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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
9/1998, de 14.05.1998
Data do Parecer: 
14-05-1998
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Defesa Nacional
Relator: 
FERNANDES CADILHA
Descritores e Conclusões
Descritores: 
DEFICIENTE DAS FORÇAS ARMADAS
INCAPACIDADE GERAL DE GANHO
Conclusões: 
1º. O exercício de instrução de salto em pára-quedas de uma aeronave em voo corresponde a um tipo de actividade com risco agravado enquadrável no nº 4 do artigo 2º, referido ao nº 2 do artigo 1º, ambos do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro;

2º. A qualificação como deficiente das Forças Armadas exige a verificação de um grau mínimo de incapacidade geral de ganho de 30%;

3º. Do acidente de que foi vítima o sargento pára-quedista (...) resultou uma incapacidade de 20%, o que impede a sua qualificação como deficiente das Forças Armadas.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Secretário de Estado da Defesa Nacional,
Excelência:
   
1. Dignou-se remeter V. Exª à Procuradoria-Geral da República o processo relativo ao Sargento Pára-quedista (...), para efeito de emissão do parecer a que alude o nº 4 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, com vista à eventual qualificação como deficiente das Forças Armadas.
Cumpre emitir esse parecer.
 
2. Do processo de averiguações extraem-se os seguintes factos relevantes:
- no dia 18 de Outubro de 1993, pelas 14h15, o Sarg/Paraq (...) participou numa sessão programada de saltos em pára-quedas, realizada, no âmbito de exercícios de instrução, no campo do Arripiado (Regimento de Caçadores de Tancos);
- no momento da aterragem, o contacto com o solo ocorreu de forma violenta, por virtude de uma súbita rajada de vento que imprimiu maior velocidade à descida;
- o sinistrado ficou a queixar-se de dores no joelho direito e o exame médico efectuado no mesmo dia revelou dores acentuadas na articulação coxo-femural direita e edema moderado na face antero-externa do joelho direito;
- o relatório médico elaborado no Hospital da Força Aérea, a que o sinistrado baixou, indicou entorse grave do joelho direito com rotura de ligamentos e fractura do planalto tibial externo, que implicaram a submissão a intervenção cirúrgica;
- após a reabilitação médica, no auto de exame de sanidade, realizado em 14 de Janeiro de 1997, foi declarado clinicamente curado, com sequelas - atrofia dos músculos da coxa direita de 2 cm e rigidez com limitação de extensão em 10º e de flexão em 65º - que foram determinantes de um grau de desvalorização de 0,20;
- a Junta de Saúde da Força Aérea, em 10 de Março de 1997, confirmou um anterior parecer de 27 de Junho de 1994, que considerou o sinistrado incapaz de todo o serviço militar e apto para o trabalho com uma incapacidade de 0,20;
- o relatório técnico elaborado em 18 de Dezembro de 1993 isentou o sinistrado de responsabilidade na produção do acidente, enquadrando-o na situação de risco imputável à imprevisibilidade das condições meteorológicas;
- a Direcção de Saúde e o Serviço de Justiça entenderam existir nexo causal entre as lesões e o acidente ocorrido em serviço.
 
3. Interessa agora averiguar se a situação descrita é enquadrável na norma do artigo 1º, nº 2, do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro.
Esta disposição estatui o seguinte:
"É considerado deficiente das Forças Armadas portuguesas o cidadão que:
No cumprimento do serviço militar e na defesa dos interesses da Pátria adquiriu uma diminuição na capacidade geral de ganho;
quando em resultado de acidente ocorrido:
Em serviço de campanha ou em circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha, ou como prisioneiro de guerra;
Na manutenção da ordem pública;
Na prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública; ou
No exercício das suas funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores;
vem a sofrer, mesmo a posteriori, uma diminuição permanente, causada por lesão ou doença, adquirida ou agravada, consistindo em:
Perda anatómica; ou
Prejuízo ou perda de qualquer órgão ou função;
tendo sido, em consequência, declarado, nos termos da legislação em vigor:
Apto para o desempenho de cargos ou funções que dispensem plena validez; ou
Incapaz do serviço activo; ou
Incapaz de todo o serviço militar."
Por seu turno, o artigo 2º do mesmo diploma esclarece o sentido da expressão "diminuição da capacidade geral de ganho" nos seguintes termos:
"1. Para efeitos de disposição constante do nº 2 do artigo 1º deste decreto-lei, considera-se que:
a) A diminuição das possibilidades de trabalho para angariar meios de subsistência, designada por "incapacidade geral de ganho", deve ser calculada segundo a natureza ou gravidade de lesão ou doença, a profissão, o salário, a idade do deficiente, o grau de reabilitação à mesma ou outra profissão, de harmonia com o critério das juntas de saúde de cada ramo das forças armadas, considerada a tabela nacional de incapacidade;
b) É fixado em 30% o grau de incapacidade geral de ganho mínimo para o efeito da definição de deficiente das forças armadas e aplicação do presente decreto-lei".
O nº 4 do mesmo artigo, com idêntica finalidade interpretativa, refere:
"O exercício de funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores", engloba aqueles casos especiais, aí não previstos, que, pela sua índole, considerado o quadro de causalidade, circunstâncias e agentes em que se desenrole, seja identificável com o espírito desta lei (redacção rectificada no Diário da República, I Série, 2º Suplemento, de 26/6/76).
A qualificação destes casos compete ao Ministro da Defesa Nacional, após parecer da Procuradoria-Geral da República".
 
4. Como resulta do respectivo preâmbulo, uma das inovações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 43/76 reporta-se ao alargamento do regime jurídico dos deficientes das Forças Armadas aos casos que, embora não relacionados com campanha ou equivalente, justificam pelo seu circunstancialismo o mesmo critério de qualificação.
Entre essas situações encontram-se aquelas que são definidas nas referidas disposições do artigo 1º, nº 2, e 2º, nº 4, como resultantes de acidente ocorrido no exercício de funções e deveres militares, e por causa desse exercício, em circunstâncias que envolvam um risco agravado equiparável ao que é inerente às restantes actividades expressamente mencionadas na lei: serviço de campanha, prisioneiro de guerra, manutenção da ordem pública, prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública.
O Conselho Consultivo tem interpretado a norma do nº 2 do artigo 1º, no estrito campo de aplicação que se refere o nº 4 do artigo 2º, como abrangendo os casos que "pelo seu circunstancionalismo justifiquem uma equiparação, em termos objectivos, àquelas situações de facto, dado corresponderem a actividades próprias da função militar ou inerentes à defesa de altos interesses públicos, importando sujeição a um risco que excedendo significativamente o que é próprio do comum das actividades castrenses, se mostra agravado em termos de se poder equiparar ao que caracteriza aquelas situações paradigmáticas" (1).
Neste enquadramento, o Conselho tem vindo a reconhecer que o risco inerente ao salto em pára-quedas de uma aeronave surge agravado relativamente ao comum das actividades castrenses, nos termos de permitir uma equiparação abstracta a qualquer das actividades directamente contempladas na lei (2).
Isso porque, na generalidade dos casos, os acidentes produzidos nestas circunstâncias ocorrem, não por infracções às regras técnicas e de segurança, nem por qualquer outro motivo imputável ao sinistrado ou a terceiro, mas por interferência de factores externos (fortes rajadas de vento, dificuldades na abertura do pára-quedas ou "enganche" noutros), que podem verificar-se, de modo imprevisível, no quadro normal do exercício militar (3).
Deste modo, o acidente sofrido pelo Sargento pára-quedista (...), face à factualidade descrita, poderá configurar uma situação de risco agravado que corresponde à previsão de norma do artigo 1º, nº 2, do Decreto-Lei nº 43/76, por referência ao nº 4 do artigo 2º.
 
5. O alcance do artigo 1º do citado diploma, no segmento analisado é, contudo, limitado pelo comando contido na alínea b) do nº 1 do artigo 2º, que fixa em 30% o grau de incapacidade geral de ganho mínimo para efeito da definição de deficiente das Forças Armadas.
Como tem sido entendido no Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, e constitui também jurisprudência pacífica, uma diminuição de capacidade geral de ganho igual ou superior a 30% é uma condição indispensável para que possa ser reconhecido o direito à reparação prevista no Decreto-Lei nº 43/76, não bastando, como tal, para esse efeito, que o militar tenha sofrido um acidente susceptível de preencher todo o restante condicionalismo definido no artigo 1º (4) (5).
Trata-se de um requisito claramente expresso com a finalidade de "permitir o enquadramento como deficiente das Forças Armadas dos militares ou equiparados que tenham sido vítimas de uma diminuição da capacidade física ou psíquica de carácter permanente, de certa relevância atingindo as respectivas capacidades de ganho, colocando-os em dificuldades profissionais e sociais" (6).
Em reforço deste entendimento poderá apontar-se a Portaria nº 162/76, de 24 de Março, que, no seu nº 4, afirma expressamente que nos casos de revisão do processo "a aplicação será feita pela nova definição DFA, constante do artigo 1º e complementada no artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/76, de 10 de Janeiro", e deverá continuar "pela verificação de percentagem de incapacidade atribuída".
O legislador pretendeu pois restringir a concessão da qualidade de deficiente das Forças Armadas aos casos em que os efeitos lesivos atingem suficiente grau de gravidade, obstando a que, à semelhança do que sucedia no regime do Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio, a qualificação pudesse abranger militares portadores de incapacidades insignificantes.
 
6. No caso em apreço, o acidente, ocorrido no decurso de um exercício de instrução em salto de pára-quedas, terá sido motivado por alteração das condições atmosféricas, traduzida numa momentânea e súbita rajada de vento que imprimiu maior velocidade à descida e sujeitou o militar a um impacto violento com o solo.
Esse exercício - como se deixou esclarecido - constitui uma actividade de risco agravado que é enquadrável no nº 2 do artigo 1º, referido ao nº 4 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/76, desde que haja originado acidente determinativo de diminuição permanente e incapacidade geral de ganho mínima de 30%.
O grau de incapacidade atribuído ao sinistrado, no caso concreto, foi de 20%, o que torna inviável, em razão do disposto na citada alínea b) do artigo 2º do mesmo diploma, a atribuição de qualidade de deficiente das Forças Armadas.

Conclusão:

7. Em face do exposto, extraem-se as seguintes conclusões:

1º. O exercício de instrução de salto em pára-quedas de uma aeronave em voo corresponde a um tipo de actividade com risco agravado enquadrável no nº 4 do artigo 2º, referido ao nº 2 do artigo 1º, ambos do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro;
2º. A qualificação como deficiente das Forças Armadas exige a verificação de um grau mínimo de incapacidade geral de ganho de 30%;
3º. Do acidente de que foi vítima o sargento pára-quedista (...) resultou uma incapacidade de 20%, o que impede a sua qualificação como deficiente das Forças Armadas.
 
 
1) Dos pareceres nºs. 55/87, de 29.07.87, e 80/87, de 19.11.87, homologados mas não publicados, e reflectindo orientação uniforme desta instância consultiva, apud parecer nº 40/93, de 1.07.93.
2) Cfr. o parecer nº 33/86, de 29.07.87, homologado, e outros aí citados, v.g., pareceres nºs 4/80, de 7.02.80, 86/81, de 11.06.81, 147/81, de 22.10.81, 219/81, de 4.03.82, 42/82, de 1.04.82 e 6/86, de 27.02.86, não publicados; ver, mais recentemente, pareceres nºs 24/93, de 20.04.93; 26/93, de 6.05.93, e 39/94, de 14.07.94, e, ainda, 60/96, de 16.12.97, 4/97, de 6.03.97, 8/97, de 9.07.97, e 37/97, de 4.12.97.
3) Cfr., v.g., os pareceres nºs. 5/88, de 11.03.88 e 44/89, de 11.05.89.
4) Cfr. Pareceres nº 115/78, de 6.07.78, publicado no Diário da República, de 23.10.78, e 77/89, de 7.12.89, publicado no Diário da República, II Série, de 11.05.90, e, mais recentemente, 24/92, de 9.07.92, 44/92, de 14.07.93, 84/92, de 11.02.93, 24/93, de 20.04.93, 28/93, de 14.07.93, 30/93, de 20.05.93, 48/93, de 11.07.93, e ainda, 4/97, de 6.03.97.
5) Cfr. acórdão do STA de 4.03.86 in AP-DR de 16.11.89, pág. 1002, de 29.09.88, in AP-DR. de 30.10.93, pág. 4481, (também in BJM nº 379, pág. 496), de 18.01.90, in AP-DR, de 12.01.95, pág. 312, e de 19.12.91, in AP-DR de 31.10.95, pág. 7420.
6) Parecer nº 115/78, de 6.07.78, publicado no Diário da República, II Série, de 23.10.78, cujos termos foram retomados nos pareceres, nº 113/87, de 28.04.88, não publicado, e nº 153/88, de 2.02.89, publicado no Diário da República, de 28/9/89. 
Anotações
Legislação: 
DL 43/76 DE 1976/01/20 ART1 N2 ART2 N4.
Referências Complementares: 
DIR ADM * DEFIC FFAA.
Divulgação
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