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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
45/1990, de 09.11.1990
Data do Parecer: 
09-11-1990
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério do Plano e da Administração do Território
Relator: 
FERREIRA RAMOS
Descritores e Conclusões
Descritores: 
PODER LOCAL
AUTARQUIA LOCAL
ORGÃO AUTARQUICO
ORGÃO REPRESENTATIVO
ORGÃO DELIBERATIVO
ORGÃO EXECUTIVO
MEMBRO
CAPACIDADE CONTRATUAL
IMPARCIALIDADE DA ADMINISTRAÇÃO
INTERESSE GERAL
IMPEDIMENTO
PERDA DE MANDATO
Conclusões: 
O artigo 9, n 2, alineas a) e b), da Lei n 87/89, de 9 de Setembro, abrange na sua previsão os membros de qualquer orgão representativo das autarquias locais, não se restringindo aos membros dos orgãos executivos.
Texto Integral
Texto Integral: 
 
 
Senhor Secretário de Estado da
Administração Local e Ordenamento do Território,
Excelência:
 
1
A sucessão legislativa operada na matéria, nomeadamente a revogação dos artigos 70º e 81º, nº 2, do Decreto-Lei nº 100/84, de 29 de Março, pela Lei nº 87/89, de 9 de Setembro, suscitou dúvidas e divergências de interpretação no tocante ao sentido a atribuir ao disposto no artigo 9º, nº 2, alíneas a) e b) deste último diploma legal.
Em parecer do Senhor Secretário do Governo Civil de Viseu sustenta-se que a revogação expressa do referido artigo 81º, nº 2, apenas teve em vista uma nova inserção sistemática da matéria, concentrando as situações de perda de mandato no diploma regulador da tutela administrativa, pelo que deverá continuar a entender-se que o âmbito de proibição de contratar com autarquias se restringe aos membros dos órgãos executivos.
Entendimento oposto foi perfilhado em parecer emitido pelo Gabinete de Vossa Excelência, por se entender que a revogação do nº 2 do artigo 81º do Decreto-Lei nº 100/84 não pode deixar de significar que se quis alterar o regime jurídico em vigor, assim se recuperando o anterior princípio normativo expresso na Lei nº 79/77, de 25 de Outubro, cujo artigo 102º, nº 2, consagrava a tese da abrangência de todos os membros dos órgãos autárquicos.
Neste mesmo sentido se pronunciaria a informação nº 91º, de 17/5/90, da Direcção-Geral da Administração Autárquica (DGAA), subscrita por uma técnica jurista mas que não obteve concordância do respectivo Director-Geral, o qual propende para o entendimento expresso pelo Senhor Secretário do Governo Civil de Viseu.
Vossa Excelência dignou-se solicitar o parecer deste Conselho Consultivo que, por isso, cumpre emitir.
 
2
2.1. Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à Lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade - artigo 266º, nº 2, da Constituição da República (1.
Como nota Vieira de Andrade (2, não é normal as constituições dos países elevarem o dever de imparcialidade da Administração a princípio constitucional e em Portugal tal sucedeu pela primeira vez na Constituição de 1976, na esteira da Constituição italiana.
Este princípio da imparcialidade tem outros desenvolvimentos ou afloramentos possíveis, tais como os que estão traduzidos no artigo 269º, nº 1, segundo o qual "No exercício das suas funções, os trabalhadores da Administração Pública e demais agentes do Estado e outras entidades públicas estão exclusivamente ao serviço do interesse público...".
Ajudará a uma melhor compreensão do tema a desenvolver, uma referência, ainda que sucinta, a outros preceitos constitucionais.
As autarquias locais são pessoas colectivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respectivas -nº 2 do artigo 237º.
A organização das autarquias locais - que, no continente, são as freguesias, os municípios e as regiões administrativas (nº 1 do artigo 238º) - compreende uma assembleia eleita dotada de poderes deliberativos e um órgão colegial executivo perante ela responsável (artigo 241º, nº 1).
Os órgãos representativos da freguesia são a assembleia de freguesia e a junta de freguesia, sendo esta o órgão executivo (artigos 245º e 247º, nº 1).
Do município são órgãos representativos a assembleia municipal e a câmara municipal, que é o órgão executivo (artigos 250º e 252º).
2.2. A legislação surgida após o 25 de Abril revela a preocupação de se harmonizarem os princípios da legalidade democrática, daí decorrendo a imparcialidade e neutralidade que deverão pautar a conduta dos agentes administrativos e que tem precipitação nos sistemas de inelegibilidades e incompatibilidades (3.
Visa-se proteger a independência das funções e, do mesmo passo, manter na acção administrativa a moralidade, objectividade e serenidade que lhe deva imprimir o cariz indiscutível do interesse geral - o que mais não é do que a afloração, em Estado Democrático de Direito, do princípio segundo o qual os agentes públicos não devem encontrar-se em situação de confronto entre o interesse próprio, de natureza pessoal, e os interesses do Estado ou dos entes públicos que representem e que lhes compete defender.
Pretende-se, assim, acautelar a independência do poder local - como corolário do princípio constitucional consignado no nº 2 do artigo 266º -, ditada pela necessidade de manter a integridade do prestígio da administração local mormente quando, ao contratar no desempenho normal das suas atribuições, possa haver perigo de colisão entre interesses públicos e particulares.
No referido parecer nº 100/82 pondera-se que, não obstante ligeiras flutuações, se nota o surgimento da incompatibilidade do cargo sempre que surja interesse em conflito.
3
3.1. Passemos de imediato à evolução legislativa iniciada com a Lei nº 79/77, de 25 de Outubro (4, da qual interessa conhecer o artigo 102º, do seguinte teor:
"1. Nenhum membro dos órgãos das autarquias locais pode votar em matérias que lhe disserem respeito ou a membros da sua família.
2. Os membros dos órgãos das autarquias locais não podem tomar parte ou interesse nos contratos por estes celebrados, salvo contratos tipo de adesão, sob pena de nulidade do contrato e perda do mandato" (5.
3.1.1. Sublinhe-se que o nº 2 - única disposição aqui em causa - se refere genericamente a "órgãos das autarquias locais", sem distinguir entre órgãos deliberativos e executivos.
Nota não despicienda tendo nomeadamente em conta que na Lei nº 79/77 se incluíam preceitos que providenciavam apenas, especificadamente, sobre órgãos deliberativos - artigo 100º, nºs. 1 e 5 - e outros tão-só respeitantes a órgãos executivos - artigos 103º, nº 1, e 109º.
Portanto, a todos os membros dos órgãos representativos das autarquias locais era vedada a intervenção em contratos, com a ressalva indicada, celebrados por aqueles órgãos.
Nenhuma distinção era feita quer no tocante aos membros, quer no respeitante aos órgãos representativos ou às autarquias.
Decorria, assim, da referida disposição o dever de abstenção de intervir, nos termos apontados, para todos os membros dos órgãos autárquicos.
3.1.2. A interpretação do citado nº 2 do artigo 102º foi objecto do parecer 100/82, cujas conclusões interessa conhecer:
"I O artigo 102º, nº 2 da Lei nº 79/77, de 25 de Outubro, tem por objectivo assegurar aos membros dos órgãos das autarquias locais o desempenho imparcial e justo das suas funções na prossecução do interesse público e no respeito pelos direitos e deveres legalmente protegidos dos cidadãos.
II Consequentemente, a disposição referida na conclusão antecedente deve entender-se como significando que, exceptuados os contratos tipos de adesão, os membros dos órgãos das autarquias locais devem abster-se, sob pena de nulidade do contrato e da perda do mandato, de intervir, por si ou por interposta pessoa, na negociação ou na outorga de contratos entre a autarquia e empresas ou sociedades de que sejam proprietários, gerentes ou membros da direcção, conselho de administração ou fiscal ou quando apenas tenham no negócio outro interesse pessoal susceptível de pôr em causa a finalidade expressa na conclusão anterior".
3.2. A 29 de Março foi publicado o Decreto-Lei nº 100/84 (6com o objectivo de rever a Lei nº 79/77 no sentido da actualização e reforço das atribuições das autarquias locais e da competência dos respectivos órgãos.
Através do artigo 97º, nº 1, foi operada a revogação expressa, entre outros, do artigo 102º, nº 2, da Lei nº 79/77.
3.2.1. Incluído também nas "Disposições gerais" - capítulo IV - e após o artigo 70º, nº 1, estabelecer que:
"Perdem o mandato os membros eleitos dos órgãos autárquicos que:
d) Se encontrem abrangidos pelo disposto do nº 2 do artigo 81º;", o artigo 81º, subordinado à epígrafe "Impedimentos", veio dispor:
"1. Nenhum membro dos órgãos das autarquias locais pode participar na discussão e votação de matérias que lhe digam directamente respeito ou a seus parentes ou afins em linha recta ou até ao 2º grau da linha colateral.
2. Pode ser declarada a perda do mandato, mediante a prévia instauração de inquérito, ao membro do órgão das autarquias que tome parte ou tenha interesse em contrato por esse órgão celebrado, que não seja de adesão, quando se verifique causa de impedimento nos termos do disposto no Decreto-Lei nº 370/83, de 6 de Outubro, sem prejuízo das demais sanções previstas nesse diploma ou em legislação especial" (7.
3.2.2. Cumpre, também aqui, fazer uma observação semelhante à já feita a propósito da Lei nº 79/77: a disposição em causa (nº 2) reporta-se genericamente a "órgão das autarquias locais", sem distinguir entre órgãos deliberativos e executivos.
Não obstante, o diploma legal contém normas específicas sobre órgãos deliberativos (artigo 78º, nºs. 1 e 5) e o artigo 93º providencia sobre órgãos deliberativos e executivos (8.
Também agora se veda a intervenção em contrato que não seja de adesão, fazendo-se impender sobre os membros do órgão das autarquias locais o dever de abstenção de intervir "em contrato por esse órgão celebrado".
3.2.3. Se bem interpretamos, terá sido, sobretudo, com base na modificação formal detectada neste segmento - onde se falava em "contratos por estes celebrados" passou a falar-se em "contrato por esse órgão celebrado" - que se sustentou a tese de que o impedimento do nº 2 do artigo 81º atingiria apenas os autarcas que pertencessem ao órgão com o qual o contrato é celebrado.
E como - prossegue-se - os membros dos órgãos deliberativos e consultivos não têm competência para a celebração de contratos, "não intervindo na formação da vontade negocial", o âmbito daquela proibição restringia-se aos membros dos órgãos executivos.
4
Semelhante entendimento (ponto 3.2.3) - que se traduziria numa alteração substancial do regime instituído pela Lei nº 79/77 - afigura-se, pelo menos, como muito duvidoso.
Como quer que seja, hoje não interessa um compromisso a este nível, já que os citados artigos 70º e 81º, nº 2, foram expressamente revogados pelo artigo 17º da Lei nº 87/89, de 9 de Setembro, e a resposta à consulta formulada há-de encontrar-se na correcta interpretação do disposto no seu artigo 9º, nº 2, alíneas a) e b).
4.1. A Lei nº 87/89 estabeleceu o regime jurídico da tutela administrativa das autarquias locais e das associações de municípios de direito público.
Na respectiva discussão parlamentar (9 não é possível colher subsídio interpretativo de valor para o caso que nos ocupa.
Interessará, todavia, uma chamada de atenção para uma intervenção do Sr. Deputado João Amaral (PCP) precisamente a propósito do nº 2 do artigo 8º (que viria a passar a artigo 9º), do seguinte teor:
"O Sr. Secretário de Estado, na formulação do corpo do nº 2, abandona formulações que hoje são do artigo 81º, nº 2, do Decreto-Lei nº 100/84.
Porque é que desaparece a referência ao inquérito prévio? Porque é que desaparece a excepção dos contratos de adesão" (10.
4.2. Dispõe o referido artigo 9º:
"2. Perdem igualmente o mandato os membros dos órgãos autárquicos que, no exercício das suas funções ou por causa delas, intervenham em processo administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado quando:
a) Nele tenham interesse, por si, como representante ou como gestor de negócios de outra pessoa;
b) Por si, ou como representante de outra pessoa, nele tenha interesse o seu cônjuge, algum parente ou afim em linha recta ou até ao 2º grau da linha colateral, bem como qualquer pessoa com quem viva em economia comum;".
Como se disse, o objecto do presente parecer circunscreve-se à determinação do exacto sentido a atribuir à aludida disposição.
4.2.1. Nenhuma distinção se contém (ou é consentida) na letra da lei no tocante aos órgãos representativos das autarquias, que permita restringir o seu alcance aos membros dos órgãos executivos.
Como assim, pode concluir-se que a proibição legal abrange qualquer órgão autárquico.
Se outra tivesse sido a intenção do legislador, fácil lhe teria sido encontrar as palavras adequadas para a exprimir, providenciando especificamente para os órgãos executivos e (ou) deliberativos (cfr. artigo 13º, nºs 2 e 3).
Veda-se, pois, aos membros dos órgãos autárquicos - no exercício das suas funções (11)ou por causa delas - a intervenção em processo administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado quando eles, ou alguma das pessoas elencadas na alínea b), nele tenham interesse.
Deste interesse faz a lei derivar um dever de abstenção de intervir, nomeadamente em contratos, para os membros dos órgãos autárquicos - recte, de qualquer órgão representativo das autarquias locais, e não apenas para os membros pertencentes ao órgão autárquico com o qual o contrato é celebrado.
4.2.2. Sendo embora geralmente reconhecido pela doutrina que não pode dar-se um sentido absoluto e dogmático à regra de que o intérprete não deve distinguir onde a lei não distingue, impõe-se, por outro lado, não esquecer que é dever do intérprete presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (artigo 9º, nº 3, do Código Civil).
Ora, no caso em apreço a lei em nada apoia uma tese que pretenda restringir a disposição em causa aos órgãos executivos.
Nem vale dizer que só os órgãos executivos podem celebrar contratos, pois esquece-se, além do mais, que a lei reserva aos órgãos deliberativos a competência para decidir as principais questões da vida autárquica (12, e que o nº 1 do artigo 241º da Constituição estabelece a responsabilidade do órgão executivo perante a assembleia (cfr., também, as competências assinaladas à assembleia de freguesia nas alíneas d), f), i), l), o) e u) do nº 1 do artigo 15º do Decreto-Lei nº 100/84, e à assembleia municipal nas alíneas c) e h), do nº 1 e e), i) e j) do nº 2 do artigo 39º do mesmo texto legal).
4.2.3. Além de que, e sobretudo, a razão de ser da lei vale igualmente para qualquer órgão autárquico.
Na verdade, como vimos, essa razão de ser vai entroncar e radicar nos princípios constitucionalmente consagrados no nº 2 do artigo 266º, mormente no princípio da imparcialidade, do qual decorre, nomeadamente, o referido dever de abstenção de intervir.
A tese que vimos rebatendo traduzir-se-ia, como é bom de ver, numa interpretação fortemente restritiva do preceito, quando é certo que nenhum elemento permite concluir pela certeza, como seria mister, de que o legislador disse mais do que queria.
 
5
Se algumas dúvidas pudessem, porventura, ser legítimas, elas seriam em definitivo e irremediavelmente arredadas atentando em dois outros diplomas que, para casos similares, consagrou semelhante solução.
Referimo-nos ao Decreto-Lei nº 370/83, de 6 de Outubro - que visou concretizar o princípio da imparcialidade na acção da Administração Pública, dando cumprimento nomeadamente ao nº 2 do artigo 266º da Constituição - e à Lei nº 29/87, de 30 de Junho (Estatuto dos Eleitos Locais).
5.1. O Decreto-Lei nº 370/83 aplica-se a "todo o titular de órgão da administração central, regional e local ...", consagrando "um sistema tanto quanto possível minucioso de situação de colisão entre interesses particulares dos mencionados titulares de órgãos públicos e o desempenho das funções públicas que lhes cabem" (do respectivo preâmbulo).
5.1.1. Este diploma é referenciado por Gomes Canotilho e Vital Moreira (13, após ponderarem, em anotação ao nº 2 do artigo 266º, que a garantia da imparcialidade da administração implica, entre outras coisas, o estabelecimento de impedimentos dos titulares de órgãos da administração para intervirem em assuntos em que tenham interesse pessoal, directo ou indirecto.
Reflexão recolhida no parecer nº 19/89 (14, onde se firmou a seguinte conclusão:
"Do princípio da imparcialidade decorre, além do mais, para os titulares dos órgãos da Administração o dever de abstenção de intervir em qualquer procedimento administrativo quando nele tenham interesse pessoal, directo e legítimo (cfr. artigos 1º e 10º do Decreto-Lei nº 370/83, de 6 de Outubro)".
5.1.2. Sob a epígrafe "Casos de impedimento ...", dispõe o artigo 1º:
"1. Nenhum titular de órgão da administração central, regional e local ou dos institutos ou empresas públicas pode intervir em processo administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado:
a) Quando nele tenha interesse, por si, como representante ou como gestor de negócios de outra pessoa;
b) Quando por si ou como representante de outra pessoa, nele tenha interesse o seu cônjuge, algum parente ou afim em linha recta ou até ao 2º grau na linha colateral, bem como qualquer pessoa com quem viva em economia comum;".
É flagrante a similitude deste preceito com o artigo 9º, nº 2, alíneas a) e b), da Lei nº 87/89.
5.2. Embora menos notável, é também significativa a similitude com o disposto no artigo 4º da Lei nº 29/87 (15 segundo o qual:
"No exercício das suas funções, os eleitos locais estão vinculados ao cumprimento dos seguintes princípios:
1) ................:
2) Em matéria de prossecução do interesse público:
d) Não intervir em processo administrativo, acto ou contrato de direito público ou privado, nem participar na apresentação, discussão ou votação de assuntos em que tenha interesse ou intervenção, por si ou como representante ou gestor de negócios de outra pessoa, ou em que tenha interesse ou intervenção em idênticas qualidades o seu cônjuge, parente ou afim em linha recta ou até ao 2º grau da linha colateral, bem como qualquer pessoa com quem viva em economia comum;
e) Não celebrar com a autarquia qualquer contrato, salvo de adesão;".
Considerando, por um lado, que esta alínea e) se refere a "autarquia", tout court, impondo aos eleitos locais o dever de com ela não celebrar qualquer contrato (salvo de adesão) e, por outro lado, que eleitos locais são, para efeitos dessa lei, "os membros dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios e das freguesias" (artigo 1º, nº 2) (16, dúvidas não pode haver de que, também por esta banda, sai corroborada (senão mesmo imposta) a interpretação que fizemos do disposto no artigo 9º, nº 2, alíneas a) e b) da Lei nº 87/89, não havendo fundamento para distinguir consoante os eleitos locais sejam membros de órgãos deliberativos ou executivos.
Conclusões:
6
Em face do exposto, conclui-se:
O artigo 9º, nº 2, alíneas a) e b), da Lei nº 87/89, de 9 de Setembro, abrange na sua previsão os membros de qualquer órgão representativo das autarquias locais, não se restringindo aos membros dos órgãos executivos.
 
____________________________________________
(1 Redacção da 2ª Revisão Constitucional (Lei Constitucional nº 1/89, de 8 de Julho, rectificada no Diário da República, I Série, nº 181, de 8/8/89).
(2 "A Imparcialidade da Administração como Princípio Constitucional", Coimbra, 1975. Acerca do princípio da imparcialidade, v. ainda: Sérvulo Correia, "Os princípios constitucionais da Administração Pública", in Estudos sobre a Constituição, 3º vol., 1979, págs. 661 e segs., maxime a págs. 677-681; Freitas do Amaral, Direito Administrativo, lições, Lisboa, 1984, vol. II, págs. 356 e segs.; Sérvulo Correia, Noções de Direito Administrativo, Editora Danúbio, vol. I, pág.447; Mário Esteves de Oliveira, Direito Administrativo, 1980, pág. 330; Saldanha Sanches, "Interesse público e Princípio da legalidade fiscal - A propósito da Representação do Estado nos Tribunais Fiscais, na Revista Jurídica, nº 7, Julho/Setembro, 1986, pág. 148; Maria Aline Gago da Silva e Jorge Baptista Bruxo, "Princípios Jurídicos da Administração Pública", INCM, 1985, págs. 9 e segs.; parecer nº 176/77, publicado no Diário da República, II Série, nº 106, de 9/5/79, nº. 4/84, homologado mas não publicado, e nº 19/89, publicado no Diário da República, II Série, nº 132, de 9/6/89; acórdãos do STA de 22/7/82 e 7/7/88, in Acórdãos Doutrinais nº 255, pág. 279, e nº 334, pág. 1171, respectivamente.
(3 Assim se ponderou nos pareceres nº 100/82, publicado no B.M.J., nº 326, e no Diário da República, II Série, nº 194, de 25/6/83, e nº 8/85, publicado no B.M.J., nº 350, pág. 79, e no Diário da República, II Série, nº 268, de 21/11/85.
(4 A economia da consulta dispensa o exame dos antecedentes legislativos atinentes à disposição em causa. A pesquisa desses antecedentes foi levada a cabo no referido parecer nº 100/82, aqui se analisando com o pormenor e profundidade exigidos os pertinentes preceitos do Código Administrativo de 1896, do chamado "Código Eleitoral" (Lei nº 3, de 3 de Julho de 1913) e do Código Administrativo de 1936 (expressamente revogado, na parte que interessava, pelo artigo 114º da Lei nº 79/77).
(5 O texto da Lei nº 79/77 surgiu da discussão dos projectos de Lei nº 47/I, do PSD, sobre autarquias locais e seus órgãos, e nº 48/I, do PCP, sobre o poder local, competência e atribuições das autarquias e proposta de Lei nº 68/I, definindo a competência das autarquias locais (publicados no DAR, respectivamente, de 20/4/77, suplemento ao nº 45-77, 2º suplemento ao nº 104, e 13/5/77, suplemento ao nº 108). Nenhum dos textos apresentava preceito semelhante, tendo sido discutidos na generalidade, em conjunto, em 12/7/77 (DAR, nº 129, do dia imediato) e na especialidade (com algumas propostas de alteração apresentadas pela UDP), nos dias 28 e 29 do mesmo mês (citado no jornal oficial nºs. 137 e 138, de 29 e 30 de Julho de 1977). Neste último dia e com uma ligeira "nuance" de redacção relativamente ao texto que veio a ser publicado (falava-se em "órgãos de poder local") foi aprovado sem discussão e por unanimidade o artigo 98º, correspondente ao actual artigo 102º. Por isso, os trabalhos parlamentares não fornecem qualquer subsídio para a apreensão do exacto sentido da norma em apreço.
(6 Rectificado no Diário da República, 2º Suplemento, de 30/6/84.
(7 Redacção da Lei nº 25/85, de 12 de Agosto.
(8 Atente-se em que o artigo 103º ("indeferimento tácito") da Lei nº 79/77 se referia aos órgãos executivos, ao passo que o correspondente artigo 82º ("indeferimento por omissão") se reporta, genericamente, aos órgãos das autarquias.
(9 A Lei nº 87/89 resultou da Proposta de Lei nº 81/V (DAR, II Série-A, nº 12, de 4/1/89, rectificada na II Série-A, nº 36, de 26/5/89), sendo aprovada na generalidade (DAR, I Série, nº 46, de 3/3/89 pág. 1692) após discussão (DAR, I Série, nº 44, de 25/2/89, págs. 1544 e segs.). A sua discussão na especialidade pode ver-se no DAR, I Série, nº 104, de 12/7/89, págs. 5050 e segs., e a votação final - aprovada com votos a favor do PSD e votos contra do PS, do PCP, do PRD, do CDS e de Os Verdes - no DAR, I Série, nº 105, de 13/5/89, pág. 5158.
(10 D.A.R., I Série, nº 104, de 12/7/89, pág. 5076.
(11Cfr. artigos 266º, nº 2, e 269º, nº 1, ambos da Constituição.
(12 Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 2ª edição, 2º. vol., pág. 391.
(13 Ob. e loc. cits., págs. 420-421.
(14 Publicado no D.R., II Série, nº 132, de 9/6/89. Cfr., também, o parecer nº 75/89, de 22/2/90, não homologado.
(15 A Lei nº 29/87 resultou do Projecto de Lei nº 403/V (DAR, II Série, nº 61, de 28/3/87, págs. 2452-2455), o qual foi aprovado na generalidade com votos a favor do PSD, do PS, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos e votos contra do PRD (DAR, I Série, nº 68, de 11/4/87, pág. 2676). Na respectiva discussão parlamentar (citado DAR, I Série, págs. 2663-2683) não se colhe argumento com interesse para o caso concreto que nos ocupa.
(16 O alcance desta expressão "órgãos deliberativos e executivos" parece ser, numa primeira aproximação, mais restrito que o da locução "órgãos autárquicos", esta susceptível de também abranger os órgãos consultivos (cfr., porém, o disposto no nº 4 do artigo 2º da Lei nº 29/87). 
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART237 N2 ART238 N1 ART241 N1 ART245 ART247 N1 ART250 ART252 ART266 N2 ART269 N1.
LAL77 ART100 N1 N5 ART102 ART103 N1 ART109.
LAL84 ART15 ART39 ART70 N1 ART78 N1 N5 ART81 ART93 ART97 N1.
L 87/89 DE 1989/09/09 ART9 N2 A B ART13 N2 ART17.
DL 370/83 DE 1983/10/06 ART1.
L 29/87 DE 1987/06/30 ART4.
Referências Complementares: 
DIR ADM * FUNÇÃO PUBL.
Divulgação
Número: 
DR218
Data: 
21-09-1992
Página: 
8876
4 + 8 =
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