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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
38/1989, de 25.01.1990
Data do Parecer: 
25-01-1990
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Defesa Nacional
Relator: 
HENRIQUES GASPAR
Descritores e Conclusões
Descritores: 
DEFICIENTE DAS FORÇAS ARMADAS
QUALIFICAÇÃO AUTOMATICA
INCAPACIDADE GERAL DE GANHO
MILITAR
PRAÇA
PENSÃO DE INVALIDEZ
ACTO DE ACERTAMENTO
REVISÃO DE PROCESSO
Conclusões: 
1 - São considerados deficientes para os efeitos do disposto no Decreto-Lei n 210/73, de 9 de Maio e da Portaria 619/73, de 12 de Setembro, os militares que, a partir de 1 de Janeiro de 1961, hajam sofrido desvalorização permanente na capacidade geral de exercicio da sua actividade profissional em consequencia de acidentes ou doenças resultantes de serviço de campanha, de manutenção da ordem publica ou da pratica de acto humanitario ou de dedicação a causa publica;
2 - A qualidade de deficiente, como pressuposto da produção dos efeitos consignados no Decreto-Lei n 210/73, de 9 de Maio (opção pela continuação no serviço activo quanto a militares do quadro permanente referidos no artigo 3, n 1, ou do complemento referidos no artigo 7, n 1, e suceptibilidade de acederem a medidas de reabilitação e de serem nomeados para vagas de lugares civis nos estabelecimentos das forças armadas, quanto as praças referidas no artigo 8, n 2, daquele diploma), resultava da verificação da incapacidade, e de juizo sobre as circunstancias em que ocorrera o acidente ou o evento que a determinou;
3 - Considerado um militar deficiente ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n 210/73, de 9 de Maio, qualifica-se automaticamente como DFA, nos termos do artigo 18, n 1, alinea c), do Decreto-Lei 43/76, de 20 de Janeiro, produzindo-se os efeitos inerentes a qualificação como DFA no ambito deste diploma imediatamente e por mero efeito da lei, independentemente de qualquer acto que considere nesta situação os destinatarios do preceito;
4 - Nestes termos, o soldado (...) portador de uma incapacidade geral de 19%, resultante de acidente sofrido em circunstancias qualificadas como serviço de campanha, deve ser considerado deficiente ao abrigo do Decreto-Lei n 210/73, de 9 de Maio;
5 - Consequentemente, beneficia de qualificação automatica como DFA nos termos do artigo 18, n 1, alinea c), do Decreto-Lei n 43/76, de 20 de Janeiro;
6 - A actualização de pensões, bem como de abonos, e prestações suplementares, previstos no Decreto-Lei n 43/76, de 20 de Janeiro não dispensa o pedido do interessado, produzindo-se os efeitos respectivos apenas a partir do momento em que o titular do direito assim se apresenta a exerce-lo.
Texto Integral
Texto Integral: 
1. Foi enviado a esta Procuradoria-Geral o processo relativo ao soldado NM(...) (...), a fim de ser submetido a parecer com vista a uma eventual qualificação daquele militar como deficiente das Forças Armadas.
Segundo o que se expõe no expediente enviado (1), o Núcleo de Apoio Jurídico do Gabinete de Vossa Excelência tem vindo a ser confrontado com múltiplos casos de acidentes ocorridos no domínio da legislação anterior ao Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro e, "potencialmente enquadráveis nas denominadas qualificações automáticas (artigo 18º do diploma citado)".
"Importando definir todo o enquadramento jurídico em tais casos, nomeadamente da necessidade de um acto formal de qualificação automática e de definição dos critérios a adoptar para se poder considerar que o requerente preenche os requisitos para tal qualificação, com os inerentes reflexos no momento a partir do qual será devida a pensão de D.F.A.", dignou-se Vossa Excelência solicitar parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral, nos termos da alínea a) do artigo 34º da Lei nº 47/86, de 15 de Outubro.
Cumpre, assim, emitir parecer.
2. A delimitação do tema da consulta impõe um prévio apontamento sobre a situação concreta relativamente ao processo enviado com o pedido de parecer.
(...) "ex-soldado nº(...), na situação de incapaz de todo o serviço militar, pensionista de invalidez", considerando-se abrangido pela alínea a) dos artigos 2º e 17º do Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio, em conjugação com o artigo 18º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, veio requerer a revisão do processo ao abrigo dos nºs 1 e 3 da Portaria nº 162/76, de 24 de Março e nº 1 da Portaria nº 114/79, de 12 de Março, a "fim de lhe ser reconhecida a qualificação de D.F.A.".
Fundamenta o pedido invocado as seguintes circunstâncias:
- em 22 de Outubro de 1969 embarcou para a Guiné;
- durante uma operação na zona de BUBA sofreu vários ferimentos espalhados por todo o corpo, e fractura do perónio do membro inferior esquerdo;
- por esse motivo baixou ao H.M. de Bissau, donde foi transferido para o H.M.P., tendo sido presente a uma J.H.I. que o julgou incapaz de todo o serviço militar com uma desvalorização de 19%, homologada em 9 de Novembro de 1971;
- o acidente foi considerado como ocorrido em serviço de campanha.
A petição apresentada foi objecto de informação produzida na Repartição de Justiça e Disciplina do Estado Maior do Exército. Pelo interesse dos elementos que contém, transcreve-se nos pontos relevantes:
"1. O presente processo concerne ao soldado NM (...) (...) incorporado em 6 de Maio de 1969. Embarcou para o CTI da Guiné em 22 de Outubro de 1969, desembarcou em Bissau em 28 de Outubro de 1969".
"2. No dia 2 de Janeiro de 1971 o militar ficou ferido em consequência do rebentamento de uma granada, quando integrado num grupo de combate se preparava para sair para a contrapenetração".
3. ( ... )
"4. Em 14 de Setembro de 1971 o militar foi presente à J.H.I. que o julgou "incapaz de todo o serviço militar", e apto parcialmente para o trabalho com desvalorização de 19% por sequela de fractura exposta do perónio esquerdo.
"5. o mapa de JHI foi homologado em 9 de Novembro de 1971."
"6. A CPIP considerou que o motivo pelo qual a JHI julgou este militar incapaz de todo o serviço, deve ser qualificado como ferimentos em campanha. Este parecer foi homologado em 7 de Setembro de 1972".
E, na sequência, concluiu - e assim informou -, que o processo deveria ser "remetido ao MDN, ao abrigo do artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/88, de 8 de Fevereiro, com vista a uma eventual qualificação automática de DFA (artigo 18º, alínea a), do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro)".
3. 0 Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, constitui o instrumento legislativo através do qual o Estado Português, considerando justo o reconhecimento do direito à plena reparação das consequências sobrevindas no cumprimento do dever militar aos que foram chamados a servir em situações de perigo ou perigosidade, estabeleceu um regime de reabilitação, assistência e reparação aos deficientes das forças armadas que traduzisse o "reflexo da consideração que os valores morais e patrióticos" devem merecer por parte da Nação (2) .
0 diploma definiu, "de forma completa", o conceito de deficiente das forças armadas (DFA) (3) , e, em relação ao regime antecedente, alargou os pressupostos de qualificação de deficiente a casos que, pelo respectivo condicionalismo, justificavam os mesmos critérios de qualificação.

0 conceito de deficiente das forças armadas vem definido no artigo 1º, nº 2 deste diploma, que dispõe:
"2. É considerado deficiente das forças armadas portuguesas o cidadão que:
No cumprimento do serviço militar e na defesa dos interesses da Pátria adquiriu uma diminuição na capacidade geral de ganho; quando em resultado de acidente ocorrido:
Em serviço de campanha ou em circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha, ou como prisioneiro de guerra:
Na manutenção da ordem pública;
Na prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública; ou
No exercício das suas funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores; vem a sofrer, mesmo a posteriori, uma diminuição permanente, causada por lesão ou doença, adquirida ou agravada, consistindo em:
Perda anatómica; ou
Prejuízo ou perda de qualquer órgão ou função; tendo sido, em consequência, declarado, nos termos da legislação em vigor:
Apto para o desempenho de cargos ou funções que dispensem plena validez; ou
Incapaz do serviço activo; ou
Incapaz de todo o serviço militar".
No artigo 2º, nº 1, alínea b) concretizam-se os termos da definição.
"1. Para efeitos da definição constante do nº 2 do artigo 1º deste decreto-lei, considera-se que:
a)( ... )
b) É fixado em 30% o grau de incapacidade geral de ganho mínimo para o efeito da definição de deficiente das forças armadas e aplicação do presente decreto-lei".
Os nºs 2, 3 e 4 do mesmo artigo 2º esclarecem, por seu lado:
"2. 0 "serviço de campanha ou campanha" tem lugar no teatro de operações onde se verifiquem operações de guerra, de guerrilha ou de contraguerrilha e envolve as acções directas do inimigo, os eventos decorrentes de actividade indirecta do inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade terrestre, naval ou aérea de natureza operacional .
"3. As "circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha" têm lugar no teatro de operações onde ocorram operações de guerra, guerrilha ou de contraguerrilha e envolvem os eventos directamente relacionados com a actividade operacional que pelas suas características impliquem perigo em circunstâncias de contacto possível com o inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade de natureza operacional, ou em actividade directamente relacionada, que pelas suas características próprias possam implicar perigosidade.
"4. "0 exercício de funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores", engloba aqueles casos especiais, aí não previstos que, pela sua índole, considerado o quadro de causalidade, circunstâncias e agentes em que se desenrole, seja identificável com o espírito desta lei.
A qualificação destes casos compete ao Ministro da Defesa Nacional, após parecer da Procuradoria-Geral da República".
0 Decreto-Lei nº 43/76, concretizando o reconhecimento do direito à plena reparação das consequências sobrevindas do cumprimento dos deveres militares, ou em situações de perigosidade equiparadas, assume-se de expressa aplicabilidade a situações passadas: a sua disciplina – nos pressupostos de definição do conceito de deficiente e no consequente elenco de medidas reparadoras - vale para situações corridas no assado, já conceitualmente definidas, ou a definir, segundo os novos pressupostos, por meio de adequado processo de revisão.
E, assim, dispôs no artigo 18º:
"0 presente diploma é aplicável aos:
1.Cidadãos considerados automaticamente, DFA:
a) os inválidos da 1ª Guerra Mundial, de 1914-1918, e das campanhas ultramarinas anteriores;
b) os militares no activo que foram contemplados pelo Decreto-Lei nº 44995, de 24 de Abril de 1963, e que pelo nº 18 da Portaria nº 619/73, de 12 de Setembro, foram considerados abrangidos pelo disposto no Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio;
c) Os considerados deficientes ao abrigo do disposto no Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio.
2. Cidadãos que, nos termos e pelas causas constantes do nº 2 do artigo 1º, venham a ser reconhecidos DFA após revisão do processo.
3. Militares que venham a contrair deficiências em data ulterior à publicação deste decreto-lei e forem considerados DFA.
( ... ) "
A específica fixação do âmbito material e pessoal da aplicação do diploma, segundo a disciplina desta norma, inscreve-se em três círculos, temporal e materialmente delimitados.
Aplica-se para o futuro e a situações novas (como seria regra geral); as situações passadas que se inscrevam no círculo dos pressupostos do conceito de deficiente das forças armadas que o diploma definiu; e a outras situações passadas em que se encontrem cidadãos automaticamente considerados como deficientes das forças armadas.
À concreta questão colocada na consulta, pelos termos de facto como se apresenta, importa a definição do âmbito e limites deste círculo de aplicabilidade do regime do Decreto-Lei nº 43/76: a situações de qualificação automática como deficiente das forças armadas.
4. Para além das situações referidas no mencionado artigo 18º, nº 1, alínea a) (que não suscitará dificuldades de determinação do respectivo âmbito pessoal), e da alínea b), que dispõe para militares no activo nas condições aí previstas (4) e que não interessam para o caso submetido à apreciação, a alínea c) alude a cidadãos considerados
deficientes ao abrigo do disposto no Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio.
0 Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio, pretendeu ampliar o universo pessoal de aplicação do Decreto-Lei nº 44995, de 24 de Abril de 1963 (5) .
A intenção ordenadora das medidas ampliativas daquele diploma vem expressamente desenvolvida na respectiva nota preambular. 0 legislador, após considerar que o diploma de 1963 havia dado um "passo importante" no caminho trilhado pelo Governo no sentido da reabilitação dos militares deficientes ao serviço da Nação e sua integração no meio social, permitindo que continuassem ao serviço activo militares do quadro permanente que tivessem sofrido diminuição da capacidade física em defesa da Pátria e que dispusessem de validez suficiente para continuarem a desempenhar de forma útil as suas funções", acrescentou:
"Entende-se, contudo, que o reconhecimento que a Nação deve àqueles que, no cumprimento dos seus deveres militares, se sacrificaram por ela exige que este procedimento seja tornado extensivo à generalidade dos militares.
Assim, fica preceituado o alargamento das regalias previstas no citado diploma a todos os militares do quadro permanente e do quadro de complemento do Exército e pessoal militar não permanente da Armada e Força Aérea que se tornem deficientes em consequência de acidentes ou doenças resultantes do serviço de campanha ou de manutenção da ordem pública ou da prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública."
Dispõe o artigo 1º deste diploma:
nº 1. "Os militares dos quadros permanentes das forças armadas deficientes em consequência de acidentes ou doenças resultantes do serviço de campanha ou de manutenção da ordem pública ou da prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública podem continuar na situação de activo ou optarem pela passagem à situação de reforma extraordinária.
nº 2. Ficam exceptuados do âmbito definido no nº 1 deste artigo os acidentes ou doenças intencionalmente provocados pelo próprio deficiente ou provenientes de acções ou omissões por ele cometidas contra ordens expressas superiores ou em desrespeito das condições de segurança determinadas por autoridades competentes, desde que não justificadas pelo estado de necessidade.
nº 3. No caso de os militares se encontrarem impossibilitados de prestar a declaração referida no nº 1 o seu silêncio entende-se como desejo de permanecer na situação de activo".
Por sua vez, o artigo 2º explicitou o conceito de serviço de campanha nos termos seguintes:
"São considerados acidentes ou doenças resultantes do serviço de campanha os provocados por:
a)Acção positiva directa do inimigo;
b)Eventos decorrentes de actuação indirecta do inimigo;
c)Eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade de natureza operacional ou em actividade directamente relacionada que, pelas suas características próprias possa implicar perigosidade ou hipóteses de contacto com o inimigo;
d)Eventos não indicados nas alíneas anteriores assim considerados pelo Ministro da Defesa Nacional, por proposta dos titulares das pastas da Marinha, Exército ou Aeronáutica, conforme os casos."
A especificação do âmbito pessoal de aplicação do diploma quanto à extensão do sentido da expressão "militares dos quadros permanentes das forças armadas" consta do artigo 3º que expressamente dispõe ser o disposto no artigo 1º "aplicável aos militares dos quadros permanentes das forças armadas com o posto ou graduação igual ou superior a primeiro-cabo do exército e da Força Aérea e a marinheiro da Armada".
Por sua vez, o artigo 7º concretiza a intenção de alargamento de âmbito, por referência à legislação anterior, expressamente referida no preâmbulo como a finalidade principal do Decreto-Lei nº 210/73.
Segundo esta norma, o disposto nos artigos 1º a 6º, relativamente a militares dos quadros permanentes (6)aplicava-se aos militares do complemento com o posto ou graduação igual ou superior a primeiro-cabo miliciano do exército, pessoal militar não permanente da Armada com o posto igual ou superior a marinheiro, e da Força Aérea com o posto igual ou superior a primeiro-cabo, sendo que estes militares que se mantiverem ao serviço efectivo teriam ingresso nos quadros permanentes (nºs 1 e 2). De acordo com o nº 3, o ingresso no quadro permanente seria estabelecido em portaria a publicar pelos departamentos respectivos.
Respeitando, ainda, à delimitação do universo pessoal de aplicação, importa considerar a disciplina do artigo 8º, designadamente os números 2. e 3.:
Dispunha:
"1. Os militares indicados no número 1. do artigo 7º (7) que não desejarem manter-se ou ingressar ao serviço efectivo logo que terminado o tratamento médico a cargo dos serviços de saúde militar terão baixa do serviço e serão encaminhados para a reabilitação médica, vocacional, profissional e social a cargo dos Ministérios da Saúde e Assistência e das Corporações e Previdência Social, nos termos da respectiva legislação.
2. As praças do Exército, Armada e Força Aérea que não são abrangidos pelas disposições anteriores, é aplicável o regime estabelecido no número anterior na parte respeitante à reabilitação.
3. Os militares indicados no número 2. serão providos mediante requerimento nas vagas de lugares de pessoal civil das unidades, departamentos e estabelecimentos fabris militares logo que o seu grau de reabilitação o permita".
Da conjugação do disposto nos artigos 1º, 7º e 8º, no 2 e 3 resulta assim patente uma diferenciação na aplicabilidade das medidas estabelecidas no diploma aos militares do quadro permanente, ou do complemento, com o sentido que a estas expressões é dado, de um lado, e às praças do Exército, Armada e Força Aérea, de outro.
Adiante se retomará esta distinção, para se determinar o sentido e alcance da limitação inscrita no nº 2 do artigo 8º.
5. No que respeita ao Ministério do Exército, a regulamentação "das determinações constantes" do Decreto-Lei nº 210/73 foi efectuada através da Portaria nº 619/73, de 12 de Setembro.
Afirmando no nº 1 que "são considerados deficientes para os efeitos consignados no Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio, os militares que tenham sofrido desvalorização permanente na capacidade geral de exercício da sua actividade profissional, em consequência de acidentes ou doenças resultantes do serviço de campanha, de manutenção da ordem pública ou prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública", estabelecia nos números seguintes regras de procedimento adequado à efectivação dos direitos consignados no Decreto-Lei nº 210/73, designadamente quanto à opção pela continuação no serviço activo.
Fixou deste modo regras sobre o prazo em que os militares poderiam solicitar o regresso à situação no activo – nº 2; sobre o procedimento de verificação da desvalorização permanente através da Junta Hospitalar de Inspecção – nº 3; sobre competência de homologação das deliberações da Junta e regras de recurso dessas deliberações – nºs 8 e 9; e relativamente ao destino funcional a dar aos militares que optassem pela continuação ao serviço activo – nºs 10 , 11 e 12.
A regulamentação constante desta Portaria, como resulta patente dos procedimentos estabelecidos, teve como destinatários unicamente os militares que, nos termos do Decreto-Lei nº 210/73, podiam, se assim o desejassem, optar pela continuação no activo em serviços que dispensassem plena validez.
Vocacionada para disciplinar sobre a opção pela continuação no serviço activo (atribuição de grau de invalidez, opção pela continuação no activo em regime que dispensasse plena validez, regras sobre destino funcional a dar aos militares que fizessem essa opção), a Portaria não tem campo pessoal de aplicação aos militares que não estavam abrangidos pela possibilidade da opção - precisamente, nos termos do artigo 8º, nº 2 do Decreto-Lei nº 210/73, as praças do Exército, Armada e Força Aérea.
6. A limitação de aplicabilidade inscrita no referido nº 2 do artigo 8º do Decreto-Lei nº 210/73, no que respeita às praças do Exército, Armada e Força Aérea, não se apresenta imediatamente apreensível, necessitando de um esforço de interpretação.
Com efeito, ao explicitar que as praças (...) "não são abrangidas pelas disposições anteriores a norma do mencionado artigo 8º, nº2, pode comportar um sentido literal envolvendo desequilíbrio na unidade do sistema implantado.
A leitura desta parte da norma e a fixação do seu sentido, não pode ser desligada do ponto em que nela se fixam também algumas consequências e efeitos - consequências e efeitos de uma certa situação, do estabelecimento e verificação de algum ou alguns pressupostos dos quais decorram.
Dizendo-se não ser aplicável a essas praças as disposições anteriores, não se poderá pensar, na verdade, na não aplicabilidade total das disposições anteriores (artigos 1º a 7º do Decreto-Lei nº 210/73), nas quais se englobam também - artigos 1º e 2º -, os pressupostos de que depende a situação de deficiente (acidente em serviço de campanha de manutenção da ordem pública, ou acto humanitário ou de dedicação à causa pública).
É que, para as aludidas praças alguns efeitos ainda são retirados do regime do diploma: os indicados no artigo 8º, nºs 2 e 3.
Tais efeitos pressupõem não, evidentemente, a simples qualidade militar de "praça', mas a verificação de determinados pressupostos para os quais o diploma rege - as situações em que se verifique deficiência, originada nas circunstâncias referidas.
Deste modo, quando o artigo 8º, nº 2, dispõe sobre a limitação de aplicabilidade às praças aí referidas, apenas pode ser entendido no contexto de uma limitação das disposições anteriores do diploma do que seja próprio do regime consequencial estabelecido para os militares do quadro permanente ou de complemento, com a definição de âmbito que expressamente se determina.
Isto é, essas praças, muito embora não possam daí retirar outros efeitos que não os consignados nos referidos nºs 1, 2 e 3 do artigo 8º, serão (poderão ser) considerados deficientes - qualificação, ou constatarão de que esses efeitos dependem - desde que também quanto aos referidos militares se verifique uma situação de invalidez nas condições determinadas pelo diploma.
Não será assim possível apenas a opção pela manutenção no serviço activo ou pela pensão de invalidez.
Há, pois, que proceder, neste sentido, a uma interpretação declarativa do nº 2 do artigo 8º fixando-lhe a seguinte compreensão: - as praças de Exército, Armada e Força Aérea referidas nesse preceito, deficientadas em razão de acidente ocorrido nas circunstâncias referidas no artigo 1º, do mesmo diploma, não beneficiam das regras próprias de opção pelo serviço activo ou pensão de aposentação ou de invalidez, exclusiva dos militares do quadro permanente ou de complemento com o posto igual ou superior a primeiro-cabo ou marinheiro, mas apenas dos direitos consignados no artigo 8º, nº 1, na parte respeitante a reabilitação, e de serem providos mediante requerimento nas "vagas de lugares de pessoal civil das unidades, departamentos e estabelecimentos fabris militares".
Embora para estes mais limitados efeitos (além da atribuição da pensão de invalidez), as praças apresentavam-se susceptíveis de serem consideradas deficientes ao abrigo do disposto no Decreto-Lei nº 210/73.
Desde que, obviamente, concorressem os respectivos pressupostos materiais de consideração.
7. Importará, em breve parêntesis, deixar algumas notas sobre o regime legal de atribuição da pensão de invalidez.
0 regime das pensões de reserva e de reforma dos oficiais e das praças do Exército constava do Decreto-Lei nº 28404, de 31 de Dezembro de 1937.
Nos termos do artigo 8º deste diploma, tinham direito à reforma extraordinária os militares que se tornassem inábeis para o serviço em consequência de desastre no exercício das suas funções; por ferimento ou mutilação grave em combate ou na manutenção da ordem pública; em virtude de moléstia, ferimento ou mutilação resultante da prática de algum acto humanitário ou de dedicação à causa pública ou de moléstia contraída no exercício das suas funções e por motivo do seu desempenho - alíneas a), b), c) e d).
0 Decreto-Lei nº 28404 foi parcialmente revogado pelo Decreto-Lei nº 45684, de 27 de Abril de 1964, que actualizou as disposições reguladoras da concessão aos militares dos três ramos das forças armadas da pensão de reforma extraordinária e da pensão de invalidez.
Segundo o disposto no artigo 1º tinham direito à reforma extraordinária os militares que nesta qualidade fossem subscritores da Caixa Geral de Aposentações e que se tornassem inábeis para o serviço em consequência de:
Moléstia, ferimento ou mutilação contraída no exercício das suas funções e por motivo do seu desempenho;
Ferimento ou mutilação em campanha ou na manutenção da ordem pública;
Moléstia, ferimento ou mutilação resultante da prática de algum acto humanitário ou de dedicação à causa pública.
E no artigo 2º (8) determinava-se que o pessoal miliciano, o pessoal das reservas da marinha, os primeiros e segundos-cabos, os soldados e os grumetes, não abrangidos pelo artigo anterior, quando, no desempenho dos seus deveres militares e por qualquer das causas referidas no mesmo artigo, venham a sofrer de impotência funcional a que corresponda a incapacidade profissional igual ou superior a 15 por cento, segundo a tabela nacional de incapacidade, aprovada pelo Decreto nº 43189, de 23 de Setembro de 1960, tinha direito ao abono de uma pensão de invalidez, que seria fixada nos mesmos termos em que, segundo as disposições do presente diploma, o era a pensão de reforma extraordinária dos militares subscritores da Caixa Geral de Aposentações.
Fundamento da pensão de invalidez relativamente aos militares que não sejam subscritores da Caixa-Geral de Aposentações consta, actualmente, do artigo 127º do Estatuto da Aposentação (Decreto-Lei nº 498/72, de 9 de Dezembro), que dispõe:
" 1. Os militares que não sejam subscritores da Caixa Geral de Aposentações têm direito a uma pensão de invalidez pelas mesmas causas que servem de fundamento à reforma extraordinária.
2. 0 disposto no número anterior abrange os capelães militares eventuais."
Deixou, pois, de se exigir grau mínimo de desvalorização(9) .
8 Os pressupostos da qualificação como deficiente para os efeitos do Decreto-Lei nº 210/73 (10) consistiam na existência de uma invalidez permanente originada em acidente em serviço de campanha ou de manutenção da ordem pública, ou em acto humanitário ou de dedicação à causa pública.
A verificação da incapacidade e a averiguação e o estabelecimento da relação entre as circunstâncias específicas do facto gerador e as consequências respectivas, na sequência de procedimentos apropriados, constituía objecto de actos que, na medida do respectivo conteúdo, operavam uma alteração na situação jurídica do militar ao qual se referiam e na posição dele perante a Administração.
Mas, uma vez definida a posição do militar perante a Administração com a prática desses actos (apuramento de grau de deficiência, e das particulares circunstâncias em que ocorreu o facto que a determinara), ficava implicitamente determinada a qualificação (estado) que constituía pressuposto do desencadeamento de outros efeitos legais a continuação no serviço activo, ou a atribuição da pensão de aposentação ou de invalidez por que o militar optara.
Deste modo, qualquer um destes efeitos (recte, o acto que relativamente a cada militar definisse a pensão ou a continuação - ou integração no activo em serviço que dispensasse plena validez) teria como fundamento a constatação da existência da qualidade de deficiente; só a constatação dessa condição poderia desencadear a atribuição dos mencionados efeitos consequenciais.
Mas, sendo assim no que respeita aos efeitos produzidos no regime do Decreto-Lei nº 210/73 relativamente aos militares aos quais era possibilitada a opção pelo serviço activo, por maioria será no que respeitasse aos militares relativamente a quem a opção não era possibilitada: as praças do Exército, Armada e Força Aérea, referidas no artigo 8º, nº 2, daquele diploma.
Nestes casos, um acto de constatação da situação, (ou qualidade, ou estado) do deficientado impunha-se como prius relativamente às consequências previstas na lei; sem semelhante apuramento, não seria admissível o requerimento (o deferimento do requerimento) e a colocação, nos termos previstos, nas vagas de pessoal civil dos estabelecimentos militares.
Com efeito, a referida qualidade (designe-se assim por comodidade do método expositivo) resulta necessariamente da verificação das condições definidas na lei: a incapacidade, apurada segundo procedimento apropriado, e o juízo sobre as circunstâncias em que ocorreu o acidente ou o acto que a determinara. Os efeitos posteriores, previstos na lei, que pressupusessem a referida qualidade, desencadear-se-iam constatada a situação (no quadro de lei) de deficiência.
0 reconhecimento ou a declaração de existência de certos factos ou direitos pode implicar um juízo de existência necessário para que se desencadeiem certos efeitos legais.
Estes actos que objectivam verificar uma dada situação real, isto é, a existência de uma situação susceptível de desencadear uma série de efeitos legais, reconduzem-se a uma actividade da espécie doutrinalmente designada por actos de "accertamento".
Pressupõem tais actos um procedimento de verificação, constituído por uma operação, ou série de operações dirigidas ao conhecimento de determinados factos, de determinadas realidades materiais (e/ou jurídicas). São actos declarativos que se limitam a verificar a existência ou a reconhecer a validade de direitos ou situações jurídicas pré-existentes; não criam um direito que antes não existisse, mas reconhecem, constatam, formalmente, a existência desse direito ou de uma situação que desencadeie, ou seja apta a desencadear, determinados efeitos jurídicos (11) .
"Os actos de verificação (accertamenti, feststellende Verwaltungsakte) reconhecem ou declaram, em aplicação de uma norma jurídica, a existência de factos, qualidades ou direitos de que a lei faz derivar determinadas consequências. Este juízo sobre algo que já existe não se traduz na introdução inovatória de elementos substantivos numa situação jurídica. Mas, apesar de tudo, permanece o factor da definição inovatória de uma situação jurídico-administrativa concreta, sem o qual não nos encontraríamos perante um verdadeiro acto administrativo: o acto de verificação inova no seio do ordenamento jurídico ao tornar certa e incontestável, no uso de um poder de autoridade, a situação que enuncia, a qual já existia, mas não revestida de imperatividade" (12) .
A actuação do regime legal estabelecido no Decreto-Lei nº 210/73, na concretização dos direitos consignados no diploma, demandava pois uma série de actos, desde a verificação da incapacidade e homologação de decisão da Junta Hospitalar, passando pela qualificação do acidente ou do facto determinante da incapacidade , até a verificação dos pressupostos da qualificação de deficiente, que permitia a opção pela continuação ao serviço activo ou pela pensão de aposentação extraordinária ou de invalidez (quanto a militares do quadro permanente ou do complemento com o, posto igual ou superior a primeiro-cabo ou marinheiro), ou apenas aplicação do regime legal quanto a medidas de reabilitação ou o provimento em vaga nos estabelecimentos civis das forças armadas, quanto às praças referidas no artigo 8º, nº 2.
Verificada a deficiência (com o sentido qualificativo próprio no quadro do Decreto-Lei nº 210/73 e da Portaria nº 619/73), produziam-se então alguns daqueles efeitos, ou ficava o militar em condições de, eventualmente, vir a obter colocação em determinados lugares do pessoal civil; era considerado deficiente ao abrigo do disposto no Decreto-Lei nº 210/73.
Sendo, porém, assim, quanto aos militares relativamente aos quais tivesse sido efectivamente constatada, declarada, a verificação dos pressupostos do Decreto-Lei nº 210/73, do mesmo modo será, por paridade de razão e considerações de igualdade quanto aos que, por razões circunstanciais (13) não foram colocados, ou se colocaram em situação que pressupusesse, ou demandasse semelhante constatação.
Constituindo esta um acto que meramente certificava, declarava a verificação dos pressupostos, existindo estes independentemente dessa declaração, os militares nos quais os referidos pressupostos se reunissem eram (são) considerados deficientes ao abrigo do disposto no Decreto-Lei nº 210/73.
9. Postas estas considerações de ordem geral, é momento de fazer intervir os elementos relativos ao caso concreto referido no processo de consulta.
0 militar em questão (soldado) ficou ferido em consequência do rebentamento de uma granada, que foi considerado em serviço de campanha.
A JHI considerou-o incapaz de todo o serviço militar e apto parcialmente para o trabalho com uma desvalorização de 19%.
Tanto o evento, como os actos de constatação de deficiência e de qualificação como "ferimentos em campanha" ocorreram antes da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 210/73.
Integram-se, não obstante, no âmbito material e temporal de aplicação do diploma, que, nos termos do artigo 17º, se aplica "aos militares que se tenham tornado inválidos pelos motivos indicados no artigo 1º, a partir de 1 de Janeiro de 1961, inclusive".
Verificam-se, assim, numa primeira apreciação os pressupostos necessários para que o militar referido fosse (pudesse ser) considerado deficiente de acordo com o disposto no Decreto-Lei nº 210/73.
Há, porém, que precisar mais detidamente esse vector do problema.
Como se salienta, nenhum dos actos (constatação da deficiência e qualificação de acidente como tendo ocorrido em campanha) foi praticado após a entrada em vigor do diploma referido, e nos termos dos procedimentos regulamentares que pretenderam criar mecanismos normativos de exequibilidade.
Este factor não assume, contudo, no presente caso, interesse relevante.
0 Decreto-Lei nº 210/73, com efeito, aplica-se aos militares deficientes em resultado do acidente ou doença em determinadas circunstâncias.
Não define deficiência, nem o modo como se determina.
A Portaria nº 619/73, por sua vez, no nº 1, considera deficiente para os efeitos daquele diploma, os militares que tenham sofrido desvalorização permanente na capacidade geral de exercício da sua actividade profissional. No caso da consulta, o militar em causa sofreu desvalorização de 19%, que o afectou na capacidade geral, porquanto apenas foi considerado parcialmente apto para o trabalho.
É certo que o mencionado diploma regulamentar nos números 2, 3 e 4, estabelece procedimentos de aplicação do Decreto-Lei nº 210/73, fixando prazos para o exercício dos direitos consignados e determinando que os militares, "logo que esteja concluído o respectivo tratamento" seriam presentes à Junta Hospitalar de Inspecção, que julgaria da sua aptidão para todo o serviço, ou verificaria a desvalorização permanente, informando a Junta, neste caso, da possibilidade de continuação no activo em regime que dispensasse plena validez.
No entanto, todo este sistema estava, como resulta patente, vocacionado apenas para responder às situações em que aos militares deficientes fosse possibilitada a opção pela continuação no activo e não já para os casos em que essa opção não era possível, como acontecia com as praças do Exército, Armada e Força Aérea, referidas no artigo 8º, nº 2.
Quanto a estes militares, relevante seria a constatação de deficiência como reflexo permanente na capacidade geral de trabalho.
No caso presente, a verificação da deficiência foi objecto de anterior deliberação de uma junta Hospitalar, homologada.
Também foi homologada a qualificação do acidente como ocorrido em campanha.
Trata-se assim, de actos definitivos que, na medida do respectivo objecto, definiram elementos fundamentais da relação jurídico-administrativa de que o soldado (...) é um dos titulares e que se desenvolve, também, no âmbito pessoal e material de aplicação do Decreto-Lei nº 210/73.
Estes elementos fundamentais (deficiência física e qualificação do evento) definitivamente estabelecidos, constituem, como se salientou já, os pressupostos de qualificação como deficiente para os efeitos do Decreto-Lei n- 210/73.
10- Retome-se, agora, a disciplina do Decreto-Lei nº 43/76, especialmente o disposto no artigo 18º, nº 1, alínea c).
Aí se determina serem qualificados automaticamente DFA os cidadãos considerados deficientes ao abrigo do disposto no Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio.
Os cidadãos considerados deficientes ao abrigo deste último diploma são os militares relativamente aos quais se verifiquem os pressupostos aludidos, de que dependia, no sistema e para os efeitos consignados, esta qualificação.
Constatada, verificada e declarada a existência desses pressupostos, o militar seria considerado deficiente.
No que respeitava às praças referidas no artigo 8º do diploma, e uma vez que não havia opção a fazer (pela continuação no serviço activo ou pela pensão de invalidez), a constatação dos pressupostos de qualificação ocorreria quando fosse necessário, e sempre que fosse necessário, decidir sobre o acesso a medidas de reabilitação, nos termos do artigo 8º, nº 1, do Decreto-lei nº 210/73, ou sobre a legitimidade para desencadear a pretensão acolhida no nº 3 da mesma disposição.
Fora destas hipóteses, e havendo sido atribuída anteriormente pensão de invalidez (14) , não se configurava necessidade prático-administrativa do acto declarativo ou de constatação da qualidade de deficiente, ao abrigo do Decreto-Lei nº 210/73.
No entanto, essa circunstância não pode obstar a que em qualquer momento em que se revele necessário, seja praticado o acto que declare verificados os pressupostos de que deriva aquela qualificação, declarando, considerando ("considerado") o militar em causa deficiente ao abrigo do disposto no Decreto-Lei nº 210/73 (15) .
Considerado deficiente ao abrigo deste diploma, a qualidade de deficiente das forcas armadas, com o sentido material e conceitual que contém no sistema do Decreto-Lei nº 43/76 ser-lhe-á automaticamente atribuída.
Isto é, a atribuição desta qualidade resulta directa e imediatamente da lei, opera ope legis quanto aos que se encontrarem na situação prevista, nesta medida sem necessidade de qualquer acto administrativo que considere nessa situação os destinatários do preceito (16) .
Reconhece-se, todavia, que considerações decorrentes de imperativos de certeza, podem determinar a conveniência de produzir um acto que declare os interessados em alguma das situações de qualificação automática.
Conquanto não exigido, porque, como se salientou, a qualificação opera por imediato efeito da lei - e um acto semelhante nada acrescentar e apenas declarar a verificação de pressupostos jurídicos e materiais que já existem -, em algumas situações onde os serviços manifestem dúvidas, a certeza da situação jurídica do interessado aconselha a que, através de acto expresso, se declarem verificadas as condições que determinam a qualificação automática, nessa medida se aplicando ao caso concreto o Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro.
11. Reconhecida automaticamente a qualidade de DFA aos cidadãos que se encontram nas situações previstas no artigo 18º, nº 1, do Decreto-Lei nº 43/76, resultando, assim, directamente da lei (mesmo sem qualquer acto que considere nesta situação os destinatários do preceito, ou com a produção de um acto de 'accertamento' nos casos em que necessidades de certeza o aconselhem), os efeitos que produza determinam-se no tempo tendo como referência em princípio, o momento expressa ou implicitamente definido na lei.
No caso do aludido diploma, a partir de 1 de Setembro de 1975, "data a partir da qual terão eficácia os direitos que reconhece aos DFA", segundo o disposto no respectivo artigo 21º (17) .
Uma especificação importa porém apontar a criar alguma restrição aos efeitos que poderiam resultar do entendimento muito ao pé da letra desta afirmação, quando se considerem as situações de deficiência antecipadamente ocorridas.
Com efeito, para além de outros direitos e regalias que apenas podem operar para futuro pela própria natureza que revestem (v.g. a possibilidade de opção pelo serviço activo em serviços que dispensem plena validez), o Decreto-Lei nº 43/76 consigna direitos que, ou pressupõem necessariamente o pedido do interessado sem retroactividade de eficácia (os direitos e regalias enumerados no artigo 14º), ou impõem semelhante pedido, não obstante a afirmação normativa sobre a automaticidade dos efeitos.
Será o caso do disposto no artigo 12º.
Referindo-se no nº 1 desta norma a actualização automática das pensões, designadamente "dos actuais deficientes fixadas independentemente da percentagem de incapacidade", segundo critérios que indica, o nº 4 expressamente determina que "a actualização automática das pensões, abonos e prestações suplementares não dispensa o pedido do interessado, mediante requerimento que deverá dar entrada na Caixa Geral de Aposentações".
Quer dizer, pressupondo (não dispensando) o pedido do interessado, a manifestação de vontade na obtenção do direito à actualização, os efeitos produzir-se-ão apenas a partir do momento em que o titular do direito assim se apresente a exercê-lo, isto é, sem recomposição retroactiva àquele momento temporal a quo dos limites de eficácia previstos, em geral, no texto da lei.
Por paridade de razão, este mesmo princípio valerá quanto à atribuição de abonos ou prestações suplementares.
12. Uma nota final.
0 soldado (...) solicitou, no requerimento apresentado, a revisão do processo, ao abrigo dos nºs 1 e 3 da Portaria nºs 162/76, de 24 de Março e nº 1 da Portaria nº 114/80, de 12 de Março, "a fim de lhe ser reconhecida a qualificação de D.F.A_".
0 modo de enquadramento jurídico da situação apresentada, afasta-se, no entanto, da opção de intervenção processual da figura da revisão, tal como vem prevista no Decreto-Lei nº 43/76 e nos diplomas que, neste ponto, o regulamentaram.
0 artigo 18º, nº 2, do Decreto-Lei nº 43/76, recorde-se, determina a aplicabilidade deste diploma aos cidadãos que, nos termos e pelas causas constantes do nº 2 do artigo 1º, venham a ser reconhecidos DFA após revisão do processo (17) .
A revisão do processo implica, necessariamente, a reapreciação da deficiência do requerente e a qualificação, nos termos e segundo a conceptualização constante dos artigos 1º e 2º do Decreto-Lei nº 43/76, das circunstâncias em que a deficiência foi contraída (18) . Isto é, vale para os casos em que ainda não tenha havido qualificação como deficiente, por ausência dos pressupostos apreciados à luz da disciplina vigente no momento da ocorrência dos factos determinantes.
Diferente é, pois, o âmbito do artigo 18º, nº 1, referente às qualificações automáticas, em que a qualificação está definida em termos materiais, por remissão a situações legalmente tipificadas, antes de qualquer outro /ou novo juízo sobre a verificação de elementos do conceito, apreciados no sistema de novo diploma.
13.Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:
1ª -São considerados deficientes para os efeitos do disposto no Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio e da Portaria 619/73, de 12 de Setembro, os militares que, a partir de 1 de Janeiro de 1961, hajam sofrido desvalorização permanente na capacidade geral de exercício da sua actividade profissional em consequência de acidentes ou doenças resultantes de serviço de campanha, de manutenção da ordem pública ou da prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública;
2ª - A qualidade de deficiente, como pressuposto da produção dos efeitos consignados no Decreto-Lei nº 10/73, de 9 de Maio (opção pela continuação no serviço activo quanto a militares do quadro permanente referidos no artigo 3º, nº 1, ou do complemento referidos no artigo 7º, nº 1, e susceptibilidade de acederem a medidas de reabilitação e de serem nomeados para vagas de lugares civis nos estabelecimentos das forças armadas, quanto às praças referidas no artigo 8, nº 2, daquele diploma), resultava da verificação da incapacidade, e de juízo sobre as circunstâncias em que ocorrera o acidente ou o evento que a determinou;
3ª Considerado um militar deficiente ao abrigo do disposto no Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio, qualifica-se automaticamente como DFA, nos termos do artigo 18º, nº 1, alínea c), do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, produzindo-se os efeitos inerentes à qualificação como DFA no âmbito deste diploma imediatamente e por mero efeito da lei, independentemente de qualquer acto que considere nesta situação os destinatários do preceito;
4ª -Nestes termos, o soldado (...), portador de uma incapacidade geral de 19%, resultante de acidente sofrido em circunstâncias qualificadas como serviço de campanha, deve ser considerado deficiente ao abrigo do Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio;
5ª -Consequentemente, beneficia de qualificação automática como DFA nos termos do artigo 18º, nº 1, alínea c), do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro;
6ª - A actualização de pensões, bem como de abonos, e prestações suplementares, previstos no Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, não dispensa o pedido do interessado, produzindo-se os efeitos respectivos apenas a partir do momento em que o titular do direito assim se apresente a exercê-lo.






(1)Informação complementar produzida na sequência de solicitação sobre o âmbito e finalidade do parecer.
(2)Considerações inscritas no preâmbulo do diploma.
(3) Reconheceu-se no preâmbulo que "as leis promulgadas até 25 de Abril de 1974 não definem de forma completa o conceito de DFA, o que deu lugar a situações contraditórias, como a marginalização dos inválidos da 1ª Grande Guerra e dos combatentes das campanhas ultramarinas, e criou injustiças aos que se deficientaram nas campanhas pós-1961, além de outros".
(4) Militares com posto ou graduação superior a primeiro-cabo no Exército e na Força Aérea e a marinheiro na Armada, que integravam os respectivos quadros permanentes, mutilados em serviço de campanha ou de manutenção da ordem pública, ou em serviço directamente relacionado - artigos 1º, 4º, §2º e artigo 6º do Decreto-Lei nº 44995, de 24 de Abril de 1963 - que foram considerados aptos para serviços condicionados.
(5)As finalidades concretizadas na normação deste diploma de 1963 estão especificadamente enunciadas no respectivo preâmbulo:
"Pela legislação actualmente em vigor, os militares dos quadros permanentes das forças armadas quando, por ferimentos ou acidentes ocorridos em serviço, mesmo tratando-se de serviço de campanha ou de manutenção da ordem pública, ficam diminuídos na sua capacidade física são afastados do serviço activo.
A realidade, porém, é que o desempenho de alguns dos cargos que competem aos militares do activo, por vezes cargos da maior relevância, dispensa plena validez física. Por outro lado, o afastamento da carreira das armas imposto aos militares que, em defesa da Pátria sofreram diminuição de capacidade física, mas que dispõem ainda de validez suficiente para continuarem a desempenhar de forma útil, funções para as quais foram especialmente preparados e às quais dedicaram a sua vida ao escolherem a carreira das armas, é procedimento que não se coaduna com o reconhecimento que a Nação deve àqueles que no cumprimento dos seus deveres militares por ela se sacrificaram.
Torna-se, assim, imperioso, à semelhança do que se verifica nas forças armadas de outros países, permitir que continuem ao serviço activo os militares nas condições referidas, com benefício para o Estado, que, dessa forma, continuará a aproveitar a capacidade e a actividade desses militares, e com benefício para eles próprios, não só material, como moral."
(6)Essencialmente regras sobre promoção, dispensa de cursos, estágios e provas, características das funções a desempenhar pelos militares deficientados que continuam no serviço activo.
(7) Como se referiu, os militares do complemento com o posto ou graduação igual ou superior a primeiro-cabo miliciano do Exército, pessoal militar não permanente da Armada com o posto igual ou superior a marinheiro e da Força Aérea com o posto igual ou superior a primeiro cabo.
(8) Redacção do Decreto-Lei nº 46046, de 27 de Novembro de 1964.
(9) Cfr., Simões de Oliveira, Estatuto da Aposentação. Anotado e Comentado, pág. 259. Cfr., também, a disposição do artigo 141º, nº 1, alínea a) do Estatuto de Aposentação que inclui, entre os diplomas expressamente revogados, o Decreto-Lei nº 45684, de 27 de Abril de 1964.
(10)Qualificação ou consideração como mera qualidade sem autonomia valorativa.
Diversamente ocorre no regime do Decreto-Lei nº 43/76 em que a qualificação assume valor autónomo, conceitual e material, e que, por si só, desencadeia imediata e directamente uma série de efeitos (concessão de benefícios) normativamente determinados - Cfr., v.g. artigo 14º do citado diploma.
(11)Cfr., sobre o assunto, Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, 10ª edição, vol. I, págs. 455 e segs.; Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol. III, ed. polic., págs. 102 e segs.; Zanobini Corso di Diritto Amministrativo, 7ª ed. vol. I. págs. 268 e segs.; Sanduli, Manuale di Diritto Amministrativo, 5ª ed. págs. 350 e segs.; e v. g. os Pareceres deste Conselho nºs 78/77, de 7 de Julho, de 13/5/88 e 125/89 de 13 de Setembro de 1988.
(12) Cfr., Sérvulo Correia, Noções de Direito Administrativo, vol. I, pág. 457.
(13) Nomeadamente quanto às praças referidas no artigo 8º, nº 2 que não necessitaram ou não recorreram à recuperação prevista no artigo 8º, nº 1, ou não solicitaram a colocação em vagas dos lugares civis dos estabelecimentos das forças armadas.
(14) Os pressupostos da atribuição da pensão de invalidez integravam um círculo mais amplo de hipóteses, por referência ao condicionalismo do qual resultava a situação, ou o estado, ou a qualificação de deficiente das forças armadas.
(15)Os elementos do processo apontam no sentido de ainda não ter ocorrido a prática desse acto.
(16)Conquanto sem directa aplicação para a hipótese da consulta, refiram-se a propósito os Pareceres deste Conselho nº 61/80, de 8 de Maio de 1980 e 113/87 de 29 de Abril de 1988.
(17) Rectificações do Decreto-Lei nº 43/76, no Diário do Governo, I Série, nº 37, de 13 de Fevereiro de 1976 e no Diário do Governo, I Série, nº 64, de 16 de Março de 1976.
(17) 0 âmbito da "revisão do processo" está definido pelo nº 1 da Portaria nº 162/76, de 24 de Março, da seguinte redacção:
"Quando no Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro e na presente Portaria constar "revisão do processo", tal expressão, ou similar, significa: elaboração, reabertura, revisão ou simples consulta dos processos, conduzida de forma a por em evidência a percentagem de incapacidade do requerente ou a sua inexistência e as circunstâncias em que foi contraída a deficiência, tendo em vista a aplicação da definição de deficiente das forças armadas (DFA) constante nos artigos 1º e 2º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro".Sobre processo de revisão e princípio do pedido, refira-se, v.g. o Parecer deste Conselho nº 85/85, de 13 de Março de 1986.
(18)A relevância essencial da reapreciação das circunstâncias tem a ver com a ampliação das situações em que o acidente é considerado de modo a permitir a qualificação como DFA, designadamente as situações de "risco agravado equiparável", previstos no artigo 2º, b), final, e definidos no artigo 2º, nº 4 do referido diploma.
Anotações
Legislação: 
DL 43/76 DE 1976/01/20 ART18 N1 C ART1 N2 ART2 N1 B ART18 N2.
DL 210/73 DE 1973/05/09 ART1 ART2 ART3 ART7 ART8 N2.
DL 44995 DE 1963/04/24.
PORT 619/73 DE 1973/09/12.
DL 28404 DE 1937/12/31.
DL 45684 DE 1964/04/27.
EA72 ART127.
PORT 162/76 DE 1976/03/24.
PORT 114/80 DE 1980/03/12.
Referências Complementares: 
DIR ADM * DEFIC FFAA.
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