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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
17/1997, de 04.12.1997
Data do Parecer: 
04-12-1997
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Maioria
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Justiça
Relator: 
ESTEVES REMÉDIO
Descritores e Conclusões
Descritores: 
CONSERVADOR
LIBERDADE DE ESCOLHA DE PROFISSÃO
NOTÁRIO
ACESSO À CARREIRA
AUDITOR DOS REGISTOS E DO NOTARIADO
ESTÁGIO
INGRESSO NA MAGISTRATURA
CENTRO DE ESTUDOS JUDICIÁRIOS
CANDIDATO
AUDITOR DE JUSTIÇA
FUNCIONÁRIO PÚBLICO
AGENTE ADMINISTRATIVO
REQUISIÇÃO
COMISSÃO DE SERVIÇO EXTRAORDINÁRIA
PREVALÊNCIA DE NORMA
DIREITO DE ACESSO À FUNÇÃO PÚBLICA
Conclusões: 
Os auditores dos registos e do notariado são agentes administrativos e, uma vez assumida a qualidade de auditores de justiça, têm direito a frequentar o Centro de Estudos Judiciários em regime de requisição, nos termos do disposto no artigo 44 do Decreto-Lei n 374-A/79, de 10 de Setembro na redacção do Decreto-Lei n 264-A/81, de 3 de Setembro.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Ministro da Justiça,
Excelência:
 
1.
   
(...), no decurso da frequência do estágio nas Conservatórias e Cartórios, tendo sido admitida ao XV Curso Normal de Formação do Centro de Estudos Judiciários, a iniciar em 16 de Setembro de 1996, requereu autorização para o frequentar em regime de requisição, pretensão que lhe foi negada pelo Director-Geral dos Registos e do Notariado ([1]).
 
Posição diversa, sobre esta específica questão, veio, no recurso hierárquico interposto pela interessada, a ser assumida na Auditoria Jurídica do Ministério da Justiça ([2]).
 
Por a «questão da requisição» se afigurar de «duvidosa solução», «atendendo à precariedade do vínculo existente, subordinado à obtenção de aproveitamento no estágio e nas provas do respectivo concurso» e por a situação se poder repetir, sugeriu-se a audição do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República.
 
Tendo esta sugestão obtido o acolhimento de Vossa Excelência, cumpre emitir parecer.
 
 
 
2.
 
 
Comecemos por atentar no teor das posições divergentes referidas.
 
A da Direcção-Geral dos Registos e do Notariado é extractada pela forma seguinte no parecer da Auditoria Jurídica:
 
                         «(...) a problemática interpretativa em questão (...) prende[-se] não só com o artº 44º do Dec-Lei nº 374-A/79, de 10/09 e com o alegado parecer da Procuradoria-Geral da República, publicado no D.R., II Série, nº 101, de 04/05/87, mas também, salvo melhor opinião, necessariamente com a evolução legislativa verificada na legislação geral da Função Pública e no próprio regime especial dos registos e do notariado.
                         5. É que, se por um lado o citado parecer considera que a figura em apreço não é uma requisição porque não tem as respectivas características específicas, mas se trata de um mecanismo legal então criado para possibilitar a frequência de um estágio de formação para ingresso numa carreira da Função Pública, verificamos que a evolução legislativa geral veio a consagrar legalmente esse direito com a criação da figura da comissão de serviço extraordinária, nos termos do nº 1 do artº 24º do Dec-Lei nº 427/89, de 07/12.
                         6. Sucede que a comissão de serviço extraordinária apenas é autorizada a quem tenha o vínculo de funcionário público e não é permitida aos agentes administrativos.
                         7. E bem se compreende que a legislação geral da função pública assim tenha decidido, porque só é agente administrativo quem esteja num estágio de formação para ingresso numa carreira ou quem tenha um vínculo precário com a Administração Pública.
                         8. Parece que o legislador recusou, no regime geral da Função Pública, admitir a instabilidade decorrente da frequência de estágios com interrupção.
                         9. No caso do Sr. Conservador de Alpiarça apenas foi reconhecido que tinha direito à comissão de serviço extraordinária em face do disposto na lei geral, não se reconheceu qualquer direito a requisição, na linha do que tem sido defendido.
                         Daí a nossa profunda divergência de interpretação com a recorrente.
                         10. O caso “sub judice” debate-se ainda com a própria evolução legislativa dos registos e do notariado.
                         10.1. Será que se pode fazer letra morta deste regime específico, nomeadamente dos imperativos estabelecidos no artº 32º do Dec-Lei nº 92/90, de 17/03, na redacção do Dec-Lei nº 238/93, de 03/07, como pretende a recorrente, quando a relação contratual em causa cai na previsão dos nºs 1 e 4 do citado normativo?
                         11. Tendo em conta a evolução legislativa do regime geral da Função Pública e mais concretamente o disposto no nº 1 do artº 24º do Dec-Lei nº 427/89, de 07/12, não será que a figura jurídica prevista no artº 44º do Dec-Lei 374-A/79, de 10/09, na redacção dada pelo Dec-Lei 264-A/81, de 03/09, constitui hoje uma verdadeira comissão de serviço extraordinária, em face dos pressupostos com que foi criado?
                         12. É que se for assim, não é permitida aos agentes administrativos, nos termos do artº 24º do Dec-Lei nº 427/89, de 07/12. Como interpretar então o artº 44º do Estatuto do C.E.J. neste contexto?»
 
 
Por seu turno, na parte pertinente, formulam-se na tomada de posição da Auditoria Jurídica as seguintes conclusões:
 
                         «e) A legislação geral da função pública disciplinadora do instituto da requisição, não obstante conter uma cláusula de prevalência - artº 41º do Dec-Lei nº 41/84, de 03/02 - não revogou o regime de requisição contemplado no artº 44º do Dec-Lei nº 374-A/79, de 10/09, na redacção do Dec-Lei nº 264-A/81, de 03/09.
                         f) A requisição a que se refere esta norma contida no diploma do CEJ não constitui instrumento de mobilidade dos funcionários e agentes da Administração Pública, mas um expediente legislativo para assegurar a concretização de um direito que é legalmente reconhecido a candidatos a auditores de justiça.
                         g) Enquanto tal, essa figura particular de requisição mantém a sua autonomia e existência legal, distinta do instituto de comissão extraordinária de serviço, este restrito na sua aplicação a funcionários.
                         h) À recorrente é reconhecida, em razão da outorga de um contrato administrativo de provimento com a DGRN, a qualidade de agente administrativo não apenas pela lei geral da função pública - artº 14º, nº 2, do Dec-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro - mas também em razão da cláusula 8º daquele contrato e artº 4º do Dec-Lei nº 92/90, de 17 de Março, na redacção do Dec-Lei nº 238/93, de 23 de Julho, “a contrario”.
                         i) A circunstância de o regime especial fixado neste último diploma e por que se rege o contrato administrativo que a recorrente celebrou prever a rescisão contratual desde que o contratado não complete o processo de admissão à carreira de conservador e notário - nº 1 do artº 32º desse diploma - não é impeditivo daquela requisição nem desta resulta, sem mais, tal rescisão contratual.
                         j) Constituindo a requisição prevista no diploma do CEJ um direito dos funcionários ou agentes administrativos, a rescisão contratual, porventura decorrente do exercício desse direito, não deverá ser tida como injustificada.» ([3])
 
 
 
3.
 
 
3.1. O Decreto-Lei nº 519-F2/79, de 29 de Dezembro, aprovou a Lei Orgânica dos Serviços dos Registos e do Notariado, introduzindo, no que importa realçar, alterações significativas no «sector do pessoal»: «procurou-se dignificar a função do conservador e notário reestruturando-se o condicionalismo exigido para o ingresso na respectiva carreira, com instituição de um curso de formação profissional com carácter teórico-prático, cuja frequência é subsidiada» ([4]) ([5]).
 
Na sua versão originária, previa-se em tal diploma que o ingresso na carreira de conservador ou notário seria antecedido da admissão a curso de formação através de testes de aptidão, da frequência de um curso de formação seguido de estágios e da colocação temporária como adjunto de conservador ou notário.
 
 
3.2. Este regime de acesso não chegaria a ser concretizado por virtude de dificuldades de aplicação prática e pelos elevados encargos financeiros que dele despontariam ([6]).
 
Em sua substituição, e com parâmetros definidos pelos Decretos-Leis nºs 71/80 e 449/80 e pelo Regulamento dos Serviços dos Registos e do Notariado (aprovado pelo Decreto Regulamentar nº 55/80, de 8 de Outubro) ([7]), instituiu-se um outro regime, este, sim, levado à prática, com as seguintes notas dominantes: inexistência de testes de aptidão; acesso aos estágios, com a duração total de 18 meses, fundamentalmente com base na classificação obtida na licenciatura em Direito; obrigatoriedade de os adjuntos de conservadores ou notários e adjuntos estagiários concorrerem aos primeiros concursos de habilitação para conservadores e notários que se realizassem após o termo dos estágios; a aprovação nos concursos conferia habilitação para o ingresso na carreira de conservador e notário ([8]).
 
 
3.3. Mais recentemente, o Decreto-Lei nº 92/90, de 17 de Março ([9]), reconhecendo a falta de formação profissional para conservadores e notários e a sua total inexistência para os oficiais dos registos e do notariado ([10]), veio regulamentar a carreira de conservador e notário e a carreira de escriturário dos registos e do notariado.
 
O ingresso na carreira de conservador e notário passa a fazer-se de acordo com um processo de admissão que integra quatro fases: provas escritas de aptidão, curso de extensão universitária ou de formação, estágio e concurso de provas públicas (artigos 2º a 28º).
 
Os auditores aprovados no concurso de provas públicas eram, depois, a requerimento e sob pena de rescisão do contrato ou de cessação da comissão de serviço extraordinária, colocados como adjuntos de conservadores e notários por despacho do director-geral dos Registos e do Notariado (artigo 29º).
 
A definição do estatuto jurídico dos auditores dos registos e do notariado resultava essencialmente do disposto no artigo 4º do Decreto-Lei nº 92/90: admissão por contrato administrativo de provimento com sujeição aos direitos, deveres e incompatibilidades da função pública, sendo-lhes vedado estagiar ou exercer as actividades de solicitador e de advogado; percepção de um subsídio mensal de formação igual a 90% do ordenado correspondente ao escalão de ingresso na 3ª classe pessoal de conservador e notário; os que fossem funcionários ou agentes da Administração Pública frequentavam o curso de extensão universitária ou de formação e o estágio subsequente em regime de comissão de serviço extraordinária, podendo optar pela remuneração do lugar de origem; em caso de exclusão ou desistência, findava automaticamente a comissão de serviço extraordinária destes auditores, que retomavam os seus anteriores cargos ou funções sem perda de antiguidade, salvo se a exclusão ou desistência fossem injustificadas; os auditores podiam inscrever-se nos Serviços Sociais do Ministério da Justiça.
 
 
3.4. O ingresso na carreira de conservador e notário é presentemente regulado pelo Decreto-Lei nº 206/97, de 12 de Agosto, diploma que, assumidamente, passa a «disciplinar (...) toda a matéria relativa ao procedimento de ingresso na carreira de conservador e notário, adaptando-a às normas do Código do Procedimento Administrativo e aproximando-a, na medida do aplicável, do regime geral de recrutamento e selecção de pessoal para a Administração Pública» ([11]).
 
De acordo com o disposto no nº 1 do artigo 3º do Decreto-Lei nº 206/97 (diploma em que, por momentos, nos deteremos), o procedimento de ingresso na carreira de conservador e notário continua a integrar quatro fases:
 
1ª - Provas de aptidão, com utilização de provas de conhecimento (provas escritas sobre matérias  de direito privado relacionadas com os registos e o notariado) e de exame psicológico (artigos 7º a 13º).
 
2ª - Curso de extensão universitária ou de formação, cada um deles com a duração de seis meses (artigos 14º a 18º).
 
Desta e da fase precedente estão dispensados os doutores em Direito (artigo 3º, nº 3).
 
Nesta parte, com a epígrafe «Auditores dos registos e do notariado», o artigo 17º estabelece:
 
                         «1 - Os candidatos admitidos ao curso de extensão universitária ou de formação e ao estágio subsequente são considerados auditores dos registos e do notariado.
                         2 - Os auditores são admitidos por contrato administrativo de provimento e estão sujeitos aos direitos, deveres e incompatibilidades dos conservadores e notários, sendo-lhes vedado exercer actividades de advogado ou de solicitador ou frequentar os respectivos estágios.
                         3 - Os auditores recebem um subsídio mensal de formação igual a 90% do ordenado correspondente ao escalão de ingresso na 3ª classe do grupo de pessoal da carreira de conservador e notário.
                         4 - Os auditores que sejam funcionários da Administração Pública frequentam o curso de extensão universitária ou o curso de formação e o estágio subsequente em regime de comissão de serviço extraordinária e podem optar pela remuneração do lugar de origem.
                         5 - Em caso de exclusão ou de desistência, finda automaticamente a comissão de serviço extraordinária dos auditores, retomando estes os seus anteriores cargos ou funções.
                         6 - Os auditores podem inscrever-se nos Serviços Sociais do Ministério da Justiça se não forem beneficiários de outro sistema de segurança social.»
 
 
3ª - Estágio, com a duração de 12 meses, sob orientação de conservadores e notários formadores. O estágio «visa proporcionar uma formação adequada, em especial de carácter prático, ao exercício das funções de conservadores e notários»; durante o estágio, os auditores «executam as tarefas que lhes forem distribuídas e procedem ao estudo das questões de natureza teórica que lhes forem indicadas pelo formador» (cfr. artigo 19º e segs.).
 
4ª - Provas finais (escritas e orais) destinadas a apreciar, em especial, a preparação e a capacidade dos candidatos para o exercício das funções de conservador e notário e a permitir a graduação do mérito relativo dos concorrentes (artigo 26º e segs.).
 
Todas as fases são eliminatórias (artigo 3º, nº 2), havendo entre elas uma relação de precedência, porquanto a passagem à fase seguinte pressupõe a existência de aproveitamento na fase que a antecede e é condicionada pelos níveis de aproveitamento e pelas notações atribuídos aos auditores (v. artigos 8º, nº 1, 9º, nºs 1 e 2, 11º, nº 1, 19º, nº 1, 24º e 33º).
 
 
 
4.
 
 
O regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública é definido pelo Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro.
 
Nos termos deste diploma, a relação jurídica de emprego na Administração Pública constitui-se por nomeação e por contrato de pessoal (artigo 3º) ([12]).
 
O contrato de pessoal está reservado para «situações específicas claramente definidas, com características de excepcionalidade e transitoriedade» ([13]) e só pode revestir as modalidades de contrato administrativo de provimento e de contrato de trabalho a termo certo (artigo 14º, nº 1, do Decreto-Lei nº 427/89).
 
Na definição do nº 1 do artigo 15º, o contrato administrativo de provimento é o «acordo bilateral pelo qual uma pessoa não integrada nos quadros assegura, a título transitório e com carácter de subordinação, o exercício de funções próprias do serviço público, com sujeição ao regime jurídico de função pública»; é celebrado nos casos logo expressamente referidos no nº 2, designadamente, com vista à «frequência de estágio de ingresso na carreira» [alínea c)].
 
Os auditores dos registos e do notariado são, de acordo com o disposto no nº 2 do artigo 17º do Decreto-Lei nº 206/97, admitidos por contrato administrativo de provimento e estão sujeitos aos direitos, deveres e incompatibilidades dos conservadores e notários, sendo-lhes vedado exercer actividades de advogado ou de solicitador ou frequentar os respectivos estágios. Encontram-se, aliás, numa das situações (frequência de estágio) tipificadas na lei para a celebração daquele tipo de contrato [cfr. artigo 15º, nº 2, alínea c), do Decreto-Lei nº 427/89].
 
Nos termos do artigo 14º, nºs 2 e 3, deste diploma, ao contrário do que acontece com o contrato de trabalho a termo certo, o contrato administrativo de provimento «confere ao particular outorgante a qualidade de agente administrativo».
 
Logo, os auditores dos registos e do notariado são agentes administrativos.
 
A esta mesma conclusão, agora alcançada por forma silogística e com uma linearidade resultante da própria lei, se chegou, num contexto jurídico diverso, sobretudo mais fluido e impreciso, por uma via bem mais densa e laboriosa, no parecer nº 127/83 ([14]). Neste parecer houve necessidade de proceder à delimitação dos conceitos de funcionário público e de agente administrativo (o que é feito com abundante recurso às doutrinas nacional e estrangeira), de analisar a natureza do estágio e o estatuto jurídico dos então adjuntos estagiários dos serviços dos registos e do notariado, para, a final, se concluir pela forma seguinte:
 
                 «1º - Os adjuntos estagiários dos serviços dos registos e do notariado, embora não sendo funcionários públicos, têm a qualidade de agentes administrativos, uma vez que o serviço prestado à Administração é executado sob a direcção e disciplina dos respectivos órgãos;
 
                 2º - Os adjuntos estagiários têm direito ao subsídio de alimentação, abono de família, subsídios de Natal e de férias, diuturnidades, nos termos da lei, devendo ser inscritos na Caixa Geral de Aposentações, Montepio dos Servidores do Estado e assistência na tuberculose (A.F.C.T.), procedendo aos descontos correspondentes.»
 
Assentemos, portanto, em que o auditores dos registos e do notariado são agentes administrativos.
 
 
 
5.
 
 
O Decreto-Lei nº 374-A/79, de 10 de Setembro ([15]), criou o Centro de Estudos Judiciários (doravante CEJ), primacialmente destinado à formação profissional de magistrados judiciais e de magistrados do Ministério Público (artigo 1º, nº 2); a formação profissional de magistrados compreende actividades de formação inicial (a que aludiremos), e actividades de formação complementar e de formação permanente (estas sem relevância para a economia do parecer) (artigo 25º).
 
Por regra, o ingresso no CEJ depende da graduação dos candidatos em testes de aptidão.
 
São admitidos sem necessidade da graduação em testes de aptidão os doutores em Direito.
 
São dispensados da fase escrita dos testes de aptidão (a) os advogados com, pelo menos, sete anos de actividade profissional e informação favorável da Ordem dos Advogados; (b) os conservadores e notários com, pelo menos, sete anos de actividade profissional e classificação de serviço não inferior a Bom; (c) os oficiais de justiça que, à data da apresentação da candidatura, sejam licenciados em Direito e naquela carreira tenham 10 anos de serviço e classificação de Muito Bom; os candidatos referidos nas alíneas precedentes não podem, no conjunto, exceder um quinto do número de vagas, distribuídas em igual proporção pelas diferentes categorias representadas, preferindo, dentro de cada uma delas, os melhores graduados nos testes e, em caso de igualdade, sucessivamente, os mais antigos na respectiva profissão e os mais velhos (artigo 28º, nºs 1 a 4, do Decreto-Lei nº 374-A/79).
 
Se o regime de dispensa total dos testes de aptidão, agora restrito aos doutores em Direito, visa incentivar o ingresso na magistratura de candidatos habilitados com um grau académico superior, o regime de dispensa parcial facilita o recrutamento de magistrados em profissões jurídicas e filia-se na presunção de preparação técnica derivada do exercício profissional ([16]).
 
O processo de candidatura e o desenvolvimento dos testes de aptidão culminam com a graduação, de entre os aptos, de tantos candidatos quantas as vagas totais disponíveis (cfr. os artigos 30º a 40º).
 
Os candidatos admitidos frequentam o CEJ com o estatuto de auditor de justiça (artigo 41º).
 
O período de formação inicial de magistrados compreende três fases sucessivas:
 
1ª - um  período de actividades  teórico-práticas com o conteúdo constante do artigo 46º;
 
2ª - um estágio de iniciação, a realizar junto dos tribunais judiciais sob a direcção e responsabilidade do magistrado encarregado do estágio, que compreende a participação dos auditores na actividade judiciária, em acções complementares de formação e em acções de síntese (artigos 49º a 51º);
 
3ª - um estágio de  pré-afectação,  durante o qual «os estagiários exercem, sob responsabilidade própria mas com a assistência de magistrados, funções inerentes à respectiva magistratura» (artigos 55º e 56º, nº 1).
 
 
O período de actividades teórico-práticas tem início no dia 15 de Setembro subsequente à data da abertura do concurso de ingresso e termina no dia 15 de Julho seguinte (artigo 46º, nº 1); o estágio de iniciação começa no dia 15 de Setembro subsequente ao termo do período de actividades teórico-práticas e termina no dia 15 de Julho seguinte (artigo 49º, nº 5); e o estágio de pré-afectação começa no dia 15 de Setembro subsequente ao termo do estágio de iniciação e termina no dia 31 de Maio seguinte (artigo 55º, nº 1, todos do Decreto-Lei nº 374-A/79).
 
As actividades de formação inicial suspendem-se durante as férias judiciais (artigos 26º do Decreto-Lei nº 374-A/79 e 10º da Lei nº 38/87, de 23 de Dezembro) ([17]).
 
 
 
6.
 
 
Conhecidos os regimes jurídicos de ingresso nas carreiras de conservador e notário, por um lado, e nas da magistratura, por outro, é altura de ponderar a questão da possibilidade de frequência do curso de formação de magistrados do CEJ, em regime de requisição, por parte de auditores dos registos e do notariado em fase de estágio.
 
 
6.1. Integrado no Capítulo II (Formação inicial), Secção II (Frequência), o artigo 44º do Decreto-Lei nº 374-A/79, sob a epígrafe «Funcionários e agentes do Estado», estabelece:
 
                         «1 - Os candidatos que sejam funcionários ou agentes do Estado, administrativos, de institutos públicos ou de empresas públicas têm direito a frequentar o Centro de Estudos Judiciários em regime de requisição e a optar, neste caso, pelas remunerações relativas à categoria de origem.
                         2 - Em caso de exclusão ou desistência justificada, os auditores de justiça que se encontrem na situação prevista no número anterior retomam os seus cargos ou funções sem perda de antiguidade; se a desistência for injustificada, o tempo de frequência é descontado na antiguidade relativa ao cargo.» ([18]) ([19])
 
Face ao disposto no nº 1, interessa começar por acentuar a parificação existente entre o regime de frequência do CEJ por candidatos que sejam quer funcionários quer agentes do Estado: têm, uns e outros, direito a frequentá-lo em regime de requisição.
 
 
6.2. No domínio do direito da função pública, e na vigência do Decreto-Lei nº 41/84, de 3 de Fevereiro (diploma que simplifica o processo de apresentação e apreciação de diplomas relacionados com estruturas orgânicas e quadros de pessoal e aprova instrumentos de mobilidade nos serviços da Administração Pública), JOÃO ALFAIA, a partir do seu artigo 25º, definia a requisição como o «preenchimento, de carácter voluntário ou obrigatório e sempre temporário, de um lugar de outro organismo, de categoria igual ou superior ao lugar de origem (que fica cativo) por parte do funcionário ou agente que vai desempenhar, no departamento utilizador, uma tarefa excepcional que não pode ser realizada pelo pessoal deste, sendo tal preenchimento da competência do membro ou membros do Governo interessados» ([20]).
 
O artigo 25º do Decreto-Lei nº 41/84 foi revogado pelo artigo 45º do Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro ([21]) - diploma que agora define o regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública.
 
O capítulo III do Decreto-Lei nº 427/89 contém normas sobre a modificação de tal relação jurídica - quer a título provisório (nomeação em substituição, comissão de serviço extraordinária, requisição e destacamento) quer com carácter de permanência (transferência e permuta).
 
Interessa ao desenvolvimento do parecer conhecer e analisar o teor dos artigos 24º (comissão de serviço extraordinária) e 27º (requisição e destacamento) do Decreto-Lei nº 427/89:
 
 
«Artigo 24º
Comissão de serviço extraordinária
 
                         1 - A comissão de serviço extraordinária consiste na nomeação do funcionário para a prestação, por tempo determinado, do serviço legalmente considerado estágio de ingresso na carreira.
                         2 - A comissão de serviço extraordinária é igualmente aplicável ao serviço prestado pelos funcionários nos serviços em regime de instalação.
                         3 - A comissão de serviço extraordinária tem a duração do estágio ou do regime de instalação, consoante os casos, e, no caso dos estagiários aprovados no estágio para os quais existam vagas, considera-se automaticamente prorrogada até à data da aceitação da nomeação.
                         4 - A comissão de serviço extraordinária para a realização do estágio não carece de autorização do dirigente do serviço de origem do nomeado.
                         5 - Durante a comissão de serviço extraordinária para a realização do estágio o nomeado tem direito à remuneração devida aos estagiários, com a faculdade de optar pela remuneração correspondente ao cargo de origem.»
 
 
É possível destacar do regime da comissão de serviço extraordinária os seguintes elementos:
 
a) aplica-se à prestação do serviço legalmente considerado estágio de ingresso na carreira e ao prestado nos serviços em regime de instalação;
 
b) tem, face a este campo de aplicação, a duração do estágio ou do regime de instalação;
 
c) quando destinada à realização do estágio não carece de autorização do dirigente do serviço de origem do nomeado;
 
d) face ao teor literal deste preceito, a comissão de serviço extraordinária só é, em princípio, aplicável a funcionários e já não a agentes administrativos, «pressupondo a detenção daquela qualidade antes da efectivação do estágio de ingresso na carreira ou do início de funções no serviço em regime de instalação» ([22]).
 
 
«Artigo 27º
Requisição e destacamento
 
                         1 - Entende-se por requisição e destacamento o exercício de funções a título transitório em serviço ou organismo diferente daquele a que pertence o funcionário ou agente, sem ocupação do lugar do quadro, sendo os encargos suportados pelo serviço do destino, no caso da requisição, e pelo serviço de origem no caso do destacamento.
                         2 - A requisição e o destacamento fazem-se para a categoria que o funcionário ou agente já detém.
                         3- A requisição e o destacamento fazem-se por períodos até um ano, prorrogáveis até ao limite de três anos.
                         4 - Decorrido o prazo previsto no número anterior, o funcionário ou agente regressa obrigatoriamente ao serviço de origem, não podendo ser requisitado ou destacado para o mesmo serviço durante o prazo de um ano.
                         5 - A requisição e o destacamento não têm limite de duração nos casos em que, de acordo com a lei, as funções só possam ser exercidas naqueles regimes.
                         6 - À requisição e ao destacamento é aplicável o disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 25º.» ([23])
 
 
Face ao disposto no citado nº 1 do artigo 27º, pode agora definir-se a requisição como o exercício de funções a título transitório em serviço ou organismo diferente daquele a que pertence o funcionário ou agente, sem ocupação de lugar do quadro, sendo os encargos dela resultantes suportados pelo serviço do destino.
 
A requisição apresenta os seguintes traços característicos:
 
a) é um instrumento de mobilidade, na medida em que implica a existência de comunicabilidade entre departamentos diversos;
 
b) traduz-se no exercício transitório de funções;
 
c) tem, portanto, carácter transitório, excepto se as funções de destino só puderem ser exercidas em regime de requisição;
 
d) não origina a ocupação de lugar do quadro no serviço de destino, nem a abertura de vaga no serviço de origem;
 
e) faz-se a requerimento do visado ou por conveniência da Administração devidamente fundamentada e com acordo do interessado, no caso de se fazer para fora do município de origem.
 
A partir da data da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro, de acordo com o disposto no nº 1 do seu artigo 43º (epigrafado de «Prevalência»), «é vedada aos serviços e organismos referidos no artigo 2º a constituição de relações de emprego com carácter subordinado por forma diferente das previstas no presente diploma» ([24]); por outras palavras, «não é legalmente possível constituir relações jurídicas de emprego das quais resulte para o particular uma obrigação de exercer uma actividade ao serviço da Administração com subordinação jurídica a esta, isto é, relações jurídicas que não resultem de nomeação ou de contrato de pessoal nas modalidades de contrato administrativo de provimento e de contrato de trabalho a termo certo» ([25]).
 
 
6.3. Não obstante a identidade terminológica não se enquadra no regime jurídico da requisição prevista no Decreto-Lei nº 427/89, a requisição prevista no artigo 44º do Decreto-Lei nº 374-A/79.
 
Nem a prevalência a que se refere o artigo 43º do primeiro diploma afasta a aplicação do regime previsto no artigo 44º do segundo.
 
Vejamos porquê ([26]).
 
O regime de requisição a que se refere o artigo 44º do Decreto-Lei nº 374-A/79 não é um instrumento de mobilidade, mas um instrumento destinado a permitir que os funcionários e agentes naquele artigo referidos possam adquirir a formação necessária ao seu ingresso na magistratura.
 
A frequência do CEJ para este efeito é um direito do funcionário ou agente e não se resolve num puro interesse da Administração em fazer deslocar pessoal para assegurar o exercício de tarefas excepcionais em serviços que não tenham pessoal adequado suficiente.
 
É certo que à Administração também interessa que ingressem na magistratura pessoas com experiência profissional no exercício de actividades jurídicas e que é essa a razão de política legislativa que comanda as soluções dos artigos 28º e 44º do Decreto-Lei 374-A/79. Mas interpõe-se um período de formação especializada entre a admissão e a nomeação, que é a frequência do CEJ, complementada com os estágios.
 
Quando o candidato é nomeado não se destina a assegurar o exercício transitório de tarefas excepcionais, mas o exercício definitivo de tarefas normais da função, onde é suposto existir pessoal adequado, embora por vezes insuficiente.
 
Em suma: não há identidade entre o regime de requisição do artigo 44º do Decreto-Lei nº 374-A/79 e o conceito legal geral constante, antes, do artigo 25º do Decreto-Lei nº 41/84, agora, do artigo 27º do Decreto-Lei nº 427/89, quanto aos respectivos fins e aos interesses que um e outro prosseguem, sem embargo de existirem alguns traços comuns, como a cativação do lugar de origem, a garantia dos direitos e regalias dos funcionários ou agentes requisitados e a opção pelo estatuto remuneratório do lugar de origem.
 
A lei não diz, com efeito, que os candidatos referidos no artigo 44º do Decreto-Lei nº 374-A/79 (que, aliás, têm de possuir as condições gerais de ingresso no CEJ referidas no artigo 29º) devam ser requisitados aos respectivos serviços. Diz que «têm direito a frequentar o Centro de Estudos Judiciários em regime de requisição», frase que não pode deixar de ser intencional, pois nunca a requisição foi, entre nós, tanto anteriormente como depois daquele diploma, analisada como um direito do funcionário ou agente, embora possa corresponder ao seu interesse.
 
Da distinção que pode fazer-se entre o conceito legal geral de requisição, constante do Decreto-Lei nº 427/89 e o conceito, digamos especial, do artigo 44º do Decreto-Lei nº 374-A/79, segue-se que um e outro têm diferentes campos de aplicação, obedecendo a teleologias também distintas: o primeiro, constitui um instrumento de mobilidade dos funcionários e agentes da Administração; o segundo, é um expediente legislativo para assegurar a concretização de um direito de candidatos a auditores de justiça, em cuja qualidade são sujeitos a um programa de formação profissional, que é condição do seu futuro recrutamento como magistrados judiciais ou do Ministério Público.
 
A diferença entre os campos de aplicação dos dois conceitos repercute-se no funcionamento da cláusula de prevalência, constante, primeiro, do artigo 41º, nº 1, do Decreto-Lei nº 41/84, e, agora, do artigo 43º, nº 1, do Decreto-Lei nº 427/89: não seria lógico nem faria sentido que esta cláusula, relacionada, como está, com o conceito geral de requisição, aspirasse a aplicar-se também a um conceito específico ou particular de requisição, cuja diferença instrumental nítida julgamos ter posto em destaque.
 
Logo, quando no nº 1 do artigo 41º do Decreto-Lei nº 41/84 se estabelecia que o disposto em tal diploma «prevalece sobre todas e quaisquer disposições gerais ou especiais relativas às matérias» nele reguladas e quando, agora, no nº 1 do artigo 43º do Decreto-Lei nº 427/89, se veda «a constituição de relações de emprego com carácter subordinado por forma diferente das previstas no presente diploma», não se pretendeu nem se está a pretender revogar uma disposição como a do artigo 44º do Decreto-Lei nº 374-A/79.
 
Em primeiro lugar, porque, não sendo o regime de requisição deste artigo um instrumento de mobilidade dos previstos no Decreto-Lei nº  427/89, não pode falar-se de «relações de emprego (...) previstas no presente diploma».
 
Em segundo lugar, prevalência não é o mesmo que revogação. Quer o Decreto-Lei nº 41/84, quer o Decreto-Lei nº 427/89, quer os diplomas que os antecederam contêm sempre, a par da cláusula de prevalência, disposições revogatórias.
 
Depois, quando o legislador quis pôr termo a uma situação paralela fê-lo por forma clara e inequívoca: referimo-nos ao estatuto jurídico dos próprios auditores dos registos e do notariado. Na versão originária, o Decreto-Lei nº 92/90, de 17 de Março, estabelecia no nº 4 do artigo 4º que os auditores dos registos e do notariado «que sejam funcionários ou agentes da Administração Pública frequentam o curso de extensão universitária ou o curso de formação e o estágio subsequente em regime de requisição, sem dependência de qualquer autorização e podem optar pela remuneração do lugar de origem»; quer o Decreto-Lei nº 238/93, de 3 de Julho (que alterou a disposição citada), quer o nº 4 do artigo 17º do Decreto-Lei nº 206/97, de 12 de Agosto (diploma que, como vimos, regula agora o procedimento de ingresso na carreira de conservador e notário) vieram estabelecer que aquela frequência é feita «em regime de comissão de serviço extraordinária», com possibilidade de opção pela remuneração do lugar de origem.
 
Por último, o entendimento exposto acaba por ser confirmado pela evolução legislativa, mediante a manutenção pelo artigo 57º da Proposta de Lei nº 139/VII, nesta parte sem alterações de relevo, do disposto no artigo 44º do Decreto-Lei nº 374-A/79.
 
 
6.4. Importa, para terminar, explicitar o fundamento material da opção legislativa em vigor.
 
A frequência do CEJ em regime de requisição pelos candidatos que sejam funcionários ou agentes do Estado, administrativos, de institutos públicos ou de empresas públicas terá ocorrido ao legislador, afirma-se ainda no parecer nº 4/87 do Conselho Consultivo, «como a solução mais adequada para criar condições incentivadoras das respectivas candidaturas às futuras nomeações nas carreiras da magistratura». E justifica-se:
 
                         «Na medida em que tal solução não prejudicaria direitos e regalias dos funcionários e agentes, inerentes aos lugares de origem, aos quais podiam regressar sem perda de antiguidade em caso de exclusão ou desistência justificada, ela revelar-se-ia apta para estimular eventuais candidatos com as qualidades que a lei presume e que, uma vez confirmadas, permitiriam a concretização de um modo alternativo de recrutamento com efeitos benéficos para a administração da justiça.
                         Sem essa solução dificilmente se atrairiam à frequência dos cursos candidatos já vinculados à função pública, pois não poderia razoavelmente esperar-se que se dispusessem a sacrificar as respectivas carreiras perante riscos, não desprezíveis, de insucesso, inerentes à obtenção das condições de colocação definitiva em lugares de magistratura.»
 
 
A par desta dimensão objectiva ou funcional, um outro conjunto de razões, agora numa dimensão subjectiva, justifica a viabilização do acesso à magistratura de quem já se encontre vinculado à Administração: «o facto de alguém já se encontrar vinculado à Administração Pública - afirmou-se no parecer nº 40/86 do Conselho Consultivo ([27]) - não pode ser motivo de preclusão do direito de querer aceder a lugar superior ou de diferente carreira».
 
Esta ideia, também acentuada pelo Conselho no citado parecer nº 4/87, está ligada ao princípio da liberdade de candidatura consagrado, no âmbito do recrutamento e selecção de pessoal na função pública, na alínea a) do nº 1 do artigo 5º do Decreto-Lei nº 498/88, de 30 de Dezembro, e constitui uma concretização da liberdade de escolha de profissão e do direito de acesso à função pública, consagrados no artigo 47º da Constituição, que dispõe o seguinte:
 
                         «1. Todos têm o direito de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho, salvas as restrições legais impostas pelo interesse colectivo ou inerentes à sua própria capacidade.
                         2. Todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso.»
 
 
O direito de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho e o direito de acesso à função pública são direitos fundamentais de natureza pessoal, que beneficiam do regime jurídico consagrado no artigo 18º da Constituição para os direitos, liberdades e garantias - designadamente, os preceitos que os consagram são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas ([28]).
 
A liberdade de escolha da profissão está sob reserva de lei restritiva (artigos 47º, nº 1, e 18º, nº 2, da Constituição), dependendo a liberdade de conformação do legislador do nível ou momento em que a restrição se verificar. «Assim: a liberdade de escolha propriamente dita só comporta, em geral, as restrições decorrentes da colisão com outros direitos fundamentais; a entrada ou ingresso admite limites mais intensos, podendo a lei estabelecer certos pressupostos subjectivos condicionadores do direito de escolha (ex.: prova de qualificação profissional, provas de concurso, idade mínima, etc.); o exercício da profissão pode estar sujeito a limites ainda mais intensos, principalmente quando da regulamentação do exercício não resultam quaisquer efeitos sobre a liberdade de escolha (ex.: estabelecimento de horário obrigatório). A consideração separada destes três momentos fundamentais não exclui a consideração materialmente unitária do direito e escolha (...).» ([29])
 
O direito de acesso à função pública, consagrado no nº 2 do artigo 47º da Constituição compreende três elementos:
 
1º - o direito à função pública, não podendo nenhum cidadão ser excluído da possibilidade de acesso, seja à função pública em geral, seja a uma determinada função em particular, por outros motivos que não a falta dos requisitos adequados à função (v.g., idade, habilitações académicas e profissionais);
 
2º - a regra da igualdade e da liberdade, não podendo haver discriminações nem diferenciações de tratamento baseados em factores irrelevantes, nem, por outro lado, regimes de constrição atentatórios da liberdade;
 
3º - a regra do concurso, enquanto forma normal de provimento de lugares, desde logo de ingresso, devendo haver justificação bastante para os casos de provimento de lugares sem concurso ([30]).
 
Em suma, a conclusão alcançada sobre o sentido da interpretação do artigo 44º do Decreto-Lei nº 374-A/79, de 10 de Setembro, mostra-se conforme o melhor entendimento e desenvolvimento da liberdade de escolha de profissão e do direito de acesso à função pública.
 
 
 
7.
 
 
Em face do exposto, formula-se a seguinte conclusão:
 
                         Os auditores dos registos e do notariado são agentes administrativos e, uma vez assumida a qualidade de auditores de justiça, têm direito a frequentar o Centro de Estudos Judiciários em regime de requisição, nos termos do disposto no artigo 44º do Decreto-Lei nº 374-A/79, de 10 de Setembro, na redacção do Decreto-Lei nº 264-A/81, de 3 de Setembro.
 
  VOTOS

(Fernando João Ferreira Ramos) - Vencido pelas razões constantes do voto do meu Exmº Colega Dr. Hneriques Gaspar.
 
  (António Silva Henriques Gaspar) - Vencido quanto à conclusão, pelos motivos que sucintamente exponho:

- A qualificação de agente administrativo, utilizada no artigo 44º, nº 1, do Decreto–Lei nº 374-A/79, de 10 de Setembro, que possibilita a frequência do CEJ em regime de requisição, pressupõe, em meu entender, uma situação de origem certa, sem sujeição a condição, que permita, verificado o respectivo condicionalismo, a efectividade prática e jurídica das consequências do regime de requisição nos casos de desistência injustificada.

Nesta conformidade, não pode nem deve ser esquecido o conteúdo da noção de agente administrativo, que terá sido certamente a fonte do legislador no momento em que foi aprovado o referido diploma.

Não satisfaz, por isso, tais exigências, uma situação não apenas precária, como manifestamente sub conditione, como aquela em que se encontram os auditores dos registos e do notariado.

Se fosse, porventura, admitida a frequência, como aceita o parecer, não poderiam, jurídica e praticamente, funcionar em caso de desistência as garantias de retoma da situação de origem que estão essencialmente na base da previsão e frequência em regime de requisição.

As consequências - prática e juridicamente inultrapassáveis - de efectivação do essencial do regime em caso de desistência, constituem, a meu ver, uma referência e um sintoma revelador de que não pode ser aceite a aparente lógica, muito tributária da pura letra da lei, que sustenta a solução que fez vencimento.


 
________________________________ 

        ([1]) Despacho de 30 de Setembro de 1996.
        ([2]) Informação de 5 de Fevereiro de 1997 de um Assessor Jurídico Principal, que obteve a concordância do Auditor Jurídico.
        ([3]) Como resulta do seu próprio teor, as transcrições reportam-se a peças constantes do recurso hierárquico interposto por (...) do despacho do Director-Geral dos Registos e do Notariado, de 30 de Setembro de 1996, que indeferiu o seu pedido de frequência do CEJ em regime de requisição e determinou a reposição de remunerações auferidas, por considerar injustificado o não completamento do processo de admissão à carreira de conservador e notário. Por despacho ministerial de 7 de Março de 1997, foi revogado o acto recorrido no que respeita a esta 2ª questão, considerando-se justificado o não completamento do processo de admissão, e, quanto à 1ª, a questão da requisição, determinou-se, como referimos em 1, a audição do Conselho Consultivo.
        ([4]) Do preâmbulo.
        ([5]) O Decreto-Lei nº 519-F2/79 tem sido objecto de numerosas alterações: cfr. os Decretos-Leis nºs 71/80, de 15 de Abril, 449/80, de 7 de Outubro, 145/85, de 8 de Maio, 66/88, de 1 de Março, 52/89, de 22 de Fevereiro, 92/90, de 17 de Março, 312/90, de 2 de Outubro, 131/91, de 2 de Abril, 300/93, de 31 de Agosto, 131/95, de 6 de Junho, 256/95, de 30 de Setembro, e 254/96, de 26 de Dezembro.
        ([6]) Preâmbulo do Decreto-Lei nº 71/80.
        ([7]) Este Regulamento veio a ser alterado pelos Decretos-Leis nºs  145/85, de 8 de Maio, 92/90, de 17 de Março, 131/95, de 6 de Junho, e 256/95, de 30 de Setembro.
        ([8]) Cfr. o parecer nº 127/83 do Conselho Consultivo (Diário da República, II Série, nº 20, de 24 de Janeiro de 1984; homologado por despacho do Ministro da Justiça de 31 de Outubro de 1983).
        ([9]) Diploma já referido na nota 5, posteriormente alterado pelos Decretos-Leis nºs 238/93, de 3 de Julho, 256/95, de 30 de Setembro, e 205/97, de 12 de Agosto.
        ([10]) Cfr. o respectivo preâmbulo, que filia a revisão destas matérias também na circunstância de o acórdão nº 53/88, do Tribunal Constitucional (Diário da República, I Série, nº 73, de 28 de Março de 1988; Boletim do Ministério da Justiça, nº 375, p. 115; e Anuário da Administração Pública, ano VI, tomo I, 1988, p. 308) ter declarado inconstitucional, com força obrigatória geral, por violação do princípio da igualdade de acesso à função pública, consagrado no artigo 47º da Constituição, a norma da alínea b) do nº 1 do artigo 113º do Regulamento dos Serviços dos Registos e do Notariado, que estabelecia, no acesso à respectiva carreira, uma preferência legal para o preenchimento das vagas de escriturário.
        ([11]) Do preâmbulo.
        ([12]) Sobre os modos de provimento dos agentes administrativos em geral, embora num quadro jurídico diverso, v. MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, vol. II, 9ª edição (Reimpressão), revista e actualizada por Diogo Freitas do Amaral, Coimbra, Almedina, 1980, p. 654 e segs.
        ([13]) Do preâmbulo.
        ([14]) Já referido na nota 8.
        ([15]) O Decreto-Lei nº 374-A/79 foi objecto de rectificações no Diário da República, I Série, nº 240, de 17 de Outubro de 1979, e, foi, posteriormente, alterado pelos Decretos-Leis nºs 264-A/81, de 3 de Setembro, 146-A/84, de 9 de Maio, 144/85, de 8 de Maio, 404/88, de 9 de Novembro, 83/89, de 23 de Março, 23/92, de 21 de Fevereiro, e 395/93, de 24 de Novembro.
        ([16]) Cfr. o preâmbulo dos Decretos-Leis nºs 374-A/79 e 395/93.
        ([17]) O enquadramento normativo do CEJ está, neste momento, em vias de ser revisto, face à pendência na Assembleia da República da Proposta de Lei nº 139/VII.
        Relativamente às matérias acabadas de referir, merecem uma referência tópica os seguintes aspectos da Proposta de Lei:
          - O ingresso no CEJ efectuar-se-á por duas vias - a dos simples licenciados em direito e a dos assessores dos tribunais judiciais (estes isentos da fase escrita dos testes de aptidão);
          - Obrigatoriedade  de  sujeição  de  todos  os  candidatos  a  exame  psicológico eliminatório, a ter lugar entre a fase escrita e a fase oral dos testes de aptidão;
          - Desvalorização da fase escrita dos testes, que, para os a ela obrigados, constituirá condição de passagem à fase oral  e factor de desempate em caso de igualdade de notação;
          - A formação inicial passa a compreender uma fase teórico-prática (com a duração de vinte e dois meses, desdobrados em três ciclos, o 1º e 3º na sede do CEJ, o 2º, com a duração de um ano, nos tribunais, «sob orientação de magistrados judiciais e de magistrados do Ministério Público, por iguais períodos de tempo») e uma fase de estágio, correspondente ao agora designado regime de pré-afectação, com a duração de dez meses, em que os auditores, já nomeados juizes de direito ou delegados do procurador da República, exercem a sua actividade sob responsabilidade própria, mas assistidos por magistrados formadores.
        ([18]) Redacção do artigo 1º do Decreto-Lei nº 264-A/81.
        ([19]) A Proposta de Lei nº 139/VII estabelece no artigo 57º, epigrafado também de «Funcionários e agentes do Estado»:
                    «1. Os candidatos que sejam funcionários ou agentes do Estado, de institutos públicos ou de empresas públicas têm direito a frequentar o CEJ em regime de requisição e a optar, neste caso, pelas remunerações relativas à categoria de origem.
                    2. Em caso de exclusão ou de desistência justificada, os auditores de justiça que se encontram na situação prevista no número anterior retomam os seus cargos ou funções sem perda de antiguidade; se a desistência for injustificada, o tempo de frequência é descontado na antiguidade relativa ao cargo.»
        As alterações relativamente ao artigo 44º do Decreto-Lei nº 374-A/79 são, como é fácil de ver, de pormenor e sem relevo, atento o objecto do parecer.
        ([20]) JOÃO ALFAIA, Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público, 1º volume, Coimbra, Almedina, 1985, p. 328; cfr. também MARCELLO CAETANO, ob. e vol. cits., p. 790.
        ([21]) Este último diploma foi alterado pelo Decreto-Lei nº 407/91, de 17 de Outubro, e pela Lei nº 19/92, de 13 de Agosto.
        ([22]) JOSÉ RIBEIRO e SOLEDADE RIBEIRO, A Relação Jurídica de Emprego na Administração Pública, Coimbra, Almedina, 1994, p. 51.
        ([23]) Estabelecem estes preceitos:
                    «2 - A transferência faz-se a requerimento do funcionário ou por conveniência da Administração, devidamente fundamentada e com o acordo do interessado, no caso de se fazer para fora do município de origem.
                    3 - Se o lugar de origem se situar na área dos municípios de Lisboa ou Porto ou na área dos seus municípios limítrofes, a transferência pode fazer-se para lugares neles situados, independentemente do acordo do funcionário.»
        ([24]) Antes, o nº 1 do artigo 41º do Decreto-Lei nº 41/84, de 3 de Fevereiro, também com a epígrafe «Prevalência», estabelecia:
                    «O disposto no presente diploma prevalece sobre todas e quaisquer disposições gerais ou especiais relativas às matérias reguladas no presente decreto-lei.»
        ([25]) JOSÉ RIBEIRO e SOLEDADE RIBEIRO, ob. cit., p. 93.
        ([26]) Seguimos, neste número, com as adaptações devidas e por vezes textualmente o parecer nº 4/87 do Conselho Consultivo (Diário da República, II Série, nº 218, de 20 de Junho de 1988; homologado por despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça de 25 de Julho de 1988). Neste parecer formulou-se a seguinte conclusão:
                    «A cláusula de prevalência do art. 41º do Dec.-Lei 41/84, de 3-2, não produziu efeitos revogatórios do direito dos conservadores e notários e demais funcionários ou agentes de serviços dependentes do Ministério da Justiça de frequentarem o Centro de Estudos Judiciários em regime de requisição, nos termos do art. 44º do Dec.-Lei 374-A/79, de 10-9, na redacção do Dec.-Lei 264-A/81, de 3-9.».
        ([27]) De 9 de Outubro de 1986 (Diário da República, II Série, nº 101, de 4 de Maio de 1987; homologado por despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça de 6 de Fevereiro de 1987).
        ([28]) Para mais desenvolvimentos, v. JORGE MIRANDA, Manual de Direito Constitucional, tomo IV, Coimbra, Coimbra Editora, Limitada, 1993, p. 275 e segs.
        ([29]) J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª edição revista, Coimbra, Coimbra Editora, 1993, p. 263.
        ([30]) Cfr. o acórdão nº 53/88 do Tribunal Constitucional, já referido na nota 10.
        Em geral, sobre as tomadas de posição do Conselho Consultivo acerca da liberdade de escolha da profissão e do direito de acesso à função pública, v. Procuradoria-Geral da República, Pareceres, vol II, p. 715 e segs.
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART8 ART47.
DL 374-A/79 DE 1979/09/10 ART44.
DL 519-F2/79 DE 1979/12/29.
DL 71/80 De 1980/04/15.
DL 449/80 DE 1980/07/10.
DRGU 55/80 DE 1980/10/08.
DL 41/84 DE 1984/02/03 ART25 ART41.
DL 498/88 DE 1988/12/30 ART5 N1 A.
DL 427/89 DE 1989/12/07 ART3 ART14 N1 ART15 N1 ART24 N1 ART27 ART43.
DL 92/90 DE 1990/03/17 ART4 ART29.
DL 206/97 DE 1997/08/12 ART3 N1 ART17 ART19.
Referências Complementares: 
DIR ADM * FUNÇÃO PUBL.
Divulgação
Número: 
DR071
Data: 
25-03-1998
Página: 
3854
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