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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
73/1993, de 14.01.1994
Data do Parecer: 
14-01-1994
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Administração Interna
Relator: 
PADRÃO GONÇALVES
Descritores e Conclusões
Descritores: 
GNR
MILITAR
PRAÇA
SERVIÇO MILITAR
CRIME ESSENCIALMENTE MILITAR
DISPENSA DE SERVIÇO
PENA DE PRISÃO
PENA MILITAR
CUMPRIMENTO DE PENA
SERVIÇO MILITAR EFECTIVO
QUADRO PERMANENTE
RESERVA TERRITORIAL
REINTEGRAÇÃO
LACUNA
ANALOGIA
Conclusões: 
1 - Por aplicação analógica dos ns 4 e 5 do artigo 40 da Lei n 30/87, de 7 de Julho, os ex-militares da Guarda Nacional Republicana, abatidos definitivamente aos quadros da Guarda, por "dispensa do serviço", e imediatamente transferidos para o ramo das Forças Armadas da sua procedência, nos termos dos artigos 74, n 1, 75 e 94, alínea c), do Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei n 265/93, de 31 de Julho, devem ser convocados para regressar ao serviço militar efectivo, se condenados em penas de presídio militar, prisão militar ou prisão disciplinar, por terem praticado infracção disciplinar ou crime essencialmente militar quando ainda prestavam serviço nos quadros permanentes daquela Corporação;
2 - As despesas com esse regresso ao serviço militar efectivo, incluindo as decorrentes do cumprimento dessas penas de prisão nos estabelecimentos prisionais militares, devem ser suportadas pelos competentes serviços do respectivo ramo das Forças Armadas.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Ministro da Administração Interna,
Excelência:
 
 
1.
 
1.1. O Comando Geral da Guarda Nacional Republicana apresentou a V. Exª a seguinte questão (1):
"1. O artº 38º do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana (Decreto-Lei nº 465/83, de 31 de Dezembro) preceitua que os militares que forem dispensados do serviço da GNR "são abatidos definitivamente aos quadros da Guarda, sendo imediatamente transferidos para o ramo das Forças Armadas, conforme a sua procedência..."
"2. Ora, tem-se verificado, com inusitada frequência, que os militares dispensados do serviço da Guarda (por terem cometido infracções que, concomitantemente, consubstanciam ilícitos de natureza penal) vêm, mais tarde, a ser condenados em penas de presídio militar.
"Pareceria, à primeira vista, que o problema estaria resolvido por força da aplicação do artº 38º do EMGNR, isto é, o ex-militar cumpriria aquela pena em estabelecimento prisional militar, sob a direcção do ramo das Forças Armadas para o qual havia sido transferido, aquando da sua dispensa do serviço.
"Porém, esta solução nunca foi adoptada, por não ser pacífico o entendimento que os respectivos ramos das FA têm daqueles preceitos. Na verdade, sempre chamaram a atenção para o que se encontra preceituado no nº 2 do artº 3º do Decreto Lei. nº 179/78, de 15 de Julho, bem como no artº 46º do Código de Justiça Militar que, expressamente, referem:
"... regressará automaticamente ao serviço efectivo com o trânsito em julgado da decisão condenatória". Ora, esse "regresso ao serviço" é entendido como o regresso ao serviço...da Guarda. Logo, à Guarda compete, nomeadamente, o encargo financeiro com a prisão do militar.
"Assim e face a essa circunstância, a GNR tem vindo a reintegrar aqueles militares até ao cumprimento das respectivas penas, momento a partir do qual regressam à sua anterior situação - dispensados do serviço.
"3. Porque a questão suscitada não o é meramente de natureza burocrática e porque o órgão financeiro desta Guarda tem levantado o problema, em termos de irresponsabilidade no custeamento das despesas com a prisão, solicita-se a V. Exª a emissão de um parecer que, contendo disciplina processual, transitória ou definitivamente, ponha fim ao conflito".
 
1.2. A Auditoria Jurídica do M.A.I. veio a pronunciar-se sobre a questão posta (parecer nº 201-R/91, de 25/9/91), concluindo nos seguintes termos:
"I- Em consonância com o disposto no artigo 38º, nº 1, al. c), do Estatuto do Militar da Guarda Nacional Republicana - texto aprovado pelo Decreto-Lei nº 465/83, de 31 de Dezembro -, os militares da Guarda Nacional Republicana, que sejam dispensados do seu serviço, são abatidos definitivamente aos quadros daquela Força de Segurança, sendo imediatamente transferidos para o ramo das Forças Armadas, conforme a sua procedência, ingressando, do mesmo passo, no escalão que lhes pertencer;
"II - Por força da normação contida no Código de Justiça Militar, os indivíduos que detenham a qualidade de militares, caso cometam um crime previsto e punido por aquele diploma - crimes essencialmente militares -, devem ser julgados como militares que são, independentemente da situação em que se encontrem perante a prestação do serviço militar (maxime, art. 46º do Código de Justiça Militar, conjugado com a Lei do Serviço Militar - aprovada pela Lei nº 30/87, de 7 de Julho -, particularmente com os seus artigos 1º a 7º);
"III - Os ex-militares da Guarda Nacional Republicana que tenham sido transferidos para um ramo das Forças Armadas e ingressado na reserva de disponibilidade e licenciamento, em um qualquer dos dois escalões que esta situação comporta (disponibilidade e tropas licenciadas), em execução do disposto no artigo 38º, nº 1, al. c), do Estatuto do Militar da Guarda Nacional Republicana, caso venham a ser condenados em pena de presídio militar, pelo cometimento de um crime essencialmente militar, devem cumprir tal pena em estabelecimento prisional militar, e sob a direcção do ramo das Forças Armadas para que transitaram; e tal, ainda que aquele crime tenha sido praticado durante o período de tempo em que o seu agente esteve ao serviço da Guarda Nacional Republicana;
"IV - Os militares da Guarda Nacional Republicana que sejam dispensados do seu serviço e que percam, por qualquer causa, a qualidade de militares, face ao ordenamento instituído pela Lei do Serviço Militar - Lei nº 30/87, citada -, caso venham a ser julgados pela prática de um crime previsto e punido pelo Código de Justiça Militar, devem-no ser na qualidade de indivíduos não militares, em obediência ao disposto no artigo 46º do diploma acabado de citar".
 
1.3. Transmitido este parecer à G.N.R., e consultado o Ministério da Defesa Nacional "com vista à obtenção da sua anuência para o procedimento preconizado no parecer", pelo Secretário de Estado da Defesa Nacional foi entendido e mandado informar (2) que:
"[...] para efeitos da clarificação sobre qual é a entidade responsável pelos encargos resultantes do cumprimento de uma pena em presídio militar por um ex-agente da GNR, condenado posteriormente à dispensa de serviço, por infracção disciplinar ou crime essencialmente militar, os pareceres jurídicos emitidos sobre o assunto não geram evidência interpretativa.
"Afigura-se estar na base dos entendimentos divergentes a definição do conteúdo e alcance de certas expressões contidas na lei, como sejam: o sentido a dar à "transferência para o ramo de origem", aquando da dispensa de serviço do agente da GNR; a aplicabilidade ao agente da GNR do conceito de "serviço militar efectivo"; a análise de se o conceito de qualidade de militar" é aplicado aos membros das FA e da GNR de modo unívoco.
"Pela análise do processo, conclui-se que a GNR tem suportado os encargos acima referidos até há cerca de dois anos atrás.
"Assim, face à dificuldade em decidir com suporte firme na actual redacção da lei sugere-se que os casos eventualmente ainda pendentes sejam solucionados de acordo com o procedimento seguido até à suscitação da questão em análise (suporte dos encargos pela GNR) e se clarifique o texto legal para precaver dúvidas futuras na matéria".
 
1.4. A Auditoria Jurídica do M.A.I. voltou a pronunciar-se (parecer nº 379-R/93, de 29 de Setembro) sobre a matéria em causa, tendo em conta a posição do M.D.N. e os novos diplomas - Decretos-Leis nºs 231/93, de 26 de Junho, e 265/93, de 31 de Julho - que aprovaram, respectivamente, a Lei Orgânica da G.N.R. e o Estatuto dos Militares da G.N.R., revogando expressamente as anteriores Lei Orgânica e Estatuto dos Militares desta Força de Segurança.
Escreveu-se nesse parecer:
"8. Os actuais diplomas estatutários relativos à Guarda Nacional Republicana continuam a consagrar, à semelhança dos que os antecederam, a figura da "dispensa do serviço".
"Em sede geral, a medida vem prevenida relativamente aos militares dos quadros permanentes daquela Força de Segurança, prevendo-se, agora, a possibilidade da sua ocorrência quer a pedido dos próprios interessados, quer por iniciativa da Administração, cabendo, neste caso, o impulso processual ao comandante-geral da Guarda Nacional Republicana (maxime, art. 84º da Lei Orgânica da Guarda Nacional Republicana e artigos 74º e 75º, ambos do Estatuto dos Militares, citado).
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"9. Em conformidade com o nº 4 do artigo 75º do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana - artigo que regula a dispensa por iniciativa do comandante-geral (daquela Força de Segurança) -, a dispensa do serviço origina o abate aos quadros e perda dos direitos de militar da Guarda, sem prejuízo da concessão da pensão de reforma nos termos da lei.
"10. Ora, face ao disposto naquele normativo - preceito que manda abater aos quadros da Guarda os militares daquela Força de Segurança que sejam destinatários de uma medida de dispensa de serviço, adoptada no quadro definido naquele artigo 75º do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana -, crê esta Auditoria Jurídica não existirem razões de fundo que impliquem uma modificação das conclusões que se alcançaram no nosso mencionado parecer nº 201-R/91.
"11. Pelo que precede, duas soluções se mostram possíveis:
a) Ou se encara a publicação de uma medida legislativa adequada, visando pôr fim às diferentes teses antagónicas sobre a matéria em questão - maxime, sobre a entidade que deve suportar os encargos inerentes à execução da pena de presídio militar, a que sejam sujeitos ex-militares da Guarda Nacional Republicana, que tenham sido destinatários da aplicação de uma medida de dispensa do serviço daquela Força de Segurança, por inciativa da Administração [...]; ou,
b) Solicita-se à Procuradoria-Geral da República que, através do seu Conselho Consultivo, emita parecer sobre a questão acima referida".
 
1.5. Tendo V. Exª concordado em se solicitar a esta Procuradoria-Geral "um parecer clarificador - devendo, entretanto, "a G.N.R. continuar a suportar os encargos" -, cumpre prestar, por este corpo consultivo, o parecer em vista.
 
2.
2.1. Dispunha o questionado artigo 38º do referido E.M. G.N.R., aprovado pelo Decreto-Lei nº 465/83, de 31 de Dezembro de 1983 (3):
"1. São abatidos definitivamente aos quadros da Guarda, sendo imediatamente transferidos para o ramo das Forças Armadas, conforme a sua procedência, ingressando no escalão que lhes pertencer, os militares que:
a) Sejam julgados incapazes de todo o serviço e não possam transitar para a situação de reforma;
b) Tenham sofrido a pena acessória de demissão;
c) Sejam dispensados do serviço da Guarda (4);
2. São igualmente abatidos definitivamente aos quadros da Guarda, sendo os seus documentos enviados ao órgão de recrutamento próprio, os militares que tenham sofrido a pena acessória de expulsão".
 
O referido Estatuto, nos termos do nº 1 do artigo 1º, aplicava-se aos "oficiais, sargentos e praças em qualquer situação do quadro permanente da G.N.R." (5).
Nos termos do artigo 28º desse Estatuto, o "militar da Guarda" podia, em função da disponibilidade para o serviço, encontrar-se numa das seguintes posições: a) Activo; b) Reserva; c) Reforma".
O artigo 37º referia-se às condições de permanência no activo e na efectividade de serviço: não podia continuar no activo, nem na efectividade de serviço, o militar que não conviesse ao serviço da Guarda ou que se comprovasse não possuir qualquer das condições referidas no nº 1º; a decisão de impôr ao militar a saída do activo e da efectividade de serviço carecia de parecer favorável do Conselho Superior da Guarda (nº 5).
Note-se que normas afins se encontravam no Estatuto dos Oficiais das Forças Armadas (Decreto-Lei nº 46672, de 29 de Novembro de 1965) e no Estatuto do Oficial do Exército (Decreto-Lei nº 176/71, de 30 de Abril) -,diplomas revogados pelo Decreto-Lei nº 34-A/90, de 24 de Janeiro, que aprovou o actual Estatuto dos Militares das Forças Armadas - ao determinarem a separação do serviço dos oficiais que "por motivo disciplinar ou pela prática de actos atentatórios do prestígio das instituições militares, devessem ser afastados das forças armadas" ou "do exército", respectivamente.
 
2.2. O Decreto-Lei nº 265/93, de 31 de Julho, aprovou o actual Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana, aplicável, nos termos do seu artigo 1º, nº 1, aos "oficiais, sargentos e praças, em qualquer situação, dos quadros da G.N.R" (6).
Nos termos do nº 1 do artigo 2º dos Estatutos, "militar da Guarda" é aquele que, tendo ingressado nesta força de segurança, se encontre vinculado à Guarda com carácter de permanência ou nela preste serviço voluntariamente".
"Ao militar da Guarda são aplicáveis o Código de Justiça Militar (CJM), o Regulamento de Disciplina Militar (RDM), o Regulamento de Continências e Honras Militares (RCHM) e o Regulamento da Medalha Militar (RMM), com os ajustamentos adequados às características estruturais deste corpo militar e constantes dos respectivos diplomas legais" - artigo 5º, nº 1.
"1- O recrutamento para os quadros da Guarda é feito por concurso de admissão nos termos deste Estatuto e demais legislação complementar (7).
2- A prestação temporária de serviço na Guarda por militares das Forças Armadas é feita mediante requisição ao ramo respectivo, sem prejuízo dos casos expressamente previstos nos Estatutos dos Militares das Forças Armadas e da Guarda Nacional Republicana" - artigo 52º, nºs 1 e 2.
"O militar da Guarda pode, em função da disponibilidade para o serviço, encontrar-se numa das seguintes situações: a) Activo; b) Reserva; c) Reforma", enquanto que "o oficial das Forças Armadas em serviço na Guarda só pode encontrar-se nas situações de activo e de reserva na efectividade de serviço" - artigo 62º, nºs 1 e 2.
"Activo é a situação em que o militar dos quadros da Guarda se encontra afecto ao serviço efectivo ou em condições de ser chamado ao seu desempenho e não tenha sido abrangido pelas situações previstas para a reserva e reforma"; "o militar dos quadros da Guarda no activo pode encontrar-se na efectividade ou fora da efectividade de serviço" - artigo 63º.
O nº 1 do artigo 74º do referido Estatuto prevê a dispensa do serviço, a requerimento do "militar dos quadros da Guarda", perdendo, nesse caso, "todos os direitos inerentes à qualidade de militar, o que implica, nomeadamente, o abate aos quadros da Guarda e a impossibilidade de readmissão".
O artigo 75º, correspondente (em parte) ao artigo 38º do anterior Estatuto, dispõe nos seguintes termos:
"1- Não pode continuar no activo nem na efectividade de serviço o militar dos quadros da Guarda cujo comportamento se revele incompatível com a condição de "soldado da lei" ou que se comprove não possuir qualquer das seguintes condições:
a) Bom comportamento militar e cívico;
b) Espírito militar;
c) Aptidão técnico-profissional.
2- O apuramento dos factos que levam à invocação da falta de condições referidas no número anterior é feito através de processo próprio de dispensa de serviço ou disciplinar.
3- A decisão de impor ao militar a saída do activo e da efectividade de serviço é da competência do Ministro da Administração Interna sob proposta do comandante-geral, ouvido o Conselho Superior da Guarda.
4- A dispensa do serviço origina o abate aos quadros e a perda dos direitos de militar da Guarda, sem prejuízo da concessão da pensão de reforma nos termos da lei".
E dispõe o artigo 94º, recolhendo a disciplina que já vinha do referido artigo 38º do Estatuto anterior:
"É abatido definitivamente aos quadros da Guarda, sendo imediatamente transferido para o ramo das Forças Armadas da sua procedência, o militar que: [...] c) Seja dispensado do serviço da Guarda; [...]."
Refira-se, nesta parte, que os citados artigos 74º e 75º estão em consonância com o artigo 94º da actual Lei Orgânica da G.N.R., aprovada pelo Decreto-Lei nº 231/93, de 26 de Junho, que prevê a "dispensa do serviço dos militares dos quadros permanentes da Guarda", a pedido dos próprios ou por iniciativa do comandante-geral".
2.3. A referida Lei Orgânica define a G.N.R. - artigo 1º - como "uma força de segurança constituída por militares organizados num corpo especial de tropas" (8).
Estes "militares" - sujeitos ao Código de Justiça Militar, ao Regulamento de Disciplina Militar, ao Regulamento de Continências e Honras Militares e ao Regulamento da Medalha Militar (artigos 92º, nº 1, da citada Lei Orgânica, e 5º, nº 1, do Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei nº 265/93) (9) - são recrutados, como logo se depreendia do citado artigo 94º do actual Estatuto dos Militares da G.N.R., entre os militares das Forças Armadas, de onde provêm.
Veja-se o artigo 271º desse Estatuto:
"O recrutamento para soldados dos quadros da Guarda é feito entre as praças e sargentos das Forças Armadas que cumpriram o serviço efectivo normal, nos termos previstos na Lei do Serviço Militar e do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, mediante requerimento dirigido ao comandante-geral" (10).
De onde resulta claramente não coincidirem, por abrangerem diferente pessoal, os conceitos de "militar da Guarda" e "militar das Forças Armadas", sendo os primeiros recrutados, em geral, entre os segundos.
Por interessar à economia do parecer, como adiante melhor se compreenderá, importa proceder a uma breve análise da Lei do Serviço Militar e do Estatuto dos Militares das Forças Armadas.
 
2.4. Nos termos do nº 4 do artigo 1º da Lei nº 30/87, de 7 de Julho (Lei do Serviço Militar), na redacção da Lei nº 22/91, de 19 de Junho, "todos os cidadãos portugueses dos 18 aos 35 anos de idade estão sujeitos ao serviço militar e ao cumprimento das obrigações militares dele decorrentes".
"O serviço militar abrange as seguintes situações: a) Reserva de recrutamento; b) Serviço efectivo; c) Reserva de disponibilidade e licenciamento; d) Reserva territorial" - artigo 2º.
"A reserva de recrutamento é constituída pelos cidadãos sujeitos a obrigações militares desde o recenseamento militar até à sua incorporação ou alistamento" - artigo 3º.
" Serviço efectivo é a situação dos cidadãos enquanto permanecem ao serviço nas Forças Armadas" - nº 1 do artigo 4º.
"Na reserva de disponibilidade e licenciamento são incluídos todos os cidadãos que prestaram serviço efectivo, a partir da data em que cessaram essa prestação". "A reserva de disponibilidade e licenciamento compreende dois escalões: a) Disponibilidade; b) Tropas licenciadas" - nºs 1 e 2 do artigo 5º.
"Disponibilidade é o escalão que abrange o período de seis anos subsequentes ao termo do serviço efectivo e destina-se a permitir o aumento dos efectivos das Forças Armadas, por convocação ou mobilização, até aos quantitativos tidos por adequados" - nº 3 do artigo 5º.
"As tropas licenciadas constituem o escalão seguinte ao de disponibilidade, o qual termina em 31 de Dezembro do ano em que os cidadãos completem 35 anos de idade, e destina-se a permitir o aumento dos efectivos das Forças Armadas até ao limite normal da capacidade de mobilização do País" - nº 4 do artigo 5º, na redacção da Lei nº 22/91.
"A reserva territorial é constituída pelos cidadãos que, não tendo cumprido o serviço efectivo, se mantêm sujeitos a obrigações militares" - artigo 6º da Lei nº35/87, como os anteriormente citados (11).
 
2.5. O Estatuto dos Militares das Forças Armadas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 34-A/90, de 24 de Janeiro, e aplicável aos "militares das Forças Armadas em qualquer situação e forma de prestação de serviço" - artigo 2º -, dispõe no artigo 3º, na redacção do Decreto-Lei nº 157/92, de 31 de Julho, que "as formas de prestação de serviço efectivo são as seguintes: a) Serviço efectivo nos quadros permanentes (QP); b) Serviço efectivo normal; c) Serviço efectivo em regime de voluntariado (RV); d) Serviço efectivo em regime de contrato (RC); e) Serviço efectivo decorrente de convocação ou mobilização".
Nos termos do artigo 4º, "é militar dos Quadros Permanentes (QP) o que, tendo ingressado voluntariamente na carreira militar e adquirido formação profissional adequada ao seu exercício, se encontra vinculado às forças armadas com carácter de permanência".
Resulta do artigo 6º que o serviço efectivo normal (SEN) é o que decorre desde "o acto da incorporação até à data de passagem à situação de disponibilidade ou o ingresso noutra forma de serviço efectivo", isto relativamente ao militar "conscrito ao serviço militar ou voluntário".
O artigo 166º prevê, no nº 1, que o militar dos Quadros Permanentes cujo comportamento, em processo próprio, se revele incompatível com a permanência no activo e na efectividade de serviço, pela prática de actos atentatórios do prestígio da instituição militar, "transita compulsivamente para a situação de reforma, se reunir as condições legais para o efeito, ou é separado do serviço".
O conceito de "separação de serviço" consta do artigo 32º do Regulamento de Disciplina Militar, aprovado pelo Decreto-Lei nº 142/77, de 9 de Abril, nos seguintes termos: "A separação de serviço consiste no afastamento definitivo de um militar do exercício das suas funções, com perda da sua qualidade de militar, ficando privado do uso de uniforme, distintivos ou insígnias militares, com a pensão de reforma que lhe couber" (12).
 
3.
3.1. Aproximemo-nos da questão posta - essencialmente a de saber qual a entidade que suporta as despesas decorrentes do cumprimento das penas de presídio militar, de prisão militar ou prisão disciplinar, impostas aos ex-mi-litares da G.N.R.", abatidos aos "quadros da Guarda", por "dispensa do serviço, quando condenados por crime previsto no Código de Justiça Militar.
 
3.2. Da antecedente exposição resulta que a G.N.R. é uma força de segurança constituída por "militares" organizados num corpo especial de tropas, sujeitos ao Código de Justiça Militar e ao Regulamento de Disciplina Militar.
Esses "militares da Guarda" são recrutados, em geral, entre os militares das Forças Armadas que, em regra, cumpriram o "serviço efectivo normal" - cfr. nota (10) -, nos termos previstos na Lei do Serviço Militar e no Estatuto dos Militares das Forças Armadas.
De onde resulta, como já se notou, serem distintos os conceitos de "militar da Guarda" e "militar das Forças Armadas", sendo os primeiros em geral, provenientes de um dos ramos das Forças Armadas (Marinha, Exército ou Força Aérea).
O "militar dos quadros permanentes da Guarda", a seu pedido ou por iniciativa do comandante--geral, pode ser "dispensado do serviço" - artigos 74º, 75º e 94º do Estatuto dos Militares da G.N.R. e artigo 94º da Lei Orgânica da G.N.R..
Nesse caso, o "militar da Guarda" é "abatido definitivamente aos quadros da Guarda", com impossibilidade de readmissão - artigos 74º, nº 1, e 75º, nº 1, do citado Estatuto -, e "transferido para o ramo das Forças Armadas da sua procedência", perdendo, consequentemente, todos os direitos inerentes à qualidade de "militar da Guarda", sem prejuízo da concessão de pensão de reforma, nos termos da lei".
 
3.3. Sendo os "militares da Guarda", quando "dispensados", "transferidos para o ramo das Forças Armadas da sua procedência" (13), importa saber qual a "situação" e "escalão" que irão ocupar nas Forças Armadas.
Vimos que todos os cidadãos portugueses estão sujeitos ao serviço militar e ao cumprimento das obrigações militares dele decorrentes, dos 18 aos 35 anos (nº 4 do artigo 1º da Lei nº 30/87, na redacção da Lei nº 22/91).
O citado artigo 2º da Lei nº 30/87 elenca quatro "situações" de serviço militar. Para duas dessas situações não poderão os "militares da Guarda dispensados" ser "transferidos": para a "reserva de recrutamento", visto que tais "cidadãos" já antes tinham sido incorporados ou alistados na reserva territorial; e para o "serviço efectivo", a que, de facto, não poderão ficar sujeitos por cumprimento anterior ou por terem sido colocados na "reserva territorial".
Os oficiais da Guarda "dispensados" serão, assim, "transferidos" para a "reserva de disponibilidade e licenciamento", ou para a "reserva territorial", conforme o caso (14), enquanto os soldados e os sargentos, que já tinham cumprido o serviço (militar) efectivo normal - artigos 271 e 243º do Estatuto dos Militares da G.N.R.-, apenas podem ser transferidos para a "reserva de disponibilidade e licenciamento", que compreende dois escalões, o de "disponibilidade e o de tropas licenciadas (artigo 5º da Lei nº 30/87).
Evidentemente que essa "transferência" só poderá operar-se enquanto os ex-militares da Guarda não perfizerem os 35 anos - cfr. os artigos 1º, nº 4 e 5º, nº 4, da Lei nº 30/87 -, pois, a partir dessa idade, deixam de estar sujeitos ao serviço militar e ao cumprimento das obrigações militares dele decorrentes, isto é, deixam de ser "militares das Forças Armadas", passando a "não militares", a "civis".
 
3.4. Dispõe o artigo 1º do Código de Justiça Militar:
"1. O presente Código aplica-se aos crimes essencialmente militares.
2. Consideram-se crimes essencialmente militares os factos que violem algum dever militar ou ofendam a segurança e a disciplina das forças armadas, bem como os interesses militares da defesa nacional, e que como tal sejam qualificados pela lei militar".
Os ex-militares da Guarda - a quem é aplicável o Código de Justiça Militar - podem ter praticado crimes essencialmente militares antes de serem "abatidos" aos quadros da Guarda.
Se vierem a ser condenados depois desse "abate", há que observar a norma do artigo 46º do Código de Justiça Militar, se tiverem deixado de ser militares das Forças Armadas, nos termos e pelas razões atrás expostas.
Dispõe este artigo 46º, na redacção do Decreto-Lei nº 146/82, de 28 de Abril:
"1. Quando algum indivíduo não militar for condenado por crime previsto neste Código, as penas militares estabelecidas para esse crime serão substituídas pelas seguintes: [...].
................................................................................................." (15).
As "penas militares" serão substituídas por penas "não militares" nos termos fixados nas quatro alíneas dessa disposição.
Anotando esta disposição, escrevem Silvino Villa Nova, Luciano Patrão e outros (16):
"De notar que esta disposição, tal como o art. 59º do anterior Código, limita o seu campo de aplicação a "indivíduos não militares", isto é a indivíduos que não pertençam a qualquer dos escalões das Forças Armadas.
"Estão, pois, nessa hipótese os que nunca prestaram serviço militar, os isentos, os excluídos ou expulsos, bem como os que tiveram baixa de serviço. Todos eles são tidos como civis, por não terem tido ou terem perdido a qualidade de militares.
"Mas já não estão nessa mesma hipótese, e, portanto, não são abrangidos por este artigo, os militares que deixaram a efectividade de serviço e transitaram de escalão nas Forças Armadas. Eles não deixam de ser militares, não perderam o vínculo que os une às Forças Armadas, não obstante as suas obrigações para com estas e a sua sujeição à disciplina militar - à qual continuam subordinados (cfr. art. 5º, nº 1, alínea b) e nº 3 do Regulamento de Disciplina Militar) - serem em grau menor do que quando estavam nas fileiras (cfr. artigos. 39º, nºs 4 e 5, e 46º da Lei do Serviço Militar, aprovado pela Lei nº 2135, de 11 de Julho de 1968).
"Estes últimos serão julgados, pois, como militares que são, sendo indiferente ao tribunal que estejam na efectividade de serviço, na disponibilidade ou licenciados.
"O Decreto-Lei nº 179/78, de 15 de Julho, veio confirmar esta doutrina".
E se os "ex-militares da Guarda" vierem a ser condenados em penas militares, tendo conservado a sua qualidade de "militares das Forças Armadas", nos termos apontados?
 
3.5. Dispôs o Decreto-Lei nº 179/78, de 15 de Julho:
"Considerando que, face ao actual Código de Justiça Militar, é indiferente ao foro militar que os militares sujeitos a julgamento se encontrem ou não na efectividade de serviço;
"Considerando que, transitoriamente, o foro militar é ainda competente para conhecer dos crimes comuns praticados por militares antes da vigência do actual Código de Justiça Militar;
"Considerando, por fim, a necessidade de manter ou fazer regressar ao serviço efectivo o militar não pertencente aos quadros permanentes para cumprimento, em estabelecimento militar adequado, de sentença condenatória em pena de presídio ou prisão militar;
............................................................................................................
"Artigo 1º O militar não pertencente aos quadros permanentes que, à data em que deva terminar o cumprimento do serviço efectivo ou serviço militar obrigatório, tenha pendente processo em que seja suspeito ou arguido de crime da competência do foro militar terá, naquela data, passagem à disponibilidade. a licenciado ou à reserva dos quadros de complemento, salvo se estiver em regime de prisão preventiva.
"Art. 2º- 1- O militar não pertencente aos quadros permanentes que, à data em que deva terminar o cumprimento do serviço efectivo ou serviço militar obrigatório, tenha pendente processo em que seja suspeito ou arguido de crime da competência do foro civil terá, naquela data, passagem à disponibilidade, a licenciado ou à reserva dos quadros de complemento.
"2- O militar nas condições do número anterior que se encontre em regime de prisão preventiva será, após a mudança da situação, transferido para o estabelecimento prisional civil competente.
"Art. 3º- 1- Depois de deduzida a ordem para a acusação, o Chefe do Estado-Maior poderá, por sua iniciativa ou a solicitação da autoridade militar ou judicial competente, determinar o regresso ao serviço efectivo do militar nas situações de disponibilidade, licenciado ou da reserva dos quadros de complemento que tenha pendente processo por crime essencialmente militar cometido na efectividade de serviço.
2 - O militar nas condições do número anterior que não for convocado para regressar ao serviço e vier a ser condenado em pena de presídio militar ou de prisão militar regressará automaticamente ao serviço efectivo com o trânsito em julgado da decisão condenatória.
............................................................................................................"
E dispôs o artigo 40º, nºs 4, 5 e 6, da citada Lei do Serviço Militar (Lei nº 30/87), que, nos termos do nº 1 do seu artigo 43º, entrou em vigor com o respectivo diploma regulamentar, o subsequente Decreto-Lei nº 463/88, de 15 de Dezembro:
"4 - São convocados para regressar ao serviço militar efectivo os cidadãos sujeitos a obrigações militares, na disponibilidade ou nas tropas licenciadas, que hajam praticado infracção disciplinar ou crime essencialmente militar durante a prestação de serviço militar efectivo, a fim de cumprirem a pena correspondente, quando esta for aplicada posteriormente à sua passagem à disponibilidade.
"5- O indivíduo nas condições do número anterior regressa automaticamente ao serviço militar efectivo com o trânsito em julgado da decisão judicial condenatória que aplique pena de presídio militar, prisão militar ou prisão disciplinar.
"6 - Fora dos casos referidos no número anterior, a convocação referida no nº 4 é ordenada pelo Chefe do Estado-Maior do respectivo ramo das Forças Armadas."
Analisando as antecedentes normas do Decreto-Lei nº 179/78 e da Lei nº 30/87 verifica-se, sem margem para dúvidas, que apenas abrangem, na sua previsão, os militares das Forças Armadas, pela prática de crime essencialmente militar (artigos 1º e 3º, nº 1, do Decreto-Lei nº 179/78, e 40º, nº 4, da Lei nº 30/87), ou de infracção disciplinar (citado artigo 40º, nº 4) (17), "durante a prestação de serviço militar efectivo" ou "efectividade de serviço" (citados artigos 3º, nº 1, do Decreto-Lei nº 179/78, e 40º, nº 4, da Lei nº 30/87), isto para além de o artigo 2º do Decreto-Lei nº 179/78 também prever a situação decorrente da prática de crime da competência do foro comum, questão que não interessa à economia do presente parecer.
Trata-se, manifestamente, de infracções cometidas antes de esses militares (das Forças Armadas) passarem à disponibilidade, a licenciados ou à reserva dos quadros de complemento (na linguagem da anterior Lei do Serviço Militar (Lei nº 2135, de 11 de Julho de 1968) ou à reserva de disponibilidade e licenciamento (na linguagem da actual Lei do Serviço Militar, a Lei nº 30/87). Se esses "militares" vierem a ser condenados - nesses casos, em penas militares -, regressarão automaticamente ao "serviço militar efectivo", até ao cumprimento da pena, sem prejuízo do que se dispõe nos nºs 2 e 3 do artigo 46º do C.J.M. (cfr. nota (15)).
São tão evidentes tais conclusões, face aos textos legais em causa, que nos dispensamos de mais amplas considerações.
Por outro lado, verifica-se que entre o nº 2 do artigo 3º do Decreto-Lei nº 179/78 e os nºs 4 e 5 do artigo 40º da Lei nº 30/87 há apenas diferenças de ordem formal, para além da "actualização" das situações dos militares que devem regressar à efectividade, ao serviço militar efectivo.
Deve por isso concluir-se que os nºs 4 e 5 do artigo 40º da Lei nº 30/87 revogaram, por substituição, o nº 2 do artigo 3º do Decreto-Lei nº 179/78, embora com o mesmo sentido, atrás exposto.
Assim sendo, cabe perguntar: será possível aplicar estas normas - como pretende a Auditoria Jurídica do M.A.I. - aos militares da Guarda, entretanto "dispensados" do serviço e imediatamente "transferidos" para as Forças Armadas, pela prática de infracções disciplinares ou crimes essencialmente militares enquanto ao serviço da Guarda? Em que termos e com que fundamento legal?
 
3.6. Recapitulando, tenhamos em conta, nos termos e para os efeitos da consulta, que os ex-militares da Guarda praticaram essas infracções antes de "dispensados do serviço" e de "transferidos para o ramo das Forças Armadas da sua procedência", por terem idade até aos 35 anos, pelo que, em conformidade com o exposto -, por não serem, à data da prática das infracções, militares das Forças Armadas na efectividade de serviço -, não lhes são directamente aplicáveis as normas dos nºs 4, 5 e 6 do artigo 40º da Lei nº 30/87.
Por outro lado, pelo facto de serem, à data da condenação, militares das Forças Armadas, embora não em efectividade de serviço, também não lhes é aplicável o disposto no artigo 46º do Código de Justiça Militar, pelo que, em consequência, os mesmos devem ser condenados com penas ditas "militares", a cumprir em estabelecimentos prisionais militares.
O cumprimento dessas penas, em estabelecimentos militares, implica que esses ex-militares da Guarda - à data já "militares das Forças Armadas" - regressem ao serviço efectivo, isto é, o cumprimento dessas penas implica a efectividade de serviço na medida em que aqueles ficam sujeitos, nesse período de tempo, à autoridade e disciplina das competentes autoridades, como se em "serviço efectivo normal" se encontrassem.
Essa, aliás, a razão de ser, o fundamento das referidas normas dos nºs 4, 5 e 6 do artigo 40º, da Lei nº 30/87.
Só que, como resulta de todo o exposto, nomeadamente dos pareceres e demais documentação que acompanha a consulta, não há normativos idênticos aos dos nºs 4, 5 e 6 do artigo 40º da Lei nº 30/87, directamente aplicáveis às situações em causa - de militares das Forças Armadas, condenados em penas militares, pela prática de crimes essencialmente militares, quando ainda eram "militares da Guarda", no activo.
Estamos, pois, perante uma lacuna da lei, a preencher, em primeiro lugar, "segundo a norma aplicável aos casos análogos" - nº 1 do artigo 10º do Código Civil - tendo presente que a analogia, na noção dada pelo nº 2 do referido artigo 10º, implica que no caso omisso procedam as razões justificativas da regulamentação do caso previsto na lei. Só na falta de caso análogo, como decorre do nº 3 do mesmo artigo 10º, deverá o intérprete criar a norma adequada a resolver a situação em causa.
 
3.7. É evidente a analogia das situações - a prevista nos nºs 4 e 5 do artigo 40º da Lei nº 30/87 e a aqui em causa.
Em ambos os casos se trata de cidadãos "militares das Forças Armadas", fora da efectividade de serviço, condenados em penas militares, que deverão cumprir em estabelecimentos prisionais militares.
Em ambas as situações se torna necessária a passagem à efectividade de serviço para o cumprimento das penas de presídio militar, prisão militar ou prisão disciplinar.
E então, cabe perguntar: essa passagem à "efectividade, na situação em causa, deverá fazer-se sob a direcção, disciplina e autoridade das competentes entidades militares, ou, antes, sob a direcção, disciplina e autoridade da Guarda? Por outras palavras, esses militares - "militares das Forças Armadas", à data da condenação, e "militares da Guarda", à data de prática das infracções-, deverão regressar à efectividade do serviço militar ou, antes, do serviço da Guarda?
Respondendo a esta questão, afigura-se-nos que a situação em causa justifica plenamente a solução encontrada para a outra situação, nas referidas normas da Lei nº 30/87 - regresso ao serviço militar efectivo -, sendo irrelevante o diferente vínculo desses militares à data da prática das infracções. O que deve relevar, para os efeitos em questão, é a situação desses militares à data de condenação e do cumprimento da pena.
Invoquemos, em reforço desta posição, a solução encontrada pelo legislador no artigo 41º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei nº 24/84, de 16 de Janeiro: "Quando, após a prática de uma infracção disciplinar, ou já na pendência do processo, o funcionário ou agente muda de Ministério, de autarquia local ou de serviço, a pena será aplicada pela entidade competente à data em que tiver de ser proferida decisão final, sem prejuízo de o processo ter sido mandado instaurar e ter sido instruído no âmbito do serviço em que o arguido exercia funções à data da infracção" (18).
Se neste preceito legal se respeitou o poder disciplinar da entidade competente à data da punição e não à data da prática da infracção, não se vê razão para, em caso afim - o caso ora em apreço -, se dever levar em conta o "vínculo" com a Guarda, que existia à data da prática da infracção, e não o "vínculo" com as Forças Armadas, existente à data da punição e do cumprimento da respectiva pena.
Acrescente-se, ainda, e decisivamente, o facto de o legislador, nos citados artigos 74º, nº 1, 75º, nº 1, e 94º do Estatuto dos Militares da G.N.R., estatuir o abate definitivo aos quadros da Guarda e a impossibilidade de readmissão, o que inviabiliza qualquer possibilidade de esses militares "regressarem" à efectividade de serviço dessa Corporação. Como tal, como militares, e apenas com militares (até aos 35 anos) devem ser tratados.
Por todo o exposto se deve concluir pela aplicação analógica das soluções previstas nas citadas normas da Lei nº 30/87, pois, como resulta do exposto, procedem, no caso em apreço, as razões justificativas daquela disciplina legal:em ambos os casos se trata de militares das Forças Armadas, fora da efectividade de serviço, condenados em penas militares, que devem cumprir essas penas necessariamente às ordens das competentes autoridades militares, a que (exclusivamente) estão sujeitos.
Pelo que, em conformidade, se deve concluir que tais "militares" devem ser convocados para regressar ao "serviço militar efectivo", para cumprimento de penas militares, suportando, lógica e necessariamente, as competentes autoridades militares os inerentes encargos com o cumprimento dessas penas.
 
Conclusão:
4.
Termos em que se conclui:
1. Por aplicação analógica dos nºs 4 e 5 do artigo 40º da Lei nº 30/87, de 7 de Julho, os ex-militares da Guarda Nacional Republicana, abatidos definitivamente aos quadros da Guarda, por "dispensa do serviço", e imediatamente transferidos para o ramo das Forças Armadas da sua procedência, nos termos dos artigos 74º, nº 1, 75º e 94º, alínea c), do Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei nº 265/93, de 31 de Julho, devem ser convocados para regressar ao serviço militar efectivo, se condenados em penas de presídio militar, prisão militar ou prisão disciplinar, por terem praticado infracção disciplinar ou crime essencialmente militar quando ainda prestavam serviço nos quadros permanentes daquela Corporação;
2. As despesas com esse regresso ao serviço militar efectivo, incluindo as decorrentes do cumprimento dessas penas de prisão nos estabelecimentos prisionais militares, devem ser suportadas pelos competentes serviços do respectivo ramo das Forças Armadas.
 

1) Ofício nº 7495, Procº 01.5.36, de 6/5/91.
2) Ofício nº 4881/CG, Procº 4772/91, de 23/7/93.
3) O Decreto-Lei nº 465/83 foi revogado expressamente pelo Decreto-Lei nº 265/93, de 31 de Julho ,que aprovou o novo Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana.
4) A dispensa do serviço estava ao tempo de igual modo prevista no artigo 70º da Lei Orgânica da G.N.R., aprovada pelo Decreto-Lei nº 333/83, de 14 de Julho, revogada pelo Decreto-Lei nº 231/93, de 26 de Junho, que aprovou a actual Lei Orgânica da G.N.R..
5) Nos termos do nº 2 do referido artigo 1º, "os militares das Forças Armadas em serviço na Guarda" regiam-se pelos seus próprios Estatutos, sendo-lhes aplicadas algumas disposições daquele Estatuto, nomeadamente as constantes do artigo 2º - que define o conceito de "militar da Guarda" -, mas não as constantes daquele artigo 38º.
6) Nos termos do nº 2 do artigo 1º dos referidos Estatutos, "os oficiais das Forças Armadas em serviço na Guarda regem-se pelo Estatuto dos Militares das Forças Armadas e pelo presente Estatuto na parte aplicável".
7) Cfr. os artigos 271º, 243º e 213º/214º do referido Estatuto relativos ao recrutamento para soldados, sargentos e oficiais dos quadros, respectivamente.
8) A anterior Lei Orgânica da G.N.R. definia-a como "um corpo especial de tropas que faz parte das forças militares, votado à causa da segurança e manutenção da ordem pública, bem como à protecção e defesa das populações e da propriedade pública, privada e cooperativa".
9) Nos termos do artigo 95º da citada Lei Orgânica, "o pessoal civil que presta serviço na Guarda está sujeito ao regime previsto na lei geral para o pessoal da Administração Pública".
10) A candidatura à frequência dos cursos de formação de sargentos é restrita aos "cabos dos quadros da Guarda" - artigo 243º do Estatuto; e "o recrutamento para oficiais dos quadros é feito entre alunos que frequentarem os cursos de formação de oficiais, e, nos termos de legislação especial, os licenciados que pertençam aos quadros da Guarda ou tenham cumprido o serviço efectivo normal como oficiais das Forças Armadas, mediante a frequência do respectivo tirocínio de formação com aproveitamento" - artigo 213º do mesmo Estatuto. Deduz-se do artigo seguinte que podem frequentar os cursos de formação de oficiais indivíduos que não tenham cumprido serviço militar efectivo. Tal resulta de uma das condições de admissão aos cursos ser: "c) Se militar, ao serviço ou na disponibilidade, ter revelado qualidades que o recomendem para oficial dos quadros da Guarda".
11) Na anterior Lei do Serviço Militar (Lei nº 2135, de 11 de Julho de 1968), artigo 4º, nº 5), "ao serviço na reserva territorial estavam sujeitos, com as obrigações que a lei impuser, todos os que tenham sido considerados inaptos para o serviço das forças armadas". A reserva territorial tem hoje diferente campo de aplicação, ao incluir cidadãos considerados aptos para o serviço militar.
12) O Decreto-Lei nº 439/73, de 3 de Setembro, revogado, quanto à G.N.R., pelo Decreto-Lei nº 465/83, previa, quanto aos "oficiais dos quadros de complemento das forças armadas", em serviço na G.N.R. e na G.F., a sua passagem à situação de "separado de serviço" (artigo 14º), por motivo disciplinar ou pela prática de actos atentatórios do prestígio das mesmas instituições (artigo 20º).
13) Embora o artigo 94º do actual Estatuto dos Militares da G.N.R. não contenha a expressão "ingressando no escalão que lhes pertencer", que constava do nº 1 do artigo 38º do anterior Estatuto, não pode deixar de se entender que a "transferência", a que se refere aquela disposição legal, é exactamente para "o escalão" ou "situação" que lhes pertencer.
14) Cfr. nota (10). Note-se que o Decreto-Lei nº 439/73, de 3 de Setembro, revogado pelo Decreto-Lei nº 465/83, quanto à G.N.R., previa que o recrutamento de oficiais para a G.N.R. e G.F., nos postos inferiores ao de coronel era (apenas) feito nos quadros permanentes e de complemento das forças armadas. Nesse caso a "transferência" desses oficiais operar-se-ia apenas para a "reserva de disponibilidade e licenciamento".
15) O Decreto-Lei nº 146/82, de 28 de Abril, introduziu os nºs 2 e 3 (passando o corpo do artigo a nº 1), a fim de regular a substituição da parte da pena não cumprida, quando os militares condenados vierem, no decurso da execução da pena, a ter baixa do serviço e a perder a sua qualidade de militares, seja qual for a respectiva causa.
16) "Código de Justiça Militar" actualizado e anotado, Almedina, pág. 75.
17) Nos termos dos artigos 34º, 35º e 36º do Regulamento de Disciplina Militar, aos oficiais, sargentos, cabos e outras praças são aplicáveis, entre outras penas disciplinares, as de prisão disciplinar e prisão disciplinar agravada, a primeira a cumprir "em casa para esse fim destinada, em local apropriado, aquartelamento ou estabelecimento militar, a bordo, em aquartelamento adequado, ou, na sua falta, onde superiormente for determinado" (artigo 27º do R.D.M.), a segunda em "casa de reclusão" (artigo 28º do R.D.M).
18) Sobre a aplicação desta norma vejam-se os pareceres nºs 118/84, de 28/2/85, e 102/88, de 27/10/88, deste corpo consultivo, publicados no Diário da República, II Série, de 12/9/85 e 22/3/89, respectivamente.
Anotações
Legislação: 
CCIV66 ART10 N1.
DL 465/83 DE 1985/12/31 ART1 ART20 ART28 ART38 ART37.
DL 265/93 DE 1993/07/31 ART1 ART2 ART5 ART52 ART62 ART63 ART74 ART75 ART94 ART213 ART214 ART243 ART271.
DL 333/83 DE 1983/07/14 ART70.
DL 231/93 DE 1993/06/26 ART1 ART92 ART94 ART95.
L 30/87 DE 1987/07/07 ART6 ART40.
L 22/91 DE 1991/06/19 ART2 ART3 ART4 ART5 ART40 N4 N5 N6 ART43.
L 2135 DE 1968/07/11 ART4. EMFA90 ART2 ART3 ART4 ART6 ART166.
DL 157/92 DE 1992/07/31.
RDM77 ART32 ART46.
DL 439/77 DE 1977/09/03.
DL 179/78 DE 1978/07/15 ART1 ART2 ART3.
DL 24/84 DE 1984/01/20 ART41.
Referências Complementares: 
DIR CRIM / DIR MIL * JUST MIL.
Divulgação
Número: 
DR273
Data: 
25-11-1994
Página: 
11876
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