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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
116/1988, de 21.03.1991
Data do Parecer: 
21-03-1991
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Maioria
Iniciativa: 
PGR
Entidade: 
Procurador(a)-Geral da República
Relator: 
FERREIRA RAMOS
Descritores e Conclusões
Descritores: 
ADVOCACIA
ADVOGADO ESTAGIARIO
ACESSO A PROFISSÃO
LIBERDADE DE ESCOLHA DE PROFISSÃO
ESTAGIO
INCOMPATIBILIDADE
ADMINISTRAÇÃO LOCAL
FUNCIONARIO PUBLICO
AGENTE ADMINISTRATIVO
AFERIDOR DE PESOS E MEDIDAS
INSCRIÇÃO
ORDEM DE ADVOGADOS
RESTRIÇÃO DE DIREITOS
DIREITO AO TRABALHO
PRINCIPIO DA IGUALDADE
Conclusões: 
1 - A incapacidade estabelecida na alinea f) do n 1 do artigo 69 do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pelo Decreto-Lei n 84/84, de 16 de Março, aplica-se aos advogados estagiarios, constituindo obstaculo a sua inscrição na Ordem com vista a realização do estagio (artigo 156, ns 1, alinea d), e 2, do mesmo Estatuto);
2 - A citada alinea f), enquanto aplicavel aos candidatos a advocacia nas condições referidas na conclusão anterior, não ofende o principio da liberdade de escolha de profissão, acolhido no artigo 47, n 1, da Constituição;
3 - A distinção que na referida alinea f) se estabelece entre agentes e funcionarios municipais, de um lado, e os demais trabalhadores por conta de outem, de outro contem uma discriminação de tratamento não justificavel perante as finalidades a que, do lado da advocacia, visa, nos termos do artigo 68, do mesmo Estatuto, o estabelecimento de incompatibilidades - a defesa da dignidade e independencia da profissão;
4 - Consequentemente, a norma constante do artigo 69, n 1, alinea f), do Estatuto da Ordem dos Advogados, ofende o principio da igualdade consagrado no artigo 13 da Constituição da Republica.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Conselheiro
Procurador-Geral da República,
Excelência:
I
(...), aferidor de pesos e medidas em serviço na câmara municipal de Sabrosa, solicitou a Vossa Excelência se dignasse pedir ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade da norma contida na alínea f) do nº 1 do artigo 69º do Estatuto da Ordem dos Advogados aprovado pelo Decreto-Lei nº 84/84, de 16 de Março - doravante designado pela sigla EOA.
Alega que, havendo-se licenciado em Direito, ao pretender fazer a sua inscrição na Ordem com vista ao estágio e futuro exercício da advocacia, deparou com a incompatibilidade definida na aludida norma, a qual não lhe permite a inscrição, uma vez que exerce as mencionadas funções de aferidor no município de Sabrosa, que, por seu turno, devido à premência da situação económica e familiar, não pode abandonar.
No entender do exponente, o artigo 69º, nº 1, alínea f) "viola claramente não só a sua liberdade de acesso mas também a sua liberdade de escolha de uma nova profissão, uma e outra consagradas no artigo 47º, nº 1, da Constituição"
Ademais, opina, o mesmo preceito é ofensivo do "seu direito de igualdade de oportunidades na escolha de profissão (artigo 59º, nº 3 CRP) na medida em que os seus colegas que com ele tiraram o curso de direito e que trabalham noutros sectores, designadamente o bancário, não vêem o seu acesso à advocacia impedido ou dificultado".
Para o requerente, aliás, o "estagiário não é um advogado no exercício pleno das suas funções", pelo que "a fiscalização do exercício da advocacia em confronto com as incompatibilidades estabelecidas na Lei deveria ser apenas feita só e só após o estágio".
É, assim, colocada a questão de saber se o artigo 69º, nº 1, alínea f), do EOA ofende a Constituição por impedir a um aferidor de pesos e medidas municipal, em razão tão-só desta qualidade, a inscrição na Ordem para a realização do estágio indispensável ao futuro exercício da advocacia.
Vossa Excelência entendeu ouvir o Conselho Consultivo, cumprindo, por isso, emitir parecer.
II
Transcreva-se, em quanto importa, o citado artigo 69º:
"Artigo 69º
(Enumeração das incompatibilidades)
1 - 0 exercício da advocacia é incompatível com as funções e actividades seguintes:
a) ( ... )
b) ( ... )
c) ( ... )
d) ( ... )
e) ( ... )
f) Presidente, excepto nas comarcas de 3ª ordem, secretário, funcionário ou agente das câmaras municipais;
g) ( ... )
h) ( ... )
i) Funcionário ou agente de quaisquer serviços públicos de natureza central, regional ou local, ainda que personalizados, com excepção dos docentes de disciplinas de Direito;
n) ( ... )
o) ( ... )
p) ( ... )
2 - As incompatibilidades atrás referidas verificam-se qualquer que seja o título de designação, natureza e espécie de provimento e modo de remuneração e, em geral, qualquer que seja o regime jurídico das respectivas funções, e só não compreendem os funcionários e agentes administrativos providos em cargos com funções exclusivas de mera consulta jurídica, previstos expressamente nos quadros orgânicos do correspondente serviço, e os contratados para o mesmo efeito.
3 - ( . . . ) "
Antes, porém, de abordarmos o problema da eventual inconstitucionalidade da norma da alínea f), cujas relações com os preceitos vertidos na alínea i) e no nº 2 são evidentes, interessa apreciar, na óptica do concreto tema da consulta, a questão de saber se a norma em apreço se aplica aos "advogados estagiários".
Questão prévia, e até prejudicial, pois uma resposta negativa a esta interrogação de imediato evidenciaria a inexistência de obstáculo, derivado da citada alínea, à inscrição na Ordem e à realização do estágio de advocacia por um aferidor municipal de pesos e medidas licenciado em Direito.
Vamos, por isso, abordá-la seguidamente.
III
0 conhecimento de aspectos sobressalientes da posição funcional dos advogados estagiários, do seu específico estatuto profissional, indispensável à dilucidação da questão posta, impõe nos debrucemos por momentos sobre o EOA, sua sede normativa.
1. A sistemática compreendia-se em 4 títulos.
0 Título I, "Da Ordem dos Advogados", é o mais extenso (artigo 1º a 153º), compreendendo 8 capítulos e respectivas secções, cujas epígrafes bem revelam um conjunto diversificado, mas fundamental, de matérias disciplinadas: "Disposições gerais" (Capítulo I, artigos 1º a 6º); "órgãos da Ordem dos Advogados" (Capítulo II, artigos 7º a 52º (1) ; "Garantias do exercício da advocacia" (Capítulo III, artigos 53º a 67º) (2) ; "Incompatibilidades e impedimentos" (Capítulo IV, artigos 68º a 75º); "Deontologia profissional" (Capítulo V, artigos 76º a 89º); "Acção disciplinar" (Capítulo VI, artigos 90º a 145º (3) ); "Receitas e despesas da Ordem dos Advogados" (Capítulo VIII, artigos 149º a 153º).
0 Título II, "Dos advogados, advogados estagiários e sociedades de advogados" (artigos 154º a 173º), aqui do maior interesse, integra, por sua vez, 4 capítulos: "Inscrição" (4) (Capítulo I, artigos 154º a 158º); "Estágio" (Capítulo II, artigos 159º a 169º); "Inscrição como advogado" (Capítulo III, artigos 170º a 172º); "Sociedades de advogados" (capítulo IV, artigo 173º).
0 Título II-A, subordinado à epígrafe "Da livre prestação de serviços em Portugal por advogados de outros Estados membros das Comunidades Europeias" (artigos 173º-A a 173º-F), não constava, compreensivelmente, da versão original, sendo introduzido no EOA pelo artigo 1º do Decreto-Lei nº 119/86, de 28 de Maio, emanado no uso de autorização concedida pela Lei nº 6/86, de 26 de Março, em cumprimento da Directiva do Conselho nº 77/249/CEE, de 22 de Março de 1977, tendente a facilitar o exercício efectivo da livre prestação de serviços por advogados.
Um Título III, dedicado a "Disposições transitó-rias" (artigos 174º a 176º), encerra o articulado.
Não vamos, obviamente, entrar na análise detalhada dos blocos sistemáticos descritos.
Como se deixou entrever, interessa-nos sobretudo o Título II, bastando que se recorra aos demais pontualmente, na medida necessária.
2. Vejamos, antes de mais, como se processa, E síntese, o estágio e quais as finalidades a que tende.
A sua duração é de 18 meses, iniciando-se os "cursos de estágio" pelo menos 2 vezes por ano, em datas fixadas pelo conselho geral (artigo 162º, nºs 1 e 2).
Há que considerar nesse lapso de tempo 2 períodos distintos.
0 primeiro, de 3 meses, destina-se, no dizer da lei, "a um aprofundamento de natureza essencialmente prática dos estudos ministrados nas universidades e ao relacionamento com as matérias directamente ligadas à prática da advocacia" (artigo 163º, nºs 1 e 3).
0 segundo período, com a duração de 15 meses, visa, por sua vez, uma apreensão da vivência da advocacia, através do contacto pessoal com o normal funcionamento de um escritório de advocacia, dos tribunais e de outros serviços relacionados com a aplicação da justiça e do exercício efectivo dos conhecimentos previamente adquiridos" (artigo 163º nºs 1 e 3).
Todo o estágio, em geral, "tem por fim familiarizar o advogado estagiário com os actos e termos mais usuais da prática forense e, bem assim, inteirá-lo dos direitos e deveres dos advogados" (artigo 163º, nº 4).
Durante o primeiro período, o estagiário não pode, é certo, "praticar actos próprios das profissões de advogado ou de solicitador judicial senão em causa própria ou do seu conjuge, ascendentes ou descendentes" (artigo 164º, nº 1).
Mas já durante o segundo período fica habilitado para, além da prática de "quaisquer actos da competência dos solicitadores" (artigo 164º, nº 2): "Exercer a advocacia em quaisquer processos, por nomeação oficiosa" (alínea a)); "Exercer a advocacia em processos penais da competência do tribunal singular" (alínea b) (5) ; "Exercer a advocacia em processos não penais cujo valor caiba na alçada dos tribunais de 1ª instância e ainda nos processos da competência dos tribunais de menores" (alínea c)); "Dar consulta jurídica" (alínea d)).
A orientação geral do estágio - cometida superiormente à Ordem dos Advogados (artigo 159º, nº 2) - compete concretamente aos denominados "serviços de estágio", à testa dos quais avultam os "centros distritais de estágio", com acção extensiva às comarcas do distrito respectivo, complementados por "serviços de orientação de estágio que podem ser criados em comarcas determinadas através de decisão do conselho geral para aí conduzirem os estágios sob a direcção do respectivo centro distrital (artigo 160º, nºs 1 e 2).
A orgânica e competência dos "serviços de estágio" aludidos consta brevemente dos 4 números do artigo 160º, cuja análise não interessa levar mais longe.
Para se possuir uma ideia exacta das tarefas de carácter formativo que são ou podem ser incumbidas aos advogados estagiários é preciso tomar em atenção os artigos 165º a 168º, que, a título elucidativo, se transcrevem, na parte útil:
"Artigo 165º
(Trabalhos de estágio)
1 - Os serviços de estágio promoverão, durante o primeiro período do estágio, a organização de seminários, de natureza essencialmente prática, relacionados com as matérias directamente ligadas ao exercício da advocacia, recorrendo ao apoio do Centro de Estudos, à participação de representantes de outras profissões e à colaboração de entidades, nacionais ou estrangeiras, ligadas à formação jurídica, designadamente às universidades e aos centros de estudos para formação de advogados ou magistrados.
2 - A comparência dos advogados estagiários aos seminários referidos será obrigatória, facultativa ou opcional, conforme o plano de trabalho do serviço de estágio competente.
3 - Por decisão do conselho geral, ouvidos os conselhos distritais, poderão ser exigidos aos advogados estagiários relatórios específicos sobre temas desenvolvidos no primeiro período do estágio, de cuja apreciação pelo serviço de estágio, homologada pelo conselho distrital, dependerá o acesso ao segundo período do estágio".
"Artigo 166º
(Segundo período do estágio)
1 - No segundo período do estágio, a orientação geral deste continua a pertencer aos serviços de estágio, devendo os advogados estagiários, cumulativamente:
a) Exercer a actividade correspondente à sua competência específica, sob a direcção de um patrono com, pelo menos, 5 anos de exercício efectivo da profissão, livremente escolhido pelo estagiário ou, em caso de requerimento justificado deste, supletivamente indicado pelo conselho distrital;
b) Participar nos processos judiciais para que for nomeado como patrono ou defensor oficioso, nos termos das leis sobre o acesso ao direito, ou prestar consulta gratuita aos economicamente necessitados, sob a direcção do serviço de estágio;
c) Enviar mensalmente ao centro de estágio competente um exemplar de um articulado e uma alegação de recurso, os quais não poderão recair sobre temas já tratados anteriormente pelo estagiário;
d) Apresentar, pelo menos, uma disserta-ção sobre deontologia profissional.
2 ( ... )
3 ( ... )".
"Artigo 167º
(Nomeações oficiosas e assistência judiciária)
1 - Nos processos de nomeação oficiosa ou quando o requerente de assistência judiciária não indique advogado, solicitador ou advogado estagiário e não haja motivos excepcionais que determinem a imediata nomeação de advogado ou solicitador, deverão os juizes remeter ao conselho distrital ou delegação da área os pedidos de nomeação de patrono ou defensor oficioso respeitantes a processos compreendidos na competência própria dos estagiários, prevista no nº 2 do artigo 164º.
2 - Notificado do despacho a que se refere o número anterior, o conselho distrital ou delegação procederá à designação do estagiário, de acordo com uma escala preexistente, comunicando ao juiz do processo a identificação do estagiário designado no prazo de 5 dias.
3 - A junção aos autos da comunicação do conselho distrital ou delegação identificando o estagiário designado é equiparada à notificação do despacho de nomeação para cômputo dos prazos previstos na legislação sobre acesso ao direito.
4 - Para efeito do disposto nos números anteriores e em caso de aglomeração de estagiários inscritos em qualquer comarca, deverá o conselho distrital correspondente ao respectivo distrito distribuir os estagiários inscritos pela própria comarca e pelas comarcas limítrofes de acordo com a opção dos estagiários ou, subsidiariamente, em função da localização e proximidade relativa do domicílio".
"Artigo 168º
(Comparências e escalas de nomeação)
1 - Os serviços de estágio determinarão a comparência do estagiário em audiências e outros actos jurídicos de natureza pública relacionados com a vida forense.
2 - Os serviços de estágio deverão organizar as nomeações previstas no artigo anterior ou as comparências aqui previstas de acordo com um critério rotativo que permita ao estagiário um conhecimento tão efectivo quanto possível dos foros cível, penal, laboral, administrativo, fiscal e aduaneiro"
3. 0 carácter absorvente dos trabalhos a cargo dos estagiários, numa intencionalidade endereçada à consecução de alto nível de formação profissional específica, ressuma claramente da normação extractada.
Pode ler-se, a este propósito, vincadamente, no ponto 5. do relatório preambular do Decreto-Lei nº 84/84:
"0 estágio é um problema essencial na formação dos advogados de hoje.
"Se, por um lado, se requer a eliminação de entraves ao pleno acesso à profissão, por outro, impõe-se que o tirocínio se faça com a melhor preparação possível dos jovens advogados.
"Nas regras consignadas no Estatuto, foi preocupação dar um papel mais activo à Ordem dos Advogados, sem descurar a acção importantíssima do patrono do estágio, buscando-se um equilíbrio que permita dar uma melhor formação, quer técnica, quer deontológica, àquele que vai iniciar a profissão de advogado".
De resto, a filosofia assim esboçada não fez senão dar tradução ao programa delineado da Lei nº 1/84, de 15 de Fevereiro - "Autorização legislativa para revisão do capítulo do Estatuto Judiciário "Do mandato judicial" -, ao abrigo da qual foi editado o Decreto-Lei nº 84/84, e cujo artigo 2º, alínea e), justamente dispôs (6) :
"Artigo 2º
0 sentido essencial da legislação a criar, ao abrigo da presente lei, será o de:
a) ( ... )
b) ( ... )
c) ( ... )
d) ( ... )
e) Rever o sistema de estágio, com o propósito de preparar o advogado estagiário para a indispensável técnica profissional e para a assunção, pelo mesmo, da consciência dos deveres, direitos e responsabilidades inerentes ao bom exercício da profissão, nomeadamente através da criação de cursos teórico-práticos e de uma formação deontológica adequada.
f) ( ... )"
Manifestação de necessidade sentida de há longa data, vamos detectá-la já perante o Estatuto Judiciário promulgado pelo Decreto nº 33547, de 23 de Fevereiro de 1944 (7) em cujo exórdio se deixaram adrede registadas motivações de irrecusável actualidade:
"29. ( ... ) ( ... )
"A justiça é um serviço público; embora não funcionário, o advogado concorre de uma maneira muito importante para a administração deste serviço.
A lei exige dêle, Portanto, conhecimentos e garantias de natureza a assegurar a boa marcha do serviço público, no qual é chamado a colaborar. Por outro lado, as partes e o público em geral, necessitando em muitas circunstâncias de conselhos jurídicos, para a condução e conclusão dos seus negócios e defesa dos seu interêsses, têm o direito de ser protegidos contra a ignorância a cupidez e a deshonestidade dos intermediários. Estas razões explicam que o acesso e o exercício da profissão de advogado sejam regulamentados".
E, mais adiante, depois de se ponderar que a Ordem dos Advogados deve ser "organizada em termos de a profissão ficar defendida, quer sob o ponto de vista técnico, quer sob o ponto de vista moral":
"Sob o ponto de vista técnico: o advogado deve possuir uma cultura jurídica susceptível de lhe permitir penetrar nos segredos dos mais intrincados e variados problemas que ao seu patrocínio judiciário e ao seu conselho possam vir a ser submetidos.
"Sob o ponto de vista moral: o advogado deve poder exercer a sua profissão com inteira pureza de carácter, livre de quaisquer sugestões ou pressões, e deve ser capaz de a exercer apenas pelo amor e apêgo que lhe tenha.
"A estes dois pontos de vista se prendem directamente as principais inovações que no presente diploma se encontram: ao primeiro liga-se a exigência de um exame para se ingressar na profissão de advogado e o estabelecimento de duas categorias de advogados - a dos que podem e a dos que não podem advogar no Supremo Tribunal de Justiça; no segundo filia-se a nova regulamentação das incompatibilidades e a exigência de averiguação de boa conduta moral para se poder ser inscrito como advogado."
Premissas que permitem ao legislador de 44 concluir (ponto 30. do relatório que vimos acompanhando):
"Ora, o estágio ou tirocínio profissional bem organizado é uma das primeiras, senão a primeira necessidade, da advocacia. É óbvia a importante contribuição que pode fornecer para a formação profissional dos novos advogados. Por isso se impõe não acabar com êle, mas organizá-lo de modo que não possa ser frustrado na sua finalidade.
"Ao estágio se deve o alto nível de cultura e de moralidade que a classe dos advogados atingiu em alguns países."
Por todo o exposto se revelam de tomo as exigências propedêuticas formuladas aos estagiários pelo Estatuto de 1944, no sentido de uma apurada habilitação para o exercício competente e digno da sua vocação.
Vejamos em resenha da época, extraída de parecer deste Conselho (8) , que não diferiam, substancial e intencionalmente, das que hoje se planteiam:
"0 tirocínio que dura, em regra, dezóito meses, tem por fim, como se diz no art. 527º do Estatuto Judiciário, familiarizar o candidato com os actos e termos mais usuais da prática forense, bem assim inteirá-lo dos direitos e deveres dos advogados, em ordem a desenvolver-lhe cumulativa-mente o espírito jurídico e o espírito de corpo-ração, e obriga a assistência no escritório do advogado, devendo o candidato, sob a direcção superior daquele, transitar por todos os serviços relacionados com a actividade do advogado, de maneira que em todos adquira a técnica profissional indispensável.
"Os tirocinantes deverão assistir aos trabalhos da chamada conferência preparatória (9) e participar neles, produzindo trabalhos escritos e exposições acêrca de pontos indicados pelo presi-dente ou escolhidos pelos próprios candidatos a aprovados pelo presidente, devendo os tirocinantes discutir os pontos e os trabalhos sob a direcção do presidente ou de quem o substituir (artigos 527º e 544º do Estatuto).
"Durante o primeiro terço do prazo do tirocínio o candidato só poderá praticar actos pertencentes às profissões de advogado ou solicitador judicial em causa própria, ou do seu cônjuge, ascendentes ou descendentes; mas, decorrido que seja o primeiro têrço do prazo do tirocínio, o candidato poderá exercer a advocacia por nomeação oficiosa ou com procuração: 1º - em processo de polícia correccional; 2º - nas causas cíveis e comerciais de valor não superior a 10 000$00, nas justificações da qualidade de herdeiro e nas causas que corram perante os tribunais de trabalho (artigo 528º do Estatuto).
"Os candidatos têm de prestar, por fim, as provas do exame previsto no artigo 535º do Estatuto, apresentando, entre os títulos de admissão, seis exemplares dactilografados de um trabalho jurídico original, cópia de cinco trabalhos forenses, pelo menos, que tenham escrito durante o seu tirocínio, com a indicação dos autos a que fôrem juntos e cópia de, pelo menos, dois trabalhos escritos que tenham realizado e a que se refere o §2º do artigo 544º do Estatuto."
A configuração e a teleologia de semelhantes prescrições justificou então um juízo conclusivo no seio desta instância consultiva:
"0 estágio não é um prolongamento do curso universitário; é, diversamente, já o treino da advocacia, a experiência do exercício dessa actividade, ainda controlada, mas já da mesma natureza, podendo o candidato acompanhar, como advogado, alguns processos desde o começo do estágio e, findo o
primeiro têrço do prazo do tirocínio, outros processos de muita responsabilidade profissional, embora de valor limitado.
"0 estágio ou tirocinio profissional bem organizado, escreve o legislador do Estatuto no nº 30 do relatório (10), é uma das primeiras, senão a primeira necessidade da advocacia."
4. Reverta-se ao Estatuto de 1984.
A qualidade de advogado estagiário e o subingresso na posição estatutária parcialmente esboçada nos números antecedentes depende de inscrição na Ordem dos Advogados (11) (12) .
Recorde-se que a inscrição se encontra regulada em geral no Capítulo I, do Título II (artigos 154º a 158º) e a inscrição corno advogado no Capítulo III do mesmo Título (artigos 170º a 172º).
Requisitos específicos da inscrição como advogado estagiário, de somenos importância na dilucidação da questão que nos ocupa, vêm disciplinados no artigo 161º, incluído no Capítulo II (13).
Talvez deva apenas salientar-se a regra de que a inscrição como estagiário se rege "pelas disposições aplicáveis à inscrição como advogado" (artigo 161, nº 4) mas como a lei não dedicou a esta no Capítulo III cópia de pormenores (14), o que acaba por avultar, em quanto ao nosso tema concerne, é realmente a normação geral do Capítulo I e, adentro desta, o artigo 156º, que se transcreve na parte com interesse (15)
"Artigo 156º
(Restrições ao direito de inscrição)
1 - Não podem ser inscritos:
a) b) c)
d) Os que estejam em situação de incompa-bilidade ou inibição do exercício da advocacia;
e) ( ... )
2 - Aos advogados e advogados estagiários que se encontrem em qualquer das situações enumeradas no número anterior será suspensa ou cancelada a inscrição.
3 - ( ... )
4 - ( ... )"
Divisa-se, no preceito transcrito, a resposta à interrogação formulada.
As incompatibilidades previstas no nº 1, alínea d), são, indubitavelmente, além do mais, aquelas que o artigo 69º enumera (16) , entre as quais, obviamente, a da alínea f) do seu nº 1, de importância nuclear no âmbito da consulta.
0 nº 2 do artigo 156º aponta então com clareza no sentido da sua aplicabilidade tanto aos advogados como aos estagiários.,
0 que, aliás, não deixa de concordar com o princípio, traduzido no artigo 159º, nº 1, segundo o qual as disposições do Estatuto se aplicam, com as necessárias adaptações, aos advogados estagiários, excepção feita às que se referem a exercícios de direito de voto".
A teleologia que lhe preside foi reflectida no citado parecer deste Conselho (17) em termos que, pese o diverso contexto histórico-normativo, julgamos perfeitamente actual.
Ponderando-se - como há pouco melhor vimos - que o estágio ou tirocínio profissional bem organizado é a primeira necessidade da advocacia, escreveu-se em seguida:
"Se a incompatibilidade estabelecida (18) não abrangêsse o período do estágio, não só se não realizariam os fins que o legislador expressamente teve em vista, mas agravar-se-iam, pela própria inexperiência do candidato, as contingências que se pretendeu evitar.
"Com efeito, a multiplicidade de encargos e de preocupações do tirocinio que o natural entusiasmo e o amor próprio do candidato ainda avolumarão, mal se compreenderia compatível, no tempo, com o exercício de certas funções importantes e delicadas. Além disso a inexperiência do tirocinante que ainda, possivelmente, lhe não permitiu a perfeita consciência dos limites, ou das exigências, da profissão, poderá expor aquele que também fôr funcionário público a tomar, mais facilmente, atitudes ou iniciativas inconvenientes à função pública que simultaneamente exerce. De um modo geral, pode, pois, dizer-se, sem exagero, que os inconvenientes que o legislador pretendeu evitar, com o estabelecimento da incompatibilidade, se dão no caso do tirocinante à advocacia, e ainda sob forma mais grave.
"E também, se o tirocínio não visa senão o fim da inscrição como advogado, para um exercício profissional, não se compreende que possa ser hábil para tirocinar quem o não é para colher benefícios do tirocínio que termina pela aprovação do tirocinante.
"A conclusão que do exposto tirar é, pois, a de que a incompatibilidade que a lei estabelece para o exercício da profissão de advogado com outras funções, abrange todo o exercício da advocacia, tanto o que se faz após a inscrição como advogado, como o que se presta durante o estágio como candidato à advocacia".
5. A solução - e não se afigura que os cânones hermenêuticos viabilizem o entendimento oposto -parecerá violenta quando transposta para a situação representada a Vossa Excelência por (...)?
Exercendo como aferidor de pesos e medidas do município de Sabrosa, licenciou-se em Direito, na justa aspiração de se tornar advogado.
A incompatibilidade da alínea f) do nº 1 do artigo 69º do EOA impõe-lhe, porém, condição de ingresso no indispensável estágio, o abandono do emprego municipal onde aufere meios de subsistência.
Antes de mais, deve o dilema argumentativamente ser reduzido às devidas proporções.
Não se trata de uma dificuldade oposta especialmente à realização do estágio, posto que, findo ele, com igual legitimidade poderia suscitar-se no tocante ao exercício propriamente dito da profissão de advogado, enquanto os réditos desta actividade não propiciassem a necessária independência económica.
A solução legal encontrada há-de, pois, ponderar-se à luz dos direitos fundamentais evocados pelo exponente, sem perder de vista aquela sua projecção.
6. É nosso mister, todavia, esclarecer primeiro uma questão condicionante na temática central da consulta.
Será que (...) pode qualificar-se, enquanto "aferidor de pesos e medidas" do município de Sabrosa, como "funcionário ou agente das câmaras municipais" no sentido da alínea f) do nº 1 do artigo 69º do EOA - ou, ainda, mais genericamente, como "funcionário ou agente de um serviço público de natureza local" na acepção da alínea i) do mesmo normativo?
Atendendo à factualidade que nos é presente, cremos não se justificar uma resposta negativa.
"Aferidor de pesos e medidas" é, justamente, uma das carreiras do pessoal das câmaras municipais previstas no Decreto-Lei nº 247/87, de 17 de Junho, diploma que, em "adaptação do Decreto-Lei nº 248/85, de 15 de Junho (19), às carreiras de pessoal da administração local "como refere o preâmbulo -, veio estabelecer "o regime de carreiras e categorias, bem como as formas de provimento, do pessoal das câmaras municipais, serviços municipalizados, federações e associações de municípios, assembleias distritais e juntas de freguesia" (artigo 1º, nº 1).
Na estruturação dos quadros, esse pessoal é congregado, consoante prescreve o artigo 6º, nº 2, nos seguintes grupos: a) pessoal dirigente e de chefia; b) pessoal técnico superior; c) pessoal técnico; d) pessoal técnico-profissional; e) pessoal administrativo; f) pessoal operário; g) pessoal auxiliar.
Por seu turno, o desenvolvimento e o regime de carreiras e categorias em que se analisam os aludidos grupos é constante do diploma e respectivos anexos (artigo 8º).
Ora, vê-se do Anexo I que o grupo do pessoal técnico-profissional compreende, entre outras, a carreira de "aferidor de pesos e medidas", comportando quatro categorias que não importa aqui detalhar.
0 recrutamento para as categorias dessas carreiras faz-se, segundo o artigo 13º, de harmonia com o disposto no artigo 20º do Decreto-Lei nº 248/85, de 15 de Julho (20) e de acordo com o preceituado no diploma.
Neste sentido dispõe, por exemplo, o artigo 41º, integrado no Capítulo III ("Formas de provimento", artigos 41º a 45º), a regra de que o "provimento do pessoal dos quadros das câmaras municipais ( ... ) é feito por nomeação provisória ou em comissão de serviço pelo período de um ano" (nº 1).
Findo este prazo, "o funcionário - acrescenta o nº 5 - será nomeado definitivamente se tiver classificação de serviço não inferior a Bom" (alíneas a)); ou "será exonerado ou regressará ao quadro de origem, conforme se trate de nomeação provisória ou em comissão de serviço, se não tiver obtido aquela classificação" (alínea b)).
0 artigo 42º previne o exercício interino de lugares dos quadros "por funcionários da categoria imediatamente inferior da respectiva carreira, desde que o titular do lugar se encontre impedido no desempenho de outras funções públicas ou em situação equivalente que legalmente lhe garanta o direito ao lugar" (nº 1) - na nomeação interina têm, aliás, preferência tios funcionários aprovados em concurso válido para o lugar a prover, segundo a ordem constante da lista de classificação final" (nº 2).
0 pessoal contratado ou assalariado dos quadros dos entes a que se refere o diploma, com pelo menos um ano de serviço, "considera-se nomeado definitivamente a partir da entrada em vigor do presente decreto-lei, devendo ser efectuado o respectivo averbamento no termo de posse e anotada a nova situação no processo individual" (artigo 43º, nº 1); de contrário considera-se nomeado provisoriamente, nos termos do nº 1 do artigo 41º" (nº 2).
Assegura-se, ademais, o "desempenho de funções públicas que não correspondam a necessidades permanentes dos serviços" por pessoal contratado a prazo certo (artigo 44º, nº 1), estabelecendo-se do mesmo passo (nº 5) a sujeição deste "ao estatuto legal e disciplinar dos funcionários e agentes das autarquias locais, excepto no que for incompatível com a natureza da situação contratual, sem que tal facto lhe confira a qualidade de agente".
Os subsídios respigados sugerem, em suma, significativamente, a qualificação do pessoal dos quadros das câmaras municipais, segundo noções categorias correntes (24) , Como "agentes" e "funcionários administrativos" segundo noções categoricas correntes (21).
Não se divisam, pois, razões, com os elementos de facto disponíveis, para pensar que o "aferidor de pesos e medidas" peticionário se encontre excluído da incidência da alínea f) e da alínea i) - do nº 1 do artigo 69º do EOA.
IV
É portanto o momento de passar ao problema da conformidade constitucional deste normativo.
1. Vem posta em causa, desde logo, em sede de direitos fundamentais, a "liberdade de escolha de profissão", garantida no artigo 47º, nº 1, da Constituição:
"Artigo 47º
(Liberdade de escolha de profissão e acesso à função pública)
1. Todos têm o direito de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho, salvas as restrições legais impostas pelo interesse colectivo ou inerentes à sua própria capacidade.
2. Todos os cidadãos têm direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso".
1.1. Os anotadores GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA ponderam constituir a referida liberdade "um direito fundamental complexo, comportando vários componentes".
Vejamos como desenvolvem a sua visão deste direito, ponderando fundamentalmente duas vertentes: a liberdade de escolha de profissão como "direito de defesa" - a sua dimensão negativa, dir-se-ia - em contraposição à "dimensão positiva" do mesmo direito:
"Enquanto direito de defesa a liberdade de profissão significa duas coisas: (a) não ser forçado a escolher (e a exercer) uma determinada profissão; (b) não ser impedido de escolher (e exercer) qualquer profissão para a qual se tenham os necessários requisitos, bem como de obter estes mesmos requisitos (22) .
0 primeiro aspecto não reveste interesse visível no domínio do problema que nos ocupa. Já o segundo se relaciona, na exposição dos anotadores citados, com a denominada "dimensão positiva" da liberdade de escolha profissional.
Eis no que poderá traduzir-se semelhante "dimensão":
"Mas o direito de escolha livre da profissão apresenta também uma dimensão positiva, conexionada com o direito ao trabalho e com o direito ao ensino, e que consiste designadamente em: (a) direito à obtenção dos requisitos legalmente exigidos para o exercício de determinada profissão, nomeadamente as habilitações escolares e profissionais; (b) direito às condições de acesso em condições de igualdade a cada profissão" (23) .
Aliás, a análise dos mesmos constitucionalistas distingue vários "níveis de realização" da liberdade de escolha de profissão, uma vez que esta, aduzem, "não pode naturalmente consistir apenas na liberdade de poder escolher livremente a profissão desejada":
"Os principais momentos são os seguintes: (a) obtenção das habilitações (académicas, técnicas, etc.) necessárias ao exercício da profissão; (b) ingresso na profissão; (c) exercício da profissão; (d) progresso na carreira profissional" (24) .
A "liberdade de escolha de profissão" garantiria, pois, "constitucionalmente todos estes aspectos" (25) .
Noutro plano, o comentário que ora prende a nossa atenção debruça-se, em primeiro lugar, sobre o conteúdo das profissões constitucionalmente garantidas - profis-sões "principais e secundárias", "típicas e não típicas," "profissões livres e estadualmente vinculadas", autónomas e não autónomas" -, concluindo que todo esse domínio, ou seja, afinal, não apenas as profissões cujo "perfil" tradicional está juridicamente fixado, mas também as actividades profissionais "novas", "atípicas", e "não habituais", se deve compreender englobado no "âmbito semântico-constitucional" do conceito, e correspondente ao "sentido normativo-material de liberdade de profissão" (26).
"Limite imanente" da liberdade de escolher profissão seria também, em segundo lugar, a "licitude da respectiva actividade, não podendo ela abranger as "profissões" constituídas por actividades ilícitas" (27) .
As duas ideias enunciadas em último lugar revelam-se assaz despiciendas na questão posta à nossa apreciação, pelo que as deixaremos quiescendo em busca de outros subsídios, importados dos autores que vimos acompanhando, nuclearmente direccionados à sua dilucidação.
De entre estes recolheremos apenas, tentando obter uma mais precisa configuração material do direito fundamental aqui em questão, a reflexão produzida no confronto entre "liberdade de escolha de profissão" e "direito ao exercício livre da profissão ("profissão livre")", a qual no contexto tópico em que nos situamos se reveste de alguma importância.
A liberdade de escolha - asseveram (28) - "é independente do estatuto legal de cada profissão, não implicando ela uma garantia institucional das "profissões livres", não sendo portanto constitucionalmente ilícito, nem a atribuição de um estatuto público a certas profissões, nem, muito menos, a submissão de certas profissões a um estatuto mais ou menos publicamente condicionado ou vinculado (advocacia, medicina, etc.)"
0 tema prende-se de algum modo com a "reserva de lei restritiva" excepcionada na segunda parte do nº 1 do artigo 47º, "um dos casos expressamente previstos de restrições legais de "direitos, liberdades e garantias", admissíveis segundo o artigo 18º, nºs 2 e 3 da lei fundamental (29) .
Observam, a propósito, os comentadores cujo pensamento ora apreciamos (30) :
"A liberdade de conformação do legislador depende porém do nível em que a restrição se verificar. Assim: a liberdade de escolha propriamente dita só comporta, em geral, as restrições decorrentes da colisão com outros direitos fundamentais; a entrada ou ingresso admite limites mais intensos, podendo a lei estabelecer certos pressupostos subjectivos condicionadores do direito de escolha (ex.: prova de qualificação profissional, provas de concurso, idade mínima, etc.); o exercício da profissão pode estar sujeito a limites ainda mais intensos, principalmente quando da regulamentação do exercício não resultam quaisquer efeitos sobre a liberdade de escolha (ex.: estabelecimento de horário obrigatório)."
Para os autores citados, todavia, a "consideração separada destes três momentos fundamentais não exclui a consideração materialmente unitária do direito de escolha, a qual é particularmente importante no caso de leis restritivas do exercício da profissão mas com implicação directa sobre a liberdade de escolha. Aqui os limites relativos aos pressupostos subjectivos (qualificação pessoal, capacidade, habilitações) são admissíveis, desde que, como é óbvio, sejam teleologicamente vinculados (interesse público) e não violem o princípio da proibição do excesso (necessidade, exigibilidade e proporcionalidade)" (31) .
Já veremos em que exactamente se traduz este princípio.
Antes, porém, interessa registar uma derradeira reflexão oriunda da mesma fonte doutrinária.
Salientando ser de contornos incertos a liberdade de conformação do legislador ordinário quanto à "tipicização ou fixação do conteúdo profissional" -ponto de menor importância na economia do presente parecer -, acrescentam GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA (32) :
"Restrições claramente admissíveis são as que visam limitar o exercício simultâneo de várias profissões (se é que a liberdade de escolha abrange o direito de ter mais do que uma ... ). A lei pode estabelecer incompatibilidades que obstem a que uma profissão seja exercida cumulativamente com outra.
0 mesmo pode acontecer em relação ao Pluriemprego. Estas medidas restritivas podem ser, de resto, concretizações de imposições constitucionais (ex.: execução de política de pleno emprego, nos termos do artigo 59º-3/a)) ou de proibições expressamente consagradas na Constituição (ex.: proibição da acumulação de empregos ou cargos públicos, nos termos do artigo 269º-4)"..
1.2. Vimos que a liberdade de escolha pode sofrer restrições, nos termos do artigo 47º, nº 1, impostas pelo "interesse colectivo" ou inerentes à "própria capacidade".
Quer dizer, "a liberdade de profissão - a de escolha e, a fortiori, a de exercício - fica logo recortada no catálogo constitucional de direitos conexa com esses dois princípios limitativos, com a consequente compressão do seu conteúdo" (33) .
0 legislador ordinário tem que respeitar, contudo, além do mais, o "princípio da proibição do excesso" ou princípio da proporcionalidade (em sentido amplo), elevado à dignidade constitucional (34) e introduzido no artigo 18º, nº 2 mercê da primeira revisão da lei básica.
"Como superconceito, desdobra-se em várias exigências: a exigência de conformidade ou adequação dos meios (a medida adoptada para a realização do interesse público deve ser apropriada para a prossecução dos fins subjacentes ao interesse público; o acto do poder público deve ser apto e conforme os fins que justificam a sua adopção; trata-se de controlar a relação de adequação medida-fim); o requisito da exigibilidade ou da necessidade (menor ingerência possível, direito do cidadão à menor desvantagem possível: o meio deve ser o mais poupado quanto à limitação dos direitos fundamentais; limitação no tempo da medida limitativa, circunscrição à pessoa ou pessoas cujos interesses devam ser sacrificados - necessidade material, exigibilidade espacial, exigibilidade temporal e exigibilidade pessoal)" (35) .
Uma teorização próxima (36) analisa-o em três subprincípios - diga-se, na essência não diversos:
"(a) princípio da adequação, isto é, as medidas restritivas legalmente previstas devem revelar-se como meio adequado para a prossecução dos fins visados pela lei (salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos);
"(b) princípio da exigibilidade, ou seja, as medidas restritivas previstas na lei devem revelar-se necessárias (tornarem-se exigíveis), porque os fina visados pela lei não podiam ser obtidos por outros meios menos onerosos para os direitos liberdades e garantias;
"(c) princípio da proporcionalidade em sentido restrito, que significa que os meios legais restritivos e os fins obtidos devem situar-se numa "justa medida", impedindo-se a adopção de medidas legais restritivas desproporcionadas, excessivas, em relação aos fins obtidos" (37) .
1.3. Ponderado o conteúdo material da liberdade de escolha de profissão, as restrições que lhe podem ser introduzidas pelo legislador ordinário e pressupostos axiais a que estas devem obedecer, poderá acaso concluir-se pela desconformidade constitucional, neste domínio, da incompatibilidade com o exercício da advocacia - e, desde logo, a título de candidato ao estágio - que atinge funcionários e agentes municipais, em harmonia com o artigo 69º, nº 1, alínea f), do EOA?
Inclinamo-nos para uma resposta negativa.
Dúvidas podem liminarmente colocar-se de que a liberdade de escolha se encontra aí directamente implicada, naquele vector, vale dizer, da "dimensão positiva" que se traduz no "direito à obtenção dos requisitos legalmente exigidos tais as habilitações escolares e profissionais, para o exercício da profissão.
A liberdade de escolha é, com efeito, independente do estatuto legal da advocacia, não importando uma garantia institucional dessa actividade enquanto profissão livre, nem inviabilizando a atribuição de um estatuto público mais ou menos condicionado ou vinculado.
Ainda mais duvidoso será, porventura, que a liberdade de escolha compreenda o direito de aceder a mais do que uma profissão.
Em causa poderá estar o segundo aspecto da "dimensão positiva", o direito aos requisitos de acesso em condições não discriminatórias, cujo cerne, intimamente conexionado com o respeito do princípio da igualdade, bem recomenda tratamento separado.
Como quer que seja, até onde a liberdade de escolha de profissão possa admitir-se visada na mencionada incompatibilidade, não vemos que mediante esta se haja manifestado desrespeito pelos pressupostos a cumprir no caso de limitação.
Em primeiro lugar, a restrição, em que a incompatibilidade pode traduzir-se/ é objecto de expressa previsão no artigo 47º, nº 1, da Constituição, tal como o artigo 18º, nº 2 postula.
Em segundo lugar, cremos que a mesma se justifica normativamente pelo interesse colectivo subjacente ao serviço público da justiça, que aos tribunais cabe nuclearmente administrar com independência e exclusiva sujeição à lei (artigos 205º e ss. da Constituição), obtendo no concurso da advocacia essencial mediação.
Por isso se compreende, do mesmo passo, a restrição no escopo da salvaguarda dos direitos e interesses implicados na administração da justiça, constitucional-mente protegidos (38) .
Finalmente, também a proporcionalidade e necessidade da medida restritiva não poderão ostensivamente negar-se.
Mostrámos oportunamente como a actividade do advogado estagiário é ia o próprio exercício da advocacia, ela mesma, enformada nos parâmetros fundamentais da liberdade e independência, secundados pela exigência instrumental da aptidão técnica, em grau elevado, consentâneo com a delicadeza dos direitos e interesses envolvidos.
E, daí, a necessidade da entrega absorvente, inconciliável, porventura, com o desempenho simultâneo de laterais funções em regime, quiçá, de mais rígida dedicação.
Daí, igualmente, o imperativo de furtar o estagiário a solicitações relacionadas com a posição funcional em determinado serviço público, propiciando permeabilidade susceptíveis de afectar a sua dignidade e independência.
Não propendemos a pensar que a incompatibilidade em questão deixe configurar-se como medida desproporcionada na óptica da sua relação com a prossecução dos fins aludidos - juízo cuja adequação tendencial, de todo o modo, melhor se aferirá a propósito das reflexões acerca do princípio da igualdade, quando se cotejar a posição dos funcionários aludidos com a de outros trabalhadores não sujeitos à inibição.
Muito ao invés, esses escopos e interesses é que careceriam, provavelmente, de adequada realização, se bem vemos, a postergar-se, por hipotético excesso em sede de direito de acesso à profissão, uma similar restrição.
Porque então, em estrita coerência, a todas as incompatibilidades definidas no artigo 69º se imporia, no seu endereçamento aos estagiários, reputar eivadas do mesmo vício.
E, a partir daqui, tornados já prodromicamente - mesmo que apenas prodromicamente - indiferentes os parâmetros capitais da liberdade e da independência da profissão, restariam talvez meras razões circunstanciais para as pretender aplicáveis - a incompatibilidade da alínea f) e todas as demais - aos próprios advogados.
2. 0 artigo 69º, nº 1, alínea f), do EOA vem ainda arguido, pelo exponente, de violar o direito de igualdade de oportunidades na escolha de profissão.
2.1. Assim chama especificamente à colação o disposto no artigo 58º, nº 3, alínea b), da Constituição, cujo teor integral importa reproduzir (39) :
"Artigo 58º
(Direito ao trabalho)
1. Todos têm direito ao trabalho.
2. 0 dever de trabalhar é inseparável do direito ao trabalho, excepto para aqueles que sofram diminuição de capacidade por razões de idade, doença ou invalidez.
3. Incumbe ao Estado, através da aplicação de planos de política económica e social, garantir o direito ao trabalho, assegurando:
a) A execução de políticas de pleno emprego;
b) A igualdade de oportunidades na escolha da profissão ou género de trabalho e condições para que não seja vedado ou limitado, em função do sexo, o acesso a quaisquer car-gos, trabalho ou categorias profissionais;
c) A formação cultural, técnica e profissional dos trabalhadores."
Não temos como líquido que o nosso problema possa reconduzir-se precisamente à temática do direito de escolha de profissão.
"É incontestável - escreveu-se no parecer da Comissão Constitucional nº 2/78 (40) - que o regime de inscrição na Ordem dos Médicos concerne o exercício do direito de escolha de profissão e género de trabalho, na medida em que somente quem estiver inscrito na Ordem pode exercer a profissão médica. Mas essa inscrição não funciona senão como uma formalidade administrativa que não afecta a liberdade prévia de escolher a medicina como profissão e que, em qualquer caso, se fundamenta na previsão de restrições legais impostas pelo interesse colectivo. Supõe-se, portanto, duvidoso reconduzir a questão da inscrição obrigatória a uma questão de livre escolha de profissão".
Seja como for, o mais relevante é colocar-se, nesta outra óptica do peticionário, um problema de violação do princípio da igualdade, de que o preceito constitucional extractado representa particular reafirmação em específico sector (41) .
Torna-se, pois, mister enfocar a questionada incompatibilidade à luz do mencionado princípio, consagrado genericamente no artigo 13º da Constituição, que dispõe:
"1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social".
2.2. Este Conselho Consultivo teve já o ensejo de apreciar a questão, no citado parecer nº 26/88.
É certo que a apreciação se centrou na incompatibilidade prevista na alínea i) do nº 1 do artigo 69º.
E não se tinha em vista especialmente a posição estagiário, mas a do advogado.
Facilmente se compreenderá, porém, que essas duas circunstâncias de modo algum contra-indiquem a transposição, para o nosso caso, da construção desenvolvida acerca do princípio da igualdade e da aferição acerca da conformidade com este princípio da concreta incompatibilidade sindicada.
De facto, os "funcionários e agentes municipais" aludidos na alínea f) são, do mesmo passo "funcionários e agentes de serviços públicos de natureza local", cabendo, pois, por via deste conceito, também na alínea i).
Mercê, por conseguinte, de similar relação entre as duas alíneas, tudo o que no aludido parecer se disse com respeito ao último segmento normativo vale essencialmente para o primeiro.
Crê-se, por outra parte, não assumir importância significativa, no plano particular em que neste instante nos movemos, que aquele parecer tenha abordado especialmente a situação dos advogados e não a dos estagiários, recte, dos candidatos à inscrição como advogados estagiários.
De um lado, já se preveniu (supra, III, 5.), as razões da manutenção da actividade inibitória, ou as dificuldades na remoção da incompatibilidade, não são necessariamente opostas em especial à realização do estágio, podendo fazer-se valer qua tale - motivo de afinidade não despiciendo - no concernente ao exercício da profissão propriamente dita.
Sobre tudo releva, como quer que seja, em sede de incompatibilidade e na tónica do caso exposto a Vossa Excelência, a diferença específica entre advogados e candidatos: a subsistência da incompatibilidade, enquanto àqueles apenas inibe do desempenho da actividade, no tocante a estes vai mais longe, produzindo o efeito de lhes vedar o próprio acesso à profissão.
No entanto, este aspecto diferencial já foi objecto de consideração a propósito da liberdade de escolha.
0 ponto de saber agora se, na perspectiva embora dos aludidos efeitos, há respeito do princípio da igualdade, é já questão que pode em larga medida abstrair-se daquela diversidade e, portanto, comum a ambos os tipos de situações.
2.2.1. 0 parecer nº 26/88 inclinou-se para a ofensa do princípio da igualdade (42) aduzindo, fundamental-mente, a seguinte argumentação:
"Considerando a incompatibilidade definida na referida alínea i) do artigo 69º ("funcionário ou agente do serviços públicos", com a excepção expressa no nº 2 da mesma disposição) à luz do princípio geral fundamentador . é possível extrair algumas conclusões (x1) : - aquela incompatibili-dade tem a ver com a protecção da advocacia e do estatuto do advogado e não com a função que é declarada incompatível com a advocacia, e a incompatibilidade "há-de justificar-se, ao menos quanto à sua extensão, à luz da defesa da independência e da dignidade da profissão e não de outros valores.
Assim, naquela norma não poderá entrar-se em linha de conta com nenhum interesse, no plano constitucional, sob o ponto de vista do estatuto da função pública. "A verdade é que o objecto da norma é estabelecer uma incompatibilidade do exercício de outras actividades (incluindo as funções públicas) com a advocacia e não de outras actividades (incluindo a advocacia) com a função pública. 0 sentido da norma é proteger a advocacia e não a função pública; visa defender a advocacia contra a função pública, a não a função pública contra a advocacia" (x2) .
A incompatibilidade estabelecida naquela alínea i) pertence ao estatuto da advocacia e não ao estatuto da função pública.
Desta precisão sai delimitada a perspectiva de análise. Não se trata de apreciar incompatibilida-des com o exercício de outras profissões, sob o ponto de vista da protecção dos valores e interesses próprios da função pública (x3) , mas tão só de determinar da razoabilidade constitucional daquelas exigências perante a
necessidade da protecção da dignidade e independência da profissão de advogado.
Na apreciação constitucional do problema (x4), assume imediata relevância a consideração do princípio da igualdade afirmado no artigo 13º da Constituição. Princípio que, como se salientou, vem invocado como suporte da desconformidade constitucional afirmada na exposição subscrita por um dos Senhores Advogados.
Mesmo que se admita, sob o ponto de vista constitucional, o reconhecimento da admissibilidade do estabelecimento de incompatibilidades do exercício de advocacia com outras actividades - uma vez que o artigo 47º da Constituição as não proíbe ao limitar o direito da livre escolha de profissão ou género de trabalho pelas "restrições legais impostas pelo interesse colectivo" (x5) - o que releva é confrontar semelhantes limitações perante a afirmação do princípio da igualdade.
Aceitando, rectius, pressupondo que o legislador gozava de discricionaridade legislativa no estabelecimento de incompatibilidades profissionais, - respeitados os princípios da proporcionalidade e necessidade - coloca-se, então, o problema "de saber se o faz sem discriminações, isto é, de acordo com o princípio da igualdade".
"Não basta que o legislador não esteja impedido de criar incompatibilidades; torna-se necessário, entre outras coisas, que elas não sejam discriminatórias, tratando desigualmente situações iguais (ou vice-versa), afectando com a incompatibilidade categoria) de pessoas que, sob o ponto de vista do funcionamento da incompatibilida-de, se encontram em igualdade de situação com outras que não são atingidas por ela" (x6) .
A referida norma do Estatuto da Ordem dos Advogados - no complexo material contido na respectiva formulação (regra, alínea i) e artigo 69º e excepção - nº 2, parte final da mesma disposição - expõe uma saliente discriminação de tratamento integrando a disciplina material constante da excepção: pode haver (há) funcionários ou agentes que, vistas as particulares qualidades das funções públicas que exercem estão excluídos do âmbito da incompatibilidade; não obstante serem "funcionários ou agentes de quaisquer serviços públicos", podem exercer a advocacia se forem "providos em cargos com funções exclusivas de mera consulta jurídica, previstos expressamente nos quadros orgânicos do correspondente serviço, e os contratados para o mesmo efeito".
Mas para além desta discriminação - in-tra-funcional - entre funcionários e agentes licenciados em direito que não exerçam exclu-sivamente, ou exerçam exclusivamente, funções de consulta jurídica, uma outra - extra-funcional -aquela norma igualmente contém. Trata-se da diferenciação entre funcionários e agentes dos serviços públicos e outras categorias de trabalhadores por conta de outrem.
Há que ver, deste modo, se semelhante discriminação (uma dupla diferença) se justifica materialmente no respeito pelo princípio da igualdade, tendo em consideração apenas a relevância que a fixação de incompatibilidades assume no plano que se considera - do lado da advocacia, da defesa da dignidade e independência da profissão.
Considerando a dignidade do exercício da profissão, qualquer das discriminações contidas na referida espécie de incompatibilidades não parece suficientemente fundada.
Assumindo certo modelo cultural de entendimento da profissão (relevância social, liberdade de exercício, liberdade intelectual e liberdade de actuação) como profissão paradigmaticamente liberal, a diferenciação de tratamento não ganha suficiente razão justificativa. Aceitando, com efeito, que certos trabalhadores por conta de outrem, - e, por isso mesmo, funcional ou laboralmente subordinados -possam exercer a advocacia, sem com isso afectar as exigências de dignidade da profissão, não se posicionam razões materialmente justificativas para restringir a proibição apenas a alguns trabalhadores por conta de outrem (os funcionários e agentes de serviços públicos e, destes, como se referiu, nem todos).
Se uns estão subordinados, em razão da ligação laboral, de tal modo que poderia inquinar o núcleo de liberdade da actuação, conatural à essência da profissão de advogado, não menos essa referência se verificaria em relação igualmente aos demais.
Deste ponto de vista, seria até porventura mais clara a estrutura normativa-funcional (e orgânico-regulamentar), com regras gerais definidas para o estatuto de funcionários e agentes que poderiam implicar com a dignidade do exercício de advocacia, do que a multiplicidade de normações de disciplina interna a que, eventualmente, estarão submetidas várias categorias de trabalhadores por conta de outrem (x7) .
Ainda, nesta perspectiva de apreciação, se não encontrará suficiente justificação material para a
diferenciação de tratamento dentro do próprio universo de funcionários e agentes.
Não afecta mais a dignidade do exercício da advocacia a impossibilidade (ou possibilidade) de esta profissão ser exercida por funcionário licenciado em direito, intelectual e profissionalmente apto, embora sem funções predominantes de consulta jurídica, ou que, no quadro da função pública (submetido embora e também a regras funcionais próprias) exerça funções exclusivas de consulta jurídica.
Estas considerações valem, de idêntica forma, quando se considera o interesse da independência da profissão - exercício pleno de decisão individual, liberto de intromissões e tensões impostas, ordens ou directivas, salvo quanto (obviamente, noutro enquadramento) integre o próprio objecto substancial do mandato.
Não será a circunstância de exercer uma função pública, com determinado estatuto geral, que não afecte como tal, directa, imediatamente, de modo marcado e relevante (como será nos casos de incompatibilidades naturais: v.g. alíneas c), d) e e) do mencionado artigo 69º do Estatuto) o exercício da advocacia, que faz diminuir as garantias de independência em confronto com qualquer outra função, exercida por conta de outrem e submetida a regras de direcção e a um poder disciplinar heterónomo.
Não significa isto, obviamente, como se referiu, que não possam ser estabelecidas incompatibilidades do exercício da advocacia com outras actividades e funções, quaisquer que sejam, tendo em vista a defesa da independência e dignidade da profissão, e salvaguardados os princípios da necessidade e da proporcionalidade.
Significa apenas, desse ponto de vista, perante as finalidades e exigências a que o estabelecimento das incompatibilidades pretende dar resposta, que não poderão ser criadas diferenciações de tratamento sem justificação material razoável. E a discriminação, nos sobreditos termos, contida na referida alínea i) nº 2, do artigo 69º perante as finalidade que pode ter por função realizar, dificilmente será materialmente razoável.
E também, vendo agora o outro lado do problema, não tem a ver com a possibilidade constitucional de o regime da função pública estabelecer incompatibilidades com o exercício de outras funções e designadamente com a advocacia. Mas esta é questão de que se não cuida agora. Do que se trata aqui, como se salientou já, é apenas de confrontar o estatuto da advocacia, partindo deste, com outras funções e actividades, e não do estatuto próprio de outras funções ou actividades em relação ao exercício da profissão de advogado (x8) . "
2.2.2. Em conformidade com a argumentação explanada, o parecer nº 26/88 extrairia as seguintes conclusões:
"5ª - A norma constante do artigo 69º, nº 1 alínea i), e do nº 2 do Estatuto da Ordem dos Advogados, estabelecendo incompatibilidades do exercício da advocacia com algumas funções públicas e não com quaisquer funções exercidas por conta de outrem, contém uma discriminação de tratamento não justificável perante as finalidades a que visam, nos termos do artigo 68º do estatuto, do lado da advocacia, o estabelecimento de incompatibilidades - a defesa da dignidade e independência da profissão;
6º - A norma constante do artigo 69º, nº 1, alínea i), e do nº 2 do Estatuto da Ordem dos Advogados, estabelecendo, por seu lado, diferenciação de tratamento em matéria de incompatibilidades entre os funcionários e agentes de quaisquer serviços públicos que exerçam exclusivamente funções de consulta jurídica, e outros funcionários ou gentes, ontem uma discriminação igualmente não justificável perante as finalidades a que visa a criação de incompatibilidades;
7º - A norma constante do artigo 69º, nº 1, alínea i), e do nº 2, ofende, deste modo, o princípio da igualdade consagrado no artigo 13º da Constituição".
3. Na sequência deste parecer nº 26/88, Vossa Excelência requereu, ao abrigo do disposto no artigo 281º, nº 1, alínea a), da Constituição, se apreciasse e declarasse, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma da alínea i) do nº 1 do artigo 69º do Estatuto da Ordem dos Advogados, na parte subsistente após a declaração de inconstitucionalidade constante do citado acórdão nº 143/85 do Tribunal Constitucional (43) , e, bem assim, a da norma do nº 2 do mesmo artigo 69º, por entender que as normas em causa violam o princípio da igualdade consagrado no artigo 13º do texto constitucional.
Pelo acórdão nº 169/90, Processo nº 1/89, de 30 de Maio de 1990 (44) , o Tribunal Constitucional, decidiu, porém, não declarar a inconstitucionalidade das citadas normas.
Após condensação liminar de tópicos fundamentais do princípio da igualdade, o referido acórdão nº 169/90 colocou, no que ora importa, uma interrogação.
Proibir (em geral) o exercício da advocacia aos funcionários e agentes administrativos, mas consenti-lo aos trabalhadores por conta de outrem, tem suficiente justificação racional ou material, ou traduz-se, antes, no estabelecimento de uma distinção arbitrária, capaz de ferir o princípio da igualdade?
A resposta foi negativa, ponderando-se que a distinção se pode imediatamente justificar pela necessidade de preservar a "independência" da profissão de advogado.
"Os funcionários públicos estão, na verdade, adstritos aos deveres de isenção, imparcialidade e dedicação exclusiva ao interesse público; os trabalhadores por conta de outrem, esses encontram-se vinculados por um dever de lealdade para com a respectiva entidade patronal.
"Ora, há-de convir-se que os deveres a que se acham adstritos os funcionários públicos são bastante mais limitativos da independência que se exige da advocacia -uma independência estatutária em relação aos "poderes", mais propriamente do que uma independência subjectiva de cada advogado - do que o dever de lealdade para com a entidade patronal que vincula os trabalhadores por conta de outrem.
"E são-no, em termos de conferir fundamento material bastante à proibição de advogar imposta aos funcionários em geral" (45) .
4. Repensada toda a problemática face ao entendimento firmado pelo Tribunal Constitucional, pondo em confronto a argumentação acolhida no referido acórdão nº 169/90 com a desenvolvida no parecer nº 26/88, continuamos, com o devido respeito, convencidos da validade da tese defendida neste parecer e, consequente-mente, a propender para a inconstitucionalidade da norma da alínea f) do nº 1 do artigo 699 do Estatuto da Ordem dos Advogados, por ofensa do princípio constitucional da igualdade.
V
Conclusão:
Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:
1ª - A incapacidade estabelecida na alínea f) do nº 1 do artigo 69º do Estatuto da Ordem dos Advogados , aprovado pelo Decreto-Lei nº 84/84, de 16 de Março, aplica-se aos advogados estagiários, constituindo obstáculo à sua inscrição na Ordem com vista à realização do estágio (artigo 156º, nºs l, alínea d), e 2, do mesmo Estatuto);
2ª - A citada alínea f), enquanto aplicável aos candidatos à advocacia nas condições referidas na conclusão anterior, não ofende o princípio da liberdade de escolha de profissão, acolhido no artigo 47º, nº 1, da Constituição;
3ª - A distinção que na referida alínea f) se estabelece entre agentes e funcionários municipais, de um lado, e os demais trabalhadores por conta de outrem, de outro, contém uma discriminação de tratamento não justificável perante as finalidades a que, do lado da advocacia, visa, nos termos do artigo 68º, do mesmo Estatuto, o estabelecimento de incompatibilidades - a defesa da dignidade e independência da profissão;
4ª - Consequentemente, a norma constante do artigo 69º, nº 1, alínea f), do Estatuto da Ordem dos Advogados, ofende o princípio da igualdade consagrado no artigo 13º da Constituição da República.
(1) Este Capítulo, onde se contém a orgânica da Ordem, de escasso interesse na economia do presente parecer, subdivide-se em 10 secções: "Disposições gerais" (Secção I, artigos 7º a 23º); "Do congresso dos advogados portugueses" (Secção II, artigos 24º a 29º); "Da assembleia geral da Ordem dos Advogados" (Secção III, artigos 30º a 35º); "Do bastonário" (Secção IV, artigos 36º e 37º); Do conselho superior" (Secção V, artigos 38º a 40º); "Do conselho geral" (Secção VI, artigos 41º a 43º); Das assembleias distritais" (Secção VII, artigos 44º e 45º); "Dos conselhos distritais" (Secção VIII, artigos 46º e 47º); "Dos presidentes dos conselhos distritais" (Secção IX, artigo 48º); "Das delegações" (Secção X, artigos 49º a 52º).
(2) Arrumados em 2 secções: "Disposições gerais" (Secção I, artigos 53º a 64º); "Dos honorários" (Secção II, artigos 65º a 67º).
(3) Com 9 secções, a saber: "Disposições gerais" (Secção I, artigos 90º a 102º); "Das penas" (Secção II, artigos 103º a 107º); "Da instrução do processo" (Secção III, artigos 108º a 114º); "Da acusação e defesa" (Secção IV, artigos 115º a 123º); "Do julgamento" (Secção V, artigos 124º a 126º); "Dos recursos" (Secção VI, artigos 127º a 133º); "Do processo de inquérito" (Secção VII, artigos 134º e 135º); "Da revisão" (Secção VIII, artigos 136º a 142º); "Da execução das decisões" (Secção IX, artigos 143º a 145º).
(4) Esta epígrafe colheu-se da versão do EOA publicada no "Boletim da Ordem dos Advogados", nº 5/89, II Série, Set./Out., Edição Especial, pág. 29. A versão publicada no "Diário da República" não a insere, devido, porventura, a lapso, cuja rectificação não se detectou.
(5) A redacção reproduzida é a resultante do artigo único do Decreto-Lei nº 325/88, de 23 de Setembro, sendo a redacção primitiva a seguinte:
"( ... )
b) Exercer a advocacia em processos penais com excepção dos de querela."
A alteração foi introduzida ao abrigo de autorização concedida mediante a Lei nº 85/88, de 20 de Julho, no propósito de harmonizar o preceito original com o regime do Código de Processo Penal aprovado pelo Decreto-Lei nº 78/87, de 17 de Fevereiro - tal a justificação que se colhe do artigo 1º da lei autorizativa e da própria nótula preambular do Decreto-Lei nº 325/88.
(6) 0 artigo 1º tem o seguinte teor: É concedida autorização ao Governo para proceder à revisão da matéria constante do capítulo V do Estatuto Judiciário "Do mandato judicial".
(7) 0 primeiro "Estatuto Judiciário" fora aprovado pelo Decreto nº 13809, de 22 de Junho de 1927, e o segundo pelo Decreto nº 15344, de 10 de Abril de 1928 - Emídio Pires da Cruz, Estatuto Judiciário, Lisboa, 1944, "Prefácio", pág. VII, nota 1.
(8) Parecer nº 35/45, votado em sessão de 26 de Abril de 1945, inédito.
(9) Instituída, nos termos do artigo 544º, na sede de cada distrito judicial, ou de cada comarca, destinava-se a conferência preparatória, mediante prelecções, práticas e outra sorte de trabalhos, especificamente ao tirocínio dos candidatos à advocacia.
(10) Já há instantes por nossa parte o evidenciámos.
(11) Dispõe, efectivamente, o artigo 53º, nº 1, do Estatuto: "Só os advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados podem, em todo o território nacional e perante qualquer jurisdição, instância, autoridade ou entidade pública ou privada, praticar actos próprios da profissão, e, designadamente, exercer o mandato judicial ou funções de consulta jurídica em regime de profissão liberal remunerada".
(12) No parecer deste Conselho nº 26/88, de 10 de Novembro de 1988, inédito, concluiu-se que a Ordem, "como associação pública não nasce do exercício do direito da livre associação consagrado no artigo 46º da Constituição e, por ser necessário à prossecução das suas finalidades específicas, detém o privilégio da unicidade de representação e de inscrição obrigatória e, consequentemente, não serem "inconstitucionais, por violação do direito (negativo) de associação, as normas do Estatuto da ordem dos Advogados, aprovado pelo Decreto-Lei nº 84/84, de 16 de Março, que impõem a inscrição obrigatória na Ordem para a obtenção da qualidade de advogado e para o exercício da profissão".
A fundamentação destas terceira e quarta conclusões do parecer pode ver-se centrada no seu ponto 7.
(13) Aluda-se, nomeadamente, à exigência da licenciatura em Direito (nºs 1 e 2) e à apresentação de adequada documentação (nº 3).
(14) Assim, o artigo 170º enuncia o princípio de que a "inscrição como advogado depende do estágio com boa informação" (nº 1), a qual depende, por seu turno, "do cumprimento do disposto nos artigos 165º e 166º" (nº 2), preceitos transcritos há momentos.
Os artigos 171º e 172º referem-se, respectivamente, sob estas mesmas epígrafes, à "Dispensa do estágio" e ao "Exercício da advocacia por estrangeiros".
(15) 0 artigo 154º limita-se a pouco mais que definir a sede da inscrição - tanto o conselho geral como o conselho distrital da área do domicílio profissional, havendo, pois, lugar a dois registos de inscrição; ALFREDO GASPAR, Estatuto da Ordem dos Advogados, Jornal do Fundão Editora, sem data, pág. 215 - e a consignar ao advogado estagiário, como domicílio profissional, o do seu patrono. 0 artigo 155º providencia acerca da "cédula profissional que é, por assim dizer, na expressiva imagem daquele Autor, " ibidem, "o bilhete de identidade profissional do Advogado e do advogado estagiário". 0 artigo 157º provê sobre as inscrições "preparatórias" - no conselho distrital respectivo - e "nos quadros da Ordem" (definitiva) - no conselho geral -, e os recursos a que há lugar em caso de recusa. 0 artigo 158º previne, por último, os ilícitos resultantes do "exercício da advocacia por não inscritos".
(16) Neste sentido, ALFREDO GASPAR, op. cit., págs. 216 e s.
(17) Cfr. supra, nota 8.
(18) Tratava-se, no parecer aludido, de saber se podia ser inscrito como candidato à advocacia determinado funcionário, à luz da incompatibilidade definida no artigo 562º, nº 4, do Estatuto Judiciário aprovado pelo Decreto nº 33547, de 23 de Fevereiro de 1944, que assim dispunha:
"Artigo 562º
0 exercício da profissão de advogado é incompatível com as funções de:
4º Funcionários dos serviços centrais de todos os Ministérios;
( ... )
( ... )".
(19) Este Decreto-Lei estabeleceu o regime geral de estruturação das carreiras da função pública, aplicando-se nuclearmente "a todos os serviços da administração central e aos institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos" (artigo 2º, nº 1). Previa-se, justamente, a sua aplicabilidade "à administração local com as adaptações que lhe vierem a ser introduzidas por decreto regulamentar" (artigo 2º, nº 3).
(20) 0 preceito define regras, que não importa detalhar, acerca dos requisitos (categoria, tempo e classificação de serviço, habilitações) a que obedece o recrutamento para as diversas categorias das carreiras técnico-profissionais em diversos níveis.
(21) Cfr. por todos MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, vol. II, 9º edição (reimpressão), revista e actualizada por FREITAS DO AMARAL, Coimbra, 1980, que define "agentes administrativos" como "os indivíduos que por qualquer título exerçam actividade ao serviço das pessoas colectivas de direito público, sob a direcção dos respectivos órgãos" (pág. 641), dando de "funcionário" o seguinte conceito (pág. 672): "agente administrativo provido por nomeação vitalícia voluntariamente aceite ou por contrato indefinidamente renovável, para servir por tempo completo em determinado lugar criado por lei com carácter permanente, segundo o regime legal próprio da função pública".
(22) Constituição da República Portuguesa Anotada, 2ª edição revista e ampliada, 1º volume, Coimbra, 1984, pág. 268.
Os autores referidos escrevem sobre a primeira revisão do texto fundamental. É de registar, no entanto, que a versão do artigo 47º resultante da segunda revisão confere exactamente com a da primeira revisão. Em relação à versão original de 1976, constante de preceitos com outra numeração (artigos 51º, nº 3, e 48º, nº 4), denota-se uma diferença na redacção do nº 2, sem interesse no contexto da consulta. Pode pois, considerar-se "à la page" o comentário relativo ao nº 1 que vamos acompanhar.
(23) Op. cit., págs. 268 e s.
(24) Ibidem.
(25) Op. cit., pág. 269.
A análise lembra de algum modo a síntese do artigo 12º, alínea (I), primeiro período, da Grundgesetz alemã de 23 de Maio de 1949: "Alle Deutschen haben das Recht, Beruf, Arbeitsplastz und Ausbildungsstatte frei zu wahlen" - "Todos os alemães têm o direito de escolher livremente a profissão, o lugar de trabalho e o estabelecimento de formação".
(26) Ibidem.
(27) Ibidem.
(28) OP. cit., pág. 270.
(29) Dispõe com efeito, o artigo 18º da Constituição, que se transcreve integralmente:
"Artigo 18º
(Força jurídica)
1. Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas.
2. A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.
3. As leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo, nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais".
Anote-se que o presente texto é, sem alterações, o da primeira revisão. Na versão originária havia diferenças nos nºs 2 e 3.
(30) Ibidem.
(31) Ibidem.
(32) OP. cit., pág. 271.
(33) JORGE MIRANDA, Manual de Direito Constitucional, IV, Coimbra, 1988, pág. 411.
(34) GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional, 4ª edição, Coimbra, 1986, págs. 335 e s., apud citado parecer nº 26/88, nota 40.
(35) Citámos, do referido parecer nº 26/88, nota 40.
(36) G. CANOTILHO e VITAL MOREIRA, op. cit., págs. 170 e s.
(37) Sublinhe-se que o regime próprio dos direitos, liberdades e garantias supõe, de acordo com o artigo 18º inter alia, a observância de outros requisitos para que as restrições se tornem constitucionalmente legítimas. Assim, a limitação não deve diminuir a extensão e o alcance do "conteúdo essencial" dos preceitos constitucionais (artigo 18º, nº 3); a lei restritiva, em princípio uma lei da Assembleia da República (artigo 168º, nº 1, alínea b)), deve revestir carácter geral e abstracto e não pode ter efeito retroactivo.
(38) Registem-se, neste sentido, passagens assaz significativas da programática definida pela Lei nº 1/84, de 15 de Fevereiro, ao legislador do EOA: "reestruturar o exercício da advocacia, de modo à completa satisfação das disposições constitucionais, nomeadamente para a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos" (artigo 2º, alínea a)); "implantar regras de deontologia profissional que assegurem a função social do advogado como pleno servidor da justiça e do direito ( ... )" (alínea c)); "reforçar os mecanismos de participação da Ordem nas formas de elaboração do direito e, bem assim, da intervenção institucional da mesma na administração da justiça" (alínea f)).
(40) De 5 de Janeiro de 1978, "Pareceres da Comissão Constitucional 4º volume, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1979, pág. 185.
Objecto do parecer eram normas do Estatuto da Ordem dos Médicos aprovado pelo Decreto-Lei nº 282/77, de 3 de Julho, suscitando polémica em diversos aspectos participe de um fundo comum ao EOA que nos ocupa. 0 excerto há-de, pois, ser lido com as indispensáveis transposições, inclusive de plano problemático, recordando-se ainda a ideia, há momentos evidenciada (supra, 111, 4.), de que o sub-ingresso na posição estatutária de advogado estagiário depende de inscrição (obrigatória) na Ordem dos Advogados, tendo como um dos seus impedimentos, justamente, a incompatibilidade em análise.
(41) Cfr., G. CANOTILHO e VITAL MOREIRA, op. cit., pág. 320, e, v.q., o parecer da Comissão Constitucional nº 28/81, de 6 de Outubro de 1981, "Pareceres" citado, 17º volume, Lisboa, 1983, pág. 36.
(42) A data da emissão deste parecer, o Tribunal Constitucional já se havia pronunciado sobre o regime das incompatibilidades com o exercício da advocacia, ao declarar, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma constante da alínea i), do artigo 69º do Estatuto da Ordem, na parte em que considera incompatível com o exercício da advocacia a função docente de disciplinas que não sejam de direito (acórdão nº 143/85, publicado no Diário da República, I Série, nº 202, de 3 de Setembro de 1985).
(x1) Cfr. o modo de abordagem do citado Acórdão do Tribunal Constitucional nº 143/85 que neste ponto se acompanha.
(x2) Cfr. Acórdão citado.
(x3) Artigo 269º, nº 5 da Constituição.
(x4) Continua a seguir-se, de perto, o Acórdão do tribunal Constitucional, nº 143/85.
(x5)
Cfr. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, constituição Anotada, cit., vol. I, pág. 271, admitem como "restrições claramente admissíveis, as que visam limitar o exercício simultâneo de várias profissões. "A lei - escrevem - pode estabelecer incompatibilidades que obstem a que uma profissão seja exercida cumulativamente com outra".
Como indicações de direito comparado, neste específico sector sobre incompatibilidades, podem referir-se o artigo 62º da lei francesa de 31 de Dezembro de 1971, que estabelece a incompatibilidade da advocacia com funções públicas, salvo regulamentação especial, e o artigo 27º, nº 4, do Real Decreto 2090/1982, de 24 de Julho, (Estatuto General de la Abogacia Española) que fixa a incompatibilidade de advocacia com o exercício de funções públicas, cujas leis reguladoras expressamente o determinem.
Cfr. EMMANUEL BLANC, La nouvelle profession d'avocat, Librerie du Journal des Notaires et des Avocata, págs. 202-203 e L. PRIET0-CASTRO, Derecho de Tribunales, 1986, pág. 533 e Nota (cont.)
Nota (cont.)
JACQUES HAMELIN e ANDRÉ DAMIEN, Les Règles de la Profession d'Avocat, 5 ème édition, Dalloz, 1987, págs. 163-175.
(x6)
Cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional referido.
x7) Cfr. a argumentação desenvolvida no referido acórdão nº 143/85 do Tribunal Constitucional decidindo pela inexistência de substanciais razões justificativas de tratamento diferenciado entre função docente em escolas públicas e escolas privadas, cujas razões são extensíveis, em geral, à contraposição função pública-trabalhador por conta de outrem.
É de sublinhar nesta perspectiva o voto de vencido do Conselheiro Monteiro Dinis e algumas passagens, obiter dicta, do voto do Conselheiro Raúl Mateus.
x8) Esta vertente era assumida por remissão na regulamentação das incompatibilidades no sistema do Estatuto Judiciário. Dispunha, com efeito, o artigo 543º, nº 1, alínea e), que não podiam ser inscritos como advogados os que exercessem funções legalmente incompatíveis com a advocacia.
(43) Cfr. nota 42.
(44) Publicado no Diário da República, II Série, nº 210, de 11/9/90.
(45) Do acórdão nº 169/90, ponto 13.
Anotações
Legislação: 
EOA84 ART69 N1 F I N2 ART162 ART163 ART164 ART165 ART166 ART167 ART168 ART156.
CONST76 ART47 N1 ART18 N2 N3 ART58 N3 B ART13.
EJ44 ART528 ART544.
DL 247/87 DE 1987/06/16 ART1 N1 ART6 N2 ART8 ART42 ART44.
Jurisprudência: 
AC TC 143/85 DE 1985/07/30.
AC TC 169/90 DE 1990/05/30.
Referências Complementares: 
DIR ADM * FUNÇÃO PUBL / DIR CONST * DIR FUND / DIR JUDIC.
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