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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
156/2002, de 30.01.2003
Data do Parecer: 
30-01-2003
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Administração Interna
Relator: 
FERNANDES CADILHA
Descritores e Conclusões
Descritores: 
SERVIÇO NACIONAL DE PROTECÇÃO CIVIL
MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA
AUTARQUIA LOCAL
SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA
CALAMIDADE PÚBLICA
FUNDO ESPECIAL DE EMERGÊNCIA
CONTA ESPECIAL DE EMERGÊNCIA
FINANÇAS LOCAIS
AUXÍLIO FINANCEIRO
SUBSÍDIO
TUTELA ADMINISTRATIVA
AUTONOMIA FINANCEIRA
AUTONOMIA ADMINISTRATIVA
FUNDO DE BASE MUNICIPAL
FUNDO GERAL MUNICIPAL
FUNDO DE COESÃO MUNICIPAL
AUTORIZAÇÃO DE DESPESAS
ACTO INTERNO
REVOGAÇÃO
IMPUGNAÇÃO
Conclusões: 
1.ª O Fundo Especial de Emergência, criado pelo Decreto-Lei n.º 339/97, de 4 de Dezembro, na sequência dos fortes temporais que assolaram as áreas dos distritos de Beja, Évora e Faro, em Outubro e Novembro de 1997, destinava-se a cobrir necessidades sociais e despesas de investimento, e às correspondentes ajudas financeiras, a fundo perdido, poderiam candidatar-se pessoas, individuais ou colectivas, e autarquias locais;
2.ª Ao contrário, a Conta Especial de Emergência, criada pelo Decreto-Lei n.º 231/86, de 14 de Agosto, na dependência do Serviço Nacional de Protecção Civil (SNPC), tem em vista a satisfação de despesas de emergência, justificadas pela necessidade imediata de fazer face a acções de socorro e assistência às populações, em caso de catástrofe ou calamidade pública, e pressupõe, não só o reconhecimento, por parte do presidente do SNPC, da necessidade de uma intervenção desse tipo, como também a impossibilidade de os encargos em causa serem cobertos por verbas próprias de que o órgão interveniente disponha para o mesmo efeito (artigos 3º, n.º 1, alíneas a) e b), e 7º);
3.ª Num outro plano, a concessão excepcional de auxílio financeiro pelo Estado às autarquias, em caso de calamidade pública, prevista no artigo 7º da Lei das Finanças Locais (Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto), e segundo a regulamentação constante do Decreto-Lei n.º 363/88, de 14 de Outubro, ainda em vigor, depende do prévio reconhecimento dessa situação por parte do Governo, e pressupõe a verificação de prejuízos em infra-estruturas ou equipamentos municipais que constituam obstáculo ao normal funcionamento dos serviços, e, além disso, que os investimentos a realizar excedam a capacidade financeira do município. 4.ª Não preenchem o primeiro dos requisitos mencionados na antecedente conclusão 2.ª, as compensações monetárias atribuídas individualmente aos sinistrados para ressarcimento de danos provocados nas suas habitações, nem as despesas realizadas com trabalhos de reparação ou reconstrução de infra-estruturas públicas ou equipamentos;
5.ª A reposição de infra-estruturas e equipamentos municipais, a que se refere a segunda parte da conclusão anterior, apenas poderia suscitar a ajuda financeira do Governo, ao abrigo do artigo 7º da Lei das Finanças Locais, se, declarada a situação de calamidade pública, comprovadamente as obras fossem indispensáveis para assegurar a continuidade dos serviços e fosse ainda de considerar que, pelo seu volume, dimensão ou natureza, excediam a capacidade financeira da autarquia;
6.ª Os encargos descritos na conclusão 3.ª (ressarcimento de danos em habitações e despesas de reparação ou reconstrução de infra-estruturas), poderiam ter sido suportados pelo Fundo Especial de Emergência, se reclamados, em tempo oportuno, pelos interessados particulares e pela autarquia local;
7.ª O Serviço Nacional de Protecção Civil, tendo passado ao regime de autonomia meramente administrativa, a partir de 1 de Janeiro de 2003, nos termos definidos no artigo 3º da Lei n.º 32-B/2003, de 30 de Dezembro, era, até essa data, um serviço dotado de autonomia administrativa e financeira, encontrando-se sujeito a tutela integrativa do Governo, designadamente na modalidade de autorização de despesas (a partir de certo montante) que devessem ser suportadas pela Conta Especial de Emergência (artigo 5º, alínea b), do Decreto-Lei n.º 231/86, de 14 de Agosto);
8.ª O despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna que autoriza o pagamento de despesas, através da Conta Especial de Emergência, reportando-se a actividades desenvolvidas pelos serviços municipais de protecção civil, constitui um acto interno de gestão financeira do Serviço Nacional de Protecção Civil, e, como tal, não se encontra subordinado ao regime de revogabilidade dos actos administrativos previsto no artigo 141º, n.º 1, do Código de Procedimento Administrativo;
9.ª O mesmo acto, na medida em que represente o indeferimento de um pedido de ajuda financeira, formulado por uma autarquia local a coberto do Fundo Especial de Emergência, reveste-se já de eficácia externa, tornando-se susceptível de impugnação contenciosa, dentro do prazo legalmente previsto, não podendo, também, ser revogado, nessa parte dispositiva, senão no condicionalismo referido no citado preceito do Código de Procedimento Administrativo.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Secretário de Estado Adjunto do
Ministro da Administração Interna,
Excelência:


I

1. Dignou-se Vossa Excelência solicitar ao Conselho Consultivo, com carácter de urgência, a emissão de parecer quanto à legalidade do pagamento de despesas efectuadas pela Câmara Municipal de Ourique, na sequência dos fortes temporais que assolaram a área do distrito de Beja, em Outubro e Novembro de 1997, e cujo enquadramento na Conta Especial de Emergência tem suscitado dúvidas por parte do Serviço Nacional de Protecção Civil (SNPC) ([1]).

A consulta surge no seguimento de um pedido de reavaliação de um anterior despacho do Senhor Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, que havia determinado àquele Serviço o pagamento de uma parte das referidas despesas, e que originou a elaboração de uma informação-parecer da auditoria jurídica ([2]), em que se formularam as seguintes conclusões:

“I. Fora dos casos excepcionais consagrados pelo artigo 7º da Lei das Finanças Locais, nos termos constantes do Decreto-Lei nº 363/88, de 14 de Outubro, publicado no desenvolvimento do regime jurídico do artigo 13º da Lei nº 1/87 – Lei das Finanças Locais vigente à data dos temporais de 1997, mas que se mantém em vigor, por força da Lei nº 42/98, de 6 de Agosto -, não é possível conceder subsídios ou comparticipações às autarquias locais.

II. Os auxílios financeiros de emergência previstos para o caso de calamidade pública contemplados na lei, apenas podem ser concedidos, desde que seja declarado o estado de calamidade pública, através de Resolução do Conselho de Ministros.

III. As autarquias locais detêm atribuições de protecção civil não só em matéria de investimentos como para auxílio às populações, sendo responsáveis pelo pagamento das despesas que efectuarem nestes domínios.

IV. Integram o Sistema Nacional de Protecção Civil os serviços municipais de protecção civil, os quais têm constituído, junto destes, os centros operacionais de emergência de protecção civil, com as funções conferidas pelo artigo 17º, nº 3, conjugado com o artigo 3º da Lei de Bases de Protecção Civil, aprovada pela Lei nº 113/91, de 29 de Agosto.

V. Apenas as despesas urgentes realizadas pela estrutura municipal de protecção civil, integrada no Sistema Nacional de Protecção Civil, e não pela autarquia, enquanto tal, nos primeiros dias da emergência, na sequência de reconhecimento das necessidades de socorro e de assistência efectuada pelo Presidente do SNPC, face à avaliação levada a efeito pelas estruturas distritais de protecção civil, ou por estas confirmadas, quando a avaliação tenha sido efectuada pela estrutura municipal, poderão ser pagas pela Conta Especial de Emergência.

VI. Tais despesas têm, ainda, de se enquadrar no âmbito definido pelo artigo 3º, alínea a), do Decreto-Lei nº 231/96, de 14 de Agosto, na redacção do Decreto-Lei nº 11/96, de 29 de Fevereiro, e de ter sido efectuadas de acordo com as regras da contabilidade pública.

VII. Fora do caso previsto na conclusão anterior, o pagamento de quaisquer outras despesas, que não possam enquadrar-se no âmbito das conclusões que antecedem, porque assumiria a forma de subsídio, é vedado pela Lei das Finanças Locais.”

Não obstante, atendendo ao melindre da situação, a auditoria jurídica sugeriu a audição deste corpo consultivo, o que mereceu a concordância de Vossa Excelência.


II

1. Para um adequado enquadramento da questão importa ter presente os antecedentes factuais, conforme resultam dos elementos que integram o processo.

a) Por ofício de 23 de Fevereiro de 1998, o Presidente da Câmara Municipal de Ourique formulou perante o Ministro da Administração Interna um pedido de apoio, a fundo perdido, através do Fundo Especial de Emergência (criado pelo Decreto-Lei n.º 339/97, de 4 de Dezembro), a fim de satisfazer despesas efectuadas na sequência das intempéries ocorridas na área do município em Outubro e Novembro de 1997;

b) O apoio financeiro solicitado atingia o montante de 154 390 827$00, de acordo com a seguinte discriminação:

a) Transferência para particulares ....................135.267.600$00
b) Conta Emergência Apoio Vítimas ................. 6.313.938$00
c) Trabalhos efectuados por administração
directa com recurso a empreiteiros locais
e máquinas camarárias:
Empreiteiros locais ................................... 2.508.480$00
d) Refeições pagas ao pessoal camarário,
bombeiros e assistentes sociais .................. 513.000$00
e) Fornecimento de materiais de construção,
equipamentos e serviços prestados ........... 9.787.809$00

c) Uma informação do Gabinete do Secretário de Estado Adjunto, que mereceu a concordância do membro do Governo (despacho de 4 de Março de 1998), propunha que as verbas mencionadas nas antecedentes alíneas c), d) e e) fossem liquidadas pelo Serviço Nacional de Protecção Civil, através da Conta Especial de Emergência (criada pelo Decreto-Lei n.º 231/86, de 14 de Agosto), considerando as restantes rubricas carecidas de cobertura legal e, assim, da exclusiva responsabilidade camarária;

d) No entanto, aquele despacho não chegou a ser executado, em face de dúvidas que foram suscitadas pelo Serviço Nacional de Protecção Civil relativamente a alguns dos documentos de despesa, originando a elaboração de uma nota informativa do mesmo Gabinete no sentido de ser efectuada uma reavaliação da situação, através do referido Serviço, a qual obteve a anuência do Secretário de Estado Adjunto (despacho de 4 de Maio de 2001);

e) O presidente do Serviço Nacional de Protecção Civil informou, então, após a reanálise de toda a documentação, ser viável o ressarcimento das despesas efectuadas pela Câmara Municipal de Ourique, no total de 12 809 434$00, conforme o previsto no despacho do Secretário de Estado Adjunto de 4 de Março de 1998;

f) Porém, outras dificuldades, que se prendem agora com a invocação do disposto no artigo 7º da Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto (Lei das Finanças Locais), que proíbe a atribuição directa de quaisquer subsídios ou comparticipações a uma autarquia local, ainda que através da referida Conta Especial de Emergêngia, determinaram uma vez mais o protelamento na execução do sobredito despacho;

g) Por fim, um ofício endereçado ao Secretário de Estado Adjunto, pelo presidente do Serviço Nacional de Protecção Civil, dando conta das anteriores vicissitudes do procedimento, suscita a intervenção da auditoria jurídica, que veio a pronunciar-se nos termos já antes sintetizados.

2. Em face da sumária descrição que consta dos elementos do processo, o pedido de reembolso formulado pela Câmara Municipal de Ourique refere-se a encargos que teve de suportar, no período que medeou entre Novembro de 1997 e Fevereiro de 1998, no auxílio prestado às populações, na sequência das intempéries que se abateram sobre a região, e respeitam a apoios financeiros directamente concedidos a sinistrados, a despesas de alimentação com pessoas que intervieram em operações de assistência, ao fornecimento de materiais de construção e de equipamento, bem como à prestação de serviços e a trabalhos de reconstrução e reparação levados a efeitos por empreiteiros locais ou serviços camarários.

Entretanto, para financiamento da reparação dos efeitos dos temporais ocorridos nas áreas dos distritos de Beja, Évora e Faro, nos dias 5 e 6 de Novembro de 1997, o Governo tinha constituído, através do Decreto-Lei n.º 339/97, de 4 de Dezembro, um Fundo Especial de Emergência, de 1 250 000 000$00, e que se destinava a assegurar “a rápida normalização das condições e vida das populações.” ([3])

Conforme resulta do artigo 1º desse diploma, o Fundo era constituído por uma dotação própria inscrita no orçamento do Gabinete do Ministro da Administração Interna, e era especialmente orientado para:

a) Reconstrução e reparação de habitações;
b) Cobertura de necessidades sociais;
c) Apoio a microempresas que não tenham acesso a linhas de crédito bonificado aplicáveis à situação contemplada neste diploma;
d) Reposição de infra-estruturas e equipamentos de interesse público;
e) Outras situações não abrangidas pela legislação específica aplicável à situação contemplada neste diploma.

As competências para proceder à inventariação e comprovação das situações elegíveis para apoio do fundo, para definir critérios de atribuição e conceder os apoios em concreto, pertenciam a uma “estrutura de coordenação e controlo”, constituída nos termos do artigo 2º, e a autorização de despesas competia ao Ministro da Administração Interna (artigo 3º).

Ainda segundo o disposto no artigo 5º, “o montante dos apoios a conceder em cada caso será fixado em função da avaliação dos danos verificados, conjugada com a capacidade efectiva dos sinistrados para, pelos seus próprios meios, superarem os danos sofridos, tendo em conta também o conjunto dos apoios proporcionados no âmbito dos programas sectoriais que beneficiam à área afectada”.

A atribuição dos apoios devia respeitar, enfim, a ordem de prioridades definida no n.º 1 do artigo 4º, nos seguintes termos:

a) Pessoas singulares;
b) Pessoas colectivas de fins não lucrativos;
c) Microempresas que não tenham acesso a linhas de crédito bonificado aplicáveis à situação contemplada por este diploma;
d) Autarquias locais.

3. Ao formular um pedido de ajuda financeira nos termos anteriormente expostos, o presidente da Câmara Municipal de Ourique pretendia beneficiar do Fundo Especial de Emergência, especialmente criado para fazer face à reaparação dos efeitos dos temporais.

Todavia, a informação do gabinete do Secretário de Estado Adjunto que serviu de base ao mencionado despacho de 4 de Março de 1998 ([4]) - que autorizou o pagamento parcial das despesas -, conclui que as verbas respeitantes a apoios financeiros directamente concedidos aos particulares, que se incluiam nas duas primeiras rubricas, não se enquadravam no âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 339/97; e, por outro lado, quanto às restantes despesas, considerou justificada a autorização de pagamento, mas através da movimentação da Conta Especial de Emergência criada pelo Decreto-Lei n.º 231/86, de 14 de Agosto.

Outros elementos do processo dão conta de que a dotação prevista para o Fundo Especial de Emergência foi integralmente utilizada no decurso dos anos de 1997 e 1998 ([5]), o que explica que, tendo sido recusada, num primeiro momento, a concessão de apoio ao abrigo do Fundo criado pelo Decreto-Lei n.º 339/97, esse específico aspecto do enquadramento jurídico não tenha sido retomado nas sucessivas reavaliações da situação efectuadas posteriormente.

Na actualidade, a questão tem, pois, de ser equacionada à luz dos diplomas legais que estabelecem o regime geral de auxílios financeiros às autarquias locais, considerando o quadro de intervenção destas entidades no domínio da protecção civil.



III

1. Ainda recentemente, a propósito da determinação da competência, em caso de iminência de calamidade, catástrofe ou acidente grave na área de um município, para desencadear as operações de protecção civil, este corpo consultivo teve o ensejo de empreender o estudo da complexa estrutura organizatória do sistema nacional de protecção civil, sendo de toda a utilidade retomar agora o método expositivo que aí se adoptou ([6]):

Como então se escreveu, coenvolvendo, embora, todas as estruturas da Administração Publica, a lei confia nuclearmente a prossecução dos objectivos de segurança interna, de matriz constitucional ([7]), ao Ministério da Administração Interna, cuja lei orgânica, consubstanciada no Decreto-Lei nº 55/87, de 31 de Janeiro ([8]), dispõe no artigo 1º (itálico nosso):

«Artigo 1º
Atribuições

Ao Ministério da Administração Interna, abreviadamente designado por MAI, compete, em geral, promover, de acordo com as directrizes do Governo, a formulação, coordenação e execução da política de segurança interna e protecção civil, assegurar as medidas necessárias à organização e execução dos processos eleitorais e garantir, através do governador civil, a representação do Governo na área do distrito.»

O artigo 2º precisa, por sua vez, determinadas áreas estratégicas relativas ao direito à segurança, na vertente da protecção civil a que especificamente concerne a consulta:

«Artigo 2º
Domínios de actuação

As atribuições do MAI exercem-se nos seguintes domínios:
a) Manutenção da ordem, segurança e tranquilidade públicas;
b) Protecção de pessoas e bens;
(...)
h) Prevenção de catástrofes, calamidades ou desastres e prestação de ajuda às populações e de socorro aos sinistrados;
(...)
j) (...)»

Nas áreas aludidas pontificam determinados organismos especializados dependentes do MAI ou a este ligados estreitamente, com destaque para os governos civis, como «serviços desconcentrados» a que se refere o artigo 14º, e os «serviços de protecção civil», que se encontram, por seu turno, previstos no artigo 15º, nº 3 (o preceito identifica como serviço de protecção civil organicamente dependente do MAI o Serviço Nacional de Bombeiros)

2. Paralelamente aos dados legislativos que concernem à organização interna do MAI, interessa considerar as grandes linhas do sistema orgânico-institucional de protecção civil.

A Lei nº 113/91, de 29 de Agosto - «Lei de Bases da Protecção Civil» -, define a protecção civil no seu artigo 1º, do seguinte modo:

“A protecção civil é a actividade desenvolvida pelo Estado e pelos cidadãos com a finalidade de prevenir riscos colectivos inerentes a situações de acidente grave, catástrofe ou calamidade, de origem natural ou tecnológica, e de atenuar os seus efeitos e socorrer as pessoas em perigo, quando aquelas situações ocorram.»

As noções de acidente grave, catástrofe e calamidade constam dos nºs 1, 2, e 3 do artigo 2º ([9]), exigindo o nº 4, face à ocorrência ou perigo de ocorrência das duas últimas singularidades, que seja «reconhecida e declarada a necessidade de adoptar medidas de carácter excepcional destinadas a repor a normalidade das condições de vida nas zonas atingidas pelos seus efeitos».

O artigo 3º ocupa-se dos objectivos e domínios de actuação da protecção civil, interessando conferir destaque aos mais significativos, na tónica da consulta:

«Artigo 3º
Objectivos e domínios de actuação

1 – São objectivos fundamentais da protecção civil:
a) Prevenir a ocorrência de riscos colectivos resultantes de acidente grave, de catástrofe ou de calamidade;
b) Atenuar os riscos colectivos e limitar os seus efeitos, no caso das ocorrências descritas na alínea anterior;
c) Socorrer e assistir as pessoas em perigo.
2 – A actividade de protecção civil exerce-se nos seguintes domínios:
a) Levantamento, previsão, avaliação e prevenção dos riscos colectivos (...)
b) (...)
c) Informação e formação das populações (...)
d) Planeamento de soluções de emergência (...)
e) Inventariação dos recursos e meios disponíveis e dos mais facilmente mobilizáveis, ao nível local, regional e nacional;
f) (...)»

Prevê igualmente o artigo 4º, nº 1, para o «caso de ocorrência de acidente grave, catástrofe ou calamidade», a adopção das «medidas de carácter excepcional» enunciadas nas suas alíneas a) a f), as quais se destinam «a repor a normalidade das condições de vida nas zonas atingidas».

Sobressai entre elas a medida prevista na última das indicadas alíneas - da alçada do Conselho de Ministros, como se verá [artigo 11º, nº 2, alínea e)] -:

«f) Afectar meios financeiros especiais destinados a apoiar as entidades directamente envolvidas na prestação de socorro e assistência aos sinistrados».

Após a alusão aos princípios básicos da «política de protecção civil», no Capítulo II da Lei de Bases (artigos 5º a 9º) ([10]), o Capítulo III (artigos 10º a 16º) regula em quatro secções distintas os órgãos superiormente incumbidos das missões de Enquadramento, coordenação, direcção e execução da política de protecção civil, respectivamente: a Assembleia da República, o Governo, o Conselho Superior de Protecção Civil e a Comissão Nacional de Protecção Civil.

A Assembleia da República, fundamentalmente, «contribui, pelo exercício da sua competência política, legislativa e financeira, para enquadrar a política de protecção civil e para fiscalizar a sua execução» (artigo 10º, nº 1).

Já a «condução da política de protecção civil é da competência do Governo, que, no respectivo Programa, deve inscrever as principais orientações a adoptar ou a propor» nesse domínio (artigo 11º, nº 1).

Nos termos do nº 2 deste normativo, compete em especial ao Conselho de Ministros ([11]):

«a) definir as linhas gerais da política governamental de protecção civil, bem como a sua execução;
b) Programar e assegurar os meios destinados à execução da política de protecção civil;
c) Declarar a situação de catástrofe ou calamidade pública, por iniciativa própria ou mediante proposta fundamentada do Ministro da Administração Interna ou dos Governos Regionais;
d) Adoptar, no caso previsto na alínea anterior, as medidas de carácter excepcional destinadas a repor a normalidade das condições de vida nas zonas atingidas;
e) Deliberar sobre a afectação extraordinária dos meios financeiros indispensáveis à aplicação das medidas previstas na alínea anterior, com salvaguarda do disposto na alínea e) do artigo 137º da Constituição da República.»

O Conselho Superior de Protecção Civil, a que preside o Primeiro-Ministro, é um «órgão interministerial» consultivo em matéria de protecção civil (artigo 13º, nº 1), competindo-lhe emitir parecer nomeadamente sobre os assuntos enunciados no nº 2 do mesmo artigo.

Por fim, a Comissão Nacional de Protecção Civil é um «órgão especializado de assessoria técnica e de coordenação operacional da actividade dos organismos e estruturas de protecção civil» (artigo 15º, nº 1), que funciona na directa dependência do Primeiro-Ministro ou do Ministro da Administração Interna por delegação daquele (nº 2) ([12]).

Compete em geral à Comissão «assistir, de modo regular e permanente, as entidades governamentais responsáveis pela execução da política de protecção civil» e, designadamente, através da elaboração de estudos e formulação de propostas sobre as matérias especificadas no artigo 16º, nº 1 ([13]).

Acrescendo aos órgãos superiores do sistema de protecção civil que se passaram em revista, interessa ainda aludir à «Estrutura, serviços e agentes de protecção civil» regulados no Capítulo IV da Lei de Bases (artigos 17º a 19º).

Dos serviços de protecção civil cuida o artigo 17º:


«Artigo 17º
Serviços de protecção civil

1 – Integram o sistema nacional de protecção civil o serviço nacional, os serviços regionais e os serviços municipais.
2 – Nos distritos haverá delegações do serviço nacional de protecção civil.
3 – No espaço sob jurisdição da autoridade marítima a responsabilidade inerente à protecção civil cabe aos serviços dependentes daquela autoridade.
4 – Aos serviços de protecção civil cabem, em geral, funções de informação, formação, planeamento, coordenação e controlo nos domínios previstos no artigo 3º.
5 – As matérias respeitantes à organização, funcionamento, quadros de pessoal e respectivo estatuto dos serviços de protecção civil e suas estruturas inspectivas, bem como as suas atribuições e competências, serão objecto de decreto regulamentar.»

Resta ainda aludir às denominadas «operações de protecção civil», reguladas no Capítulo V, assim titulado (artigos 20º a 22º), da Lei de Bases.

Dispõe o nº 1 do artigo 20º que, em «situação de acidente grave, catástrofe ou calamidade e no caso de perigo de ocorrência destes fenómenos, são desencadeadas operações de protecção civil, de harmonia com os programas e planos de emergência previamente elaborados, com vista a possibilitar a unidade de direcção das acções a desenvolver, a coordenação técnica e operacional dos meios a empenhar e a adequação das medidas de carácter excepcional a adoptar» (frisado nosso).

Os planos de emergência aí mencionados são elaborados segundo as directivas emanadas da Comissão Nacional de Protecção Civil, e devem consignar, nomeadamente, o “inventário dos meios e recursos mobilizáveis, em situação de acidente grave, catástrofe ou calamidade” (artigo 21º, n.º 1, alínea a)).

Consoante a extensão territorial da situação visada, os planos de emergência podem ser nacionais, regionais, distritais e municipais. E, atendendo à sua finalidade, gerais ou especiais (artigo 21º, nº 2), estando ademais sujeitos a actualização periódica (nº 3).

3. O regime jurídico estabelecido na Lei de Bases foi regulamentado e desenvolvido pelo Decreto-Lei nº 203/93, de 3 de Junho ([14]), que, do mesmo passo, reorganizou o Serviço Nacional de Protecção Civil, instituindo a sua Lei Orgânica ([15]).

Nos termos do artigo 2º desse diploma, o «sistema nacional de protecção civil compreende a nível nacional o SNPC, a nível regional os serviços regionais de protecção civil ([16]) e a nível municipal os serviços municipais de protecção civil».

«Os municípios - estatui o nº 1 do artigo 5º - «dispõem de serviços municipais de protecção civil, aos quais incumbe a prossecução dos objectivos e o desenvolvimento das acções de informação, formação, planeamento, coordenação e controlo nos domínios previstos no artigo 3º da Lei n.º 113/91, de 29 de Agosto».

Os serviços municipais de protecção civil prosseguem assim, não só objectivos de prevenção, mas também de atenuação e limitação de riscos colectivos resultantes de acidente grave, de catástrofe ou de calamidade, e, ainda, de socorro e assistência às pessoas em perigo, todos delineados no nº 1 do artigo 3º da Lei nº 113/91, há momentos transcrito, actuando, outrossim, nos domínios enunciados no nº 2 do mesmo artigo.

Ainda segundo o n.º 2 daquele artigo 5º, “os municípios que à data da publicação do Decreto-Lei nº 203/93 não tivessem criado o respectivo serviço de protecção civil deviam promover a sua criação.”

Esboçada uma estrutura geral do sistema no Capítulo I, o Capítulo II (artigos 7º a 10º) regula a natureza e atribuições do SNPC.

Trata-se de «um serviço dotado de autonomia administrativa e financeira e património próprio» (artigo 7º, nº 1), dependente actualmente do Ministro da Administração Interna (nº 2, na redacção do artigo 1º do Decreto-Lei nº 152/99) ([17]).

As suas atribuições vêm detalhadas no artigo 8º, interessando realçar as que mais se prendem com o tema da consulta:

«Artigo 8º
Atribuições

São atribuições do SNPC orientar e coordenar a nível nacional todas as actividades de protecção civil, incumbindo-lhe, na prossecução dos objectivos fundamentais de protecção civil:
a) Submeter à apreciação da Comissão Nacional de Protecção Civil propostas de acções a empreender no domínio dos objectivos fundamentais da protecção civil, bem como mecanismos de colaboração com vista à coordenação operacional da actividade de serviços e estruturas de protecção civil;
b) (...)
c) (...)
d) Fomentar e apoiar actividades em todos os domínios em que se desenvolve a protecção civil, nomeadamente facultando apoio técnico ou financeiro compatível com as suas disponibilidades e plano anual de actividades;
e) (...)
(...)
j) (...) ([18])

O SNPC dispõe de uma infra-estrutura de órgãos e serviços desenhada no Capítulo III do Decreto-Lei nº 203/93 (artigos 11º a 32º), cuja análise em pormenor seria desajustada à economia do parecer.

Importa em todo o caso que se retenham os aspectos seguintes.

São órgãos do SNPC o presidente e o conselho administrativo (artigo 11º).

O conselho administrativo é um «órgão deliberativo em matéria de gestão financeira e patrimonial» (artigo 13º, nº 1), competindo-lhe, designadamente, “verificar a legalidade das despesas e autorizar o respectivo pagamento” (artigo 14º, alínea d)).

O presidente configura-se, por seu turno, como órgão executivo, com competências, além do mais, para «coordenar toda a actividade do SNPC, garantindo o seu funcionamento» e autorizar a realização de despesas, dentro dos limites legalmente admissíveis” (artigo 12º, nº 2, alíneas a) e d)).

O SNPC desdobra-se, por outro lado, numa rede de serviços centrais e distritais, importando realçar que os serviços distritais do SNPC correspondem às delegações distritais de que fala o artigo 17º, nº 2, da Lei de Bases.

De entre os serviços centrais (artigos 15º a 29º), sobressai a Direcção de Serviços de Planeamento e Operações, à qual compete, especialmente através da sua Divisão de Planeamento e Operações, «colaborar com os serviços municipais e as delegações distritais de protecção civil na elaboração de planos de emergência e no desenvolvimento dos programas deles decorrentes» [artigo 17º, nº 1, alínea c)] e, bem assim, «assegurar o levantamento de meios e recursos e inventariar as carências, propondo as soluções adequadas para fazer face a acidentes graves, catástrofes ou calamidades» [alínea d)].

Também à Inspecção de Protecção Civil, outro dos serviços centrais do SNPC, estão conferidas competências específicas, para referenciar apenas as que mais relevam para a economia do parecer, de acompanhamento «no local, em caso de acidente grave, catástrofe ou calamidade», das «acções de socorro desenvolvidas pelas várias entidades e organizações» [artigo 23º, n.º 1, alínea e)].

Cabe ainda registar que «na iminência ou verificação de acidente grave, catástrofe ou calamidade que afecte áreas que envolvam mais de um município é a delegação distrital de protecção civil, actuando na dependência directa do governador civil, que assume a direcção e controlo das operações através do centro distrital de operações de emergência de protecção civil» (artigo 31º, n.º 2).

4. Num outro plano, sublinhe-se que o SNPC dispõe das dotações atribuídas pelo Orçamento do Estado e de receitas próprias enunciadas nas alíneas a) a h) do artigo 33º (este preceito constitui o único dispositivo do Capítulo IV, epigrafado «gestão financeira e patrimonial»).

No quadro das disponibilidades financeiras do SNPC, adquire relevo, porém, a designada Conta Especial de Emergência, que foi criada no seio desse organismo pelo Decreto-Lei n.º 231/86, de 14 de Agosto ([19]).

Na respectiva nótula preambular, a iniciativa governamental surge justificada nos seguintes termos:

“Tem-se verificado que situações de catástrofe ou calamidade pública impõem normalmente acções necessárias e urgentes de socorro e assistência.
A experiência recolhida ensina que a urgência, indispensabilidade e eficácia de tais acções requerem que a cobertura dos encargos que geram seja previamente assegurada, evitando-se, deste modo, que a sua execução seja retardada pelo processamento normal de atribuição de meios financeiros indispensáveis.
Urge, por isso, criar um mecanismo financeiro permanente de gestão rápida que permita fazer face durante os primeiros dias de emergência às indispensáveis medidas de socorro e assistência a populações que venham a ser atingidas pelas catástrofes ou calamidades públicas.”

E é nesta intencionalidade que a Conta é constituída, conforme explicita o n.º 1 do artigo 3º ([20]), para suportar as seguintes despesas ([21]):

“a) Despesas urgentes decorrentes de acções de socorro e assistência às populações atingidas por situações de catástrofe, calamidade, acidente grave ou outras situações de emergência, nomeadamente com alimentação, incluindo água, abrigo, agasalho, transporte e cuidados de saúde, e outros apoios destinados a minorar graves situações de carência que por aquelas tenham sido provocadas ou agravadas;
b) Encargos de emergência que não possam cobertos pelas verbas próprias dos organismos intervenientes;
c) Encargos resultantes do pagamento da prestação de serviços a que haja de recorrer acções de emergência.”

Os artigos 4º, 5º e 6º referem-se, por seu turno, a aspectos relativos à gestão da conta, esclarecendo que ela é movimentada pelo Conselho Administrativo, mediante autorização do presidente do Serviço Nacional de Protecção Civil, até ao montante de 20 000 000$00, e do Ministro da Administração Interna, sob proposta do presidente do Serviço Nacional de Protecção Civil, quando a despesa a efectuar for de montante superior (artigos 3º e 4º), e que se encontra sujeita às normas da contabilidade pública e à fiscalização do Tribunal de Contas.

Por fim, o artigo 7º estabelece como pressuposto da atribuição de meios financeiros o reconhecimento das necessidades de socorro e assistência, que deverá ser declarado pelo presidente do Serviço Nacional de Protecção Civil, face à avaliação levada a efeito pelas estruturas distritais de protecção civil, ou por estas confirmadas, quando a avaliação inicial tenha sido efectuada pelas estruturas municipais de protecção civil.


IV

1. Em função de tudo o que anteriormente se expôs, e considerando de igual modo as diversas interconexões que fluem da normação aplicável à protecção civil, o parecer n.º 26/2002, que vimos de acompanhar, concluiu que é ao presidente da câmara municipal que, na iminência ou perante a ocorrência de acidentes graves, catástrofes ou calamidades que afectem no todo ou em parte o município, compete adoptar de imediato as iniciativas de direcção, coordenação e execução das operações de protecção civil adequadas – quer no plano da prevenção, quer no plano da minimização dos efeitos daquelas eventualidades.

E, nesse propósito, deverá agir nos quadros do plano de emergência municipal, accionando a intervenção do serviço de protecção civil do município e activando o Centro Municipal de Operações de Emergência de Protecção Civil (CMOEPC) a que se refere o artigo 11º do Decreto-Lei nº 222/93.

Sem embargo, os órgãos centrais do SNPC dispõem de poderes funcionais específicos nessa área, que, além do mais, se poderão particularizar através da atribuição de meios financeiros que constituem a dotação da Conta Especial de Emergência.

2. Um aspecto que cabe agora analisar é o de saber se as despesas realizadas pela Câmara Municipal, no contexto de reparação de danos provocados pelas intempéries e de assistência financeira aos sinistrados, poderão agora ser reembolsados através daquela conta.

Como se assinalou, o objectivo da criação da Conta Especial de Emergência é o de assegurar que, em situações de catástrofe ou de calamidade pública, possam ser desencadeadas acções de socorro e de assistência que, pela sua grave necessidade e urgência, não devam ser retardadas pela eventual ausência de meios financeiros.

A Conta destina-se, pois, a disponibilizar as verbas que se tornem necessárias para fazer face, de imediato, às despesas a realizar com a implementação de medidas de protecção civil que as circunstâncias justifiquem.

Daí que se realce, no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 231/86, que se trata de “um mecanismo financeiro (..) que permite fazer face durante os primeiros dias de emergência às indispensáveis medidas de socorro e assistência a populações que venham a ser atingidas pelas catástrofes ou calamidades públicas.”

Que esse é o principal objectivo da lei ressalta com evidência do elenco de despesas que se consideram susceptíveis de ser cobertas através da movimentação da Conta, e entre as quais se incluem, em primeira linha, as despesas com a alimentação, incluindo água, abrigo, agasalho, transporte e cuidados de saúde.

Não está excluído, porém, que se trate de compromissos financeiros que tenham sido assumidos, não pelos serviços centrais do SNPC, mas por um órgão local de protecção civil, como o demonstra a referência feita na alínea b) do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 231/86 a “encargos de emergência que não possam ser cobertos pelas verbas próprias dos organismos intervenientes.”

Nesse sentido aponta também a já aludida circunstância de ser ao presidente da câmara municipal que cabe, em caso de calamidade, catástrofe ou acidente grave na área de um município, a competência para o desencadeamento, coordenação e condução das operações de protecção civil adequadas.

Por conseguinte, não poderia recusar-se ao órgão autárquico o poder-dever de adoptar, no imediato, as medidas de emergência e de auxílio às populações que fossem consideradas necessárias e adequadas, em face dos desvastadores efeitos dos temporais, sem embargo de o financiamento dessas acções poder estar a cargo dos órgãos dirigentes do SNPC.

3. Reportando-nos ao caso vertente, e face ao regime jurídico sucintamente delineado, é de concluir que o facto de os serviços municipais de protecção civil terem desencadeado, por sua iniciativa, um conjunto de acções destinadas ao ressarcimento e reparação de danos resultantes dos temporais, assumindo os respectivos encargos financeiros, não inviabiliza, só por si, que esse encargos venham a ser suportados através da Conta Especial de Emergência.

Porém, e se bem entendemos, a cobertura desses encargos depende da verificação cumulativa de três requisitos:

- há-de tratar-se de despesas de emergência, ou seja de despesas justificadas pela necessidade imediata de fazer face a acções de socorro e assistência às populações (artigo 3º, n.º 1);

- exige-se que os encargos em causa não possam ser cobertos pelas verbas próprias de que o órgão interveniente disponha para o mesmo efeito (artigo 3º, n.º 2, alínea b));

- é necessário que tenha havido um expresso reconhecimento das necessidades de socorro e assistência, por parte do presidente do SNPC (artigo 7º).

E compreende-se que assim seja.

De um lado, estão em causa despesas que se destinam a cobrir cuidados elementares de protecção civil, que, desde logo, deverão ser prestados pelas entidades oficiais que se encontrem mais próximas das populações e que possam fazer uma avaliação imediata da situação. Se essas mesmas entidades dispõem de verbas orçamentadas para fazer face a uma intervenção desse tipo, não há motivo para que não as utilizem, autorizando, desde logo, o pagamento das despesas necessárias. A Conta Especial de Emergência funciona, assim, como um fundo de garantia, que se destina a assegurar que a ausência de suficientes recursos financeiros ou eventuais dificuldades de tesouraria, por parte dos serviços locais de protecção civil, não constituam obstáculo a que sejam adoptadas no momento mais oportuno as convenientes medidas de emergência.

Por outro lado, tratando-se de uma Conta que se encontra na disponibilidade do SNPC, e que apenas pode ser movimentada mediante autorização do seu presidente (ou em certos casos do ministro da tutela), justifica-se que, como pressuposto do despacho autorizativo, haja lugar ao reconhecimento, por essa entidade, das necessidades de socorro e assistência que justificam o pagamento.

4. Não tendo sido colocada, ao que se sabe, no caso concreto, qualquer objecção quanto à caracterização da situação de emergência – e que o próprio Governo não se eximiu a reconhecer mediante a criação de um Fundo Especial de Emergência através de diploma legal -, a recusa de pagamento das despesas realizadas pelos serviços municipais de protecção civil de Ourique apenas poderia fundar-se na inverificação de qualquer um dos demais requisitos há pouco enunciados. Ou seja, teria de basear-se na suficiência orçamental do organismo (o que implicava o reconhecimento, por parte da entidade decidente, de que os serviços municipais de protecção civil possuíam disponibilidade financeira própria para desencadear as operações de socorro e assistência) e ou na impossibilidade de qualificar essas operações como acções de emergência na acepção acolhida pelo artigo 3º do Decreto-Lei n.º 231/86.

Quanto àquele primeiro aspecto, são escassos os elementos de que dispõe este Conselho para avalizar uma opinião suficientemente consistente.

Como se anotou, a Lei n.º 113/91, de 29 de Agosto, prevê a criação de serviços municipais de protecção civil que deverão integrar o sistema nacional de protecção civil, o qual compreende, ainda, a nível nacional, o SNPC (artigos 2º e 17º, n.º 1).

Porém, nem essa lei, nem os diplomas que desenvolveram o respectivo regime jurídico ou que o regulamentaram, vieram estabelecer qualquer disciplina específica no tocante ao respectivo suporte financeiro, ao contrário do que sucedeu com o SNPC, cujo diploma orgânico contém disposições relativas à gestão financeira e patrimonial e à constituição das dotações orçamentais (artigo 33º).

Deste modo, os serviços municipais de protecção civil, como quaisquer outros serviços integrados na organização municipal, beneficiarão, para a prossecução dos seus objectivos, das verbas que lhes sejam atribuídas, e, para o efeito, se encontrem inscritas na respectiva rubrica do orçamento do município (sem prejuízo dos auxílios financeiros que lhe possam ser concedidos, nos termos gerais, por parte do Estado - e pelo próprio SNPC - e de outras pessoas colectivas de direito público).

Por outro lado, cabe à assembleia municipal autorizar a criação dos serviços municipais de protecção civil, bem como aprovar a proposta de orçamento para o município em função do plano de actividades previsto, incluindo o que respeita ao funcionamento daqueles serviços (artigo 53º, n.º 2, alíneas b) e n), da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro) ([22]).

A resposta à questão de saber se os serviços municipais de protecção civil de Ourique dispunham ou não de verbas próprias para acorrer a encargos de emergência, e se tais verbas se encontravam disponíveis à data da ocorrência ou poderiam ser utilizadas no pagamento das despesas concretamente realizadas, depende, pois, de uma análise dos documentos previsionais e dos mapas de execução orçamental, tarefa que, naturalmente, não está ao alcance deste Conselho realizar.

5. Por outro lado, também no que concerne à qualificação das despesas, para efeito de se considerarem ou não abrangidas pelo disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 231/86, se nos deparam algumas limitações.

O Conselho não teve acesso à documentação justificativa - e atenta a sua vocação de órgão consultivo, nem seria exigível que lhe fosse dado analisá-la -, pelo que o entendimento que poderá formular, neste ponto, apenas poderá ter por base a descrição sumária que surge patenteada no relatório que acompanhou o pedido de pagamento.

Uma outra prevenção torna-se necessário, ainda, efectuar.

A pretensão do presidente da Câmara Municipal de Ourique visava originariamente a atribuição de apoio financeiro no âmbito do Fundo Especial de Emergência, que havia sido especialmente criado pelo Governo para fazer face aos efeitos dos temporais que incidiram sobre a área do distrito de Beja, abrangendo a do município de Ourique.

Como resulta da enumeração constante do artigo 1º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 339/97, de 4 de Dezembro, o Fundo era especialmente dirigido à satisfação de despesas de investimento que não se encontrassem já cobertas por outros fundos ou formas de auxílio previstos em legislação especial para o mesmo tipo de ocorrência (cfr. artigo 1º, n.º 1, alínea e)).

O que, aliás, justifica que as autarquias locais não fossem as principais beneficiárias do Fundo, e que a este pudessem candidatar-se, prioritariamente, pessoas singulares, pessoas colectivas de fins não lucrativos e pequenas empresas (artigo 3º, n.º 1) ([23]).

O regime jurídico do financiamento a conceder através do Fundo Especial de Emergência, a que a autarquia pretendeu candidatar-se, poderá explicar que, na discriminação das despesas, para o aludido efeito, se tenham levado em conta situações que seriam susceptíveis de enquadramento na previsão legal do artigo 1º, n.º 1, do citado Decreto-Lei n.º 339/97, mas que não serão já de considerar se se pretender subsumi-las ao regime, muito diverso, da Conta Especial de Emergência.

6. O pedido formulado pelo presidente da Câmara Municipal de Ourique abarcava - recorde-se – rubricas relativas a (a) transferência para particulares; (b) Conta Emergência Apoio Vítimas; (c) trabalhos efectuados por administração directa com recurso a empreiteiros locais e máquinas camarárias; (d) refeições pagas ao pessoal camarário, bombeiros e assistentes sociais; (e) fornecimento de materiais de construção e equipamentos e prestação de serviços.

Como se anotou, e deverá constituir ponto assente, as despesas a suportar pela Conta Especial de Emergência serão aquelas que se mostrem justificadas por acções de emergência que se tornou necessário desenvolver nos momentos que se seguiram imediatamente à eclosão das situações de catástrofe ou de calamidade pública.

Como resulta da explicitação feita, a título ilustrativo, na alínea a) do n.º 1 do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 231/86, as acções em vista são as de socorro e assistência às populações atingidas, que visem minorar graves situações de carência, e que, em primeira linha, abrangem as necessidades essenciais do indivíduo (alimentação, abrigo, agasalho, tratamento médico e medicamentoso).

Por maioria de razão, e dado o carácter meramente exemplificativo das situações elencadas, não está fora de hipótese que se incluam as acções de salvamento e todas as actividades que visem a desobstrução de vias públicas ou de espaços habitados, quando ocorram deslizamentos ou aluímentos de terras ou o desmoronamento de edifícios, e, bem assim, o desencarceramento ou resgate de pessoas sinistradas (cfr. alínea c) do n.º 1 do artigo 3º).

Por outro lado, embora a norma do artigo 3º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 231/86 pareça apontar para prestações em espécie, é razoável aceitar, em certas situações, que as acções de assistência se traduzam em atribuições monetárias que permitam aos sinistrados obter alimentação e abrigo nos casos em que, por virtude da situação de catástrofe ou calamidade, não possam aceder, em condições de normalidade, às suas habitações.

7. No caso em apreço, e reportando-nos à primeira das rubricas discriminadas no relatório de despesas, os elementos do processo não esclarecem em que termos se processou a transferência de verbas para os particulares e que tipo de despesas se teve em vista satisfazer. Parece tratar-se, em todo o caso, de compensações monetárias individuais, feitas directamente pelos serviços municipais de protecção civil a um certo número de sinistrados.

No entanto, a disparidade dos montantes envolvidos e a sua ordem de grandeza (atingem, em regra, 1500 contos por cada sinistrado, situam-se, por vezes, na casa das centenas de contos, e não excedem, num caso, 60 contos) sugere que as verbas se destinaram a ressarcir danos provocados no recheio ou na estrutura das habitações.

Assim sendo, se as ajudas económicas às vítimas poderão legitimar-se por apelo a um princípio de solidariedade ou até com base numa responsabilidade objectiva fundada no risco social ([24]) – e poderiam como tal encontrar-se abrangidas pelo Fundo Especial de Emergência criado pelo Decreto-Lei n.º 339/97 (a que poderiam candidatar-se pessoas singulares) -, é já de reconhecer que elas não preenchem os requisitos de que depende a sua qualificação como despesas de emergência.

Nos mesmos termos, não poderá imputar-se à Conta Especial de Emergência, a título de acções de emergência, as despesas realizadas com trabalhos de reparação ou reconstrução de infra-estruturas ou de habitações e, bem assim, o fornecimento de materiais de construção ou de equipamento, a que se referem as rubricas há pouco referenciadas sob as alíneas c) e e), as quais, ao invés, se enquadrariam, com toda a propriedade, nas situações contempladas nas alíneas a) e d) do artigo 1º do Decreto-Lei n.º 339/97, e podendo ter beneficiado de financiamento através do Fundo Especial de Emergência.

Ao contrário, considerando os critérios de interpretação antes explanados, não deverá suscitar dúvidas o reembolso de despesas relativas a refeições de pessoal camarário, bombeiros e assistentes sociais, que se presume terem tido lugar no quadro das acções de socorro e assistência desencadeadas imediatamente após a ocorrência, e cabem na previsão da alínea a) do n.º 1 do artigo 1º do Decreto-Lei n.º 231/86.

No que se refere às verbas despendidas através da Conta Emergência Apoio Vítimas, não existem elementos de informação bastantes que permitam alicerçar uma opinião precisa, já que se desconhece, quer a titularidade da conta, quer a natureza das despesas consideradas.

Aparentemente, poderá tratar-se de uma conta privativa dos serviços municipais de protecção civil destinada a ser accionada em situações de emergência e para a satisfação de despesas de necessidade premente, resultantes da implementação, por esses serviços, de medidas de socorro e assistência.

A ser assim, porém, os encargos suportados através desses meios financeiros não poderão ser cobertos por intermédio da Conta Especial de Emergência do SNPC, por a tal se opor o disposto a alínea b) do n.º 1 do artigo 1º do citado diploma legal.


V

1. Resta verificar se as despesas consideradas inelegíveis, segundo o entendimento agora exposto, poderão justificar a atribuição de um auxílio financeiro à autarquia local no quadro da cooperação financeira que ao Estado cabe garantir nos termos previstos no artigo 7º da Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto (Lei das Finanças Locais).

A resposta a esta questão remonta-nos ao regime jurídico das finanças locais que este corpo consultivo, em diversas ocasiões, teve já oportunidade de analisar demoradamente ([25]).

A Lei n.º 42/98, na esteira de anteriores diplomas legislativos que definiram o regime financeiro dos municípios e das freguesias ([26]), e em articulação com o princípio constitucional vertido no artigo 238º da Lei Fundamental, em necessária decorrência da autonomia local ([27]), estabelecem a autonomia financeira das autarquias locais, caracterizada pela atribuição de património e meios financeiros próprios (artigo 2º, n.º 1).

A autonomia financeira pressupõe uma autonomia de gestão de recursos financeiros, que deverão ser suficientes para que as autarquias locais possam desempenhar as atribuições que lhes estão constitucional e legalmente conferidas, e autónomos, no sentido de que o exercício de atribuições e competências não deverá ficar dependente de auxílios financeiros do poder central ([28]).

A este propósito, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA escrevem ([29]):

“A autonomia financeira requer a autodeterminação financeira, de modo que a vida financeira das autarquias não fique dependente de actos discricionários do poder central. Consequentemente, afastam-se, em princípio, os subsídios e comparticipações, considerados como instrumentos de dependência das autarquias locais relativamente ao poder central e de discriminação entre elas (Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro, artigo 13º).”

O regime de finanças locais constitucionalmente consagrado prevê, todavia, também, uma justa repartição dos recursos públicos pelo Estado e pelas autarquias e a correcção de desigualdades entre autarquias do mesmo grau (artigo 238º, n.º 2), o que vem sendo entendido como a afirmação de um princípio de equilíbrio financeiro, primeiro, entre o Estado e as autarquias locais, e, depois, das autarquias locais entre si. “No primeiro caso, trata-se de um equilíbrio financeiro vertical, porque através dele se pretende assegurar uma distribuição equilibrada (“justa repartição”) de receitas entre o Estado e as pessoas colectivas territoriais autónomas. No segundo caso, trata-se de um equilíbrio financeiro horizontal, que visa corrigir as desigualdades entre autarquias do mesmo grau” ([30]).

O equilíbrio financeiro – vertical e horizontal – encontra-se concretizado, em termos gerais, no artigo 5º da Lei n.º 42/98 ([31]) e realiza-se através da afectação às autarquias locais de uma determinada percentagem das receitas de IRS, IRC e IVA, a que deverão acrescer recursos financeiros adicionais, a afectar nos orçamentos anuais do Estado, para satisfazer encargos que resultem da transferência de novas atribuições para as autarquias (n.ºs 1, 3 e 4) ([32]).

Especificamente, a repartição vertical de recursos é alcançada através do Fundo de Base Municipal [que assegura uma capacidade financeira mínima para o funcionamento dos municípios e é repartido igualmente por todos eles – artigo 10º-A ([33])] e do Fundo Geral Municipal [que visa dotar os municípios de condições financeiras adequadas ao desempenho das suas atribuições, em função de índices de funcionamento e investimento – artigo 11º); ao passo que a repartição horizontal de recursos é fomentada pela distribuição do Fundo de Coesão Municipal, em que se tomam já em conta os índices de desenvolvimento social, em vista à correcção de assimetrias (artigos 13º, 14º e 14º-A ([34])] ([35]).

2. Mas não só os instrumentos de repartição de fundos públicos intervêm neste campo.

O n.º 2 do artigo 7º da Lei n.º 42/98 ([36]) prevê que “poderão ser excepcionalmente inscritas no Orçamento do Estado, por ministério, verbas para financiamento de projectos das autarquias locais de grande relevância para o desenvolvimento regional e local, quando se verifique a sua urgência e a comprovada e manifesta incapacidade financeira das autarquias para lhes fazer face.”

A correspondente disposição da anterior Lei das Finanças Locais (Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro - artigo 14º), sob a epígrafe “Cooperação técnica e financeira entre o Governo e as autarquias locais no domínio do desenvolvimento regional e local”, concretizava o âmbito deste tipo de financiamento, referindo-se a projectos que fossem objecto de contratos-programas de desenvolvimento ou que se incluíssem em programas de desenvolvimento integrado (regionais ou definidos pela legislação comunitária) e em programas de reordenamento do litoral ([37]).

A norma actual é mais imprecisa: por um lado, favorece um alargamento da cooperação financeira da administração central, ao apelar a um conceito indeterminado para definir o elenco de projectos que poderão beneficiar de financiamento através do orçamento do Estado (projectos de grande relevância para o desenvolvimento regional e local); por outro, introduz um critério restritivo de apreciação, ao exigir que se verifique urgência na execução das obras e comprovada e manifesta incapacidade financeira das autarquias para lhes fazer face ([38]).

A norma que, porém, mais reclama a nossa atenção, na perspectiva da resolução da questão que vem suscitada, é a do já citado artigo 7º, mas no ponto em que admite que o Governo possa tomar providências orçamentais para a concessão de auxílios financeiros.

Com efeito, esse preceito dispõe:

“Artigo 7º
(Cooperação técnica e financeira)

1 – Não são permitidas quaisquer formas de subsídios ou comparticipações financeiras aos municípios e freguesias por parte do Estado, das Regiões Autónomas, dos institutos públicos ou dos fundos autónomos.
2 – Poderão ser excepcionalmente inscritas no Orçamento do Estado, por ministério, verbas para financiamento de projectos das autarquias locais de grande relevância para o desenvolvimento regional e local, quando se verifique a sua urgência e a comprovada e manifesta incapacidade financeira das autarquias para lhes fazer face.
3 – O Governo e os governos regionais poderão ainda tomar providências orçamentais necessárias à concessão de auxílios financeiros às autarquias locais, nas seguintes situações:
a) Calamidade pública;
b) Municípios negativamente afectados por investimento da responsabilidade da administração central;
c) Edifícios sede de autarquias locais, negativamente afectados na respectiva funcionalidade;
d) Circunstâncias graves que afectem drasticamente a operacionalidade das infra-estruturas e dos serviços municipais de protecção civil;
e) Instalação de novos municípios ou freguesias;
f) Recuperação de áreas de construção clandestina ou de renovação urbana quando o seu peso relativo transcenda a capacidade e a responsabilidade autárquica nos termos da lei.
4 – O Governo definirá por decreto-lei, no prazo de 180 dias, as condições em que haverá lugar à cooperação técnica e financeira prevista neste artigo.
5 – (...)
6 – (...)
7– (...)”

Não obstante, a Lei ter imposto um prazo de 180 dias para a definição por decreto-lei do regime de cooperação técnica e financeira prevista nessa disposição, e esse propósito ter sido reafirmado na nova redacção dada ao n.º 4 desse artigo 7º pela Lei n.º 94/2001, de de 20 de Agosto - que permitiu a renovação do mesmo prazo, a partir da entrada em vigor deste último diploma (1 de Janeiro de 2002) ([39]) -, o certo é que até ao momento não foi publicado o diploma do desenvolvimento do regime jurídico, implicando que se considere ainda em vigor, como aliás determina o disposto no n.º 2 do artigo 36º da Lei n.º 42/98, a regulamentação legal emanada em execução da anterior Lei da Finanças Locais ([40]).

É de notar, porém, que o artigo 7º da Lei n.º 42/98 não traz alterações significativas relativamente à correspondente disposição da Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro (cfr. artigo 13º).

Do elenco de situações relativamente às quais é viável, no regime actual, a atribuição excepcional de auxílio financeiro, por parte do Estado, apenas se encontram excluídos, no cotejo com a anterior disposição, os casos de bloqueamento grave nos transportes urbanos colectivos ou no funcionamento do serviços municipais de bombeiros, que antes estavam contemplados na alínea d) do n.º 1 do artigo 13º da Lei n.º 1/87. Assim, continua a ser possível, hoje, conceder ajudas financeiras às autarquias, através de verbas a inscrever no orçamento do Estado, nomeadamente em caso de calamidade pública, conforme prevê a alínea a) do n.º 3 do artigo 7º da Lei n.º 42/98 e já antes resultava da homóloga disposição da Lei n.º 1/87.

Ora, o diploma que, em execução da anterior Lei das Finanças Locais, regulamentou a concessão excepcional de auxílio financeiro, por parte do Estado, e que ainda se mantém em vigor (Decreto-Lei n.º 363/88, de 14 de Outubro), estipulou no n.º 1 do artigo 2º, para a situação de calamidade pública, o seguinte condicionalismo:

“1 – A concessão excepcional de auxílio financeiro pode ter lugar nos casos previstos e nas condições seguintes:

a) Calamidade pública reconhecida pelo Governo através de resolução do Conselho de Ministros, desde que se verifiquem prejuízos em infra-estruturas ou equipamentos municipais que constituam obstáculo à sua utilização ou prestação normal de serviço e em que a reposição oportuna da situação inicial exija meios que excedam a capacidade financeira do município; (...)”
3. Como se constata, a atribuição de ajuda financeira pelo Estado, nas sobreditas circunstâncias, depende da prévia declaração pelo Governo da ocorrência de calamidade pública; para além disso, a ajuda restringe-se ao ressarcimento de danos em infra-estruturas e equipamentos que tenham sido afectados, quando a sua reposição se torne necessária à normalização do funcionamento dos serviços municipais; e, por outro lado, só será concedida se a autarquia não dispuser de suficiente capacidade financeira para fazer face a esses investimentos.

No caso vertente, ao que se sabe, não foi emitida qualquer Resolução do Conselho de Ministros reconhecendo a situação de calamidade.

Acresce que parte das despesas cujo pagamento é reclamado (considerando agora, apenas, as não elegíveis para a Conta Especial de Emergência segundo a análise anteriormente efectuada) manifestamente não se enquadram na previsão da norma da alínea a) do n.º 1 daquele artigo 2º, como sucede com as entregas monetárias feitas a particulares, supostamente para ressarcimento de danos sofridos nas suas habitações. E, no tocante às verbas respeitantes a trabalhos de construção civil e fornecimento de materiais, não há uma indicação clara de que se tenham destinado à reposição de infra-estruturas ou equipamentos municipais. E mesmo que se verificasse essa hipótese, tornava-se ainda necessário demonstrar que as obras eram indispensáveis para assegurar a continuidade dos serviços e que essas obras, pelo seu volume, dimensão ou natureza, excediam a capacidade financeira da autarquia (o que pressupõe também que implicassem o dispêndio de verbas muito avultadas).

Nenhum dos requisitos enunciados na disposição regulamentar se encontra preenchido, em face dos elementos coligidos do processo. E mesmo que fosse possível demonstrar, através de prova suplementar, a elegibilidade das despesas efectuadas com obras de reparação e fornecimento de materiais, a ausência de declaração de calamidade pública impediria, mesmo em relação a tais despesas, a concessão de auxílio financeiro ao abrigo da referida disposição.

Cabe, aliás, relembrar que o Governo, no uso da competência que a Lei de Bases de Protecção Civil lhe confere, perante situações de emergência (cfr. artigo 11º, n.º 2, alínea d)), accionou um programa de apoio financeiro às populações e autarquias afectadas pelas condições meteorológicas adversas que se fizeram sentir em Outubro e Novembro de 1997 – através do referido Fundo Especial de Emergência -, fazendo supor que procurou instituir uma solução global para o problema, ao invés de actuar, de modo parcelar, através do funcionamento do regime de cooperação financeira previsto no artigo 7º da Lei de Finanças Locais.


VI

1. Tendo-se concluído em sentido parcialmente oposto ao conteúdo do despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna, de 4 de Março de 1998, que, com base numa informação do respectivo Gabinete, determinou ao presidente do Serviço Nacional de Protecção Civil que processasse o pagamento, através da Conta Especial de Emergência, a favor da Câmara Municipal de Ourique, não só dos gastos referentes a refeições de pessoal camarário, bombeiros e assistentes sociais, mas também das verbas descritas nas alíneas c) e e) da nota de despesas, impõe-se enfrentar os aspectos processuais que poderão advir de uma nova definição da situação jurídica que atenda aos critérios interpretativos agora enunciados.

Como se assinalou, à data em que foi proferido o aludido despacho, o SNPC constituia um organismo dotado de autonomia administrativa e financeira, dependente do Ministro da Administração Interna (artigo 7º do Decreto-Lei n.º 203/93, de 3 de Junho, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 159/99, de 10 de Maio) ([41]).

Ademais, dispunha de receitas próprias e de dotações que lhe eram afectadas pelo orçamento do Estado (artigo 33º); e, em consonância, o seu presidente podia autorizar a realização de despesas nos limites legalmente admissíveis (artigo 12º, n.º 2, alínea d)).

No que se refere à movimentação da Conta Especial de Emergência, essa competência ia até ao montante de 20 000 000$00 ([42]), pertencendo ao Ministro da Administração Interna quando estivessem em causa verbas superiores (artigo 5º do Decreto-Lei n.º 231/86, de 14 de Agosto).

2. Tradicionalmente, a autonomia administrativa é definida como o poder conferido aos órgãos de pessoa colectiva pública de praticar actos de carácter definitivo e que possam tornar-se imediatamente eficazes. Envolve, por conseguinte, uma capacidade de exercício de direitos públicos que implica que os órgãos representativos da pessoa colectiva pública possam produzir decisões, vinculando os seus destinatários, sem necessidade de intervenção de quaisquer outros órgãos da mesma pessoa ou de outra pessoa colectiva pública ([43]).

Quando atribuída a serviços ou organismos desconcentrados da mesma pessoa colectiva ou a entidades ou departamentos de nível intermédio da respectiva estrutura orgânica, a autonomia administrativa corresponde à possibilidade de os respectivos órgãos praticarem os actos administrativos compreendidos no âmbito dos seus poderes funcionais, sem necessidade de qualquer prévia delegação de competências por parte dos órgãos dirigentes centrais. A autonomia administrativa tem, nesse caso, o sentido de atribuir uma competência própria e exclusiva a órgãos subalternos, permitindo que estes possam definir a situação jurídica concreta através de actos de eficácia externa.

Esse expediente jurídico tem sido usado pelo legislador mesmo em relação a serviços não personalizados que se encontram integrados em departamentos ministeriais, o que só poderá justificar-se pelo propósito de reservar a esses organismos uma competência dispositiva originária no seu campo específico de actuação (v.g., Decretos-Leis n.ºs 104/80, de 10 de Maio, 442/86, de 31 de Dezembro, e 96/93, de 2 de Abril).

Em reforço deste entendimento aponta a definição legal de autonomia administrativa tal como resulta do Decreto-Lei n.º 155/92, de 28 de Julho - estabelece o regime financeiro de serviços e organismos da Administração Pública -, e cujo artigo 3º desse diploma estatui: “Os serviços e organismos dispõem de créditos inscritos no Orçamento do Estado e os seus dirigentes são competentes para, com carácter definitivo e executório, praticarem actos necessários à autorização de despesas e seu pagamento, no âmbito da gestão corrente.”

Por outro lado, a autonomia financeira vem sendo definida como a ”medida da liberdade dos poderes financeiros das entidades públicas; ou a capacidade financeira de uma pessoa ou órgão público.” ([44])

Considerando as principais áreas da actividade financeira, a autonomia pode revestir diversas modalidades ([45]):

- autonomia patrimonial – o poder de ter património próprio e ou tomar decisões relativas ao património público;

- autonomia orçamental – o poder de ter orçamento próprio, gerindo as correspondentes receitas e despesas;

- autonomia de tesouraria – o poder de gerir autonomamente os recursos monetários próprios, em execução ou não do orçamento;

- autonomia creditícia – o poder de contrair dívidas, assumindo as correspondentes responsabilidades, pelo recurso a operações financeiras de crédito.

No entanto, as diversas formas de autonomia financeira são independentes entre si, constituindo atributos de pessoas colectivas, de órgãos ou de conjunto de órgãos, conforme o regime que se encontrar definido nos respectivos diplomas orgânicos.

O que importa sobretudo reter é que as autonomias (administrativa ou financeira), do mesmo passo que delimitam os poderes decisórios que são atribuídos a um organismo para a realização do interesse público e na sua relação com os particulares, determinam simultaneamente um relacionamento de natureza tutelar com os órgãos do Estado ([46]).

A tutela poderá implicar, por parte do órgão superior, o poder de aprovação ou de autorização dos actos da entidade tutelada; o poder de fiscalizar o seu comportamento; o poder de substituir o órgão tutelado ou de alterar as respectivas decisões; o poder de responsabilizar os titulares do órgão tutelado ([47]).

Precisamente, no caso em apreço, o Secretário de Estado Adjunto, ao determinar ao SNPC o pagamento de certas despesas ao abrigo da Conta Especial de Emergência, actuou no exercício de uma tutela integrativa, e uma tal intervenção mostrava-se justificada, num primeiro momento, em razão da circunstância de o pedido, tal como fora formulado pelo presidente da Câmara Municipal de Ourique, envolver verbas que excediam a autonomia decisória daquela entidade.

A questão que se coloca, neste contexto, é a de saber se, por razões de legalidade, aquele despacho poderá ser agora substituído por um outro.

3. Como vimos, o sistema nacional de protecção civil é integrado por uma superestrutura de órgãos – desde a Assembleia da República e o Governo, até ao Conselho Superior e à Comissão Nacional de Protecção Civil – de planeamento, direcção, controlo, decisão e coordenação de acções operacionais da rede orgânica de serviços e agentes, nomeadamente a nível distrital e municipal ([48]).

O SNPC, por sua vez, sem embargo da vocação nacional e da implantação organizativa vertical, actua outrossim transversalmente, por todas as formas descritas, inclusive nos domínios distrital e municipal, sendo certo que os planos de emergência são elaborados, do topo à base, permitindo enquadrar, interactivamente, as operações de protecção civil nacionais, distritais, municipais, inventariar recursos mobilizáveis nesses domínios, definir as normas de actuação dos serviços e organismos aí verticalmente localizados, os critérios e mecanismos de articulação de meios, assegurar a unidade de direcção e de controlo.

Por outro lado, e conforme resulta da Lei de Bases – artigo 17º, n.º 1 -, os serviços municipais de protecção civil integram o sistema nacional de protecção civil, princípio esse que surge reafirmado no artigo 2º da Lei Orgânica do SNPC.

Poderá, assim, considerar-se que os serviços municipais, ainda que dirigidos pelo presidente da Câmara Municipal e funcionalmente adstritos ao município, actuam como serviços locais do sistema nacional de protecção civil.

Nesse sentido aponta a norma atributiva de competência constante do artigo 68º, n.º 1, alínea x), da Lei nº 169/99, de 18 de Setembro ([49]), onde se declara que o presidente da câmara municipal dirige o serviço municipal de protecção civil, em estreita articulação com o Serviço Nacional de Protecção Civil, e tendo em vista o cumprimento dos planos e programas estabelecidos e a coordenação das actividades a desenvolver no domínio da protecção civil, designadamente em operações de socorro e assistência, com especial relevo em situações de catástrofe e calamidade públicas.

Em reforço desse entendimento, importa ainda notar que os planos de emergência municipais são objecto de aprovação pela Comissão Nacional de Protecção Civil, dependendo apenas de parecer prévio da câmara municipal (artigo 21º, nºs 2 e 5, do Decreto-Lei n.º 203/93)

E, por outro lado, os Centros Municipais de Operações de Emergência de Protecção Civil (CMOEPC), aos quais compete, justamente, entre outras missões, na ocorrência ou iminência de acidente grave, catástrofe ou calamidade, desencadear a execução dos correspondentes planos de emergência e assegurar a condução das operações de protecção civil deles decorrentes, embora sejam dirigidos pelo presidente da câmara e activados por sua decisão, apresentam uma composição heterogénea, que inclui múltiplos representantes de organismos exteriores à autarquia (artigo 11º, nºs 1, 4 e 5, do Decreto-Lei nº 222/93).

Afigura-se, pois, que em relação às acções de emergência que se desenrolem sob responsabilidade do município, não funciona o princípio autonómico - que há pouco foi analisado, e que proíbe a interdependência das autarquias locais relativamente aos órgãos do poder central -, porquanto, pela própria natureza das coisas, a função de protecção civil que incumbe à autarquia se dissolve numa actividade multidisciplinar e plurisectorial que diz respeito a todas as estruturas da sociedade e a todos os níveis da Administração.

4. Serve tudo para dizer que o falado despacho do Secretário de Estado Adjunto, de 4 de Março de 1998, se configura como um acto interno de gestão financeira, praticado no uso de competências próprias como entidade tutelar do SNPC, e não é, por isso, susceptível de originar uma relação jurídica interadministrativa.

O aludido despacho não está, pois, subordinado ao regime de revogabilidade dos actos administrativos, e, designadamente, aos limites temporais de revogação aplicáveis aos actos inválidos (cfr. artigo 141º, n.º 1, do Código de Procedimento Administrativo) ([50]), os quais são impostos por razões de certeza e segurança jurídicas, em vista à salvaguarda dos direitos constituídos, por um acto anterior, na esfera jurídica dos seus destinatários, e, por isso, pressupõem a preexistência de um acto de eficácia externa.

Sendo assim, nada obsta - tanto mais que o despacho em causa não chegou a ser executado -, que o membro do Governo adopte agora uma posição de sentido divergente, determinando que o reembolso a efectuar através da Conta Especial de Emergência abarque apenas as verbas que se enquadrem no conceito de despesas urgentes, a que se reporta a alínea a) do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 231/86, de 14 de Agosto.
E dado que – como se anotou -, o SNPC perdeu entretanto a sua autonomia financeira ([51]), a prolação de um novo acto insere-se no poder de direcção do membro do Governo, em matéria de gestão dos recursos monetários, e, portanto, no exercício de uma competência dispositiva, e não já no mero plano da tutela integrativa.

5. A questão coloca-se diversamente se houver de interpretar-se o despacho de 4 de Março de 1998 como um indeferimento, ao menos implícito, de um pedido de apoio financeiro ao abrigo do Fundo Especial de Emergência.

A este Fundo poderiam candidatar-se pessoas, individuais e colectivas, e autarquias locais, sendo seu objectivo assegurar, não só a cobertura de necessidades sociais, mas também a reparação e reposição de bens públicos ou privados que tenham sido afectados pelos efeitos dos temporais.

A recusa de financiamento, ainda que envolva uma margem de liberdade de apreciação por parte da entidade decidente, era, nesse plano, susceptível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos de quem tenha formulado a sua candidatura e, nessa medida, era passível de impugnação contenciosa.

Do mesmo modo, com um tal sentido decisório, o acto só poderia ser revogado nos termos e dentro do prazo previstos no artigo 141º, n.º 1, do Código de Procedimento Administrativo.

Segundo o entendimento doutrinal e jurisprudencial corrente – e que agora emerge com clareza do disposto no n.º 2 do citado artigo 141º ([52]) -, esse prazo corresponde ao mais longo dos prazos previstos para a interposição de recurso contencioso, que, para os actos anuláveis, é, actualmente, o consignado no artigo 28º, n.º 1, alínea c), da LPTA – um ano - ([53]), contado a partir da prática do acto ou da sua publicação, quando esta seja imposta por lei (artigo 29º, n.º 4, da mesma Lei) ([54]).

Por outro lado, o decurso do referido prazo, sem que o acto tenha sido impugnado – , gera a sanação de eventuais vícios de que padeça, tudo se passando com se fosse um acto válido, o que para efeitos de revogação conduz à aplicação do disposto no artigo 140º do Código de Procedimento Administrativo ([55])

VII

Pelo exposto, extraem-se as seguintes conclusões:

1.ª O Fundo Especial de Emergência, criado pelo Decreto-Lei n.º 339/97, de 4 de Dezembro, na sequência dos fortes temporais que assolaram as áreas dos distritos de Beja, Évora e Faro, em Outubro e Novembro de 1997, destinava-se a cobrir necessidades sociais e despesas de investimento, e às correspondentes ajudas financeiras, a fundo perdido, poderiam candidatar-se pessoas, individuais ou colectivas, e autarquias locais;

2.ª Ao contrário, a Conta Especial de Emergência, criada pelo Decreto-Lei n.º 231/86, de 14 de Agosto, na dependência do Serviço Nacional de Protecção Civil (SNPC), tem em vista a satisfação de despesas de emergência, justificadas pela necessidade imediata de fazer face a acções de socorro e assistência às populações, em caso de catástrofe ou calamidade pública, e pressupõe, não só o reconhecimento, por parte do presidente do SNPC, da necessidade de uma intervenção desse tipo, como também a impossibilidade de os encargos em causa serem cobertos por verbas próprias de que o órgão interveniente disponha para o mesmo efeito (artigos 3º, n.º 1, alíneas a) e b), e 7º);

3.ª Num outro plano, a concessão excepcional de auxílio financeiro pelo Estado às autarquias, em caso de calamidade pública, prevista no artigo 7º da Lei das Finanças Locais (Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto), e segundo a regulamentação constante do Decreto-Lei n.º 363/88, de 14 de Outubro, ainda em vigor, depende do prévio reconhecimento dessa situação por parte do Governo, e pressupõe a verificação de prejuízos em infra-estruturas ou equipamentos municipais que constituam obstáculo ao normal funcionamento dos serviços, e, além disso, que os investimentos a realizar excedam a capacidade financeira do município.

4.ª Não preenchem o primeiro dos requisitos mencionados na antecedente conclusão 2.ª, as compensações monetárias atribuídas individualmente aos sinistrados para ressarcimento de danos provocados nas suas habitações, nem as despesas realizadas com trabalhos de reparação ou reconstrução de infra-estruturas públicas ou equipamentos;

5.ª A reposição de infra-estruturas e equipamentos municipais, a que se refere a segunda parte da conclusão anterior, apenas poderia suscitar a ajuda financeira do Governo, ao abrigo do artigo 7º da Lei das Finanças Locais, se, declarada a situação de calamidade pública, comprovadamente as obras fossem indispensáveis para assegurar a continuidade dos serviços e fosse ainda de considerar que, pelo seu volume, dimensão ou natureza, excediam a capacidade financeira da autarquia;

6.ª Os encargos descritos na conclusão 3.ª (ressarcimento de danos em habitações e despesas de reparação ou reconstrução de infra-estruturas), poderiam ter sido suportados pelo Fundo Especial de Emergência, se reclamados, em tempo oportuno, pelos interessados particulares e pela autarquia local;

7.ª O Serviço Nacional de Protecção Civil, tendo passado ao regime de autonomia meramente administrativa, a partir de 1 de Janeiro de 2003, nos termos definidos no artigo 3º da Lei n.º 32-B/2003, de 30 de Dezembro, era, até essa data, um serviço dotado de autonomia administrativa e financeira, encontrando-se sujeito a tutela integrativa do Governo, designadamente na modalidade de autorização de despesas (a partir de certo montante) que devessem ser suportadas pela Conta Especial de Emergência (artigo 5º, alínea b), do Decreto-Lei n.º 231/86, de 14 de Agosto);

8.ª O despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna que autoriza o pagamento de despesas, através da Conta Especial de Emergência, reportando-se a actividades desenvolvidas pelos serviços municipais de protecção civil, constitui um acto interno de gestão financeira do Serviço Nacional de Protecção Civil, e, como tal, não se encontra subordinado ao regime de revogabilidade dos actos administrativos previsto no artigo 141º, n.º 1, do Código de Procedimento Administrativo;

9.ª O mesmo acto, na medida em que represente o indeferimento de um pedido de ajuda financeira, formulado por uma autarquia local a coberto do Fundo Especial de Emergência, reveste-se já de eficácia externa, tornando-se susceptível de impugnação contenciosa, dentro do prazo legalmente previsto, não podendo, também, ser revogado, nessa parte dispositiva, senão no condicionalismo referido no citado preceito do Código de Procedimento Administrativo.






[1]) Despacho de 6 de Dezembro de 2002, comunicado pelo ofício n.º 3619, da mesma data, entrado na Procuradoria-Geral da República no dia 11 imediato.
[2]) Parecer n.º 703/L/02, de 28 de Novembro.
[3]) Do preâmbulo.
[4]) Informação da mesma data.
[5]) Esta referência consta da Informação-parecer da Auditoria Jurídica.
[6]) Parecer n.º 26/2002, de 10 de Abril de 2002, pendente de homologação.
[7]) Cfr. artigo 27º, n.º 1, da Constituição da República.
[8]) Com alterações introduzidas pelos Decretos-Leis nº 92/92, de 23 de Maio, nº 107/92, de 2 de Junho, e nº 117/93, de 13 de Abril, sem reflexos na temática da consulta.
[9]) Acidente grave «é um acontecimento repentino e imprevisto, provocado por acção do homem ou da natureza, com efeitos relativamente limitados no tempo e no espaço susceptíveis de atingirem as pessoas, os bens ou o ambiente» (nº 1); catástrofe vem definida como «acontecimento súbito quase sempre imprevisível, de origem natural ou tecnológica, susceptível de provocar vítimas e danos materiais avultados, afectando gravemente a segurança das pessoas, as condições de vida das populações e o tecido sócio-económico do País» (nº 2); considera-se, por sua vez, calamidade «um acontecimento ou uma série de acontecimentos graves, de origem natural ou tecnológica, com efeitos prolongados no tempo e no espaço, em regra previsíveis, susceptíveis de provocarem elevados prejuízos materiais e, eventualmente, vítimas, afectando intensamente as condições de vida e o tecido sócio-económico em áreas extensas do território» (nº 3).
[10]) A politica de protecção civil surge caracterizada no artigo 6º da Lei de Bases nos seguintes termos:
“A política de protecção civil tem carácter permanente, multidisciplinar e plurissectorial, cabendo a todos os órgãos e departamentos do Estado promover as condições indispensáveis à sua execução, de forma descentralizada, sem prejuízo do apoio mútuo entre organismos e entidades do mesmo nível ou proveniente de níveis superiores.»
[11]) Também o Primeiro-Ministro tem funções específicas, neste âmbito, como responsável pela direcção da política de protecção civil, conforme prevê o artigo 12º, que se reproduz:
«Artigo 12º
Competência do Primeiro-Ministro
1 – O Primeiro-Ministro é responsável pela direcção da política de protecção civil, competindo-lhe, designadamente:
a) Coordenar e orientar a acção dos membros do Governo nos assuntos relacionados com a protecção civil;
b) Convocar o Conselho Superior de Protecção Civil e presidir às respectivas reuniões;
c) Assumir a direcção das operações em situações de catástrofe ou calamidade de âmbito nacional.
2 – O Primeiro-Ministro pode delegar, no todo ou em parte, as competências referidas nas alíneas b) e c) do número anterior no Ministro da Administração Interna.»
[12]) Ao abrigo do nº 5 do artigo 15º - «As normas de funcionamento da Comissão serão fixadas por decreto regulamentar» - e nos termos da alínea c) do artigo 202º da Constituição, segundo a qual (3ª Revisão, de 1992) compete ao Governo, no exercício de funções administrativas, «Fazer os regulamentos necessários à boa execução das leis», foi emanado o Decreto Regulamentar nº 23/93, da 19 de Julho, tendo como objectivo, declarado na nota preambular, «especificar as atribuições enunciadas genericamente na Lei de Bases da Protecção Civil e fixar as normas de funcionamento da aludida Comissão, articulando-as sistematicamente num corpo normativo coerente», cuja confrontação com o articulado da Lei se reveste por isso de interesse não despiciendo. Cfr., quanto à composição da Comissão, o seu artigo 2º.
[13]) Destacam-se aspectos relativos a:
- Mecanismos de colaboração institucional entre todos os organismos e serviços com responsabilidades no domínio da protecção civil, bem como formas de coordenação técnica e operacional da actividade por aqueles desenvolvida, no âmbito específico das respectivas atribuições estatutárias;
- Critérios e normas técnicas sobre a organização do inventário de recursos e meios, públicos e privados, mobilizáveis ao nível local, distrital, regional ou nacional, em caso de acidente grave, catástrofe ou calamidade;
- Critérios e normas técnicas sobre a elaboração de planos de emergência, gerais e especiais, de âmbito local, distrital, regional ou nacional;
- Prioridades e objectivos a estabelecer com vista ao escalonamento de esforços do organismos e estruturas com responsabilidades no domínio da protecção civil, relativamente à sua preparação e participação em tarefas comuns de protecção civil.
[14]) Conexamente, foi também regulamentada a estrutura organizacional dos centros operacionais de protecção civil, que consta do Decreto-Lei n.º 222/93, de 18 de Junho.
[15]) O SNPC fora preteritamente criado em regime de instalação na dependência do Ministério da Defesa Nacional pelo Decreto-Lei nº 78/75, de 22 de Fevereiro, que assim resultou tacitamente revogado. O artigo 43º do Decreto-Lei nº 203/93 apenas revogou expressamente o Decreto-Lei nº 510/80, de 25 de Outubro – anterior «Lei Orgânica do SNPC», assim o designa o Sumário da folha oficial -, além do quadro de pessoal em anexo II à Portaria nº 461/87, de 2 de Junho. Por outro lado, o Decreto-Lei nº 203/93 foi alterado pelo Decreto-Lei nº 152/99, de 10 de Maio, e este último objecto de rectificação mediante a Declaração nº 10-AQ/99, de 30 de Junho, tudo sem reflexos significativos na problemática que nos ocupa.
[16]) Trata-se de serviços das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira cuja regulamentação, de harmonia com o artigo 4º, «será objecto de diploma próprio».
[17]) Esta caracterização - vigente à data da prolação do despacho do Secretário de Estado Adjunto, de 3 de Março de 1998, e que interessa tomar em consideração para efeito de analisar a situação jurídica daí decorrente (cfr. infra VI.) -, foi entretanto alterada pelo artigo 3º da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, em cumprimento do disposto no artigo 90º, n.º 1, da Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto, aditado pela Lei Orgânica n.º 2/2002, de 28 de Agosto (Lei da Estabilidade Orçamental). Nos termos desta disposição, interpretada em conjugação com o seu quadro anexo, o SNPC mantém a autonomia administrativa e património próprio, perdendo a autonomia financeira.
[18]) A redacção da alínea d) resulta do artigo 1º do Decreto-Lei nº 152/99, que igualmente aditou as alíneas i) e j).
[19]) Alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 11/96, de 29 de Fevereiro, e 316/99, de 11 de Agosto.
[20]) Na redacção dada pelo Decreto-Lei n.ºs 11/96, de 29 de Fevereiro, que alterou a alínea a). Entretanto, o Decreto-Lei n.º 316/99, de 11 de Agosto, introduziu uma nova redacção no n.º 2 desse artigo, permitindo que através da Conta Especial de Emergência pudessem ser liquidados encargos com a ajuda internacional, aspecto que não tem relevo na óptica da consulta.
[21]) Conforme dispõe o artigo 2º, a Conta é constituída por receitas que provêem de:
“a) Dotação especialmente consignada para o efeito no Orçamento do Estado:
b) Auxílios financeiros para o efeito concedidos ou postos à disposição do Serviço Nacional de Protecção Civil por entidades públicas ou privadas, nacionais, estrangeiras ou internacionais, ou por pessoas singulares;
c) Eventuais saldos disponíveis no fim de cada ano económico do orçamento privativo do Serviço Nacional de Protecção Civil;
d) Subsídios, auxílios ou dotações extraordinárias de qualquer outra origem, desde que destinados ao fim indicado no artigo 3º, nº 1.”
[22]) Assim já sucedia no domínio da Lei n.º 100/84, de 29 de Março, vigente à data dos factos (cfr. artigo 39º, n.º 2, alíneas b)).
[23]) Cfr. supra II. 2..
[24]) Um afloramento desta questão em FERNANDES CADILHA, Responsabiliddae Civil da Administração Pública, Separata da Revista do Ministério Público n.º 86, págs. 24-25.
[25]) Cfr. pareceres n.º 81/80, de 19 de Junho de 1980, 30/86, de 3 de Julho de 1986, e 34/87, de 11 de Fevereiro de 1988.
[26]) O regime das finanças locais, em concretização do princípio constitucional da autonomia financeira das autarquias locais, tem sido sucessivamnete regulado pelas Leis n.º 1/79, de 2 de Janeiro, 98/84, de 29 de Março, e 1/87, de 6 de Janeiro, tendo este último diploma sido revogado e substituído pela Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto.
[27]) Na versão originária da Constituição resultava do artigo 240º.
[28]) GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição revista, Coimbra, 1993, pág. 889.
[29]) Ibidem.
[30]) GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, ob. cit., pág. 890.
[31]) Na redacção entretanto introduzida pela Lei n.º 94/2001, de 20 de Agosto, o preceito dispõe:
“Artigo 5º
(Equilíbrio financeiro vertical e horizontal)
1 – A repartição dos recursos públicos entre o Estado e as autarquias locais é obtida mediante uma afectação financeira a estas, equivalente a 33% da média aritmética simples da receita proveniente dos impostos sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) e sobre o valor acrescentado (IVA).
2 – A receita dos impostos sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) e sobre o valor acrescentado (IVA) a que se refere o nº 1 é a que corresponde à cobrança líquida destes impostos no penúltimo ano relativamente ao qual o Orçamento do Estado se refere, excluindo, no que respeita ao IRC, a parte que corresponde às derramas.
3 – Quando forem conferidas novas atribuições às autarquias locais, o Orçamento do Estado deve prever a afectação de recursos financeiros adicionais, de acordo com os encargos resultantes das novas atribuições.
4 – A transferência de atribuições dos municípios para as freguesias pode implicar a redistribuição da percentagem referida no nº 1 do presente artigo pela participação dos municípios e das freguesias nos impostos do Estado, constantes dos nºs. 1 e 2 do artigo 10º, respectivamente.
5 – O plano de distribuição das dotações referidas no nº 3 do presente artigo deverá constar de mapa anexo ao Orçamento do Estado.
6 – A participação de cada autarquia local nos recursos referidos no nº 1 é determinada nos termos e de acordo com os critérios previstos na presente lei, visando corrigir as desigualdades entre autarquias do mesmo grau.”
[32]) A Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, estabelece o quadro de transferência de atribuições e competências para as autarquias, e reafirma, no artigo 3º, n.º 2, o princípio segundo o qual a transferência deve ser acompanhada dos meios humanos, dos recursos financeiros e do património adequados ao desempenho da função transferida. O mesmo critério transparecia, implicitamente, do disposto no artigo 14º, n.º 1, da Lei n.º 77/84, de 8 de Março, que, precedentemente, estabelecia a delimitação de actuações da administração central e local em matéria de investimentos.
[33]) Aditado pelo artigo 2º da Lei n.º 94/2001, de 20 de Agosto.
[34]) O artigo 14º, na redacção dada pelo artigo 1º da Lei n.º 94/2001, de 20 de Agosto, e o artigo 14º-A, aditado pelo artigo 2º da mesma Lei.
[35]) A participação das freguesias nos impostos do Estado é efectuada, por sua vez, através do Fundo de Financiamento das Freguesias, que é distribuído nos termos do disposto no artigo 15º.
[36]) Na redacção da Lei n.º 94/2001, de 20 de Agosto.
[37]) O Decreto-Lei n.º 384/87, de 24 de Dezembro, veio depois estabelecer disposições gerais relativas a contratos-programas, plurissectoriais ou sectoriais e acordos de colaboração.
[38]) As autarquias locais dispõem de outros instrumentos financeiros que a urgência conferida à consulta e o menor relevo de que se revestem para a inteligência do parecer não consentem que se analisem em pormenor. Dir-se-á, apenas, sinteticamente, que possuem receitas próprias, conforme a regulamentação constante dos artigos 16º e segs. da Lei de Finanças Locais (incluindo, para os municípios, as que resultam de cobrança de impostos municipas, taxas e derramas), e poderão contrair empréstimos e utilizar aberturas de crédito, nos termos previstos nos artigos 23º e segs. da mesma Lei.
[39]) Cfr. artigo 3º da Lei n.º 94/2001.
[40]) De acordo, aliás, com um princípio geral que vem sendo aceite pela doutrina, segundo o qual os regulamentos de execução mantêm a sua vigência enquanto não forem substituídos, ainda que apenas na parte que se compatibilize com a nova lei (cfr. AFONSO RODRIGUES QUEIRÓ, Lições de Direito Administrativo, vol. I, Coimbra, 1976, pág. 483; no mesmo sentido, os pareceres do Conselho Consultivo n.ºs 68/91, de 20 de Maio de 1993, 59/95, de 9 de Novembro de 1995, e 9/96, de 19 de Agosto de 1996, este último publicado no “Diário da República”, II Série, de 29 de Novembro de 1996).
[41]) Este regime foi entretanto alterado, passando o SNPC a dispor de autonomia meramente administrativa, com as consequências que adiante se analisarão (cfr. antecedente nota 17).
[42]) O Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de Dezembro, estipulou a conversão em Euros dos valores fixados em escudos em diversos diplomas identificados em anexo, bem como a a aplicação automática da taxa de conversão prevista no artigo 1º do Regulamento CE n.º 2866/98, do Conselho, em relação a outras referências legais feitas em escudos.
[43]) Segue-se aqui, textualmente, por momentos, o acórdão do STA de 16 de Março de 1996, publicado no “Apêndice ao Diário da República”, de 31 de Agosto de 1998, pág. 2267. Sobre a matéria, também, o parecer do Conselho Consultivo n.º 48/98, publicado no “Diário da República”, II Série, de 4 de Janeiro de 2000.
Quanto ao conceito de autonomia administrativa, num sentido tradicional, veja-se MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, 10ª ed., Tomo I, 1973, pág. 222; e SÉRVULO CORREIA, Noções de Direito Administrativo, vol. I, Lisboa, 1982, pág. 194.
[44]) SOUSA FRANCO, Finanças Públicas e Direito Financeiro, vol. I, 4.ª edição (6.ª reimpressão), Coimbra, pág. 152.
[45]) Idem, págs, 152-153.
[46]) Nisso os organismos autónomos se distinguem dos serviços que se encontram numa relação de dependência hierárquica, que estão sujeitos a um poder de direcção dos órgãos superiores, envolvendo, nomeadamente, o poder de avocar os assuntos que lhes estiverem afectos.
[47]) A doutrina usa distinguir, em função do conteúdo do acto tutelar, entre tutela integrativa, tutela inspectiva, tutela sancionatória, tutela revogatória e tutela susbtitutiva (FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, I vol., 2.ª edição, Coimbra, págs. 702-703).
[48]) Retomam-se aqui, por momentos, considerações já expendidas no citado parecer do Conselho Consultivo n.º 26/2002.
[49]) Estabelece o quadro de competências, assim como o regime jurídico de funcionamento, dos órgãos dos municípios e das freguesias, tendo recebido uma primeira alteração, mediante a Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro – rectificada por Declaração n.º 9/2002, de 5 de Março -, sem influência no tema que nos ocupa.
Por outro lado, a norma referenciada reproduz a disposição do artigo 53º, n.º 1, alínea i), da anterior Lei das Autarquias Locais (Lei n.º 100/84, de 29 de Março, agora substituída pela Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro), pelo que o mesmo regime vigorava já à data em que tiveram lugar as acções de emergência em causa.
[50]) O preceito estabelece que “os actos administrativos que sejam inválidos só podem ser revogados com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respectivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida”.
[51]) Cfr. antecedente nota17.
[52]) Cfr. FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, II vol., Coimbra, 2001, pág. 451; ROBIN DE ANDRADE, A Revogação dos Actos Administrativos, Coimbra, 1969, pág. 229; e, entre outros, o acórdão do STA (Pleno), de 13 de Março de 1990, in “Apêndices ao Diário da República”, de 30 de Junho de 1992, pág. 245.
[53]) Nos termos do novo Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de Fevereiro (cuja entrada em vigor, porém, foi diferida para um ano após a sua publicação - artigo 9º da Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro), o prazo mais longo para a impugnação contenciosa – aquele que assiste ao Ministério Público – é ainda de um ano e está sujeito a idêntico regime de contagem.
[54]) Nos termos da parte final do artigo 141º, n.º 1, do CPA – que reproduz o artigo 48º da LPTA –, esse prazo estende-se até à resposta da autoridade recorrida, quando tenha sido interposto recurso contencioso, possibilitando que esta opere a revogação do acto impugnado já na pendência desse recurso.
[55]) Neste sentido, FREITAS DO AMARAL, ob. e loc. cit.; FREITAS DO AMARAL et allii, Código de Procedimento Administrativo, 2.ª edição, Coimbra, pág. 222.
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART27 N1 ART238; CPADM91 ART140 ART141 N1 N2; LPTA85 ART28 N1 C) ART29 N4; DL 363/88 DE 14/10 ART2 N1 ART7; LFL87 ART13 ART14; LFL98 ART2 N1 ART5 ART7 ART10-A ART11 ART13 ART14 ART14-A ART36; L 113/91 DE 29/08ART1 ART2 ART3 ART4 N1 A) A F) ART5 ART6 ART7 ART8 ART9 ART10 N1 ART11 N1 N2 E) F) ART12 ART13 N1 N2 ART15 N1 N2 ART16 ART17 ART20 N1 A) N2 N3 ART33; DL 231/86 DE 14/08 ART2 ART3 N1 A) ART4 ART5 ART6 ART7; DL 11/96 DE 29/02; DL 316/99 DE 11/08; DL 339/97 DE 04/12 ART1 N ART2 ART3 N1 ART5, DL 231/86 DE 14/08 ART1 N1 A) B9; DL 55/87 DE 31/01 ART1 ART2 ART14 ART15 N3; DL 92/92 DE 23/05; DL 107/92 DE 02/06; DL 117/93 DE 13/04; DR 23/93 DE 19/07; DL 203/93 DE 03/06 ART2 ART5 N1 N2 ART7 ART8 ART11 ART12 ART13 N1 ART14 D) ART17 N1 C) D) ART21 N2 N5 ART23 N1 C) ART31 N2 ART33 ART43; DL 222/93 DE 18/06 ART11; DL 78/75 DE 22/02; DL 510/80 DE 25/10; P 461/87 DE 02/06; DL 152/99 DE 10/05 ART1; RECT 10-AQ/99 DE 30/06; L 32-B/2002 DE 30/12 ART3; L 94/2001 DE 20/08 ART3 ART90 N1; LO 2/2002 DE 28/08; L 169/99 DE 18/09 ART53 N2 B) N4 ART68 N1 X); L 100/84 DE 29/03 ART39 N2 B); L 1/79 DE 02/01; L 98/84 DE 29/03; L 159/99 DE 14/09 ART3 N2; L 77/84 DE 08/03 ART14 N1; DL 384/87 24/12; DL 323/2001 DE 17/12; DL 104/80 DE 10/05; DL 442/86 DE 31/12; DL 96/93 DE 02/04; DL 155/92 DE 28/07 ART3; L 5-A/2002 DE 11/01; RECT 9/2002 05/03
Jurisprudência: 
AC STA DE 16/03/96
Referências Complementares: 
DIR ADM*ADM PUBL*****
REG CONS CE 28666/98
Divulgação
Data: 
11-07-2003
Página: 
10466
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