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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
30/1989, de 24.05.1989
Data do Parecer: 
24-05-1989
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
AR - Presidente da AR
Entidade: 
Assembleia da República
Relator: 
LOURENÇO MARTINS
Descritores e Conclusões
Descritores: 
ASSEMBLEIA DA REPUBLICA
PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA DA REPUBLICA
FUNCIONARIO PARLAMENTAR
FUNÇÃO PUBLICA
REMUNERAÇÃO
COMPETENCIA
Conclusões: 
1 - A norma do artigo 53 da Lei Organica da Assembleia da Republica - Lei n 77/88, de 1 de Julho -, ao conferir poderes ao Presidente da Assembleia para fixar o regime remuneratorio dos funcionarios parlamentares e outro pessoal nela mencionado, tem fundamento, como outras regras dessa lei, no principio da separação entre orgãos de soberania (artigo 114, n 1, da Constituição), e colhe apoio na competencia auto-organizativa do Parlamento, não sendo incompativel com quaisquer normas ou principios da Lei Fundamental;
2 - Os poderes concedidos ao Presidente da Assembleia da Republica pela aludida norma do artigo 53 devem ser exercidos sem prejuizo do disposto no anexo I a Lei n 77/88, o que significa, alem do mais, não abrangerem a possibilidade de alteração do quantitativo correspondente as letras de vencimento de cada categoria, tal como resulta da tabela geral de vencimentos dos trabalhadores da Administração Publica.
Texto Integral
Texto Integral: 
SENHOR PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA DA REPUBLICA,
EXCELENCIA:

1

1.1. Levantaram-se dúvidas sobre a interpretação do artigo 53º da Lei nº 77/88, de 1 de Julho, a Lei Orgânica da Assembleia da República (LOAR), o qual, sob a epígrafe "Regime remuneratório do pessoal da Assembleia da República e dos gabinetes", diz o seguinte:

"O regime remuneratório do pessoal da Assembleia da República e do pessoal dos gabinetes do Presidente da Assembleia da República e dos grupos parlamentares ou equiparado será fixado pelo Presidente da Assembleia da República, obtido o parecer favorável do Conselho de Administração, sem prejuízo do anexo I à presente Lei".



1.2. Em parecer de um Consultor Jurídico da Assembleia da República (1), discutiram-se dois pontos, e obtiveram-se as correspondentes conclusöes:


- a primeira parte daquele preceito "tem o sentido unívoco de conferir ao Presidente da Assembleia da República competência para fixar o regime remuneratório" do pessoal aí mencionado, pois tal foi o sentido desejado pelo legislador como resulta da discussäo, dos trabalhos preparatórios, do sistema jurídico em que se insere e das circunstâncias em que foi adoptado;

- as letras do anexo I para que o artigo 53º remete "näo säo as letras da Funçäo Pública", de conteúdo preciso, servindo apenas de limites da hierarquiza çäo de situaçöes funcionais devendo à letra A "corresponder o vencimento mais elevado e os restantes vencimentos sucessivamente inferiores segundo a ordenaçäo das letras no alfabeto".

Para chegar a tal resultado invocou-se a aplicaçäo dos princípios consignados no artigo 9º do Código Civil.

Justifica-se pormenorizar a argumentaçäo desse parecer, começando pela competência atribuída ao Presidente da Assembleia da República para fixar o regime remuneratório do pessoal.

O artigo 53º transitou do projecto de lei nº 142/V (do PSD) sem alteraçäo apesar das críticas de alguns deputados, insurgindo-se contra as consequências a que levava, isto é, colocar a segunda figura na hierarquia do Estado na posiçäo "inesperada e surpreendente" de ter de fixar, todos os anos, o regime remuneratório do pessoal da Assembleia da República.

Tal norma mostra-se, porém, baseada no princípio da separaçäo dos poderes (artigo 114º da Constituiçäo da República) entre os órgäos de soberania, o qual se revela na LOAR, desde matérias menores, por exemplo, as instalaçöes, passando pela autonomia administrativa e financeira até ao estatuto próprio dos deputados.

Deu-se agora um passo em frente criando o quadro dos funcionários parlamentares (artigo 45º da LOAR), excluindoos da "qualificaçäo genérica de funcionários públicos" e dotando-os com um estatuto próprio, tendencialmente completo.

Em abono do referencial de autonomia administrativa parlamentar citam-se os exemplos da França, Espanha e Itália, nos quais se releva a natureza especial do trabalho parlamentar (2.

No tocante ao segundo aspecto vale a pena extractar do parecer da Assessoria Jurídica os passos, a nosso ver, mais significativos:

"... deve notar-se que nem a lei, nem o anexo I indiciam qualquer intençäo de identificar as letras do anexo com as remuneraçöes atribuídas por idênticas letras na funçäo pública (...). .

" Por outro lado, todo o artigo 53º se harmoniza se se entender que as letras do anexo I foram adoptadas pelo legislador sem qualquer conteúdo quantitativo, apenas como uma hierarquizaçäo de situaçöes funcionais".

"Assim, o que o legislador pretendeu foi subtrair à Administraçäo da Assembleia da República - e, consequentemente, à negociaçäo - o elenco das carreiras e dentro destas as diferentes categorias por que elas se desenvolvem e que têm traduçäo na diferenciaçäo de letras".

Logo, "as letras do anexo I näo säo as letras da Funçäo Pública, já com um conteúdo preciso". Por isso, "o seu conteúdo está em aberto", cabendo ao Presidente da Assembleia da República determiná-lo (3 .


1.3. Pronunciando-se sobre o parecer a que nos vimos repor tando, em 9.03.89, Vossa Excelência despachou:

"O parecer, aliás douto, da Assessoria Jurídica (...) sobre a interpretaçäo do artigo 53º, da Lei Orgânica da Assembleia da República, näo afasta as dúvidas que podem derivar da própria conformidade deste preceito com as normas e princípios constitucionais, designadamente os constantes dos artigos 168º, nº 1, alínea u) e 184º, do Diploma Fundamental, e bem assim do problema da conjugaçäo da competência atribuída ao presidente da Assembleia da República para fixar o regime remuneratório do pessoal referido naquele artigo da Lei Orgânica com o preceituado no anexo I, da mesma Lei que remete para a escala de letras da Funçäo Pública ...".

Daí ter Vossa Excelência considerado útil a audiçäo do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, havendo-se pedido urgência no ofício de remessa dos elementos respectivos.

Cumpre, pois, emitir o solicitado parecer.


2


Podemos isolar as duas questöes postas deste modo:- o disposto no artigo 53º da LOAR, ao conferir competência ao Presidente da Assembleia da República para fixar o regime remuneratório de determinado pessoal da Assembleia é compatível com as normas e princípios da Constituiçäo da República?

- e (admitida tal conformidade constitucional) o que significa a ressalva da parte final daquele artigo 53º, "sem prejuízo do anexo I à presente Lei"?

Antes de abordar qualquer das questöes, torna-se necessário conhecer, na óptica da consulta, os princiais tópicos da LOAR e os seus antecedentes.


2.1. Reparte-se por nove capítulos a Lei nº 77/88, de 1 de Julho: âmbito (capítulo I), sede e instalaçöes (capítulo II), Plenário (capítulo III), Administraçäo da Assembleia da República (capítulo IV), Serviços da Assembleia da República (capítulo V), pessoal dos Serviços da Assembleia da República (capítulo VI), apoio aos partidos e grupos parlamentares (capítulo VII), orçamento (capítulo VIII), e disposiçöes finais e transitórias (capítulo IX). Interessa-nos particular- mente salientar disposiçöes dos capítulos I, IV, V, maxime VI, e IX.

Logo no artigo 1º se destaca a postura autonómica do Parlamento, através da definiçäo de "instrumentos de gestäo administrativa, financeira e de apoio técnico que permitam à Assembleia da República o desenvolvi- mento da sua actividade específica", dotando-a de "autonomia administrativa e financeira" bem como de património próprio, afectando-lhe "serviços hierarquizados, denominados Serviços da Assembleia da República..".

Orgäos de administraçaäo da AR säo o seu Presidente e o Conselho de Administraçäo (artigo 5º), cabendo ao Presidente superintender na administraçäo. Dispöe de um Gabinete constituído por pessoal da sua livre escolha e nomeaçäo ao qual se aplicam, como regra, as disposiçöes em vigor para o Gabinete do Primeiro-Ministro (artigos 8º, nº 1 e 10º, nº 1) (4.

O Conselho de Administraçäo - o órgäo de consulta e gestäo - é constituído por um máximo de sete deputados, pelo secretário-geral da AR e por um representante dos funcionários parlamentares, conferindo-lhe a lei um vasto leque de atribuiçöes (artigo 13º); depende da constituiçäo concreta da Assembleia e seus grupos parlamentares e mantém-se em funçöes até à primeira reuniäo da AR da nova legislatura.

No apoio técnico e administrativo ao funcionamento da AR assume particular relevo a figura do secretário-geral, nomeado pelo Presidente, obtido parecer favorável do Conselho de Administraçäo (5

Para além do Auditor Jurídico, da Assessoria Jurídica e do Gabinete de Estudos Parlamentares, os serviços da AR compreendem ainda a Direcçäo-Geral de Apoio Parlamentar, a Direcçäo-Geral de Administraçäo e Informática, a Direcçäo de Serviços de Relaçöes Públicas e Internacionais e o Museu. Com alguma particularidade na organizaçäo e chefia de serviços poderäo anotar-se os dispositivos do artigo 31º, nº 3, que comete a direcçäo do Gabinete de Apoio Técnico (inserido na Direcçäo-Geral de Apoio Parlamentar) a um técnico superior "equiparado a chefe de divisäo para efeitos de vencimento", a do artigo 38º, nº 2, ao confiar a direcçäo do Centro de Informática a um técnico superior "equiparado a director de serviços para efeitos de vencimentos".



2.2 No capítulo VI encontramos a norma básica sobre o "estatuto do pessoal parlamentar", o artigo 45º, que estipula:

"O pessoal da Assembleia da República, que constitui o quadro dos funcionários parlamentares, rege-se por estatuto próprio, nos termos da presente lei e da sua regulamentaçäo, constituindo direito subsidiário a legislaçäo aplicável à administraçäo central do Estado, designadamente o Estatuto da Aposentaçäo".

Afirmada a regra de que o recrutamento do pessoal näo dirigente é feito por concurso público (artigo 47º), com algumas especialidades sobre a sua admissäo e provimento (artigo 48º, anexos e regulamentos próprios), a LOAR enfatiza o dever de sigilo dos funcionários e agentes da AR (artigo 50º) e dispöe no artigo seguinte expressamente sobre acumulaçäo e incompatibilidades, em termos, aliás, semelhantes aos da funçäo pública em geral (6.

O artigo 52º respeita ao "regime especial de trabalho", sendo útil proceder à sua transcriçäo:

"1. O pessoal permanente da Assembleia da República tem regime especial de trabalho, decorrente da natureza e das condiçöes de funcionamento próprias da Assembleia da República.

2. Este regime é fixado por deliberaçäo do Conselho de Administraçäo, podendo compreender, nomeadamen- te, horário especial de trabalho, regime de traba- lho extraordinário, prestaçäo de serviço por turnos e remuneraçäo suplementar, ficando sempre ressalvados os direitos fundamentais dos trabalha- dores consignados na Constituiçäo da República Portuguesa e na lei geral.

3. A remuneraçäo suplementar a que se refere o número anterior é calculada com base no vencimento, acrescido de diuturnidades, sendo paga em doze duodécimos, e faz parte integrante do vencimento.

4. Em situaçöes excepcionais de funcionamento dos serviços da Assembleia da República pode ser atribuído ao respectivo pessoal um subsídio de alimentaçäo e transporte.

5. A aplicaçäo do regime de trabalho previsto nos números anteriores ao pessoal dos gabinetes do Presidente da Assembleia da República e dos grupos parlamentares é da competência do Presidente da Assembleia da República e da direcçäo dos grupos parlamentares, respectivamente".

É a disposiçäo seguinte - o já citado artigo 53º- que atribui ao presidente da Assembleia da República a competência para fixar o regime remuneratório do pessoal da AR, dos gabinetes do Presidente, dos grupos Presidente, dos grupos Presidente, dos grupos Presidente, dos grupos parlamentares ou equiparado (7 ,sem prejuízo do anexo.

Algumas especificidades decorrem dos artigos 55º a 58º, respeitantes ao pessoal dirigente - directores-gerais directores de serviço e chefes de divisäo - sendo, certo que, apesar da remissäo geral para o direito subsidiário aplicável à administraçäo central, constante do referido artigo 45º, se remete aqui, de novo, para a lei geral (v. g., nº 3 do artigo 55º).

Haverá ainda a salientar que o Orçamento da AR é aprovado pelo Plenário (artigos 4º, alínea b), e 64º, nº 2), o mesmo sucedendo com o relatório e a conta, após "parecer do Tribunal de Contas".

Os serviços regem-se pelo disposto na LOAR e seus regulamentos, mas constitui direito subsidiário para a integraçäo das lacunas "a legislaçäo aplicável à administraçäo central do Estado" (artigo 76º, nº 2).


2.3. Restará, em sede de apreciaçäo da LOAR, lançar uma mirada sobre o anexo I a que alude o artigo 53º, relativo ao "Quadro do pessoal da Assembleia da República". O anexo engloba a mençäo ao "quadro anterior" e ao "quadro actual reestruturado". E enquanto no quadro anterior se discriminava o grupo de pessoal, a área funcional, carreira e categoria, o quadro novo acrescenta o nível (a seguir ao grupo de pessoal), o grau (a seguir à carreira), em vez de categoria refere-se à categoria/cargo, adita a referência à letra e procede a uma comparaçäo sobre o número de lugares a mais ou a menos.

O pessoal aparece dividido segundo os grupos seguintes: pessoal dirigente, pessoal técnico superior, pessoal técnico, pessoal com funçöes de chefia, pessoal técnico-profissional, pessoal técnico auxiliar, pessoal de Administraçäo, pessoal auxiliar, pessoal operário. Este agrupamento é praticamente idêntico ao anterior.

No entanto, para além de algumas carreiras novas, surgem também algumas categorias novas em carreiras anteriores, normalmente num intuito valorizativo, e permitindo acesso até letra de vencimento mais elevada.

Fiquemo-nos agora por aqui. Adiante se procederá à comparaçäo com as carreiras e categorias similares dos quadros da funçäo pública.


3


A LOAR teve origem nos projectos de lei, nº142/V, apresentado pelo PSD (8 e nº 169/V, apresentado pelo PS, PCP, PRD, CDS, Os Verdes e ID (9

Sobre os mesmos pronunciou-se, de forma sintética, a Comissäo de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (10, apontando-lhes várias divergências mas considerando-os em condiçöes de subir a Plenário para apreciaçäo na generalidade.

Aprovado na generalidade o projecto de lei nº 142/V, apresentado pelo PSD (11 baixou à Comissäo para a sua votaçäo na especialidade (12, tendo sido rejeitado o projecto de lei nº 169/V.

Dessa votaçäo na especialidade resultou a aprovaçäo, por unanimidade, de um conjunto de artigos, e de outros por maioria (entre estes se contando o artigo 53º, ora em foco), tendo, porém, acabado por subir ao Plenário a sua discussäo e votaçäo (13 .

Os deputados da Oposiçäo referindo-se em comcreto ao artigo 53º, insurgiram-se contra a possibilidade de ser o Presidente a fixar os vencimentos dos funcionários da AR, com o que se degradaria em "negociador de acordos colectivos de trabalho", ao mesmo tempo que se ignorava o ordenamento jurídico dos trabalhadores da funçäo pública. Foi mesmo proposta a eliminaçäo de tal norma (mas rejeitada).

Todavia, outras vertentes mereceram destaque dos deputados da Oposiçäo (que, aliás, votaram em bloco contra a aprovaçäo do projecto de lei).

Disse-se, com efeito, que o disposto no artigo 53º era contraditório com a própria Lei Orgânica e seus anexos, na medida em que, por um lado, remeteria o regime remuneratório para a tabela geral do funcionalismo público e, por outro, atribuía competência ao Presidente da Assembleia da República para o definir (14.

Houve mesmo quem alertasse para o facto de entrarem em crise os princípios constitucionais, nomeadamente o da superintendência do Governo na Administraçäo quebrando-se o princípio da unidade a que a funçäo pública deve estar submetida (artigos 202º e 267º da CRP), o que poderia conduzir à sua "balcanizaçäo" (15.

Como se disse, a LOAR foi aprovada apenas com os votos do partido maioritário e àquele artigo 53º näo foram introduzidas quaisquer emendas.

Afigura-se oportuno deixar, desde já, consignado um breve comentário sobre o relevo e ilaçöes a extrair da discussäo do projecto da LOAR.

É sabida a dificuldade de captar o sentido ou intençäo do legislador quando este se apresenta como um órgäo colegial, integrado por várias correntes de pensamento.

De qualquer modo, parece desajustado dizer afastada uma crítica ou observaçäo feita na discussäo, taxando-a de improcedente, quando näo levou â modificaçäo de um determinado preceito. Concretizando: alguns deputados da Oposiçäo entendiam prescrutar uma certa contradiçäo na maneira como o artigo 53º estava redigido quando concedia ao Presidente o poder de fixar o regime remuneratório mas o confinava nos parâmetros do anexo I (16.

Näo pode dizer-se, sem mais, inexistir qualquer contradiçäo pelo motivo de a crítica näo ter sido atendida, ou melhor, näo ter levado a alteraçäo do preceito. Antes se diria que a crítica näo foi refutada, subsistindo a dúvida sobre a sua bondade.


4

Uma retrospectiva sobre o anterior modelo dos serviços técnicos e administrativos da Assembleia da República pode auxiliar a melhor compreender o que mudou com a actual LOAR.



4.1 Através do Decreto nº 575/76, de 21 de Julho, criou-se um órgäo especialmente incumbido de prestar o indispensável apoio administrativo e técnico à Assembleia da República, ou seja, a Secretaria-Geral da Assembleia da República.

Deste diploma ressaltam duas notas:

- a Secretaria-Geral era um típico organismo da Administraçäo Pública composto por funcionários e agentes, em tudo semelhante a qualquer outro organismo público;

- a entidade tutelar dos serviços integrantes da Secretaria-Geral era o Primeiro-Ministro (que nomeava o secretário-geral e os chefes dos serviços, só quanto a estes ouvindo previamente o Presidente da Assembleia).

Todavia, os poderes atribuídos ao Primeiro-Ministro cedo transitaram para a competência da Assembleia da República - artigo 1º do Decreto-Lei nº 693/76, de 21 de Setembro.


4.2 Aquele Decreto nº 575/76, veio a ser revogado (artigo 29º) pela primeira Lei Orgânica da Assembleia da República, a Lei nº 32/77, de 25 de Maio.

Ao percorrê-la, verifica-se que o Presidente da Assembleia da República continua a superintender nos respectivos serviços (artigo 3º, nº 1), ouvindo o conselho administrativo nos domínios da gestäo financeira e do pessoal.

A organizaçäo interna dos serviços depende de despacho do Presidente e as condiçöes do seu funcionamento seräo definidas em regulamento, também aprovado pelo Presidente (artigo 8º).

A Assembleia da República dispunha de autonomia administrativa e financeira bem como de património próprio (artigo 12º).

Sobre o "regime de pessoal" estipulava o capítulo VII.

Nos termos do artigo 17º, a Assembleia da República era servida por "um corpo permanente de funcionários técnicos e administrativos", em regra nomeados pelo seu Presidente, mediante parecer favorável do conselho administrativo e sob proposta do secretário-geral, "de acordo com os requisitos gerais aplicáveis à funçäo pública" (artigo 20º).

O seu regime especial de trabalho, eventualmente determinante de um horário especial, de prestaçäo de serviço por turnos e de remuneraçäo suplementar, constava do artigo 21º, sem embargo da possibilidade de requisiçäo de técnicos e gestores de empresas públicas ou da requisiçäo e destacamento de funcionários.

Depois de relevar que os funcionários e agentes da Assembleia da República "estäo exclusivamente ao serviço do interesse público", e têm um particular ónus de sigilo, dispunha o nº 2 do artigo 25º:

"Aplica-se aos trabalhadores referidos no número anterior o Estatuto da Funçäo Pública em tudo o que näo contrarie o disposto na presente lei".

As modificaçöes introduzidas pela Lei nº 86/77, de 28 de Dezembro, e pela Lei nº 27/79, de 5 de Setembro, näo atingiram o figurino desenhado (17, praticamente idêntico ao da Funçäo Pública em geral.

Homologado pelo Despacho Normativo nº 368-A/79, publicado no Diário da República, de 14 de Dezembro de 1979 (18 Estatuto Jurídico do pessoal da Assembleia da República integra as respectivas normas de provimento e as alteraçöes ao quadro da Assembleia da República "para efeito de reestruturaçäo de carreiras e correcçäo de anomalias previstas no Decreto-Lei nº 191-C/79".

Com especificidades, designadamente quanto à selecçäo e nomeaçäo de pessoal dirigente e categorias próprias da AR, pode, no entanto, afirmar-se que o esquema geral do "Estatuto Jurídico" se apresenta como um conjunto de regras semelhantes às aplicáveis em outros serviços da Funçäo Pública. O mesmo se diga da distribuiçäo dos funcionários pelo quadro, grupos, carreiras, categorias e letras de vencimento.


As alteraçöes à Lei Orgânica de 1977, provenientes da Lei nº 5/83, de 27 de Julho e da Lei nº 11/85, de 20 de Junho, näo modificam, pode dizer-se mesmo que ratificam (nomeadamente o artigo 1º da Lei nº 11/85), as características do Estatuto Jurídico definidas para o pessoal da Assembleia da República. Afirmou-se expressamente que "as normas de provimento de pessoal constaräo sempre de lei" (nº 2º da nova redacçäo do artigo 20º da Lei Orgânica, dada pela Lei nº 11/85), o que significa a intençäo de chamar à própria Assembleia da República os aspectos, sempre delicados, dos requisitos de acesso, nomeaçäo e promoçäo do pessoal.



4.3.Estaremos agora em condiçöes de pontuar as principais características do estatuto dos hoje designados funcionários parlamentares, no termo da evoluçäo iniciada em 1976.


Na verdade, como já foi frisado, a nova LOAR dá um passo em frente na direcçäo de uma maior autonomia do corpo de funcionários do Parlamento em relaçäo aos funcionários públicos da administraçäo central, regional e local.


Poderemos hoje dizer que:


- a Assembleia da República está dotada de um quadro próprio de funcionários parlamentares, baseando-se a autonomia da sua gestäo numa manifestaçäo do princípio da separaçäo de poderes entre os diversos órgäos de soberania e de auto-organizaçäo (cfr., v.g., artigos 167º, alínea g) 178º e 184º, da CRP);

- os funcionários parlamentares säo funcionários do Estado, gozando de estatuto próprio, cujas especi- ficidades entroncam, fundamentalmente, na necessi- dade de dar apoio à actividade "sui generis" desenvolvida pela Assembleia da República;

- constitui direito subsidiário do regime estatutá- rio dos funcionários parlamentares a legislaçäo aplicável aos funcionários da administraçäo central;

- a organizaçäo do seu quadro distribui-se por carreiras e categorias semelhantes às dos funcionários da administraçäo central.



5

Algumas notas de direito comparado recolhidas (para além das que já acompanhavam o pedido de consulta), confirmam a hodierna tendência de autonomia dos recursos humanos e materiais empenhados no apoio aos parlamentos.

Em França, o estatuto geral dos funcionários exclui do seu campo de aplicaçäo os funcionários das assembleias parlamentares bem como os magistrados judiciais. "Séparation des pouvoirs oblige" (19 .

Tradicionalmente o estatuto do pessoal das assembleias parlamentares ficava ao abrigo da própria lei, dependendo täo-só da regulamentaçäo do "bureau" de cada assembleia, onde ia beber o seu fundamento jurídico.

Sem pôr em causa o princípio da autonomia, algumas iniciativas legislativas vieram reforçar as garantias estatutárias deste pessoal (20.

Em primeiro lugar aplicou-se-lhes, a partir de 1958, o direito de recurso à jurisdiçäo administrativa para litígios de natureza individual, de que estavam excluídos.

Em segundo lugar, e a propósito da instabilidade gerada pela extinçäo da Assembleia da Uniäo Francesa (1963), atribuiu-se-lhes a qualidade de funcionários do Estado, aumentando a segurança no emprego e tornando-lhes aplicáveis normas jurídicas superiores à simples regulamentaçäo dos "bureaux" e os princípios gerais de direito.

Finalmente, em 1983, os lugares da Assembleia nacional säo "reservados" aos funcionários parlamentares, proibindo-se a colaboraçäo de carácter permanente de funcionários ligados a administraçäo exterior; assegura-se o seu recrutamento segundo a regra inderrogável do concurso; o regime de reforma é determinado pelo "bureau" da Assembleia, após parecer das organizaçöes sindicais representativas; garante-se a intervençäo da jurisdiçäo administrativa nos litígios individuais em obediência a princípios gerais de direito e às garantias fundamentais reconhecidas ao conjunto dos funcionários civis e militares do Estado.

Significativa da independência dos parlamentos no mundo näo deixa de ser, desde logo, o sistema de nomeaçäo do seu secretário-geral ou figura equiparada, que, na grande maioria dos casos, cabe ao órgäo director do Parlamento ou ao próprio Parlamento (21

Ainda em França, alude-se, a propósito do "estatuto específico" dos funcionários parlamentares: "un compromis délicat droit s'opérer entre le respect de l'autonomie parlamentares, qui implique des pouvoirs étendus à l'égard de leurs personnels, et le sonhait de ces derniers d'obtenir des garanties équivalents à celles des fonctionnaires de l'État" (sublinhado agora) (22.

Quanto a Portugal crê-se näo ser discutível aquela equivalência, näo apenas em relaçäo aos funcionários públicos em geral como aos agentes de gabinetes de outros órgäos de soberania.



6

6.1. A primeira questäo interroga sobre a conformidade constitucional de uma norma que leva a autonomia parlamentar ao ponto de atribuir ao Presidente da Assembleia da República a fixaçäo do regime remuneratório do seu pessoal. Desde a versäo originária da Constituiçäo da República que o artigo 184º preceitua:

"Os trabalhos da Assembleia e os das suas comissöes seräo coadjuvadas por um corpo permanente de funcionários técnicos e administrativos e por especialistas requisitados ou temporariamente contratados, no número que o Presidente considerar necessário".

JORGE MIRANDA, em declaraçäo de voto, justificava a dignidade constitucional do preceito pela eficácia que a imposiçäo feita ao legisladorordinário de criar as" condiçöes administrativas, técnicas e financeiras para que ele seja um órgäo de soberania na plena acepçäo do tema" iria conferir aos trabalhos da Assembleia (23.

A outra norma constitucional citada como de potencial conflito seria a do artigo 168º, nº 1, alínea u), a qual considera reserva relativa de competência da Assembleia da República legislar sobre as "Bases do regime e âmbito da funçäo pública".

Recorde-se que durante a discussäo da nova LOAR, e a respeito do artigo 53º ora em foco, um deputado apelava para a näo violaçäo do princípio da superintendência do Governo na Administraçäo - cfr. supra 3.

- ínsito no artigo 202º e da unidade a que a funçäo pública deve estar sujeita (citou-se também o artigo 267º.

O artigo 202º da CR refere-se à competência administrativa do Governo, nela se inscrevendo:

"................................................

d) Dirigir os serviços e a actividade da administraçäo directa do Estado, civil e militar...;

e) Praticar todos os actos exigidos pela lei respeitantes aos funcionários e agentes do Estado e de outras pessoas colectivas públicas;

.................................................

No Título VIII (Administraçäo Pública) encontramos um conjunto de princípios e regras a que os órgäos e agentes administrativos devem obediência. O artigo 267º respeita à "Estrutura da Administraçäo", no qual releva a preocupaçäo de desburocratizaçäo, a aproximaçäo entre os serviços e as populaçöes, a participaçäo dos interessados na gestäo efectiva dos serviços, devendo actuar-se formas adequadas de descentralizaçäo e desconcentraçäo, mas "sem prejuízo da necessária eficácia e unidade de acçäo e dos poderes de direcçäo e superintendência do Governo" (nº 2).

Adiante, no artigo 269º (regime da funçäo pública), impöe-se aos "trabalhadores da Administraçäo Pública e demais agentes do Estado e outras entidades públicas" uma sujeiçäo exclusiva ao "serviço do interesse público", o näo prejuízo ou benefício em virtude do exercício de quaisquer direitos políticos constitucionais, a garantia de audiência e defesa em processo disciplinar, enfim, a regra da inacumulabilidade de empregos ou cargos públicos e um estatuto de incompatibilidades.



6.2 Quando o artigo 184º da CRP alude a "um corpo permanente de funcionários" ao serviço da Assembleia näo afasta, antes supöe, a nosso ver, que esses funcionários poderäo fazer parte de um quadro dotado de especificidades.

Crê-se, porém, que já näo seria conforme à Constituiçäo afastá-los da observância de certos princípios previstos no Título VIII para os trabalhadores da Administraçäo Pública, demais agentes do Estado e de outras entidades públicas, bem como retirar-lhes direitos e garantias aí consignados, como funcionários do Estado que säo.

Todavia, parecem suficientemente ancoradas no princípio da separaçäo entre órgäos de soberania (artigo 114º) as especialidades do seu estatuto, mesmo quanto ao regime remuneratório. As particularidades do trabalho efectuado justificaräo, sem dúvida, compensaçöes ajustadas. O facto de ser da competência do Presidente a fixaçäo do regime remuneratório igualmente pode encontrar fundamento naquele princípio de separaçäo de poderes ainda espelhado no facto de a Assembleia da República gozar de orçamento próprio, aprovado pelo Plenário que, como se viu, também aprova o seu relatório de execuçäo e respectiva conta (24.

Como atrás se anotou, pode ainda apelar-se para os poderes de auto-organizaçäo e funcionamento cometidos à Assembleia da República (para o Governo resultam do disposto no nº 2 do artigo 201º da Constituiçäo).



6.3 A doutrina (25 distingue três níveis no alcance da reserva de competência legislativa da AR: um, mais exigente, em que lhe pertence todaa regulamentaçäo; outro, menos exigente, em que a reserva se limita ao regime geral, comum ou normal da matéria; um terceiro, em que a reserva apenas respeita às bases gerais do regime jurídico da matéria.

Näo é fácil determinar os contornos das bases gerais ou, no caso, das "bases do regime da funçäo pública". O "estatuto próprio da funçäo pública como organizaçäo e como relaçäo de emprego específica" e a demarcaçäo do seu âmbito, ou seja, das áreas em que os organismos e servidores do Estado ficam sujeitos àquele regime, seriam matérias daquelas "bases" (26 .

Atendendo a que a LOAR é uma lei formal da AR, näo se vê onde poderia nascer uma inconstitucionalidade orgânica por violaçäo do disposto no artigo 168º, nº 1, alínea u), da Constituiçäo. Quando muito, a entenderem-se fixadas as bases do regime e âmbito da funçäo pública e que o seu desenvolvimento cabia ao Governo, estar-se-ia perante competência legislativa concorrencial (nº 2 do artigo 115º e alínea c) do nº 1 do artigo 201º, ambos da CRP).

Nem, por outro lado, se poderá dizer retirada indevidamente esta matéria da competência administrativa do Governo pois que a leitura das normas constitucionais näo pode ser feita considerando-as isoladamente, mas como fazendo parte de um conjunto unitário e coerente de normas e princípios.

A atribuiçäo da competência em causa ao Presidente da AR näo fere, por si, de modo insustentável, a competência administrativa do Governo face aos funcionários e agentes do Estado, pois encontra apoio, como já se frisou, no princípio da separaçäo de poderes entre órgäos de soberania e ainda na capacidade de auto-organizaçäo cometida pela Constituiçäo ao Parlamento.

Já näo será despiciendo saber como é exercida aquela competência, nomeadamente se for quebrada a harmonia suposta entre o regime remuneratório do conjunto dos dos trabalhadores da Administraçäo Pública e demais agentes do Estado.


7

Passemos à segunda questäo.

Essencialmente, o que está em causa é saber se na ressalva da parte final do artigo 53º da LOAR se consagrou ou näo um limite à fixaçäo do regime remuneratório do pessoal da AR, pelo Presidente, proveniente do montante que as letras representam na tabela de vencimentos do funcionalismo público.

Näo perfilhamos a tese da Assessoria Jurídica da AR, segundo a qual as letras respeitantes às categorias funcionais mencionadas no anexo I à LOAR, näo implicam uma referência a determinado conteúdo quantitativo, mas apenas uma hierarquizaçäo de carreiras e categorias que näo pode ser discutida nem ultrapassada.


7.1 Como já se disse - supra 2.3. - as carreiras e respectivas categorias do quadro anterior do pessoal da AR e do quadro actual reestruturado, repartem-se por forma muito semelhante.

Mas mais importante é agora realçar que os grupos de pessoal e as suas categorias, sempre que correspondem ao desempenho de funçöes semelhantes às da Administraçäo Pública geral, säo designados de modo igual e cabem-lhes letras de "vencimento" iguais, o que pode confirmar-se pela comparaçäo entre o falado anexo I da LOAR e o mapa II anexo ao Decreto-Lei nº 241/85, de 15 de Julho, que reestruturou as carreiras da funçäo pública (27.

Exemplo frisante topa-se logo no agrupamento do pessoal em que aos grupos de pessoal dirigente, técnico superior, técnico, técnico-profissional, administrativo, operário e auxiliar, previstos no artigo 14º do Decreto-Lei nº 248/85, a LOAR apenas adita o pessoal com funçöes de chefia (o chefe de sector como categoria única) e o pessoal técnico-auxiliar (28 .

Idêntica paridade se verifica nas categorias do pessoal da carreira técnica superior e da carreira técnica, apresentando-se dividido pelas mesmas e, o que ora mais interessa, remuneradas precisamente com iguais letras de vencimento (29 .

Quer isto dizer que é flagrante a coincidência de situaçöes e seu tratamento por categorias e remuneraçöes, embora sem excluir especificidades (que o nº 3 do artigo 14º do citado Decreto-Lei nº 248/85 também admite expressamente) e até valorizaçäo (de letra) quanto a categorias previstas na AR com igual designaçäo (30 .

Sendo os funcionários parlamentares também funcionários do Estado e ressalvando-se, na fixaçäo dos seus vencimentos, o estipulado naquele anexo I à LOAR, näo se encontra qualquer fundamento para quebrar a harmonia que resulta de à mesma realidade básica funcional corresponder letra idêntica de vencimentos.

Só com uma manifestaçäo inequívoca de intençäo se poderia aceitar a ruptura da uniformidade do sistema.



7.2 A ideia de tratamento idêntico de situaçöes idênticas encontra também manifestaçäo em alguns preceitos já atrás aludidos.

Assim, pode ao chefe de gabinete do Presidente da Assembleia da República poder ser atribuído abono para despesas de representaçäo, dentro dos limites em vigor para o gabinete do Primeiro-Ministro, de acordo com o nº 2 do artigo 10º da LOAR, o mesmo podendo suceder com o abono para despesas de representaçäo do secretário-geral da AR, que também näo poderá exceder os limites estabelecidos para os secretários-gerais dos outros órgäos de soberania (artigo 21º, nº 6) (31.

Subjacente encontra-se o sentido de equiparaçäo.


7.3 Ao mesmo resultado se chegaria, a entender-se que a remissäo da parte final do artigo 53º da LOAR näo era suficientemente clara ou era mesmo lacunosa. Funcionaria, entäo, o dispositivo do artigo 45º, que aponta como direito subsidiário do estatuto dos funcionários parlamentares a legislaçäo aplicável à administraçäo central do Estado. Ora, na legislaçäo aplicável à Administraçäo Pública central a referência às letras de vencimento assume o conteúdo preciso do quantitativo que lhes mais corresponde na tabela geral da remuneraçäo da designada Funçäo Pública (32.

7.4 Deu-se conta de que alguns deputados da Oposiçäo, durante a discussäo da LOAR, observaram haver discrepância, ou mesmo contradiçäo nos termos do artigo 53º: o Presidente fixava o regime remuneratório, mas se tinha de respeitar o disposto no anexo I, nessa medida o regime era fixado exteriormente ao seu critério.

Como se vem procurando demonstrar, crê-se que a interpretaçäo correcta do preceito é a que considera aquela ressalva em termos de näo se bulir no montante correspondente a cada letra segundo a tabela geral de vencimentos dos trabalhadores da Administraçäo Pública.

E o preceito mantém-se sem paradoxo ou contradiçäo insanável, mas também sem se aderir à tese da Assessoria Jurídica que pretende dar-lhe o máximo de maleabilidade.

Com efeito, na interpretaçäo que ora se perfilha, sobeja campo de actuaçäo para o Presidente da Assembleia da República na fixaçäo do regime remuneratório.

Desde logo, quanto às nomeaçöes do pessoal de apoio aos grupos parlamentares, de livre escolha e nomeaçäo destes, o qual pode näo se encontrar subordinado a qualquer vínculo anterior à Administraçäo (artigo 62º, nº 3) e tornar-se necessário fixar-lhe a respectiva remuneraçäo.

Para além de aspectos menores, como sejam, o da fixaçäo de abonos para despesas de representaçäo, já referidos, as compensaçöes de encargos decorrentes de requisiçäo de técnicos (artigo 59º, nº 2, alínea b)), ao Presidente compete fixar, obtido o parecer favorável do Conselho de Administraçäo e sob proposta do secretário-geral, o montante da remuneraçäo suplementar (artigos 22º, nº 2, alínea a) e 52º, nºs 2 e 3). Igualmente lhe compete fixar o subsídio de alimentaçäo e transporte para situaçöes excepcionais de funcionamento dos serviços da AR (artigos 22º, nº 2, alínea b) e 52º, nº 4).

O que näo pode, no entanto, é alterar o quantitativo correspondente às letras de vencimento de cada categoria. Enquanto subsistir o sistema vigente, haverá uma remissäo implícita e dinâmica para as actualizaçöes que nelas forem ocorrendo por força de outros diplomas legais.
Aliás, se pudemos afirmar a constitucionalidade do regime instituído, que confere autonomia de recursos e da sua gestäo ao Parlamento, tal näo significa que se o exercício dos poderes do Presidente, no âmbito do regime remuneratório do pessoal da AR (33 , viesse a criar diversidades näo justificadas por especiais ónus ou dificuldades do labor desenvolvido, tal näo ofendesse porventura outros princípios constitucionais.
Conclusão:


8

Pelo exposto se formulam as seguintes conclusöes:


1ª A norma do artigo 53º da Lei Orgânica da Assembleia da República - Lei nº 77/88, de 1 de Julho -, ao conferir poderes ao Presidente da Assembleia para fixar o regime remuneratório dos funcionários parlamentares e outro pessoal nela mencionado, tem fundamento, como outras regras dessa lei, no princípio da separaçäo entre órgäos de soberania (artigo 114º, nº 1, da Constituiçäo), e colhe apoio na competência auto-organizativa do Parlamento, näo sendo incompatível com quaisquer normas ou princípios da Lei Fundamental;


2ª Os poderes concedidos ao Presidente da Assembleia da República pela aludida norma do artigo 53º devem ser exercidos sem prejuízo do disposto no anexo I à Lei nº 77/88, o que significa, além do mais, näo abrangerem a possibilidade de alteraçäo do quantitativo correspondente às letras de vencimento de cada categoria, tal como resulta da tabela geral de vencimentos dos trabalhadores da Administraçäo Pública.



(1 De 3 de Março de 1989.
(2 Alude ainda nesse parecer à existência, no "processo legislativo", de um ofício do Sindicato dos Funcionários Públicos, (quereria dizer-se Parlamentares) dirigido ao Presidente da Comissäo de Direitos, Liberdades e Garantias, de 14.04.88, em o Sindicato elenca um certo número de matérias que pretenderia ver consagradas na futura lei, entre elas, que se cometesse à Assembleia da República a fixaçäo das remuneraçöes do seu pessoal. Terá sido a partir dessa proposta que surgiu a norma do artigo 53º.
(3 Volta a recordar-se o ofício do Sindicato, citado na nota (2), informando-se que o Sindicato, emobra tenha recorrido às letras quando propunha a revisäo dos vencimentos da carreira técnica superior, já lhes daria um conteúdo que nada tinha a ver com idênticas letras da Funçäo Pública. Reconhece-se, todavia, que näo foi obtido o acordo do Partido autor do projecto de lei para a revisäo de tais vencimentos, mas houve-o para a "soluçäo de que o regime remuneratório dos funcionários parlamentares fosse da competência da Assembleia da República". O que, diga-se desde já, para a questäo em causa pouco adianta.
(4 Ao Chefe do Gabinete do Presidente da Assembleia da República pode ser atribuíd um abono para despesas de representaçäo, a fixar pelo President e, "nos limites em vigor para o Gabinete do Primeiro-Ministro".
(5 A sua remuneraçäo é igual ao vencimento base fixado para o cargo de director-geral, acrescido da diferença entre este e o de subdirector- -geral, podendo ser-lhe atribuído um abono para despesas de representaçäo, a fixar pelo Presidente, ouvido o Conselho de Administraçäo, que näo exceda os limites estabelecidos para os secretários-gerais dos outros órgäos de soberania (nºos 5 e 6 do artigo 21º) - sobre tal estatuto e sua comparaçäo com os funcionários de outros órgäos de soberania pode ver-se o Parecer nº 90-88, de 9.03.89, pendente de homologaçäo.
(6 Cfr. nº 4 do artigo 269º da Constituiçäo da República, o Decreto-Lei nº 11o-A/81, de 14 de Maio - artigos 22º e 23º - e a alínea c) do nº 1 do artigo 24º do Decreto-Lei nº 24/84, de 16 de Janeiro, que aprovou o Estatuto Disciplinar. V. JOÄO ALFAIA, "Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público", 1º vol., 1985, págs. 168 e segs..
(7 O artigo 59º permite ao Presidente da AR autorizar a requisiçäo ou destacemento, nos termos da lei geral, de funcionários de outros departamentos do Estado, auferindo, por inteiro, as remuneraçöes inerentes aos cargos que exerciam "acrescidas das compensaçöes de encargos decorrentes das requisiçöes que forem fixadas por despacho do Presidente ... "Por sua vez, no artigo 61º permite-se, ainda que a título excepcional, a contrataçäo de pessoal além do quadro, ao qual também é evidentemente necessário fixar uma remuneraçäo, emobra tal näo se diga de forma expressa nesse preceito.
(8 De 28.12.87, publicado no D.A.R., II Série, nº 35, de 30.12.87.
(9 De 27.01.88, publicado no D.A.R., II Série, nº 44, de 3.02.88..
(10 Parecer de 4.02.88, publicado no D.A.R., I Série, nº 45, de 5.02.88.
(11 D.A.R., I Série, nº 51, de 12.01.88, pág. 1718.
(12 Cfr. D.A.R., I Série, nº 51, pág 1726.
(13 Cfr. ,D.A.R., II Série, nº 74, de 11.05.88, e I Série, n's 84, de 6.05.88, e 86 de 11.05.88.
(14 Deputado JORGE DE LEMOS (PCP), pág. 3493 do D.A.R., I Série, nº 86, de 11.05.88.
(15 Deputado JORGE LACÄO (PS), pág. 3494, D.A.R., cit. na nota anterior.
(16 Repare-se que a remissäo para o anexo I tem sido entendida, no plano concreto, como a referência às letras de cada categoria dentro das carreiras.
(17 Uma disposiçäo transitória da Lei nº 27/79 prevê a reestruturaçäo de carreiras e correcçäo de anomalias previstas no Decreto-Lei nº 191-C/79, de 25 de Junho.
(18 Na sequência de nova redacçäo dada ao artigo 20º da Lei nº 32/77.
Aquele despacho Normativo nº 368-A/79 foi alterado pelo Despacho Normativo nº 253/80, de 13 de Agosto, e ainda pela Resoluçäo da Assembleia da República nº 4/84, de 18 de Julho, que publicou um novo anexo com o quadro de pessoal.
(19 JACQUES-SYLVAIN-KLEIN, "Le fondement législatif du statut des fonctionnaires parlamentaires", in Droit Administratif, AJDA, Spécial fonction publique, Abril de 1984, pág. 241. Cfr. também, PIERRE/ AVRIL JEAN GICQUEL, "Droit Parlementaire" , Montchrestien, 1988, pág. 61 e segs.; SILVERA e SERGE SALON , "La fonction publique et ses problèmes actuels, Paris, 1976, págs. 32 e segs.; CLAUDE DE JOURNES, "L'Administration des assemblées parlamentaires sous la Cinquième République" , in Revue du Droit Publique et de la Science Politique en France et à l'Étranger, 1978, pág. 321 e segs.; JEAN-MARIE PONTIER," Parlement et Administration en France, in Annuaire Européen d'Administration Publique, IV, 1981. Para Itália - V.PAOLO BISCARETTI DI RUFFIA, "Diritto Costituzionale", 7ª ediçäo, Nápoles, 1965, pág. 336 e segs., com atinência para a temática da separaçäo de poderes - v. Parecer nº 160/81, de 28.01.82, näo homologado.
(20 Foram elas: "ordonnance" de 17.11.1958, lei de finanças para 1963 e lei de 13.07.83.
(21 Na recolha de dados comparativos in "Les Parlements dans le Monde", vol. I, preparado por " Le Centre International de Documentation Parlamentaire de l'Union Interparlementaire", Bruxelas, 1986, informa-se que num total de 81 países, o secretário-geral é nomeado, em 36, pelo órgäo director do Parlamento, em 19, pelo Parlamento, em 16, pelo Chefe do Estado, em 6 por uma Comissäo da Funçäo Pública e apenas em 4 pelo Governo.
(22 CHARLES DÉBBASCH et alia, "Droit Constitutionnel et Institutions Politiques", 2ª ediçäo, Economica, Paris, 1986 pág. 694.
(23 AMARO DA COSTA lembrava a necessidade de os parlamentares, à semelhança, por exemplo, do Parlamento Europeu, disporem de "staff" próprio. Cfr. Diário da Assembleia Constituinte, nº 111, de 11.02.76, pág. 3672.Tal desiderato encontrava já guarida no nº 3 do artigo 183º onde se afirma que os grupos parlamentares, para além de locais de trabalho, devem dispor de pessoal técnico e administrativo da sua confiança.
(24 Segundo uma norma sistematicamente repetida nos diplomas de actualizaçäo dos vencimentos dos trabalhadores da Administraçäo Pública - v.g. o nº 3 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 98/89, de 29 de Março -, nas remuneraçöes asseguradas pelo cofre geral dos tribunais e pelo cofre dos conservadores, notários e funcionários de justiça, aquela actualizaçäo fica dependente de despacho do Ministro da Justiça.Näo surpreenderá, assim, que também o Presidente da Assembleia da República tenha poderes para gerir verbas de um orçamento anterior.
(25 GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituiçäo da República
Portuguesa Anotada, 2ª ediçäo, 2º vol., 1985, pág. 197.
(26 GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, loc. cit., pág. 203. Do primeiro autor cfr. ainda Direito Constitucional, 4ª ediçäo, pág. 622 e segs..
Reportando-se à anterior expressäo, de alcance sensivelmente mais amplo que a actual - dizia a alínea u) da versäo originária da Constituiçäo: "Regime e âmbito da funçäo pública ..." - entendeu a Comissäo Constitucional, no parecer nº 22/79, de 7.08.79, in Pareceres da Comissäo Constitucional, 9º vol., pág. 48, que pertencia à competência reservada da AR a definiçäo do "estatuto geral da funçäo pública, é dizer, a definiçäo do sistema de categorias, de organizaçäo de carreiras, de condiçöes de acesso e de recrutamento, do complexo de direitos e de deveres funcionais que valem em princípio para todo e qualquer funcionário público e que, por isso mesmo, fornecem o enquadramento da funçäo pública como um todo, dentro das funçöes do Estado".
(27 Diploma alterado (artigos 18º e 19º) pelo Decreto-Lei nº 265/88, de 28 de Julho, que reestruturou as carreiras técnica superior e técnica.
(28 Ao pessoal administrativo faz equivaler a LOAR o grupo de pessoal de Administraçäo.
(29 Note-se que ao tempo da publicaçäo da LOAR ainda näo estava em vigor o Decreto-Lei nº 265/88.
(30 O caso, por exemplo, do tesoureiro, que na AR tem apenas uma categoria, a que cabe a letra E (contra três categorias no mapa II do Decreto-Lei nº 265/88, sendo a letra H a mais elevada).
(31 A letra da lei até "consentiria" um abono de quantia menos elevada.
(32 Cfr., como diplomas mais recentes , a Portaria nº 780/86, de 31 de Dezembro, o Decreto-Lei nº 26/88, de 30 de Janeiro, anexo ao Decreto-Lei nº 98/89, de 29 de Março.
(33 Nos termos do Decreto-Lei nº 383-A/87, de 23 de Dezembro, cabe ao Primeiro-Ministro e ao Ministro das Finanças fixar os vencimentos mensais ilíquidos do pessoal dirigente, o que tem sido feito através do Despachos Normativos nºs 16/88, de 6 de Abril e 23/89, de 15 de Março.
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART184 ART168 N1 N ART202 D E ART267 ART114.
L 77/88 DE 1988/07/01 ART53 ART45 ART76 N2 ANEXOI.
DL 575/76 DE 1976/07/21.
DL 693/76 DE 1976/09/21 ART1.
L 32/77 DE 1977/05/25 ART3 N1 ART8 ART17 ART20 ART25 N2.
DN 368-A/79 DE 1979/12/14.
L 5/83 DE 1983/07/27.
L 11/85 DE 1985/06/20.
DL 241/85 DE 1985/07/15 MAPAII.
Referências Complementares: 
DIR ADM * FUNÇÃO PUBL / DIR CONST.
Divulgação
Número: 
DR201
Data: 
01-09-1989
Página: 
8683
Pareceres Associados
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