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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
32/1990, de 12.07.1990
Data do Parecer: 
12-07-1990
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Agricultura e Pescas
Relator: 
HENRIQUES GASPAR
Descritores e Conclusões
Descritores: 
REGULAMENTO DE EXECUÇÃO
IMPOSTO SOBRE O VALOR ACRESCENTADO
INCIDENCIA
ISENÇÃO FISCAL
FLORICULTURA
HORTICULTURA
PRODUÇÃO AGRICOLA
Conclusões: 
1 - A sujeição a imposto sobre o valor acrescentado das transmissões de bens e prestações de serviços no ambito das actividades referidas e isentas, nos termos do artigo 9, n 36, do Codigo do IVA (aprovado pelo Decreto-Lei n 394-B/84, de 26 de Dezembro), quando a isenção provoque distorções na concorrencia, nos termos do artigo 11 do Codigo do IVA, pressupõe a definição, por acto normativo, geral e abstracto, da Administração das situações e actividades relativamente as quais a previsão da norma se verifique;
2 - O Despacho Normativo n 51/86, de 5 de Junho de 1986, do Ministro das Finanças, emitido nos termos do artigo 11, do Codigo do IVA, constitui um regulamento de execução que concretiza relativamente a actividade de floricultura a previsão daquela norma, conjugada com o disposto no artigo 9, n 36 do mesmo diploma;
3 - A redacção do artigo 9, n 36, do Codigo do IVA, aprovado pelo Decreto-Lei n 394-B/84, de 26 de Dezembro e a versão desta norma operada atraves do artigo 1 do Decreto-Lei n 195/89, de 12 de Junho, traduzem o mesmo conteudo material (apresentando as modificações operadas apenas alteração formal de tecnica legislativa);
4 - Um regulamento emitido ao tempo de vigencia da anterior redacção de uma norma regulamentada, não fica afectado na respectiva vigencia pela alteração não substancial posterior da norma cuja previsão concretiza e desenvolve;
5 - Assim, o Despacho Normativo n 51/86, emitido ao tempo de vigencia da anterior redacção do artigo 9, n 36, do Codigo do IVA, modificado nos termos da conclusão 3, mantem integralmente a respectiva vigencia e validade como norma de execução da previsão do artigo 11, relacionado com o artigo 9, n 36, do referido diploma.
Texto Integral
Texto Integral: 
 
Senhor Secretário de Estado da Agricultura,
Excelência:
 
 
1.
 
A Direcção-Geral das Contribuições e Impostos do Ministério das Finanças e a Direcção-Geral do Planeamento e Agricultura do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação têm manifestado posições divergentes sobre o regime do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) aplicável às actividades de floricultura e horticultura floral e ornamental.
Vossa Excelência, despachando sobre uma informação da Direcção-Geral do Planeamento e Agricultura (1 onde se reconhece que "nesta matéria, quem representa os interesses do Estado, ao nível da administração, é a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos", determinou submeter todo o processo ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, a fim de obter parecer sobre o assunto.
Cumpre, assim, emitir parecer.
2.
 
A fixação do objecto da consulta impõe a delimitação dos termos em que se assume a divergência das referidas Direcções-Gerais.
A Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, através do Serviço de Administração do IVA, entende que os produtos de floricultura estão sujeitos a IVA à taxa de 17% a partir da definição operada através do Despacho Normativo nº 51/86, do Ministro das Finanças, de 5 de Junho de 1986 (2, emitido nos termos do artigo 11º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (3, com referência ao regime previsto no artigo 9º, nº 36º, deste diploma.
Na perspectiva dos referidos serviços, a modificação operada através do Decreto-Lei nº 195/89, de 12 de Junho, em várias disposições do Código do IVA, e nomeadamente no artigo 9º, nº 36, em nada afecta o anterior Despacho Normativo, emitido nos termos de uma norma (o artigo 11º) que se manteve inalterada.
Diversamente, a Direcção-Geral do Planeamento e Agricultura, sustenta que o referido Despacho Normativo de 1986 deixou de produzir efeitos, por caducidade, a partir do momento em que uma "nova solução legal" foi definida a contemplar o regime das operações a que se referia.
3.
 
O Decreto-Lei nº 394-B/84, de 26 de Dezembro, no uso de autorização legislativa conferida pelo artigo 22º da Lei nº 42/83, de 31 de Dezembro, aprovou o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (Código do IVA).
Procedeu-se, através deste diploma, a uma profunda reforma no sistema da tributação indirecta, traduzindo uma substancial alteração do modelo de tributação geral do consumo até então vigente (4.
O imposto sobre o valor acrescentado visa tributar todo o consumo em bens materiais e serviços, abrangendo na sua incidência todas as fases do circuito económico, desde a produção ao retalho, sendo, porém, a base tributável limitada ao valor acrescentado em cada fase (5.
Nos termos do artigo 1º do Código do IVA, estão sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado as transmissões de bens e as prestações de serviços efectuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal (alínea a)) e as importações de bens (alínea b)).
Os sujeitos passivos de imposto vêm enumerados nos nºs 1 a 3 do artigo 2º.
O conceito de transmissão de bens no âmbito de incidência do IVA consta do artº 3, nº 1, que dispõe considerar-se, em geral, transmissão de bens a transferência onerosa de bens corpóreos por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade (6.
O artigo 9º, relativo a isenção nas operações internas, enumera nos diversos números - 42 - variadas prestações de serviços, transmissões de bens e situações assim consideradas, isentas de imposto.
Entre as isenções previstas, o nº 36 do artigo 9º inclui as transmissões de bens efectuadas no âmbito das explorações enunciadas no Anexo A do Código, bem como "as prestações de serviços agrícolas definidas no Anexo B, quando efectuadas com carácter acessório por um produtor agrícola que utiliza os seus próprios recursos de mão-de-obra e equipamento normal da respectiva exploração agrícola s silvícola".
A redacção actual do nº 36 do artigo 9º, foi dada pelo artigo 1º do Decreto-Lei nº 195/89, de 12 de Junho.
A redacção anterior do referido nº 36 apresentava-se, do ponto de vista da forma, menos especificante. Dispunha: "as transmissões de bens e prestações de serviços efectuadas no âmbito de uma actividade agrícola, silvícola ou pecuária, de pesca em água doce, de piscicultura, ostreicultura e cultura de outros moluscos e crustáceos".
Por sua vez, o Anexo A, referido na actual redacção do artigo 9º, nº 36, e inserido no Código através do mencionado Decreto-Lei nº 195/89, tem o seguinte conteúdo, epigrafado de "lista das actividades de produção agrícola".
"I - Cultura propriamente dita:
1) Agricultura em geral, incluindo a viticultura;
2) Fruticultura (incluindo a oleicultura) e horticultura floral e ornamental, mesmo em estufas;
3) Produção de cogumelos, de especiarias, de sementes e de material de propagação vegetativa; exploração de viveiros.
Exceptuam-se as actividades agrícolas não conexas com a exploração da terra ou em que esta tenha carácter meramente acessório, designadamente as culturas hidropónicas e produção em vasos, tabuleiros e outros meios autónomos de suporte.
II - Criação de animais conexa com a exploração do solo, ou em que este tenha carácter essencial:
1) Criação de animais;
2) Avicultura;
3) Cunicultura;
4) Sericicultura;
5) Helicicultura;
6) Culturas aquícolas e piscícolas;
7) Canicultura;
8) Criação de aves canoras, ornamentais e de fantasia;
9) Criação de animais para obter peles e pêlo ou para experiências de laboratório.
III - Apicultura.
IV - Silvicultura.
V - São igualmente consideradas actividades de produção agrícola as actividades de transformação, efectuadas por um produtor agrícola sobre os produtos provenientes, essencialmente, da respectiva produção agrícola, com os meios normalmente utilizados nas explorações agrícolas e silvícolas".
O Decreto-Lei nº 195/89, de 12 de Junho, que operou modificações no Código do IVA, através da alterações de variadas disposições e revogação de outras, teve fundamentalmente por finalidade adaptar aquele Código à legislação comunitária e aos impostos sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) e das pessoas colectivas (IRC) (7.
Nesta finalidade se entende a referência no artigo 9º, nº 36 a um Anexo que passou a integrar o Código do IVA, enumerando uma lista de actividades de produção agrícola e, assim, especificando o sentido da redacção inicial, que apenas se referia a "actividade agrícola, silvícola ou pecuniária". Aquele Anexo, nomeadamente no respectivo nº 1, ('cultura propriamente dita'), tem por fonte imediata o Anexo A da 6ª Directiva (Directiva 77/388/CEE, de 17 de Maio de 1977, sobre o regime do imposto sobre o valor acrescentado - base tributável uniforme).
4.
 
Os artigos 1º a 8º integram o Capítulo I do Código do IVA, referente a incidência, e os artigos 9º a 15º, que constituem o capítulo II, prevêem as isenções.
Impõe-se, pois, em breve aproximação, algumas notas sobre os conceitos de 'incidência' e 'isenção'.
O conceito de incidência comporta um sentido amplo e um sentido restrito. "Em sentido amplo, abrange o complexo de pressupostos de cuja conjugação resulta o nascimento da obrigação de imposto, assim como os elementos da sua obrigação" (8.
A incidência, nesta acepção, "comporta as regras que determinam o sujeito activo e os sujeitos passivos (contribuintes, responsáveis, substitutos), a matéria colectável, a taxa do imposto, e os benefícios fiscais" (9.
Porém, em sentido restrito, "a incidência é pessoal ou subjectiva quando se dirige a determinar os sujeitos passivos da obrigação tributária (contribuinte, substituto, responsáveis), e é real ou objectiva quando se dirige a determinar a riqueza tributada, ou, nos impostos independentes da riqueza, os pressupostos que definem os elementos objectivos do facto tributário (10.
A definição normativa do facto tributário, ou da situação que dá origem à obrigação do imposto, constitui a delimitação da incidência real de imposto, e a definição das pessoas a ela sujeitos (contribuintes ou sujeitos passivos) corresponde à incidência pessoal do imposto (11.
O conceito de isenção não apresenta na doutrina um tratamento unívoco (12.
O tema do parecer, porém, dispensa qualquer aproximação elaborada sobre o conceito, e muito menos um compromisso teórico.
Referem-se, pois, apenas alguns elementos essenciais da doutrina nacional.
Para ALBERTO XAVIER (13, a isenção tem a natureza jurídica de um facto impeditivo autónomo e originário e não de uma simples delimitação negativa do facto constitutivo (incidência).
O facto em que a isenção se traduz não esgota a sua eficácia no plano da relação jurídica do imposto. Configura-se como um facto impeditivo quanto à constituição da relação tributária, mas assume valor constitutivo de uma situação jurídica complexa - a de contribuinte isento - que é inteiramente distinta do não contribuinte.
"A verificação do facto isento modela a esfera jurídica da pessoa quanto à qual se verifica em termos substancialmente diversos da do sujeito quanto ao qual se não verificam os elementos da tipicidade fiscal. Para além dos casos bem nítidos das isenções temporárias e das isenções condicionais, em que a eficácia impeditiva se encontra sujeita a termo e condição, com os consequentes reflexos subjectivos, acresce ainda que a lei comete ao contribuinte isento certos deveres jurídicos - como o da apresentação regular de declarações e outras informações - que jamais impõe ao não contribuinte" (14.
Nessa matéria, deverá distinguir-se entre não incidência e isenção. Para o autor citado (15, "a não incidência decorre da não verificação de um elemento positivo do tipo legal do facto tributário ou da verificação de um seu elemento negativo - fenómenos que são por vezes objecto de preceitos meramente definitórios ou declarativos. A isenção dá-se quando, não obstante se ter verificado o facto tributário em todos os seus elementos, a eficácia constitutiva deste é paralisada originariamente pela ocorrência de um outro facto a que a lei atribui assim eficácia impeditiva".
Para NUNO SÁ-GOMES (16, as isenções fiscais não são delimitações negativas da incidência, mas antes "situações complexas traduzidas, por um lado, por factos impeditivos do nascimento da obrigação tributária, ou, tratando-se de isenções parciais, factos impeditivos do nascimento daquela obrigação com o conteúdo normal, mas sempre factos que se situam no âmbito genérico da incidência, constituindo 'excepções' a esta, por razões não tributárias, que se sobrepõem ao interesse público da percepção do imposto, dando origem, concomitantemente, e em termos constitutivos, à situação jurídica subjectiva do contribuinte isento, pela atribuição a este do direito à isenção".
As isenções fiscais podem classificar-se sob várias espécies, de natureza doutrinária, ou decorrendo directamente da lei (17.
A principal distinção a estabelecer é a que delimita isenções objectivas (ou reais) e isenções subjectivas (ou pessoais). "Nas isenções objectivas o facto isento é definido em função do elemento objectivo do facto tributário de que constitui a espécie de um género, operando relativamente a todos os sujeitos incluídos no elemento subjectivo. Nas isenções subjectivas o facto isento é definido em função do elemento subjectivo do facto tributário: operando apenas relativamente a uma dada categoria de pessoas nele previstas, mas incluindo todos os factos incluídos no elemento objectivo".
Quando o facto isento é modelado por tal forma que se refere ao elemento objectivo e ao elemento subjectivo do facto tributário, fala-se em isenções mistas.
Outra distinção, separa as isenções em permanentes e temporárias.
Aquelas não têm na lei um período pré-determinado da duração; nestas, a lei determina antecipadamente o respectivo período de duração (18.
Segundo ainda outro critério, as isenções distinguem-se em totais e parciais. "Nas isenções totais, o facto isento desenvolve a sua eficácia impeditiva relativamente ao facto tributário considerado na sua totalidade.
Nas isenções parciais, a eficácia impeditiva respeita apenas a uma determinada parte quantitativa do facto tributário" (19.
As isenções podem ainda distinguir-se em puras e condicionais. Nestas, a eficácia do facto impeditivo fica subordinada à realização de um facto acessório que é uma 'conditio juris'.
"Com efeito, a par de factos principais - constitutivos ou impeditivos -, a previsão da norma tributária comporta ainda por vezes factos acessórios. Na verdade, nem sempre a norma tributária material se limita a construir os factos a que respeita - constitutivos ou impeditivos - em termos de lhes imprimir uma eficácia plena e imediata. Em certos casos, quer o facto tributário, quer o facto isento, vêem os seus efeitos dependentes da necessária verificação de um outro facto, previamente designado pela lei. É o que se passa nas isenções condicionais" (20.
Presentes estas noções sobre os conceitos de incidência e isenção, poder-se-á avançar na concretização dos elementos fundamentais do imposto sobre o valor acrescentado.
A incidência real ou objectiva ficou já definida: as transmissões de bens e as prestação de serviços efectuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal e as importações de bens - artigo 1º, alíneas a) e b) do Código do IVA.
A incidência subjectiva está delimitada no artigo 2º, através da indicação dos sujeitos passivos do imposto: as pessoas singulares ou colectivas que, de um modo independente e com carácter de habitualidade, exerçam actividades de produção, comércio ou prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e das profissões livres, e bem assim os que, do mesmo modo independente, pratiquem uma só operação tributável, desde que essa operação seja conexa com o exercício das referidas actividades - nº 1, alínea a) do artigo 2º (21.
Deste modo, as transmissões de bens ou a prestação de serviços efectuadas no exercício de actividades de produção e comércio, incluindo as actividades agrícolas, estariam em princípio, se não houvesse norma a dispor em contrário, no domínio da incidência real ou objectiva do imposto sobre o valor acrescentado.
Como se referiu, porém, o nº 36 do artigo 9º do Código do IVA estabelece uma isenção relativamente às transmissões de bens efectuadas no âmbito da exploração da actividades agrícolas (22.Tipifica, assim, a lei um facto (a circunstância de a transmissão de bens ocorrer no âmbito de uma actividade especificamente determinada) que impede o nascimento de obrigação tributária como resultaria da eficácia normal da regra geral de incidência, e que, por isso, se apresenta também de algum modo, como uma "excepção" ao âmbito genérico de incidência (23.
Configura-se como uma isenção objectiva, total e permanente. Não constitui, porém, uma isenção pura e simples.
Com efeito, a isenção prevista no nº 36º do artigo 9º poderá desaparecer em determinadas circunstâncias, recte, verificada, constatada que seja, determinada perturbação das regras do mercado.
Efectivamente, o artigo 11º do Código do IVA prevê que o Ministro das Finanças possa "determinar a sujeição a imposto de algumas das actividades referidas nos nºs 36 e 37 do artigo 9º sempre que as respectivas isenções ocasionem distorções significativas da concorrência".
Invocando o disposto neste artigo 11º, foi publicado o já referido Despacho Normativo nº 51/86, de 5 de Junho de 1986, que se transcreve:
"A isenção do IVA referida no nº 36 do artigo 9º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), quanto à actividade exercida pelos produtores de flores e plantas ornamentais, poderá gerar graves distorções de concorrência, uma vez que incentiva e privilegia o encurtamento dos circuitos económicos (a venda ou aluguer directo pelo produtor), em detrimento de outros onde actuam agentes económicos não ligados à produção nem enquadrados nos regimes especiais de isenção ou no dos pequenos retalhistas.
Tal situação, conduzindo ao agravamento da posição concorrencial destes em relação aos produtores, poderá pôr em causa a neutralidade do imposto, o que se pretende acautelar, evitando distorções resultantes da aplicação das disposições do CIVA sem prejuízo para quaisquer dos agentes económicos em causa.
Assim:
1 - Determino, declarando obrigatória, nos termos do artigo 11º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, a sujeição ao IVA dos produtores de flores e plantas ornamentais a que se refere o nº 36 do artigo 9º do CIVA e a consequente apresentação da declaração competente para efeitos de registo.
2 - A declaração referida no número anterior deverá ser apresentada na repartição de finanças competente no prazo de 30 dias a contar da publicação do presente despacho." (24
Importa, pois, qualificar este acto.
5.
 
O Despacho Normativo nº 51/86 constitui uma forma de regulamento ministerial, emanado em nome do seu autor, sem revestir qualquer formalidade normativa solene, e com publicação na I Série do Diário da República como requisito de eficácia (25.
Revela-se no conteúdo, sentido e fim como um regulamento que concretiza elementos de aplicação de uma norma do sistema de incidência e isenções relativamente a uma determinada actividade económica: - a floricultura, como sector integrado nas actividades de produção agrícola (26.
Na definição de MARCELLO CAETANO (27, o regulamento constitui norma jurídica de carácter geral e execução permanente dimanada de uma autoridade administrativa sobre matéria própria da sua competência.
Noutra formulação (28, "regulamento é a norma geral e abstracta emanada, no exercício da função administrativa, por um órgão administrativo".
Os regulamentos administrativos são, segundo FREITAS DO AMARAL (29, "as normas jurídicas emanadas por uma autoridade administrativa, no desempenho do poder administrativo", encerrando esta noção três elementos essenciais - de natureza material, orgânica e funcional.
O regulamento administrativo consiste em normas jurídicas, tem natureza normativa, revestindo as características da generalidade e abstracção; é editado por uma autoridade administrativa, isto é, emana de um órgão integrado na Administração Pública e é produzido no exercício de poder administrativo, sendo, por isso, subordinado e condicionado face à lei, à actividade legislativa, "livre, primária e independente" (30.
Do ponto de vista da dependência e subordinação do regulamento administrativo à lei, os regulamentos de execução ou complementares constituem a espécie onde se revela no máximo o grau dessa subordinação.
São regulamentos de execução ou complementares aqueles que, para tornarem possível a aplicação de uma determinada lei, desenvolvem, pormenorizam ou particularizam a disciplina normativa nela contida; são publicados em seguimento a uma lei para assegurarem a respectiva execução, desenvolvendo uma tarefa de pormenorização, de detalhe e de complemento do comando legislativo (31.
Através do regulamento de execução, de desenvolvimento da previsão normativa, a disciplina da lei, pormenorizada e desenvolvida de modo geral e abstracto pela administração, fica em condições de ser aplicada às situações concretas da vida que cabem na respectiva previsão.
O tema da consulta aconselha também algumas notas a propósito da relação entre a vigência (ou modificação) da lei e o regulamento.
A relação de estrita subordinação e dependência do regulamento de execução em relação à lei manifesta-se, de modo marcado, na repercussão da revogação ou modificação da lei sobre a vigência do regulamento que a pormenoriza e desenvolve.
A revogação ou modificação da lei exequenda repercute-se automaticamente na vigência do regulamento; a revogação da lei implica a imediata cessação (cessação automática) das normas que a desenvolvem e executam. Porém, se a lei apenas for modificada, o regulamento de execução manter-se-á em vigor em tudo quando não contrariar a nova lei (a lei modificada), ou, dito de outro modo, manter-se-á em vigor em tudo quanto for necessário para a execução da nova lei (32.
Para AFONSO QUEIRÓ (33, "os regulamentos de execução devem considerar-se tacitamente revogados se for revogada ou substancialmente modificada a lei regulamentada. Se houver apenas incompatibilidade parcial entre a nova lei e o regulamento precedente, este sobreviverá na medida em que se harmonizar com ela - salvo se outra for a vontade apurada do legislador".
6. O Despacho Normativo nº 51/86, como se referiu, concretiza quanto à actividade agrícola de floricultura um elemento de aplicação da norma do artigo 11º do Código do IVA: - a sujeição a imposto (rectius, a inaplicabilidade da isenção prevista no nº 36 do artigo 9º) perante a constatação de que a isenção provocava distorções na concorrência relativamente àquela referida actividade.
O mencionado Despacho Normativo constitui, pois, um regulamento emanado da Administração, pelo Ministro das Finanças, na sequência do disposto no artigo 11º do Código do IVA e destinado a concretizar e desenvolver a previsão desta norma: é um regulamento de execução da norma daquele artigo 11º, possibilitando a sua aplicação a situações delimitadas.
A previsão da lei - sujeição das transmissões de bens operadas no âmbito da actividade agrícola a imposto, quando a isenção provoque distorções na concorrência -, não pode ser actuada sem uma complementaridade concretizadora relativamente às actividades sectoriais nas quais o referido elemento (a condição resolutiva da isenção) se verifique.
A verificação deste elemento (distorção da concorrência) implica necessariamente a análise e ponderação de critérios de determinação administrativa sobre o funcionamento do mercado, e da ponderação dos elementos de análise das razões de perturbação da concorrência relativamente a cada actividade específica. Há-de ser então definido na concretização da lei, pela referência de actividade, às transmissões de bens ou prestações de serviços que ficam excluídas da isenção, integrando a plenitude de aplicabilidade das regras gerais de incidência.
Resta apreciar a sequência legislativa atrás enunciada, em relação com o referido Despacho Normativo.
O artigo 11º do Código do IVA não foi objecto de qualquer modificação desde o Decreto-Lei nº 394-B/84, de 26 de Dezembro.
O nº 36 do artigo 9º, por sua vez, teve as modificações atrás mencionadas, operadas pelo Decreto-Lei nº 195/89, de 12 de Junho.
O Despacho Normativo nº 51/86, foi emitido ao tempo do primeira versão do nº 36 do artigo 9º.
Porém, como é logo saliente pela imediata apreensão daquela norma de isenção numa e noutra das versões, o conteúdo material não apresenta qualquer diferença: uma e outra das versões, são modos, fórmulas de técnica legislativa parcialmente diversas de transmitir a mesma realidade normativa material.
Estabelece-se na primeira redacção a isenção do imposto quanto às transmissões de bens e prestações de serviços efectuados no âmbito de uma actividade agrícola, silvícola ou pecuária, de pesca em água doce, de piscicultura, ostreicultura e cultura de outros moluscos e crustáceos.
Na redacção do Decreto-Lei nº 195/89, de 19 de Junho, isentam-se as transmissões de bens efectuadas no âmbito das explorações enunciadas no Anexo A do Código do IVA - que especifica o âmbito das actividades de produção agrícola, incluindo nestas, além das de "cultura propriamente dita", a pecuária, culturas aquícolas e piscicolos e a silvicultura, tal como na primitiva redacção.
Utilizou-se uma outra técnica legislativa, exactamente, no entanto, com o mesmo conteúdo de âmbito material.
De idêntico modo, no que respeita às prestações de serviços efectuados no âmbito de uma actividade agrícola.
A redacção, com efeito, do Decreto-Lei nº 195/89 limita-se a especificar neste ponto, por remissão para Anexo B (34, a lista das prestações de serviços agrícolas.
Vê-se, pois, que da anterior para a actual redacção do artigo 9º, nº 36, do Código do IVA, não se operou modificação que não fosse de mera forma ou de técnica de construção normativa. O conteúdo material do preceito manteve-se integralmente; não houve modificação substancial.
Sendo assim, do mesmo modo se manteve integralmente o conteúdo material de referência da norma do artigo 11º, na parte em que se refere às actividades enunciadas no nº 36 do artigo 9º do Código do IVA.
Não se produziu qualquer modificação que afecte a vigência de um regulamento de execução e concretização da referida disciplina normativa. Como se salientou, a modificação da lei exequenda apenas determina a cessação de regulamento em quanto este não harmonizar com aquela.
O Despacho Normativo nº 51/86, tem como conteúdo de regulamentação uma espécie de actividade agrícola (a floricultura) que se integra no âmbito das actividades de exploração agrícola previstas na referida norma do nº 36, do artigo 9º - tanto na previsão genérica da redacção anterior (35, como na especificação da fórmula normativa da redacção do Decreto-Lei nº 195/89, através da remissão para o Anexo A.
A vigência do mencionado Despacho não foi, pois, afectada pela modificação do artigo 9º, nº 36 do Código do IVA.
 
Conclusões:
8
 
Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:
1ª - A sujeição a imposto sobre o valor acrescentado das transmissões de bens e prestações de serviços no âmbito das actividades referidas e isentas, nos termos do artigo 9º, nº 36, do Código do IVA (aprovado pelo Decreto-Lei nº 394-B/84, de 26 de Dezembro), quando a isenção provoque distorções na concorrência, nos termos do artigo 11º do Código do IVA, pressupõe a definição, por acto normativo, geral e abstracto, da Administração das situações e actividades relativamente às quais a previsão da norma se verifique;
2ª - O Despacho Normativo nº 51/86, de 5 de Junho de 1986, do Ministro das Finanças, emitido nos termos do artigo 11º, do Código do IVA, constitui um regulamento de execução, que concretiza relativamente à actividade de floricultura a previsão daquela norma, conjugada com o disposto no artigo 9º, nº 36 do mesmo diploma;
3ª - A redacção do artigo 9º, nº 36, do Código do IVA, aprovado pelo Decreto-Lei nº 394-B/84, de 26 de Dezembro e a versão desta norma operada através do artigo 1º do Decreto-Lei nº 195/89, de 12 de Junho, traduzem o mesmo conteúdo material (apresentando as modificações operadas apenas alteração formal de técnica legislativa);
4ª - Um regulamento emitido ao tempo de vigência da anterior redacção de uma norma regulamentada não fica afectado na respectiva vigência pela alteração não substancial posterior da norma cuja previsão concretiza e desenvolve;
5ª - Assim, o Despacho Normativo nº 51/86, emitido ao tempo de vigência da anterior redacção do artigo 9º, nº 36, do Código do IVA, modificado nos termos da conclusão 3ª, mantém integralmente a respectiva vigência e validade como norma de execução da previsão do artigo 11º, relacionado com o artigo 9º, nº 36, do referido diploma.
 
________________________________________________________
(1 Informação nº 7, de 9 de Fevereiro de 1990.
(2 Publicado no Diário da República, I Série, nº 146, de 28 de Junho de 1986.
(3 Aprovado pelo Decreto-Lei nº 394-B/84, de 26 de Dezembro.
(4 O Imposto de Transacções, vigente desde 1966.
(5 O Código do IVA tem sofrido variadas alterações: Leis nº 42/85, de 22 de Agosto, 3/86, de 7 de Fevereiro; 8/86, de 30 de Abril, 2/88, de 26 de Janeiro e 2/89, de 17 de Fevereiro e Decretos-Leis nºs 185/86, de 14 de Julho, 280/86, de 5 de Setembro, 383/86, de 15 de Novembro, 202/87, de 16 de Maio, 404/87, de 31 de Dezembro, 122/88, de 24 de Agosto, 195/89, de 12 de Junho, e 198/90, de 19 de Julho. Ao tema da consulta, como se verá, importa apenas considerar as modificações operadas pelo Decreto-Lei nº 195/89.
(6 O artigo 3º, nº 2 considera para o efeito, a energia eléctrica, o gás, calor, frio e similares bens corpóreos, e o nº 3 enumera nas várias alíneas um conjunto de situações em que a entrega ou afectação de bens se consideram transmissões de bens para efeito de IVA.
(7 Conforme expressamente consta do preâmbulo do diploma.
(8 Cfr., SOARES MARTINEZ, Manual de Direito Fiscal, pág. 122.
(9 Cfr., SOARES MARTINEZ, ibidem.
(10 Citado de NUNO SÁ GOMES, Lições de Direito Fiscal, vol. II, 1985, págs. 52 a 53.
(11 Cfr., CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL, Curso de Direito Fiscal, I vol., pág. 12.
(12 Cfr., NUNO SÁ-GOMES, op. cit., págs. 62 e segs, onde se faz referência às principais orientações doutrinais relativas à natureza jurídica das normas de isenção tributária.
Cfr., também sobre a noção de isenção fiscal, os pareceres deste conselho nºs 184/83 de 26 de Janeiro de 1984, publicado no Diário da República, II Série, nº 85, de 10-4-84 e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 338, pág. 151 e 102/86 de 19 de Fevereiro de 1987, publicado no Diário da República, II Série, nº 147, de 30-6-87 e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 369, pág. 163.
(13 Manual de Direito Fiscal, Lisboa, 1974, pág. 281 e segs.
(14 Cfr. ALBERTO XAVIER, ibidem.
(15 Cfr., ALBERTO XAVIER, ibidem, págs. 283-284.
(16 Cfr. Lições de Direito Fiscal, cit. pág. 67.
(17 Nesta parte acompanha-se textualmente a exposição de ALBERTO XAVIER, op. cit., págs. 287 e segs..
(18 Cfr. ALBERTO XAVIER, ibidem, pág. 288.
(19 Cfr., ALBERTO XAVIER, ibidem, pág. 289.
(20 Cfr., ALBERTO XAVIER, ibidem, pág. 290.
(21 A alínea a) , as alíneas b) e c) do nº 1, e os nºs 2 e 3 do artigo 2º completam a enunciação de sujeitos passivos em termos que, todavia, não importa referir, por desnecessários ao tema e à economia do parecer.
(22 Não se referem, por dispensáveis, a situações de isenção contempladas na 2ª parte do nº 36 do artigo 9º.
(23 Aproximando-se nesta construção, da posição expressa por NUNO SÁ GOMES, cfr. local cit. nota (16).
(24 A situação concorrencial de um mercado mede-se essencialmente por três condições, que são também os elementos constitutivos da concorrência.
O acesso ao mercado, para as empresas, deve ser livre; as empresas devem dispor de liberdade de acção e os utilizadores e consumidores devem dispôr de liberdade de escolha.
Os critérios de determinação da concorrência constituem os instrumentos que permitem medir e apreciar uma situação de mercado: - os critérios da estrutura, do comportamento dos agentes económicos e de resultados.
Cfr., BERTHOLD GOLDMANN e ANTOINE LYON-CAEN, Droit Commercial Europeén, 4ª ed., Dalloz, 1983, págs. 526 e segs.
Cfr., sobre as noções etimológica e económica de concorrência e os conceitos de concorrência perfeita e imperfeita, J. SIMÕES PATRÍCIO, Direito da Concorrência, (aspectos gerais), págs. 19 e segs..
(25 Cfr., MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, I, pág. 131.
(26Cfr., classificação das actividades económicas, III Parte. Divisão , 111 1110 1110.0 1110.0.0:
"Agricultura e Pecuária":
"Agricultura em geral, fruticultura, viticultura e produção de sementes; viveiros (excepto de espécies florestais); horticultura (ao ar livre e em estufas); plantações de chá, café, cacau e borracha; criação de gado, avicultura, cunicultura, criação de animais para produção de peles e outro fins; apicultura, produção de leite, lã, peles, ovos e mel. Também se incluem os serviços relacionados com jardinagem paisagística, tais como plantação e tratamento de relvados, flores e árvores de sombra ou ornamentais. A transformação de produtos agrícolas feita em explorações agrícolas inclui-se neste grupo quando não for possível classificá-la separadamente da produção (por exemplo: vinificação, extracção de azeite, desnatação de leite, etc.)."
(27 Cfr., Manual de Direito Administrativo, 10ª ed., tomo I, 1973, pág. 95.
(28 Cfr., ESTEVES DE OLIVEIRA, op. cit., pág. 103.
(29 Cfr., Direito Administrativo, (vol. III), ed. cop., Lisboa 1985, págs. 15 e segs.
(30 Cfr., ibidem, pág. 19.
(31 Cfr. MARCELLO CAETANO, op. cit., pág. 96, FREITAS DO AMARAL, op. cit., pág. 22 e ESTEVES DE OLIVEIRA, op. cit., págs. 110-111.
(32 Cfr. MARCELLO CAETANO, op. cit., pág. 111, ESTEVES DE OLIVEIRA, op. cit., pág. 149 e FREITAS DO AMARAL, op. cit., pág. 60.
(33 Cfr., Lições de Direito Administrativo, vol I (ed. cop.), 1976, págs. 482-483 e Teoria dos Regulamentos, na 'Revista de Direito e de Estudos Sociais, Ano I (2ª série), nº 1, Janeiro-Março de 1986, págs. 26.
(34 Transcreve-se o Anexo B do Decreto-Lei nº 195/86, de 12 de Junho:
Lista das prestações de serviços agrícolas
"As prestações de serviços que contribuem normalmente para a realização da produção agrícola, designadamente as seguintes:
a) As operações de sementeira, plantio, colheita, debulha, enfardação, ceifa, recolha e transporte;
b) As operações de embalagem e de acondicionamento, tais como a secagem, limpeza, trituração, desinfecção e ensilagem de produtos agrícolas;
c) O armazenamento de produtos agrícolas;
d) A guarda, criação e engorda de animais;
e) A locação, para fins agrícolas, dos meios normalmente utilizados nas explorações agrícolas e silvícolas;
f) Assistência técnica;
g) A destruição de plantas e animais nocivos e o tratamento de plantas e de terrenos por pulverização;
h) A exploração de instalações de irrigação e de drenagem;
i) A poda de árvores, corte de madeira e outras operações silvícolas."
A "lista de prestação de serviços" tem também como fonte imediata o Anexo B. da 6ª Directiva do Conselho, de 17 de Maio de 1977 (Directiva 77/388/CEE) sobre o regime comum do imposto sobre o valor acrescentado - base tributável uniforme.
(35 Mas especificada na actividade "agricultura" segundo o código de classificação das actividades económicas. Cfr.-nota (26). 
Anotações
Legislação: 
DN 851/86 DE 1986/06/05.
CIVA84 ART9 N36 ART11.
DL 195/89 DE 1989/06/12.
Referências Complementares: 
DIR FISC.
Divulgação
Número: 
DR065
Data: 
19-03-1991
Página: 
9
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