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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
83/1999, de 28.09.2000
Data do Parecer: 
28-09-2000
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério das Finanças
Relator: 
LUÍS DA SILVEIRA
Descritores e Conclusões
Descritores: 
HOSPITAIS CIVIS DE LISBOA
PERSONALIDADE JURÍDICA
AUTONOMIA ADMINISTRATIVA
AUTONOMIA FINANCEIRA
ORGANIZAÇÃO HOSPITALAR
PESSOA COLECTIVA DE DIREITO PÚBLICO
SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE
INSTITUTO PÚBLICO
REGULAMENTO INTERNO
HOSPITAL
Conclusões: 
Os Hospitais Civis de Lisboa são titulares de personalidade jurídica.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças,
Excelência:



1.


Por despacho de Vossa Excelência de 9 de Dezembro de 1999 ([1]), foi solicitado a este Conselho parecer sobre se os Hospitais Civis de Lisboa são ou não titulares de personalidade jurídica.

O problema suscitou-se por ocasião de um processo de justificação administrativa relativo ao registo a favor do Estado de certo terreno, no âmbito do qual os Hospitais Civis de Lisboa apresentaram reclamação, invocando serem eles os proprietários de imóvel, que lhes teria sido doado em 3 de Dezembro de 1930.

A aludida questão deu azo a opiniões divergentes no seio da Direcção-Geral do Património, o que conduziu ao presente pedido de parecer.

Cumpre, pois, emiti-lo.


2

2.1. Os Hospitais Civis de Lisboa (HCL) constituíram-se com base no Hospital de São José - que, por sua vez, sucedeu ao Hospital Real de Todos os Santos, criado em 15 de Maio de 1482.

Os últimos diplomas de organização do Hospital de São José, antes da criação dos Hospitais Civis de Lisboa, foram o Decreto de 10 de Setembro de 1901 (regulamento geral dos serviços clínicos) e o Decreto de 24 de Dezembro do mesmo ano (regulamento da administração do Hospital).

Em 1913, o Decreto nº 126, de 9 de Setembro, atribuiu unitariamente a administração de todos os Hospitais Civis de Lisboa à Provedoria Central da Assistência, colocando ainda o respectivo serviço de contabilidade na dependência do Ministro das Finanças ([2]).


2.2 – O Decreto nº 4563, de 12 de Julho de 1918, procedeu a uma importante reorganização dos Hospitais Civis de Lisboa, acerca da qual se pode ler, no respectivo preâmbulo, nomeadamente, que:

"Na resolução do complexo problema hospitalar reconheceu-–se, como orientação fundamental, que os Hospitais Civis de Lisboa devem ser autónomos dentro da Assistência Pública e independentes da Provedoria Central da Assistência de Lisboa; e que devem ser completamente independentes da Faculdade de Medicina de Lisboa, por serem diferentes as suas funções de assistência e pedagógicas, sem quebra, aliás, das boas relações, mútuo auxílio e eficaz colaboração que uma e outra instituição devem manter e dispensar-se.
A experiência dos últimos anos tem vindo a demonstrar que a direcção e administração dos hospitais deve ser uma, para todos os estabelecimentos similares, havendo um só director como entidade administrativa, ou autoridade técnica executiva, independente, usando da maior liberdade mas tendo correlativamente a máxima responsabilidade , direcção que deve ser cercada, para consulta e orientação, dum conselho técnico e outro administrativo formados pelas maiores competências representando os principais serviços hospitalares."

O preceituado do diploma em referência iniciava-se com a seguinte disposição:

"Artigo 1º - Os Hospitais Civis de Lisboa constitutem uma entidade técnica e administrativamente autónoma, independente do Ministério do Interior, considerada como pessoa moral com capacidade jurídica e compreendem os seguintes institutos:
a) Hospital de São José (policlínico geral);
b) Hospital de S. Lázaro (escola de enfermagem com serviço clínico anexo);
c) Hospital de Destêrro (urologia, dermatologia, sifiligrafia e venéreo);
d) Hospital Estefânia (policlínico geral, para mulheres e crianças);
e) Hospital de Arroios (policlínico geral com gafaria anexa, provisória);
f) Hospital do Rêgo (doenças infecto-contagiosas);
g) Dispensário Popular de Alcântara (consulta externa)."

A gestão da instituição em causa cabia ao Director-Geral dos Hospitais Civis de Lisboa, nos termos do subsequente artigo 2º:

“Artº 2º A direcção e administração autónoma de todos os institutos a que se refere o anterior artigo e seu § 1º, e bem assim a superintendência em todos os seus serviços gerais e especiais incumbem a uma entidade oficial que se denominará Director Geral dos Hospitais Civis de Lisboa, cabendo a sua nomeação ao Governo, sob proposta do corpo clínico hospitalar, precedida de eleição que será feita em lista tríplice e recairá em clínicos dos Hospitais.
................................................................................................”.

Ao Director-Geral competia, designadamente, segundo o artigo 4º:
“1º Superintender em todos os serviços hospitalares, técnicos e administrativos, fiscalizando a sua execução;

2º Representar activa e passivamente, em juízo e fora dele, os Hospitais Civis de Lisboa;
................................................................................................”.

Mais adiante, o Decreto nº 4563 caracterizava assim a autonomia técnica e administrativa dos Hospitais Civis de Lisboa:

"Artigo 11º - A autonomia técnica e administrativa dos Hospitais Civis de Lisboa consiste:

a) No livre exercício de todos os serviços técnicos hospitalares sob tutela da sua Direcção Geral;
b) Na criação ou modificação dos mesmos serviços quando os progressos da sciência e interesses dos hospitais o aconselhem e sempre que isso não traga aumento de despesa orçamental nem prejuízo para o pessoal hospitalar, ou lesão dos seus direitos adquiridos.
c) Na arrecadação dos bens, donativos ou rendimentos destinados aos hospitais;
d) Na organização de orçamentos e aplicação aos serviços das receitas próprias dos hospitais e dos subsídios do Estado;
e) No ensaio de todas as iniciativas tendentes ao aperfeiçoamento dos serviço.
§ único. A modificação de serviços criados por lei ou decreto será sempre submetida à aprovação do Governo.

Art.15º. Os Hospitais Civis de Lisboa custearão as suas despesas com os rendimentos próprios de que disponham, com os subsídios anualmente inscritos no orçamento da Secretaria de Estado do Interior e com os que extraordináriamente lhe sejam concedidos.”

Na parte que mais directamente interessa ao objecto do presente parecer, pode, pois, afirmar-se, em síntese, que, segundo o Decreto nº 4563, os Hospitais Civis de Lisboa:

- constituíam uma “pessoa moral com capacidade jurídica”;
- eram dotados de autonomia técnica e administrativa;
- dispunham de direcção autónoma, encabeçada no Director-
-Geral dos Hospitais, que os representava em juízo e fora dele;
- custeavam as suas despesas com rendimentos e outras receitas próprias.

2.3 - Em 1968, foi publicado, tendo em mira executar e desenvolver as bases definidas na Lei nº 2011, de 2 de Abril de 1946 (Lei da Organização Hospitalar) e na Lei nº 2120, de 19 de Julho de 1963 (Bases da política de saúde e assistência), um diploma de inegável relevo para o objecto do presente parecer.

Trata-se do Estatuto Hospitalar – Decreto-Lei nº 48357, de 27 de Abril do mencionado ano ([3]).

De entre as regras contidas nesse diploma, interessam, nomeadamente, os dos seus artigos 8º e 27º que estatuem, respectivamente:

"Artº 8º - 1. Os estabelecimentos e serviços pertencentes ao Estado ou à mesma instituição podem constituir grupos ou centros hospitalares com administração central comum, atribuindo-se, em regulamento, a cada uma das unidades agrupadas ou integradas, quando se trate de serviços oficiais, a autonomia administrativa que for julgada conveniente.
2. O diploma orgânico do centro ou grupo deve indicar a forma de participação dos estabelecimentos e serviços na administração central e os poderes desta.

Art. 27º - 1. Os hospitais gerais oficiais gozam de personalidade jurídica e de autonomia administrativa, nos termos deste diploma e seus regulamentos.
2. Os hospitais e serviços especializados oficiais têm personalidade jurídica e autonomia administrativa, se lhes forem concedidas nos diplomas orgânicos ou, posteriormente, nos termos da legislação vigente ou em portaria do Ministro da Saúde e Assistência.
3. Os demais estabelecimentos e serviços hospitalares continuam a reger-se pela legislação própria das instituições a que pertencem, sob a tutela administrativa do Ministério da Saúde e Assistência, exercida através das Direcções-Gerais da Assistência e dos Hospitais."

Em execução do aludido Estatuto, foi publicado, na mesma data, o Regulamento Geral dos Hospitais, aprovado pelo Decreto nº 48358 ([4]).

Neste diploma regulamentar, reporta-se expressamente à caracterização dos Hospitais Civis de Lisboa o seu artigo 79º, que prescreve:

"Art.79º - 1. São hospitais centrais gerais:
a) Em Lisboa: os Hospitais Civis de Lisboa e o Hospital de Santa Maria;
b) No Porto: o Hospital Escolar de S. João e o Hospital Geral de Santo António;
c) Em Coimbra: os Hospitais da Universidade de Coimbra.

2. Os Hospitais Civis de Lisboa constituem um grupo hospitalar, nos termos do artigo 8º do Decreto–Lei nº 48357, ao qual se aplica o disposto para os restantes hospitais centrais, com as alterações constantes do presente capítulo.
3. Os hospitais sub-regionais ou especializados da região sede de zona podem funcionar como prolongamento dos serviços de internamento dos hospitais centrais, nos termos de acordos a aprovar pelo Ministro da Saúde e Assistência."

A unidade e autonomia de administração dos HCL – e, do mesmo passo, a sua especificidade enquanto grupo hospitalar, admitida no preceito acabado de transcrever – ressaltam ainda de outras normas do mesmo Regulamento, tais como, designadamente, as dos seus artigos 83º, nº 3, e 84, nº 2 ([5]):

"Art.83º - 1. Nos hospitais centrais são órgãos de administração:
a) O conselho de administração
b) O conselho de direcção.
2. Como órgão de apoio técnico haverá um conselho técnico.
3. Cada um dos hospitais integrados nos Hospitais Civis de Lisboa terá uma direcção e uma comissão técnica podendo o mesmo ser determinado quanto aos hospitais ou estabelecimentos integrados em centros ou grupos hospitalares.

"Art. 84º - 1. O conselho de administração é presidido pelo director do hospital ou pelo provedor da Misericórdia a que o hospital pertença e tem como vogais:
a) Os membros do conselho de direcção do hospital;
b) Um representante do Ministério das Finanças;
c) Um representante do Ministério das Corporações e Previdência Social;
d) Um representante da câmara municipal da sede da zona hospitalar;
e) Um delegado da Direcção-Geral de Saúde.
2. Os Hospitais Civis de Lisboa e os demais grupos e centros hospitalares terão ainda dois vogais, representantes das direcções dos hospitais e estabelecimentos integrados; o Hospital Geral de Santo António terá dois vogais, designados pela mesa administrativa da Santa Casa da Misericórdia do Porto."

Da consideração conjugada dos mencionados Estatuto e Regulamento é, pois, legítimo deduzir que, nos termos do sistema por eles instituído:
- os HCL constituíam um grupo hospitalar; e
- eram, enquanto tais, qualificados como hospital central geral, e submetidos ao respectivo regime jurídico;
- por seu turno, os hospitais gerais eram considerados titulares de personalidade jurídica e autonomia administrativa.


2.4 - A unidade assim conferida aos Hospitais Civis de Lisboa permitiu, designadamente, equipará-los, enquanto instituições de ensino e investigação científica, às Faculdades integradas na Universidade de Lisboa – Portaria nº 113/76, de 25 de Fevereiro.

2.5 - Em 1977, foi publicada a Lei Orgânica Hospitalar (Decreto-Lei nº 129/77, de 2 de Abril), cujos dois primeiros preceitos eram do seguinte teor:

"Artigo 1º - 1. O presente decreto-lei aplica-se aos hospitais centrais, gerais e especializados e aos hospitais distritais.
2 - Até que se proceda a uma revisão global da legislação hospitalar em vigor continuam a observar-se as disposições do Estatuto Hospitalar, do Regulamento Geral dos Hospitais e dos diplomas complementares na parte não contrariada por este diploma.
Artigo 2º - 1. Os hospitais a que se aplica o presente decreto-lei são pessoas colectivas de direito público, dotadas de autonomia administrativa e financeira, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.
2 - A capacidade jurídica dos hospitais abrange todos os direitos e obrigações necessários à prossecução dos seus fins definidos na lei."

Em execução deste diploma legal, veio, no mês seguinte, a ser emanado o Regulamento dos Órgãos de Gestão e Direcção dos Hospitais (Decreto Regulamentar nº 30/70, de 20 de Maio), de cujo preceituado releva, directamente, para o objecto deste parecer, o artigo 42º, que determinava:

"Artigo 42º - 1. O esquema de órgãos previsto neste diploma existirá também nos grupos ou centros hospitalares.
2. No respectivo regulamento interno, além do previsto no número anterior, serão definidos o grau de autonomia e o esquema de órgãos de cada estabelecimento agrupado ou integrado."


2.6 - A Lei do Serviço Nacional de Saúde (Lei nº 56/79, de 15 de Setembro) patenteou minguada relevância para o assunto ora em análise, limitando-se a qualificar como “serviços prestadores de cuidados diferenciados” os hospitais gerais, os hospitais especializados e outras instituições especializadas.

Já, contudo, a Lei de Gestão Hospitalar (Decreto-Lei nº 19/88, de 21 de Janeiro) ([6]) integra alguns preceitos que a este propósito merecem atenção.

Trata-se, nomeadamente, dos respectivos artigos 2º, 3º, 10º e 21º, que assim prescrevem:

"Artigo 2º
Natureza jurídica dos hospitais

1 – Os hospitais são pessoas colectivas de direito público, dotadas de autonomia administrativa e financeira, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.
2 – A capacidade jurídica dos hospitais abrange todos os direitos e obrigações necessários à prossecução dos seus fins definidos na lei.
3 - .........................................................................................”.

Artigo 3º
Superintendência e tutela

1- Compete ao Ministro da Saúde praticar todos os actos que por lei lhe caibam relativamente à organização e funcionamento dos hospitais, designadamente os que se enquadram na superintendência e tutela quanto à execução dos seus planos anuais e plurianuais.
...................................................................................................."

Artigo 10º
Receitas e despesas dos hospitais

1 – Constituem receitas dos hospitais:
a) O rendimento dos bens próprios;
b) O produto de alienação de bens próprios;
c) As doações, heranças e legados;
d) As comparticipações, dotações ou subsídios do Estado ou de outras entidades;
e) O pagamento dos serviços prestados nos termos da legislação em vigor e dos acordos e tabelas aprovados;
f) Os saldos das gerências anteriores, que transitam automaticamente;
g) Outras receitas que lhes sejam atribuídas.
.........................................................................................”.

Artigo 21º
Revogação

1 – Fica revogado o Decreto–Lei nº 129/77, de 2 de Abril.
2 – Em tudo quanto não se encontre regulado neste diploma e respectiva regulamentação mantém-se em vigor o disposto no Estatuto Hospitalar e no Regulamento Geral dos Hospitais, aprovados, respectivamente, pelos Decretos–Leis nºs. 48 357 e 48 358 ([7]), de 27 de Abril de 1968.”

Reafirma-se, pois, que os hospitais são pessoas jurídicas de direito público, dotadas de autonomia administrativa e financeira e sujeitas à superintendência e tutela do Ministério da Saúde.

Esclarece-se, de todo o modo, que na parte não afectada por esta lei, se mantêm em vigor o Estatuto Hospitalar e o Regulamento Geral dos Hospitais aprovados em 1968.

Em execução da Lei de Gestão Hospitalar foi publicado o Decreto Regulamentar nº 3/88, de 22 de Janeiro, que refere (ao invés daquela) os grupos hospitalares, no respectivo artigo 36º:

"Artigo 36º
Grupos e Centros hospitalares

1 - É aplicável a cada um dos hospitais integrados em grupos e aos centros hospitalares o esquema de órgãos neste diploma, com as necessárias adaptações e com observância do disposto no número seguinte.
2 - No regulamento interno de cada centro ou grupo hospitalar serão definidos, além da composição dos seus órgãos, o grau de autonomia e o esquema de órgãos de cada um dos estabelecimentos que o constituem."

Especifica-se, pois, que, em princípio, o esquema organizatório dos hospitais integrados em grupos hospitalares é o estabelecido, em geral, nesse diploma regulamentar, conquanto com as necessárias adaptações.


2.7 - Diversos diplomas vieram, seguidamente, ocupar-se da estruturação e funcionamento dos HCL enquanto grupo hospitalar.

De entre eles, cabe destacar, desde logo, a Portaria nº 598/93, de 23 de Junho, que extinguiu o quadro de pessoal dos HCL, substituindo-o por quadros próprios dos hospitais que os compõem.

Mas particular importância exibiu, em termos de estruturação dos HCL, a publicação do respectivo regulamento interno, enquanto grupo hospitalar.

Esse Regulamento foi inicialmente aprovado pela Portaria nº 1152/95, de 19 de Setembro, mas veio logo no ano seguinte a ser substituído por outro, hoje em vigor, aprovado pela Portaria nº 201/96, de 5 de Junho.

Deste diploma, intitulado "Regulamento Interno do Grupo Hospitalar dos Hospitais Civis de Lisboa", e cujo preâmbulo anota ser este "o mais antigo grupo hospitalar existente em Portugal", realçamos as seguintes normas:

"Artigo 1º
Âmbito

1 - Os Hospitais Civis de Lisboa constituem um grupo hospitalar, adiante designado por grupo, composto pelos seguintes estabelecimentos hospitalares:
a) Hospital de São José;
b) Hospital de Santo António dos Capuchos;
c) Hospital de Curry Cabral;
d) Hospital de D. Estefânia;
e) Hospital de Santa Maria;
f) Hospital do Desterro;
g) Hospital de Arroios.
2 - Os hospitais referidos nas alíneas b) e f) constituem um subgrupo hospitalar, sob a administração do Hospital de Santo António dos Capuchos.
3 - É aplicável a cada hospital integrado no grupo o esquema de órgãos previstos no Decreto Regulamentar nº 3/88, de 22 Janeiro, com as especificações decorrentes do regime estabelecido no presente Regulamento.
4 - Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, podem ser integrados no grupo, por portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Saúde, outros estabelecimentos hospitalares ou de saúde cuja articulação se revele funcional e economicamente vantajosa.

Artigo 3º
Coordenador do grupo hospitalar dos Hospitais Civis de Lisboa

1 - O grupo é coordenado por um coordenador, nomeado por despacho do Ministro da Saúde de entre médicos com a categoria de chefe de serviço do quadro dos Hospitais Civis de Lisboa.
2 - Compete ao coordenador coordenadar as actividades do grupo hospitalar, assegurando e promovendo a complemen-taridade entre os hospitais integrados no grupo e, em especial:
a) Executar a estratégia comum definida pelo conselho de gestão estratégica;
b) Analisar os projectos e planos de acção sectoriais compatíveis com a execução dessa estratégia, avaliar periodicamente o seu nível de execução e propor as medidas correctivas julgadas necessárias;
c) Gerir os meios postos à sua disposição com vista à concretização das metas definidas pelo conselho de gestão estratégica, bem como orientar a actividade da acção médica dos Hospitais Civis de Lisboa;
d) Representar o grupo hospitalar e estabelecer com outros instituições, ouvido o conselho de gestão estratégica, protocolos de colaboração que vinculam o grupo;
e) Decidir sobre a mobilidade de recursos humanos dos hospitais do grupo, sempre que não se verifique acordo entre os respectivos conselhos de administração.
3 - O coordenador pode recorrer ao apoio técnico de pessoal dos hospitais integrados no grupo hospitalar cujo parecer entenda vantajoso e, bem assim, determinar a constituição de grupos de trabalho para o estudo de problemas específicos.
4 - O coordenador pode criar unidades coordenadoras funcionais, constituídas por funcionários pertencentes aos quadros de pessoal dos hospitais integrados no grupo hospitalar, para assegurar a coordenação de uma ou mais actividades de intervenção do grupo hospitalar.
5 - O estatuto do coordenador será definido por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Saúde.

Artigo 6º
Funcionamento

1 - As regras de funcionamento do conselho de gestão estratégica e do conselho técnico são fixadas por regulamento a aprovar na primeira reunião.
2 - O apoio aos órgãos de gestão a que se refere o artigo 2º do presente Regulamento é assegurado pelo Hospital de São José, cujo conselho de administração deve promover, para o efeito, a conveniente afectação de recursos humanos, instalações e equipamento.

Artigo 8º
Estruturas organizativas comuns

1 - O grupo pode dispor de estruturas organizativas comuns, designadamente serviços, decorrentes da estratégia definida.
2 - As estruturas organizativas comuns são criadas por despacho do Ministro da Saúde, sob proposta do coordenador.
3 - O funcionamento das estruturas organizativas comuns é suportado proporcionalmente pelo orçamento de cada um dos hospitais que integram o grupo."

Reitera-se e estrutura-se, pois, a instituição HCL como grupo hospitalar.


Mantém-se, como regra (salvas as especificidades constantes deste mesmo regulamento), a orgânica interna de cada um dos hospitais que o compõem, tal como definida no Decreto Regulamentar nº 3/88.

Atribui-se a coordenação das actividades do grupo a um coordenador, incumbido de o representar e de gerir os meios postos à sua disposição para prossecução das finalidades respectivas.

O Regulamento em causa veio a ser parcialmente alterado pela Portaria nº 1045/97, de 9 de Outubro, modificações essas do teor seguinte:

"Artigo 3º

......................................................................................................
e) Decidir sobre a mobilidade do pessoal dos hospitais integrados, sempre que esteja em causa a melhoria da capacidade técnica e assistencial ou não se verificando acordo entre os respectivos conselhos de administração;
f) Definir as iniciativas de interesse comum, sendo os encargos decorrentes das mesmas suportados pelos orçamentos dos hospitais do grupo.

Artigo 8º

......................................................................................................
3 - O financiamento das estruturas organizativas comuns é suportado proporcionalmente pelo orçamento de cada um dos hospitais que integram o grupo, sendo tal proporção fixada pelo coordenador, ouvido o conselho de gestão estratégica."


2.8 - No ano transacto, o Governo considerou adequado emanar um diploma estabelecendo o regime geral aplicável aos centros hospitalares e aos agora chamados grupos de hospitais.

Trata-se do Decreto-Lei nº 284/99, de 26 de Julho, cujas normas mais significativas, em relação aos grupos de hospitais, se passam a transcrever:

"Artigo 2º
Definição

1 - Um centro hospitalar é uma pessoa colectiva pública, dotada de autonomia administrativa e financeira, património próprio e do esquema de órgãos legalmente estabelecido para os hospitais públicos, que integra vários estabelecimentos hospitalares destituídos de personalidade jurídica.
2 - Um grupo de hospitais é composto por vários estabelecimentos hospitalares autónomos, nos termos da legislação aplicável, mas sujeitos a coordenação ou administração comum.

Artigo 3º
Criação

1 - A criação de centros hospitalares e de grupos de hospitais faz-se por portaria do Ministro da Saúde, sob proposta do conselho de administração da administração regional de saúde territorialmente competente.
2 - A proposta a que se refere o número anterior deve ser devidamente fundamentada em razões de interesse público, designadamente a optimização dos serviços prestados por dois ou mais estabelecimentos hospitalares e o reforço da respectiva articulação e complementaridade, técnica ou assistencial.

Artigo 4º
Legislação aplicável

Sem prejuízo do disposto no presente diploma, os centros hospitalares e os grupos de hospitais regem-se pela legislação aplicável aos estabelecimentos hospitalares do Serviço Nacional de Saúde.

Artigo 8º
Transição

Os centros hospitalares sucedem, independentemente de quaisquer formalidades, na universalidade dos direitos e obrigações de que forem titulares os hospitais que neles sejam integrados, constituindo o diploma previsto no artigo 3º título bastante, para todos os efeitos legais.

Artigo 9º
Regime

1 - Os hospitais que, nos termos do presente diploma, sejam integrados num grupo mantêm a sua natureza de pessoas colectivas públicas, dotadas de autonomia administrativa e financeira e património próprio, bem como os respectivos quadros de pessoal.
2 - O grupo de hospitais pode ficar sujeito a coordenação comum, mantendo os hospitais nele integrados os respectivos órgãos de administração e de direcção técnica, ou ser dotado de um único esquema de órgãos, nos termos legalmente estabelecidos para os hospitais públicos.
3 - A portaria prevista no nº 1 do artigo 3º pode consignar receitas ao grupo, nomeadamente dotações orçamentais ou percentagens das importâncias cobradas por serviços prestados pelos hospitais nele integrados.

Artigo 10º
Regulamento interno
O regulamento interno do grupo de hospitais é aprovado por portaria do Ministro da Saúde.

Artigo 11º

1 - O Grupo de hospitais pode dispor de estruturas organizativas comuns, a prever no respectivo regulamento interno.
2 - Os encargos com o funcionamento das estruturas referidas no número anterior são suportados, proporcionalmente, pelos orçamentos dos hospitais que integram o grupo.

Secção II
Grupo de hospitais sob coordenação comum

Artigo 12º
Órgãos

São órgãos do grupo de hospitais sob coordenação comum:
a) O coordenador;
b) O conselho de direcção;
c) O conselho técnico.

Secção III
Grupo de hospitais sob administração comum

Artigo 18º

1 - O grupo de hospitais sob administração comum dispõe de um único conselho de administração, composto pelo director, que preside, pelo administrador-delegado, pelo director clínico e pelo enfermeiro-director de serviços de enfermagem, sem prejuízo do disposto no nº 2 do artigo 3º do Decreto Regulamentar nº 3/88, de 22 de Janeiro.
2 - Cada hospital integrado no grupo pode dispor de um conselho directivo, a prever no regulamento interno referido no artigo 10º, composto por um adjunto do director clínico, um adjunto do enfermeiro-director de serviços de enfermagem e por um administrador hospitalar designado pelo conselho de administração do grupo.

Artigo 22º
Revogação

São revogados os artigos 8º do Decreto-Lei nº 48 357, de 27 de Abril de 1968, e 36º do Decreto Regulamentar nº 3/88, de 22 de Janeiro."

Da análise dos normativos supramencionados pode, muito resumidamente, concluir-se que:

- o regime do Decreto-Lei nº 284/99 veio substituir, enquanto enquadramento geral dos grupos de hospitais, o que decorria do artigo 8º do Estatuto Hospitalar e do artigo 36º do Decreto Regulamentar nº 3/88;

- a criação de centros hospitalares e de grupos de hospitais passa a operar-se por portaria do Ministro da Saúde, sobre proposta da administração regional de saúde competente;

- enquanto que os centros hospitalares são qualificados como pessoas colectivas públicas, o mesmo se não afirma expressamente em relação aos grupos de hospitais;

- especifica-se, diversamente, que os hospitais pertencentes a grupos mantêm a respectiva personalidade colectiva pública, bem como autonomias administrativa e financeira, e património próprio;

- os grupos de hospitais podem organizar-se sob coordenação comum ou sob administração comum;

- caso este último em que são geridos por um conselho de administração único;

- nada se dispõe acerca dos grupos de hospitais já existentes, nem de eventual sistema de transição destes para o novo regime assim instituído.


2.9 - Ao abrigo do Decreto-Lei nº 284/99 foi já criado, pela Portaria nº 202/2000, de 6 de Abril, o Grupo Hospitalar do Médio Tejo - tendo o artigo 1º deste diploma explicitado que, nos termos do artigo 9º, nº 1, daquele decreto-lei, os hospitais que o compõem mantêm a natureza de pessoas colectivas públicas, dotadas de autonomia administrativa e financeira, e património próprio.


3.


3.1 - Em 1918, os Hospitais Civis de Lisboa apresentam-se legalmente caracterizados como pessoa jurídica, ao serem qualificados pelo Decreto nº 4563 como "pessoa moral com capacidade jurídica".

Nota-se, aliás, que foi na vigência deste diploma que os Hospitais Civis de Lisboa receberam, por doação, o terreno cujo registo deu origem ao presente pedido de parecer.

A doutrina mais autorizada não deixou de reafirmar tal natureza jurídica dos Hospitais Civis de Lisboa.

Assim é que, nomeadamente, o Cons. Almeida Ferrão ([8]) afirma que, a partir do Decreto nº 4563, os Hospitais Civis de Lisboa assumiram a natureza de "serviço personalizado do Estado".

Por seu turno, Marcelo Caetano ([9]), ao abordar a figura de instituto público, enquando modalidade de serviço público personalizado, já em 1968 indicava os Hospitais Civis de Lisboa como exemplo desse tipo de pessoa colectiva de direito público.

Esta qualificação manteve-se, aliás, nas posteriores edições do seu "Manual de Direito Administrativo".

3.2 - Tratava-se, na verdade, claramente, dum instituto público, uma das formas de administração indirecta - e, consequentemente, de descentralização institucional - que têm sido adoptadas, ao longo dos anos, no âmbito do Estado português.

Os Hospitais Civis de Lisboa ajustavam-se, assim, às características típicas dos institutos públicos, tais como a doutrina as tem vindo a enunciar. Recorde-se, por todos, o ensinamento de Freitas do Amaral ([10]):

a) Os institutos públicos são pessoas públicas;
b) Beneficiam, em grau maior ou menor, de autonomia administrativa;
c) Podem dispor, e normalmente dispõem, de autonomia financeira;
d) São em regra criados, modificados e extintos mediante decreto-lei;
e) Possuem órgãos próprios, dos quais o principal é em regra uma comissão, ou junta, ou junta autónoma, ou conselho administrativo;
f) Os respectivos presidentes são simultaneamente órgão dirigente do instituto público e órgão do Estado;
g) Os seus serviços administrativos podem ser centrais e locais;
h) Estão sujeitos a uma intervenção do Governo bastante apertada, que se traduz nomeadamente em poderes de superintendência e de tutela administrativa;
i) O regime jurídico do seu funcionamento é, regra geral, um regime de direito público: os institutos produzem regulamentos, praticam actos administrativos, celebram contratos administrativos, cobram impostos e taxas, exercem poderes de polícia, podem promover expropriações por utilidade pública, o seu pessoal tem estatuto de funcionário público, as suas finanças regem-se pelas leis da contabilidade pública, a sua actividade típica é considerada como gestão pública, e a fiscalização jurisdicional dos seus actos compete aos tribunais administrativos."

Outros autores têm, de resto, proposto análogas formulações, de entre os quais cabe, designadamente, destacar Paulo Otero ([11]).

E este Conselho igualmente se tem pronunciado em moldes destes muito próximos, designadamente nos pareceres nºs 14/85, de 11 de Novembro de 1985, 93/91, de 11 de Junho de 1992, 32/94, de 13 de Outubro de 1994 ([12]), e 4/95, de 29 de Março de 1995 ([13]).


4.


A fundamental legislação hospitalar de 1968 (Estatuto Hospitalar e Regulamento Geral dos Hospitais) enriqueceu a qualificação jurídico-administrativa dos Hospitais Civis de Lisboa, integrando-os simultaneamente em duas categorias de instituições típicas da organização hospitalar.

Por um lado, conferiu-lhes a natureza de grupo hospitalar, tal como resulta da conjugação do artigo 8º do Estatuto Hospitalar (Decreto-Lei nº 48357) com o artigo 79º, nº 2, do Regulamento Geral dos Hospitais (Decreto nº 48358).

Por outro lado, os Hospitais Civis de Lisboa foram, então, inseridos na enumeração dos "hospitais centrais gerais", constante do artigo 79º, nº 1, do Regulamento Geral dos Hospitais (tais como, p.e., também o Hospital de Santa Maria, em Lisboa, e os Hospitais da Universidade de Coimbra).

Ora, dado que, por força do artigo 27º do Estatuto Hospitalar, aos hospitais gerais oficiais era reconhecida personalidade jurídica, desta regra decorre que tal era, sob esse regime, a índole dos Hospitais Civis de Lisboa.

A legislação hospitalar de 1968 era, pois, omissa quanto à atribuição ou não de personalidade jurídica aos grupos hospitalares, enquanto tais.

Tão-pouco se pronunciou, especificamente, sobre a titularidade ou não de personalidade jurídica por parte dos Hospitais Civis de Lisboa.

Só que, da atribuição, a estes, da qualificação de "hospital central geral" infere-se, com segurança, que lhes era reconhecida personalidade jurídica, já que a legislação em causa a conferia a todos os "hospitais gerais oficiais".


5.


5.1- A Lei Orgânica Hospitalar de 1977 (Decreto-Lei nº 129/77) generalizou a todos os hospitais por ela abrangidos - "hospitais centrais, gerais e especializados, e hospitais distritais" - a natureza de pessoas colectivas de direito público, dotadas de autonomia administrativa e financeira.

Não se encontra menção, nesta Lei Orgânica, aos grupos hospitalares, referência que apenas veio a constar do respectivo diploma regulamentar (Decreto Regulamentar nº 30/77), em termos de se determinar que o esquema de órgãos neste previsto existiria também nos grupos e centros hospitalares.

Como, todavia, aquele Decreto-Lei nº 129/77 prescreveu (artigo 1º, nº 2) que na parte por ele não contrariada se continuaria a aplicar o Estatuto Hospitalar e correspondente Regulamento de 1968, legitima-–se a conclusão de que os Hospitais Civis de Lisboa continuavam, por força destes diplomas, a ter natureza de hospital central geral, e, nessa medida, a ser titulares de personalidade jurídica.


5.2 - O sistema acabado de indicar foi mantido, no essencial, pela legislação de gestão hospitalar que, em 1988, veio substituir o regime instituído em 1977.

Isto, sem prejuízo de se detectarem certas modificações, de precisão ou aperfeiçoamento.

Assim é que, por um lado, a Lei de Gestão Hospitalar (Decreto--Lei nº 19/88) estendeu a qualificação de pessoa colectiva de direito público, genericamente, a todos os hospitais.

Por seu turno, o respectivo regulamento (Decreto Regulamentar nº 3/88), especificou que o regime dele constante se aplicaria, sim - com as necessárias adaptações -, a cada um dos hospitais integrados em grupos ou centros hospitalares. E acrescentou que nos regulamentos internos de cada uma destas últimas instituições se definiria, não só a composição dos seus órgãos, mas, também, o grau de autonomia e o esquema organizativo de cada um dos estabelecimentos neles integrados.

Visto que a aludida Lei de Gestão Hospitalar continou a manter, salvas as especialidades nela consagradas, o regime básico da legislação hospitalar de 1968, também a seu propósito se justifica reiterar a apreciação acima feita acerca da subsistência da qualificação dos Hospitais Civis de Lisboa como hospital central geral, e, consequentemente, da sua caracterização como pessoa colectiva de direito público.


5.3 - O regime geral hoje em vigor sobre a estrutura orgânica hospitalar geral resulta, pois, da conjugação da legislação emanada em 1968 com a publicada duas décadas depois.

Da respectiva economia decorre que, presentemente, todos os hospitais públicos são dotados de personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira.

A mesma consequência se poderia, aliás, extrair, do ponto de vista da legislação financeira, atendendo a que, hoje, por força do Decreto-Lei nº 155/92, de 28 de Julho (Regime de administração financeira do Estado), os institutos públicos, enquanto organismos dotados de autonomia administrativa e financeira, se configuram como pessoas jurídicas - artigos 43º e 44º.

A circunstância de, assim, cada um dos hospitais integrados nos Hospitais Civis de Lisboa ter passado a constituir uma pessoa colectiva de direito público, não é, todavia, incongruente com a subsistência da personalidade jurídica destes afirmada em 1918 e reiterada, desde 1968, em resultado da sua qualificação como hospitalar central geral.

Nada obsta, aliás, a que um instituto público possa, por sua vez, integrar outros institutos públicos "menores" ou de âmbito mais cingido.

Salienta-o, nomeadamente, com clareza, Paulo Otero, quando escreve ([14]):

"Aliás, existem mesmo certos institutos públicos que possuem na sua esfera de acção institutos públicos menores ou sub-institutos públicos."

E, mais adiante:

"Institutos públicos menores ou sub-institutos - são, como já tivemos oportunidade de referir, institutos públicos que surgem para a prossecução de certos fins que já haviam sido confiados a um outro instituto público que, deste modo, se vê assistido de um instituto público menor para melhor prosseguir parte das suas atribuições iniciais."

E, na jurisprudência, análoga afirmação consta do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11 de Março de 1997 (ao qual, aliás, adiante se fará menção mais detalhada):

“Aliás, no plano dos princípios, nada obsta a que cada um dos hospitais integrados no grupo hospitalar constituído pelos Hospitais Civis de Lisboa goze de personalidade jurídica e dela goze também o próprio grupo, pois que os interesses prosseguidos por cada um dos hospitais que o integram e pelo referido grupo hospitalar enquanto tal continuam distintos como o eram no passado, aqueles primeiros prosseguem fins específicos do hospital a que os mesmos respeitam, enquanto o do referido grupo hospitalar tem por base os serviços comuns dos mencionados hospitais." ([15])



6.

6.1. Considerando agora, mais directamente, o regime jurídico actual especificamente aplicável aos Hospitais Civis de Lisboa, há que reconhecer que o respectivo regulamento interno, aprovado pela Portaria nº 201/96, nenhuma referência faz à questão de saber se eles são ou não dotados de personalidade jurídica.

Bem vistas as coisas, porém, nem seria forçoso que tal diploma desse aspecto se ocupasse, já que o seu objecto é, precisamente, a definição da orgânica e funcionamento interno dos Hospitais Civis de Lisboa, enquanto grupo hospitalar, e não a sua caracterização externa, face a outras entidades públicas e privadas.

Note-se, de resto, que tão-pouco nesse regulamento se faz qualquer menção à personalidade jurídica dos hospitais integrados nos Hospitais Civis de Lisboa - qualidade que estes indubitavelmente ostentam, face à legislação vigente.


6.2 - Particular atenção merece, sob este prisma, o regime geral dos grupos de hospitais e centros hospitalares, pela primeira vez definido em moldes abrangentes pelo Decreto-Lei nº 284/99, com expressa revogação das regras isoladas que a esta matéria antes se aplicavam, desde a reforma de 1968.

Ora, embora este diploma não o diga directa e expressamente, da sua economia parece resultar que a generalidade dos grupos de hospitais não possui, enquanto tal, personalidade jurídica.

Na verdade, enquanto esta é enfaticamente afirmada em relação aos centros hospitalares no respectivo artigo 1º, nº 1, a mesma asserção não consta quando se caracterizam os grupos de hospitais, logo no subsequente nº 2 do mesmo preceito.

Acresce que, ao definir-se, mais adiante, o regime geral dos grupos de hospitais (artigo 9º), se aponta que os hospitais neles integrados mantêm a sua natureza de pessoas colectivas públicas, dotadas de autonomia administrativa e financeira e património próprio, bem como quadros de pessoal privativos. O facto de não se expressar idêntica ou análoga caracterização no tocante aos grupos de hospitais, permite conduzir, por contraposição, à conclusão de que estes não são titulares de tais qualidades.


6.3 - Importa ter em conta, porém, que o Decreto-Lei nº 284/99, ao estabelecer o regime geral dos grupos de hospitais, tem -como aliás é de regra no tocante à aplicação das leis - eficácia futura, nada dispondo em relação às situações já existentes à data da sua entrada em vigor.

A circunstância, pois, de, sob o sistema instituído pelo citado diploma legal, os grupos de hospitais não terem personalidade jurídica não afecta, sem mais, a natureza de pessoa colectiva (de direito público) que os Hospitais Civis de Lisboa já anteriormente possuíam.

Como pôde observar-se, a personalidade jurídica dos Hospitais Civis de Lisboa existia desde 1918 e foi sendo mantida no domínio dos diplomas genéricos sobre organização e gestão hospitalar que se foram sucedendo.

Aliás, a personalidade jurídica dos Hospitais Civis de Lisboa nem estava correlacionada com a sua natureza de grupo hospitalar (depois designado "grupo de hospitais"), mas, sim, a partir de 1968, com o facto de serem qualificados como hospital central geral.

Acresce que, para que os Hospitais Civis de Lisboa deixassem de ser titulares da personalidade jurídica que possuiam, seria necessário que um diploma legal - o Decreto nº 4563 tinha "força de lei" - o determinasse, ou especificamente, ou , porventura, através da instituição de um novo sistema global que claramente implicasse a perda dessa característica.

Ora não será esse o caso do Decreto-Lei nº 284/99, já que não contém qualquer norma concreta que retire personalidade jurídica aos Hospitais Civis de Lisboa, nem tão-pouco consagra um regime geral que envolva forçosamente tal consequência.

Comprova-o, de resto, o facto de este diploma legal não integrar qualquer regra transitória que prescrevesse que entidade ou entidades sucederiam porventura na titularidade dos direitos e obrigações que eram próprios dos Hospitais Civis de Lisboa, nem, em particular, na propriedade dos bens que lhes pertenciam. A existência de uma tal disposição na economia do Decreto-Lei nº 284/99 seria, na verdade, necessária, se correspondesse ao intento do legislador extinguir, por força desse diploma, a personalidade jurídica dos Hospitais Civis de Lisboa.


7.

Assume, enfim, inegável significado mencionar que, através duma série já apreciável de decisões, o Supremo Tribunal Administrativo tem, uniformemente, desde 1975, reconhecido personalidade jurídica aos Hospitais Civis de Lisboa.

Fê-lo, designadamente, nos seguintes acórdãos:

- de 22 de Maio de 1975 ([16]), o qual, apoiando-se na natureza dos Hospitais Civis de Lisboa como hospital central geral para daí deduzir a sua qualidade de pessoa jurídica, face ao Estatuto Hospitalar e ao Regulamento Geral dos Hospitais, e, consequentemente, a competência do Supremo Tribunal Administrativo para julgar recursos de actos do respectivo órgão dirigente;

- de 22 de Junho de 1976 ([17]), fundando-se igualmente no artigo 27º do Estatuto Hospitalar e no artigo 78º do Regulamento Geral dos Hospitais para afirmar a natureza de "serviço personalizado do Estatuto" dos Hospitais Civis de Lisboa, e, daí, extrair solução idêntica à do aresto anterior, em sede de competência do Supremo Tribunal Administrativo;

- de 6 de Março de 1980 ([18]), acolhendo implicitamente a doutrina dos arestos anteriores, para considerar inexistente um acto praticado, em nome da Comissão Instaladora dos Hospitais Civis de Lisboa, mas, apenas, por um dos membros;

- de 19 de Março de 1992 ([19]), ao admitir a sujeição dos Hospitais Civis de Lisboa ao regime do Decreto-Lei nº 48051, respeitante à responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas;

- de 11 de Março de 1997 ([20]), em cuja fundamentação - para concluir que por actos dos órgãos ou agentes dos Hospitais Civis de Lisboa responde o respectivo património, e não o do Estado - se pondera que:

"Desde logo haverá que considerar como acertado o entendimento, firmado no despacho ora recorrido, como vimos, segundo o qual os Hospitais Civis de Lisboa gozam de personalidade jurídica, ou seja, que constituem o ente público cuja responsabilidade civil extracontratual o A. pretende na presente acção efectivar.
Na verdade, segundo o artigo 79º, nº 2, do Decreto nº 48.358, de 27 de Abril de 1968, que aprovou o Regulamento Geral dos Hospitais, os Hospitais Civis de Lisboa, que constituem um grupo hospitalar nos termos do artigo 8º do Decreto-Lei nº 48357, da mesma data, são considerados hospitais centrais gerais, e estes últimos gozam, por força do artigo 27º, nº 1, deste último diploma, de personalidade jurídica.
Semelhante situação não se alterou com a entrada em vigor do Decreto-Lei nº 19/88, de 21 de Janeiro e do seu regulamento , o Decreto nº 3/88, de 22 Janeiro, pois que no aspecto agora em apreciação, apenas resultou, de forma inovatória, a atribuição de personalidade jurídica, a todos e a cada um dos hospitais do sistema nacional de saúde, dado que estes diplomas apenas pretenderam disciplinar de novo um sector bem restrito, não obstante importante, da actividade hospitalar e que teve a ver com o modelo da respectiva gestão, mantendo-se, pois, no essencial, salvo no que às carreiras médicas se refere, as grandes linhas da organização hospitalar estabelecida pelo já referido Decreto nº 48357 e seu regulamento (aprovado pelo já referido Decreto nº 48358."


8.


Em conclusão:

Os Hospitais Civis de Lisboa são titulares de personalidade jurídica.







[1]) Comunicado pelo Ofício do Chefe do Gabinete nº 5566, de 10 de Dezembro de 1999 (Proc.33/04/07).
[2]) Para a história dos Hospitais Civis de Lisboa, veja-se: Almeida Ferrão, "Serviços Públicos no Direito Português", Coimbra, 1962, págs. 265 e segs.
[3]) Rectificado em 3 de Setembro e 8 de Outubro de 1968, e alterado pelos Decretos-Leis nºs 7/77, de 5 de Janeiro, e 301/79, de 18 de Agosto.
[4]) Rectificado em 6 de Setembro de 1968, e alterado pelo Decreto nº 499/70, de 24 de Outubro, e pelos Decretos Regulamentares nºs 21/79, de 14 de Maio, 98/82, de 28 de Dezembro, 52/84, de 6 de Agosto.
[5]) Na redacção dada pelo Decreto nº 499/70, de 24 de Outubro.
[6]) Alterada pelo Decreto-Lei nº 202/89, de 22 de Junho.
[7]) Trata-se de lapso, pois o Regulamento Geral dos Hospitais foi aprovado pelo Decreto Regulamentar nº 48358.
[8]) Op. cit., pág. 268.
[9]) "Manual de Direito Administrativo", 8ª edição, vol. I, pág. 342.
Nas edições anteriores, os Hospitais Civis de Lisboa eram referidos, como organismos autónomos, a propósito da administração descentralizada.
[10]) "Curso de Direito Administrativo", vol. I, 2ª edição (reimpressão), Coimbra, 1996, págs. 353-354.
[11]) "Institutos públicos", in "Dicionário Jurídico da Administração Pública", vol V, págs. 251 e segs.
[12]) Diário da República, II Série, de 20 de Junho de 1995.
[13]) Diário da República, II Série, de 7 de Julho de 1995.
[14]) Op. cit., págs. 253 e 254.
[15]) Apêndices do Diário da República, de 25 de Novembro de 1999, pág. 1977.
[16]) Acórdãos Doutrinais, nº 166, págs. 1264 e segs.
[17]) Apêndice ao Diário da República, de 11 de Maio de 1978, págs. 328 e segs.
[18]) Apêndice ao Diário da República, de 11 de Abril de 1984, págs. 1161 e segs.
[19]) Acórdãos Doutrinais, nº 372, págs. 1275 e segs.
[20]) Apêndice ao Diário da República, de 25 Novembro de 1999, págs. 1972 e segs., esp. 1977.
Anotações
Legislação: 
D DE 1901/09/10
RGU GERAL DOS SERVIÇOS CLINICOS
D DE 1901/12/24
RGU DA ADMINISTRAÇÃO DO HOSPITAL
D 126 DE 1913/09/09
D 4563 DE 1918/07/12
L 2011 DE 1946/04/02
L 2120 DE 1963/07/19
DL 48357 DE 1968/04/27 ART79 ART83 ART84
D 499/70 DE 1970/10/24
PORT 113/76 DE 1976/02/25
DL 129/77 DE 1977/04/02
DRGU 30/70 DE 1970/05/20
L 56/79 DE 1979/09/15
DL 19/88 DE 1988/01/21
DL 202/89 DE 1989/06/22
DRGU 3/88 DE 1988/01/23
PORT 598/93 DE 1993/06/23
PORT 1152/95 DE 1995/09/19
PORT 201/96 DE 1996/06/05 ART1 ART3 ART8
PORT 1045/97 DE 1997/10/09 ART3 ART8
DL 284/99 DE 1999/07/26 ART2 ART3 ART4 ART8 ART18 ART22
PORT 202/00 DE 2000/04/06
DL 155/92 DE 1992/07/28 ART43 ART44
Jurisprudência: 
AC STA DE 1997/03/11 IN AP-DR DE 1999/11/25 PAG 1977
AC STA DE 1975/05/22 IN AP-DR N166 PAG 1264
AC STA DE 1976/06/22 IN AP-DR DE 1978/05/11 PAG 328
AC STA DE 1980/03/06 IN AP-DR DE 1984/04/11 PAG 1161
AC STA DE 1992/03/19 IN AD N376 PAG 1275
AC STA DE 1997/03/11 IN AP-DR DE 1999/11/25 PAG 1972
Referências Complementares: 
DIR ADM * ADM PUBL / DIR CIV * TEORIA GERAL
Divulgação
Data: 
10-04-2002
Página: 
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