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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
21/1997, de 08.05.1997
Data do Parecer: 
08-05-1997
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Não Aplicável
Iniciativa: 
PGR
Entidade: 
Procurador(a)-Geral da República
Relator: 
ESTEVES REMÉDIO
Descritores e Conclusões
Descritores: 
AVAL DO ESTADO
VIOLAÇÃO DE LEI
UGT
GARANTIA
INSTITUTO PÚBLICO
CONTRATO
EMPRESA
DIREITO PRIVADO
SINDICATO
ACTO DESTACÁVEL
ASSOCIAÇÃO SINDICAL
NULIDADE
CONFEDERAÇÃO GERAL
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
LIBERDADE SINDICAL
RESPONSABILIDADE PRÉ-CONTRATUAL
INDEPENDÊNCIA
AUTONOMIA
ACTIVIDADE COMERCIAL
FINANCIAMENTO
EMPRÉSTIMO BANCÁRIO
EMPREENDIMENTO
PROJECTO
Conclusões: 
1- O regime legal do aval do Estado consta, basicamente da Lei n 1/73, de 2 de Janeiro, diploma que não contempla a concessão dessa garantia a assoiações sindicais;
2- O Despacho n 122/97-XIII, de 7 de Março de 1997, do Ministro das Finanças, publicado no Diário da República, II Série, n 77, de 2 de Abril de 1997, que concedeu "o aval de Estado, ao contrato de empréstimo a celebrar pela União Geral dos Trabalhadores - UGT, com a Caixa Geral de Depósitos, S. A., até ao montante máximo de 600 000 contos", com fundamento na Lei n 1/73, de 2 de Janeiro, que não lhé é aplicável, padece do vício de violação de lei;
3- O mesmo despacho enferma ainda no vício material de violação de lei, por violação do princípio da independência das associações sindicais, consagrado pelas disposições conjugadas dos artigos 55, n 4, da Constituição, e 6, n 2, do Decreto-Lei n 215-B/75, de 30 de Abril (Lei Sindical);
4- A iligalidade do Despacho n 122/97-XII, se e quando este despacho vier a ser contenciosamente anulado, acarreta a nulidade da garantia;
5- A ilegalidade do Despacho n 122/97-XIII e a nulidade da garantia são susceptíveis de originar situações de responsabilidade civil e de, verificados os respectivos pressupostos, constituir o Estado na obrigação de indemnizar.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Conselheiro Procurador-Geral da República,
Excelência:

I

Na sequência de informação elaborada por uma Assessora do Gabinete sobre a «recente concessão de aval do Estado a empréstimo bancário à UGT: (1), Vossa Excelência, por estarem em causa questões «complexas e controvertidas na doutrina:, entendeu ouvir o Conselho Consultivo sobre:
«a) a legalidade do aval; b) na hipótese de ilegalidade, os reflexos que o vício do acto produz na garantia do contrato; c) ainda na hipótese de ilegalidade, o problema da eventual responsabilidade do Estado.:
Com as limitações de indagação e análise decorrentes do carácter urgente da consulta, cumpre emitir parecer.
II
A concessão do aval consta do Despacho nº 122/97-
XIII, de 7 de Março de 1997, do Ministro das Finanças, do seguinte teor:
«1 - Considerando que:
1.1 - A União Geral dos Trabalhadores - UGT
é uma confederação sindical que tem por fim, entre outros, a defesa das liberdades individuais e colectivas e os interesses e direitos dos trabalhadores, na perspectiva da consolidação da democracia política pluralista e da consecução da democracia social e económica; a defesa e concretização da livre negociação colectiva como processo contínuo de participação na justa distribuição da riqueza e de intervenção na organização das relações sociais, segundo os princípios da boa fé negocial e do respeito mútuo; a luta pelo direito ao trabalho e pela livre escolha do emprego e pela segurança; a defesa e a promoção da reconversão e reciclagem profissional de modo a obstar ao desemprego tecnológico, bem como a eliminar o subdesemprego e a formação cultural-profissional e político- sindical dos representados pelos sindicatos seus filiados cf. art. 9º, als. b), g), h), m) e r), dos respectivos estatutos;
1.2 - Tais fins, em particular o que releva da defesa e da promoção da reconversão e reciclagem profissional de modo a obstar ao desemprego tecnológico, bem como eliminar o subdesemprego, se revestem de manifesto interesse para a economia nacional, interesse este constitucionalmente reconhecido art. 58º, nº 3, al. c), da Constituição;
1.3 - As acções de formação profissional promovidas pela UGT, a partir de 1986 e que se desenvolveram até ao final de 1996 e abrangeram milhares de formandos, se revestem de interesse para o País, na medida em que permitiram aumentar a qualificação profissional dos trabalhadores e propiciaram novas oportunidades de emprego para milhares de formandos, contribuindo desta forma para a redução do desemprego, tarefa constitucionalmente deferida ao Estado art. 58º, nº 3, al. a), da Constituição;
1.4 - As finalidades subjacentes ao empréstimo que a UGT pretende contrair junto da
Caixa Geral de Depósitos, S. A., relevam do conceito de 'manifesto interesse para a economia nacional' contido na base II, nº 1, da Lei 1/73, de 2-1, contribuindo igualmente para a salvaguarda de interesses constitucionalmente protegidos, cuja prossecução é deferida ao Estado;
1.5 - Atendendo às características do empréstimo, mormente nos planos da taxa de juro, reembolso do capital e pagamento de juros, as mesmas só poderão ser obtidas pela UGT caso o empréstimo beneficie de garantia do Estado, uma vez que só nessa eventualidade poderá a UGT obter da entidade financiadora as condições excepcionais de financiamento antes descritas, dado que o risco do crédito, com garantia do Estado, será nulo;
1.6 - Nessa conformidade, o financiamento não poderá realizar-se satisfatoriamente sem a garantia do Estado;
1.7 - As características económicas, estrutura financeira e orgânica administrativa da
UGT oferecem ao Estado garantias suficientes quanto à sua capacidade para fazer face às responsabilidades financeiras que pretende assumir, tendo em conta o plano financeiro inerente ao empréstimo negociado com a Caixa
Geral de Depósitos, nomeadamente o prazo global de amortização (12 anos) e o período de deferimento (2 anos), bem como a taxa de juro e o modo de reembolso do capital e pagamento de juros;
1.8 - A concessão da garantia do Estado no presente caso não afecta o comércio entre os Estados membros para efeitos do disposto no art.
92º do Tratado Que Institui a Comunidade Europeia, não havendo, por isso, que proceder à sua notificação à Comissão das Comunidades Europeias.
Assim:
2 - Ao abrigo das disposições conjugadas das bases I e II da Lei 1/73, de 2-1, e do nº 1 do art. 66º da Lei 52-C/96, de 27-12, concedo o aval do Estado ao contrato de empréstimo a celebrar pela União Geral dos Trabalhadores - UGT, com a
Caixa Geral de Depósitos, S. A., até ao montante máximo de 600 000 contos, cujas condições constam da ficha técnica anexa ao presente despacho e que dele faz parte integrante.: (2)
Da ficha técnica constam, entre outros dados, a finalidade do empréstimo - «consolidação de passivos bancários e liquidação de dívidas a formandos e a fornecedores resultantes da promoção de acções de formação profissional: -, o período de amortização - dez anos -, e a taxa de juro - «Lisbor a seis meses, reportada ao segundo dia útil anterior ao início de cada período de contagem de juros:.
III
1. O regime geral de concessão do aval do Estado a operações de crédito interno ou externo continua a ser regulado pela Lei nº 1/73, de 2 de Janeiro (3) (4); deve, todavia, realçar-se a circunstância de a Constituição ter passado a dispor, agora na alínea i) do artigo 164º, que compete à Assembleia da República «estabelecer o limite máximo dos avales a conceder em cada ano pelo Governo: (5). Para além do cumprimento desta imposição constitucional, tem-se, com alguma frequência, feito constar de leis do orçamento, normas relativas à própria prestação de avales (6).
A prestação do aval pelo Estado é, como resulta desde logo dos termos restritivos da sua regulamentação legal, uma operação de excepção, prevista em limitados casos, tratada inicialmente numa perspectiva de «política de fomento:, depois na óptica da «intervenção indirecta do Estado na economia: e agora dogmaticamente enquadrada no âmbito dos auxílios do Estado aos agentes económicos (7).
Da Lei nº 1/73 interessa-nos destacar as seguintes disposições:
«Capítulo I
Da concessão de avales do Estado por acto administrativo
Base I
É autorizado o Ministro das Finanças a prestar, por uma ou mais vezes, o aval do Estado a operações de crédito interno ou externo a realizar pelas províncias ultramarinas, por institutos públicos ou por empresas nacionais.
Base II
1. O aval será prestado apenas quando se trate de financiar empreendimentos ou projectos de manifesto interesse para a economia nacional, ou em que o Estado tenha participação que justifique a prestação dessa garantia e, em qualquer caso, se verifique não poder o financiamento realizar-se satisfatoriamente sem o referido aval.
2. Se a operação de crédito for proposta por empresa privada, o aval somente poderá ser concedido após verificação de que a empresa oferece a segurança suficiente para fazer face às responsabilidades que pretende assumir, designadamente pelas suas características económicas, estrutura financeira e orgânica administrativa.
3. A responsabilidade em capital decorrente para o Estado dos avales prestados ao abrigo da autorização concedida pela base anterior não excederá a quantia que for fixada pelo Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos sobre proposta do Ministério das Finanças.
4. As responsabilidades actuais do Estado, em capital, decorrentes da concessão de avales a operações de crédito externo, serão contadas para efeito do limite fixado no número precedente desta base.(*)
Base III
Precedendo acordo do Ministro das Finanças, parte dos empréstimos a que tiver sido dada a garantia do Estado pode, de harmonia com as regras deste diploma, ser utilizada para financiamento de operações de fomento a realizar por outras entidades públicas ou privadas.:
«Capítulo II
Do processo de concessão de avales do Estado
Base VII
1. O aval será prestado, em cada caso, mediante prévio despacho de autorização do Ministro das Finanças, pelo director-geral da Fazenda Pública (**), ou seu legal substituto, o qual poderá, para o efeito, outorgar nos respectivos contratos, emitir declarações de aval autenticadas com o selo branco da mesma Direcção- Geral, ou assinar títulos representativos das operações de crédito avalizadas.
2. A prestação do aval será precedida de consulta aos órgãos competentes do planeamento económico.
3. A inobservância do disposto no nº 1 desta base implicará a nulidade do aval.
Base VIII
1. Em anexo ao despacho referido no nº 1 da base anterior figurará o plano de amortização do capital mutuado e de pagamento dos juros respectivos.
2. A modificação do plano a que se refere o número anterior, sem prévia autorização do Ministro das Finanças, implicará a imediata cessação do aval, não podendo o beneficiário do mesmo invocar qualquer responsabilidade do Estado após o início da execução das modificações introduzidas.:
«Capítulo IV
Das garantias do Estado pelo facto de prestar avales
Base X
A concessão do aval do Estado confere ao Governo o direito de fiscalizar a actividade da entidade beneficiária da garantia, tanto do ponto de vista técnico e económico como do ponto de vista administrativo e financeiro.:
2. Como resulta das disposições legais transcritas e é acentuado pela doutrina (8), o aval do Estado apenas pode ser prestado quando se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos ou pressupostos:
1º Tratar-se de operação de crédito (interno ou externo) a realizar por institutos públicos ou empresas nacionais (9);
2º Destinarem-se tais operações a financiar empreendimentos ou projectos de manifesto interesse para a economia nacional ou em que o Estado tenha participação que justifique a prestação de garantia;
3º Não poder a operação financeira realizar-se satisfatoriamente sem o aval;
4º Necessidade, quando a operação de crédito for proposta por empresa privada, de esta oferecer segurança suficiente para fazer face
às responsabilidades que pretende assumir.
O Despacho nº 122/97-XIII faz expressa menção ao preenchimento do requisito terceiro, alude indirectamente ao requisito segundo, contém referências ao que pode ser entendido como o desenvolvimento do requisito quarto e não faz qualquer referência ao primeiro, isto é, ao enquadramento da UGT no universo subjectivo das entidades referidas na base I, os institutos públicos e as empresas nacionais (10).
Analisemos separadamente tais requisitos.
2.1. Na definição de FREITAS DO AMARAL o instituto público é uma pessoa colectiva pública, de tipo institucional, criada para assegurar o desempenho de determinadas funções administrativas de carácter não empresarial, pertencentes ao Estado ou a outra pessoa colectiva pública (11).
A actuação dos institutos públicos não se restringe ao campo económico, mas já no período anterior a 1974 actuavam na administração económica portuguesa numerosos institutos públicos, então chamados, genericamente, organismos de coordenação económica (12).
A generalização da figura do instituto público é atribuída ao favor, motivado por razões de eficiência, de que goza a fórmula da devolução de poderes, traduzida na entrega a pessoas colectivas de actividades que, em princípio, deveriam considerar-se do Estado (13).
Quer do ponto de vista objectivo ou material, quer do ponto de vista subjectivo ou orgânico, os institutos públicos integram-se na administração estadual indirecta e têm como características essenciais o serem pessoas colectivas de substrato essencialmente institucional, disporem de autonomia administrativa e financeira, serem criados, modificados e extintos por via legislativa, possuírem órgãos próprios, estarem sujeitos à superintendência e tutela administrativa e ser de natureza administrativa o seu regime jurídico básico (14)
(15).
Vejamos agora o conceito de empresa.
A Proposta de Lei nº 20/X (16), que está na génese da Lei nº 1/73, admitia, na base I, a prestação do aval do Estado a operações de crédito «a realizar pelas províncias ultramarinas, por institutos públicos e por sociedades anónimas nacionais:. No parecer nº 40/X da Câmara Corporativa, que incidiu sobre aquela proposta de lei, entendeu-se que seria preferível a expressão empresas privadas nacionais, em lugar de sociedades anónimas nacionais, com fundamento em que «poderão verificar-se casos em que se justifique a concessão de avales pelo Estado a sociedades não anónimas: (17). Este entendimento, subscrito também pela Comissão de Finanças e de Economia da Assembleia Nacional (18), acabou por obter consagração legal (19).
No seu articulado a Lei nº 1/73 acentua, quanto às empresas, aspectos organizacionais que hão-de contribuir para a delimitação do respectivo conceito: refere-se, por exemplo, a segurança suficiente para fazer face às responsabilidades que pretende assumir, as suas características económicas, estrutura financeira e orgânica administrativa (base II, nº 2), bem como a possibilidade, quanto às sociedades anónimas, de transformação em acções do crédito do Estado resultante do pagamento de qualquer prestação (base XII, nº 1).
No domínio da ciência económica, a empresa é considerada como a unidade produtiva básica, definida como uma organização de factores produtivos destinada a produzir, vender ou propiciar a circulação de bens ou serviços; está-lhe normalmente associada a finalidade de maximização do lucro, moldada num comportamento socialmente aceite no mercado ou, ao menos, a superação dos custos pelas receitas (20).
A par da empresa como entidade económica ou como organização social, isto é, a par da empresa como «forma típica de organização produtiva: (21), deparamos com diversos conceitos jurídicos de empresa (22), alguns fixados por via legislativa (23).
Para os efeitos da Lei nº 1/73, o conceito de empresa - como resulta do articulado da lei e dos elementos interpretativos disponíveis, mais explicitamente, dos elementos teleológico, sistemático e histórico - pressupõe a conjugação de dois aspectos fundamentais: por um lado, a existência de uma organização integrada na actividade produtiva ou, na terminologia da lei, na «economia nacional:, e, por outro, uma certa forma de expressão ou enquadramento jurídicos dessa organização; numa aproximação que poderá aqui ser utilizada, as empresas são «as formas de organização com características substancial e formal (jurídica) de índole capitalista, normalmente contempladas, como objecto principal ou exclusivo, pelo Direito Comercial: (24).
Não reveste estas características nem é abrangido pelo conceito de empresa contemplado na Lei nº 1/73 o desenvolvimento pontual de uma actividade eventualmente qualificável como comercial ou económica levada a cabo por entidades que não têm, nem podem ter, como objecto social o exercício de actividades comerciais (25).
Apesar de no seu articulado se referir a empresas nacionais (base I), empresa privada (base II, nº 2) e sociedades anónimas (base XII, nº 1), a Lei nº 1/73 não distingue, para a concessão do aval, entre os diversos tipos de empresas, designadamente, entre empresas públicas e privadas, tal como não distingue entre as diversas modalidades de institutos públicos (a referência, contida na base III, a entidades públicas ou privadas não pode, por razões de ordem sistemática e de coerência legislativa, deixar de ser harmonizada com a enumeração constante da base I; além disso, a base III refere-se à utilização derivada de parte dos empréstimos avalizados, não à concessão originária de avales). A lei restringe é a concessão de avales a operações de crédito em que intervenham empresas ou institutos públicos, e exige que umas e outros sejam nacionais.
Será possível enquadrar a UGT em alguma destas categorias?
De acordo com os respectivos Estatutos (26), a
União Geral de Trabalhadores é uma confederação sindical de âmbito nacional (artigo 1º), «autónoma e independente do patronato, do Estado, das confissões religiosas e dos partidos ou de outras associações de natureza política:
(artigo 4º), que se assume como «coordenadora de todas as organizações sindicais nela filiadas que defendem, lutam, e se reclamam do sindicalismo democrático, assegurando e respeitando a completa autonomia das mesmas, em conformidade com os presentes estatutos:
(artigo 6º).
A UGT prossegue, como fim geral, «a edificação de uma sociedade mais justa, livre e igualitária, da qual sejam banidas todas as formas de opressão e alienação:, e tem como fins específicos os referidos nas várias alíneas do artigo 9º, genericamente dirigidos à defesa e
à promoção de interesses sócio-profissionais dos seus membros.
De acordo com a chamada Lei Sindical (27), por confederação geral entende-se a «associação nacional dos sindicatos:, sendo o sindicato definido como a «associação permanente de trabalhadores para defesa e promoção dos seus interesses sócio-profissionais: artigo
2º, alíneas f) e b).
A UGT é uma confederação geral, isto é, uma associação nacional de sindicatos.
O sindicato, a união, a federação e a confederação geral, são pela Lei Sindical considerados associações sindicais ou organizações sindicais artigo 2º, alínea c), às quais compete defender e promover a defesa dos direitos e interesses sócio-profissionais dos trabalhadores que representam e, designadamente, celebrar convenções colectivas de trabalho e prestar serviços de carácter económico e social dos seus associados (artigo 4º) (28).
As associações sindicais são, face ao respectivo regime jurídico, pessoas colectivas de direito privado e utilidade pública (o escopo que visam interessa aos seus associados, mas também à colectividade), assentam em agrupamentos de pessoas, tendo a natureza de associações, e prosseguem um fim económico não lucrativo, na medida em que pretendem conseguir vantagens patrimoniais ou materiais para os seus associados (29); o escopo das associações sindicais não pode consistir no exercício de uma actividade comercial (30).
Desta breve caracterização dos institutos públicos, das empresas e das associações sindicais resulta claramente que a UGT - não obstante o seu carácter e âmbito nacionais -, é uma associação nacional de sindicatos, não um instituto público nem uma empresa
(31).
É altura de retomar e desenvolver uma ideia já atrás aflorada - a de que a prestação de avales pelo Estado é uma operação de excepção com aplicação restrita aos casos expressamente previstos na lei.
Aliás, uma das ideias-chave subjacentes às tentativas de alteração do regime jurídico dos avales residia precisamente na rigorosa salvaguarda da tipologia dos casos de aval a fim de se introduzir maior rigor e disciplina na matéria, evitar o desregramento financeiro e travar o endividamento crescente do Estado.
E na redefinição do elenco das entidades beneficiárias da garantia nunca, em qualquer dos projectos e propostas de lei apresentados, se propôs o seu alargamento a associações sindicais - a formulação mais generalizada e abrangente referia-se a pessoas colectivas de direito público, empresas nacionais e empresas em que a maioria do respectivo capital seja detida por pessoas singulares ou colectivas nacionais, mesmo que a sua sede se localize ou a sua principal actividade se exerça em território estrangeiro (32).
De acordo com o disposto no artigo 9º do Código Civil, a interpretação visa a reconstituição do pensamento legislativo e, se não deve cingir-se à letra da lei, também não pode conduzir à consagração de um resultado «que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso:.
A enumeração das pessoas jurídicas beneficiárias de avales do Estado é uma enumeração taxativa, resultando tal taxatividade quer da base I da Lei nº
1/73, quer de diplomas legislativos posteriores, designadamente de leis do orçamento (33).
No que concretamente interessa destacar, a letra da lei, o seu enunciado linguístico funciona aqui, não apenas como ponto de partida, mas também como limite da interpretação: obsta a que na enumeração da base I da
Lei nº 1/73 possam ser incluídas entidades - associações ou organizações sindicais, rectius, uma confederação geral - que nela não têm um mínimo de correspondência ou ressonância verbal (34).
2.2. Do segundo requisito - destinarem-se as operações de crédito a financiar empreendimentos ou projectos de manifesto interesse para a economia nacional ou em que o Estado tenha participação que justifique a prestação de garantia - resulta a exigência de que hão-de estar em causa empreendimentos ou projectos de notório e evidente interesse para a economia nacional, considerada esta na sua globalidade, ou em que o Estado tenha participação que justifique o aval.
A lei abrange quer os projectos ou empreendimentos que vão ser desenvolvidos quer os que, tendo-o sido, se encontram numa situação de risco ou de ruptura que importe superar e que é superável mediante a operação de crédito avalizada. Há nesta parte uma inquestionável margem de discricionaridade, inerente ao desenvolvimento da actividade administrativa.
Todavia, cabe acentuar que entre a base I e a primeira parte do nº 1 da base II da Lei nº 1/73 existe uma relação de cumulação. Os requisitos do aval, no que agora interessa realçar, o 1º e 2º desses requisitos são, como já referimos, de verificação cumulativa. Quer dizer, a operação de crédito a avalizar pelo Estado tem que ser realizada por instituto público ou empresa nacionais e tem que se destinar a financiar empreendimentos ou projectos de manifesto interesse para a economia nacional ou em que o Estado tenha participação que justifique a prestação da garantia.
Não se questiona, no caso concreto, que as finalidades subjacentes ao empréstimo «relevam do conceito de 'manifesto interesse para a economia nacional' contido na base II, nº 1, da Lei 1/73, de 2-1, contribuindo igualmente para a salvaguarda de interesses constitucionalmente protegidos, cuja prossecução é deferida ao Estado:.
Porém, a verificação deste 2º requisito não supre a falta de preenchimento do 1º; e a circunstância de a
UGT não fazer parte do elenco das entidades referidas na base I da Lei nº 1/73 continua a impedi-la de beneficiar do aval do Estado.
2.3. Aqui chegados, são de todo irrelevantes, quer a afirmação de que a operação financeira se não podia realizar satisfatoriamente sem o aval do Estado, quer a preocupação de afirmar quanto à UGT, que não é uma empresa, a verificação de um requisito (o quarto) que pressupõe que a operação de crédito seja proposta por empresa privada.
2.4. Em suma, o Despacho nº 122/97-XIII, de 7 de
Março de 1997, do Ministro das Finanças, publicado no Diário da República, II Série, nº 77, de 2 de Abril de
1997, ao conceder o aval do Estado a um financiamento de
600 000 contos, pela Caixa Geral de Depósitos à UGT, com fundamento na Lei nº 1/73, de 2 de Janeiro, que não lhe
é aplicável, enferma do vício de violação de lei.
3. Por uma outra via chegamos a idêntica conclusão.
3.1. Com a epígrafe «Liberdade sindical:, o artigo
55º da Constituição estabelece:
«1. É reconhecida aos trabalhadores a liberdade sindical, condição e garantia da construção da sua unidade para defesa dos seus direitos e interesses.
2. No exercício da liberdade sindical é garantido aos trabalhadores, sem qualquer discriminação, designadamente: a) A liberdade de constituição de associações sindicais a todos os níveis; b) A liberdade de inscrição, não podendo nenhum trabalhador ser obrigado a pagar quotizações para sindicato em que não esteja inscrito; c) A liberdade de organização e regulamentação interna das associações sindicais; d) O direito de exercício de actividade sindical na empresa; e) O direito de tendência, nas formas que os respectivos estatutos determinarem.
3. As associações sindicais devem reger-se pelos princípios da organização e da gestão democráticas, baseados na eleição periódica e por escrutínio secreto dos órgãos dirigentes, sem sujeição a qualquer autorização ou homologação, e assentes na participação activa dos trabalhadores em todos os aspectos da actividade sindical.
4. As associações sindicais são independentes do patronato, do Estado, das confissões religiosas, dos partidos e outras associações políticas, devendo a lei estabelecer as garantias adequadas dessa independência, fundamento da unidade das classes trabalhadoras.
(.).:
A liberdade sindical, nas suas vertentes positiva (direito de criar e aderir a sindicatos) e negativa (direito de não ser coagido a inscrever-se ou a permanecer em sindicatos) é comummente considerada abrangida na liberdade de associação (artigo 46º da Constituição), de que constitui uma concretização (35).
Por razões históricas e de segurança jurídica, é frequentemente objecto de tratamento autónomo quer em textos de direito interno (como acontece entre nós) quer em textos internacionais (36).
O princípio da independência das associações sindicais relativamente ao Estado constitui um valor constitucionalmente consagrado, cujo fundamento material reside na protecção da própria liberdade sindical (37).
A independência e autonomia necessárias à contestação e à defesa dos interesses dos trabalhadores implicam um certo distanciamento em relação ao Estado
(38), que é susceptível de, em concreto, assumir e ser garantido por formas diversas.
Atentemos na conformação, entre nós, do princípio da independência das associações sindicais e nas garantias que a lei ordinária estabelece para o assegurar.
Ao nível da lei ordinária, o exercício da liberdade sindical é regulado pelo Decreto-Lei nº 215-
B/75, de 30 de Abril (Lei Sindical).
A Lei Sindical estabelece:
«Artigo 6º
1. É proibido às entidades e organizações patronais ou a quaisquer organizações não sindicais promover a constituição, manter ou subsidiar, por quaisquer meios, associações sindicais ou, de qualquer modo, intervir na sua organização e direcção.
2. As associações sindicais são independentes do Estado, dos partidos políticos e das instituições religiosas, sendo proibida qualquer ingerência destes na sua organização e direcção, bem como o seu recíproco financiamento.
3. É incompatível o exercício de cargos em corpos gerentes de associações sindicais com o exercício de quaisquer cargos de direcção em partidos políticos ou instituições religiosas.:
No desenvolvimento do princípio da independência e autonomia das associações sindicais, a lei proíbe o Estado de qualquer ingerência na organização e direcção das associações sindicais, bem como o respectivo financiamento.
Se não é possível conceber a existência de liberdade sindical sem a independência e autonomia sindicais, já nos parece também que não faz parte da natureza das coisas que o princípio da independência implique necessariamente a proibição de financiamento das associações sindicais, isto é, esta proibição não faz parte do núcleo essencial de tal princípio. A opção do legislador pela sua consagração cai no âmbito da discricionaridade legislativa inerente ao princípio democrático.
Por outras palavras, a liberdade e a independência sindicais não são incompatíveis com o financiamento pelo Estado das associações sindicais. Mas, para tal, é preciso que se deixe de proibir tal financiamento e se estabeleçam, por forma clara, transparente e equitativa, os critérios a que deve obedecer.
3.1.1. O princípio da independência e autonomia proíbe, desde logo, qualquer ingerência do Estado na organização e direcção das associações sindicais.
Todavia, de acordo com o disposto na base X da Lei nº 1/73, a concessão do aval do Estado confere ao Governo o direito de fiscalizar a actividade da entidade beneficiária da garantia, tanto do ponto de vista técnico e económico como do ponto de vista administrativo e financeiro.
O exercício deste direito de fiscalização relativamente às associações sindicais não se afigura compatível com o princípio da independência e da autonomia de que as mesmas gozam.
3.1.2. Numa outra dimensão, o princípio da independência e autonomia proíbe o financiamento das associações sindicais pelo Estado.
Na linguagem comum financiar significa abonar dinheiro para algum empreendimento e financiamento é o acto de facultar capitais a uma empresa para ajudar o seu desenvolvimento (39).
No âmbito do direito económico (40), os auxílios ou ajudas do Estado consistem basicamente em prestações da Administração Pública a favor de actividades de interesse geral desempenhadas por agentes económicos que lhe são estranhos.
Em função do seu conteúdo, os auxílios do Estado assumem diferentes formas, por exemplo, ajudas financeiras, benefícios fiscais, assistência técnica e mesmo participações em capital.
Por seu turno, as subvenções ou ajudas financeiras assumem também formas variadas mas podem ser agrupadas em três grandes tipos: entregas directas aos beneficiários, renúncia de créditos e utilização dos mecanismos de crédito, assim explicitados:
«As entregas directas incluem os subsídios de exploração, a fundo perdido ou reembolsáveis, subsídios de equipamento, subsídios para garantir o rendimento. As renúncias a créditos dizem respeito às 'situações em que o Estado aceita a não remuneração de capitais públicos aplicados em empresas ou renuncia a receber participações em lucros que lhe eram devidas ou, ainda, permite o não cumprimento de obrigações legais por parte dos subvencionados'. Nos mecanismos de crédito incluem-se a concessão directa de empréstimos, a simples bonificação e a garantia. Esta é comummente concedida através do aval do Estado o qual consiste num 'acto unilateral pelo qual o Estado garante o cumprimento de dívidas de outras entidades assumindo em caso de incumprimento as respectivas responsabilidades perante os credores' x.: (41)
CARLOS FERREIRA ALMEIDA (42), entre os actos de intervenção indirecta do Estado na economia, refere os actos de incitação ou de fomento económico que, entre outras, podem assumir a modalidade de «concessão de crédito, tanto sob a forma de empréstimos directos das instituições de crédito do sector público, como através de avales do Estado a operações realizáveis junto de entidades creditícias do sector privado ou mesmo do sector público:.
JORGE SILVA SOUSA (43) afirma que os avales do Estado «são um meio relevante de intervenção indirecta na vida económica e social, sendo utilizados para finalidades semelhantes às referidas para a concessão de crédito: - por exemplo, «para financiar investimentos na
área económica e social, ajudando as entidades privadas a quem são concedidos a realizá-los (designadamente quando se trata de áreas críticas a que o financiamento privado não responde e quando se trata de ajudar os mutuários a superar crises conjunturais - v. g. ajuda a empresas em situação económica difícil):.
Especificamente sobre o aval do Estado afirma EDUARDO PAZ FERREIRA (44):
«Entre as várias formas de apoio financeiro que o Estado concede, figura em posição de destaque a que se refere à prestação de garantias a empréstimos a obter por agentes económicos.
Tal garantia traduz-se na prestação do chamado aval do Estado (.).
Tal forma de garantia de créditos deveria em rigor ser incluída entre as formas de apoio directo do Estado, podendo dizer-se que é uma forma normal de subvenção. Levanta, no entanto, problemas específicos que levam a considerá-la autonomamente, como aconselha, de resto, toda uma ampla tradição de autonomia de tratamento.
O quanto fica dito não implica que se não tenha presente que esta é e tem sido uma importantíssima fonte de encargos para o Estado, bastando recordar que em 30 de Julho de 1987 a dívida garantida atingia um montante de 396,3 milhões de contos. (x1)
Trata-se, por outro lado, de uma matéria em que a inovação legislativa é necessária, dado que o essencial da legislação reguladora ainda é anterior à Constituição de 1976. (x2) :
Quer o aval do Estado seja classificado como uma forma de apoio directo, cuja especificidade aconselha o seu tratamento autónomo, quer como um mecanismo de crédito integrado nos auxílios do Estado, quer como acto de incitação ou de fomento, a sua concessão por parte do Estado deve ser considerada como uma forma de financiamento às entidades em benefício de quem é concedido.
3.2. Logo, ainda que se entendesse que a UGT faz parte do universo subjectivo das entidades cujas operações de crédito podem beneficiar do aval do Estado, a concessão deste - porque confere ao Governo o direito de fiscalizar a actividade da UGT sob os pontos de vista técnico, económico e financeiro, e porque constitui uma forma de financiamento - viola o princípio da independência das associações sindicais relativamente ao Estado, nos termos em que está consagrado nos artigos
55º, nº 4, da Constituição, e 6º, nº 2, da Lei Sindical.
O Despacho nº 122/97-XIII, de 7 de Março de 1997, do Ministro das Finanças, continua, portanto, também nesta perspectiva, a padecer do vício de violação de lei.
IV
A conclusão pela ilegalidade do despacho que concede o aval conduz à necessidade de analisarmos as duas outras questões enunciadas em I.
A carência de elementos de facto, desde logo, o desconhecimento dos exactos termos em que o aval foi prestado - recorde-se que, de acordo com o nº 1 da base
VII, o aval pode ser prestado mediante outorga nos respectivos contratos, emissão de declarações de aval autenticadas com o selo branco da Direcção-Geral do Tesouro ou assinatura de títulos representativos das operações de crédito avalizadas - e a necessidade de operar com a prognose de desenvolvimentos hipotéticos implicam e aconselham que o tratamento das questões em falta se tenha que restringir ao enunciado genérico e sintético de quadros de verificação tão-só possível.
V
1. Comecemos pela questão dos «reflexos que o vício do acto produz na garantia do contrato:.
Não cremos que seja essencial à economia do parecer o estudo da questão da natureza jurídica do aval, tema sobre o qual, noutras ocasiões, o Conselho Consultivo (45) e alguns autores (46) se pronunciaram já desenvolvidamente.
Optámos, nesta parte, pela metodologia seguida pelo Conselho noutros casos (47), acentuando, no que ao objecto do parecer interessa, por um lado, alguns traços específicos do regime jurídico do aval do Estado (qualquer que seja a modalidade por que seja prestado), regime jurídico que se deve aferir, desde logo, pela Lei nº 1/73 e, por outro, os caracteres de garantia pessoal e acessória de tal instituto.
2. Sobre a pessoalidade da posição jurídica do Estado avalista importa reter que, mediante o aval, o Estado garante pessoalmente e com o seu património o cumprimento de dívidas de outras entidades, assumindo, no caso de incumprimento, as respectivas responsabilidades perante os credores. Estes têm naturalmente interesse na vinculação de vários devedores, em lugar de um só, cada um dos quais se responsabiliza pela dívida com o seu património.
E acrescenta-se, a este propósito, no parecer nº 23/92, que estamos a acompanhar:
«(.) O aval do Estado surge, nesta teleologia, como garantia afim, embora não idêntica, à fiança, 'figura-tipo' das garantias pessoais (-), em similar conformação regulada, justamente, no capítulo do Código Civil dedicado
às 'garantias especiais das obrigações' (-).
Bem se entende, por isso, que, partícipe de uma natureza e destinação comum, possa o aval acolher-se à sombra da fecunda elaboração teórico- normativa já enraizada no ambiente fidejussório, premunindo-se o intérprete de cautelas contra transposições acríticas de sector.:
A obrigação do Estado avalista é acessória da que recai sobre o devedor principal, a UGT - após a constituição da garantia «passa assim a haver uma obrigação principal, a que vincula o (principal) devedor e, por cima dela, a cobri-la (-), tutelando o seu cumprimento, uma obrigação acessória, a que o fiador fica adstrito: (48).
A acessoriedade do aval reflecte-se quer no conteúdo da garantia (que não poderá exceder a dívida principal), quer no nexo existente ao nível de forma entre o contrato e a prestação do aval (cfr. base VII da
Lei nº 1/73), quer na relação existente entre a validade do aval e a validade do contrato.
3. De acordo com o disposto no nº 1 da base VII da
Lei nº 1/73, a prestação do aval do Estado reclama, em primeiro lugar, a existência de um despacho prévio de autorização do Ministro das Finanças. O despacho nº 122/97-XIII do Ministro das Finanças constitui esse despacho de autorização (não lhe retira esta natureza nem dispensa a intervenção sequencial do director-geral do Tesouro, a circunstância de no despacho se afirmar «concedo o aval:).
Exige-se, depois, a intervenção do director-geral do Tesouro, por uma das formas referidas na mesma disposição legal - outorga no contrato, emissão de declaração de aval ou assinatura de títulos representativos das operações de crédito avalizadas.
A inobservância do procedimento descrito implicará a nulidade do aval (nº 3 da base VII). Embora se desconheça qual a modalidade concreta do aval, não há indícios de que este procedimento não tenha sido observado.
4. Mas qual o reflexo da ilegalidade do despacho do Ministro das Finanças na garantia do contrato?
Liminarmente, importa acentuar que tal ilegalidade só produz efeitos se e depois de, por via contenciosa, o despacho vir a ser anulado.
Depois, interessa frisar que o «contrato de empréstimo a celebrar pela União Geral dos Trabalhadores
- UGT, com a Caixa Geral de Depósitos, S. A.: é um contrato de direito privado, não obstante a repercussão do aval do Estado no seu clausulado e mesmo na própria celebração.
Entre o despacho do Ministro das Finanças e o contrato de mútuo interpõe-se a intervenção do director- geral do Tesouro, concretizadora da prestação do aval.
Independentemente da questão de saber qual a estrutura jurídica e a natureza desta intervenção (49), isto é, quer a qualifiquemos como negócio unilateral ou como contrato, e quer se lhe atribua natureza civil ou natureza administrativa, chegaremos à conclusão da invalidade da garantia.
4.1. Vejamos separadamente cada uma destas hipóteses.
4.1.1. Sobre a repercussão da invalidade do acto administrativo destacável relativamente a contrato de direito de privado outorgado pela Administração, afirma SÉRVULO CORREIA (50):
«A invalidade do acto administrativo que habilitar a Administração a outorgar um contrato de direito privado acarretará a nulidade deste, designadamente por falta de poderes de representação da pessoa colectiva pública pelo
órgão ou agente que nele outorgar (artigos 258º e
294º do Código Civil). Se as normas vigentes condicionam a celebração do contrato à presença de actos administrativos específicos, a não produção de efeitos de direito por estes corresponde à falta de deliberação do órgão competente para formar a vontade da pessoa colectiva pública e, portanto, à não referibilidade do negócio ao ente (-).:
4.1.2. Se se considerar a prestação do aval pelo director-geral do Tesouro como acto unilateral de direito privado (51), a invalidade do acto administrativo que o viabiliza determina, pela mesma ordem de razões, a sua nulidade.
4.1.3. De acordo com o disposto na alínea i) do nº
2 do artigo 133º do Código de Procedimento Administrativo, são nulos os actos administrativos consequentes de actos administrativos anteriormente anulados (52).
4.1.4. Por seu turno, o artigo nº 1 do artigo 185º do Código de Procedimento Administrativo estabelece que os contratos administrativos são nulos ou anuláveis «quando forem nulos ou anuláveis os actos administrativos de que haja dependido a sua celebração:.
MARIA JOÃO ESTORNINHO (53), a este propósito, distingue três situações, de que aqui nos interessa realçar a terceira, não expressamente prevista na lei, que é a de se ter verificado a anulação do próprio acto prévio, através do recurso contencioso de acto destacável; para esta situação aquela autora propõe:
«A solução para este problema terá de passar necessariamente pelo próprio regime geral do dever de executar as sentenças de anulação de actos administrativos, cujas regras se aplicam também ao recurso contencioso destes actos destacáveis. E, assim, faz todo o sentido também nestes casos a obrigação de extrair da sentença todas as suas consequências (o que, como é sabido, envolve nomeadamente a obrigação de reconstituição da situação hipotética actual, a supressão dos efeitos do acto administrativo e a eliminação dos actos consequentes do acto administrativo destruído).
Importa também a este propósito ter presente o artigo 133º, nº 2, alínea i) do Código de Procedimento Administrativo, que estabelece a nulidade dos actos consequentes dos actos anteriormente anulados (-). Se se considerar esta disposição aplicável aos contratos administrativos o que só parece poder verificar- se nos contratos 'com objecto passível de acto administrativo', nos termos do artigo 185º, nº
3, alínea a), o contrato será nulo, por si só, em virtude da mera anulação de um acto destacável que lhe seja anterior.:
VI
Resta analisar, também por forma perfunctória, o problema da eventual responsabilidade do Estado.
A ilegalidade do Despacho nº 122/97-XIII, de 7 de
Março de 1997, do Ministro das Finanças, apesar de afectar a validade do aval, não se repercute imediata e directamente na validade do «contrato de empréstimo a celebrar pela União Geral dos Trabalhadores - UGT, com a
Caixa Geral de Depósitos, S.A.:.
Os outorgantes do contrato de mútuo podem mantê-lo nos termos em que foi celebrado, prescindindo do aval do Estado. Tal como pode a mutuária prestar, e a mutuante aceitar, outras garantias.
Mas podem também questioná-lo, com invocação da essencialidade da garantia para a elaboração do contrato e para a formação da própria vontade de contratar.
Nesta segunda hipótese, são, em abstracto, configuráveis situações de invocação de vícios da vontade, por exemplo, a existência de erro sobre os motivos, modalidade de erro sobre que dispõe o artigo
252º do Código Civil:
«1. O erro que recaia nos motivos determinantes da vontade, mas se não refira à pessoa do declaratário nem ao objecto do negócio, só é causa de anulação se as partes houverem reconhecido, por acordo, a essencialidade do motivo.
2. Se, porém, recair sobre as circunstâncias que constituem a base do negócio, é aplicável ao erro do declarante o disposto sobre a resolução ou modificação do contrato por alteração das circunstâncias vigentes no momento em que o negócio foi concluído.:
O erro-motivo, uma vez verificados os respectivos requisitos, constitui causa de anulabilidade do contrato, nos termos do disposto no artigo 287º e seguintes do Código Civil.
A manutenção do «contrato de empréstimo:, seguida de incumprimento por parte do mutuário, ou a sua anulação podem originar situações de responsabilização do Estado.
A responsabilidade civil do Estado e demais entidades públicas está genericamente consagrada no artigo 22º da Constituição e abrange tanto os actos de gestão privada como os actos de gestão pública.
Mais difícil é definir aqui o tipo e os contornos da responsabilidade face ao total desconhecimento do processo negocial que terá culminado na celebração do contrato, do papel nele desempenhado pelo Estado e mesmo da própria modalidade do aval.
Encontrar-nos-emos, em princípio, face ao disposto no nº 1 do artigo 227º do Código Civil (54), no campo da responsabilidade pré-contratual, se e na medida em que se provar uma intervenção culposa relevante do Estado em contactos e negociações preliminares com a mutuante e a mutuária, conducentes à fixação das condições do empréstimo constantes da «ficha técnica: e à autorização do aval.
Aqui a obrigação de indemnizar é apenas de excluir quando a outra parte conhecia ou tinha obrigação de conhecer a existência do vício.
É esta, porém, uma avaliação que só em imediação com os factos se poderá fazer (55).

VII

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1ª O regime legal do aval do Estado consta, basicamente da Lei nº 1/73, de 2 de Janeiro, diploma que não contempla a concessão dessa garantia a associações sindicais;
2ª O Despacho nº 122/97-XIII, de 7 de Março de
1997, do Ministro das Finanças, publicado no Diário da República, II Série, nº 77, de 2 de
Abril de 1997, que concedeu «o aval do Estado ao contrato de empréstimo a celebrar pela União
Geral dos Trabalhadores - UGT, com a Caixa
Geral de Depósitos, S. A., até ao montante máximo de 600 000 contos:, com fundamento na
Lei nº 1/73, de 2 de Janeiro, que não lhe é aplicável, padece do vício de violação de lei;
3ª O mesmo despacho enferma ainda do vício material de violação de lei, por violação do princípio da independência das associações sindicais, consagrado pelas disposições conjugadas dos artigos 55º, nº 4, da Constituição, e 6º, nº 2, do Decreto-Lei nº 215-
B/75, de 30 de Abril (Lei Sindical);
4ª A ilegalidade do Despacho nº 122/97-XIII, se e quando este despacho vier a ser contenciosamente anulado, acarreta a nulidade da garantia;
5ª A ilegalidade do Despacho nº 122/97-XIII e a nulidade da garantia são susceptíveis de originar situações de responsabilidade civil e de, verificados os respectivos pressupostos, constituir o Estado na obrigação de indemnizar.


VOTO


(José Augusto Sacadura Garcia Marques) - Votei vencido pelas razões que sucintamente passo a expor:

1. - Não posso continuar a acompanhar o entendimento anteriormente sufragado por esta instância consultiva, segundo o qual “o aval do Estado constitui uma garantia creditícia com finalidade financeira de natureza excepcional, não permitindo por conseguinte a integração analógica nem legitimando, atenta a sua etiologia, a interpretação extensiva” (parecer nº 25/88, de 24 de Maio de 1989).
Ainda que a Base I da Lei nº 1/73, de 2 de Janeiro, deva ser qualificada como uma norma excepcional, sempre admitiria interpretação extensiva - cfr. o artigo 11º do Código Civil.

2. - Importa, assim, proceder à análise hermenêutica dos preceitos da Lei nº 1/73, definidores dos requisitos da concessão do aval do Estado - Bases I e II.
E, desde logo, interessa verificar se, como pretende o parecer, do universo subjectivo dos beneficiários do aval do Estado, devem ser excluídas as associações sindicais, quando, na qualidade de operadores privados, promovem a organização e prestação de acções de formação profissional.

3. - No centro da controvérsia situa-se o conceito de “empresa”, ou, na letra da Base I, de “empresa nacional”.

3.1. O conceito de “empresa” é, essencialmente, um conceito económico.
Com todo o respeito, não me é possível acompanhar, nesse âmbito, o discurso argumentativo seguido pelo parecer. Pelo contrário, adiro às considerações, a propósito, tecidas pelo meu Exmº Colega, Dr. Lucas Coelho, acolhendo, por isso, as conclusões atingidas no respectivo voto de vencido, para as quais tomo a liberdade de remeter. Limitar-me-ei, por isso, a aditar alguns breves dados.
Segundo um Autor, a empresa é uma organização de pessoas e capitais que tem por finalidade exercer, com certa permanência, uma actividade económica (ANTÓNIO PEREIRA DE ALMEIDA, “Direito Comercial”, ed. AAFDL, pág. 138, apud MANUELA REGO, “A Definição Legal de Subsídio ou Subvenção” - artigo 21º do Decreto-Lei nº 28/84, de 20 de Janeiro), in Criminalidade no Domínio da Obtenção e Utilização de Subsídios, Arrábida, 14 a 16 de Março de 1996, Separata do Boletim do Ministério da Justiça, nº 454, págs. 85 e segs., tal como os autores a seguir citados).
Juridicamente, a empresa pode ter formas diversas. E, embora exista uma certa tendência para perfilhar um modelo “societário” de empresa, assimilando-a à figura jurídica da sociedade, é preciso ter em conta, como salienta outro Autor, que “uma mesma sociedade pode, mantendo-se una, como sujeito jurídico, ter várias empresas” (MIGUEL J. A. PUPO CORREIA, “Direito Comercial”, 4ª edição, Lisboa, 1996, págs. 151 e segs.).
Noção fundamentalmente económica, a empresa pode apresentar, nas suas projecções jurídicas, feições muito diferenciadas, assim dando lugar a diversos regimes em alternativa. Como salienta MENEZES CORDEIRO, por vezes interessa ao direito tratar as entidades produtivas como unidade, independentemente, por exemplo, de elas traduzirem pessoas singulares ou colectivas, com várias subdivisões ou, até, realidades não personalizadas. Assim sucede no domínio do Direito da concorrência (“Direito da Economia, vol. 1º, ed. AAFDL, 1986, pág. 233.
Também no Direito comunitário - em área, aliás, ligada à concorrência - houve que utilizar a ideia de empresa, como modo de alcançar um tratamento unitário requerido por várias realidades. Como salienta MENEZES CORDEIRO, as necessidades de aplicação do artigo 85º, nº 1, do Tratado de Roma, levaram, por via jurisprudencial, a definir empresa, para efeitos do Tratado de Roma, como “um conjunto unitário e autónomo de factores materiais e imateriais, ordenado com vista à prossecução de fins económicos”. Não se infira daqui que o seu escopo tenha necessariamente que ser o lucro: a estrutura empresarial visa, no fundamental, optimizar os resultados face aos meios disponíveis, tendo em conta as metas implicadas que poderão, no limite, residir na prestação de serviços gratuitos e, como tal, não lucrativos. (Ob. cit., pág. 241 e nota 30). Também COUTINHO DE ABREU reconhece que “está longe de estar provado, mesmo entre nós, que o intuito lucrativo seja nota essencial ao conceito jurídico de empresa in genere” (“Definição de Empresa Pública”, separata do vol. XXXIV do Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, págs, 40 e segs. e 138 e segs.)

3.2. Por força da noção ampla, estabelecida no artigo 2º do Código dos Processos Especias de Recuperação da Empresa e de Falência, aprovado pelo Decreto-Lei nº 132/93, de 23 de Abril, aquele Código - com as excepções constantes do artigo 2º do diploma preambular - aplica-se “tendencialmente, a toda e qualquer empresa, independentemente da respectiva natureza jurídica e modelo orgânico” (JOÃO LABAREDA, “Recuperação de empresas e falências”, Textos, Sociedades Comerciais, ed. CEJ-CDPOA, 1994-1995, pág. 185). O que significa que aquela noção abrange, inclusivamente, “as sociedades civis com personalidade jurídica e as associações económicas sem fins lucrativos. As próprias fundações poderão também, em muitos casos, considerar-se abrangidas, desde que, na sua actividade, se organizem de forma empresarial, no sentido do artigo em questão (...). Qualquer sector da economia é genericamente apto para ser desenvolvido por forma empresarial” (LUÍS A. CARVALHO FERNANDES e JOÃO LABAREDA, “Código dos Processos Especias de Recuperação da Empresa e de Falência Anotado”, 1994, pág. 55).

3.3. - São frequentes as decisões do Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia neste sentido (cfr., a este propósito, MANUELA REGO, op. cit., págs. 92 e 93).

3.3.1. Seleccionemos algumas.

A) - “Para definir a noção de empresa não nos podemos (...) limitar a considerações formais, mas seria necessário fazer intervir igualmente elementos económicos.
“(...) a empresa é constituída por uma organização uintária de elementos pessoais materiais e imateriais, ligada a um sujeito juridicamente autónomo, e perseguindo de uma forma durável um fim económico determinado.
“(...) segundo esta noção, a criação de qualquer sujeito de direito no domínio da organização económica arrasta a constituição de uma empresa distinta” (Acórdão do Tribunal de Justiça, nos processos nºs 17/61 e 20/61, in “Recueil de la Jurisprudence de la Cour”, 1962, págs. 628 e segs.; no mesmo sentido, o acórdão proferido no processo nº 19/61, págs. 661 e segs.)

B) - “A noção de empresa, colocada num contexto de direito da concorrência, deve ser entendida como designando uma unidade económica do ponto de vista do objecto do acordo em causa mesmo se, do ponto de vista jurídico, esta unidade económica é constituída por várias pessoas físicas ou morais” (Acórdão proferido no processo nº 170/83, in “Recueil (...), 1984-1987, págs. 2999 e segs.)

C) - “À luz do direito comunitário da concorrência, o conceito de empresa compreende qualquer entidade que exerça uma actividade económica, independentemente do seu estatuto jurídico. O facto de esta entidade ser uma sociedade cooperativa, organizada de acordo com a legislação de um Estado membro, não pode afectar a natureza económica da actividade exercida pela dita cooperativa” (Acórdão do Tribunal de 1ª Instância das Comunidades Europeias, de 2 de Julho de 1992, in Colectânea de Jurisprudência, 1992, tomo II, pág. 1931).

3.3.2. Será ainda possível, mediante concretização adicional, tentar demonstrar que a letra da Base I, na referência que faz ao conceito de “empresa”, não exclui as associações sindicais. E não se estranhe a aproximação que continuará a ser feita relativamente a princípios do direito comunitário e, mais especificamente, do direito da concorrência. É que, no domínio em que nos movemos - relativo à concessão de apoios ao desenvolvimento de acções de formação profissional -, tal apelo é não só pertinente, mas até, indispensável, não tendo sido certamente por acaso que, no Despacho de concessão do aval, o Senhor Ministro das Finanças fez expressa referência ao artigo 92º do Tratado de Roma - cfr. ponto 1.8. do Despacho ministerial 122/97-XIII.
Como escreve MANUEL AFONSO VAZ (“Direito Económico. A Ordem Económica Portuguesa”, apud MANUELA REGO, loc. cit., pág.94): “Em matéria da concorrência (...) é essencialmente em função da sua actividade económica que o agente será ou não qualificado de empresa...Trata-se, pois, de uma entidade empenhada em actividades económicas (...) seja ela uma sociedade, uma pessoa física (por exemplo, um inventor que comercializa a sua invenção concedendo uma licença de patente) ou mesmo uma associação profissional. Um sindicato profissional pode mesmo ser considerado como uma empresa, no sentido do Tratado, independentemente de ter ou não personalidade jurídica. (Cfr. Decisão da Comissão nº 74/634/CEE).
Em comentário efectuado a propósito, escreve MANUELA REGO: “Assim, independentemente da designação comum ou da forma jurídica adoptada, o que releva é o fim económico visado. Esse fim não necessita de constar dos estatutos ou pactos sociais, não se exigindo a actividade dirigida a tal fim permanente. O que interessa é que a entidade, em determinado momento da sua vida, o prossiga da mesma forma que todos os outros operadores do mercado”.

4. - Resulta do que se expôs que, do meu ponto de vista, a UGT - e, em geral, todas as associações ou organizações sindicais (artigo 2º, alínea c), do Decreto-Lei nº 215-B/75, de 30 de Abril - Lei Sindical) - enquanto entidade responsável pela promoção e organização de acções de formação profissional, é, nos termos expostos, suporte de uma empresa, para os efeitos da Base I da Lei nº 1/73. Conclusão que, penso, se alcança no quadro de uma simples interpretação declarativa. Mas que, por maioria de razão, se atingiria com recurso aos cânones da interpretação extensiva, passível, como se viu, de utilização “in casu”.
Termos em que se demonstra a irrelevância do argumento que faz apelo à natureza taxativa da enumeração dos beneficiários do aval do Estado, constante da Base I. É que, a ser correcta, como creio, a construção acima exposta, não sairia violado o invocado carácter taxativo do catálogo de destinatários da referida garantia. E isto sem sequer ser necessário utilizar o argumento respeitante à inclusão, doutrinariamente aceite, das Regiões Autónomas (todavia, omissas da norma em referência) no elenco de tais beneficiários.
Além de que, adicionalmente, se justifica proceder a uma interpretação actualista dos conceitos vertidos na lei. À data da publicação da Lei nº 1/73, o legislador não poderia prever a actuação de uma confederação geral de trabalhadores no domínio da formação profissional e no quadro constitucional e jurídico-comunitário hoje em vigor.
Nem se diga que o elemento histórico afasta este entendimento, apontando, em contrapartida, para a adopção de um conceito societário de empresa. É que resulta insofismável que, se essa houvesse sido a intenção do legislador, em vez de “empresa”, a norma teria, muito simplesmente, utilizado a noção de “sociedade comercial”.

5.- Vejamos, agora, com a brevidade requerida, como, no caso concreto, se encontram também reunidos os demais requisitos para a concessão do presente aval por parte do Estado.
Em tal sede, reveste-se de particular importância o elemento teleológico de interpretação. Nesse contexto, assume específico relevo a finalidade do financiamento avalizado. A mesma deve consistir em apoiar a realização de “empreendimentos ou projectos de manifesto interesse para a economia nacional, ou em que o Estado tenha participação que justifique a prestação da garantia” - nº 1 da Base II.
A verdade é que, como é salientado no despacho ministerial de concessão do aval (pontos 1.2. e 1.3.), a actividade “formação profissional” envolve vertentes que são tarefas constitucionalmente deferidas ao Estado - artigo 58º, nº 3, alíneas a) e c), da CRP.
Assim sendo, os encargos com a “execução de políticas de emprego” e com a “formação cultural, técnica e profissional dos trabalhadores” devem, em última análise, ser suportados pelo Estado.
Ao prestar aval à UGT para a celebração de um empréstimo destinado a suportar encargos - dívidas - contraídas em projectos ou empreendimentos de formação profissional (segundo parece, já desenvolvidos, o que não obsta a que sejam abrangidos pela Lei nº 1/73, como, aliás, o próprio parecer reconhece), está verificado o referido requisito relativo à finalidade. O Despacho 122/97-XIII refere expressamente que as finalidades subjacentes ao empréstimo que a UGT pretende contrair junto da Caixa Geral de Depósitos, relevam do conceito de “manifesto interesse para a economia nacional” contida na Base II, nº 1 da Lei nº 1/73 (ponto 1.4.).
Quanto ao requisito relativo à “indispensabilidade” do aval (parte final do nº 1 da Base II), é a mesma igualmente salientada no competente despacho de concessão - cfr. ponto 1.5.
É irrelevante que o Despacho em apreço não faça referência ao preenchimento do primeiro requisito - ou seja, tratar-se de operação de crédito (interno ou externo) a realizar por institutos públicos ou empresas nacionais.
Com efeito, por um lado, não é, obviamente, necessário que os despachos ministeriais de autorização da prestação de avales por parte do Estado refiram expressamente o preenchimento dos requisitos legais, o que representa mesmo uma prática excepcional. A ausência de tal referência expressa não habilitará jamais a concluir que os requisitos legais não se encontram reunidos. Acresce que, no caso concreto, o Despacho ministerial enuncia a verificação, por parte da UGT, dos parâmetros que a Lei nº 1/73, exemplificativamente enuncia com vista à verificação de que a empresa oferece a segurança suficiente para fazer face às responsabilidades que pretende assumir: as características económicas, estrutura financeira e orgânica administrativa - cfr. ponto 1.7. do Despacho e nº 2 da Base II da Lei nº 1/73.
Tudo a apontar, portanto, para o entendimento que considera a UGT, nesta específica vertente, ou seja, enquanto promotora da organização de acções de formação profissional, como sujeito juridicamente autónomo de uma empresa.

6.- Depois de se ter visto não haver impedimento à prestação do presente aval com fundamento na não verificação dos requisitos previstos por lei para o efeito, subsiste, ainda assim, a questão da eventual violação do princípio da independência das associações sindicais relativamente ao Estado, nos termos em que está consagrado nos artigos 55º, nº 4, da Constituição da República, e 6º, nº 2, da Lei Sindical.
Dir-se-ia, seguindo a orientação do parecer, que as normas da Base X da Lei nº 1/73, conjugada com a do referido nº 2 do artigo 6º do Decreto-Lei nº 215-B/75, se configurariam como “normas blindadas”, ferindo de morte a legalidade do aval.
Mais uma vez, e com todo o respeito, discordo da construção feita pelo parecer.

6.1. Ao prestarem serviços na área da formação profissional (ou noutras de carácter económico ou social), as associações sindicais agem na qualidade de operadores privados. Nestes termos, o direito de fiscalização conferido ao Governo pela Base X da Lei nº 1/73, exercido embora em conformidade com os parâmetros ali fixados, apenas poderá incidir em matéria relativa à referida actividade formativa. Ora, o desenvolvimento da “empresa”, que tem por objecto a prestação das acções formativas, situa-se como actividade lateral, acessória, relativamente ao núcleo essencial da actividade sindical. A fiscalização consentida pela Base X não incidirá na área estritamente sindical - defesa e promoção dos direitos e interesses sócio-económicos dos trabalhadores que representam. Se assim não fosse sairia molestado o valor (constitucionalmente) prevalente da liberdade sindical.

6.2. E é também essencialmente por isso que, neste domínio concreto, estranho ao “núcleo duro” da vertente sindical, não opera a proibição de financiamento contida no nº 2 do artigo 6º da Lei Sindical, desde que respeitados, como creio que foi o caso, os parâmetros da transparência, publicidade e interesse público.
Reconhece-se, acompanhando, aliás, neste ponto, o parecer, que “a liberdade e a independência sindicais são compatíveis com o financiamento pelo Estado das associações sindicais”. Por algum motivo, a proibição de financiamento não figura no texto do artigo 55º da Constituição da República.
Ora, nesta matéria, não basta atentar na norma do nº 2 do artigo 6º da Lei Sindical, importando analisar disposições e práticas do direito comunitário, com cuja normação, que prevaleceria, haveria que conformar, se necessário fosse, a interpretação das normas pertinentes do ordenamento jurídico interno.
Nem poderia ser de outro modo. Com efeito, como explicar, se assim não fosse, o regime dos financiamentos de que podem ser beneficiárias, no âmbito da formação profissional, por parte do Fundo Social Europeu (FSE), entidades de direito privado, entre as quais as associações sindicais, bem como os poderes de fiscalização inerentes ao controlo financeiro da aplicação dos mesmos?
Vejam-se, designadamente, a propósito da reestruturação do FSE, a Decisão do Conselho nº 71/66/CEE, de 1 de Fevereiro, e o Regulamento de aplicação nº 2398/71/CEE, de 8 de Novembro de 1971, e, mais tarde, a Decisão do Conselho nº 83/516/CEE, de 17 de Outubro de 1983.
Recorde-se que o FSE participa no financiamento de acções de formação e orientação profissional, sendo a sua contribuição concedida para acções realizadas por operadores que se regem por normas de direito público ou de direito privado - cfr. artigos 1º, nº 2, e 2º, da última das mencionadas Decisões do Conselho.
Como se pode ler no parecer nº 9/92, de 25 de Fevereiro de 1994, relativamente à condensação dos aspectos nucleares do regime emergente da reforma de 1983 do FSE, as “despesas elegíveis” para subvenções do FSE abrangem, entre outras, a remuneração das pessoas que sejam objecto de acções de formação profissional, custos de preparação, funcionamento e gestão de acções desta natureza, estadia e despesas de deslocação dos beneficiários. Escreve-se, ademais, no citado parecer, com interesse para este ponto - excepção feita às referências bibliográficas que agora não se justifica transcrever:
“No campo de aplicação pessoal, são destinatários das acções do Fundo, tanto os indivíduos a quem as acções se dirigem ou beneficiam, como os promotores das mesmas.
“(...)
“Promotores das acções são, por sua vez, os organismos que o artigo 2º, nº 1, (da Decisão 83/516/CEE) designa por operadores de direito público ou de direito privado.
“Entre os primeiros, os próprios Estados interessados (...) e seus entes públicos, os serviços centrais, regionais e locais, as empresas públicas, nacionalizadas, ou de capital maioritariamente público.
“Operador de direito privado pode, do mesmo passo, ser qualquer empresa privada, uma cooperativa ou associação sem fim lucrativo, um sindicato”.
Também merecem referência as “verificações” no local a que a Comissão pode proceder (sem prejuízo de controlo efectuado pelos Estados-Membros) - cfr., verbi gratia, o artigo 7º do Regulamento CEE nº 2950/83, e as medidas de “controlo financeiro” das acções a que se refere o artigo 23º do Regulamento (CEE) nº 4253/88 (Veja-se ainda, sobre a matéria, MARIA DE FÁTIMA GONÇALVES, “Fundo Social Europeu - O Caso Português/ As Irregularidades - A Notícia do Crime”, in Criminalidade no Domínio da Obtenção e Utilização de Subsídios, Arrábida, 14 a 16 de Março de 1996, Separata do Boletim do Ministério da Justiça, nº 454, págs. 45 e segs.).
Resulta do exposto que, na área da formação profissional, as ajudas por parte do Estado, mormente sob a forma de prestação de aval, não podem ser proibidas, não colidindo com o princípio da independência das associações sindicais.

7. Atento todo o exposto, concluo que o Despacho nº 122/97-XIII, de 7 de Março de 1997, do Senhor Ministro das Finanças, não está ferido de ilegalidade. Por esse motivo está prejudicada a resposta às demais questões formuladas na consulta.

(Eduardo de Melo Lucas Coelho) - Vencido nos termos seguintes.

I

1. A consulta dirigida ao Conselho Consultivo compreende três ordens de questões: legalidade do aval; reflexos da ilegalidade nos actos negociais conexos; responsabilidade do Estado emergente da ilegalidade e dos efeitos por esta determinados.

Não me pronuncio sobre a segunda e a terceira, embora reconheça que, se houvesse ilegalidade, o vício determinaria, num primeiro momento, a invalidade do subsequente negócio de aval, com reflexos, num segundo momento, no contrato de mútuo, susceptíveis de envolver responsabilidade civil do Estado.

Creio, porém, que os elementos disponíveis não permitem considerar ilegal o despacho ministerial, ficando as duas aludidas questões logicamente prejudicadas.

As considerações seguintes respeitam, pois, exclusivamente, ao problema da legalidade do despacho do Ministro das Finanças ([1]) mediante o qual, ao abrigo, nomeadamente, das Bases I e II da Lei nº 1/73, de 2 de Janeiro, foi autorizada a concessão à UGT do questionado aval.

Cinjo-me, evidentemente, a aspectos fundamentais e restrinjo-–me no plano argumentativo, pois não é possível, no contexto de um simples voto, abordar e aprofundar todas as questões implicadas.



2. Fez vencimento a tese da ilegalidade, com dois fundamentos.

Primeiro, a UGT não pode ser considerada “instituto público” “nem empresa nacional”. Ora, nos termos da Base I da Lei n.º 1/73, os avales do Estado só podem ser concedidos para operações a realizar por entes dessas duas categorias - abstrai-se, obviamente, das “províncias ultramarinas” hoje inexistentes. Logo, o citado despacho padece do vício de violação de lei, por ofensa da Base I.

Segundo. O despacho enferma do mesmo vício por ofensa do princípio da independência das associações sindicais consagrado no artigo 55.º, n.º 4, da Constituição e no n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei nº 215-B/75, de 30 de Abril (Lei Sindical), princípio que o parecer analisa em duas vertentes, com resultados coincidentes.

Na minha opinião não se verificará, salvo o devido respeito, nem um nem o outro vício.

Vejamo-los, sucessivamente.


II

1. Para concluir, em primeiro lugar, pela violação da Base I o parecer afirma, como se disse, que a UGT não é um instituto público nem uma empresa nacional.

Não discuto a qualificação de instituto público. A caracterização ensaiada no parecer, afiançada pela melhor doutrina, basta para a rejeitar.

Já penso, todavia, que a UGT, na óptica em que foi encarada pelo despacho ministerial, se deixa abranger no conceito “empresa nacional”, para os específicos efeitos da mesma Base.


2. A posição contrária do parecer socorre-se, neste ponto, de um determinado conceito de empresa emprestado pela ciência económica, como é devido, e, ponderando a natureza jurídica da UGT, conclui pela irredutibilidade desta àquela categoria.

Neste ponto de vista, a empresa é “a unidade produtiva básica, definida como uma organização de factores produtivos destinada a produzir, vender ou propiciar a circulação de bens ou serviços”, a que está “normalmente associada a finalidade de maximização do lucro, moldada num comportamento socialmente aceite no mercado ou, ao menos, a superação dos custos pelas receitas”.

A UGT, pelos estatutos e pela Lei Sindical, é uma “confederação sindical de âmbito nacional”, uma “associação sindical”, em suma, caracterizada, face ao respectivo regime jurídico, como “pessoa colectiva de direito privado e utilidade pública”.

Assenta num “agrupamento de pessoas”, prossegue “um fim económico não lucrativo”, não podendo o seu escopo “consistir no exercício de uma actividade comercial”.

Logo, a UGT não é uma empresa.

Não se cuidou de precisar a intermediação argumentativa, mas dá a ideia de que se propendeu para a subjectivação em abstracto da organização de factores de produção característica do conceito de empresa, recusando-se a subsunção da UGT a este modelo por se configurar como sujeito de natureza jurídica essencialmente diversa. A UGT não seria uma empresa porque, precisamente, não é uma semelhante organização, mas uma associação de pessoas (jurídicas).

Isto, por um lado. Adjuvantemente, a empresa visa um fim lucrativo, mediante a comercialização dos bens e serviços produzidos, ou prestados, e esse não pode ser o escopo de uma associação sindical, de direito privado e utilidade pública.

3. Com todo respeito, trata-se, a meu ver, de uma perspectiva insuficiente e metodologicamente difícil de aceitar.

Por um dos lados, ou por ambos, também não seria «empresa» uma associação de direito civil, uma fundação, uma sociedade civil, um empresário em nome individual, uma cooperativa, e tantos outros entes considerados como tal.

Não é, de facto, que a empresa não possa ser encarada de um ponto de vista subjectivo, reportando-se então ao próprio empresário ou titular ([2]).

O que não deve é subjectivar-se ou personalizar-se a própria organização, erigindo-se esta, como no parecer vai implicado, em ente categorialmente diferenciado e autónomo de um titular, pessoa singular ou colectiva.

A solução da questão depende, em todo o caso, do conceito de “empresa” relevante para efeitos da Base I da Lei nº 1/73, e da natureza jurídico-concreta do ente cuja qualificação adentro daquele conceito é problemática.

Ponderem-se os dois vectores por esta ordem.

4. A empresa é realidade oriunda da economia e a sua noção constitui basicamente tarefa da ciência económica.

Essa realidade acaba por relevar inelutavelmente no domínio do direito, sendo missão da ciência jurídica a construção do conceito jurídico de empresa.

Por um lado, esta elaboração teorética, operando com base em normas pertencentes a diferentes sectores jurídicos, preocupados com a tutela de interesses diversificados, não tem que conduzir necessariamente a um conceito unitário.

Por outro lado, encontra-se de algum modo condicionada, a montante, pela realidade económica de que o direito parte, não lhe sendo legítimo, consequentemente, desenvolver percursos nem atingir resultados que desfigurem a empresa, tornando-a irreconhecível na fonte.

Daí o relevo carismático da realidade económica.

No entanto, as noções económico-jurídicas de empresa variam com os autores e seria impossível pretender aqui inventariar sequer a mínima parte ([3]).

Não me custaria, inclusive, aceitar como base de trabalho o conceito perfilhado no parecer, que há pouco destaquei (supra, ponto 2.), com determinadas precisões e acertos advertidos pela doutrina especializada, ou emergentes do direito e jurisprudência comunitários, cujos ditames não podem, neste domínio, ser ignorados.

4.1. Em primeiro lugar, não parece que o exercício de uma actividade comercial e o conexo móbil lucrativo - muito menos a «maximização do lucro» - sejam elementos constitutivos/ /caracterizadores do conceito de empresa.

COUTINHO DE ABREU ([4]) vai ao ponto de afirmar: «está longe de estar provado, mesmo entre nós, que o intuito lucrativo seja nota essencial do conceito jurídico de empresa in genere».

A doutrina italiana pondera, por sua vez, a este respeito ([5]), que ao antigo escopo lucrativo se substituiu na época contemporânea a ideia mais limitada de «actividade abstractamente lucrativa» ou «actividade que pode proporcionar lucro», admitindo, do mesmo passo, que o sujeito possa concretamente determinar-se por um diverso escopo, mesmo de natureza ideal.

Mas também o critério da natureza abstractamente lucrativa, deixando sem explicação as empresas de fins mutualísticos, se tornou insatisfatório. Os sócios das cooperativas não visam a realização de um lucro ou incremento patrimonial. As cooperativas de consumo, em particular, o que proporcionam aos sócios é a poupança de despesas, logo, diminuições patrimoniais. E, todavia, não se pode duvidar de que as cooperativas sejam titulares de empresas em sentido técnico.

Perante tais situações, a doutrina tradicional ampliou a perspectiva: a actividade da empresa/empresário supõe tão-somente a «extracção de uma utilidade económica» - quer consista no lucro, numa poupança, ou noutra vantagem patrimonial -, ou apenas um escopo «egoístico»; pelo menos, um escopo não «altruístico».

Mas ainda nesta medida a ampliação foi considerada insuficiente atendendo às empresas exercitadas por determinados entes públicos, como as «caixas de aforros», cujo escopo, em lugar de se traduzir na «extracção de utilidades económicas» ou de equivaler a fins «egoísticos», antes merece, precisamente, a qualificação de «altruístico».

Não se regressou já, em todo o caso, ao antigo móbil do lucro.

A doutrina tem estabilizado na exigência máxima da realização de um fim económico como caracterizador do conceito de empresa, asserção que as noções recolhidas nos pontos 3.1. e 3.2. do voto de vencido do meu Exmo. Colega Dr. Garcia Marques significativamente sufragam.

Das mesmas flui, aliás, que entes tão diversos como sociedades civis, associações económicas sem fins lucrativos e até fundações - com finalidades, de resto, as mais alheias ao exercício do comércio - podem ser titulares de empresas.

A mesma perspectiva é ainda a da jurisprudência comunitária, bastando compulsar os acórdãos citados no ponto 3.3.1. do mesmo voto de vencido, aos quais me permitia aditar os seguintes arestos do Tribunal de Justiça.

No acórdão de 29 de Outubro de 1980 ([6]) decidiu-se que uma «associação sem fim lucrativo» é considerada empresa para efeitos do artigo 85.º, n.º 1, do Tratado C.E.

No acórdão de 23 de Abril de 1991 ([7]) lê-se, por sua vez: «o conceito de empresa abrange qualquer entidade que exerça uma actividade económica, independentemente do seu estatuto jurídico e modo de funcionamento», precisando-se que a «actividade de mediação de emprego é uma actividade económica», que o “facto de as actividades de colocação serem normalmente confiadas a serviços públicos não prejudica a natureza económica dessas actividades» e que, portanto, «uma entidade como um serviço público de emprego que exerça actividades de colocação pode ser considerada empresa para efeitos da aplicação das regras de concorrência comunitárias».

Destas precisões resultaria um conceito de empresa depurado de elementos não essenciais, próximo, inclusivamente, daquele acolhido no artigo 2.º do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência que a nota 23 do parecer transcreve.

4.2. A segunda precisão foi aflorada há instantes (supra, ponto 3.).

Diz respeito à necessária e incindível conexão entre a empresa e um sujeiro jurídico (empresário, titular), pessoa singular ou colectiva, pressupondo, na expressão da doutrina transalpina ([8]), a «alteridade» da empresa relativamente a ele, mas excluindo a «dissociação» entre empresário e empresa ([9]).

Fica, por aqui, logicamente excluída a personalização ou subjectivação desta - «l’impresa non costituice un soggetto giuridico a sé stante, distinto dalla personna del suo titolare» ([10]) -, personalização, aliás, inconfundível, como anteriormente sublinhei (supra, ponto 3. e nota 2), com o modo de encarar a empresa numa óptica subjectiva que a identifica em abstracto com o próprio titular.

Esta a construção que a moderna «concepção democrática» da empresa subscreve - “l’impresa resta, giuridicamente, attività dell’impreditore, ad esso e soltanto ad esso imputado» ([11]) - e o direito comunitário uma vez mais sufraga.

Assim flui da jurisprudência há pouco recenseada e, muito claramente, do seguinte passo do acórdão do Tribunal de Justiça, de 13 de Julho de 1962 ([12]): «a empresa é constituída por uma organização unitária de elementos pessoais, materiais e imateriais, ligada a um sujeito juridicamente autónomo, que prossegue, de forma duradoura ([13]) um fim económico determinado”.

No quadro esboçado se compreende perfeitamente que um jusfilósofo francês tenha, muito recentemente, podido escrever ([14]):

«Le droit est ainsi le produit d’institutions que le droit constitue lui-même et auxquelles il donne le droit de produire du droit (-), et, à l’intérieur du système juridique clos que constitue l’ordre juridique de l’État (...) l’entreprise n’est rien.

«Elle ne peut, au mieux, être perçue que comme un ensemble - un réseau - de contrats et de droits de proprieté qui n’ ont pas, en tant qu’ensemble d’existence juridique propre».

Aproveito apenas o mote para precisar que a titularidade da empresa não tem que se fundar num direito de propriedade do empresário, podendo bem resultar de uma relação contratual. Tudo depende das circunstâncias do caso concreto.

Pense-se apenas, por exemplo - sem esquecer decerto que os conceitos de empresa e de estabelecimento podem não coincidir - na cessão de exploração configurada no revogado artigo 1085.º, n.º 1, do Código Civil, e hoje no artigo 111.º, n.º 1, do Regime do Arrendamento Urbano aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro.


4.3. Fluem do exposto, como essenciais ao conceito de empresa in genere, os seguintes elementos constitutivos: a organização de factores produtivos, tais como o capital e o trabalho, relações jurídicas, direitos; a orientação da unidade organizada para a consecução de um fim económico; a estabilidade ou não ocasionalidade da actividade económica desenvolvida.

Não se vêem razões de tomo para entender o termo «empresa» da Base I da Lei n.º 1/73 em sentido diferente.

Sendo esse o conceito doutrinariamente preferível e vigente na Comunidade, deve a aludida expressão legal ser interpretada em conformidade com o seu conteúdo e implicações.

Observe-se a este propósito adicionalmente o seguinte.

Sabemos já ser indispensável que aquela unidade organizacional finalisticamente direccionada para a realização de um objectivo económico esteja juridicamente ligada a um sujeito de direito seu titular - pessoa singular ou colectiva, qualquer que seja o estatuto jurídico desta e mesmo que o seu escopo seja de carácter não lucrativo.

Abstraindo - se tal fosse possível - dessa conexão, quedaria a organização económico-empresarial, evidentemente, desprovida de significado jurídico, no limbo inconcebível dos «direitos sem sujeito».

Rejeitada, no entanto, a abstracção, por absurda, e revertendo ao conceito «empresa» na acepção da Base I, uma de duas: ou a expressão está aí tomada em sentido subjectivo, equivalendo nesta óptica ao respectivo titular, como oportunamente se mostrou; ou foi utilizada em sentido objectivo, envolvendo também obrigatoriamente o titular, atenta aquela necessária conexão.

Em qualquer das hipóteses, o titular da empresa, tal como configurado pela doutrina e densificado pelo direito e jurisprudência comunitários passados em revista, releva necessariamente no conceito de empresa para os fins da aludida Base.

É em similares condições apodíctico que o aval do Estado pode ser concedido, por exemplo, a uma associação de direito privado de fim não lucrativo titular de uma empresa ([15]).

4.4 Radicalmente diferente é a interpretação do parecer, fazendo, ao que parece, equivaler a expressão «empresa» da Base I ao conceito de empresa comercial e de sociedade comercial.

Mas isso, tudo ponderado, por apelo fundamentalmente a um argumento histórico.

A Câmara Corporativa, apreciando a proposta governamental que originou a Lei n.º 1/73, foi de parecer que à expressão «sociedades anónimas nacionais», constante da Base I da proposta, seria preferível a expressão «empresas privadas nacionais»([16]), com o fundamento de que «poderão verificar-se casos em que se justifique a concessão de avales pelo Estado a sociedades não anónimas». E este entendimento, subscrito também pelas Comissões de Finanças e de Economia da Assembleia Nacional, acabou por obter consagração legal.

O argumento será, portanto, este: dos trabalhos preparatórios da Lei n.º 1/73 resulta que se parificou o conceito «empresa» com o de sociedade comercial.

Desde logo, acho muito difícil sustentar que tenha sido essa a «vontade real» do «legislador histórico»([17]).

Basta notar que as Comissões de Finanças e de Economia se limitaram a declarar, quanto ao aspecto em causa, sendo os frisados meus: «Em relação à Base I subscreve-se a fórmula proposta pela Câmara Corporativa, tornando-a ainda mais ampla, de forma a cobrir todas as empresas nacionais, privadas ou públicas, de economia mista ou não. Apenas se sugere que no critério selectivo sejam tidas em conta as características a que devem obedecer as ditas empresas nacionais».

Foi consequentemente proposta e aprovada no plenário a substituição da expressão da Câmara Corporativa «empresas privadas nacionais» pela expressão «empresas nacionais» que veio a figurar na Lei.

Aliás, se fosse aquela a vontade do legislador histórico, a designação inequívoca «sociedade comercial» teria provavelmente sido utilizada, como bem observa GARCIA MARQUES (ponto 4., in fine).

O que, bem ao invés, se deve objectivamente registar é que, preferindo-se a essa a expressão «empresas nacionais», se proporcionou ao Governo uma maior latitude de actuação e a possibilidade de fazer intervir na prossecução dos interesses nacionais um número superior e mais diversificado de actividades empresariais.

Ilação, de resto, em perfeita sintonia com a «maleabilidade» e o carácter «realista» e «factual» do direito administrativo económico, que se manifesta, segundo LAUBADÈRE ([18]), «na relativa imprecisão das suas normas e, por consequência, na extensão da liberdade de apreciação que consente à administração, ou, por outras palavras, na extensão daquilo que se chama em direito administrativo o poder discricionário desta última».

Uma «imprecisão voluntária» explicável, em resumo, «pela dificuldade que o direito experimenta (...) em apreender os fenómenos económicos e dominá-los» ([19]).

Ainda, porém, que a vontade do legislador histórico fosse aquela que o parecer sustenta, nem por isso seria esse o critério decisivo da interpretação.

Por força do artigo 9º, n.º 1, do Código Civil a interpretação deve ter em conta as circunstâncias em que a lei foi elaborada, assim como as condições específicas do tempo em que é aplicada.

Ora, a interpretação histórica do parecer desvaloriza em extremo este segundo parâmetro.

Além do mais, «o novo direito administrativo económico (...) o direito das intervenções actuais do Estado na economia», «é um direito jovem, recente». E não apenas jovem, mas um direito que «está, pelo menos em parte, em gestação»([20]).

Entende-se, nessa medida, que determinada evolução se tenha verificado na respectiva teorização desde 1972, uma época marcada, aliás, por especificidades da economia portuguesa sem paralelo no presente, 30 anos volvidos.

E os progressos da ciência do direito das empresas não são igualmente factor discipiendo em quanto à nossa questão interpretativa concerne.

Concluo, pois, que o argumento do parecer acabado de apreciar não vale, salvo o devido respeito, para afastar o conceito de empresa há pouco esboçado.


5. É tempo de pôr à prova das reflexões antecedentes a natureza jurídico-concreta da UGT.


5.1 Natureza jurídico-concreta, necessariamente.

Não foi a UGT, caracterizada em geral como confederação de sindicatos, associação sindical ou pessoal colectiva de direito privado que se tornou destinatária do aval. Mas a UGT configurada pelo despacho autorizativo em certa veste, confinada a um circunstancialismo aferido pela prática de actividades determinadas, interveniente numa operação bancária visando finalidades específicas e não outras.

É nesta configuração concreta, de que não pode abstrair-se, que a UGT há-de, pois, merecer ou desmentir a qualificação de «empresa nacional».

O que, numa palavra, se afigura problemático não é saber, em tese, se uma associação sindical pode teoricamente ser qualificada empresa, mas se a UGT, no condicionalismo que relevou para a concessão do aval - não coincidente, necessariamente, com o que relevaria a respeito de qualquer outro beneficário, sindicato ou não - pode ser considerada como tal para efeitos da Base I.

Pois bem. Esta perspectiva supõe obrigatoriamente se tome em devida consideração a fundamentação factual do despacho, que não cabe aqui questionar.

O Conselho Consultivo não dispõe, aliás, de outros factos além desses, carecendo, ademais, de competência para investigar nesse domínio.

Mas pode, obviamente, extrair presunções com base na factualidade aludida, e não lhe está vedado socorrer-se dos factos notórios com interesse no tratamento jurídico da questão.

O que tudo não esgotará, porventura, o universo dos factos relevantes.


5.2. Qual, nestes termos, a factualidade disponível?

A “ficha técnica” anexa ao despacho imediatamente revela a finalidade do mútuo celebrado entre a UGT e a CGD com aval do Estado: «consolidação de passivos bancários e liquidação de dívidas a formandos e a fornecedores resultantes da promoção de acções de formação profissional” (frisado meu) ([21]) ([22]).

Justamente, as «acções de formação profissional promovidas pela UGT, a partir de 1986 - sublinho do ponto 1.3. do despacho - e que se desenvolveram até ao final de 1996 e abrangeram milhares de formandos, (...) permitiram aumentar a qualificação profissional dos trabalhadores e propiciaram novas oportunidades de emprego para milhares de formandos, contribuindo desta forma para a redução do desemprego (...)».

Em terceiro lugar, o ponto 1.7. do mesmo despacho salienta que «as características económicas, estrutura financeira e orgânica administrativa da UGT oferecem ao Estado garantias suficientes quanto à sua capacidade para fazer face às responsabilidades financeiras que pretende assumir(...)» - as quais, observe-se, ascendem ao montante de 600.000 contos de capital mutuado, sem contar com os juros.

Finalmente, creio ser do domínio público que a UGT foi financiada pelo Fundo Social Europeu, aquele, precisamente, dos Fundos estruturais comunitários que tem como privilegiado escopo a formação e orientação profissional ([23]).

Face aos elementos descritos, é legítima a ilação de que a UGT promoveu, durante 10 anos, importantes acções de formação profissional que não poderiam conceber-se sem a mobilização de recursos humanos, financeiros e de know-how, finalisticamente organizados e geridos, de forma estável e duradoura, em ordem à consecução daqueles fins, cujo carácter económico não pode ser questionado ([24]).

Havendo que ministrar formação, tal implicava, naturalmente, o recrutamento e a preparação de pessoal docente e auxiliar, a selecção, orientação e docência dos formandos, o pagamento das remunerações devidas a uns e a outros; providenciar instalações, prover à sua manutenção, conservação e funcionamento; assegurar matérias-–primas, meios energéticos, informáticos, sistemas de comunicações; a celebração dos contratos atinentes à satisfação dessas diversas necessidades; a elaboração de projectos e programas, a definição e implementação de estruturas organizatórias, contabilísticas e de gestão do cosmos votado a prossecução das actividades de formação profissional.

Com toda a probalidade, os custos financeiros envolvidos foram assegurados pelas contribuições do Fundo Social Europeu de que a UGT beneficiou.

Mas, se assim é, então parece que tudo se reconduz, esse complexo organizado de capital, trabalho, know-how e gestão, ao conceito de empresa a que há pouco se chegou.

A UGT constituiu provavelmente uma verdadeira empresa, ou promoveu a constituição de empresas para a realização das actividades em causa, no sentido da Base I da Lei 1/73, não se tornando essencial, na tónica em que nos situamos, curar dos concretos procedimentos jurídicos adrede licitamente utilizados, que o Conselho Consultivo, de resto, desconhece.

Esquecer esta realidade, como quer que especificamente se configure, pretendendo subsumir ao conceito «empresa» da citada Base a UGT na mera natureza abstracta de associação de direito privado, seria despojá-la de um elemento essencial de convocação da norma, maxime a marca de economicidade, antes posta em relevo, nesta indelevelmente impressa.

Concluo, pois, não se verificar muito provavelmente o primeiro fundamento de ilegalidade do despacho ministerial, sentido em que concorre também a ponderosa argumentação vertida nos pontos 3.3.2., 4. e 5. do voto do meu Exm.º Colega Dr. Garcia Marques, para que com a devida vénia remeto.


III

Resta o segundo motivo de ilegalidade apontado no parecer - a violação do princípio da independência e autonomia das associações sindicais consagrado nos artigos 55º da Constituição e 6º, nº2, da Lei Sindical -, tema em que pouco tenho a acrescentar às considerações emitidas também no ponto 6. do mesmo voto.

A violação do princípio é analisada no parecer em duas vertentes: a proibição de ingerência do Estado na organização e direcção das associações sindicais; a proibição de financiamento destas por aquele.




1. Quanto à primeira vertente, pondera-se que, nos termos da Base X da Lei nº 1/73, a “concessão do aval do Estado confere ao Governo o direito de fiscalizar a actividade da entidade beneficiária da garantia, tanto do ponto de vista técnico e económico como do ponto de vista administrativo e financeiro”.

É para mim seguro, no entanto, que a fiscalização tem de se limitar aos estritos aspectos relacionados com a operação de crédito e a destinação da quantia mutuada às finalidades relacionadas com a formação profissional que lhe vão implicadas, podendo e devendo necessariamente conformar-se na prática com o núcleo essencial da liberdade e autonomia de organização e direcção da associação sindical.

E isto, por certo, dentro de um nível de exigibilidade não superior ao da fiscalização a que a UGT, enquanto promotora de acções de formação profissional subvencionadas pelo Fundo Social Europeu, se subordinou, nos termos do direito comunitário e do direito interno conexo, quer por parte das instituições comunitárias, quer por banda do Estado português na sua posição de garante e co-–responsável nesse domínio ([25]).


2. No tocante à segunda vertente, admitindo que o aval do Estado deve ser considerado como “financiamento” no sentido em que o conceito está tomado no nº2 do artigo 6º da Lei Sindical - em contexto, aliás, arrevesado -, observaria apenas adicionalmente o seguinte.

O aspecto do financiamento não respeita ao núcleo essencial do princípio constitucional da independência das associações sindicais, como o parecer reconhece.

O artigo 55º da Constituição - diploma posterior ao Decreto-Lei nº215-B/75, de 30 de Abril - nem sequer alude a esse aspecto, muito embora detalhe pormenonizados tópicos na definição do domínio de compreensão do princípio.

E pode, porventura, aceitar-se que a concessão da garantia pelo Estado ao mútuo de direito privado celebrado entre a CGD e UGT constitui violação do citado preceito da Lei Sindical, quando, com toda a probabilidade, a UGT recebeu durante vários anos dinheiro do Fundo e dinheiro directamente dos cofres do Estado membro português, em aplicação dos direitos comunitário e interno relativos às subvenções do mesmo Fundo ([26])?

A UGT pôde, ao abrigo dessa normação, aceder a tais financiamentos.

Creio, por conseguinte, que alguma compressão/harmonização do nº 2 do artigo 6º da Lei Sindical com aqueles direitos se deve ter como hermeneuticamente fundada, sob pena de se verificar, porventura, um conflito insanável, redundando, quiçá, na neutralização daquele preceito.

Outro dos problemas que na economia do presente voto - pese a sua extensão, de que me penitencio - não é, obviamente, possível investigar em todas as implicações.



([1]) Despacho nº 122/97 - XIII, de 7 de Março de 1997, “Diário da República”, II Série, n.º 77, de 2 de Abril, pág. 3887.
([2]) Sobre o tema, mesmo na óptica peculiar da empresa comercial, remeto, por todos, para a preclara lição, ornada de ricos subsídios comparatísticos, de FERNANDO OLAVO, Direito Comercial, vol. I, 2.ª edição, Lisboa 1974, pág. 248 e segs., e, especialmente, 252 e seguinte.
Registando o conceito de empresa perfilhado pela “grande parte dos autores” - “a actividade profissionalmente exercida e dispondo de organização em ordem à realização de fins de produção ou troca de bens e de serviços” -, aquele autor escreve, justamente, que o artigo 230º do Código Comercial “emprega a expressão empresa em sentido subjectivo, reportando-se ao empresário (...) já que só os empresários, pessoas jurídicas - singulares ou colectivas, precisa -, se podem propor algo”, isto é, os escopos enumerados no artigo.
”Mas - adverte - se é certo que o artigo 230º alude às empresas em sentido subjectivo, não o é menos que vem a caracterizá-las pelo seu objecto, por aquilo que o empresário há-de exercer, em suma, pela empresa em sentido objectivo“.
É tema a que adiante se retornará (cfr. infra, 4.2.).
([3]) Uma escolha bem elucidativa no actual panorama da doutrina nacional (COUTINHO DE ABREU, PUPO CORREIA, PEREIRA DE ALMEIDA, JOÃO LABAREDA, CARVALHO FERNANDES/LABAREDA, MENEZES CORDEIRO, MANUEL AFONSO VAZ) pode ver-–se em MANUELA REGO, A definição legal de subsídio ou subvenção, comunicação ao Seminário sobre «Criminalidade no Domínio da Obtenção e Utilização de Subsídios», levado a efeito na Arrábida em Março de 1996, Separata do «Boletim do Ministério da Justiça», n.º 454, págs. 90 e segs. ¾ concepções a que nos pontos 3.1. e 3.2. do voto de vencido do meu Exmo. Colega Dr. Garcia Marques se confere a merecida saliência.
Na comercialística cfr., por exemplo, FERNANDO OLAVO, op. loc. cit. supra, nota 2, e, mais recentemente, PINTO FURTADO, Curso de Direito das Sociedades, 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 1986, págs. 228 e segs., com a inabarcável bibliografia, nacional e estrangeira, a que recorrem.
([4]) Apud MANUELA REGO, op. cit., pág. 90.
([5]) FRANCESCO GALGANO, L’Impresa, «Trattato di Diritto Commerciale e di Diritto Pubblico dell’Economia», 2.º vol., Padova, CEDAM, 1978, págs. 55 e segs., que por momentos acompanho.
([6]) Caso Van Landewyck/Comissão, processos apensados n.ºs 209 a 215 e 218/78, «Recueil», págs. 3125 e segs., especialmente o considerando n.º 88, pág. 3250.
([7]) Caso Höfner e Elser/Macroton GmbH, processo n.º C-41/90, «Colectânea», págs. I-2010 e segs., considerandos n.ºs 21, 22 e 23, págs. I-2016/2017.
([8]) GALGANO, op. cit., pág. 15.
([9]) GALGANO, Idem, pág. 19.
([10]) GALGANO, Ibidem..
([11]) GALGANO, Idem, pág. 21.
([12]) Caso Mannesmann Aktiengelellschaft/Alta Autoridade da CECA, processo n.º 19/61, «Recueil», págs. 705 e seguintes.
([13]) Assim se aflora a denominada característica da «profissionalidade». Como entendê-la?
A doutrina pondera que a «profissionalidade no exercício da actividade da empresa não pretende designar um estado pessoal ou uma condição social, mas apenas a «estabilidade» ou «não ocasionalidade» da actividade exercitada.
Não tem que tratar-se, porém, de uma actividade ininterrupta. O que conta é a «habitualidade», a «repetição» constante da actividade económica.
Por outro lado, esta actividade pode não ser a única nem a principal actividade do sujeito, e configurar-se antes como «acessória ou marginal» com respeito a outras, não económicas, por ele desenvolvidas.
Incompatível com o requisito da profissionalidade é só o cumprimento ocasional de um negócio: uma isolada compra seguida de revenda, uma operação isolada de mediação, mesmo que dêem lugar a uma pluralidade de actos coordenados e, por isso, a uma “actividade”, mas circunscrita dentro de modestos limites temporais, não originam, todavia, uma actividade profissional.
Mas isso não significa que um único negócio não possa implicar o desenvolvimento de actividades no tempo com características de profissionalidade.
A duração e a estabilidade podem, com efeito, estar presentes em uma única operação técnico-económica, cuja complexidade exija adequada organização e o decurso de considerável período de tempo - v.g., a construção de um edifício e a sucessiva venda dos apartamentos, ou a construção de uma estrada.
No sentido exposto, GALGANO, op. cit., págs. 52 e segs.; cfr, também ANTEO GENOVESE, La nozione giuridica dell’impreditore, CEDAM, Padova, 1990, págs. 21 e seg., que fala de «potencialidade de duração, objectiva e recognoscível», contendo «um elemento de necessidade relativo ao cumprimento» do objectivo proposto.
([14]) JEAN-PHILIPPE ROBÉ, L’ordre juridique de l’entreprise, «Droits. Revue Française de Théorie, de Philosophie et de Culture Juridique», n.º 25, Abril de 1997, págs. 163/164.
([15]) Evidentemente que outros requisitos devem ser preenchidos - o aval, por exemplo, só pode ser prestado « quando se tratar de financiar empreendimentos ou projectos de manifesto interesse para a economia nacional», reza a Base II, n.º 1, da Lei n.º 1/73 -, mas esses nada têm a ver com o conceito de empresa da Base I, não podendo, em boa lógica, ser utilizados como elementos «teleológicos» ou «sistemáticos» na delimitação desse conceito, sob pena de se entrar num círculo algo inextricável.
Como o parecer acentua, trata-se de requisitos cumulativos. E se a verificação do requisito ora exemplificado não supre a falta dos requisitos da Base I, também a inversa é verdadeira, evidenciando-se por aí uma recíproca independência.
([16]) «Privadas» porque a Câmara entendia - citando MARCELO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, tomo I, 9ª edição, Lisboa, 1970, pág. 365 - que as empresas públicas estavam compreendidas nos «institutos públicos», paralelamente acolhidos na Base I da citada proposta.
([17]) Se é que semelhantes mitos podem mesmo revestir-se de apreciável valor hermenêutico para o intérprete, colocado este, nas ordens contemporâneas, ante a complexa teia de intervenções plurissubjectivas, burocrático-administrativas e parlamentares, conducentes à feitura das leis.
([18]) ANDRÉ DE LAUBADÈRE, Direito Público Económico, Almedina, Coimbra, 1985, págs. 112/113.
([19]) LAUBADÈRE, Ibidem.
([20]) LAUBADÈRE, Idem, pág. 110.
([21]) A finalidade assinada ao mútuo, traduzindo um pressuposto essencial em que assentou o despacho de autorização do aval, de modo algum pode ser ilidida pela aplicação das verbas mutuadas a fins diferentes, o que redundaria, aliás, na completa subversão do regime da Lei n.º 1/73.
([22]) No plano factual agora em foco, afigura-se-me infundada a leitura que o parecer faz, na nota 28, do citado passo da “ficha técnica”, no sentido de que os passivos bancários não são «resultantes da promoção de acções de formação profissional», segmento, todavia, naturalmente bem posicionado, em termos gramaticais, para os abranger.
A afirmação, por seu turno, de que o mútuo não se destina «à promoção de acções de formação profissional», mas sim à liquidação de dívidas «resultantes da promoção daquelas acções», deve ser articulada com o passo do subsequente ponto 2.2. do parecer, segundo o qual a «lei abrange quer os projectos ou empreendimentos que vão ser desenvolvidos, quer os que, tendo-o sido, se encontram numa situação de risco ou de ruptura que importe superar e que é superável mediante a operação de crédito avalizada», havendo «nesta parte uma inquestionável margem de discricionaridade, inerente ao desenvolvimento da actividade administrativa».
([23]) Sobre os mecanismos de funcionamento das subvenções do Fundo Social Europeu, veja-se o parecer do Conselho n.º 9/92, emitido em 25 de Fevereiro de 1994 a pedido de Sua Excelência o Senhor Ministro do Emprego e Segurança Social do anterior Governo, ainda pendente de homologação; cfr., também MARIA DE FÁTIMA GONÇALVES, Fundo Social Europeu, Separata citada supra, págs. 45 e seguintes.
A finalidade «estrutural» dos Fundos - explica-se na nota 33 desse parecer - significa que os mesmos «visam substancialmente a realização de investimentos, públicos ou privados, e não a simples cobertura de despesas correntes».
([24]) Acho, porém, que seria inviável atribuir natureza comercial às aludidas acções de formação profissional, em face da filosofia adversa do Fundo Social Europeu, induzida, além do mais, da gratuitidade dos subsídios e das proibições de sobrefinanciamento (cfr., v.g., o artigo 5.º, nº 5, da Decisão do Conselho nº 83/516/CEE) e de obtenção de «mais-valias”. Cfr. o citado Parecer nº 9/92 e MORAIS ANTUNES, A Gestão do Inquérito, Separata citada supra, nota 3, pág. 26.
([25]) Aspectos de regime detalhados no mesmo parecer nº 9/92, e no estudo citado supra, nota 23, para que se remete.
([26]) Também acerca deste ponto, evidenciando-se a normal comparticipação do Estado membro a favor dos promotores das acções de formação subvencionadas pelo Fundo, veja-se, uma vez mais, o parecer nº 9/92.



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1) Informação nº 35/97, de 9 de Abril de 1997.
2) Diário da República, II Série, nº 77, de 2 de Abril de 1997.
3) Mantém-se em vigor o Decreto-Lei nº 45 337, de 4 de Novembro de 1963, que não foi objecto de revogação e constitui lei especial quanto a garantias a prestar a operações de crédito externo a realizar entre o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento e empresas ou bancos nacionais. Deve ainda ter-se em consideração o Decreto-Lei nº 127/96, de 10 de Agosto, que define o regime e sistema de garantia do Estado a empréstimos bancários (SGEEB) no âmbito do quadro de acção para a recuperação de empresas em situação financeira difícil (QARESD), aprovado pela Resolução de Conselho de Ministros nº 100/96.
4) O parecer nº 25/88, de 24 de Maio de 1989, do Conselho Consultivo (Diário da República, II Série, nº
196, de 25 de Agosto de 1990; Boletim do Ministério da Justiça, nº 397, p. 5) dá-nos conta, quer dos antecedentes da Lei nº 1/73 e respectivo processo legislativo, quer dos esforços (baldados) posteriormente desenvolvidos com vista à reformulação do regime jurídico dos avales do Estado e ao seu mais perfeito ajustamento ao ordenamento constitucional.
Omitimos, por isso e por não ser essencial à economia do parecer, o desenvolvimento desta matéria, sem prejuízo de uma ou outra referência pontual considerada oportuna.
5) Versão da Lei Constitucional nº 1/89, de 8 de Julho
(2ª revisão), correspondente à alínea h) do mesmo artigo 164º, na versão da Lei Constitucional nº 1/82, de 30 de Setembro (1ª revisão). A fixação do limite máximo dos avales do Estado competia antes ao Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos (base II, nº
3, da Lei nº 1/73).
Para o ano corrente, o artigo 66º, nº 1, da Lei nº 52-
C/96, de 27 de Dezembro (Orçamento do Estado para 1997), estabelece: «O limite para a concessão de avales e outras garantias do Estado é fixado, em termos de fluxos líquidos anuais, e para operações financeiras internas e externas, em 450 milhões de contos:.
6) Cfr., por exemplo, os artigos 57º da Lei nº 30-C/92, de 28 de Dezembro, 61º da Lei nº 75/93, de 20 de Dezembro, 71º da Lei nº 39-B/94, de 27 de Dezembro,
64º da Lei nº 10-B/96, de 23 de Março, e 66º da Lei nº 52-C/96, de 27 de Dezembro. Sobre a conformidade constitucional deste procedimento, v. o acórdão nº 205/87, do Tribunal Constitucional (Diário da República, I Série, nº 150, de 3 de Julho de 1987, e Boletim do Ministério da Justiça, nº 368, p. 205).
7) Cfr. os pareceres nºs 25/88, já referido, e 220/81 (complementar), de 18 de Abril de 1985 (inédito);
MANUEL AFONSO VAZ, Direito Económico - A Ordem Económica Portuguesa, Coimbra, Coimbra Editora, 1984, p. 151; CARLOS FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Económico,
2ª parte, edição da A.A.F.D.L., 1979, pp. 537-544;.
ANTÓNIO CARLOS SANTOS, MARIA EDUARDA GONÇALVES E MARIA MANUEL LEITÃO MARQUES, Direito Económico, 2ª edição,
Coimbra, Almedina, 1995, pp. 254-256.
*) V. nota 5.
**) Hoje director-geral do Tesouro.
8) ANTÓNIO L. DE SOUSA FRANCO, Finanças Públicas e Direito Financeiro, 4ª edição (3ª Reimpressão), volume
II, Coimbra, Almedina, 1996, pp. 142-145; GUILHERME DE OLIVEIRA MARTINS, Dicionário Jurídico da Administração Pública, volume IV, entrada «Dívida Pública:, pp. 139-
140; CRISPIM ÂNGELO G. DE GOUVEIA, Manual de Técnica Financeira - o Tesoureiro Público Nacional, Lisboa,
1979, pp. 163-168; parecer nº 25/88, referido na nota
4.
9) Eventualmente, também pelas Regiões Autónomas (ANTÓNIO L. DE SOUSA FRANCO, ob. cit., p. 143, e GUILHERME DE OLIVEIRA MARTINS, ob. cit., p. 140). Não, todavia, por entidades estrangeiras (parecer nº 25/88).
10) Abstraímos das «províncias ultramarinas: e da questão de saber se do elenco fazem agora parte as Regiões Autónomas. Anote-se, porém, que o nº 4 do artigo 66º da Lei nº 52-C/96, de 27 de Dezembro - repetindo um procedimento que vem já da Lei nº 2/88, de 26 de Janeiro (artigo 10º, nº 4) - fixa para as Regiões Autónomas uma taxa de aval específica, diversa da taxa prevista no nº 2 da base XI da Lei nº 1/73.
11) Curso de Direito Administrativo, vol. I, 2ª edição (Reimpressão), Coimbra, Almedina, 1996, p. 345; cfr. também JOÃO CAUPERS, Direito Administrativo - Guia de Estudo, Equitas - Editorial Notícias, pp. 228-229.
12) ANTÓNIO CARLOS SANTOS et alii, ob. cit., p. 139.
13) DIOGO FREITAS DO AMARAL, "A Função Presidencial nas Pessoas Colectivas de Direito Público", em Estudos de Direito Público em Honra do Professor Marcello Caetano, Lisboa, Edições Ática, 1973, pp. 21 e 31;
MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, vol. I, 10ª edição (reimpressão), revista e actualizada por Diogo Freitas do Amaral, Coimbra,
Almedina, pp. 187-190.
14) Cfr. FREITAS DO AMARAL, Curso., vol. cit, pp. 331-
333; MARCELLO CAETANO, ob. cit, loc. cit. e pp. 372-
382; ANTÓNIO CARLOS SANTOS et alii, ob. cit., pp. 139-
142.
15) Essencialmente por razões de ordem pragmática, tem- se, com alguma frequência vindo a optar, quanto ao estatuto do pessoal dos institutos públicos, pelo regime jurídico-laboral do contrato individual de trabalho - cfr., por exemplo, o artigo 30º do Decreto-
Lei nº 388/86, de 18 de Novembro (aprova a orgânica do
ICEP - Instituto do Comércio Externo de Portugal); o artigo 32º do Decreto-Lei nº 387/88, de 25 de Outubro
(cria o Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento); o artigo 66º dos Estatutos do Instituto Nacional para o Aproveitamento dos Tempos Livres dos Trabalhadores - INATEL (aprovados pelo artigo 1º do Decreto-Lei nº 61/89, de
23 de Fevereiro); o artigo 30º, nº 1, do Decreto-Lei nº 280/89, de 23 de Agosto, alterado pelo Decreto-Lei nº 118/94, de 5 de Maio (aprova os Estatutos do Instituto Nacional de Estatística); o artigo 24º do Decreto-Lei nº 283/89, de 23 de Agosto (aprova os novos Estatutos do Instituto das Comunicações de Portugal).
16) Actas da Câmara Corporativa, nº 86, de 19 de Janeiro de 1972.
17) Pareceres (X Legislatura) - Ano de 1972, vol. III, pp. 248-249.
18) Cfr. Diário das Sessões, nº 196, de 17 de Novembro de
1972.
19) A discussão da Proposta de Lei nº 20/X pode ver-se no Diário das Sessões, nºs 196, 197, 198 e 199, respectivamente de 17, 22, 23 e 24 de Novembro de
1972.
20) Cfr. ANTÓNIO CARLOS SANTOS et alii, ob. cit., p. 182;
ALFREDO DE SOUSA, Análise Económica, Universidade Nova de Lisboa, Faculdade de Economia, pp. 93-96; ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Direito da Economia, 1º volume,
Lisboa, Associação Académica da Faculdade de Direito,
1986, pp. 230-234; JORGE MANUEL COUTINHO DE ABREU,
«Definição de Empresa Pública:, no Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra,
Suplemento vol. XXXIV, Coimbra, 1991, p. 298 e ss.;
PAUL A. SAMUELSON e WILLIAM D. NORDHAUS, Economia, 12ª edição, McGraw-Hill, pp. 49-56 e 1119; IVA CARLA VIEIRA e MARIA MANUEL BUSTO, Manual Jurídico da Empresa, Porto, Elcla Editora, p. 17 e segs.
21) A expressão é de SOUSA FRANCO, Nota sobre o Princípio da Liberdade de Comércio, separata do Boletim do Ministério da Justiça, nº 355, p. 9.
22) Cfr. Nicole Catala, L'Entreprise, tomo 4 de Droit du Travail, Dalloz, Paris, 1980, pp. 132-140.
23) Por exemplo, o artigo 2º do Código dos Processos Especiais de Recuperação de Empresa e da Falência define empresa como «toda a organização dos factores de produção destinada ao exercício de qualquer actividade agrícola, comercial, industrial ou de prestação de serviços:.
Para a noção legal de empresas públicas, v. o artigo
1º do Decreto-Lei nº 260/76, de 8 de Abril.
24) ANTÓNIO L. SOUSA FRANCO, ob. cit. na nota 21, p. 15.
Numa outra obra (Noções de Direito da Economia, vol.
I, ed. da AAFDL, Lisboa, 1982-1983, pp. 109-112), o mesmo autor define as empresas capitalistas através de três características fundamentais: têm um património autónomo, afecto especificamente à produção especializada de certos bens ou serviços; baseiam a sua organização na contribuição diferenciada dos factores de produção, e não numa sua contribuição indiferenciada; a contribuição dos diversos factores de produção é prestada recorrendo ao princípio do mercado e em função do seu preço.
25) Porém, numa interpretação actualista da Lei nº 1/73, crê-se não haver obstáculo jurídico à subsunção ao conceito de empresas de certas formas típicas resultantes da cooperação interempresarial é, por exemplo, o caso dos agrupamentos complementares de empresas (a que se referem a Lei nº 4/73, de 4 de Junho, e o Decreto-Lei nº 430/73, 25 de Agosto) e dos consórcios (cujo regime jurídico é estabelecido pelo Decreto-Lei nº 231/81, de 28 de Julho).
Sobre a inviabilidade de um conceito unitário de empresa, demonstrada a partir do direito comunitário da concorrência e do direito do trabalho, v. COUTINHO
DE ABREU, Da Empresarialidade - As Empresas no Direito, Colecção Teses, Coimbra, Almedina, p. 282 e ss.
26) Boletim do Trabalho e Emprego, 3ª Série, nº 9, de 30 de Março de 1993.
27) Decreto-Lei nº 215-B/75, de 30 de Abril.
28) É nesta óptica que deve ser enquadrada a actuação das associações sindicais quando, na qualidade de operadores privados, promovem acções de formação profissional no âmbito da actividade do Fundo Social Europeu (sobre o regime jurídico das actividades de formação profissional, v. o Decreto-Lei nº 401/91, de
16 de Outubro). Todavia, importa frisar que o empréstimo, de acordo com a «ficha técnica: referida em II, não se destina à promoção de acções de formação profissional, mas sim à consolidação de passivos bancários (cuja proveniência se ignora) e à liquidação de dívidas a formandos e a fornecedores resultantes da promoção daquelas acções.
A função, natureza e processo de actuação do Fundo Social Europeu, bem como questões relacionadas com a restituição de quantias indevidamente aplicadas, são analisadas no parecer nº 9/92 do Conselho Consultivo, de 25 de Fevereiro de 1994 (pendente de homologação).
29) Cfr. ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito do Trabalho, Coimbra, Almedina, 1991, pp. 118-121 e 443 e segs., maxime pp. 454-456; ANTÓNIO DE LEMOS MONTEIRO FERNANDES, Noções Fundamentais de Direito do Trabalho,
2, Coimbra, Almedina, 1990, p. 69; CARLOS ALBERTO DA
MOTA PINTO, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª edição actualizada (6ª reimpressão), Coimbra, Coimbra Editora, Limitada, 1992, pp. 287-288.
30) V., para mais desenvolvimentos, o parecer nº 39/95 do Conselho Consultivo, de 20 de Dezembro de 1995 (inédito).
31) No ordenamento jurídico anterior a 25 de Abril de
1974, isto é, ao tempo do início da vigência da Lei nº
1/73, os sindicatos nacionais eram considerados organismos corporativos primários, sendo organismos intermédios as federações e as uniões; os organismos corporativos eram obrigatórios - os «criados por lei especial ou ao abrigo de lei geral que permita impor a obrigação de inscrição neles de quantos exerçam a actividade ou profissão representada:, sendo, por isso, considerados pessoas colectivas de direito público - ou facultativos - os que «resultam de iniciativa dos interessados, os quais requerem a respectiva criação e solicitam ao Ministério das Corporações a aprovação dos estatutos que, uma vez concedida, implica o reconhecimento da personalidade jurídica: (estes eram considerados pessoas colectivas de direito privado e regime administrativo) (MARCELLO CAETANO, ob. e vol. cits., pp. 383-390).
32) V. Projecto de Lei nº 31/I, do PSD (Diário da Assembleia da República, nº 50-S, de 4 de Dezembro de
1976, e nº 107-S, de 11 de Maio de 1977); Proposta de
Lei nº 52/I (Diário da Assembleia da República, nº 82-
S, de 5 de Março de 1977, e nº 110-S, de 18 de Maio de 1977); Projecto de Lei nº 80/I, do PSD (Diário da Assembleia da República, II Série, nº 8, de 18 de Novembro de 1977); Projecto de Lei nº 163/II, do Deputado da ASDI, Sousa Franco (Diário da Assembleia da República, II Série, nº 40, de 13 de Março de 1981); Projecto de Lei nº 116/III, da ASDI (Diário da Assembleia da República, II Série, nº 10, de 28 de
Junho de 1983); Projecto de Lei nº 260/IV, do PRD (Diário da Assembleia da República, II Série, nº 89, de 16 de Julho de 1986).
33) V., supra, notas 6, 9 e 10.
34) Cfr. J. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Coimbra, Almedina, 1987, p. 182.
35) Cfr. J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA,
Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª edição revista, Coimbra Editora, 1993, p. 299 e segs.;
JORGE MIRANDA, Manual de Direito Constitucional, tomo
IV, 2ª edição, Coimbra Editora, Limitada, p. 415;
MENEZES CORDEIRO, ob. cit., p. 145; MONTEIRO FERNANDES, ob. cit., pp. 55-64. Também o Conselho Consultivo se pronunciou já, por diversas vezes, sobre a liberdade sindical: v., por exemplo, os pareceres nºs 15/79, de 19 de Abril de 1979 (Diário da República, II Série, nº 142, de 22 de Junho de 1979), e 39/95, referido na nota 30.
36) V. artigo 23º, nº 4, da Declaração Universal dos Direitos do Homem; artigos 2º, 3º e 5º da Convenção nº
87 da Organização Internacional do Trabalho; artigo
11º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem; artigo 5º da Carta Social Europeia; artigo 8º do Pacto Internacional sobre Direitos Económicos, Sociais e Culturais; artigo 22º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos.
37) GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, ob. cit., p. 303.
38) G. H. CAMERLYNCK, GÉRARD LYON-CAEN e JEAN PÉLISSIER (Droit du Travail, 13ª edição, Paris, Dalloz, 1986, pp. 615-616) resumem o relacionamento entre os sindicatos e o Estado com a afirmação de que o movimento sindical goza de autonomia em relação ao Estado com a única condição de respeitar as leis; acrescentam que no Direito francês o sindicalismo é política e financeiramente independente do Estado, que não poderá atribuir aos sindicatos subsídios ou subvenções.
Em Espanha a liberdade sindical está consagrada no artigo 28º da Constituição e regulada na Lei Orgânica nº 11/1985, de 2 de Agosto, cujo artigo 13º considera ofensas à liberdade sindical os actos de ingerência consistentes em fomentar a constituição de sindicatos dominados ou controlados por um empregador ou uma associação patronal, ou em sustentar economicamente, ou por outra forma, sindicatos com o mesmo propósito de os controlar.
39) ANTÓNIO DE MORAIS SILVA, Novo Dicionário Compacto da Língua Portuguesa, vol. III, p. 50; Lello Universal, volume primeiro, p. 1008.
40) Seguimos aqui de perto ANTÓNIO CARLOS SANTOS et alii, ob. cit., pp. 254-255, e EDUARDO PAZ FERREIRA, "O Controlo das subvenções financeiras e dos benefícios fiscais", na Revista do Tribunal de Contas, nº 1, Janº- Março/89, p. 21 e segs. x) A. SOUSA FRANCO, Finanças Públicas e Direito Financeiro, Coimbra: Almedina, 1994, II Vol., p. 142.
O regime legal do aval do Estado consta da Lei nº
1/73, de 2 de Janeiro. Exige-se, nomeadamente, a sua indispensabilidade para que a operação se realize e a ligação desta a um empreendimento de interesse para a economia nacional ou em que o Estado tenha participação que justifique a garantia.
41) ANTÓNIO CARLOS SANTOS et alii, ibidem.
42) Ob. cit., pp. 541-544.
43) "Natureza jurídica da autorização parlamentar dos empréstimos", em O Direito, ano 122º, 1990, I (Janeiro- Março), p. 73 e segs., maxime pp. 92-93 e 132.
44) Ob. cit., p. 33. x1) Fonte: Banco de Portugal. x2) Lei nº 1/73, de 2 de Janeiro, Decreto-Lei nº 159/75, de 27 de Março, Decreto-Lei nº 346/73, de 10 de Junho.
Sucederam-se, no entanto, as iniciativas legislativas neste domínio, sem que qualquer delas tivesse sido aprovada. Vd. Projecto de Lei nº 31/1, Proposta de Lei nº 52/1, Projecto de Lei nº 80/1, Projecto de Lei nº 163/II e Projecto de Lei nº 116/III.
45) Pareceres nºs 229/79, de 10 de Abril de 1980, 130/79, de 12 de Fevereiro de 1981 (Diário da República, II Série, nº 203, de 4 de Setembro de 1981; Boletim do Ministério da Justiça, nº 308, p. 24), 220/81, de 28 de Abril de 1983 (Diário da República, II Série, nº 4, de 5 de Janeiro de 1984, Boletim do Ministério da Justiça, nº 332, p. 165; publicado também na Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 118º, p. 173) e 220/81, complementar (inédito).
46) COSTA FREITAS, «O aval do Estado, natureza jurídica e efeitos:, no Boletim da Ordem dos Advogados, nº 23,
Fevereiro/1984, p. 4 e segs.; ALBERTO LUÍS, Direito Bancário, Coimbra, Almedina, 1985, p. 177 e segs.;
RAÚL VENTURA, «Aval do Estado , vencimento da obrigação do Estado avalista:, na Revista da Banca, nº
4, Outubro-Dezembro 1987, p. 67 e segs.; EDUARDO PAZ FERREIRA, Da Dívida Pública e das Garantias dos Credores do Estado, Coimbra, Almedina, 1995, pp. 161-
163.
47) Pareceres nºs 25/88, referido na nota 3, 40/90, de 7 de Novembro de 1991 (Diário da República, II Série, nº
168, de 23 de Julho de 1992) e 23/92, de 24 de Março de 1994 (Diário da República, II Série, nº 139, de 18 de Junho de 1994).
48) JOÃO DE MATOS ANTUNES VARELA, Das Obrigações em geral, 5ª edição, revista e actualizada, Coimbra,
Almedina, 1992, p. 477.
49) Sobre a estrutura negocial da fiança, v. ANTUNES VARELA, ob. cit., p. 483 e segs.
50) Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, Colecção Teses, Coimbra, Almedina,
1987, p. 561. Cfr. também MARIA JOÃO ESTORNINHO,
Algumas questões de contencioso dos contratos da Administração Pública, Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1996, pp. 36-39, e A
Fuga para o Direito Privado - Contributo para o estudo da actividade de direito privado da Administração Pública, Colecção Teses, Coimbra, Almedina, 1996, p.
306 e segs..
51) Assim, AFONSO RODRIGUES QUEIRÓ, "Anotação" ao acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 2 de Outubro de
1979, na Revista de Legislação e de Jurisprudência,
113º ano, 1980-1981, nº 3670, pp. 197-198.
52) Cfr., para mais desenvolvimentos, MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e J. PACHECO DE AMORIM, Código de Procedimento Administrativo, 2ª edição, Coimbra, Almedina, 1997, pp. 650-651.
Sobre «o melindroso problema dos actos consequentes do acto anulado, isto é, daqueles actos administrativos praticados, ou dotados de certo conteúdo, em virtude da prática de um acto administrativo anterior:, já MARCELLO CAETANO defendia (Manual..., vol. II, 9ª edição, pp. 1217-1219) que «a anulação do acto antecedente implica a eliminação dos actos consequentes e dos respectivos efeitos, pois sem ela não ficará completa a reintegração da ordem jurídica violada, não terão sido apagados todos os vestígios da ilegalidade cometida:.
53) Algumas questões ..., pp. 34-36.
54) Onde se estabelece que «quem negoceia com alguém para conclusão de um contrato deve, nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte:.
55) Não significa isto que se mostrem de todo excluídas outras formas de responsabilidade, seja a responsabilidade contratual, seja a extracontratual.
A responsabilidade contratual provém, em termos gerais, da falta de cumprimento das obrigações emergentes dos contratos, de negócios unilaterais ou da lei.
Na responsabilidade extracontratual subjectiva, o Estado e demais pessoas colectivas públicas respondem civilmente perante terceiros pelas ofensas dos direitos destes ou das disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, resultantes de actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício (artigo 2º, nº 1, do Decreto-Lei nº 48 051, de 21 de Novembro de 1967). A obrigação de indemnizar existirá caso se verifiquem os pressupostos da responsabilidade do Estado que, com especificidades que será despiciendo assinalar, não diferem substancialmente dos pressupostos da responsabilidade civil do âmbito do direito privado - o acto ilícito (cfr. o artigo 6º do Decreto-Lei nº 48 051)a culpa, o prejuízo e a existência de nexo de causalidade entre o acto ilícito e o prejuízo cfr. JOÃO CAUPERS, ob. cit., p. 217 e segs., e pareceres do Conselho Consultivo nºs 138/79, de 20 de Dezembro de 1979 (Boletim do Ministério da Justiça, nº 298, p. 5), 68/92, de 12 de Maio de 1994, e 72/95, de 24 de Janeiro de 1996, estes inéditos.
Anotações
Legislação: 
L 1/73 DE 1973/01/02. DL 401/91 DE 1991/10/16.
CONST76 ART164 I ART55 N4. DL 159/75 de 1975/03/27.
DL 45337 DE 1963/11/04. DL 346/73 DE 1973/06/10.
DL 127/96 DE 1996/08/10. CPADM91 ART133 ART185.
L 30-C/92 DE 1992/12/28 ART57.
L 75/93 DE 1993 DE 1993/12/20 ART61.
L 39-B/94 DE 1994/12/27 ART71.
L 10-B/96 DE 1996/03/23 ART64.
L 52-C/96 DE 1996/12/27 ART66.
DL 388/86 DE 1986/11/18 ART30.
DL 387/88 DE 1988/10/25 ART32.
DL 260/76 DE 1976/04/08 ART 8 ART1.
DL 132/93 DE 1993/06/24.
DL 215-B/75 DE 1975/04/30 ART6.
Jurisprudência: 
AC TC 205/87 DR I SÉRIE DE 1987/07/03.
Referências Complementares: 
DIR FINANC / DIR ADM / DIR CIV * CONTRATOS / DIR TRAB * DIR SIND.*****
DUDH ART23 N4
CONVOIT87 ART2 ART3 ART5
CEDH ART11
CARTA SOCIAL EUROPEIA ART5
PIDESC ART8
PIDCP ART22
Divulgação
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