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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
27/1991, de 16.01.1992
Data do Parecer: 
16-01-1992
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação
Relator: 
LUCAS COELHO
Descritores e Conclusões
Descritores: 
REFORMA AGRARIA
EXPROPRIAÇÃO
PREDIO RUSTICO
REVERSÃO
POSSE MATERIAL
EXPLORAÇÃO DE FACTO
POSSE
POSSE CAUSAL
PODER ADMINISTRATIVO
DESVIO DE PODER
Conclusões: 
1 - A reversão dos predios rusticos expropriados prevista no artigo 30 da Lei n 109/88, de 26 de Setembro - Lei de Bases da Reforma Agraria - na redacção do artigo 1 da Lei n 46/90, de 22 de Agosto tem como pressuposto basico a não aplicação dos predios ao fim cuja utilidade publica fundamentou a expropriação;
2 - A frustração do fim de utilidade publica que presidiu a expropriação revela-se, face a previsão da alinea b) do n 1 do citado artigo 30, na circunstancia de os predios rusticos expropriados terem regressado a posse material e exploração de facto dos anteriores titulares ou dos seus herdeiros antes de 1 de Janeiro de 1990, independentemente de acto administrativo com esse objectivo;
3 - O conteudo substancial do conceito "posse material" e grosso modo constituido pelo elemento "corpus possessorio", seja o exercicio estavel do complexo de poderes materiais de facto de detenção, guarda, conservação, uso e fruição do predio rustico expropriado;
4 - O conceito "exploração de facto" compreende, igualmente no plano factual, o conjunto de poderes e actos de fruição e extracção das utilidades economicas que podem proporcionar as actividades agricola, silvicola e pecuaria susceptiveis de serem desenvolvidas no predio rustico expropriado;
5 - A posse material e a exploração de fato do predio rustico expropriado são, em principio, pressupostos cumulativos da reversão na previsão da alinea b) do n 1 do artigo 30 da Lei n 109/88;
6 - Porem, se a posse material ocorreu pouco antes de 1 de Janeiro de 1990, de modo a não permitir de todo a exploração de facto ate aquele dia, nem por isso deixa de se justificar a reversão, posto não ter sido afectada a destinação economico-social do predio rustico, permanecendo em aberto as possibilidades de lhe dar oportuna e adequada consecução;
7 - Na hipotese configurada na anterior conclusão 6, a situação, no tocante a exploração de facto verificada posteriormente a 1 de Janeiro de 1990, a realização ou a não realização injustificada dos actos de exploração consentaneos com o fim economico e social do predio rustico e da actividade de exploração e fruição normal implicada nessa destinação, deve ser tomada em conta no exercicio do poder discricionario conferido pelo artigo 30, n 1, alinea b), da Lei n 109/88, com vista a concessão ou recusa da reversão.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Ministro da Agricultura,

Excelência:


I


O artigo 1º da Lei nº 46/90, de 27 de Agosto, deu nova redacção ao artigo 30º da Lei nº 109/88, de 26 de Setembro (Lei de Bases da Reforma Agrária), ficando como segue:
"Artigo 30º
Reversão
1- Por portaria conjunta do Primeiro-Ministro e do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação pode ser determinada a reversão dos prédios ou de parte dos prédios rústicos expropriados quando se comprove que:
a) Permaneceram na posse material e exploração de facto dos anteriores titulares ou na dos respectivos herdeiros;
b) Antes de 1 de Janeiro de 1990 e independentemente de acto administrativo com esse objecto, regressaram à posse material e exploração de facto dos anteriores titulares ou às dos respectivos herdeiros;
c) Os prédios permaneceram ou regressaram à posse e exploração do Estado, quando se trate de explorações exclusivamente florestais, ou quando os anteriores titulares ou os respectivos herdeiros se substituíram ao Estado nos arrendamentos celebrados com os beneficiários da entrega em exploração, por acordo com estes.
2 - Os factos invocados por qualquer interessado para os efeitos do número anterior devem ser provados nos termos gerais de direito, cabendo à direcção regional de agricultura competente na respectiva área a apreciação da prova produzida, com vista ao apuramento dos factos que importam à decisão final." (1

Em face do normativo reproduzido, dignou-se Vossa Excelência solicitar o parecer deste corpo consultivo, com a urgência possível, ponderando o seguinte:
"A primeira alínea do preceito parece-nos ser a situação típica em que se subsume o direito de reversão: o Estado não aplicou o prédio expropriado aos fins para que se destinava, o prédio permaneceu na posse do expropriado, logo, pode reverter ao primitivo proprietário a requerimento deste.
"No caso da alínea b), configurando embora situações em que o bem não foi aplicado ao fim cuja utilidade pública justificou a expropriação porque regressou, ainda que mais tarde, à posse do primitivo proprietário, podendo haver lugar à reversão, persistem problemas de interpretação quanto ao seu alcance, suscitando-se nomeadamente as seguintes questões:
a) Em que consiste a "posse material e exploração de facto" susceptível de desencadear o mecanismo da reversão?
b) Se, por hipótese, a posse material ocorreu em data que não permitiu uma exploração de facto até 1 de Janeiro de 1990 (p. ex. a 25 de Dezembro de 1989), pode o prédio rústico reverter? E, em caso afirmativo, há que ter em conta a situação de exploração de facto no momento de proferimento de despacho ordenando a elaboração de portaria derrogatória da de expropriação?"

Sendo estas as dúvidas interpretativas suscitadas no tocante à alínea b) do artigo 30º, cumpre emitir parecer com a prioridade que lhe foi atribuída.

II

Verificado o condicionalismo descrito na alínea em causa, pode ser determinada a reversão dos prédios ou de parte dos prédios rústicos expropriados.

1. Interessa, em primeiro lugar esclarecer o que deve entender-se por reversão, no contexto específico de uma lei de bases da reforma agrária como a Lei nº 109/88, de 26 de Setembro.
1.1. Após 25 de Abril de 1974, com maior incidência na zona sul do País, verificou-se um movimento de ocupação de terras (2, eventos a que procuraram responder os Decretos-Leis nºs 406-A/75 e 407-B/75, de 30 de Julho, institucionalizando, no plano jurídico, um conjunto de medidas de reforma agrária.

O primeiro diploma sujeitava a expropriação os prédios rústicos em determinadas condições de localização, área e titularidade que não importa agora detalhar, enquanto o segundo, atendendendo a condicionalismos semelhantes, nacionalizava igualmente prédios rústicos beneficiados por certos aproveitamentos hidro-agrícolas.

A breve trecho surgia, porém, "imbuída de filosofia e valores diferentes dos que animavam os referidos Decretos-Leis" (3e revogando estes diplomas, a Lei nº 77/77, de 29 de Setembro, que estabeleceu, nos termos da Constituição, as "bases gerais da reforma agrária".

Entre as medidas de reforma agrária continua a sobressair no âmbito desta lei a expropriação de prédios rústicos na zona de intervenção, verificados similares pressupostos relativos à localização, área e titularidade dos imóveis.

Também ela seria, no entanto, revogada pela vigente Lei nº 109/88, de 26 de Setembro, que veio definir, em conformidade com a lei fundamental, entretanto revista, as novas "bases da reforma agrária".

Ao recente figurino não era estranha a considerável alteração das circunstâncias em que a anterior lei de bases fora elaborada e aprovada (4.

Visou-se "uma completa remodelação das Bases da reforma agrária, no sentido da simplificação dos critérios de aplicação, de ampliação de alguns dos máximos apontados para a propriedade privada, da eliminação de zonas de discricionaridade, de revisão de regras injustas ou comprovadamente irrealistas e da consolidação de situações factuais juridicamente precárias".

Não obstante, porém, as modificações introduzidas, "houve a necessidade de evitar um corte com o passado mais recente, mantendo-se diversas normas características da ossatura da Lei de Bases e garantindo-se a continuidade e a consolidação de situações em que o Estado, para execução da reforma agrária, entregou terras em exploração a numerosos beneficiários, ajudando a criar "uma nova geração de agricultores, em cujo dinamismo continua a apostar" (5.

A nova lei mantém a estrutura essencial da lei antecedente, "definindo os princípios fundamentais de intervenção na política agrícola e na reestruturação da propriedade rústica, bem como as regras relativas à entrega em exploração".

"Os princípios de reestruturação fundiária seguiram fundamentalmente o modelo vindo da sequência legislativa anterior; as modificações operadas situaram-se nas soluções de concretização e não no próprio modelo de intervenção essencial".

"A intervenção neste domínio manteve-se, assim, no princípio da expropriabilidade dos prédios rústicos localizados na zona de intervenção, e no direito concedido aos respectivos proprietários dos prédios expropriados de preservar a propriedade de uma área nos termos definidos pela lei".

O princípio da expropriabilidade vem definido no artigo 11º, exceptuando e declarando não expropriáveis, o artigo 12º, determinados prédios rústicos situados na zona de intervenção, tipificados em função das qualidades dos respectivos titulares e também da área.
Continua, pois, a afirmar-se, como regra, a medida de reestruturação fundiária da expropriação dos prédios rústicos situados na zona geográfica de intervenção, subordinada, todavia, a requisitos e dentro de condicionalismos cuja análise na economia e inteligência do parecer se torna despicienda.

Note-se apenas que "aos proprietários dos prédios expropriados é atribuído o direito de reserva da propriedade de uma área que a lei determina", assumindo este "uma função de equilíbrio, na realização da política de reestruturação fundiária, entre o princípio da extinção das grandes propriedades agrícolas, que deverão entrar no domínio do Estado como modo de reordenar a posse útil da terra", e "a garantia constitucional do direito à propriedade privada."

Ou seja, os proprietários de "prédios rústicos na zona de intervenção estão sujeitos (...) à transferência da propriedade para o Estado através de expropriação. Porém, para salvaguarda do princípio constitucional do direito à propriedade privada, assiste-lhes o direito de reserva de uma determinada área, definida na lei, relativamente à qual gozam dos poderes inerentes ao direito de propriedade."

"Por força do acto de expropriação extingue-se o direito de propriedade do titular da coisa expropriada (...) e nasce um novo direito de propriedade sobre a mesma coisa radicado no expropriante - no caso de expropriação no domínio da reestruturação fundiária, os prédios expropriados passam para o domínio privado indisponível do Estado" (artigo 24º, da Lei nº 109/88).

A expropriação por utilidade pública constitui, assim, "conceitualmente uma forma de extinção e de aquisição [originária] do direito de propriedade por acto de autoridade, em consequência do reconhecimento da necessidade de desafectar do domínio privado determinado bem em função da realização de um interesse público".

1.2. Pode, porém, acontecer que "a expropriação tenha sido realizada para um fim de utilidade pública, mas após a sua consumação se verifique que os bens expropriados não foram aplicados no todo ou em parte ao fim que determinou a expropriação ou que cessou a aplicação a esse fim".

"Nestes casos, é concedido ao expropriado o direito de recuperar esses bens que se mostraram desnecessários para a realização do interesse público justificativo da expropriação" (6.

Com efeito, a "determinação dos bens a expropriar por utilidade pública deve obedecer ao princípio geral, formulado desde sempre na nossa legislação, de que a expropriação será limitada ao necessário para a realização do seu fim" (7.

Corolário lógico deste princípio é, justamente o denominado direito de reversão ou retrocessão: "os bens expropriados que não sejam aplicados ao fim cuja utilidade pública justificou a expropriação (...) devem reverter ao primitivo proprietário" (8.

Pondera-se, nesta tónica, que a faculdade de retrocessão reconhecida ao expropriado se apresenta como implicação do "princípio constitucional da garantia da propriedade", e como consequência da "causa da expropriação", isto é, precisamente, do "interesse público específico" que a motivou, indicado no acto declarativo de utilidade pública, o qual "acompanha a vida deste instituto mesmo para além da sua consumação, de modo que perante o seu não cumprimento o expropriado pode requerer a reversão dos bens expropriados" (9.
O instituto da reversão não é, por outro lado, concebido com uniformidade nos ordenamentos jurídicos.

Na Itália, França e Espanha considera-se a reversão "como uma nova transmissão do bem, de tal modo que o preço que o expropriado deve pagar não é uma restituição da indemnização anteriormente concedida, mas um preço actual, correspondente ao valor do bem no momento da sua reaquisição" (10.

Em outros ordenamentos, como o alemão e o português do Código de 76 (11, o preço a pagar pelo expropriado na reversão é, em princípio, idêntico à indemnização recebida pela expropriação, entendendo-se que "a eventual valorização posterior do objecto não deverá beneficiar o expropriante, devido à sua actuação irregular ao não ter aplicado o bem ao fim específico que tinha determinado a expropriação" (12.
As orientações sumariadas correspondem grosso modo às duas principais teorias que procuram dilucidar o problema da natureza jurídica do direito de reversão.

A primeira considera-o como um "direito legal de compra" conferido ao expropriado, qualificável como direito potestativo, uma vez que, exercido este, não pode o expropriante opor-se-lhe eficazmente (13.
A segunda considera a reversão como condição resolutiva.
O acto expropriativo, de que deriva a transferência dos bens para a entidade expropriante, tem, como vimos, a sua justificação no facto de os bens serem necessários para a realização de um interesse público específico. Daí que a expropriação, e a consistência da transferência da propriedade, esteja condicionada à efectiva subsistência daquela sua causa e única, essencial razão, ou seja subordinada à condição resolutiva, juspublicística, de a entidade expropriante dar ao bem a específica destinação de utilidade pública prosseguida (14.

Não interessará neste momento ir mais longe, no intuito de cabal satisfação da consulta.

Anote-se, todavia, além do mais, que a última teoria apresenta, em certa opinião, o fundamento correcto do direito, conferido ao expropriado, de recuperar, no todo ou em parte, os bens expropriados, o qual residirá, em suma, no sentido e alcance do elemento "utilidade pública" no instituto da expropriação (15.

2. Atingido um quadro suficientemente definido das consequências jurídicas a que pode haver lugar no caso de integração da previsão normativa configurada na alínea b) do nº 1 do artigo 30º da Lei de Bases da Reforma Agrária, importa agora recortar analiticamente os "Tatbestandmerkmale" da norma em questão.

Com efeito, a consequência jurídica vem neste caso formulada antes da previsão e é bom que, a benefício da disciplina da investigação e do adequado tratamento metodológico das questões, se radique a plena consciência dessa nuance.

A técnica utilizada compreende-se facilmente à luz da economia, inteligência e funcionalidade dos ingredientes discursivos.

Basta notar que a consequência jurídica - a reversão dos prédios expropriados - é comum às diferentes previsões recortadas nas três alíneas do nº 1 do artigo 30º, assim se dando lugar, verdadeiramente, nesta óptica, a outras tantas normas jurídicas autónomas, sem embargo das afinidades e relações entre elas intercedentes.

A norma que nos interessa, delimitada com base na hipótese descrita na alínea b), assume, pois, a seguinte configuração, em que, por razões de menor complexidade, abstraimos deliberadamente das fracções de prédios a que no artigo 30º se alude:
"Quando se comprove que os prédios rústicos expropriados regressaram à posse material e exploração de facto dos anteriores titulares ou às dos respectivos herdeiros antes de 1 de Janeiro de 1990 e independentemente de acto administrativo com esse objecto, [previsão] pode ser determinada a sua reversão por portaria (...)" [consequência jurídica].
Pretende-se, num primeiro ponto, esclarecer o que seja a "posse material e exploração de facto" susceptível de desencadear o mecanismo da reversão.
2.1. Vejamos em que consiste a "posse material" de um prédio rústico.

A imediata sugestão dirigida ao espírito do intérprete relaciona-se com a noção de posse vertida no artigo 1251º do Código Civil:

"Artigo 1251º
(Noção)
Posse é o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real."

Consagra este preceito uma "concepção subjectiva" do instituto possessório.
Em tal acepção, remontando a SAVIGNY, e acolhida nos Códigos francês e italiano, a posse é integrada por dois elementos: o "corpus possessório" e o "animus possidendi".

O "corpus", o elemento material, consiste no "domínio de facto sobre a coisa, traduzido no exercício efectivo de poderes materiais sobre ela ou na possibilidade física desse exercício" (16.
Reconduz-se, pois, normalmente, ao exercício de poderes de detenção, à guarda e conservação da coisa em poder do possuidor, à sua ocupação.

Não será, porém, necessário à existência do "corpus" um permanente contacto físico com a coisa. Basta que esta se encontre "virtualmente dentro do âmbito do poder de facto do possuidor" - não deixa de haver posse de um automóvel pelo facto de se deixar este estacionado numa rua por umas hora ou por um dia (17.

A própria detenção, aquele contacto físico, real ou virtual, com a coisa pode faltar, traduzindo-se o "corpus" em actos de fruição mediante a recolha de vantagens económicas proporcionadas pela coisa - os frutos de um prédio rústico cultivado por outrem, ou as rendas de qualquer prédio dado em arrendamento (18.

O "animus" é, por sua vez, o elemento de natureza psicológica, consistindo na "intenção de exercer sobre a coisa, como seu titular, o direito real correspondente àquele domínio de facto" (19.

Na "concepção objectiva", de VON IHERING, perfilhada pelos direitos brasileiro e alemão, a posse reduz-se ao "exercício de um poder de facto sobre a coisa", decerto volitivamente orientado, mas prescindindo da especial qualificação do "animus" postulada na teoria subjectiva (20.

Nessa tese, porém, nem todo o poder de facto constitui posse. Para que esta possa afirmar-se, deve o poder ou domínio de facto (tatsachliche Gewalt; tatsachliche Herrschaft), salienta a doutrina, revestir-se de alguma estabilidade, não bastando um contacto fugaz com a coisa - o doente que na sala de espera de um consultório lê uma das revistas habitualmente aí disponíveis não tem a posse dela; o indivíduo sentado num café não tem a posse da mesa nem da cadeira (21.

Na mesma concepção, não são, ademais, considerados possuidores aqueles que exercem um poder de facto sobre as coisas, mas na directa e imediata dependência de outrem (como seus subordinados). Fala-se, a este propósito, de "servidores da posse" (Besitzdiener; § 855 do BGB), aos quais é lícito usar os meios de autotutela (§ 860 do BGB) contra sujeitos diferentes do possuidor, mas não as acções de manutenção ou restituição da posse (22.

A diferença prática entre as duas concepções radica em que, na concepção objectiva, o instituto da posse - ou melhor, alguns dos seus efeitos, como os que se referem à defesa da posse - se aplica a muitas situações que na concepção subjectiva se qualificam de "mera detenção". Serão possuidores (directos, imediatos), nesta tónica, o locatário, o comodatário, o depositário, o mandatário, o transportador, o administrador de bens alheios, relativamente às coisas que nessa qualidade lhes são entregues, embora a sua posse não exclua a posse do titular do direito real (possuidor mediato, indirecto), em cujo nome ou interesse actuam (23.

Já, porém, no tocante a outros efeitos,tais os que respeitam à usucapião, é necessário o "animus", exigível em geral pela concepção subjectiva (24.

A nossa lei preferiu, portanto, acolher-se à teoria subjectiva, como resulta claramente do artigo 1251º do Código Civil.

Acresce, aliás, que o artigo 1253º qualifica como simples "detenção" diversas situações em que o poder de facto se exerce sobre as coisas sem o "animus possidendi", originando, portanto, mera "posse precária", em lugar de verdadeira posse.

Possuidor, para a nossa lei, é, assim, apenas aquele que, "actuando por si ou por intermédio de outrem (...), além do corpus possessório tenha também o animus possidendi - a intenção de exercer sobre a coisa um direito real próprio" (25.

Todavia, a lei estabelece no artigo 1252º, nº 2 uma importante presunção destinada a facilitar a prova do animus: em princípio, "presume-se a posse naquele que exerce o poder de facto".

E a diferença entre o nosso sistema e os que consagram a concepção objectiva esbate-se na medida em que o Código Civil português estendeu a protecção possessória a diversas situações de simples detenção - cfr. v.g. os artigos 1037º, nº 2 (locatário), 1133º, nº 2 (comodatário) e 1188º, nº 2 (depositário) (26.

Acrescente-se que uma situação possessória tanto pode corresponder como não ao exercício de um direito sobre a coisa.

Daí a contraposição do exercício causal ao exercício aparente do direito, que está na base da distinção doutrinal entre posse causal e posse formal.

A posse causal é "aquela que tem a justificá-la a titularidade do direito a que se refere"; enquanto a posse formal ocorre "quando alguém exerce aparentemente um direito sobre uma coisa, estando a sua situação dissociada da titularidade substantiva" (27.

A primeira modalidade, na medida em que representa apenas o exercício de um direito real pré-existente, em cujo conteúdo figura e que constitui a sua causa jurídica, não reveste propriamente autonomia.

É a denominada posse formal, implicando uma relação de facto ou material, "considerada independentemente da legitimidade do direito que visa traduzir ou da causa que tende a legitimá-la", a qual "constitui um instituto autónomo, um direito em si, com elementos, efeitos e categoria jurídica independentes" (28.

Escreveu-se a tal propósito:
"Esta relação de facto da pessoa com a coisa pode logicamente dissociar-se do direito que traduz. É possível na verdade supor um estado de facto, conteúdo material de um direito, que não tenha atrás de si uma causa jurídica; e esta possibilidade não é apenas lógica, é também real. Com efeito, embora quem perante o público se apresente na atitude de proprietário seja, na maior parte das vezes, titular de um direito de propriedade, quem se apresente como usufrutuário seja, em regra, titular de um usufruto, contudo pode suceder, e sucede com frequência, que se estabeleçam entre uma pessoa e uma coisa relações materiais, que nenhum título jurídico justifique.
"Usufrui e transforma, muitas vezes, quem não é proprietário nem titular de direitos que lhe permitam a prática de actos de fruição e de transformação; mas simplesmente porque furtou ou usurpou o objecto que detém ou o adquiriu por título destituído de valor.
"Quer dizer: - o exercício de um direito ou a possibilidade de o exercer não coincide sempre com a existência do próprio direito.
"Dissociada ou não do direito que traduz, a relação material, aparência de um direito ou poder independente, tem por si mesma um valor próprio.
"É que os actos de uso, de fruição e de transformação, porque são susceptíveis de se repetirem indefinidamente, dão lugar, por si e por força da sua própria materialidade, a um estado de permanência, de continuidade, que o público se acostumou a considerar e por isso mesmo, inspirador de interesses e criador de relações.
"Ora, é a este estado - susceptível de, sob o ponto de vista lógico e real, ser isolado do direito que traduz e que na vida social aparece como um facto de alto valor, elevado pela lei, que lhe definiu os elementos e regulou os efeitos, a categoria jurídica independente - que se chama jus possessionis, posse formal, posse em sentido próprio" (29.

Sustenta-se ser, de resto, a esta "posse formal" que se refere o artigo 1251º do Código Civil ao defini-la como poder que se manifesta quando alguém actua "por forma correspondente ao exercício do direito", pretendendo, nesta expressão, explicitar que a posse não se identifica com o exercício do próprio direito; trata-se apenas de "actuação que exteriormente se apresenta parecida com o exercício de um direito real e por isso não assimilável à posse causal" (30.

Noutro sentido, atendendo a que o Código de 1867 (artigo 474º) tornava objecto da posse "qualquer coisa ou direito", enquanto o Código vigente restringe o conceito aos direitos reais, deixando de fora as restantes classes de direitos, nessa outra óptica se diz que o Código Civil de 1966 consagra um "conceito material" de posse, por contraposição ao Código de Seabra que enunciava um conceito de posse meramente "formal" (31.

A natureza jurídica da posse é controvertida.

Para alguns trata-se de um mero facto. A lei "atribui relevo jurídico à posse, não porque lhe reconheça autonomia, mas antes porque vê nela [topicamente] uma presunção da propriedade - o seu reflexo factual" (32.

Num ponto de vista aparentado, precisa-se, porém, que "a posse em sentido técnico", ou seja, a "posse formal ou autónoma, não é evidentemente um direito, embora seja fonte de consequências jurídicas e até de direitos". É sim, "uma situação de facto juridicamente relevante, como ocorre a muitas outras no mundo jurídico", tais "o casamento putativo, a união de facto, a ausência, etc." (33.

Para outros autores, a posse é considerada como verdadeiro "direito subjectivo", de natureza real, dotado de eficácia "erga omnes" (34.

Mesmo nesta construção se aceita, em todo o caso, ser a posse, no plano físico ou naturalístico, realmente um facto, embora recebido pelo direito, que lhe atribui diversos efeitos independentemente de qualquer averiguação sobre a existência, na esfera do possuidor, do direito real correspondente aos poderes exercidos sobre a coisa.

A posse, dá-se como assente, nasce como pura relação de facto, se bem que, uma vez nascida, se converta em direito, em relação produtora de efeitos jurídicos.

E o certo é que ela reveste, como facto, características diferentes das que normalmente andam associadas ao comum dos factos jurídicos. Estes apenas têm que existir no momento do surgimento do direito subjectivo, desempenhando aí tão-só uma função genética ou geradora, enquanto na posse, o facto acompanha indissoluvelmente o direito, o qual se extinguirá logo que o facto deixe de subsistir.

Daí, precisamente, a "natureza provisória" do direito do possuidor: a protecção que a lei confere à posse cessará se, antes do decurso do prazo da usucapião, vier o titular do direito reivindicar triunfantemente a coisa (35.

É, como quer que seja, irrecusável o relevo, no domínio da posse, da materialidade e factualidade em que se traduz o"corpus".

Por isso que a palavra posse seja "empregada na linguagem corrente - communiter loquendo - para referir a realidade que constitui a base daquele conceito e que se traduz na retenção e fruição material de uma coisa" (36.
2.2. Cremos, por todo o exposto, ser esse vector de realidade e facticidade que se pretendeu fazer avultar mercê da expressão "posse material" vertida na alínea b) do nº 1 do artigo 30º da Lei de Bases da Reforma Agrária (37.

O conteúdo substancial do conceito será, assim, grosso modo, preenchido pelo elemento "corpus possessório", o complexo de poderes materiais de facto, de detenção uso e fruição da coisa, cujo exercício estável e, decerto, revestido de publicidade, constitui fundamento nuclear de toda a posse - diagnóstico que a própria semântica sugere -, com formal abstracção, dir-se-ia, de uma específica exigência do "animus possidendi", aliás, essencial na estrutura e função económico-social da posse já em sentido jurídico.

Compreende-se que assim seja.

O prédio está expropriado, integrado, pois, na propriedade do Estado e no seu domínio privado indisponível. E, posto que a lei se propõe fazê-lo reverter juridicamente à esfera do anterior titular cumpridos meros requisitos de realidade - reveladores, por seu turno, da frustação do fim de interesse público visado pela expropriação -, não faria, porventura, muito sentido, e careceria até de utilidade, a pretensão de uma similar atitude psicológica, cuja intencionalidade vai colimada ao funcionamento autónomo da posse na produção de paralelo efeito jurídico.

Mas tal não significa que essa espécie de ligação entre o possuidor material e o prédio, implicada no "animus possidendi", seja para a lei indiferente.

Bem pelo contrário.

Não se trata verdadeiramente de prescindir dela na reaquisição do domínio, como se bastasse a transparência externa de actos materiais mais ou menos indiciários.

A lei vai mais longe, ao ponto de os poderes de facto relevantes no sentido da reversão serem unicamente os exercitados pelo anterior titular ou seus herdeiros.
2.3. Entende-se que essa posse material compreenda os actos e factos de "exploração", manifestação expressiva de fruição individual e da destinação económica e social do prédio rústico.

Neste Conselho houve já o ensejo de teorizar no sentido de que o conceito de "prédio rústico" em sede de reforma agrária coincide com a noção utilizada no artigo 204º, nº 2, do Código Civil: "uma parte delimitada do solo e as construções nele existentes que não tenham autonomia económica".

Em desenvolvimento da ideia ponderou-se, por exemplo, no parecer nº 82/80 (38:
"Prédio rústico será assim constituído por uma porção delimitada de terra com as edificações necessárias à prossecução dos seus fins agrícolas, silvícolas ou pecuários. Consequentemente, a construção humana sem autonomia económica, que tenha conexão necessária e directa com a prossecução daqueles fins, será apenas uma componente do prédio rústico sujeita ao seu destino. Nessa construção humana, podem incluir-se as adegas, os celeiros, as edificações destinadas às alfaias agrícolas (-), e, inclusive, as instalações que servem de domicílio aos trabalhadores ligados à exploração da terra."

A exploração de um prédio rústico consiste, pois, na extracção das utilidades económicas que podem proporcionar as actividades agrícola, silvícola e pecuária nele desenvolvidas.

Privilegiadamente, a actividade agrícola.

É na realidade "a força produtiva da terra que confere à actividade agrícola o seu carácter específico" (39.

Entende-se, pois, sem esforço, dizíamos, que a "posse material" de um prédio rústico implique a actividade de exploração, agrícola ou outra, nele susceptível de ser praticada.

E se o prédio rústico está expropriado, essa exploração "de facto" - pois que abstraída ainda, como sabemos, de adequado suporte jurídico - parece mesmo constituir, em princípio, nos termos do artigo 30º, nº 1, alínea b), da Lei nº 109/88, requisito indispensável de outorga da reversão.

De outra forma talvez se compreendesse menos, incluída a priori no conjunto de poderes de facto cujo exercício pode caracterizar uma posse em sentido material, a especial exigência que no contexto daquela previsão lhe é dedicada.

Naturalmente, em domínio onde são delicadas as implicações da função económico-social da propriedade fundiária, não poderia o legislador, com razoabilidade, alhear-se de semelhante imperativo.
2.4. A "posse material e a exploração de facto" de que nos fala a alínea b) são, nos termos referidos, nuclearmente, conceitos de facto.

O caso paralelo da alínea a) bem o ilustra.

Nesta hipótese, recorde-se, o prédio rústico "permaneceu", não obstante a expropriação, na posse material e exploração de facto dos anteriores titulares.
Ora, pela expropriação extingue-se o direito de propriedade do expropriado e surge um novo direito de propriedade com o mesmo objecto na titularidade do expropriante, direito "absolutamente independente do direito do expropriado", que "opera sem necessidade de qualquer conduta deste no sentido de entrega efectiva ou simbólica da coisa" (40.
Compreendem-se, por conseguinte, as condições em que, apesar da expropriação, o prédio rústico permaneceu na posse material e exploração de facto do expropriado.
A sua propriedade transferira-se para o domínio do Estado, carecendo, pois, de fundamento jurídico aquela posse e exploração.
Estas só podem, consequentemente, conceber-se em termos factuais, aliás, conflituantes com a situação jurídica de pertinência, ao Estado - tal como na alínea b)-, do direito exteriorizado, e aparentado, pela posse material e exploração de facto do anterior titular.

3. A posse material e a exploração de facto do prédio rústico expropriado são, em princípio, pressupostos cumulativos da reversão na previsão da alínea b).
Todavia, os dois requisitos não se situam no mesmo plano de relacionamento do sujeito com a coisa.

A priori, a posse material compreende ou pode compreender um conjunto de actos e factos traduzindo diversos graus de funcionalidade dos poderes de facto exercidos, desde os primeiros contactos com a coisa, materializando a sua detenção, guarda e conservação, até aos actos mais ou menos complexos corporizando a exploração e fruição das utilidades que seja susceptível de proporcionar.

É óbvio, porém, que estes últimos actos de exploração apenas normalmente são viabilizados pela precedência natural dos actos de detenção, guarda e conservação.

Mas também, porque estes actos de mais simples relação já por si podem substanciar a posse, então, desde que esta surja pela sua prática, logo a "exploração de facto" potencialmente se prefigura naquela posse material preparatória.

Ora, tais perspectivas não podem perder-se de vista quando se afirma a necessidade, como regra, segundo a questionada alínea b), de que o prédio rústico tenha regressado à posse material e à exploração de facto dos anteriores titulares antes de 1 de Janeiro de 1990.
3.1. Nesta óptica, quid juris, se a posse material ocorreu em data que não permitiu uma exploração de facto até àquele dia?

Verificam-se, neste caso, os pressupostos da reversão?

Este o primeiro aspecto da segunda questão colocada por Vossa Excelência.

Inclinamo-nos para uma resposta afirmativa.

A circunstância de o prédio haver regressado à posse material do antigo titular - por meios, obviamente, que não sejam ilegítimos e, nomeadamente, por "acordo entre as partes", mas sem necessidade do concurso de acto administrativo com esse objectivo -, já de algum modo revela que não foi aplicado ao fim de utilidade pública que determinara a expropriação, e, assim sendo, deixa esta de justificar-se, justificando-se, ao invés, a reversão (41.

Não houve, todavia, possibilidade de exploração do prédio antes de 1 de Janeiro de 1990.

Os factos em que se baseia esta conclusão da consulta não vêm particularizados.

Decorrera talvez um lapso demasiado curto desde a ocorrência da posse material, ou não era a época própria dos trabalhos de exploração típicos e adequados à fruição do prédio em causa.

As colheitas, por exemplo, estavam realizadas, e a preparação da terra para as sementeiras, tal como os abates e extracções do sector silvícola, só deveriam ter lugar mais tarde.

Sem embargo, praticaram-se ainda, por hipótese, actos preparatórios elementares de guarda e manutenção de alfaias agrícolas, ou de contactos visando a contratação de trabalhadores ou a obtenção de financiamentos.

Como quer que seja, não foi, consequentemente, afectada a destinação económico-social do prédio, permanecendo em aberto todas as possibilidades de lhe dar oportuna consecução.

A reversão, frustrado o fim de utilidade pública que motivara a expropriação, continua a apresentar-se, porventura, como meio conveniente à prossecução dos interesses envolvidos na função social da propriedade fundiária.

Seria, num semelhante circunstancialismo, violenta e ofensiva da teleologia normativa, e do fim legal, como a seguir também reconheceremos, a recusa da reversão, em homenagem à pura literalidade da norma.
3.2. Advindo o prédio rústico expropriado à posse material do anterior titular pouco antes de 1 de Janeiro de 1990, sem possibilidade, assim, como a consulta refere, de aquele desenvolver, até esse momento, actos de exploração consentâneos com o seu fim económico e social, pode acontecer que esses actos sejam praticados, com diligência e oportunidade, posteriormente à referida data.

Ou, pode, pelo contrário, verificar-se que o prédio, sem justificação, não vem a ser objecto da actividade de exploração e fruição normal implicada na sua destinação - injustificadamente, as sementeiras habituais não vieram a ser realizadas na altura própria, descuidou-se a manutenção e reprodução dos gados, sujeitando-se estes a abate indiscriminado, de puro consumo, as colheitas não tiveram lugar na época adequada.

Será que a situação, no concernente à exploração de facto, posterior a 1 de Janeiro de 1990, configurada em qualquer das duas formas apontadas, com gradações que seria inviável tipificar, pode, como quer que se apresente, ser tomada em conta na perspectiva da prática dos actos administrativos tendo como escopo a derrogação da expropriação e a concessão da reversão?

Tal a última interrogação formulada por Vossa Excelência.

Propendemos igualmente para uma resposta afirmativa.

Na verdade, as competências em matéria de reversão conferidas ao Primeiro-Ministro e ao Ministro da Agricultura pelo artigo 30º da Lei nº 109/88 integram, a nosso ver, poderes funcionais de cariz discricionário.

Em lugar de impor àqueles membros do Governo uma actuação vinculada à concessão da reversão e à inerente desexpropriação, logo que verificados os pressupostos de produção destes efeitos jurídicos, é o citado normativo, ao invés, suficientemente sugestivo - "(...) por portaria conjunta (...) pode ser determinada a reversão dos prédios (...) quando se comprove (...)" - no sentido de lhes ficar reservada a liberdade de apreciação acerca da conveniência e da oportunidade de exercício do poder funcional respectivo (42.

Isto quer dizer que o exercício do poder fica "entregue ao critério do respectivo titular, deixando-lhe liberdade de escolha do procedimento a adoptar em cada caso como mais ajustado à realização do interesse público protegido pelo norma que o confere" (43.

A outorga de semelhante liberdade não retira, no entanto, ao poder discricionário o seu carácter funcional. Embora o titular do poder seja o único juiz da oportunidade e da conveniência em exercê-lo, deve o poder "ser exercido sempre que assim o exijam os interesses servidos e para o fim que eles imponham".

Ora, como compreender essa margem mais ou menos ampla de determinação reconhecida à Administração em determinadas situações?

"A discricionaridade de certos poderes conferidos por lei aos órgãos da Administração - entendida ela pela opinião maioritária como "liberdade de escolha do agente entre vários comportamentos possíveis", por modo que "a lei indicaria ao agente o fim a prosseguir mas deixar-lhe-ia a determinação dos meios e das circunstâncias" - traduz o reconhecimento pelo legislador da impossibilidade de prever na norma toda a riqueza e variedade das circunstâncias em que o órgão pode ser chamado a intervir e das soluções mais convenientes consoante os casos. O legislador deixa, pois, em maior ou menor grau, a quem tiver de aplicar a lei, liberdade para encontrar a melhor solução para cada caso concreto, considerando-a legal desde que preencha o fim de interesse público que se pretende realizar" (44.

"Isto é: definido o fim a atingir - e não apenas o fim último e genérico de toda a actividade administrativa, mas os fins específicos a realizar por certo órgão em dadas condições - a lei autoriza o órgão competente a deduzir dele, segundo o seu critério em cada caso, as regras de acção e os modos de agir".

A liberdade de apreciação pode, de resto, respeitar "a certos pressupostos, à conveniência de agir ou de abster-se, ao momento de agir, ao objecto, às formalidades e à forma do acto".

"A lei confiou no órgão, admitindo como expressão correcta da vontade legal qualquer solução dada no caso concreto desde que vise o fim de interesse público por ela fixado ao conferir a competência" (45.

O fim subjacente ao poder discricionário conferido no artigo 30º da Lei de Bases da Reforma Agrária é o de, frustrado o escopo de utilidade pública prosseguido com a expropriação, reconduzir a propriedade à sua destinação económico-social, fonte de vantagens individuais e colectivas, mercê de eventual restituição ao expropriado que, pela posse material e a exploração de facto exercidas sobre o prédio rústico, se mostre concretamente vocacionado para a prossecução dessa finalidade.

Justamente por isso, o circunstancialismo factual em que vem sendo realizada a exploração no momento do exercício do poder discricionário constitutivo da reversão é necessariamente elemento de apreciação acerca da consecução do apontado fim legal.

De forma que a ressonância negativa da realização do fim mediante a concessão da reversão pode justificar a abstenção do exercício do poder.

Concretizando. Na segunda das hipóteses há pouco delineadas no tocante à situação da exploração de facto, o exercício normal do poder discricionário conduzirá, sob pena de desvio de poder, à não outorga da reversão.
Conclusão:



III

Termos em que se conclui:
1. A reversão dos prédios rústicos expropriados prevista no artigo 30º da Lei nº 109/88, de 26 de Setembro - Lei de Bases da Reforma Agrária - na redacção do artigo 1º da Lei nº 46/90, de 22 de Agosto, tem como pressuposto básico a não aplicação dos prédios ao fim cuja utilidade pública fundamentou a expropriação;
2. A frustração do fim de utilidade pública que presidiu à expropriação revela-se, face à previsão da alínea b) do nº 1 do citado artigo 30º, na circunstância de os prédios rústicos expropriados terem regressado à posse material e exploração de facto dos anteriores titulares ou dos seus herdeiros antes de 1 de Janeiro de 1990, independentemente de acto administrativo com esse objectivo;
3. O conteúdo substancial do conceito "posse material" é grosso modo constituído pelo elemento "corpus possessório", seja o exercício estável do complexo de poderes materiais de facto de detenção, guarda, conservação, uso e fruição do prédio rústico expropriado;
4. O conceito "exploração de facto" compreende, igualmente no plano factual, o conjunto de poderes e actos de fruição e extracção das utilidades económicas que podem proporcionar as actividades agrícola, silvícola e pecuária susceptíveis de serem desenvolvidas no prédio rústico expropriado;
5. A posse material e a exploração de facto do prédio rústico expropriado são, em princípio, pressupostos cumulativos da reversão na previsão da alínea b) do nº 1 do artigo 30º da Lei nº 109/88;
6. Porém, se a posse material ocorreu pouco antes de 1 de Janeiro de 1990, de modo a não permitir de todo a exploração de facto até aquele dia, nem por isso deixa de se justificar a reversão, posto não ter sido afectada a destinação económico-social do prédio rústico, permanecendo em aberto as possibilidades de lhe dar oportuna e adequada consecução;
7. Na hipótese configurada na anterior conclusão 6., a situação, no tocante à exploração de facto verificada posteriormente a 1 de Janeiro de 1990, a realização ou a não realização injustificada dos actos de exploração consentâneos com o fim económico e social do prédio rústico e da actividade de exploração e fruição normal implicada nessa destinação, deve ser tomada em conta no exercício do poder discricionário conferido pelo artigo 30º, nº 1, alínea b), da Lei nº 109/88, com vista à concessão ou recusa da reversão.



_______________________________________

(1) O artigo fora publicado originariamente com a redacção que a seguir se transcreve:
"Artigo 30º
Reversão
1- Por portaria conjunta do Primeiro-Ministro e do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação pode ser determinada a reversão dos prédios rústicos expropriados, quando se comprove que:
a) Permaneceram na posse material e exploração de facto dos anteriores titulares ou na dos respectivos herdeiros;
b) Antes de 24 de Fevereiro de 1988 e independentemente de acto administrativo com esse objectivo, regressaram à posse material e exploração de facto dos anteriores titulares ou às dos respectivos herdeiros."
(2) Parecer deste Conselho nº 135/83, de 7 de Julho de 1983, "Diário da República", II Série, nº 8, de 10 de Janeiro de 1984, e "Boletim do Ministério da Justiça", nº 333, pág. 111, que neste momento acompanhamos muito de perto; cfr. também os pareceres nº 111/80, de 20 de Novembro de 1980, "Diário da República", II Série, nº 182, de 10 de Agosto de 1981, e "Boletim do Ministério da Justiça", nº 306, pág. 88; nº 46/89, de 12 de Julho de 1989, inédito.
(3) Parecer nº 111/80, ponto 2.2.
(4) Parecer nº 46/89, que agora vamos seguir por momentos nos pontos 4. e 5., transcrevendo, por vezes, literalmente.
(5) Motivações constantes da exposição justificativa da respectiva proposta de lei, seleccionadas no parecer nº 46/89, que continuamos a acompanhar.
(6) FERNANDO ALVES CORREIA, As garantias do particular, na expropriação por utilidade pública, Coimbra, 1982, pág. 162; parecer nº 135/83, ponto VII.
(7) MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, tomo II, 9ª edição, 2ª reimpressão revista e actualizada pelo Prof. Doutor DIOGO FREITAS DO AMARAL, Coimbra, 1983, págs. 1032 e s., escrevendo sob o signo da Lei nº 2030, de 22 de Junho de 1948, e do Regulamento das Expropriações aprovado pelo Decreto nº 43587, de 8 de Abril de 1961.
O princípio vinha também formulado no artigo 4º, nº 1, do Código das Expropriações aprovado pelo Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro, o qual rege, aliás, as expropriações previstas na Lei nº 109/88 "em tudo quanto nela não esteja especificamente regulado" (artigo 25º) - "A expropriação será limitada ao necessário para a realização do seu fim, podendo, todavia, atender-se a exigências futuras quando previsíveis".
Revogado este diploma pelo artigo 3º do recente Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro, o princípio continua a ser acolhido no artigo 3º, nº 1, do novo Código das Expropriações agora aprovado - para entrar em vigor, no entanto, 90 dias após a data da publicação (artigos 1º e 2º) -: "A expropriação deve limitar-se ao necessário para a realização do seu fim, podendo, todavia, atender-se a exigências futuras, de acordo com um programa de execução faseada e devidamente calendarizada, o qual não poderá ultrapassar o limite máximo de seis anos".
(8) MARCELLO CAETANO op. cit., págs. 998 e 1035 e s.
(9) ALVES CORREIA, op. cit., págs. 162 e s., observando (nota 274) que a ideia da garantia constitucional do direito de propriedade como fundamento da reversão é claramente salientada na jurisprudência do Bundesverfassungsgericht, segundo o qual a pretensão de retrocessão (Ansprusch auf Rückenteignung) tanto pode fundar-se nas disposições legais que expressamente a prevêem (v.g., os §§ 102 e 103 da Bundesbaugesetz, de 23 de Junho de 1960), como, directamente, no artigo 14º, nº 1, da Constituição de Bonn, que aquela garantia consigna. Neste sentido, o Tribunal Constitucional alemão considerou - escreve o mesmo autor - que, "se o fim da expropriação não for realizado dentro do prazo previsto ou se se verificar posteriormente que o imóvel não é necessário para aquele fim, desaparece a legitimação para o ataque à propriedade privada e o fundamento jurídico (Rechtsgrund) para a aquisição da propriedade por parte de uma entidade pública e que se encontra no artigo 14º, nº 3, frase 1 da GG [Grundgesetz], que refere que uma expropriação só é admissível para a realização do bem comum".
O artigo 14º, primeiro parágrafo, da Constituição de Bonn dispõe, efectivamente: "Das Eigentum und das Erbrecht werden gewahrleistet. Inhalt und Schranken werden durch die Gesetz bestimmt" ("São garantidos a propriedade e o direito de sucessão. O seu conteúdo e limites são determinados pela lei"). Estatuindo, por sua vez, o primeiro período do nº 3 do mesmo artigo: "Eine Enteignung ist nur zum Wohle der Allgemeinheit zulassig" ("A expropriação só é admissível para a realização do bem comum") - exigência igualmente implicada, diga-se, na expressão "expropriação por utilidade pública" vertida no homólogo preceito do artigo 62º, nº 2, da nossa Constituição.
Acerca do sentido desses normativos constitucionais podem consultar-se MAUNZ-DÜRIG, Grundgesetz Kommentar, vol. II, C.H. Beck'sche Verlagsbuchhandlung, München, 1989, especialmente págs. (14) 18 e ss., (14) 135 e ss. e (14) 207 e ss. Ponderam estes autores - pág. (14) 231 -, especificamente acerca da "Rückenteignung" ("desexpropriação", traduzir-se-ia, mais ao pé da letra) - designação, importada do § 102 da Bundesbaugesetz, que, de resto, criticam, preferindo-lhe a expressão "Rückübertragung des Eigentums" ("reversão" ou "retrocessão da propriedade"), por não se tratar aqui de expropriações, mas da concessão de pretensões obrigacionais dirigidas à resolução dos efeitos expropriatórios; e a precisão teria importância por isso que, não estando propriamente em causa "expropriações", deixaria de ter aplicação o princípio da reserva de lei a propósito estatuído no artigo 14º, parágrafo terceiro, segundo período ("Sie darf nur durch Gesetz oder auf Grund eines Gesetzes erfolgen, das Art und Ausmass der Entschadigung regelt (...)"),tal como no nº 2 do artigo 62º da Constituição portuguesa -, ponderam, portanto, que, se o escopo do bem comum estiver presente no momento da expropriação, mas desaparecer mais tarde, o anterior proprietário passa a dispor de um direito de reversão da propriedade que flui directamente do artigo 14º, parágrafo primeiro, primeiro período. Os pressupostos do parágrafo terceiro, primeiro período, representam a necessária "causa" da operada modificação da propriedade, de modo que, falhando os mesmos após a expropriação, deve a situação constitucionalmente assegurada (garantia da propriedade) ser reposta mediante a eliminação da aludida modificação. E a falência da causa da expropriação pode resultar do facto de o projecto não ser realizado ou de o bem expropriado não ser ou ter deixado de ser necessário à sua consecução.
(10) ALVES CORREIA, op. cit., págs. 163 e s., citando PASQUALE CARUGNO, A. LAUBADÆRE e GARCIA DE ENTERRIA.
(11) A mesma orientação parece ser ainda a do Código recém-aprovado pelo Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro (cfr. o artigo 73º, nº 1, alíneas d) e e), e nº 3, e o artigo 74º).
(12) ALVES CORREIA, op. cit.,pág. 164.
(13) Neste sentido, face ao direito italiano, NAZARENO SAITTA, Natura ed esercizio del diritto di retrocessione, "Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico", Ano XIV (1964), nº 3, págs. 613 e ss. e particularmente pág. 639, apud ALVES CORREIA, op. cit., págs. 165 e s., e nota 283.
Na mesma orientação escreve MICHELE PALLOMINO, Retrocessione dei beni espropriati, "Enciclopedia del Diritto", XL, pág. 97, louvando-se na jurisprudência, tratar-se de "un diritto potestativo dell'espropriato, cui corrisponde una posizione di soggezione o di obbligo specifico (a retrocedere il bene) dell'espropriante".
(14) ALVES CORREIA, op. cit., págs. 166 e s.
(15) ALVES CORREIA, op. cit., pág. 167.
(16) MANUEL HENRIQUE MESQUITA, Direitos Reais, Sumários das Lições ao Curso de 1966-67, Coimbra, 1967, págs. 65 e ss., cuja lição estamos a seguir muito de perto.
(17) MOTA PINTO, Direitos Reais (prelecções ao 4º ano jurídico coligidas por Álvaro Moreira e Carlos Fraga), Coimbra, 1972, pág. 181, que agora acompanhamos.
(18) MOTA PINTO, op. cit., págs. 182 e s.; PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, Noções Fundamentais de Direito Civil, vol. II, nova edição, Coimbra, 1950, págs. 129 e segs..
(19) M. H. MESQUITA, op. cit., pág. 67; MOTA PINTO, op. cit., págs. 183 e ss.; PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, op. cit., págs. 129 e ss.
Nos direitos francês e espanhol vejam-se G. MARTY/P. RAYNAUD, Droit Civil. Les Biens, 2ª edição, Paris, 1980, págs. 305 e ss.; J.A. ALVAREZ-CAPEROCHIPI, Curso de Derechos Reales, tomo II, Los Derechos Reales Limitados, Madrid, págs. 124 e ss.; A. HERNANDEZ GIL, Obras completas, tomo II, La Posesión como Institución Jurídica y Social, Madrid, 1987, págs. 83 e ss..
(20) Dispõe, assim, o primeiro parágrafo do § 854 do Código Civil alemão, dispositivo, tal como o nosso artigo 1251º, introdutório do Livro Terceiro, subordinado à epígrafe "Sachenrecht" ("Direito das coisas"): "Besitzerwerb". "Der Besitz einer Sache wird durch die Erlangung der tatsachlichen Gewalt über die Sache erworben (...)". ("Aquisição da posse". "A posse de uma coisa adquire-se pela obtenção do poder de facto sobre a coisa (...)"). Cfr. PALANDT/BASSENGE, Bürgerliches Gesetzbuch, 49ª edição, München, 1990, págs. 1012 e ss.; FRIEDRICH QUACK, Münchener Kommentar zum Bürgerlichen Gesetzbuch, 4º vol., 2ª edição, München, 1986, págs. 22 e ss.
(21) M. H. MESQUITA, op. cit., pág. 66, nota 1, citando LENT-SCHWAB, Sachenrecht, 11ª edição, § 4, II.
(22) M.H. MESQUITA, ibidem.
(23) M. H. MESQUITA, op. cit., pág. 67, notas 1 e 2; cfr. também, para os conceitos de posse directa e indirecta do direito brasileiro, OLIVEIRA ASCENSÃO, Posse-Dir. Civ., "Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura", 15º volume, Lisboa, coluna 850.
(24) M. H. MESQUITA, op. cit., pág. 67, nota 1.
(25) M. H. MESQUITA, op. cit., págs. 71 e s.; no mesmo sentido, MOTA PINTO, op. cit., págs. 189 e ss.;ORLANDO DE CARVALHO, Introdução à Posse, "Revista de Legislação e de Jurisprudência", Ano 122º, (1989), nºs 3780 e 3781, págs. 68 e ss.; PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, vol. III, 2ª edição revista e actualizada (reimpressão), com a colaboração de M. H. MESQUITA, Coimbra, 1987, págs. 5 e s., criticando, de resto, MENEZES CORDEIRO na medida em que defende ter o Código Civil consagrado a concepção objectiva da posse.
(26) PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, pág. 6; M. H. MESQUITA, op. cit., págs. 72 e s.
(27) OLIVEIRA ASCENÇÃO, Direitos Reais, Lisboa, 1978, págs. 290 e s.
(28) PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, Noções Fundamentais, págs. 126 e s.; ORLANDO DE CARVALHO, op. cit., págs. 105 e s.
(29)MANUEL RODRIGUES, A Posse. Estudo de Direito Civil Português, 3º edição, revista, anotada e prefaciada por F. LUSO SOARES, Coimbra, 1980, págs. 8 e s.
(30) A. PENHA GONÇALVES, Direito Reais. Posse e Detenção, Lisboa, 1990, pág. 7.
(31) M. R. MACHADO DE OLIVEIRA, A Posse (Na doutrina e na jurisprudência), Porto, 1981, pág. 15.
(32) A exposição é de M.H. MESQUITA, op. cit., págs. 84 e ss., o qual, aliás, não partilha esta opinião, mas o ponto de vista contrário.
(33) ORLANDO DE CARVALHO, op. cit., págs. 105 e s.
(34) Assim M. H. MESQUITA, págs. 86 e ss. e doutrina por este citada; MOTA PINTO, op. cit., págs. 214 e s., caraterizando a posse como "direito real provisório". Em sentido de certo modo diverso, OLIVEIRA ASCENSÃO, Posse, coluna 852, propendendo a qualificar a posse como direito, mas negando-lhe, todavia, a oponibilidade a terceiros e, portanto, a natureza de direito real, e Direitos Reais, págs. 291 e ss., onde escreve que "toda a posse é uma realidade jurídica, que tem como pressuposto uma realidade ou situação de facto, mas que surge por vezes com autonomia em relação a ela".
(35) No sentido exposto seguiu-se muito de perto M. H. MESQUITA, op. cit., págs. 85 e ss.
(36) PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, pág. 7, observando, ademais, a partir da jurisprudência pertinente, que "quando se alega ou quesita a existência de posse neste sentido, trata-se, para efeitos processuais, de matéria de facto".
(37) Justamente aludindo a esse vector, pondera ALVAREZ-CAPEROCHIPI, op. cit., pág. 124, que "la posesión material es requisito sustancial para la constitución de un derecho real de prenda (art. 1863), y la subsistencia del derecho real exige la subsistencia de la posésion".
(38) De 19 de Junho de 1980, "Diário da República", "Diário da República", II Série, nº 258, de 7 de Novembro de 1980, e "Boletim do Ministério da Justiça", nº 303, pág. 55; cfr. também o parecer nº 38/77, de 23 de Junho de 1977, "Diário" citado, II Série, de 11 de Outubro de 1977, e "Boletim" nº 271, pág. 37.
(39) C. DUPEYRON/J.-J. BARBIERI, Droit Agraire, 1º vol., Droit de l'exploitation, Paris, pág. 9.
(40) Parecer nº 46/89, citado supra, nota 2 e passim (ponto 5.).
(41) Lê-se, a este propósito, na "Exposição de motivos" da respectiva Proposta de Lei do Governo nº 146/V - "Alteração à Lei nº 109/88, de 26 de Setembro (Lei de Bases da Reforma Agrária)"-, "Diário da Assembleia da República", V Legislatura, 3ª Sessão Legislativa (1989-1990), II Série, nº 43, de 23 de Maio de 1990, pág. 1357, que esteve na base da Lei nº 46/90:
"Passa a ser permitida a reversão de prédios rústicos anteriormente nacionalizados quando se comprove que sempre estiveram na posse e exploração dos anteriores titulares ou dos seus herdeiros [alusão clara à previsão do artigo 30º, nº 1, alínea a)].
"Reconhece-se, igualmente, a reversão de prédios expropriados desde que, por acordo entre as partes, os mesmos tenham regressado à posse e exploração dos anteriores titulares, antes de 1 de Janeiro de 1990 [alínea b)].
"Nestes casos constata-se que não teve qualquer sentido económico e social a nacionalização efectuada e corrige-se, deste modo, uma situação de injustiça que não tinha qualquer justificação política e social."
Sobre os trabalhos parlamentares em torno da aludida Proposta de Lei, pode ainda consultar-se o citado "Diário", V Legislatura, 3ª Sessão Legislativa: II Série-A, nº 53, de 27 de Junho de 1990, pág. ; I Série, nº 91, de 27 de Junho de 1990, págs. 3094 e ss.; I Série, nº 92, de 29 de Junho de 1990, pág. 3158; I Série, nº 100, de 13 de Julho de 1990, págs. 3586 e s.; II Série-A, nº 60, de 16 de Julho de 1990, págs. 1637 e ss.
(42) No "Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre os recursos interpostos pelo PCP e pela ID quanto à admissão da proposta de lei nº 31/V (Lei de Bases da Reforma Agrária)", proposta que, como vimos supra, nota 5, deu origem à Lei nº 109/88, escreveu-se, tendo em vista o artigo 29º, antecessor do definitivo artigo 30º (cfr. a redacção deste transcrita supra, nota 1), com diferenças despiciendas no tocante ao aspecto agora em análise ("Diário", II Série, nº 49, pág. 952, nº 59, pág. 1150, e nº 69, pág. 2542, todos citados supra, nota 5):
"10.2.- Isto dado como assente, nem se vê como questionar a reversão de prédios rústicos em relação aos quais se terá concluído não se justificar, por razões de interesse público, a apreensão expropriativa.
"Repare-se, aliás, que nem sequer se figura um direito dos particulares, mas uma faculdade a exercer pelo Governo. O artigo 29º é bem claro acerca disso."
No debate desse parecer falou-se justamente, a propósito (Almeida Santos), da "discricionária reversão" prevista no mesmo normativo ("Diário" citado em último lugar, pág. 2546).
(43) MARCELLO CAETANO, "Manual", tomo I, 10ª edição, (reimpressão), Coimbra, 1980, págs. 214 e ss., cuja lição acerca da caracterização do poder discricionário estamos a acompanhar de perto. Uma caracterização necessariamente sumária, como impõe a urgência prioritária do parecer.
(44) MARCELLO CAETANO, "Manual", tomo I, págs. 214 e s.
(45) MARCELLO CAETANO, "Manual", tomo I, págs. 485 e s.
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART62 N2.
L 109/88 DE 1988/09/26 ART30.
L 46/90 DE 1990/08/27 ART1.
CCIV66 ART204 N2 ART1037 N2 ART1133 N2 ART1188 N2 ART1251 ART1252 ART1253.
CEXP76 ART4 N1 ART25.
CEXP91 ART3 N1 ART73 ART74.
Referências Complementares: 
DIR ECON * DIR AGR.*****
CCIV ALEMÃO (BGB) PAR854 PAR855 PAR860.
CONST BONN ART14 N1 N3.
Divulgação
Número: 
DR172
Data: 
28-07-1992
Página: 
6964
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