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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
71/1998, de 14.01.1999
Data do Parecer: 
14-01-1999
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Defesa Nacional
Relator: 
LOURENÇO MARTINS
Descritores e Conclusões
Descritores: 
DEFICIENTE DAS FORÇAS ARMADAS
QUALIFICAÇÃO AUTOMÁTICA
INCAPACIDADE GERAL DE GANHO
SERVIÇO DE CAMPANHA
Conclusões: 
1 - A norma da alínea c) do n.º 1 do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 43/76, de 20 de Janeiro, abrange os militares considerados deficientes ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 210/73, de 12 de Setembro;

2 - Para que um militar da Armada possa ser qualificado, de forma automática, como deficiente das Forças Armadas, para além de a conduta que lhe deu origem dever ter ocorrido em serviço de campanha, de manutenção da ordem pública ou de prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública, de acordo com o disposto no artigo 1.º n.º 1, daquele Decreto-Lei n.º 210/73, é ainda necessário que tenham sido observadas as regras de procedimento aí referidas, bem como na Portaria n.º 848/73, de 5 de Dezembro;

3 - A fim de um acidente poder ser caracterizado como tendo lugar em "serviço de campanha", tem de verificar-se no teatro de operações, tal como definido nos números 2 e 3 do artigo 2º do Decreto-Lei n.º 43/76, de 20 de Janeiro, sendo ainda indispensável que aquele acontecimento haja provindo de acção directa ou indirecta do inimigo, ou de qualquer outra acção de natureza operacional;

4 - A qualificação como deficiente das Forças Armadas exige um grau mínimo de incapacidade geral de 30% - n.º 1, alínea b), do artigo 2º do citado Decreto-Lei n.º 43/76;

5 - O SAJ FZ (...), não reúne condições para ser declarado, de forma automática, deficiente das Forças Armadas, e o acidente ocorrido em dia indeterminado de Agosto de 1970, do qual lhe resultou um grau de desvalorização de 14%, não possui os requisitos que permitam caracterizá-lo como tendo ocorrido em "serviço de campanha".
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Secretário de Estado
da Defesa Nacional,
Excelência:

1

Para ser submetido a parecer deste Corpo Consultivo nos termos do n.º 4 do artigo 2º do Decreto-Lei n.º 43/76, de 20 de Janeiro, dignou-se Vossa Excelência enviar o processo relativo ao SAJ FZ (...), na situação de reserva.

Cumpre, pois, emiti-lo.

2

2.1. Do processo extraem-se, com relevância para a consulta, os seguintes factos:

- recrutado em 1.10.63, para servir por 4 anos na Armada, o ora requerente (...) prestou quatro comissões de serviço no ex-Ultramar;

- quando se encontrava em Angola, integrado na CF8, em data indeterminada de Agosto de 1970, sofreu um traumatismo do dedo anelar da mão direita provocado em acidente de que foi vítima;

- este ocorreu quando, integrado numa patrulha de botes no Rio Zaire, ao ser detectada uma pequena lancha motorizada do inimigo, e ao tentar pôr em movimento apressadamente o motor do bote, tendo puxado o cordel da cremalheira, esta engatou-se, impedindo que o cordel desenrolasse por completo, o que lhe provocou o mencionado traumatismo;

- foi assistido inicialmente pelo enfermeiro do Posto da Pedra do Feitiço, e depois pelo médico do serviço de saúde de Santo António do Zaire;

- dada a frequência deste tipo de acidentes e a sua normal pouca gravidade não eram levantados processos, segundo informou o Comandante da Companhia;

- a solicitação do requerente ([1]), foi organizado processo pela ocorrência, no qual se determinaram os efeitos das lesões então sofridas;

- submetido a exame de sanidade, em 8.01.82, considerou-se apresentar "deformidade em extensão das falanges digitais do dedo anelar direito" determinante de um coeficiente de desvalorização de 8%, o qual foi confirmado pela Junta de Saúde Naval, em sessão de 29.01.82, e homologado superiormente;

- submetido de novo à JSN, em 22.03.83, esta considerou que das sequelas do acidente traumático do dedo anelar direito, devia atribuir-se-lhe um grau de incapacidade de 14%, deliberação também homologada superiormente, em 14.04.83;

- em requerimento datado de 5 de Junho de 1998 - ou seja, cerca de 15 anos depois da sujeição à JSN e sem que aparentemente tenha solicitado qualquer revisão do processo -, vem pedir que o acidente seja considerado com risco agravado equiparado a campanha;

- as autoridades militares, na sequência do parecer da Chefia do Serviço de Justiça ([2]), consideram que o acidente, contrariamente ao que o requerente pretende e o oficial averiguante admitiu, não deve ser considerado em campanha, mas apenas em serviço.


3

3.1. Tratando-se de factos ocorridos anteriormente à vigência do Decreto-Lei n.º 43/76, de 20 de Janeiro, importa começar por indagar se estamos ou não perante um caso de qualificação automática, nos termos do n.º 1 do artigo 18º desse diploma ([3]).

Dispõe tal preceito ([4]):

"O presente diploma é aplicável aos:

1. Cidadãos considerados, automaticamente, DFA:

a) Os inválidos da 1.ª Guerra Mundial, de 1914-1918, e das campanhas ultramarinas anteriores;

b) Os militares no activo que foram contemplados pelo Decreto-Lei n.º 44 995, de 24 de Abril de 1963, e que pelo n.º 18 da Portaria n.º 619/73, de 12 de Setembro, foram considerados abrangidos pelo disposto no Decreto-Lei n.º 210/73, de 9 de Maio;

c) Os considerados deficientes ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 210/73, de 9 de Maio.

2. Cidadãos que, nos termos e pelas causas constantes do n.º 2 do artigo 1.º, venham a ser reconhecidos DFA após revisão do processo.

3. Militares que venham a contrair deficiência em data ulterior à publicação deste Decreto-Lei e forem considerados DFA.

Prevê, pois, o n.º 1 do referido artigo 18º três situações de qualificação automática como DFA.

É evidente no caso em análise não se estar perante situação prevista na alínea a) desse n.º 1, o mesmo sucedendo quanto à alínea b), a qual dispõe para militares no activo nas condições aí previstas ([5]) ora não relevantes.

Resta a situação prevista na alínea c) - "cidadãos considerados deficientes ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 210/73, de 9 de Maio".


3.2. O Decreto-Lei n.º 210/73, de 9 de Maio, visou estender à generalidade dos militares o procedimento adoptado no Decreto-Lei n.º 44995, de 24 de Abril de 1963, que permitiu (artigo 1.º) continuarem ao serviço activo os militares do quadro permanente que tivessem sofrido diminuição da capacidade física em defesa da Pátria e que dispusessem de validez suficiente para continuarem a desempenhar de forma útil as suas funções, em cargos ou funções que dispensassem plena validez ([6]).
3.2.1. Na parte que ora mais interessa, dispôs o Decreto-Lei n.º 210/73:

"Artigo 1.º - 1. Os militares dos quadros permanentes das forças armadas deficientes em consequência de acidentes ou doenças resultantes do serviço de campanha ou de manutenção da ordem pública ou da prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública podem continuar na situação de activo ou optarem pela passagem à situação de reforma extraordinária.

................................................................................."

"Artigo 3º - O disposto no artigo 1.º é aplicável aos militares dos quadros permanentes das forças armadas com o posto ou graduação igual ou superior a primeiro-cabo do Exército e da Força Aérea e a marinheiro da Armada ([7])".

"Artigo 7º - 1. O disposto nos artigos anteriores aplica-se aos militares do quadro de complemento com o posto ou graduação igual ou superior a primeiro-cabo miliciano do Exército, pessoal militar não permanente da Armada com o posto igual ou superior a marinheiro e da Força Aérea com o posto igual ou superior a primeiro-cabo.

2. Os militares indicados no número anterior que se mantiverem ao serviço efectivo terão ingresso nos quadros permanentes.

3. O ingresso no quadro permanente será estabelecido em portaria a publicar pelos departamentos respectivos".

"Artigo 8º -1. Os militares indicados no n.º 1 do artigo 7º que não desejarem manter-se ou ingressar no serviço efectivo logo que terminado o tratamento médico a cargo dos serviços de saúde militares terão baixa de serviço e serão encaminhados para a reabilitação médica, vocacional, profissional e social a cargo dos Ministérios da Saúde e Assistência e das Corporações e Previdência Social, nos termos da respectiva legislação.

2. Às praças do Exército, Armada e Força Aérea que não são abrangidas pelas disposições anteriores é aplicável o regime estabelecido no número anterior na parte respeitante à reabilitação.

3. Os militares indicados no n.º 2 serão providos mediante requerimento nas vagas de lugares de pessoal civil das unidades, departamentos e estabelecimentos fabris militares, logo que o seu grau de reabilitação o permita".

"Artigo 17º o presente diploma aplica-se aos militares que se tenham tornado inválidos pelos motivos indicados no artigo 1.º, a partir de 1 de Janeiro de 1961, inclusive".


3.2.2. Regulamentando aquele diploma, à semelhança do que se fez pela Portaria n.º 619/73, de 12 de Setembro, para o Exército, estipulou-se na Portaria n.º 848/73, de 5 de Dezembro, para a Armada:

"1º - Consideram-se deficientes, para os efeitos consignados no Decreto-Lei n.º 210/73, de 9 de Maio, os militares da Armada que tenham sofrido desvalorização permanente na capacidade geral de exercício da sua actividade profissional, em consequência de acidentes ou doenças resultantes do serviço de campanha, de manutenção da ordem pública ou da prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública.

2º - A Junta de Saúde Naval (J.S.N.), à qual os militares são presentes quando hajam concluído o tratamento exigido pelo acidente ou doença referidos no número anterior, é a entidade competente para declarar a deficiência, para os efeitos consignados no diploma referido e na presente portaria.
..............................................................................

"5º - A decisão da J.S.N. carece de homologação do Ministro da Marinha.

6º - Os militares dos quadros permanentes ou que, não o sendo, tenham posto ou graduação igual ou superior a marinheiro e que, presentes à J.S.N., tenham sido declarados deficientes nos termos do n.º 1, deverão, quando notificados da respectiva decisão, declarar por escrito se optam pela continuação na efectividade do serviço, em funções que dispensem plena validez, ou pela passagem à situação de reforma extraordinária ou pela baixa do serviço com pensão de invalidez, conforme o que lhes for aplicável.

7º - Os militares que optarem pela continuação na efectividade do serviço ficam na situação de adidos aos respectivos quadros, caso pertençam aos quadros permanentes; não pertencendo a estes quadros, ingressam neles, nas condições estabelecidas nos números seguintes, ficando, igualmente, na situação de adidos a esses quadros.

8º - O ingresso nos quadros permanentes dos militares referidos na última parte do número anterior é feito, em princípio, no mesmo posto e na classe, subclasse e ramo que o Ministro da Marinha definir por despacho, sobre proposta do superintendente dos Serviços do Pessoal da Armada".


3.3. A situação do militar ora em causa, o qual prestou serviço na Armada durante cerca de 32 anos ([8]), tendo passado à situação de reserva em 30.06.95, caberia na previsão do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 210/73, e do n.º 1 da Portaria n.º 848/73, uma vez que se tratava de marinheiro da Armada.

Por isso que se deva agora apreciar da existência ou não desses pressupostos de concessão da qualidade de "deficiente automático", perante o disposto no Decreto-Lei n.º 210/73.

Recorde-se que nos termos do seu artigo 17.º, atrás transcrito, o diploma se aplica "aos militares que se tenham tornado inválidos pelos motivos indicados no artigo 1.º, a partir de 1 de Janeiro de 1961, inclusive".

Os motivos indicados nesse artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 210/73 ([9]), que poderiam determinar a qualificação de deficiente das Forças Armadas, eram que a incapacidade permanente proviesse de acidentes ou doenças resultantes de:

- serviço de campanha;

- manutenção da ordem pública;

- prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública.

Este corpo consultivo teve oportunidade de apreciar, no parecer n.º 38/89 ([10]), um caso de qualificação automática como DFA, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 43/76 (uma praça pertencente ao Exército).

Frisava-se aí:

"A actuação do regime legal estabelecido no Decreto-Lei n.º 210/73, na concretização dos direitos consignados no diploma, demandava pois uma série de actos, desde a verificação da incapacidade e homologação de decisão da Junta Hospitalar, passando pela qualificação do acidente ou do facto determinante da incapacidade, até à verificação dos pressupostos da qualificação de deficiente que permitia a opção pela continuação ao serviço activo ou pela pensão de aposentação extraordinária ou de invalidez (quanto a militares do quadro permanente ou de complemento com o posto igual ou superior a primeiro cabo ou marinheiro) ...".

"Verificada a deficiência (com o sentido qualificativo próprio no quadro do Decreto-Lei n.º 210/73 e da Portaria n.º 619/73), produziam-se então alguns daqueles efeitos...", nomeadamente e também o de poder ser considerado deficiente ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 210/73.

Ora, no caso em apreço, não há no processo qualquer notícia de que tenham sido observados os mecanismos legais a que se referem os preceitos acima mencionados, sendo certo que não existia sequer qualquer auto pela ocorrência verificada, o que só veio a suceder no ano de 1981. Ignora-se em que momento as lesões sofridas determinaram alguma incapacidade para o ora requerente, cuja existência evidentemente se tornava necessária para aquela qualificação.

Por conseguinte, concluimos que o requerente não pode ser classificado, de acordo com a alínea c) do n.º 1 do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 43/76, como deficiente (automático) das Forças Armadas ([11]), o que dispensaria a verificação de um coeficiente preciso de desvalorização, tal como passou a ser exigido com o diploma de 1976.

Resta, assim, avaliar se pode sê-lo em virtude do disposto no n.º 2 desse artigo 18º, isto é, se está abrangido, após a revisão do seu processo ([12]), pelas causas constantes do n.º 2 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 43/76.

É o que passaremos a fazer.

4

Dispõe o n.º 2 do artigo 1.º daquele Decreto-Lei:

"2. É considerado deficiente das Forças Armadas portuguesas o cidadão que:

No cumprimento do serviço militar e na defesa dos interesses da Pátria adquiriu uma diminuição na capacidade geral de ganho:

Quando em resultado de acidente ocorrido:

Em serviço de campanha ou em circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha, ou como prisioneiro de guerra;

Na manutenção da ordem pública;

Na prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública; ou:

No exercício das suas funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte necessariamente risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores;

Vem a sofrer, mesmo a posteriori uma diminuição permanente causada por lesão ou doença, adquirida ou agravada, consistindo em:

perda anatómica; ou:

Prejuízo ou perda de qualquer órgão ou função;

Tendo sido, em consequência, declarado, nos termos da legislação em vigor:

Apto para o desempenho de cargos ou funções que dispensem plena validez; ou

Incapaz do serviço activo; ou

Incapaz de todo o serviço militar".

E acrescenta-se no artigo 2º, n.º 1, alínea b):

"1. Para efeitos da definição constante do n.º 2 do artigo 1º deste decreto-lei, considera-se que:

a) (...)

b) É fixado em 30% o grau de incapacidade geral de ganho mínimo para o efeito da definição de deficiente das forças armadas e aplicação do presente decreto-lei".

Os números 2, 3 e 4 do mesmo artigo 2º estabelecem:

"2. O "serviço de campanha" tem lugar no teatro de operações onde se verifiquem operações de guerra, de guerrilha ou de contraguerrilha e envolve as acções directas do inimigo, os eventos decorrentes de actividade indirecta do inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade terrestre, naval ou aérea de natureza operacional.

"3. As "circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha" têm lugar no teatro de operações onde ocorram operações de guerra, guerrilha ou de contraguerrilha e envolvem os eventos directamente relacionados com a actividade operacional que pelas suas características impliquem perigo em circunstâncias de contacto possível com o inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade de natureza operacional, ou em actividade directamente relacionada, que pelas suas características próprias possa implicar perigosidade.

"4. "O exercício de funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores", engloba aqueles casos especiais, aí não previstos que, pela sua índole, considerado o quadro de causalidade, circunstâncias e agentes em que se desenrole, seja identificável com o espírito desta lei (redacção rectificada no "Diário da República", I Série 2º Suplemento, de 26/6/76).
A qualificação destes casos compete ao Ministro da Defesa Nacional, após parecer da Procuradoria-Geral da República".



5

5.1. O grau de incapacidade geral de ganho mínimo de 30% constitui condição imprescindível para a qualificação de deficiente das Forças Armadas, como prescreve a alínea b) do n.º 1 do artigo 2º do Decreto-Lei n.º 43/76, acabado de citar.

Nem sempre assim aconteceu, porquanto na vigência de diplomas anteriores, com idênticos objectivos, não se encontrava estabelecido tal limite mínimo, o que aliás vimos há instantes.

Como se afirmou em anteriores pareceres, trata-se de um requisito claramente expresso com a finalidade de "permitir o enquadramento como deficiente das Forças Armadas dos militares ou equiparados que tenham sido vítimas de uma diminuição da capacidade física ou psíquica de carácter permanente, de certa relevância, atingindo as respectivas capacidades de ganho, colocando-os em dificuldades profissionais e sociais". E observou-se também que a fixação desse mínimo visou equiparar, neste aspecto, os deficientes das Forças Armadas aos acidentados do trabalho por este modo se "terminando com a inconsequência do Decreto-Lei n.º 210/73, de 9 de Maio, que, não fixando limite mínimo àquela diminuição de capacidades, permitia a qualificação de militares portadores de incapacidades insignificantes em contradição com os objectivos fundamentais do diploma " ([13]).

Deste modo o grau de incapacidade de 14% atribuído ao sinistrado tornaria legalmente inviável a qualificação como deficiente das Forças Armadas.

À semelhança, porém, do que vem constituindo procedimento usual deste Conselho, se abordará, ainda que sumariamente, a questão da qualificação do acidente ([14]).


5.2. Do que ora se trata é de saber se o acidente a que os autos se referem ocorreu ou não em "serviço de campanha ou em circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha".

Partindo do pressuposto de que a ocorrência se deu no teatro de operações, onde se podiam verificar situações de guerrilha, não está estabelecido que se estivesse em presença de acções directas do inimigo ou de eventos decorrentes de actividade indirecta do inimigo ou de qualquer outra acção de natureza opreracional.

Mesmo para situações directamente relacionadas com o serviço de campanha, para que possa mostrar-se integrado aquele conceito de "serviço de campanha" não basta realizar uma qualquer actividade de natureza castrense de que resulte um acidente, mas torna-se necessário que ocorra um evento directamente relacionado com a actividade operacional e que, pelas suas características, implique perigo em circunstâncias de contacto possível com o inimigo.

Subjacente aos preceitos em causa perpassa sempre a noção de perigosidade.

O bote em que o sinistrado estava, à deriva no rio Zaire, com o motor parado, encontrava-se em patrulha numa zona de proximidade com o inimigo. E teria sido a presença de uma pequena lancha, identificável com ele, que determinou a urgência de pôr em movimento o motor, para eventual perseguição ou fuga, não se sabendo, porém, o que veio a suceder posteriormente. Da matéria de facto apurada nada se adianta, ignorando-se por completo se o facto de o motor não ter pegado, na tentativa de que o requerente saiu magoado, teve alguma influência na acção da patrulha. Se alguém o impulsionou de seguida e o pôs a trabalhar, se o inimigo se aproximou ou se se tratou de rebate falso.

Ora, como se assinalou no Parecer n.º 67/94 ([15]), "uma vez determinado que o acidente, doença ou seu agravamento, se verificou no teatro de operações, é ainda indispensável, para se afirmar a existência de uma situação de "serviço de campanha", que aquele acontecimento tenha provindo de acção directa ou indirecta do inimigo, ou de qualquer outra acção de natureza operacional".

A singularidade dos factos relatados e a insuficiência de elementos sobre o contexto em que ocorreram não permitem considerar que tenham tido lugar em "serviço de campanha", tal como o conceito deve ser entendido.


7

Pelo exposto extraem-se as seguintes conclusões:

1 - A norma da alínea c) do n.º 1 do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 43/76, de 20 de Janeiro, abrange os militares considerados deficientes ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 210/73, de 12 de Setembro;

2 - Para que um militar da Armada possa ser qualificado, de forma automática, como deficiente das Forças Armadas, para além de a conduta que lhe deu origem dever ter ocorrido em serviço de campanha, de manutenção da ordem pública ou de prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública, de acordo com o disposto no artigo 1.º n.º 1, daquele Decreto-Lei n.º 210/73, é ainda necessário que tenham sido observadas as regras de procedimento aí referidas, bem como na Portaria n.º 848/73, de 5 de Dezembro;

3 - A fim de um acidente poder ser caracterizado como tendo lugar em "serviço de campanha", tem de verificar-se no teatro de operações, tal como definido nos números 2 e 3 do artigo 2º do Decreto-Lei n.º 43/76, de 20 de Janeiro, sendo ainda indispensável que aquele acontecimento haja provindo de acção directa ou indirecta do inimigo, ou de qualquer outra acção de natureza operacional;

4 - A qualificação como deficiente das Forças Armadas exige um grau mínimo de incapacidade geral de 30% - n.º 1, alínea b), do artigo 2º do citado Decreto-Lei n.º 43/76;

5 - O SAJ FZ (...), não reúne condições para ser declarado, de forma automática, deficiente das Forças Armadas, e o acidente ocorrido em dia indeterminado de Agosto de 1970, do qual lhe resultou um grau de desvalorização de 14%, não possui os requisitos que permitam caracterizá-lo como tendo ocorrido em "serviço de campanha".

[1]) Requerimento de 23 de Abril de 1981.
[2]) Que chega a pôr em causa se tivesse verificado a presença de qualquer lancha inimiga - o que, porém, é afirmado pelo requerente e por uma testemunha que então se encontraria também no bote e deu a ordem de colocar o motor em movimento.
No entanto, o requerente disse não recordar quem era na altura o Oficial comandante do mesmo.
[3]) Seguimos de perto o que se disse no Parecer n.º 12/95, de 27.05.95, homologado, mas não publicado.
[4]) Estendemos a transcrição a normas que também nos interessam.
[5]) Militares dos quadros permanentes com posto ou graduação igual ou superior a primeiro cabo no Exército e na Força Aérea e a marinheiro da Armada, que integravam os respectivos quadros permanentes, mutilados em serviço de campanha ou directamente relacionado - artigos 1.º, 4.º, §2º e artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 44995, de 24 de Abril de 1963 - que foram considerados aptos para serviços condicionados.
Cfr. o Parecer n.º 83/90, de 25/10/90, homologado.
[6]) Nos termos do artigo 2º do Decreto-Lei n.º 44995, os militares nas condições do artigo anterior, logo que estivesse concluído o respectivo tratamento, eram presentes a uma junta médica, que julgaria se se encontravam aptos para todo o serviço activo ou apenas para o desempenho de cargos que dispensassem plena validez, segundo normas a estabelecer para cada departamento por portaria do titular respectivo.
A Portaria n.º 21716, de 7 de Janeiro de 1966, do Ministério do Exército, pôs em execução, a título provisório, as condições em que os referidos militares eram considerados abrangidos pelas disposições do Decreto-Lei n.º 44995, aprovando a tabela de lesões para a aplicação daquele Decreto-Lei.
[7]) Segundo consta da sua nota de assentos, este militar passou a marinheiro fuzileiro em 5 de Maio de 1968.
[8]) A nota de assentos é bastante lacunar.
[9]) Repetidos, aliás, no n.º 1 da Portaria n.º 848/73, de 5 de Dezembro.
[10]) De 25.01.90 , homologado, mas não publicado. Veja-se também o parecer n.º 42/90, de 27 de Setembro de 1990, no âmbito do qual se apreciou o acidente com um militar abrangido pelo artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 210/73.
[11]) Cfr., com interesse, a posição e os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo citados no Parecer n.º 93/90: da Secção, de 14/6/75 e de 10/7/86, e do Pleno da Secção do CA, de 14/7/88 (Rec. n.º 19361); da Secção de 29/9/88, publicado no BMJ n.º 379, p.p. 496 e segs.
[12]) Revisão que, pelo exame das fotocópias enviadas, não se detecta tenha sido pedida - cfr. o disposto nas Portarias n.ºs 162/76, de 24 de Março e 114/79, de 12 de Março.
[13]) Parecer n.º 115/78, de 6/7/78, publicado no Diário da República, II Série, n.º 244, de 23/10/78, pág. 6414, cujos termos foram retomados, mais recentemente, nos pareceres n.º 113/87, de 28/4/88, e n.º 153/88, de 2/2/89.
Cfr. ainda os pareceres nºs 207/77, de 27/10/77, 51/87, de 17/6/87, 44/89, de 11/5/89, todos homologados e o penúltimo publicado no "Diário da República, I Série, n.º 219, de 23/4/87, pág. 11559, nos quais se versou a matéria deste limite mínimo de incapacidade.
[14]) No citado Parecer n.º 12/95, em caso semelhante, dá-se a entender do benefício que adviria para o sinistrado na qualificação do acidente como proveniente de serviço de campanha ou equiparado, para efeitos de cálculo da pensão - cfr. o artigo 54.º (pensão de aposentação extraordinária), n.º 3, do Estatuto da Aposentação e também os artigos 127º e 128º, quanto à pensão de invalidez para militares não subscritores da CGA e o artigo 38º, todos do EA.
Para melhor esclarecimento desta matéria pode ver-se o ponto 7 do já citado Parecer n.º 38/89.
[15]) De 12 de Outubro de 1995, homologado, mas não publicado, citando o Parecer n.º 195/79, de 7.02.80, este publicado no Diário da República, II Série, de 3.11.80, e no BMJ, n.º 301, pp. 187 e sgs., conclusão 4ª.
Anotações
Legislação: 
DL 43/76 DE 1976/01/20 ART1 N2 ART2 N1 B N2 N3 N4 ART18 N1 C.
DL 210/73 DE 19873/05/09 ART1 N1 ART3 ART7 N1 N2 N3 ART8 N1 N2 N3 ART17.
DL 44995 DE 1963/04/24 ART1.
PORT 619/73 DE 1973/09/12.
PORT 848/73 DE 1973/12/05 ART1 ART2 ART5 ART6 ART7 ART8.
Referências Complementares: 
DIR ADM * DEFIC FFAA.
Divulgação
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