma invulgar capacidade de concepção e análise, de um espírito esclarecido e determinado e de uma total dedicação a resolução dos inúmeros problemas da sua responsabilidade, tem desenvolvido acção de excepcional mérito no desempenho das altas e importantíssimas funções que lhe estão confiadas, prestigiando as Forças Armadas e prestando a estas e ao Pais serviços altos e relevantes" (O.E. nº 12 - 2ª série, de 15 de Junho de 1984).

3.

3.1 Da folha de matrícula consta ainda longa enumeração dos serviços por que passou e cargos que desempenhou no Exército, desde a sua promoção a Alferes, em 1945. Para além das condecorações e medalhas que mencionou no requerimento em que solicita a concessão da pensão, verifica-se da folha de matrícula que ao peticionante foram ainda atribuídas as seguintes distinções, que se enunciam pela ordem por que são referidas no documento que se vem acompanhando:

- Agraciado pelo Governo de Espanha com a cruz de 2ª classe de mérito militar (O.E. nº 3 – 2ª série, de 1-3-1962);

- Nos termos do artigo 75º da R.M.M. do Decreto nº 566/75, de 20 de Dezembro, por delegação de Sua Excelência o Ministro do Exército, foi concedida a medalha comemorativa das campanhas de Angola com a legenda “1971-72-73” (O.S. 11º-196, 22-8-1973);

- Pelo Governo Brasileiro foi agraciado com o grau de Comendador da Ordem de Mérito Militar do Brasil (O.E. nº 10 - 2º série, de 15MAI66);

- Condecorado com a medalha de ouro de comportamento exemplar, em conformidade com as disposições do Regulamento da Medalha Militar, promulgado pelo Decreto nº 566/71, de 20 de Dezembro de 1971 (O.E. nº 6, de 15MAR74 – 2ª série);

- Condecorado com a medalha de mérito militar de 1ª classe por "cativação de louvores", segundo parecer do Conselho Superior de Disciplina do Exército (O.E. nº 15, de 01AGO86 – 2ª série).

3.2 O Decreto nº 566/71, de 20 de Dezembro, que substituiu o Decreto nº 35 667, de 28 de Maio de 1946, promulgou o Regulamento da Medalha Militar (2). Nos termos do seu artigo 22, a medalha militar compreende as seguintes modalidades: valor militar, cruz de guerra, serviços distintos, mérito militar e comportamento exemplar.

A medalha de serviços distintos corresponde o Capitulo IV (artigos 21º a 32º). Esta medalha "e reservada a galardoar serviços de carácter militar relevantes e extraordinários ou actos notáveis de qualquer natureza, ligados a vida do Exército, da Armada ou da Força Aérea, de que resulte, em qualquer dos casos, honra e lustre para a Pátria ou para as instituições militares do País".

"A medalha de serviços distintos compreende os seguintes graus:

Medalha de ouro:
Medalha de prata;
Medalha de cobre"(3)

Relembre-se que ao General (...) foram impostas duas medalhas de ouro de serviços distintos, uma das quais com palma (portaria de 13 de Agosto de 1976) - cfr. supra, 2.1..

Dispõe o artigo 53º do Decreto nº 566/71 que "as medalhas de valor militar e de serviços distintos, quando concedidas por feitos ou serviços em campanha, terão sobre a fita uma palma de prata dourada ...”(4) .

"À medalha de mérito militar correspondem os artigos 33º a 40º, integrantes do Capitulo V (5). Compreende os seguintes graus: Grã-cruz; 1ª classe; 2ª classe; 3ª classe e 4ª classe (artigo 34º), sendo o grau de 1ª classe concedido a oficiais generais, coronéis ou capitães-de-mar-e-guerra, com vinte anos de serviço (artigo 35º, nº 2, alínea a)).

Por sua vez, a medalha de comportamento exemplar, que compreende os graus de medalha de ouro, medalha de prata e medalha de cobre (artigo 41º, nº 2), é objecto do Capítulo VI (artigos 41º a 47º). A medalha de ouro é concedida ao militar que contar trinta anos de serviço militar efectivo, que nunca tenha sofrido qualquer punição disciplinar ou criminal e tenha sempre revelado dotes notáveis de zelo pelo serviço e alto sentido da virtude da obediência e das regras da disciplina militar (artigo 42º).

Finalmente, as medalhas comemorativas das campanhas serão concedidas aos militares que nelas tenham tomado parte (artigo 49º, nº 1).

3.3 Analisado o condicionalismo legal inerente à concessão das medalhas (nacionais) com que o requerente foi agraciado, vejamos o regime relativo aos graus das ordens honoríficas com que o General (...) foi distinguido. Trata-se, relembre-se, da grã-cruz da Ordem do Infante D. Henrique (alvará de 22-2-1984) e dos graus de grande-oficial da Ordem Militar de Cristo (alvará de 4 de Dezembro de 1965) e de grande-oficial da Ordem Militar de Avis (alvará de 15 de Janeiro de 1970).

3.3.1 O Decreto-Lei nº 44 721, de 24 de Novembro de 1962, promulgou a lei orgânica das ordens honoríficas portuguesas, tendo o respectivo Regulamento sido editado pelo Decreto nº 45 498, de 31 de Dezembro de 1963 (6).

Entretanto, o Decreto-Lei nº 94/75, de 1 de Março, "considerando a actual conjuntura política nacional e a necessidade de se rever à luz do Programa do Movimento das Forças Armadas a orgânica das Ordens Honoríficas Portuguesas, determinou que "só serão concedidas agraciamentos a título excepcional e nos termos do artigo 20º do Decreto-Lei nº 44 721, de 24 de Novembro de 1962".

Só através do Decreto-Lei nº 132/85, de 30 de Abril, viria a ser revogado o Decreto-Lei nº 44 721 e os diplomas que o alteraram, bem como o Decreto-Lei nº 94/75, de 1 de Março. Assim se revê a orgânica das ordens honoríficas, justificando-se salientar a inclusão nas mesmas (na categoria das "ordens nacionais") da Ordem da Liberdade, que fora criada pelo Decreto-Lei nº 709-A/76, de 4 de Outubro.

Entretanto, o Decreto-Lei nº 132/85 viria a ser revogado pelo Decreto-Lei nº 414-A/86, de 15 de Dezembro (artigo 5º), diploma que aprovou a Lei Orgânica das Ordens Honoríficas Portuguesas, cujo regulamento foi editado pelo Decreto-Regulamentar nº 37-A/86, da mesma data(7).

3.3.2 Nos termos do artigo 2º do Decreto-Lei nº 44 721, as ordens honoríficas portuguesas distribuiam-se pelas categorias de "antigas ordens militares", que compreendiam as ordens da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito, de Avis, de Cristo e de Sant’Iago da Espada, de "ordens nacionais (Ordem do Império e do Infante D. Henrique) e Ordens de mérito civil (da Benemerência, da Instrução Pública e do Mérito Agrícola e Industrial) (artigo 2º) (8).

As Ordens Militares de Avis e de Cristo e à Ordem do Infante D. Henrique correspondem, respectivamente, os artigos 4º, 5º e 8º (9). A primeira é "exclusivamente reservada a oficiais das forças armadas, para recompensa de serviços distintos prestados em qualquer dos seus ramos". A Ordem Militar de Cristo é concedida "por destacados serviços prestados ao País no Governo, na diplomacia, na magistratura ou na administração pública”.

Por fim, a Ordem do Infante D. Henrique visa distinguir os que houverem prestado serviços relevantes a Portugal, no País e no estrangeiro, ou serviços na expansão da cultura portuguesa ou para conhecimento de Portugal, sua história e seus valores.

Entretanto, de acordo com o artigo 14º (do Decreto-Lei nº 44 721), os graus das antigas ordens militares e das ordens nacionais são, por ordem ascendente: cavaleiro (ou dama, se o agraciado for do sexo feminino), oficial, comendador, grande-oficial e grã-cruz(10).

De onde se conclui ser a grã-cruz da Ordem do Infante D. Henrique a condecoração mais importante com que o peticionante foi distinguido.


4.

4.1 Em face dos louvores e condecorações que mereceu ao longo de mais de 40 anos, verifica-se que a acção do General (...) tem vindo a ser reconhecida superiormente como digna de destaque e elogio.

Importa, por conseguinte, consignar o quadro legal justificativo da pretensão formulada, desde o Código para a Concessão de Pensões, de 1928, até ao diploma actual, o Decreto-Lei nº 404/82.

4.2 O Código para a Concessão de Pensões, aprovado pelo Decreto nº 15 969, de 21 de Setembro de 1928, dispunha no respectivo artigo 3º que davam direito à "pensão por serviços excepcionais e relevantes ao País" prevista no nº 2 do artigo 1º:

"1º - Feitos de valor nos campos de batalha,

2º - Actos de abnegação e coragem cívica,

3º - Altos e assinalados serviços prestados à Humanidade e à Pátria", que cidadãos militares ou civis tivessem praticado.

A este diploma sucedeu o Decreto com força de lei nº 17 335, de 10 de Setembro de 1929, que manteve no artigo 3º inserida essa tipologia factual para atribuição da aí designada "pensão por serviços excepcionalmente relevantes prestados ao País, em circunstâncias que mereçam prova do reconhecimento nacional".

Mais tarde, o Decreto-Lei nº 47 084, de 9 de Julho de 1966, conservou a mesma tipologia factual na alínea a) do seu artigo 3º, ainda que sem aludir às circunstâncias fautoras do mérito de reconhecimento nacional, que se liam no diploma imediatamente precedente.

O Decreto-Lei nº 404/82, de 24 de Setembro, enumerou no seu artigo 3º, nº 1, correspondentemente à tipologia que vinha nos anteriores diplomas, entre os factos que originam a pensão em causa:

“1) A prática, por cidadão português, militar ou civil, de feitos praticados em teatro de guerra, actos de abnegação e coragem cívica ou altos e assinalados serviços à Humanidade ou à Pátria".

5.

Este corpo consultivo tem acentuado, com frequência, que esta sucessão legislativa não significa que tenha havido alterações no que concerne aos requisitos de fundo que originam o direito à pensão nas situações hoje contempladas no nº 1 do citado artigo 3º do Decreto-Lei nº 404/82, como aliás logo sugere o confronto do teor verbal das normas jurídicas implicadas

Reparar-se-á, porventura, que a disposição que vem de citar-se, bem como a que lhe correspondia no Decreto-Lei nº 47 084, não reproduzem a expressão "em circunstâncias que mereçam prova de reconhecimento nacional" que figurava no corpo do artigo 3º, do diploma de 1929, mas a verdade é que, como se tem feito notar com regularidade (...),a divergência é irrelevante, pois se deve apenas a razões de ordem formal: a necessidade do reconhecimento nacional é algo que está implícito na natureza da própria pensão e, naturalmente, dos actos que a respectiva concessão pressupõe.

De resto, no preâmbulo do Decreto-Lei nº 404/82, o legislador deixou bem claro que, com o novo diploma, procurava, fundamentalmente, reunir matéria que andava dispersa por vários outros, e que as inovações introduzidas se circunscreviam à fórmula de cálculo das pensões, ao limite dos rendimentos com influência na atribuição da pensão e à igualação dos direitos dos beneficiários.

Por outro lado, este Conselho Consultivo tem insistido em que só actos de particular valia conferem direito à pensão.

Assim se tem escrito que estes hão-de ser "excepcionalmente relevantes que mereçam prova do reconhecimento nacional"; que no exercício da função pública hão-de ser revelados por actos ou factos que ultrapassem ostensivamente o exercício da função, ainda que esta haja sido exercida com o maior zelo, devoção, espírito de sacrifício e competência técnica (13) ; que não basta o mero "cumprimento do dever ainda que por forma exemplar ou sacrifício da saúde" (14) que o direi to à pensão se há-de fundar "na prática de actos demonstrativos de que o seu autor ultrapassou o cumprimento dos deveres que lhe incumbiam por tal forma que os serviços prestados devam ser considerados excepcionais e relevantes” (15) ; ou ainda que os actos praticados foram tais que "o seu autor se tornou credor do reconhecimento da Pátria em razão da excepcionalidade e da relevância dos mesmos (16).

Mas tem avançado mais na caracterização dos actos "excepcionais e relevantes", captando deles quatro notas fundamentais (17) : "a valia dos interesses que tais actos visam realizar, prosseguir ou defender; a tipologia dos mesmos; a gratuitidade destes; e a subordinação em grau que pode ir até ao sacrifício, nem que seja potencial, dos interesses de quem age aos interesses alheios que os seus actos intentam servir".

Valor dos interesses prosseguidos: naturalmente que há-de tratar-se de interesses altamente relevantes para o País, enquanto comunidade polarizada à volta de um certo quadro essencial de valores.

Tal decorre imediatamente, do próprio carácter excepcional do prémio concedido, mas também de expressões legais tão significativas como “serviços excepcionais e relevantes prestados ao País" corpo do artigo 3º - ou "altos e assinalados serviços à Humanidade ou à Pátria” - nº 1 da mesma disposição.

A tipologia deduz-se do relevo especial que o acto tem de assumir na dupla perspectiva dos interesses que serve e do alto grau de entrega e capacidade de auto-superação que mobiliza ou pressupõe. Por isso, a lei fala designadamente, "em altos e assinalados serviços" e em "actos de abnegação e coragem cívica".

A gratuitidade e a subordinação dos interesses do autor do acto no sentido de que o comportamento considerado implica o ir-se além do dever - não merece especial galardão quem se limitou a fazer o que devia -, dar sem contrapartida pessoal, a abnegação e coragem cívica a que alude o artigo.

Só quem vai além do dever, ainda que cumprido escrupulosamente, ganha "jus" ao reconhecimento da comunidade.

Por isso se compreende que o legislador tivesse referido no preâmbulo do Decreto-Lei nº 47 084 que "a finalidade que continua a orientar a política legislativa persiste a mesma: concretizar o dever de gratidão da Pátria"; e que, no preâmbulo também do Decreto-Lei nº 413/85, se voltasse a acentuar a mesma ideia: "os bombeiros, demais pessoal de combate aos incêndios e os simples cidadãos que tombaram em consequência da luta que travaram em defesa das vidas e dos bens ameaçados merecem o respeito e o reconhecimento da comunidade".

6.

Retenha-se, ainda, ter vindo o Conselho Consultivo a abandonar a rigidez do critério de quase automática recepção da qualificação de certos factos como merecedores de condecorações ou medalhas , aceitando ou não a sua veracidade, como a própria qualificação, daí extraindo efeitos quanto ao direito à pensão conforme existia ou não paralelismo entre os mesmos, doutrina seguida, nomeadamente, quando se ignoravam os factos que haviam estado na base da concessão da condecoração ou medalha.

Como se escreveu, oportunamente:

"Entende-se que tal posição deve ser revista, adoptando-se outro percurso.

"Assim, não será, desde logo, possível proceder a qualquer qualificação se os factos não são conhecidos (ainda que algum galardão tenha sido atribuído) ou se não se apresentam suficientemente concretizados.

"Não se verificando, porém, qualquer das hipóteses acabadas de referir, aceitar-se-ão, em princípio, os factos que foram tidos em conta para efeito de concessão das condecorações, medalhas ou quaisquer outros galardões.

"Conhecidos' e concretizados os factos, haverá então que proceder à sua qualificação com base num juízo autónomo, agora norteado pelos preceitos relativos à concessão do direito à pensão por serviços excepcionais e relevantes" (18).

7.

Não se suscitam dúvidas quanto à legitimidade do requerente, uma vez que o artigo 5º, nº 1, do Decreto-Lei nº 404/82, estabelece a pensão em beneficio do próprio autor do facto que a origine, enquanto vivo.

7.1 - Excluída a caracterização da actividade desenvolvida como "feitos praticados em teatro de guerra" (cfr. supra, ponto 1), torna-se também evidente, em face dos elementos disponíveis, que a pretensão da pensão não se enquadrará manifestamente na noção de factos de abnegação e coragem cívica". Resta assim saber se os factos praticados são bastantes para caber no conceito de “altos e assinalados serviços à Humanidade e à Pátria".

Cumpre, pois, emitir o respectivo juízo de valor que se formula negativamente.

É verdade que a matéria de facto disponível credita o requerente, por certo, como distinto oficial do Exército que serviu durante uma longa carreira cujos méritos fizeram jus aos louvores e condecorações que a sua folha de matrícula reflecte.

Mas na óptica do entendimento do regime da pensão não assumem esses factos, tal como constam do processo, aquele carácter de relevante excepcionalidade para concitar o especial reconhecimento nacional pressuposto nesse regime.

7.2 Uma referência específica cabe fazer à circunstância de a análise da folha de matrícula não evidenciar os factos concretos que justificaram a concessão das medalhas e a imposição das condecorações com que o peticionante foi distinguido. Todavia, no seu requerimento, ele próprio refere que a concessão da medalha de ouro de serviços distintos com palma e a atribuição da Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique foram determinadas pelos louvores concedidos pelo Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, por portaria de 13 de Agosto de 1976 e de 15 de Fevereiro de 1984 - cfr. supra, 2.2. e 2.4..

Tal circunstância justifica, pois, que nos detenhamos na apreciação da actividade, objecto desses louvores, sem esquecer a conduta enaltecida pelo louvor transcrito em 2.3., a qual está intimamente associada com a que viria a ser louvada em 1984.

Já se referiu que a importante actividade de comando militar desempenhada pelo General (...), no Sector de Cabinda, não foi qualificada pelo Supremo Tribunal Militar como integrante do conceito de "feitos praticados em teatro de guerra". Também não temos dúvidas em a considerar excluída da caracterização correspondente à noção de "altos e assinalados serviços à Humanidade e à Pátria". O mesmo se diga quanto à forma como o peticionante desempenhou as funções de presidente da comissão directiva dos Serviços Sociais das Forças Armadas, a qual foi objecto dos louvores transcritos em 2.3. e 2.4.. Trata-se de uma actividade de gestão, por certo muito eficiente, dinâmica e competente. No entanto, não assume o relevo extraordinário indispensável para tornar o seu autor credor do reconhecimento nacional.

7.3 Quanto aos graus de grande-oficial das Ordens Militares de Avis e de Cristo, com que o requerente foi agraciado, além de não terem o valor relativo da Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique, desconhecem-se, por falta de elementos no processo, quais os factos concretos que determinaram a sua concessão, sendo, assim, impossível a qualificação imprescindível para efeitos da pensão pretendida pelo requerente.

O mesmo se diga quanto às restantes medalhas com que o mesmo foi distinguido. Relativamente à medalha comemorativa, é manifesto que o mero serviço nas condições de campanha não é subsumível ao disposto no nº 1 do artigo 3º do Decreto-Lei nº 404/82.

Anotar-se-á ainda que, além de o processo não referir os factos que originara a atribuição das restantes medalhas, os pressupostos abstractos das respectivas concessões ficam aquém dos pressupostos reveladores da excepcionalidade do relevo dos factos que dão origem à pensão por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País(19).

Por último, desconhece-se a importância das condecorações concedidas pelos Governos de Espanha e do Brasil.

O relevo que pudessem ter, a propósito da requerida pensão, dependeria da natureza dos factos, que o processo não regista, na base dos quais tenha estado a atribuição das condecorações e da sua qualificação em face dos pressupostos de concessão da mesma pensão(20).

7.4 Em suma, pode dizer-se que não basta, por conseguinte, que se reconheça o brilhantismo de uma carreira exercida com mérito, por certo, superior ao normalmente exigido. Como o artigo 1º, nº 1, da respectiva lei orgânica refere, para esse efeito é que servem as ordens honoríficas, agraciando em vida ou a título póstumo "os cidadãos portugueses que se notabilizaram por méritos pessoais, por feitos cívicos ou militares ou por serviços prestados ao País".

Falece, no entanto, no caso vertente, a excepcional relevância a merecer grau de reconhecimento nacional, a medida específica dos pressupostos em que radica o direito à pensão e se corporiza numa particular valia que ultrapasse o escrupuloso ou, mesmo, exemplar cumprimento do dever - como já houve ocasião de se sublinhar, supra, no ponto S..

Tudo quanto se disse aplica-se em sede de qualificação de “altos e assinalados serviços à Humanidade e à Pátria", como se aplicaria, se tal fosse o caso, na caracterização de "actos de abnegação e coragem cívica”.

Ou seja, aceitando, embora que se está na presença de uma personalidade com brilhante carreira profissional, sem dúvida acima da média, contribuindo com a sua acção para o prestígio das Forças Armadas, impõe-se, todavia, reconhecer que não se aponta nem se divisa qualquer feito de relevo extraordinário, de excepcionalidade, que justifique a atribuição da pensão em apreço.

Flui do exposto que todas as distinções com que o requerente foi agraciado pressupõem um perfil profissional e humano, em certos aspectos, digno de servir como exemplo.

Mas nenhuma delas se projecta para além do âmbito funcional, nem faz, necessariamente, supor actuações que, marcadas pelo traço da excepção, vão muito além do cumprimento do dever e surjam aos olhos do cidadão comum como merecedoras de consagração nacional.

7.

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1ªO direito à pensão por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País, há-de resultar da prática de actos demonstrativos de que o seu autor se tornou credor do reconhecimento nacional em razão da excepcionalidade e relevância dos mesmos.

2ªOs factos constantes das notas biográficas e de assentos do requerente (...), General de Artilharia na situação de reserva, não satisfazem os requisitos definidos na conclusão anterior.

Termos em que este Conselho Consultivo emite parecer desfavorável à pretensão.






(1) Louvor publicado na O.S. nº 40, de 22DEZ76 da RO/DSP/ME. Este louvor, incidindo sobre actividade de comando militar, encontra-se reproduzido no acórdão do S.T.M., referido no ponto 1..
(2) O Decreto nº 566/71 foi objecto de rectificações publicadas nos "Diários do Governo" de 22-1-1972 e de 7-2-1972.
(3) Transcrição dos nºs 1 e 2 do artigo 21º. Nos termos do artigo 22º, "a medalha de ouro de serviços distintos destina-se a galardoar serviços distintíssimos no desempenho de uma muito importante comissão de serviço militar ou de alta missão de serviço publico ...”.
(4) Cfr. também o artigo 46º do Decreto nº 35 667, de 28 de Maio de 1946. A propósito da regra segundo a qual só é permitido usar uma insígnia de cada modalidade de medalha militar, vejam-se os artigos 45º do Decreto nº 35 667 e 562 do Decreto nº 566/71.
(5) "Destina-se a galardoar os militares que revelem competência profissional e aptidão para bem servir nas diferentes circunstâncias e, bem assim, excepcionais qualidades e virtudes militares, com um espírito de sacrifício e abnegação, coragem moral, valentia e lealdade, que os tornem dignos de ocupar cargos da maior responsabilidade ou os postos de maior risco e merecedores do respeito e consideração pública" (artigo 33º).
(6) Foram introduzidas alterações aos citados diplomas pelo Decreto-Lei nº 46 170, de 22 de Janeiro de 1965 e pelos Decretos nºs 46 786, de 23 de Dezembro de 1965 e 48 285, de 22 de Março de 1968.
(7) Alterados, respectivamente, pelo Decreto-Lei nº 85/88 e pelo Decreto-Regulamentar nº 12/88, ambos de 10 de Março.
(8) Cfr. os artigos 2ºs do Decreto-Lei nº 132/85 e da Lei Orgânica das Ordens Honoríficas Portuguesas, aprovada pelo Decreto-Lei nº 414-A/86. A alteração que sobressai consistiu na extinção da Ordem do Império e na criação da Ordem da Liberdade (pelo Decreto-Lei nº 709-A/76, de 4 de Outubro.
(9) Cfr., na actual Lei Orgânica das Ordens Honoríficas, os artigos 4º (Ordem Militar de Cristo), 5º (de Avis) e 7º (Ordem do Infante D. Henrique). A propósito do regime desta última, poderá ver-se o parecer nº 64/88, de 23 de Junho de 1988.
(10) Cfr. artigos 14º, nº 1, do Decreto-Lei nº 132/85, e 13º, nº 1, da LOOHP, aprovada pelo Decreto-Lei nº 414-A/86.
(11) Passaremos a seguir, muito de perto, transcrevendo-o em grande parte, o parecer nº 65/87, não publicado.
(12) Cfr., entre outros, os pareceres nºs 186/80, de 4 de Dezembro e 204/81, de 18 de Março de 1981, no Boletim do Ministério da Justiça, nºs 315-5, e 320-195, e no Diário da República, II Série, nºs 138, de 18/6/82, pág. 4 796, e 187, de 14/8/82, pág. 6 371, respectivamente; e ainda os pareceres nºs 59/84, de 3/8/84 e 59/87, 85/87 e 3/88.
(13) Parecer nº 204/81, já citado.
(14) Pareceres nºs 204/81, já citado, e 95/82, de 24/2/83, não publicados.
(15) Parecer nº 116/84, de 14/3/85, não publicado. (16) - Parecer nº 286/77, de 14/5/79, não publicado.
(17) Pareceres nºs 204/81, já referido, e 201/83, de 9/3/84, no Diário da República, nº 128, II Série, de 7/6/85 e 42/87 não publicado.
(18) Cfr. pareceres nºs 27/85, de 16-5-85, no Diário da República, II Série, nº 287, de 13-12-85, 105/87, de 14 de Janeiro de 1988, 15/88 e 29/88, ambos de 15 de Abril, 16/88, de 28 de Abril, 34/88, de 13 de Maio, 42/88, de 26 de Maio e 64/88, de 23 de Junho, todos de 1988.
(19) Nesse sentido, quanto às medalhas de comportamento exemplar e de mérito militar, veja-se o parecer nº 42/88, de 26 de Maio (ponto 4.2.).
(20) Sobre o relevo dos factos justificativos da atribuição de condecorações estrangeiras, na concessão de pensão por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País, vejam-se os pareceres nº 78/74, de 16 de Maio de 1974, no Boletim do Ministério da Justiça nº 249, pág. 397, outros aí citados, e ainda os pareceres nºs 269/78 e 42/88, já indicados.
Anotações
Legislação: 
DL 404/82 DE 1982/09/24.
RGU DA MEDALHA MILITAR APROVADO PELO D 566/71 DE 1971/12/20.
D 35667 DE 1946/05/28.
DL 44721 DE 1962/11/24.
D 45498 DE 1963/12/31.
DL 94/75 DE 1975/03/01.
DL 132/85 DE 1985/04/30.
DL 709-A/76 DE 1976/10/04.
DL 414-A/86 DE 1986/12/15.
DRGU 37-A/86 DE 1986/12/15.
DL 85/88 DE 1988/03/10.
DRGU 12/88 DE 1988/03/10.
D 15969 DE 1928/09/21.
D 17335 DE 1929/09/10. DL 47084 DE 1966/07/09.
Referências Complementares: 
DIR ADM * FUNÇÃO PUBL * PENSÕES.*****
* CONT REFPAR
P002011983
P000421987
P000271985
P000151988
P000291988
Divulgação
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