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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
6/1997, de 09.06.1999
Data do Parecer: 
09-06-1999
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Maioria
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Administração Interna
Relator: 
LUÍS DA SILVEIRA
Descritores e Conclusões
Descritores: 
GNR
MILITAR DA GNR
AGENTE MILITARIZADO
OBRIGAÇÕES MILITARES
TRABALHADOR ESTUDANTE
HORÁRIO DE TRABALHO
FALTAS JUSTIFICADAS
EXAME
ENSINO SUPERIOR
ENSINO UNIVERSITÁRIO
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
FUNCIONÁRIO PÚBLICO
REGIME DA FUNÇÃO PÚBLICA
FORÇAS DE SEGURANÇA
FORÇAS ARMADAS
LICENÇA MILITAR
FUNÇÃO MILITAR
DEFESA NACIONAL
DIREITO DOS TRABALHADORES
LICENÇA PARA ESTUDOS
AUSÊNCIA AO SERVIÇO
RESTRIÇÕES DE DIREITOS
DISPONIBILIDADE
TRABALHO SUBORDINADO
AGENTE DO ESTADO
AGENTE POLÍTICO
GABINETE MINISTERIAL
GOVERNADOR CIVIL
SERVIÇO PÚBLICO ADMINISTRATIVO
SERVIÇO MILITAR DE CARREIRA
AGENTE DA ADMINISTRAÇÃO
ADMINISTRAÇÃO DIRECTO DO ESTADO
MINISTÉRIO DA DEFESA NACIONAL
DIREITOS ECONÓMICOS SOCIAIS E CULTURAIS
DIREITO AO ENSINO
CARREIRA MILITAR
Conclusões: 
1ª - Aos militares da Guarda Nacional Republicana não é, em virtude do dever de disponibilidade que sobre eles impende, aplicável o regime dos trabalhadores-estudantes constante da Lei nº 116/97, de 4 de Novembro;

2ª - Os militares da Guarda Nacional Repúblicana podem, fora do âmbito desta, frequentar cursos ou outras unidades de ensino:
a) Ou nos termos do artigo 150º do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Repúblicana, aprovado pelo Decreto-Lei nº 265/93, de 31 de Julho – desde que tal frequência não implique prejuízo para o serviço;
b) Ou, não sendo esse o caso, ao abrigo de licença para estudos, a qual só pode ser concedida, por despacho ministerial, segundo o artigo 178º do mesmo Estatuto, se se tratar de curso, cadeira ou estágio “com interesse para a Guarda e de que resulte valorização profissional e técnica” dos requerentes;

3ª - A apreciação do “interesse para a Guarda” relevante para a concessão de licença para estudos realiza-se, face às circunstâncias de cada situação concreta, em função das atribuições próprias da Guarda Nacional Repúblicana, enunciadas, nomeadamente, no artigo 2º da respectiva Lei Orgância, aprovada pelo Decreto-Lei nº 231/93, de 26 de Junho.
Texto Integral
Texto Integral: 
 Senhor Ministro da Administração Interna,
Excelência:
 
1.
1.1. Através de despacho, datado de 21 de Janeiro de 1997 ([1]), do antecessor de Vossa Excelência, foi solicitado parecer deste corpo consultivo acerca da questão de saber se aos oficiais da Guarda Nacional Republicana é aplicável o regime geral relativo aos trabalhadores-estudantes, e, em particular, no tocante à concessão de horários flexíveis e a justificação de faltas ao serviço, para efeito da realização de exames em cursos de ensino superior.
Por despachos de Sua Excelência o Secretário de Estado da Administração Interna, datados de 19 de Fevereiro de 1999 ([2]), foi pedida urgência para a emissão do referido parecer, dado estarem pendentes recursos hierárquicos relativos à matéria que constitui seu objecto, processos que se encontram suspensos até à elaboração do mesmo.
1.2. O problema em análise foi suscitado por requerimentos de oficiais da GNR solicitando que lhes fosse aplicado o regime da então vigente Lei n.º 26/81, de 21 de Agosto, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 271/86, de 4 de Setembro, com vista à atribuição de horários especiais e à dispensa de serviço para efeitos, respectivamente, de frequência a aulas e realização de exames em cursos universitários em que se encontram inscritos.
 1.3. Os oficiais em questão estavam autorizados a frequentar cursos universitários em horário pós-laboral, mencionando-se na documentação relativa a um deles que tal permissão lhe fora concedida, por despacho do Comandante-Geral da GNR, “exclusivamente nas condições exactas indicadas:
              - Fora das horas de serviço, sem prejuízo para o mesmo, para a disciplina ou para terceiros;
              - Sem encargos para a FN;
              - Não pode fazer uso de uniforme militar.”
Da informação elaborada na 1ª Repartição da GNR acerca do pedido deste mesmo oficial para que lhe fosse aplicado o regime de trabalhador – estudante ([3]) consta a seguinte indicação:
              “Até à presente data nenhum militar beneficiou do regime de excepção solicitado, tendo sempre sido autorizados a matricular-se em Cursos Superiores (alguns já são licenciados), mas sem prejuízo para o serviço ou para terceiros, mesmo em casos em que a promoção ao posto imediato estava dependente de habilitações literárias exigíveis nos termos estatutários.”
Posteriormente, o Comando do Regimento a que o mesmo oficial pertence elaborou também informação ([4]) sobre o respectivo requerimento, cujos nºs 3 e 4 são do seguinte teor:
              “3- Influência que o deferimento da pretensão pode ter na regularidade do serviço: O serviço que o requerente desempenha na unidade será concerteza afectado; no entanto, não se prevê a paralisação do mesmo durante as suas ausências.
              4- Prejuízo para terceiros, que o informante considera resultar do deferimento da pretensão: Haverá prejuízo para terceiros, particularmente, na escala de Oficiais de Dia à Unidade”.
1.4. Os requerimentos em questão vieram a ser indeferidos, com fundamento, essencialmente, na seguinte ordem de razões:
              - os militares da GNR não poderiam ser abrangidos pelo conceito de trabalhadores-estudantes, já que esta instituição “não é um serviço da Administração Pública na acepção tradicional e técnica do funcionalismo público civil, mas sim uma Força de Segurança constituída por militares organizada num Corpo Especial de Tropas com leis estatutárias específicas”.([5])
              - o regime de licenças desse pessoal está especificamente contemplado no Capítulo X do Estatuto dos Militares da GNR, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 265/93.
              - a Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas (Lei n.º 29/82, de 11 de Dezembro) exclui expressamente, no seu artigo 31º, n.º 11, a aplicabilidade aos militares das regras constitucionais relativas aos direitos dos trabalhadores. 
1.5. Nos recursos hierárquicos interpostos destas decisões de indeferimento, os interessados salientam que, por força do próprio Decreto-Lei n.º 265/93 (artigo 9º, n.º 2, al. a)), os capitães - posto em que ambos se encontram  colocados –, necessitam, para ser promovidos a major, de possuir habilitações correspondentes, no mínimo, ao bacharelato.
Um deles acrescenta, ainda – para além da invocação genérica do artigo 78º da Constituição -, que entende não terem as decisões recorridas respeitado o princípio da hierarquia das leis, por se haverem baseado no Decreto-Lei n.º 265/93, em prejuízo do disposto na Lei n.º 26/81, de 31 de Julho.
1.6. Ao analisar o problema em vista, a Auditoria Jurídica do Ministério da Administração Interna elaborou Parecer ([6]) onde ponderou, designadamente, o seguinte:
              “2. A Lei n.º 26/81, de 21 de Agosto, estabelece o regime jurídico do trabalhador-estudante, tanto para o sector público como para o privado. A este regime só se sobrepunham, à data da entrada em vigor da Lei n.º 26/81, regimes especiais mais favoráveis que estivessem estabelecidos por lei ou por instrumentos de regulamentação de trabalho. Era, pois, em princípio, aplicável aos militares da GNR que devessem, face à definição do conceito exarado no art.º 2º da própria Lei, ser considerados como trabalhadores-estudantes.
               Porém, o Estatuto dos Militares da GNR, aprovado por Decreto-Lei, é um diploma de hierarquia idêntica à da citada Lei n.º 26/81 (cfr. art.º 115º, n.º 2, da Constituição), especial e posterior àquela. Nessa medida, prevalece sobre as disposições da Lei n.º 26/81, no respectivo âmbito de aplicação pessoal (art.º 7º, n.º 3, do Código Civil, a contrario); o que não significa, só por si, que a Lei em questão deixe de ser aplicável aos militares da GNR, mas somente que, na medida em que as disposições da Lei foram contrariadas pelas do Estatuto, prevalecem estas; as normas da Lei que não forem contrariadas no Estatuto mantêm a sua aplicabilidade ao pessoal da GNR.
               Não será assim, todavia, se houver uma revogação global ou por substituição, isto é, se o legislador tiver querido, no tocante aos militares da GNR, regular toda a matéria do estatuto do trabalhador-estudante (ou, nas palavras em que a questão vem suscitada pela GNR, todo o estatuto do “militar-estudante”).
               O Cap. X do Estatuto tem por epígrafe “Licenças”, o art.º 170.º, o primeiro deste Capítulo, elenca as “licenças” que podem ser concedidas aos militares da GNR, entre elas colocando a licença de férias e a licença por junta médica, para além da licença para estudos.
               Tanto basta para mostrar que a terminologia aqui adoptada não corresponde àquela que é usada no Decreto-Lei n.º 497/88, de 30 de Dezembro; neste diploma, o direito a férias é claramente separado de todas as outras situações de ausência do serviço, mesmo daquelas a que o funcionário tem direito, independentemente de autorização; e das faltas distinguem-se ainda as “licenças”, termo que é reservado para as ausências prolongadas do serviço, mediante autorização (art.º 72.º ). Ora, no Estatuto dos Militares da GNR, todas as ausências, quer sejam por motivo de férias, quer sejam aquilo que o Decreto-Lei n.º 497/88 denomina como faltas, quer as licenças no sentido restrito que acima apontámos são designadas como “licenças”.
               Assim, parece-nos ter sido intenção do legislador regular no respectivo Estatuto todo o tipo de ausências do serviço dos militares da GNR, sem embargo de, relativamente a algumas espécies, remeter para a lei geral.
               Mas, se foi a intenção do legislador prever e regular todo o sistema de ausências na GNR, então terá afastado a aplicação da lei geral aos militares da GNR, mesmo que as respectivas normas não sejam contrariadas pelas do Estatuto, em todos os casos em que para ela se não remeta – por força do disposto, quanto à cessação da vigência das leis, no art.º 7.º, n.º 2, do Código Civil; para que se possa recorrer à lei geral será necessário que haja uma lacuna no Estatuto da GNR e não apenas um caso não regulado, já que este, por definição, não terá sido previsto deliberadamente, por não se ter querido contemplá-lo.”
1.7. Cumpre, pois, emitir parecer sobre o problema assim esboçado.
2.
2.1. Importa, para tanto, começar por ter em conta as orientações básicas que acerca de tal matéria possam extrair-se da Lei Fundamental.
Cabe atentar, desde logo, no princípio básico definido no artigo 58º, n.º 2, alínea c), da Constituição, segundo o qual:
“Artigo 58º
(Direito ao trabalho) 
              1. ...........................................................................................
              2. Para assegurar o direito ao trabalho, incumbe ao Estado promover:
                    ...........................................................................................
                     a) A formação cultural e técnica e a valorização profissional dos trabalhadores.”
Esta norma está sistematicamente integrada no Capítulo I (“Direitos e deveres económicos”) do Título III (“Direitos e deveres económicos, sociais e culturais”) da Parte I (“Direitos e deveres fundamentais”) da Constituição.
Merece realce, ademais, o facto de a revisão de 1997 ter introduzido no texto constitucional uma expressa referência aos trabalhadores-estudantes.
Fê-lo no artigo 59º, sob a epígrafe “Direitos dos trabalhadores”, e nos termos seguintes:
              “2. Incumbe ao Estado assegurar as condições de trabalho, retribuição e repouso a que os trabalhadores têm direito, nomeadamente:
              ……………………………………………………………………..
              f) A protecção das condições de trabalho dos trabalhadores-estudantes.
              3. ………………………………………………………………”.
Esta regra vem inserida no mesmo Capítulo que a do artigo precedente.
E não especifica qual seja o conteúdo dos direitos dos trabalhadores-estudantes.
Encarrega o Estado de proteger as “condições de trabalho” desses trabalhadores – assim remetendo para a lei ordinária a definição do elenco e da substância dos direitos em que a protecção dos respectivos interesses se deva traduzir.
De todo o modo, entre as “condições de trabalho” que a Lei Fundamental pretende que sejam proporcionadas aos trabalhadores–estudantes deverão decerto figurar, pelo menos, a garantia de emprego e manutenção da remuneração a que tenham direito, bem como o ajustamento de horários e eventual concessão de dispensas que permitam a adequada compatibilização entre as actividades laborais e escolares, sem sacrifícios desproporcionados.
2.2. A Lei Fundamental também curou, por seu turno, de, no Título IX (“Administração Pública”) da Parte III (“Organização do poder político”), definir os princípios nucleares do regime jurídico aplicável ao respectivo pessoal.
Sobressai, nesta perspectiva, a regra geral constante do n.º 1 do artigo 269º, precisamente subordinado à epígrafe “Regime da função pública”:
“Artigo 269º
(Regime da função pública)
              1. No exercício das suas funções, os trabalhadores da Administração Pública e demais agentes do Estado e outras entidades públicas estão exclusivamente ao serviço do interesse público, tal como é definido, nos termos da lei, pelos órgãos competentes da Administração.
                 ………………….……………………………………………… .”
Da formulação deste preceito se infere, por um lado, que o sector mais relevante e típico do pessoal ao serviço do Estado e das demais entidades públicas é qualificado como “trabalhador da Administração Pública”.
Mas também se conclui que desse pessoal fazem ainda parte outros elementos, englobados na designação de “demais agentes do Estado”.
Ou, por outras palavras: de entre a categoria genérica de “agentes do Estado” destaca-se o conjunto dos “trabalhadores da Administração Pública”.
Logo de seguida vem consignada a seguinte regra:
“Artigo 270º
(Restrições ao exercício de direitos)
                          A lei pode estabelecer restrições ao exercício dos direitos de expressão, reunião, manifestação, associação e petição colectiva e à capacidade eleitoral passiva dos militares e agentes militarizados dos quadros permanentes em serviço efectivo, bem como dos agentes dos serviços e forças de segurança, na estrita medida das exigências das funções próprias”.
Este preceito surge, pois, também sistematicamente integrado no Título relativo à “Administração Pública.”
E o seu posicionamento em relação ao artigo (269º), respeitante ao “Regime da função pública”, sugere que o legislador constitucional considerou que ele comportaria especialidades de regime estabelecidas, face ao regime geral dos “trabalhadores e demais agentes do Estado”, com respeito aos “militares e agentes militarizados”.
O facto de as restrições consignadas neste artigo 270º se reportarem apenas a “direitos, liberdades e garantias” deve explicar-se pela circunstância de ser em relação a esta categoria de situações  jurídicas activas que o artigo 18º, n.º 2, da Lei Fundamental estabelece que “A lei só pode restringir os direitos, liberdades garantias nos casos expressamente previstos na Constituição…etc.”.
3.
As pretensões que originaram a solicitação do presente parecer reportam-se a alguns dos benefícios legalmente atribuídos aos trabalhadores-estudantes.
O regime legal dos trabalhadores-estudantes começou por ser estabelecido pela Lei n.º 26/81, de 21 de Agosto ([7]) – aliás vigente à data dos originários pedidos formulados pelos interessados.
Esse diploma foi, contudo, substituído pela Lei n.º 116/97, de 4 de Novembro (Estatuto dos Trabalhadores-Estudantes), hoje em vigor ([8]).
A noção de trabalhador-estudante consta hoje do artigo 2º, n.º 1, deste diploma legal, que é do seguinte teor ([9]):
“Artigo 2º
Âmbito de aplicação
              1 - Para efeitos de aplicação do presente diploma, considera-se trabalhador-estudante todo o trabalhador por conta de outrem, independentemente do vínculo laboral, ao serviço de uma entidade pública ou privada e que frequente qualquer nível do ensino oficial ou equivalente, incluindo cursos de pós-graduação, realização de mestrados ou doutoramentos, em instituição pública, particular ou cooperativa.
................................................................................................ .”
Os pedidos sob apreciação referem-se, concretamente, à concessão de horário especial ou dispensa para frequência de aulas e à ausência para prestação de provas de avaliação, regalias essas reguladas na Lei n.º 116/97 nos moldes seguintes:
“Artigo 3º
Horário de trabalho
              1- As empresas ou serviços devem elaborar horários de trabalho específicos para os trabalhadores-estudantes, com flexibilidade ajustável à frequência das aulas e à inerente deslocação para os respectivos estabelecimentos de ensino.
              2- Quando não seja possível a aplicação do regime previsto no número anterior, o trabalhador-estudante será dispensado até seis horas semanais, sem perda de retribuição ou de qualquer outra regalia, se assim o exigir o respectivo horário escolar.
              3- A opção entre os regimes previstos nos números anteriores será objecto de acordo entre a entidade empregadora, os trabalhadores interessados e as suas  estruturas representativas, em ordem a conciliar os direitos dos trabalhadores-estudantes com o normal funcionamento das empresas ou serviços.
              4- Não existindo o acordo previsto no número anterior, aplicar-se-á supletivamente o regime previsto nos nºs 2 e 5 do presente artigo.
              5- A dispensa de serviço para frequência de aulas prevista no n.º 2 do presente artigo poderá ser utilizada de uma só vez ou fraccionadamente e depende da duração do trabalho semanal, nos seguintes termos:
                     a) Duração de trabalho entre vinte e vinte e nove horas – dispensa até três horas;
                     b) Duração de trabalho entre trinta e trinta e três horas – dispensa até quatro horas;
                     c) Duração de trabalho entre trinta e quatro e trinta e sete horas – dispensa até cinco horas;
                     d) Duração de trabalho igual ou superior a trinta e oito horas – dispensa até seis horas.
              6- O período normal de trabalho de um trabalhador-estudante não pode ser superior a oito horas por dia e a quarenta horas por semana, no qual se inclui o trabalho suplementar, excepto se prestado por casos de força maior.
              7- Mediante acordo, podem as partes afastar a aplicação do número anterior em favor do regime flexível previsto na lei geral, tendo o trabalhador-estudante direito, nesse caso, a um dia por mês de dispensa de trabalho, sem perda de remuneração.”
“Artigo 5º
Prestação de provas de avaliação
              1- O trabalhador-estudante tem direito a ausentar-se, sem perda de vencimento ou de qualquer outra regalia, para prestação de provas de avaliação, nos seguintes termos:
                     a) Até dois dias por cada prova de avaliação, sendo um o da realização da prova e o outro o imediatamente anterior, incluindo sábados, domingos e feriados;
                     b) No caso de provas em dias consecutivos ou de mais de uma prova no mesmo dia, os dias anteriores serão tantos quantas as provas de avaliação a efectuar, aí se incluindo sábados, domingos e feriados;
                     c) Os dias de ausência referidos nas alíneas anteriores não poderão exceder um máximo de quatro por disciplina.
              2- Consideram-se justificadas as faltas dadas pelos trabalhadores-estudantes na estrita medida das necessidades impostas pelas deslocações para prestar provas de avaliação.
              3- As entidades empregadoras podem exigir, a todo o tempo, prova da necessidade das referidas deslocações e do horário das provas de avaliação de conhecimentos.
              4- Para efeitos da aplicação do presente artigo, consideram-se provas de avaliação todas as provas escritas e orais, incluindo exames, bem como a apresentação de trabalhos, quando estes as substituam.”
De qualquer modo, a invocação dos aludidos direitos significa, implicitamente, a reivindicação da categoria geral de trabalhadores-estudantes por parte dos seus pretendidos titulares.
4.
4.1. Para ajuizar sobre se o regime dos trabalhadores-estudantes é adequado ao pessoal da GNR – e, em especial, aos respectivos oficiais – cabe averiguar qual seja o estatuto jurídico que lhes seja aplicável.
A Guarda Nacional Republicana (GNR) é caracterizada pelo artigo 1º da sua actual Lei Orgânica, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 231/93, de 26 de Junho ([10]), como “uma força de segurança constituída por militares organizados num corpo especial de tropas”.
A natureza jurídica da GNR, assim definida, permitiu a JOÃO RAPOSO ([11]) caracterizá-la do modo seguinte:
              “Atentas as suas missões, a GNR é uma verdadeira e própria polícia de segurança pública, integrada no sistema de segurança interna definido pela Lei n.º 20/87, de 12 de Junho, alterada pela Lei n.º 8/91, de 1 de Abril [cfr. artigo 14º, n.º 2, alínea a)]. A isso não se opõe a circunstância de ser constituída por militares. Na verdade, e como se sabe, essa solução não é inédita no direito comparado – é também o que se passa, por exemplo, com a Gendarmerie, em França, com a Guardia Civil, em Espanha, ou com a Arma Carabinieri, em Itália.”
As características especiais desta instituição explicam que os militares que a constituem possuam regime estatutário próprio – o Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 265/93, de 31 de Julho ([12]).
Trata-se, pois, dum diploma especial, para cuja cabal interpretação se torna necessário considerar também o regime aplicável, quanto ao objecto deste parecer, à generalidade dos militares, e, a um nível de maior concretização, a quaisquer oficiais – já que o problema em análise diz respeito a oficiais da GNR. 
É sabido que as normas especiais afastam, em regra, no âmbito da sua previsão, as normas gerais com as quais se relacionam. Trata-se de princípio geral de Direito reflectido no artigo 7º, n.º 3, do Código Civil.
Mas, por seu turno, a interpretação das normas especiais – precisamente porque o são – não dispensa a consideração das correlativas normas gerais.
É que as normas especiais, enquanto tais, não só têm de ser congruentes com as normas gerais de que constituem especificação, como têm, por natureza, de constituir afinal ainda uma concretização dos princípios básicos que informam aquelas.
Por isso procedemos, de seguida, à indicação das disposições da lei ordinária relevantes para a matéria em discussão, partindo das que assumem âmbito mais genérico e, subsequentemente, no sentido de uma progressiva especificação ou concretização.
4.2 – O diploma básico regulador dos objectivos, estrutura e organização das Forças Armadas – a Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas (Lei n.º 29/82, de 11 de Dezembro ([13]) – contém um preceito relativo ao regime jurídico dos militares.
Trata-se do artigo 31º, cujo escopo é o de estabelecer as restrições ao exercício dos direitos por parte de militares.
Dele sobressaem os respectivos nºs. 1 e 11, que estipulam:
“Artigo 31º
(Restrições ao exercício de direitos por militares)
              1 – O exercício dos direitos de expressão, reunião, manifestação, associação e petição colectiva e a capacidade eleitoral passiva dos militares e agentes militarizados dos quadros permanentes e contratados em serviço efectivos será objecto das restrições constantes dos números seguintes.
……………………………………………………………………….
              11 – Aos cidadãos mencionados no n.º 1 não são aplicáveis as normas constitucionais referentes aos direitos dos trabalhadores.
…………………………………………………………………. “.
Esta norma teve por objectivo, pois, dar aplicação ao artigo 270º da Constituição – naturalmente na redacção vigente à data da emanação da Lei n.º 29/82.
De entre as restrições assim consignadas, a constante do n.º 11 relaciona-se de algum modo com o tratamento da questão ora em análise.
Adiante se verá em que medida, uma vez tidas em conta todas as demais prescrições legais a tal assunto concernentes.
4.3 – Em 1 de Junho de 1989 foi publicada a Lei n.º 11/89 ([14]), definidora das “Bases gerais do estatuto da condição militar.”
Este diploma é, segundo expressa determinação do seu artigo 16º (aliás dispensável, dada a qualidade desses elementos), aplicável aos militares da Guarda Nacional Republicana.
Das determinações desta lei merecem particular referência, na perspectiva do presente parecer, as seguintes:
              “Art.º. 2º A condição militar caracteriza-se:
              ………………………………………………………………….. “.
              f) Pela permanente disponibilidade para o serviço, ainda que com sacrifício dos interesses pessoais;
              g) Pela restrição, constitucionalmente prevista, de alguns direitos e liberdades;
              ………………………………………………………………….. “.
              Art.º 7º Os militares gozam de todos os direitos e liberdades reconhecidos aos demais cidadãos, estando o exercício de alguns desses direitos e liberdades sujeito às restrições constitucionalmente previstas, com o âmbito pessoal e material da Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas.
              Art.º 12º - 1- Os militares têm o direito e o dever de receber treino e formação geral, cívica, científica, técnica e profissional, inicial e permanente, adequados ao pleno exercício das funções e missões que lhes forem atribuídas. 
              2 – Os militares têm ainda o direito e o dever de receber formação de actualização, reciclagem e progressão, com vista à sua valoração humana e profissional e à sua progressão na carreira”.
4.4 – No desenvolvimento das mencionadas Bases Gerais (e nos termos do respectivo artigo 17º, n.º 1), veio a ser publicado o Estatuto dos Militares das Forças Armadas, aprovado pelo  Decreto–Lei n.º 34-A/90, de 24 de Janeiro ([1).
No preâmbulo deste diploma enunciaram-se alguns dos princípios básicos da condição militar que nela se pretenderam desenvolver, nomeadamente:
 “A condição do militar tem uma natureza, que, de modo claro e indiscutível, se distingue do estatuto funcional dos demais servidores de Estado, desde logo pela permanente disponibilidade para lutar em defesa da Pátria, se necessário com o sacrifício da própria vida;
………………………………………………………………………
Pela permanente disponibilidade para o serviço, seja em termos temporais, seja em termos de mobilidade territorial, ainda que com sacrifício dos interesses pessoais do militar e da sua família; 
Pela restrição, constitucionalmente prevista, de alguns direitos e liberdades;
……………………………………………………………….. “.  
O princípio da disponibilidade foi legislativamente traduzido no artigo 12º do Estatuto, cujo n.º 1 dispõe que:
“Artigo 12º
Dever de disponibilidade  
1. O militar mantém permanente disponibilidade para o serviço, ainda que com sacrifício dos interesses pessoais.
……………………………………………………….…........“.
Quanto ao exercício de direitos, liberdades e garantias, reitera-se a sua sujeição às restrições, constitucionalmente admitidas, enunciadas na Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas (artigo 19º).
Este diploma estatutário não é, de todo o modo, indiferente à obtenção, pelos militares, de formação e qualificação proporcionadas por estabelecimentos ou cursos alheios à organização castrense.
Denota-o, por um lado, a posição que, em termos gerais, define, no tocante a equivalências, o artigo 83º:
“Artigo 83º
Equivalências  
              1. Para efeitos militares podem ser concedidas equivalências pelo respectivo CEM a cursos ministrados em estabelecimentos de ensino nacionais e estrangeiros.”
Corroborando este ponto de vista, no que concerne aos militares do Quadro Permanente, determina-se adiante, no artigo 212º:
“Artigo 212º
Valorização profissional
O militar dos QP, visando a sua valorização profissional e prestígio da instituição militar, pode, sem prejuízo do serviço, habilitar-se com qualquer curso ou estágio de conteúdo genérico ou de especialização técnico-profissional, devendo o mesmo ser averbado no seu processo pessoal. 
Ainda no tocante aos militares do Q.P., tem particular importância assinalar que os mesmos podem, para frequência de cursos, estágios ou disciplinas “com interesse” para as Forças Armadas, obter licença de estudos ([16]), sem perda de remuneração.
É o que consta do artigo 221º do Estatuto, que prescreve:
“Artigo 221º
Licença para estudos
              1 – A licença para estudos é concedida pelo CEM do ramo respectivo, a requerimento do interessado, para efeitos de frequência de cursos, estágios ou disciplinas em estabelecimentos de ensino nacionais ou estrangeiros  estranhos às forças armadas, com interesse para as mesmas e de que resulte valorização profissional e técnica dos militares.
              2 – O militar dos QP a quem tenha sido concedida licença para estudos deverá apresentar nas datas que lhe forem determinadas os documentos comprovativos do respectivo aproveitamento escolar.
              3 – A licença para estudos pode ser cancelada sempre que a entidade compete considere insuficiente o aproveitamento escolar do militar.
              4 – A licença para estudos é concedida sem perda de vencimentos.
              5 – A licença para estudos apenas pode ser concedida ao militar dos QP do activo na efectividade de serviço.
              6 – A concessão da licença para estudos obriga o requerente, após a conclusão do curso, a prestar serviço nas forças armadas por um período a fixar no despacho de autorização, atento o disposto no n.º 2 do artigo 207º.”
4.5 – Cumpre, enfim, atentar nas regras especificamente consagradas para os militares da GNR no Decreto–Lei n.º 265/93 e no Estatuto por ele aprovado.
No que tange à restrição ao exercício de alguns direitos, liberdades e garantias, o artigo 15º do Estatuto procede à habitual remissão para a LDNFA.
Também o dever de disponibilidade surge reafirmado pelo Estatuto quanto aos militares da GNR – aliás com especial desenvolvimento – nos moldes do respectivo artigo 9º:
“Artigo 9º
Dever de disponibilidade 
              1 – Face à especificidade da missão, o militar da Guarda encontra-se permanentemente de serviço.
              2 – O militar da Guarda deve manter permanente disponibilidade para o serviço, ainda que com sacrifício dos interesses pessoais, não se ausentando da área onde presta serviço, a não ser quando devidamente autorizado, ou quando, no exercício das suas funções, deva efectuar de imediato diligências que possam conduzir ao esclarecimento de qualquer acto de natureza criminal ou contra-ordenacional.
              3 – O militar da Guarda deve comunicar o seu domicílio habitual ou eventual e, no caso de ausência por licença ou doença, o local onde possa ser encontrado ou contactado.”
Acerca, por último, das habilitações e qualificações académicas conseguidas fora do âmbito da GNR, os dois diplomas em referência ostentam uma postura que de modo algum poderá ser taxada de puramente neutral.
Assim é que, ao enunciar as obrigações dos militares da GNR, o artigo 14º do Estatuto determina que:
“Artigo 14º
Outros deveres
Constituem, ainda, deveres do militar da Guarda:
.............................................................................................
              m) Comunicar todas as alterações à sua evolução técnica e cultural, relativamente a habilitações literárias que obtenha ou cursos técnicos e superiores que complete;
              .............................................................................................”.
Correlativamente, e estabelecendo, a este propósito, posições jurídicas de cariz activo, o artigo 150º desse mesmo diploma prevê que:
“Artigo 150º
Valorização profissional
              1 – Com vista à sua valorização profissional e prestígio da instituição, o militar da Guarda pode frequentar qualquer curso complementar para a sua cultura geral ou especialização técnica, sem prejuízo do serviço, devendo a frequência e eventual conclusão do mesmo ser averbada no seu processo individual.
              2 – O militar pode, ainda, frequentar cursos desta natureza com prejuízo para o serviço, nos termos do artigo 178º”.
Este último preceito reporta-se, precisamente, à licença para estudos – concedida sem perda de remuneração, consoante esclarece o artigo 170º, n.º 3, por ele assim regulada:
“Artigo 178º
Licença para estudos 
              1 – A licença para estudos pode ser concedida, por despacho ministerial, a requerimento do interessado, para efeitos de frequência de curso, cadeiras ou estágios, em estabelecimentos de ensino nacionais ou estrangeiros, com interesse para a Guarda e de que resulte valorização profissional e técnica dos militares dos quadros da Guarda.
              2 – O militar a quem tenha sido concedida licença para estudos deverá apresentar, nas datas que lhe foram determinadas, os documentos comprovativos do aproveitamento escolar.
              3 – A licença para estudos pode ser cancelada, por proposta do comandante-geral, quando este considere insuficiente o aproveitamento escolar do militar a quem a mesma tenha sido concedida.
              4 – A licença para estudos conta como tempo de serviço efectivo, mas sem os aumentos de tempo previstos no n.º 3 do artigo 101º.”
Não pode, de resto, deixar de se ter presente que – como um dos interessados expressamente refere – a manifestação concreta da relevância, para certos oficiais da GNR, da titularidade de determinadas habilitações académicas ressalta até do facto de o artigo 9º, n.º 2, do Decreto–Lei n.º 265/93 estipular que os ingressados nos quadros entre 1984 e 1994 só poderiam ser promovidos a major se possuíssem, no mínimo, habilitações equivalentes ao grau de bacharelato, em áreas a definir pelo comandante-geral.
5.
5.1 -  Para se poder tomar posição sobre a aplicabilidade aos oficiais da GNR, enquanto militares, de aspectos do regime respeitante aos trabalhadores–estudantes, ou, porventura, aos trabalhadores em geral, põe-se, naturalmente, a questão prévia de saber se eles devem qualificar-se como trabalhadores (da Função Pública). 
Se os militares não couberem no conceito de trabalhadores, decerto não poderão beneficiar de regalias que lhes são próprias, nem, também, das relativas a um sub–conjunto destes – o dos trabalhadores-estudantes.
Não falta, a este propósito, quem entenda que a peculiar natureza do serviço nas Forças Armadas não é adequada a uma relação de trabalho subordinado - embora tal posição se não apresente muito convincente, como adiante se procurará mostrar.
Assim é que, p.e., JOÃO CAUPERS ([17]) explicou o facto de as restrições ao exercício de direitos por parte de militares constantes do artigo 270º da Lei Fundamental se cingirem a “direitos, liberdades e garantias pessoais e direitos de participação” (e não já a quaisquer direitos dos trabalhadores) pelo facto de que “os militares de carreira não têm com o Estado uma relação de trabalho subordinado, já que a “defesa militar da República”, que o n.º 1 do artigo 275º da Constituição impõe às Forças Armadas, não parece compatível com tal tipo de relação jurídica.”
Ponto de vista próximo deste – conquanto não idêntico – encontra-se manifestado na Memória Justificativa da Proposta de Lei que deu origem à Lei n.º 29/82 ([18]), onde a razão de ser do n.º 9 ([19]) do respectivo artigo 31º vem assim apresentada: “... a proposta de lei esclarece ainda dois pontos que não ficaram expressamente regulados em sede de revisão constitucional: um consiste em que, não sendo os militares e agentes militarizados trabalhadores – no sentido constitucional de sujeitos de uma relação jurídica de emprego em que a entidade patronal é uma empresa -, não são titulares dos direitos dos trabalhadores (n.º 9), designadamente a liberdade sindical, o direito à greve e o direito de criar comissões de trabalhadores (v. a Constituição, artigos 53º e 58º)”.
Ao apreciar especificamente esta norma da Lei n.º 29/82, o Tribunal Constitucional ([20]) não declarou a respectiva inconstitucionalidade, invocando, para tanto, entre outras razões, a de considerar que os militares e agentes militarizados não seriam trabalhadores (da Administração Pública), cabendo, antes, na noção de “demais agentes do Estado”:
              “Trata-se de que, pretendendo-se aí – nesse preceito que justamente versa o “regime da função pública” – significar que também os servidores do Estado em geral, gozam do estatuto constitucional próprio dos “trabalhadores” (o que levou a dar-lhes esta mesma designação), todavia não deixou de reconhecer-se que a extensão de um tal estatuto , nesse domínio, não podia ser “universal” daí que, onde antes se distinguia entre “funcionários e agentes do Estado”, tenha continuado a distinguir-se entre “trabalhadores da Administração Pública e demais agentes do Estado”. E a contraposição é agora particularmente sintomática porque, se antes ainda podia ser levada à conta da tradicional distinção, dentro da função pública, entre agentes “funcionários” e agentes “não funcionários”, agora só pode evidentemente traduzir a diferença entre os agentes do Estado a que convém o estatuto constitucional de “trabalhadores” e aqueles outros a que não convém tal estatuto.
              Mas, se é assim – se a própria Constituição reconhece a salvaguarda que certos agentes ou servidores do Estado não podem ser havidos, do seu ponto de vista, como “trabalhadores” e não gozam, por conseguinte, dos específicos “direitos, liberdades e garantias” destes últimos – então dentro dessa categoria de agentes públicos não podem deixar de entrar primariamente, e pelo menos os “militares” e os “agentes militarizados”: impõe-no a natureza mesma das funções (do “serviço”) que uns e outros desempenham e a natureza das instituições em que se integram, a ponto de se poder dizer que, a não valer quanto a eles, nem se vê que sentido pudesse ter a ressalva constitucional.”
5.2 – Não se afigura, todavia, que esta seja a perspectiva que deva ter-se por consagrada, na Constituição e na legislação ordinária em vigor, acerca da caracterização jurídica da relação estabelecida entre o Estado e os militares.
O enquadramento sistemático do artigo 270º no Título IX da Parte III da Lei Fundamental denota que o legislador constitucional, ao ocupar-se aí das restrições ao exercício de certos direitos por parte dos militares (bem como dos agentes militarizados e dos serviços e forças de segurança), os considerou como elementos ao serviço da “Administração Pública”.
É sintomático, aliás, que tal norma relativa ao Estatuto dos militares tenha sido integrada no dito Título respeitante à “Administração Pública”, e não no imediatamente subsequente, referente à “Defesa Nacional”.
O contexto em que o mencionado artigo 270º se apresenta reforça este ponto de vista.
Ele é antecedido por uma norma (artigo 269º) em que se estipulam os princípios gerais do regime relativo aos “trabalhadores do Estado e demais agentes do Estado e outras entidades públicas”.
O preceito em causa revela-se, pois, como consubstanciando certos limites ou restrições ao regime do pessoal abrangido pelo preceito anterior – a generalidade dos trabalhadores e agentes da Administração Pública.
E é logo seguido por outro artigo (271º) que de novo contém regras gerais para os “funcionários e agentes do Estado e das demais entidades públicas”, agora em matéria de responsabilidade civil, criminal e disciplinar.
A revisão constitucional de 1997 veio, ainda, reforçar a posição ora propugnada, ao incluir na previsão do artigo 270º um conjunto de pessoal – “agentes dos serviços e forças de segurança – sobre cuja caracterização como trabalhadores da Administração Pública não parecem suscitar-se dúvidas.
Restaria, é certo, a possibilidade de, na senda da opinião que fez vencimento no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 103/87 – considerar que os militares e agentes militarizados caberiam, relativamente à previsão do artigo  269º da Constituição, não no grupo dos “trabalhadores da Administração Pública”, mas sim no dos “demais agentes do Estado.” ([21])
Conquanto, em puros termos literais, essa questão se pudesse suscitar, os trabalhos preparatórios da norma constitucional em causa parecem apontar no sentido de se concluir que pela expressão “demais agentes do Estado” se quis abarcar os agentes políticos ([22]).
Recorde-se, a confirmá-lo, os termos em que essa formulação foi, na discussão em plenário acerca do preceito em referência, sustentada pelo deputado NUNES DE ALMEIDA, em nome do partido que a propusera:
"Por outro lado, quero também salientar a distinção entre aqueles que exercem funções dentro do aparelho de Estado – dessa profunda diferença que tem que haver, que deve ser salientada e é necessário clarificar – entre os que estão numa relação de emprego público, numa relação de trabalho com a Administração e aqueles que são agentes políticos da Administração, como por exemplo os funcionários dos gabinetes ministeriais, os membros dos gabinetes ministeriais, ou os governadores civis e outros casos deste tipo” ([23]).  
A lei ordinária definidora dos “Princípios gerais em matéria de emprego público, remunerações e gestão de pessoal da Administração Pública” corrobora, ao aplicá-las e desenvolvê-las, as normas constitucionais acima abordadas, na interpretação que para as mesmas se preconizou.
Trata-se do Decreto–Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, emanado sob autorização parlamentar ([24]), cujo objecto surge assim recortado:
“Artigo 1º
(Objecto)
              O presente decreto-lei estabelece princípios gerais em matéria de emprego público, remuneração e gestão de pessoal na função pública.”
Por sua vez, o âmbito pessoal de aplicação desse diploma vem definido no respectivo artigo 3º do modo seguinte:
“Artigo 3º
(Âmbito pessoal) 
              1. Considera-se abrangido pelo presente diploma o pessoal que, exercendo funções nos serviços e organismos do Estado, sob a direcção dos respectivos órgãos, se encontre sujeito ao regime de direito público.
              2. As disposições do presente diploma são aplicáveis às forças armadas e às forças de segurança, com as adaptações decorrentes das seus estatutos específicos.
              3. ............................................................................................... .”
Isto significa, pois, que a lei geral básica em matéria de emprego público, remunerações e gestão da função pública é directamente aplicável (e não, portanto, por extensão ou remissão) ao pessoal das forças armadas e forças de segurança – conquanto, naturalmente, com as adaptações exigidas pela específica natureza das instituições respectivas.
Alicerçado nas bases constitucionais e legais acabadas de referir, já este Conselho teve oportunidade de sustentar a inclusão dos militares no conceito de trabalhadores da Administração Pública.
Fê-lo, designadamente, no Parecer n.º 64/92, de 14 de Janeiro de 1993 ([25]), do qual se citam, nesse sentido, os seguintes elucidativos passos:
              “O artigo 269º visa os trabalhadores da Administração Pública e demais agentes do Estado e outras entidades públicas, mas, como se verá oportunamente, os militares estão inseridos na Administração ainda que se apresentem como funcionários públicos especiais, ao menos no quadro dos direitos, liberdades e garantias.”
              ......................................................................................................
              Embora o EOA autonomize a situação militar, a verdade é que resulta do tratamento sistemático que a Constituição confere aos militares, nomeadamente da inserção do artigo  270º, já conhecido, no Título VIII, “Administração Pública”, e não no Título IX, “Defesa Nacional”, que estes estão incluídos na “função pública” em sentido amplo (...), não gozando de qualquer estatuto especial, sui generis, exclusivo deles. As relações de serviço dos militares e agentes militarizados integram-se, assim, quanto aos seus direitos e deveres, nas relações de serviço do funcionalismo público, havendo apenas necessidade de estabelecimento de restrições a alguns dos seus direitos, derivadas das exigências específicas do serviço militar ou militarizado.”
Esta posição corresponde, note-se, à opinião que tem tido mais aceitação no âmbito da doutrina portuguesa.
Pode hoje dar-se por assente, como ponto de partida – e nomeadamente após a revisão constitucional de 1989 – que o conceito constitucional de trabalhadores abrange os trabalhadores da função pública. Refira-se, por todos, BARROS MOURA ([26]), que parte da verificação de que, para a lei fundamental, “o conceito de trabalhador coincide , assim, com o utilizado no Direito do Trabalho”, para concluir que “trata–se, por outro lado, de todos os trabalhadores, incluindo os da função pública (cfr. art.º 269º)”.
Da conjugação desta asserção com o facto de a administração militar fazer parte da Administração Pública extraem, pois, diversos autores a ilação de que os militares devem considerar-se integrados no conceito de trabalhadores da Administração Pública.
Este entendimento foi expressamente exposto por LIBERAL FERNANDES ([27) quando ponderou:
"Neste contexto, as FA são parte integrante da Administração, constituindo, por isso, um serviço público administrativo; este enquadramento faz com que a disciplina das relações profissionais dos seus agentes não possa ser concebida separadamente do regime do emprego público em geral, como aconteceria se a administração civil e a militar constituíssem compartimentos estanques. Por conseguinte, sem prejuízo da respectiva especificidade, as relações profissionais dos militares estão sujeitas ao direito da função pública. Ora, possuindo o vínculo de serviço militar de carreira todas as características essenciais da relação de emprego público – sujeição ao regime de direito público, prestação de trabalho, retribuição e  subordinação jurídica -, é natural que lhe sejam extensíveis os princípios do trabalho público dependente, entre os quais se destacam as normas sobre direitos e liberdades fundamentais.  
Acresce que é a própria lei relativa aos princípios gerais  em matéria de emprego público, o Decreto–Lei n.º 184/89, de 2/6, a qualificar os militares como agentes trabalhadores da Administração. De facto, ao determinar a aplicação do seu conteúdo aos membros das Forças Armadas, com ressalva apenas da regulamentação prevista nas leis específicas dos respectivos organismos (art.º 3º, n.º 2), aquela lei está a reafirmar a integração do serviço militar no âmbito do emprego público e, consequentemente, a conferir ao pessoal abrangido um estatuto jurídico-profissional idêntico ao dos restantes agentes da Administração submetido ao direito público.  
Finalmente, a integração do serviço militar no sector da função  pública resulta também do próprio artigo 270º da CRP. A inclusão desta norma na parte referente à Administração Pública, imediatamente a seguir ao dispositivo que define o estatuto profissional de todos os agentes do Estado (artigo 269º, n.º 1), significa que o legislador constituinte remeteu para os princípios fundamentais da função pública a própria caracterização do regime aplicável aos militares. Neste aspecto, o disposto no artigo 270º não constitui uma excepção ao estabelecido no artigo 269º n.º 1 da CRP para a função pública em geral; por isso, a questão dos limites ao exercício dos direitos fundamentais pelos militares constitui apenas um aspecto particular da disciplina que rege as relações profissionais abrangidas por esta última norma”.  
Semelhante ponto de vista se encontra também sustentado por JOSÉ MIGUEL SARDINHA ([28]), quando afirma:              
              “Como se verificou, as Forças Armadas integram-se hoje na Administração directa do Estado, através do Ministério da Defesa Nacional. Com tal integração, parece-nos indiscutível que os militares sejam verdadeiros funcionários públicos, no sentido “de profissionais da Administração Pública vinculados a esta por uma relação jurídica de emprego público disciplinado pelo Direito Administrativo”. Com efeito, se se entender a função pública como “a actividade desenvolvida pelos órgãos e agentes das pessoas colectivas de direito público no sentido de assegurar a satisfação das necessidades colectivas”, é lógico que os militares como agentes da Pessoa Colectiva de Direito Público – Estado, exercem uma actividade para satisfação de uma necessidade colectiva, como seja a defesa nacional, integrando-se assim a sua acção no conceito de função pública. Logo, os militares são verdadeiros funcionários públicos.”  
Esta não é, aliás, uma perspectiva apenas ajustada à ordem jurídica portuguesa.  
Ela pode, mesmo, ver-se corroborada, em termos comparatísticos, pela concepção dominante, nomeadamente, no país vizinho, em que o enquadramento constitucional das Forças Armadas se aproxima bastante do vigente em Portugal.  
Citam-se, a comprová-lo, os seguintes trechos, colhidos, respectivamente, de obras de PARADA VÁZQUEZ ([29]), “La Ley 17/1989, de 20 de julio, del Régimen del Personal Militar Profisional en su Exposición de Motivos parte, efectivamente, de la obviedad de que la función pública militar constituye una parte de la función pública, pero de esa obviedad se deduce sin más que la función pública militar debe ser regulada igual que la civil pero com peculiaridades. Partiendo de esta premisa nada tiene de particular que la “revolución” producida en las reformas de la función pública civil de 1964 y 1984 se translade a la función pública militar”; e NEVADO MORENO ([30]), “A mayor abundamiento, desde un punto de vista jurídico-positivo, y ubicándonos en el régimen vigente, la consideración de la Defensa Nacional como un servicio público há sido consagrada por la Ley 17/1989 sobre el Régimen del Personal Militar Profesional en su art. 1 al definir la Función Militar:
              “La función militar es un servicio del Estado a la comunidad nacional prestado por las Forças Armadas...”
Por cosiguiente, sin perjuicio de la relación jurídica que les una – la cual nos mostrará una concreta tipología -, el personal integrante de esta organización recibe sin objección el carácter de servidor público, como agente del Estado a quien se le va a encomendar la consecución de los resultados propios del servicio definido, teniendo presente que cuando en él se reúnan los rasgos de permanencia, profesionalidad, desempeño de vacante dotada presupuestariamente, etc., es decir, los elementos recogidos en el art. 1 de la Ley Articulada de Funcionarios Civiles del Estado, este sevidor habrá de ser considerado como un funcionario, concretamente un funcionario público militar”.
6. 
Tendo por ajustado o entendimento de que os militares (e portanto os oficiais da GNR) se integram na categoria de trabalhadores da Administração Pública, imediatamente se suscita a questão da aplicabilidade do atrás transcrito no n.º 11 do artigo 31º da Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas.  
Na verdade, o teor literal dessa regra, ao prescrever, genericamente e sem qualquer reserva, que a esses cidadãos “não são aplicáveis as normas constitucionais referentes aos direitos dos trabalhadores”, parece implicar, sem mais, a recusa, a tais elementos, de quaisquer desses direitos – incluindo, hoje, após a revisão de 1997, os respeitantes à situação de trabalhador-estudante.  
Tal estatuição, a assumir esse significado, não deixaria, naturalmente, de suscitar legítimas dúvidas acerca da sua constitucionalidade.  
Esse problema não deixou de ser abordado (conquanto sem conduzir a um procedimento de controlo preventivo da constitucionalidade) no inicial veto presidencial ([31]) ao Decreto da Assembleia da República n.º 90/II, que precedeu aquela Lei, no qual se ponderou que: “De outro lado, o n.º 11 do mesmo artigo 31º ou é inútil – por aos militares não poder eventualmente aplicar-se a qualificação de trabalhadores – ou é inconstitucional – se constitucionalmente essa qualificação lhes couber” ([32]).
Na verdade, nem o artigo 270º nem qualquer outra norma da Lei Fundamental permitem que na lei ordinária sejam estabelecidas restrições ao exercício de tais direitos – o que sempre seria necessário, nos termos do artigo 18º, n.º 2, da Constituição, no concernente aos “direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores”, consignados nos artigos 53º a 57º.
O Acórdão n.º 103/87 do Tribunal Constitucional arredou a alegada inconstitucionalidade da norma em causa por considerar que ela só se aplicaria aos “direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores” ([33]) ([34]).  
Adoptando perspectiva diversa, mas também tendente à afirmação da constitucionalidade da regra  em análise, a justificação governamental da proposta de lei que esteve na origem da Lei n.º 29/82 sustentou que, na norma que veio a transformar-se no n.º 11 do artigo 31º desse diploma, a fórmula “direitos dos trabalhadores” se reportava aos direitos dos trabalhadores das empresas.  
E tanto assim é que, perante a crítica de eventual inconstitucionalidade de tal preceito, aventada no veto presidencial ao decreto parlamentar que antecedeu essa Lei, o Governo, enquanto autor da proposta de lei, veio,  na discussão que sobre aquele incidiu na Assembleia da República, reiterar a denegação de tal vício, por o preceito em causa ter em vista tão-somente direitos dos trabalhadores das empresas.  
Este entendimento restritivo do n.º 11 do artigo 31º da Lei n.º 29/82, em consonância com o explicitado propósito do legislador, apresentá-lo-ia compatível com o normativo constitucional – pois os militares não cabem, obviamente, no conceito de trabalhadores de empresa.  
O enquadramento sistemático da norma em causa, obrigando a apreciá-la em contraponto e no seguimento do princípio geral definido no n.º 1 do artigo 31º da LDNFA em que se integra, aponta no sentido de que os “direitos dos trabalhadores” a que se reporta terão a mesma natureza dos contemplados naquele (e também no artigo 270º da Constituição) – ou seja, a de “direitos, liberdades e garantias”.  
De todo o modo, a economia do presente parecer não exige, forçosamente, a opção por uma ou outra das aludidas soluções propostas.  
Basta-lhe o reconhecimento de que, tanto num como noutro caso, a expressão  “direitos dos trabalhadores” utilizada no n.º 11 do artigo 31º da LDNFA deve ser entendida em sentido mais contido que o literal, não abarcando os direitos que, apesar de também fundamentais, caibam na categoria de “direitos económicos, sociais e culturais” ([35]).  
7.
7.1 -  O n.º 11 do artigo 31º da Lei 29/82 não constitui, assim, obstáculo à titularidade, por parte dos militares, do direito à “formação cultural e técnica e a valorização profissional”, previsto na alínea c) do n.º 2 do artigo 58º, e que mais não é que a concretização, para os trabalhadores, dos direitos à educação, à cultura e ao ensino, garantidos aos cidadãos em geral, nos artigos 73º e 74º - todos da Lei Fundamental.  
Só que esse direito não pode traduzir-se na pura e simples aplicação, aos militares (e, concretamente, aos oficiais da GNR) da integralidade do regime geral relativo aos trabalhadores-estudantes, tal como definido na Lei n.º 116/97. Ela seria, com efeito, dificilmente compatível com o dever de disponibilidade (36) que sobre aqueles incide.
Não parecem, nomeadamente, conciliáveis os direitos à fixação de horários especiais ou à dispensa para frequência de aulas ou realização de exames com o facto de o militar se encontrar “permanentemente em serviço”, e ter por isso a obrigação de “permanente disponibilidade para o serviço, ainda que com sacrifício dos interesses pessoais”.
Justifica-se, pois, analisar se os direitos previstos na alínea c) do n.º 2 do artigo 58º da Constituição comportam, designadamente no tocante aos aludidos aspectos, limitações ou adaptações adequadas, na medida em que se apliquem a trabalhadores do Estado pertencentes às forças militares ou militarizadas.
7.2 - Cabe, a este propósito, fazer desde logo uma constatação prévia: a de que, não estando o artigo 58º da Constituição  sistematicamente integrado no  Título II da Parte I desse texto fundamental, relativo aos “direitos, liberdades e garantias” – mas sim entre os “direitos económicos, sociais e culturais” –, a eventual restrição ou condicionamento aos direitos nele previstos não carece da expressa habilitação constitucional acerca destes estipulada no artigo 18º, n.º 2. 
É nesse sentido, crê-se, que VIEIRA DE ANDRADE ([37]) esclarece: “Julgamos que, no âmbito dos direitos económicos, sociais e culturais, a vinculação do legislador não é absoluta nem sequer a sua actuação é determinada no essencial pela Constituição.”
Apesar de a Constituição não prescrever ou admitir expressamente a estipulação de restrições ou condicionamentos aos direitos em causa, pode, pois, o legislador ordinário consagrá-los, com respeito pelos princípios constitucionais gerais e básicos da proporcionalidade e da salvaguarda do núcleo essencial ([38]) desses direitos – já que da afectação deste os mesmos resultariam descaracterizados e, mesmo, frustrados.
7.3 – Conquanto a eventual limitação ou condicionamento dos direitos fundamentais do tipo em análise não careça de expressa habilitação constitucional, isso não significa, naturalmente, que tais adaptações dispensem qualquer apoio na Constituição.
JORGE MIRANDA ([39]) sustenta que tais limitações aos direitos fundamentais decorrem, ou da sua conjugação com outros direitos fundamentais, interesses ou da sua compatibilização com “princípios objectivos ou institutos e valores de outra natureza.”
De entre as últimas, destacar-se-iam precisamente as relacionadas com “estatutos ou relações especiais de poder”, como as respeitantes aos militares ([40]).
Aceitando semelhante orientação, ALEXANDRE PINHEIRO ([41]) sugere o seguinte critério para configuração e tratamento das limitações concernentes a “relações especiais de poder”: 
“As relações especiais de poder têm um carácter vincadamente institucional. Pensamos que neste domínio de relações há que: a) aferir da cobertura constitucional, apelando para um quadro de valores, da própria instituição; b) atender aos fins constitucionalmente previstos da instituição; c) adequar as restrições aos direitos fundamentais, aos fins da instituição em termos de proporcionalidade e necessidade”.
7.4. Este tipo de limitação ou condicionamento dos direitos fundamentais pode, de resto, encontrar uma base constitucional explícita, ainda que mediata, na remissão que o n.º 2 do artigo 16º da Constituição faz para a Declaração Universal dos Direitos do Homem, com respeito à interpretação e integração das normas constitucionais e legais relativas a tais direitos.
Tal remissão torna relevante, nesta matéria, o n.º 2 do artigo 29º da Declaração, quando dispõe que “ninguém está sujeito senão às limitações estabelecidas pela lei com vista exclusivamente a promover o reconhecimento e o respeito dos direitos e liberdades dos outros e a fim de satisfazerem as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar numa sociedade democrática”.
A possibilidade de recorrer à transcrita norma da Declaração Universal para justificar a admissão de limites ou condicionamentos aos direitos fundamentais na nossa ordem jurídica tem sido sustentada por não poucos autores, de entre os  quais se podem destacar JORGE MIRANDA ([42]) e VIEIRA DE ANDRADE ([43]).
E também este Conselho tem recorrido, com certa regularidade, aos critérios indicados na aludida regra da Declaração de 1948 para suprir a inexistência de uma cláusula geral de limitação dos direitos fundamentais  no acervo normativo vigente oriundo de fontes internas.
Fê-lo, nomeadamente, nos pareceres n.º 27/82, 23/86, 27/87 ([44]) e 23/95, conforme se realçou, especificamente, em “Pareceres da Procuradoria-Geral da República”, Vol. I (págs. 230-231).
É certo que a legitimidade deste procedimento argumentativo não tem deixado de, em contraponto, ser posta em causa por alguns ([45]), considerando-o incompatível com a vincada exigência, firmada no artigo 18º, n.º 2, da Constituição, no sentido de as restrições a “direitos, liberdades e garantias” terem de confortar-se em expressa autorização constitucional.
Independentemente da bondade ou não dessa posição, de que aqui e agora não cabe discutir, a verdade é  que tal crítica não abarca o tipo de direitos a que o presente parecer se refere, pois que estes se incluem nos “direitos económicos, sociais e culturais”, e não já nos “direitos, liberdades e garantias.”  
8. 
8.1 - Apresenta-se, assim, alicerçado em suporte constitucional bastante o ajustamento do “direito à formação cultural e técnica e à valorização profissional” ao estatuto específico dos militares, e, em particular, ao dever de disponibilidade que sobre eles impende.
Isto, naturalmente, desde que essa adaptação se revele proporcionada e não seja tal que acabe por descaracterizar ou defraudar o intento da norma da alínea c) do n.º 2 do artigo 58º da Constituição.
Essa justa compatibilização entre os interesses dos militares que pretendam frequentar cursos exteriores à instituição a que pertençam surge adequadamente propiciada, no que concerne à GNR, pela conjugação dos regimes constantes dos artigos 150º e 178º do Estatuto dos Militares dessa organização.
Assim é que os militares da GNR podem, “com vista à sua valorização profissional e prestígio da instituição”, frequentar “qualquer  curso complementar para a sua cultura geral ou especialização técnica”, sob a condição de essa frequência ocorrer “sem prejuízo para o serviço” (artigo 150º).
Se o militar da GNR pretender inscrever-se em curso, cadeira ou estágio cuja frequência implicaria “prejuízo para o serviço”, terá então de optar por requerer licença para estudos, a qual lhe poderá ser concedida por despacho ministerial, se se considerar que das correspondentes habilitações resulta, para além de “valorização profissional e técnica” do requerente, ainda “interesse para a Guarda” (artigos 150º, n.º 2, e 178º).
E as autoridades da GNR sabem, assim, que, durante o período da licença para estudos, não podem contar com o militar que dela beneficie para a programação das actividades da instituição a que este pertença.
8.2 – A frequência de cursos ao abrigo do artigo 150º do Estatuto em referência depende, naturalmente, da verificação, pelos competentes órgãos da GNR, de que a mesma não implica “prejuízo para o serviço”.
Por seu turno, a concessão da licença para estudos, nos termos do artigo 178º do mesmo diploma, apresenta-se como objecto de um poder discricionário ministerial.
Tal como qualquer poder discricionário, a faculdade de concessão desta licença tem de exercer-se para prossecução da finalidade ou finalidades que justificam a sua consagração.
Assim, tendo a mencionada licença de reportar-se a curso, cadeira ou estágio “de interesse para a Guarda”, este há-de aferir-se em função das atribuições próprias de tal instituição, nomeadamente tipificadas no artigo 2º da respectiva Lei Orgânica.
Essa apreciação atinente à realização de objectivos da GNR terá, como também constitui exigência específica do exercício de qualquer poder discricionário, de resultar da ponderação de todas as circunstâncias e condicionalismos relevantes de cada situação concreta.
8.3 – Do que acima se expôs decorre, pois, que o regime jurídico dos trabalhadores-estudantes, plasmado na Lei n.º 116/97, não é, enquanto tal, aplicável aos militares da GNR.
Não pode deixar de constatar-se, todavia, que o enquadramento legal em cujo âmbito lhes é proporcionada a frequência de cursos ou outras unidades de ensino exteriores à GNR – decorrente da conjugação dos artigos 150º e 178º do Estatuto que lhes é próprio – não se apresenta em oposição com as “condições de trabalho” que devem ser garantidas aos trabalhadores-estudantes, na interpretação que para esse conceito, informador da alínea f) do n.º 2 do artigo 59º da Constituição, antes se preconizou.
9.
Em conclusão:
              1ª - Aos militares da Guarda Nacional Republicana não é, em virtude do dever de disponibilidade que sobre eles impende, aplicável o regime dos trabalhadores-estudantes constante da Lei nº 116/97, de 4 de Novembro;
              2ª - Os militares da Guarda Nacional Repúblicana podem, fora do âmbito desta, frequentar cursos ou outras unidades de ensino:
                     a) Ou nos termos do artigo 150º do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Repúblicana, aprovado pelo Decreto–Lei nº 265/93, de 31 de Julho – desde que tal frequência não implique prejuízo para o serviço;
                     b) Ou, não sendo esse o caso, ao abrigo de licença para estudos, a qual só pode ser concedida, por despacho ministerial, segundo o artigo 178º do mesmo Estatuto, se se tratar de curso, cadeira ou estágio “com interesse para a Guarda e de que resulte valorização profissional e técnica” dos requerentes;
              3ª - A apreciação do “interesse para a Guarda” relevante para a concessão de licença para estudos realiza-se, face às circunstâncias de cada situação concreta, em função das atribuições próprias da Guarda Nacional Repúblicana, enunciadas, nomeadamente, no artigo 2º da respectiva Lei Orgância, aprovada pelo Decreto–Lei nº 231/93, de 26 de Junho.



VOTO

(Alberto Esteves Remédio) - vencido pelas razões que, em síntese, passo a enunciar.

1. Os direitos económicos, sociais e culturais, integrados no Título III da Parte I da Constituição - com a epígrafe «Direitos e Deveres Fundamentais» -, são direitos fundamentais.

Apesar de não beneficiarem do regime especial dos direitos liberdades e garantias (Título II) e dos direitos fundamentais de natureza análoga (artigo 17º), o direito à educação (artigo 73º, nº 1), o direito ao ensino (artigo 74º, nº 1) e, mais concretamente, o direito à protecção das condições de trabalho dos trabalhadores-estudantes [artigo 59º, nº 2, alínea f), como os anteriores, da Constituição] estão sujeitos ao regime geral dos direitos fundamentais; os direitos económicos, sociais e culturais são «direitos constitucionais a que correspondem verdadeiras obrigações do Estado, e que devem, à semelhança do que acontece com os direitos e liberdades tradicionais, ser concebidos como direitos subjectivos públicos do cidadão» (J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Fundamentos da Constituição, Coimbra Editora, 1991, pág. 129; v. também, do primeiro autor, “Tomemos a sério os direitos económicos, sociais e culturais”, em Estudos de Homenagem ao Prof. Doutor Ferrer-Correia, III, Universidade de Coimbra, 1991, págs. 464-465).

Os direitos económicos, sociais e culturais são por regra direitos a prestações em relação ao Estado ou a outras entidades (públicas ou privadas) e a sua positivação, a densificação legal da suas dimensões subjectiva e objectiva, confere-lhes operacionalidade prática. Fala-se, a este propósito, em direitos derivados a prestações, os quais, na medida em que constituem a densificação de direitos fundamentais, passam a desempenhar uma função tutelar desses direitos, «garantindo o grau de concretização já obtido. Consequentemente, eles radicam-se subjectivamente não podendo os poderes públicos eliminar, sem compensação ou alternativa, o núcleo essencial já realizado desses direitos» (GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, Coimbra, 1998, pág. 437).

Não obstante a sua natureza, os direitos económicos, sociais e culturais são invocáveis judicialmente e são susceptíveis de servir de parâmetro da constitucionalidade das normas - quer por omissão quer por acção (JORGE MIRANDA, Manual de Direito Constitucional, Tomo IV, 2ª edição, Coimbra Editora, Limitada, 1993, pág. 106); de outro modo: «as normas constitucionais consagradoras de direitos económicos, sociais e culturais implicam a inconstitucionalidade das normas legais que não desenvolvem a realização do direito fundamental ou a realizam diminuindo a efectivação legal anteriormente atingida» (GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional..., cit., págs. 436 e 813).


2. No caso concreto, a Lei nº 116/97 (como antes a Lei nº 26/81) veio concretizar o regime jurídico do trabalhador-estudante, de cuja normação destacamos os seguintes aspectos: (i) dispensa, na falta de acordo em contrário, até seis horas de trabalho semanal (artigo 3º); (ii) regime especial de exames, com direito a uma época especial e a ausentar-se para prestação de provas de avaliação (artigo 5º); (iii) regime específico quanto a férias e licenças; (iv) os trabalhadores-estudantes gozam de certo tipo de regalias nos estabelecimentos de ensino, v. g., dispensa de frequência de aulas ou de um número mínimo de disciplinas ou cadeiras e época especial de exames (artigo 8º).

Porém, a própria Lei nº 116/97 prevê alguns mecanismos de contenção - no artigo 10º enuncia casos de cessação das regalias inerentes ao estatuto do trabalhador-estudante e, no artigo 11º contempla a hipótese de a existência de excesso de candidatos à frequência de cursos comprometer o «funcionamento normal da empresa»: fixar-se-á, então, por acordo entre os trabalhadores interessados, a hierarquia e a estrutura representativa dos trabalhadores interessados, o número e as condições em que serão deferidas as pretensões apresentadas (a previsão reporta-se expressamente ao artigo 3º, mas por analogia poderá, se tal se justificar, abarcar a prestação de provas de avaliação).


3. Os oficiais, sargentos e praças da GNR são, como se demonstra no parecer, trabalhadores da função pública.

O Estado não pode simultaneamente erigir em direito fundamental o direito à protecção das condições de trabalho dos trabalhadores-estudantes, densificá-lo por via da lei ordinária, e alijar de todo, quanto a tais trabalhadores e sem fundamento material bastante, o ónus da sua concretização.

No caso presente, encontramo-nos, é certo, no âmbito das chamadas relações especiais de poder; que são susceptíveis de assumir, consoante as situações, natureza diversa. Porém, em qualquer dos estatutos ou relações especiais de poder «haverá que preservar o equilíbrio entre o respeito pela liberdade das pessoas e a prossecução dos fins institucionais, embora o grau de compressão dos direitos acompanhe a variedade das situações» (JORGE MIRANDA, ob. cit., pág. 302).

É este equilíbrio que, salvo o devido respeito, não se nos afigura ser respeitado na solução encontrada no parecer, onde, sem justificação material bastante, somos conduzidos à negação pura e simples de um direito fundamental (as vias da «valorização profissional» e da «licença para estudos», consagradas, respectivamente, nos artigos 150º e 178º do Estatuto da GNR não configuram direitos dos oficiais, sargentos e praças, mas concessões hierárquicas outorgadas sem prejuízo para o serviço e/ou com prejuízo para o beneficiário - cfr. nº 4 do segundo dos dispositivos).

Reconhecendo o esforço exegético feito no parecer na procura de um fundamento constitucional para o dever de disponibilidade expressamente consagrado no artigo 9º do Estatuto da GNR [aprovado pelo Decreto-Lei nº 265/93, emitido pelo Governo ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 201º da Constituição] , afigura-se-me que tal dever não pode assumir carácter absoluto.

Assim, os problemas de ordenação com que se depare, na prática, entre o direito fundamental à protecção das condições de trabalho dos trabalhadores-estudantes, consagrado no artigo 59º, nº 2, alínea f), da Constituição, e concretizado pela Lei nº 116/97, e o dever de disponibilidade que impende sobre os oficiais, sargentos e guardas da GNR, na articulação entre o direito fundamental e o dever, «deverão ser resolvidos à luz dos direitos fundamentais mediante uma tarefa de concordância prática e de ponderação possibilitadora da garantia dos direitos sem tornar impraticáveis os estatutos especiais» (GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional..., cit., pág. 425). A própria Lei nº 116/97 fornece, para esta tarefa, pistas não despiciendas.


4. Entendo, em suma, dentro do condicionalismo sucintamente exposto, que o Estatuto do Trabalhador-Estudante, constante da Lei nº 116/97, de 4 de Novembro, é aplicável aos oficiais, sargentos e praças da Guarda Nacional Republicana.


NOTAS

[1])   Comunicado por ofício, do Chefe do Gabinete, n.º 331, de 27 de Janeiro de 1997 (Proc. 2099/96).
[2])   Transmitidos por ofício do respectivo Chefe de Gabinete n.º. 410, e 411, ambos de 19 de Fevereiro de 1999 (Proc. 01.01-191/99 – SEAI – 476 e 01.01.-190/99 – DIAP-456).
[3])   Informação n.º 59/97, de 17 de Janeiro de 1997 (Proc. 1.4.36/1.4.45).
[4])   Datada de 9 de Abril de 1997.
[5])   Do ofício n.º 28573, de 1 de Outubro de 1996, do Chefe de Estado-Maior da GNR.
[6])   Parecer n.º 24-T/97, de 13 de Janeiro de 1997 (Pº n.º 2099/96-MAI).
[7])   Alterada pelo Decreto-Lei n.º 271/86, de 4 de Setembro.
[8])   Para a qual remete, no tocante a faltas, o Decreto-Lei n.º 100/99, de 31 de Março, respeitante ao regime de faltas, férias e licenças do funcionalismo público.
[9])   Nos termos do subsequente n.º 2, os trabalhadores por conta própria e os que frequentam cursos de formação profissional ou programas de ocupação temporária de jovens beneficiam de parte das regalias dos trabalhadores-estudantes.
[10])  Rectificado pela declaração n.º 138/93, de 31 de Julho, e alterado pelo Decreto-Lei n.º 298/94, de 24 de Novembro.
[11])  Tema “Guarda Nacional Republicana”, in “Dicionário Jurídico da Administração Pública”, págs. 119-120.
[12])  Alterado pelos Decretos-Leis nºs 298/94, de 24 de Novembro, 297/98, de 28 de Setembro, e 188/99, de 2 de Junho.
[13])  Alterada pelas Leis nºs. 41/83, de 21 de Dezembro, 111/91, de 29 de Agosto, 113/91, de 29 de Agosto, e 18/95, de 13 de Julho.
[14])  Alterada pela Lei n.º 27/91, de 17 de Julho.
[15])  Alterado, por ratificação, pela Lei n.º 27/91, de 17 de Julho, e ainda pelo Decreto–Lei n.º 157/92, de 31 de Julho, pela Lei n.º 15/92, de 5 de Agosto, e pelo Decreto–Lei n.º 175/97, de 22 de Julho.
[16])  Os militares não pertencentes ao QP apenas poderão, para o mesmo efeito, recorrer à licença registada, não remunerada (artigo 106º).
[17])  “Os direitos fundamentais dos trabalhadores e a Constituição”, Lisboa, 1985, pág. 91.
[18])  Proposta de Lei n.º 129/II, in DAR, 2ª Série, n.º 141, de 2 de Outubro de 1982.
[19])  N.º 11, no texto definitivo da Lei n.º 29/82.
[20])  Acórdão n.º 103/87, de 26 de Março de 1987 (DR, I Série, de 6 de Maio de 1987).
[21])  Opinião aliás também expressa, conquanto algo dubitativamente, por GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA (“ Constituição da República Portuguesa anotada”, 3ª ed., Coimbra, 1993, pág. 945), mas criticada, p.e., por JORGE LEITE (“Liberdade sindical dos profissionais da PSP - Notas a um acórdão”, in “Revista do Ministério Público”, ano 10º, n.º 39, pág. 24-26).
[22])  Esta observação não deixou, aliás, de ser feita já no voto de vencido que o Cons. MONTEIRO DINIS lavrou no acórdão n.º 103/87.
[23])  DAR, I Série, n.º 125, de 23 de Julho de 1982, pág. 5270.
[24])  Alterado pelas Leis nºs. 30-C/92, de 28 de Dezembro, e 25/98, de 26 de Maio.
[25])  Não publicado.
[26])  “A Constituição portuguesa e os trabalhadores - da revolução à integração na CEE”, in “Portugal - O sistema político e constitucional - 1974/87”, Lisboa, 1989, págs. 820-821.
[27])  “Sobre a proibição da liberdade sindical dos militares contida no artigo 31º, n.º 6 da Lei da  Defesa Nacional”, in “Direitos dos Militares”, Colóquio realizado pela AOFA, 1993, págs. 29-30; e também “As Forças Armadas e a PSP perante a liberdade sindical”, in “Estudos de Homenagem ao Prof. Doutor FERRER CORREIA”, Coimbra, 1991, págs. 931-932.
[28])  “As Forças Armadas e as autarquias locais na ordem jurídica portuguesa”, Coimbra, 1991, pág. 25.
[29])  “Modelos  de función publica y función pública militar”, in “La función militar en el actual Ordenamiento constitucional español”, Madrid, 1995, pág. 52.
[30])  “La función pública militar”, Madrid, 1997, págs.150-151.
[31])  DAR, II Série, de 23 de Novembro de 1982.
[32])  Na resposta governamental apresentada, na Assembleia da República, a esse veto presidencial, o Vice-Primeiro Ministro e Ministro da Defesa Nacional retorquiu que  não só “manifestamente não se aplicam aos militares os direitos dos trabalhadores”, como a norma em causa não seria “inútil porque esclarece um ponto da maior importância  que não resultaria claro se não fosse objecto de um esclarecimento expresso”.
[33])  Acrescentando que, face ao teor do artigo 269º, os militares se não deveriam considerar trabalhadores, mas sim agentes da Administração Pública – questão já antes considerada neste parecer.
[34])  Posição fortemente contestada, é certo, nos votos de vencido dos Conselheiros VITAL MOREIRA e MONTEIRO DINIS.
[35])  Encontra-se pendente na Assembleia da República (e foi nela já aprovada na generalidade – V. DAR, I Série, de 26 de Março de 1999, pág. 2394) a Proposta de Lei n.º 216/VII, que contém alterações à Lei da Defesa Nacional e das Forças Armadas.
     Concretamente quanto ao n.º 12 (anterior n.º 11) do artigo 31º, propõe-se nesse texto que ele passe a determinar que aos militares “não são aplicáveis as normas constitucionais e legais relativas aos trabalhadores quanto aos direitos sindicais, à criação de comissões de trabalhadores, ao direito à greve e aos limites de duração do trabalho.”
     Há que reconhecer que, se este texto vier a receber força legal, resultará reforçada a ideia de que os militares são trabalhadores da Administração Pública.
     Isto, ademais, se se atentar em que, na apresentação parlamentar desta Proposta de Lei, o Ministro da Defesa Nacional comentou essa norma afirmando que “as restrições aos direitos laborais passam a ser exclusivamente as que dizem respeito aos direitos sindicais, criação de comissões de trabalhadores, direito à greve e aos limites ou duração do trabalho, sendo aplicáveis aos militares as restantes normas constitucionais referentes a estes direitos (DAR, I Série, de 25 de Março de 1999).
     Em contrapartida, é bem provável que se renove, conquanto em moldes algo diversos, a discussão em torno da constitucionalidade dessa regra.
[36])  Esse dever receberá clara reafirmação, no tocante aos militares da GNR, se vier a ser aprovada a Proposta de Lei n.º 272/VII, relativa ao Regulamento Disciplinar dessa instituição, presentemente em discussão , e cujo artigo 15º é do seguinte teor (DAR, II Série-A, de 29 de Abril de 1999):
“Artigo 15º
Dever de disponibilidade
     1 – O dever de disponibilidade consiste em o militar da Guarda manter-se permanentemente pronto para o serviço ainda que com sacrifício dos interesses pessoais.
     2 – No cumprimento do dever de disponibilidade, cabe ao militar da Guarda, designadamente;
          a) Apresentar-se com pontualidade no lugar a que seja chamado ou onde deva        comparecer em virtude das obrigações de serviço;
          b) Comparecer no comando, unidade ou estabelecimento a que pertença sempre que circunstâncias especiais o exijam, nomeadamente em caso de grave alteração da ordem pública, de emergência ou de calamidade;
          c) Não se ausentar, sem a devida autorização, do posto ou local onde deva permanecer por motivo do serviço ou por determinação superior.”
[37])  “Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976”, Coimbra, 1983, pág. 249.
[38])  VIEIRA DE ANDRADE (op. cit., 250) fala, a este propósito, de “conteúdo mínimo”, noção que parece literalmente menos exigente que a de “núcleo essencial”.
     Mas a verdade é que, se o “núcleo essencial “ do direito é atingido, dificilmente se poderá continuar a admitir a subsistência deste.
[39])  “Manual de Direito Constitucional”, T.IV, “Direitos Fundamentais”, Coimbra, 2ª ed., 1993, págs. 301 e segs.
[40])  “Este Conselho já teve ensejo, recentemente (Parecer n.º 17/98, de 2 de Dezembro de 1998, não publicado), de também qualificar de “relação especial de poder” a que se estabelece entre o Estado e os militares.
[41])  ”Dicionário Jurídico da Administração Pública”, tema “Restrições aos direitos, liberdades e garantias”, pág. 284.
[42])  “Estudos ...”, págs. 66 e segs.; “Manual ...” págs. 271 e segs.; “Direitos Fundamentais”, in “Dicionário Jurídico da Administração Pública”, pág. 81.
[43]) Op. cit., pág. 231-232.
[44])  No parecer n.º 27/87 não deixou de se reconhecer a existência de certa dificuldade de articulação dos princípios constantes do artigo 29º, n.º 2 da Declaração Universal com o teor da Lei Fundamental.
[45])  Nomeadamente VITAL MOREIRA e GOMES CANOTILHO, “Constituição ...” pág. 139; CASALTA NABAIS, “Os direitos fundamentais na jurisprudência do Tribunal Constitucional”, Coimbra, 1990, págs. 21-22.
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART73 ART74.
ART18 ART58 ART59 ART269 ART270 ART271.
L 26/81 DE 1981/08/21.
L 271/86 DE 1986/09/04.
EMGNR93 ART9 ART14 ART150 ART178 ART170 ART72.
L 116/97 DE 1997/11/04 ART2 ART3 ART5.
L 29/82 DE 1982/12/11 ART31.
DL 497/88 DE 1988/12/30.
DL 100/99 DE 1999/03/31.
DL 231/93 DE 1993/06/26 ART2.
L 20/87 DE 1987/06/12.
L 8/91 DE 1991/04/01.
L 11/89 DE 1989/06/01 ART2 ART7 ART12.
EMFA90 ART12 ART83 ART212 ART221.
DL 184/89 DE 1989/06/02.
Referências Complementares: 
DIR ADM * ADM PUBL * FUNÇÃO PUBL * GARANT ADM / DIR CONST * DIR FUND / DISC MIL / DIR TRAB.*****
DUDH ART29
Divulgação
Data: 
20-05-2001
Página: 
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