Simp English Español

Está aqui

Dados Administrativos
Número do Parecer: 
140/2001, de 14.03.2002
Data do Parecer: 
14-03-2002
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério das Finanças
Relator: 
ESTEVES REMÉDIO
Descritores e Conclusões
Descritores: 
REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES
ESTATUTO POLÍTICO-ADMINISTRATIVO
ARMAZÉM DA ALFÂNDEGA
TITULARIDADE
ESTADO
PRINCÍPIO DA UNIDADE DO ESTADO
PATRIMÓNIO DO ESTADO
PATRIMÓNIO REGIONAL
AUTONOMIA REGIONAL
REGIÃO AUTÓNOMA
DOMÍNIO PÚBLICO
DOMÍNIO PRIVADO
DOMÍNIO PRIVADO DISPONÍVEL
DOMÍNIO PRIVADO INDISPONÍVEL
DOMÍNIO PÚBLICO NECESSÁRIO
DESAFECTAÇÃO
SERVIÇO ESTADUAL
DIRECÇÃO-GERAL DO PATRIMÓNIO DO ESTADO
DIRECÇÃO-GERAL DAS ALFÂNDEGAS
ALFÂNDEGA
INTERPRETAÇÃO DA LEI
Conclusões: 
1. O Estado e as regiões autónomas (bem como as autarquias locais) são titulares de domínio público e de domínio privado (indisponível e disponível);

2. De acordo com o disposto na alínea a) do artigo 113.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores:
2.1. Integram o domínio privado da Região os bens do domínio privado do Estado existentes no território regional, excepto os afectos aos serviços estaduais não regionalizados;
2.2. Integram o domínio privado indisponível do Estado os bens a este pertencentes, que, na Região Autónoma dos Açores, se encontrem afectos ao funcionamento de serviços estaduais não regionalizados, como os serviços integrados na Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo;

3. Os bens a que se refere a parte final da conclusão 2.2., uma vez terminada a sua afectação ao funcionamento de serviços estaduais integrados na Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, continuam na titularidade do Estado, passando, com as legais consequências, a integrar o seu domínio privado disponível;

4. Compete à Direcção-Geral do Património, serviço do Ministério das Finanças encarregado de assegurar de forma integrada a gestão e administração do património do Estado, proceder à aquisição, administrar e alienar os bens do património do Estado [artigo 22.º, n.º 1, e n.º 2, alíneas b) e c), do Decreto-Lei n.º 158/96, de 3 de Setembro].
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Secretário de Estado do Tesouro e das
Finanças,
Excelência:


1.

Dignou-se Vossa Excelência solicitar a emissão de parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, «visando encontrar solução jurídica para a titularidade do designado Antigo Armazém da Alfândega, sito em Santa Cruz das Flores, Açores» ([1]).

A questão surge directamente relacionada com duas disposições do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores (EPARAA) ([2]), que, para melhor percepção de posições tomadas sobre a matéria, convém, desde já, conhecer:

«Artigo 112.º
Domínio público

1 – Os bens do domínio público situados no arquipélago pertencentes ao Estado, bem como aos antigos distritos autónomos, integram o domínio público da Região.
2 – Exceptuam-se do domínio público regional os bens que interessam à defesa nacional e os que estejam afectos a serviços públicos não regionalizados, desde que não estejam classificados como património cultural.


Artigo 113.º
Domínio privado

Integram o domínio privado da Região:
a) Os bens do domínio privado do Estado existentes no território regional, excepto os afectos aos serviços estaduais não regionalizados;
b) Os bens do domínio privado dos três antigos distritos autónomos;
c) As coisas e direitos afectos a serviços estaduais transferidos para a Região;
d) Os bens adquiridos pela Região dentro ou fora do seu território ou que por lei lhe pertençam;
e) Os bens abandonados e os que integrem heranças declaradas vagas para o Estado, desde que uns e outros se situem dentro dos limites territoriais da Região.»


São, em síntese, as seguintes as tomadas de posição a que nos referimos.

As Autoridades Regionais defendem que as disposições citadas são de aplicação permanente, devendo ser interpretadas de forma dinâmica; continuam, por isso, a permitir à Região adquirir (automaticamente) a titularidade de todos os bens do domínio público do Estado que deixem de interessar à defesa nacional ou que sejam desafectados de serviços públicos não regionalizados (artigo 112.º, n.º 2, 1.ª parte), bem como dos bens do domínio privado do Estado que deixem de estar afectos a serviços públicos não regionalizados [artigo 113.º, alínea a)] ([3]).

Por seu turno, na Direcção-Geral do Património do Ministério das Finanças conclui-se sobre esta matéria ([4]):

«1) O art. 112.º do EPARAA deverá ser interpretado restritivamente. Assim sendo, o património cultural de interesse nacional não pode ser transferido para o domínio público regional, pois consubstancia uma afirmação da identidade cultural, histórica e artística nacional;

«2) Os bens do domínio público militar, aéreo e marítimo integram o domínio público necessário do Estado, sendo essenciais ao exercício dos poderes de soberania, pelo que não poderão sair da esfera patrimonial do Estado;

«3) O art. 113.º do EPARAA deverá ser interpretado restritivamente, atendendo-se ao seu elemento teleológico. Assim, tal norma não dispõe para o futuro, tendo-se esgotado o seu alcance no momento da entrada em vigor do respectivo Estatuto, não se afigurando congruente a imposição de uma restrição à capacidade patrimonial do Estado que dificulte a prossecução das suas atribuições.»

Não se esperará do Conselho Consultivo uma indagação teórica sistemática que abarque todas as questões suscitadas pelos artigos transcritos ou tão-só sugeridas pelas sínteses conclusivas acabadas de referir.

Enquanto órgão de consulta jurídica da Procuradoria-Geral da República (artigos 36.º e 37.º do Estatuto do Ministério Público), o Conselho Consultivo faz investigação jurídica aplicada, que, neste caso, será finalisticamente orientada para a resolução de uma concreta questão, qual seja a de «encontrar solução jurídica para a titularidade do designado Antigo Armazém da Alfândega, sito em Santa Cruz das Flores, Açores».

Delimitado o respectivo objecto, cumpre emitir parecer.


2.

Nos termos da Constituição, Portugal é uma República soberana e a soberania, una e indivisível, reside no povo (artigos 1.º e 3.º).

Portugal abrange o território historicamente definido no continente europeu e os arquipélagos dos Açores e da Madeira (artigo 5.º, n.º 1).

De acordo com o artigo 6.º, o Estado é unitário e respeita na sua organização e funcionamento o regime autonómico insular e os princípios da subsidiariedade, da autonomia das autarquias locais e da descentralização democrática da administração pública (n.º 1); os arquipélagos dos Açores e da Madeira constituem regiões autónomas dotadas de estatutos político-administrativos e de órgãos de governo próprio (n.º 2).

O artigo 6.º da Constituição, enquanto critério orientador da organização e estruturação da administração pública, inclui um princípio constitucional geral – o princípio da unidade do Estado, que implica designadamente a proibição de qualquer forma de pluralismo estadual, segundo um esquema federal ou outro – e três princípios de âmbito menor que qualificam aquele sem o contrariarem – os princípios da autonomia local, da descentralização administrativa e da autonomia regional.

O princípio da unidade do Estado constitui, por um lado, um pressuposto e um fim da autonomia regional e, por outro, um limite à descentralização política consagrada na Constituição ([5]).


2.1. A regionalização política não é um princípio geral de organização do Estado e abrange apenas uma pequena parte do território nacional tendo aliás em conta a sua situação particular, designadamente, o serem territórios insulares periféricos ([6]) ([7]) ([8]).

Esta situação peculiar é, depois, especificada no Título VII da Parte III (organização do poder político), que a Constituição dedica às regiões autónomas (artigos 225.º a 234.º).

Assim, estabelece-se no artigo 225.º que as características geográficas, económicas, sociais e culturais e as históricas aspirações autonomistas das populações insulares constituem o fundamento do «regime político-administrativo próprio dos arquipélagos dos Açores e da Madeira» (n.º 1), da «autonomia político-administrativa regional» (n.º 3) .

A autonomia regional traduz-se neste «regime político-administrativo próprio» e consiste essencialmente numa certa medida de autonomia política (e não apenas administrativa), consubstanciada designadamente em poderes legislativo e executivo próprios. É principalmente isto que distingue as regiões autónomas das regiões administrativas, também previstas na Constituição (artigos 255.º a 262.º).

As regiões autónomas «são formas de descentralização política do Estado – e não apenas descentralização administrativa –, assente no reconhecimento de comunidades regionais dotadas de interesses políticos próprios no contexto da comunidade nacional» ([9]).

Na descentralização política, «por maiores que sejam os poderes legislativos e governativos dados às províncias ou regiões – porque só há descentralização política de âmbito territorial – estas não integram nunca o conceito de Estado. Esses poderes não são próprios delas e os ordenamentos jurídicos que constituem não têm validade originária, nem dispõem de eficácia ou executoriedade sem o apoio do braço do Estado. Descentralização política equivale, não a soberania, mas apenas a autonomia político-administrativa ou (...) a autonomia com integração», isto é, autonomia «de comunidades que compõem, com outras, um povo, ao qual corresponde um certo e determinado Estado e que por essa via têm pleno acesso à soberania desse Estado» ([10]).

A autonomia político-administrativa regional não afecta a integridade da soberania do Estado e exerce-se no quadro da Constituição (n.º 3 do artigo 225.º) ([11]).

A autonomia regional visa, aliás, para além do desenvolvimento económico-social e da promoção e defesa dos interesses regionais, o próprio reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses (n.º 2 do artigo 225.º da Constituição).


2.2. A autonomia das regiões implica uma relativa atenuação da acção e dos poderes do Estado a par da afirmação das regiões, mas implica também a contenção da acção regional dentro de parâmetros que evitem a chamada recentralização regional (o que sucederia, por ex., no caso de esvaziamento de competências das autarquias locais no território das regiões) ([12]).

A concreta configuração da autonomia regional tem, desde 1976, sido condicionada por uma tensão dialéctica, mais acentuada no período inicial, entre as reivindicações dos órgãos de governo próprio das Regiões e as reacções centralistas por parte de instâncias do poder central do Estado.

A autonomia tem, pois, um carácter dinâmico, como se pode constatar através das mutações que se têm verificado tanto no plano constitucional como no da lei ordinária ([13]).

No actual quadro constitucional, para além da autonomia política, expressa na existência de órgãos de governo próprio (artigos 6.º, n.º 2, 225.º e 231.º), o regime autonómico insular tem outras dimensões: a autonomia normativa, ou seja, a competência legislativa e regulamentar (artigos 112.º, n.ºs 1 e 2, 227.º, 228.º e 232.º); a autonomia administrativa (artigos 226.º e 228.º); a autonomia económica e financeira, que implica a garantia de recursos financeiros suficientes para a prossecução das tarefas que incumbem às regiões [artigos 164.º, alínea t), 227.º, n.º 1, alíneas h) a j), e 229.º, n.º 3, tal como os anteriores, da Constituição]; e a autonomia como liberdade de decisão dentro do leque de competências constitucional e estatutariamente definidas sem qualquer tutela ou controlo dos órgãos do governo central ([14]).

E, dentro dos limites constitucionais, a autonomia regional ou as suas assinaladas dimensões não são rígidas nem imutáveis, antes podem, com o decurso do tempo e a alteração de circunstâncias, apresentar flutuações ou diferentes graus de concretização.

Assim, ressalvada a sua compatibilização com os objectivos enunciados nos n.ºs 2 e 3 do artigo 225.º da Constituição, nada impede que a autonomia regional dos Açores e da Madeira «se vá ampliando de acordo com o desenvolvimento económico-social e a promoção dos interesses regionais. Assim sucedeu, de forma muito clara, recentemente, com a revisão de 1997» ([15]), em que se assistiu «a um alargamento substancial dos poderes legislativos das regiões» ([16]), com eventuais reflexos na autonomia administrativa e na autonomia económica e financeira (e patrimonial), áreas mais directamente implicadas no objecto da consulta.

A fronteira entre o conteúdo da autonomia regional e os poderes do Estado tem contornos flexíveis, tendencialmente definidos por um critério que reserve para as autoridades centrais as competências próprias da essência dos poderes de soberania (v. g., política externa, política de defesa nacional, justiça, segurança interna e matérias que integram a matriz do Estado de direito democrático – nacionalidade, sistema eleitoral, direitos, liberdades e garantias, e bases gerais da administração pública) e transfira para as regiões as atribuições e competências mais ligadas ao Estado assistencial (por ex., em áreas como a educação, saúde, segurança social, trabalho, ambiente, património cultural ou organização económico-financeira), sem prejuízo dos princípios fundamentais constantes de leis gerais da República (artigos 228.º e 112.º, n.º 4, da Constituição) ([17]).

Há, digamos, como que um núcleo central da autonomia, a par de matérias inerentes à essência dos poderes de soberania. Entre um e outras, existem espaços de livre conformação do legislador, nos quais a autonomia conhece avanços e recuos, ampliações e compressões ([18]).

Em termos gerais, as questões de natureza administrativa «aparecem como problemas vitais do regionalismo, na medida em que é ao seu nível que as regiões são confrontadas com as realidades quotidianas»; «sem a actividade administrativa que a prolonga e concretiza, a actividade legislativa não tem quase sentido, de maneira que, por extensa que seja a função legislativa, não se poderá avaliar o seu alcance verdadeiro senão precisando a amplitude e os limites da função administrativa» ([19]).

No âmbito da sua autonomia administrativa, as regiões autónomas detêm, face ao disposto no n.º 1 do artigo 227.º da Constituição, várias categorias de poder regulamentar e de poder executivo em sentido estrito, designadamente:

– poder regulamentar de legislação nacional e de legislação regional [alínea d)];
– poder executivo próprio [alínea g)];
– poder executivo delegado;
– poder executivo específico ou conexo com outras matérias, nomeadamente, administração e disposição do seu património e celebração dos actos e contratos em que tenham interesse [alínea h)].

O poder executivo próprio é «aquele que respeita à execução das leis e dos regulamentos regionais e, bem assim, aquele que respeitar à execução de normação nacional, mas, tão-só, em matérias explicitamente definidas nos estatutos político-administrativos»; o poder executivo delegado é o que «foi conferido à região pelos órgãos de soberania mediante acto legislativo de transferência, não gozando, por consequência, da especial protecção que o estatuto lhe poderia oferecer» ([20]).

O quadro da autonomia regional, que, em linhas gerais, acabámos de esboçar não constitui, do sistema, um dado rígido e imutável, não obstante a consolidação e estabilidade alcançadas.

Atenta a sua conexão com as políticas de defesa nacional e de segurança externa e interna do Estado, o controlo das fronteiras e dos fluxos de pessoas e bens – serviço em que se integra a matéria do parecer –, constitui uma área tradicionalmente reservada às autoridades centrais ([21]).

Assim acontece entre nós, onde a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo «ocupa pelas suas atribuições, inserção e posicionamento do aparelho do Estado, uma situação destacada no âmbito da Administração Pública» ([22]).


3.

Os direitos do Estado sobre o território sujeito à sua jurisdição distinguem-se dos direitos do Estado sobre parcelas desse território ou bens nele existentes, «correspondentes grosso modo a propriedade no sentido de direito real ou de estrutura próxima da propriedade, e estejam estes submetidos ao Direito público ou submetidos ao Direito privado» ([23]).

São realidades distintas, portanto, o domínio público do Estado, o domínio privado do Estado e o chamado senhorio territorial do Estado, expressão com que se pretende abranger espaços indeterminados, como o espaço aéreo ou o espaço marítimo territorial, os quais «não são, como tais, objecto de direito de propriedade, embora possa uma fracção deles ser apropriada. O Estado exerce sobre esses espaços meros direitos dominiais, resultantes da jurisdição incluída no senhorio da entidade soberana sobre o território onde tem assento (o chamado domínio eminente)» ([24]).

Fala-se também, a este propósito, em domínio público necessário (por contraposição a domínio público acidental); pertencem ao domínio público necessário «os bens que não podem pertencer senão ao Estado, e o seu estatuto jurídico não pode ser outro senão o da dominialidade (domínio marítimo, domínio hídrico, domínio aéreo, domínio militar)» ([25]). E fala-se igualmente em bens inerentes à soberania nacional, para significar os «elementos essenciais do domínio marítimo e do domínio aéreo que não podem transferir-se do Estado para a Região» ([26]).

Fixemos a nossa atenção na delimitação do domínio público e do domínio privado.


3.1. Numa acepção objectiva, entende-se por domínio público o conjunto das coisas que, pertencendo ao Estado, às regiões autónomas ou às autarquias locais, «são submetidas por lei, dado o fim de utilidade pública a que se encontram afectadas, a um regime jurídico especial caracterizado fundamentalmente pela sua incomerciabilidade, em ordem a preservar a produção dessa utilidade pública» ([27]).

Acerca da natureza do direito sobre as coisas públicas, predomina, entre nós, a concepção de que as coisas públicas são objecto de um direito de propriedade pública, caracterizado pelos seguintes traços ([28]):

a) o sujeito do direito é sempre uma pessoa colectiva pública de população e território – o artigo 84.º, n.º 2, da Constituição é elucidativo a este respeito, ao estabelecer que a «lei define quais os bens que integram o domínio público do Estado, o domínio público das regiões autónomas e o domínio público das autarquias locais»;

b) o direito de propriedade pública é exercido para produção do máximo de utilidade pública das coisas que formam o seu objecto, conforme a lei determinar;

c) o uso das coisas públicas traduz-se na utilização por todos ou em benefício de todos;

d) a fruição nuns casos confunde-se com o uso, noutros é independente dele e consiste na faculdade de cobrar taxas pela utilização dos bens, ou na colheita dos seus frutos naturais;

e) as coisas públicas são incomerciáveis como tais pelos processos de Direito privado, mas comerciáveis segundo os processos de Direito público ([29]);

f) relativamente a terceiros, o proprietário exerce o jus excludendi alios por meio de actos administrativos definitivos e executórios, isto é, usando a sua própria autoridade e independentemente de recurso aos tribunais.

Sobre a delimitação do objecto do domínio público, isto é, sobre a questão de saber quais são, no direito português, os bens pertencentes ao domínio público, dispõe, em primeira linha, a própria Constituição, que, desde a revisão de 1989, contém uma disposição sobre esta matéria:

«Artigo 84.º
(Domínio Público)

1. Pertencem ao domínio público:
a) As águas territoriais com os seus leitos e os fundos marinhos contíguos, bem como os lagos, lagoas e cursos de água navegáveis ou flutuáveis, com os respectivos leitos;
b) As camadas aéreas superiores ao território acima do limite reconhecido ao proprietário ou superficiário;
c) Os jazigos minerais, as nascentes de águas mineromedicinais, as cavidades naturais subterrâneas existentes no subsolo, com excepção das rochas, terras comuns e outros materiais habitualmente usados na construção;
d) As estradas;
e) As linhas férreas nacionais;
f) Outros bens como tal classificados por lei.
2. A lei define quais os bens que integram o domínio público do Estado, o domínio público das regiões autónomas e o domínio público das autarquias locais, bem como o seu regime, condições de utilização e limites.»

A enumeração constante do n.º 1 é meramente exemplificativa, pois pertencem ao domínio público os bens expressamente referidos nas suas alíneas a) a e), bem como, de acordo com a alínea f), «outros bens como tal classificados por lei».

Do n.º 2 do artigo 84.º resulta, como já acentuámos, que apenas as pessoas colectivas de direito público de população e território – Estado, regiões autónomas e autarquias locais – podem ser titulares dos bens que integram o domínio público, sem prejuízo de os mesmos poderem estar afectados a outros entes públicos ou mesmo confiados a entidades privadas (concessionários de serviços e de obras públicas, ou de exploração do domínio público) ([30]).

Resulta também do artigo 84.º da Constituição que tanto a definição dos bens que integram o domínio público do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais, como a definição dos respectivos regime, condições de utilização e limites estão sujeitas ao princípio de reserva de lei (constitucional e ordinária).

Neste conspecto, assume uma importância relevante o Decreto-Lei n.º 477/80, de 15 de Outubro, diploma que, em conformidade com o sumário oficial, «cria o inventário geral do património do Estado».

Para efeitos de inventário – dispõe o artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 477/80 –, «entende-se por património do Estado o conjunto de bens do seu domínio público e privado, e dos direitos e obrigações com conteúdo económico de que o Estado é titular, como pessoa colectiva de direito público»; o inventário geral compreende, pois, «o domínio público, o domínio privado e o património financeiro do Estado» (artigo 3.º).

Sobre cada uma destas componentes versam, respectivamente, os artigos 4.º, 5.º e 6.º do Decreto-Lei n.º 477/80, de 15 de Outubro ([31]).

No âmbito do quadro legal mencionado, os bens do domínio público do Estado têm sido agrupados de forma diversa, consoante o critério do domínio público por que se opte ([32]).

Na esteira de MARCELLO CAETANO ([33]), será possível, na conjugação do critério da função específica ou principal que as coisas públicas desempenham com outros critérios complementares (por ex., a natureza física dos bens), arrumar os bens do domínio público do seguinte modo ([34]):

Domínio público hídrico (as águas territoriais, com os seus leitos e fundos marinhos contíguos; a plataforma continental; as águas marítimas interiores, leitos e margens; os lagos, lagoas e cursos de água navegáveis ou flutuáveis e respectivos leitos e/ou margens; as águas reconhecidas como aproveitáveis para a produção de energia eléctrica ou para a irrigação; as valas abertas pelo Estado e as barragens de utilidade pública; águas que interessam ao abastecimento público, referidas no Decreto n.º 5787-4I, de 10 Maio de 1919; lagos, lagoas não navegáveis nem flutuáveis e pântanos, quando circundados por diversos prédios particulares);

Domínio público aéreo (as camadas aéreas superiores ao território acima do limite reconhecido ao proprietário e superficiário);

Infra-estruturas materiais (vias de transporte e comunicações) (as estradas; as linhas férreas nacionais; os portos artificiais e docas, os aeroportos e aeródromos de utilidade pública; as linhas telegráficas, telefónicas, os cabos submarinos e as obras, canalizações e redes de distribuição pública de energia eléctrica);

Recursos naturais do subsolo (os jazigos minerais e petrolíferos, as nascentes de água mineromedicinais, os recursos geotérmicos e outras riquezas naturais existentes no subsolo, com exclusão das rochas e terras comuns e dos materiais normalmente empregados nas construções);

Domínio público militar (as obras e instalações militares, bem como as zonas terrestres reservadas a defesa militar; os navios da armada, as aeronaves militares e os carros de combate, bem como outro equipamento militar de natureza e durabilidade equivalentes);

Domínio público cultural (os palácios, monumentos, museus, arquivos, teatros nacionais, bem como os palácios escolhidos pelo Chefe de Estado para a secretaria da presidência e para sua residência e da sua família).

A atribuição do carácter dominial a um bem pode ser alcançada por uma das seguintes vias:

i) qualificação legal: é a própria lei que inclui uma classe de coisas na categoria do domínio público – tanto a lei constitucional como a lei ordinária ([35]);

ii) classificação: é o acto pelo qual a lei ou a Administração declaram que certa e determinada coisa pertence a uma dada categoria de bens dominiais;

iii) afectação: é «o acto ou o facto que determina o ingresso imediato de uma coisa no domínio público» ([36]) ou, de outro modo, «o acto ou a prática que consagra a coisa à produção efectiva de utilidade pública» ([37]).

Os bens do domínio público são, por regra, directamente administrados pelo serviço ou entidade pública que tem por atribuição a realização dos fins a que os bens se encontram votados.

No âmbito de tal administração, podem os bens do domínio público ser objecto de transferência dos direitos de propriedade e de uso.

Interessa aqui referenciar as transferências de domínio ou mutações dominiais, para abranger as situações em que os bens do domínio público mudam de titular do respectivo direito de propriedade pública.

As mutações dominiais – afirma-se ([38]) –, podem ter origem em diversas causas:

«a) Uma lei que vem conferir às câmaras municipais as atribuições de gestão que cabiam ao Estado relativamente a certas estradas secundárias;

«b) O desmembramento de uma autarquia ou a sua extinção, tendo como consequência a transferência do seu domínio público para outra autarquia ou para o Estado;

«c) Uma modificação legislativa nas atribuições municipais e paroquiais.»

Importa, por fim, fazer referência à cessação da dominialidade.

Uma coisa deixa de pertencer ao domínio público se se verificar a sua desqualificação, a sua desclassificação ou a sua desafectação, bem como se ocorrer a sua degradação ou desaparecimento por qualquer acidente, natural ou não.

Diz-se que há desafectação quando «as coisas continuam a existir mas, por decisão expressa da Administração ou com o seu consentimento tácito, deixam de ter utilidade pública ou perdem o carácter dominial».

A desafectação expressa pode ser genérica (a lei retira o carácter dominial a toda uma categoria de bens, v. g., declara alienáveis os palácios nacionais) ou singular (a lei ou um acto administrativo declara não dominial, ou sem utilidade pública, certa e determinada coisa).

Se tiver havido classificação antes da afectação, torna-se necessário que a desafectação seja precedida de desclassificação, a efectuar por acto com o mesmo valor formal: declarar-se-á por lei, decreto ou portaria, conforme o caso, que o monumento perdeu o carácter nacional, que a estrada é eliminada do plano das estradas nacionais ou que o navio de guerra é abatido da respectiva lista.

A desafectação tácita resulta, não de um acto legislativo ou administrativo, mas da prática consequente à perda da utilidade pública de um bem; significa que este deixou de servir ao seu fim de utilidade pública, perdeu o carácter público e ficou a pertencer ao domínio privado da pessoa colectiva de direito público sua proprietária.

A partir do momento em que se haja verificado a desafectação tácita, o bem entra no comércio jurídico-privado e torna-se alienável e prescritível. Como exemplos de escola, apontam-se o caso da estrada que, por virtude da abertura de outra com a mesma utilidade, deixou de ser utilizada, ou o da fortaleza desartilhada e desguarnecida ([39]).


3.2. A par dos bens integrados no seu domínio público, os entes públicos territoriais possuem igualmente um domínio privado, integrado pelos «bens que, por não se encontrarem integrados no domínio público, estão, em princípio, sujeitos ao regime de propriedade estatuído na lei civil e, consequentemente, submetidos ao comércio jurídico correspondente» ([40]).

Aplica-se, por regra, ao domínio privado do Estado o regime da propriedade contido no Código Civil, cujo artigo 1304.º dispõe:

«Artigo 1304.º
Domínio do Estado e de outras pessoas colectivas públicas

O domínio das coisas pertencentes ao Estado ou a quaisquer outras pessoas colectivas públicas está igualmente sujeito às disposições deste código em tudo o que não for especialmente regulado e não contrarie a natureza própria daquele domínio.» ([41])

«Esta última restrição deve entender-se no sentido de que o domínio, mesmo privado, de uma pessoa colectiva de direito público sobre os bens que lhe pertencem pode ser influenciado pelos fins de interesse público do sujeito e escapar, nessa medida, à aplicação pura e simples do Direito privado.» ([42])

Aplicam-se, de um modo geral, aos bens do domínio privado do Estado, as classificações que o Código Civil estabelece nos artigos 203.º e seguintes, com relevo para a que distingue entre coisas móveis e imóveis.

São móveis o equipamento dos diversos serviços públicos (por ex., repartições, escolas, hospitais).

Dos imóveis há que distinguir, ainda segundo a lei civil, os prédios rústicos, como as florestas, os parques, as matas ou os terrenos agrícolas, dos prédios urbanos, como os edifícios destinados à instalação dos serviços administrativos ou tão-somente arrendados a particulares para habitação.

No domínio privado do Estado coexistem bens que desempenham um papel deveras relevante na prossecução das atribuições administrativas e bens que apenas vieram à posse da Administração ocasionalmente ou cuja única utilidade é a produção de rendimentos. Os primeiros carecem naturalmente de uma protecção mais apertada «enquanto e na medida em que se acharem afectados a uma função de interesse público» ([43]).

Os bens do domínio privado têm sido, por isso, classificados em bens do domínio privado disponível ou do património financeiro e bens do domínio privado indisponível ou do património administrativo ([44]) ([45]).

Os bens do domínio privado indisponível encontram-se afectos à realização de fins de utilidade pública, abrangendo, em geral, os bens indispensáveis ao funcionamento dos serviços públicos, nomeadamente as dependências onde eles se encontram instalados (por ex., os prédios onde funcionam); são bens que, apesar de não terem sido definidos pela lei como bens do domínio público, assumem, no entanto, um carácter indispensável ao funcionamento da Administração e da prossecução dos interesses que ela visa prosseguir. Estão, por isso, sujeitos a um regime que os aproxima dos bens do domínio público.

Os bens do domínio privado disponível são os que não se encontram especialmente afectos à satisfação de qualquer necessidade pública específica ou, por outras palavras, «bens que estejam aplicados a fins meramente financeiros». Trata-se, como se referiu, de bens de aquisição ocasional (sucessão hereditária, execução fiscal) ou que apenas de destinam a produzir rendimentos (v. g., títulos mobiliários) ([46]).

Como notou MARCELLO CAETANO ([47]), «com a indisponibilidade não se pretende conferir aos bens a condição jurídica de inalienáveis em virtude da sua própria utilidade pública, como no domínio público: pretende-se tão-somente evitar que sejam desviados da afectação ao fim de utilidade pública, exterior aos bens, que eles são chamados a servir».

Por sua vez, a disponibilidade «não significa necessariamente uma sujeição total ao Direito privado, sem quaisquer condicionamentos impostos pelas leis administrativas: significa, sim, que não havendo afectação a nenhum fim de utilidade pública os bens podem ser alienados ou onerados pela Administração, ainda que tão-somente pelas formas prescritas na lei administrativa (...) (x).»

A aquisição de bens para o domínio privado pode ser feita a título oneroso ou a título gratuito e verificar-se no quadro do Direito privado (compra, troca, doação, sucessão de particulares, usucapião, ocupação, acessão, etc.) ou do Direito público (expropriação, requisição, nacionalização, execução fiscal, obras públicas, sucessão das pessoas colectivas extintas, reversão de obras executadas pelos concessionários, cessação da dominialidade, etc.).

Na administração dos bens do domínio privado do Estado (ou de outra pessoa colectiva pública), desempenham papel fundamental as entidades que directamente os administram – aos níveis da sua conservação, valorização e rendibilização – e o Ministério das Finanças através da Direcção-Geral do Património, entidade a quem compete, designadamente, elaborar o cadastro e o inventário dos bens do património do Estado, proceder à aquisição de bens imóveis e ao arrendamento de imóveis destinados à instalação de serviços públicos, e administrar e alienar os bens do património do Estado (artigos 1.º do Decreto-Lei n.º 477/80, de 15 de Outubro, 4.º, alínea m), e 22.º do Decreto-Lei n.º 158/96, de 3 de Setembro) ([48]).

Uma nota final sobre a extinção do domínio privado.

Também aqui encontramos modos de Direito privado – a venda e a troca, por ex. – e modos de Direito público – v. g., a cessão definitiva, a reversão de bens expropriados, a restituição de bens executados e a execução judicial ([49]).

Uma vez que o Estado não se encontra vocacionado nem preparado para a administração de bens móveis ou imóveis alheios às necessidades dos serviços, «a administração patrimonial do Estado tem fundamentalmente como objecto os bens do seu domínio indisponível. Os bens disponíveis são para alienar.»

Na prática, todavia, sucede «conservarem-se na posse do Estado, durante anos, prédios não aplicados a serviços ou a qualquer fim de utilidade pública. Isto acontece sobretudo quando o Estado adquire prédios com o fim de realizar obras de construção, adaptação, ou remodelação e, depois, por carência de verbas ou por demora na definição dos projectos ou dos aproveitamentos, se vai protelando, muitas vezes indefinidamente, a respectiva realização.» ([50])


4.

Enquanto pessoas colectivas públicas de população e território, as regiões autónomas dispõem de património próprio [artigo 227.º, n.º 1, alínea h), da Constituição], que compreende um domínio público e um domínio privado ([51]).

De acordo com as considerações precedentes, integram o domínio público os bens submetidos por lei, dado o fim de utilidade pública a que se encontram afectos, a um regime jurídico especial, caracterizado fundamentalmente pela sua incomerciabilidade, em ordem a preservar a produção dessa utilidade; integram o domínio privado os bens que, por não se encontrarem integrados no domínio público, estão, em princípio, sujeitos ao regime de propriedade previsto na lei civil, submetidos, portanto, ao comércio jurídico correspondente.

Os bens pertencentes às regiões autónomas foram, de início, objecto de transferência casuística para as administrações regionais, acompanhando a transferência de funções e serviços a que se encontravam adstritos ([52]).

A matéria foi, depois, objecto de tratamento sistemático nos diplomas estatutários, encontrando-se, agora e quanto à Região Autónoma dos Açores, regulada no Capítulo II (Bens da Região) do Título VI (Regime económico e financeiro) do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores (EPARAA) ([53]), onde se dispõe:

«Artigo 111.º
Activo e passivo próprios

A Região tem activo e passivo próprios, competindo-lhe administrar e dispor do seu património.

Artigo 112.º
Domínio público

1 – Os bens do domínio público situados no arquipélago pertencentes ao Estado, bem como aos antigos distritos autónomos, integram o domínio público da Região.
2 – Exceptuam-se do domínio público regional os bens que interessam à defesa nacional e os que estejam afectos a serviços públicos não regionalizados, desde que não estejam classificados como património cultural.

Artigo 113.º
Domínio privado

Integram o domínio privado da Região:
a) Os bens do domínio privado do Estado existentes no território regional, excepto os afectos aos serviços estaduais não regionalizados;
b) Os bens do domínio privado dos três antigos distritos autónomos;
c) As coisas e direitos afectos a serviços estaduais transferidos para a Região;
d) Os bens adquiridos pela Região dentro ou fora do seu território ou que por lei lhe pertençam;
e) Os bens abandonados e os que integrem heranças declaradas vagas para o Estado, desde que uns e outros se situem dentro dos limites territoriais da Região.» ([54]) ([55])

As disposições transcritas provêm, nos seus precisos termos, da versão originária do EPARAA ([56]).


4.1. O artigo 111.º consagra, em termos amplos, a existência de um património concebido fundamentalmente em termos económicos, ao estabelecer que a Região «tem activo e passivo próprios, competindo-lhe administrar e dispor do seu património».

Tal disposição – à semelhança do que vimos disporem relativamente ao Estado os artigos 2.º, 3.º e 6.º do Decreto-Lei n.º 477/80, de 15 de Outubro ([57]) – reflecte que a Região Autónoma dos Açores dispõe, também, de um património financeiro, categoria integrada essencialmente por créditos, débitos, participações, saldos de tesouraria e direitos relativos a empresas públicas regionais ([58]).


4.2. Quanto ao domínio público, a regra é que os bens dominiais situados no arquipélago pertencentes ao Estado e aos antigos distritos autónomos passam a integrar o domínio público da Região Autónoma dos Açores (artigo 112.º, n.º 1).

Exceptuam-se do domínio público regional os bens que interessam à defesa nacional e os que estejam afectos a serviços públicos não regionalizados, desde que não estejam classificados como património cultural (artigo 112.º, n.º 2).

Em anotação a esta disposição, já se escreveu que o Estatuto restringe, «excessivamente, o âmbito do domínio público do Estado, visto que integra no património das regiões a generalidade dos bens do domínio público aí situados e as únicas excepções que admite respeitam aos bens que interessam à defesa nacional ou que estejam afectos a serviços não regionalizados. Acresce que, segundo o teor literal do preceito, os próprios bens que interessam à defesa nacional ou que estejam afectos a serviços públicos não regionalizados podem pertencer à Região Autónoma. Basta, para o efeito, que esses bens sejam classificados como património cultural. E, para reforçar ainda mais a nossa perplexidade, a transferência dos bens em causa verifica-se independentemente de ser o Estado ou a Região a proceder à respectiva classificação como património cultural. Assim, se o Estado classifica como monumento nacional um determinado imóvel com interesse para a defesa (v. g., um quartel do exército ou uma fortaleza militar) ou afecto a um serviço não regionalizado, esse mesmo acto transfere o dito monumento para o domínio público regional.» ([59])

Aponta-se, por isso, «para tentar salvar» o artigo 112.º, o recurso à chamada interpretação conforme à Constituição, sob pena de se concluir pela sua inconstitucionalidade.

Tem-se, assim, entendido que os bens do domínio público necessário, inerentes ao exercício da soberania, não podem, uma vez que a soberania estadual não é partilhada pelas regiões, ser para estas transferidos. Isto é, os bens indissoluvelmente ligados à soberania devem permanecer integrados no domínio público necessário do Estado, tomado este na acepção de pessoa colectiva de direito público que tem por órgão o Governo, não podendo ser transferidos para as regiões autónomas, sem prejuízo das competências administrativas que, sobre eles, lhes possam ser atribuídas ([60]).


4.3. Quanto ao domínio privado da Região, ele passa a ser constituído pelos bens do domínio privado do Estado existentes no território regional (excepto os afectos aos serviços estaduais não regionalizados), pelos bens dos antigos distritos autónomos, pelos bens afectos a serviços regionalizados, pelos adquiridos pela Região ou que por lei lhe pertençam e pelos bens abandonados ou declarados vagos para o Estado no território da Região (artigo 113.º).

Sobre o artigo 105.º do Estatuto, na redacção da Lei n.º 9/87, de 26 de Março, correspondente, sem alterações, ao actual artigo 113.º, escrevem RUI MEDEIROS e PEREIRA DA SILVA ([61]):

«O artigo 105.º, ao integrar no domínio privado da Região Autónoma os bens do domínio privado do Estado existentes no território regional que não estejam afectos a serviços estaduais, parece impedir que o Estado proceda à desafectação do domínio público e posterior alienação em hasta pública de bens afectos à defesa nacional ou a serviços públicos não regionalizados. Há, efectivamente, um momento em que estes bens estão desafectados e ainda não foram alienados e, nessa ocasião, por força do Estatuto, os referidos bens passam a pertencer às regiões autónomas. A solução que se extrai do artigo 105.º, que se harmoniza, de resto, com a generosidade do Estatuto em matéria de receitas regionais, afigura-se excessiva. Basta pensar que, nos termos da lei estatutária, o Estado renuncia ao seu poder de disposição sobre bens situados no arquipélago dos Açores. Todavia, do ponto de vista jurídico-constitucional, não parece fácil concluir no sentido da inconstitucionalidade do artigo 105.º. Resta saber se não será possível interpretar restritivamente o artigo 105.º de forma a considerar que as suas alíneas a), b) e c) contêm soluções transitórias cujo alcance se esgota no momento da entrada em vigor do Estatuto.

«Todavia, mesmo que o Estado não possa proceder à desafectação e posterior alienação em hasta pública de bens afectos à defesa nacional ou a serviços públicos não regionalizados, nada obsta que afecte esses bens a serviços de outras entidades públicas não estaduais que se integrem na administração indirecta ou autónoma do Estado.»

Acerca de disposição paralela do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira – o artigo 145.º ([62]) – já se considerou que a mesma contempla «um conceito muito amplo do património privado. Praticamente efectua-se a transferência ex-lege para a RAM, de todo o património do Estado – excepto o que esteja afecto aos serviços não regionalizados deste».

Afirma-se que «a redacção da alínea a) [do artigo 145.º] suscita uma dúvida pertinente», tal a de parecer impedir o Estado de ser detentor de bens privados da Região, e acrescenta-se:

«Emerge uma clara vontade dos órgãos de governo próprio da Região em providenciarem na obtenção da maior “vantagem” possível do domínio patrimonial, há que reconhecer. Todavia, para alguma opinião, mais ou menos informada e esclarecida, tal pode configurar um sinal de alguma “avareza”, se é lícita a expressão, por parte das Regiões Autónomas tal o empenho em que se busca integrar o máximo património possível.» ([63])


5.

É altura de centrarmos a indagação que tem vindo a ser efectuada na resolução da concreta questão jurídica colocada à apreciação do Conselho Consultivo – a questão da «titularidade do designado Antigo Armazém da Alfândega, sito em Santa Cruz das Flores, Açores», também referenciado no processo como as «antigas instalações do Armazém do Posto Aduaneiro de Santa Cruz das Flores, disponibilizado pela Alfândega de Ponta Delgada em Fevereiro de 2000». Trata-se de um prédio urbano inscrito na matriz, a favor do Estado Português, sob o artigo 815 ([64]).

Adicionalmente, refira-se que não há no processo qualquer indício de que tal bem possua relevância cultural ([65]).

Nos termos do Decreto-Lei n.º 158/96, de 3 de Setembro ([66]) – que aprovou a Lei Orgânica do Ministério das Finanças –, dos serviços deste Ministério integrados na Administração directa do Estado faz parte a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo [artigo 4.º, alínea i)], a qual tem por missão, de acordo com as políticas definidas pelo Governo e as normas comunitárias: (a) exercer o controlo da fronteira externa comunitária e do território aduaneiro nacional para fins fiscais, económicos e de protecção da sociedade, designadamente no âmbito da cultura e da segurança e saúde públicas e (b) administrar os impostos especiais sobre o consumo (artigo 19.º, n.º 1).

A actual orgânica da Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo (DGAIEC) foi aprovada pelo Decreto-Lei n.º 360/99, de 16 de Setembro ([67]).

A reestruturação a que, com este diploma, se procedeu teve como ponto de partida a supressão das fronteiras internas da Comunidade Europeia e o estabelecimento em 1 de Janeiro de 1993 do mercado interno.

«Este facto histórico levou a que a acção primacial das alfândegas se orientasse para o controlo da fronteira externa da Comunidade e para a gestão de áreas novas que lhe foram então cometidas, nomeadamente no domínio dos impostos especiais sobre o consumo» (do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 360/99).

Nos termos do artigo 2.º deste decreto-lei, e no que mais directamente se relaciona com o objecto do parecer, cabe à DGAIEC:

«(...);
b) Exercer a acção de inspecção tributária, prevenindo e combatendo a fraude e evasão fiscais, designadamente controlando as trocas de mercadorias e os meios de transporte para fins fiscais, económicos e de protecção da sociedade, através da aplicação de procedimentos e controlos relacionados com a entrada, saída e circulação das mercadorias no território aduaneiro nacional, procedendo à realização de controlos, designadamente, verificações, varejos, inspecções e auditorias, com vista a garantir a correcta aplicação da regulamentação aduaneira e fiscal e prevenindo e reprimindo a fraude e a evasão aduaneiras e fiscais e os tráficos ilícitos, designadamente de estupefacientes, substâncias psicotrópicas e seus precursores, produtos estratégicos e outros produtos sujeitos a proibições e restrições;
(...);
d) Cooperar e articular com outros serviços, organismos comunitários e internacionais, no âmbito das actividades referidas na alínea b) (...);
(...);
f) Garantir a aplicação das normas a que se encontram sujeitas as mercadorias introduzidas no território aduaneiro da Comunidade, até que lhes seja atribuído um destino aduaneiro;
g) Garantir a atribuição de um destino aduaneiro às mercadorias nos termos da legislação em vigor;
(...);
i) Solicitar para os fins e domínios referidos na alínea b) a intervenção de serviços policiais e forças de segurança;
(...).»

A DGAIEC dispõe de serviços centrais e de serviços periféricos (artigo 8.º).

Os serviços centrais integram departamentos como o Departamento de Gestão Aduaneira ou o Departamento de Inspecção e Fiscalização Aduaneira [artigo 10.º, n.º 1, alíneas a) e c)].

Os serviços periféricos constituem unidades orgânicas desconcentradas da DGAIEC, no plano regional e local, que visam assegurar a prossecução das suas atribuições na respectiva área de jurisdição (artigo 12.º, n.º 1).

São serviços periféricos as alfândegas, as delegações aduaneiras e os postos aduaneiros (artigo 12.º, n.º 2).

As alfândegas são unidades orgânicas de carácter regional, criadas e extintas por portaria do Ministro das Finanças, a que incumbe, em geral, na respectiva área de jurisdição, assegurar a execução das actividades de natureza operativa e de gestão corrente conexas com as atribuições da DGAIEC, que devam ser prosseguidas a nível regional (artigos 13.º e 14.º, n.º 1).

As alfândegas são dirigidas por directores de alfândegas, hierarquicamente dependentes do director-geral, sem prejuízo da dependência funcional relativamente os subdirectores-gerais que dirijam os departamentos da DGAIEC (n.º 1 do artigo 15.º).

As delegações e postos aduaneiros são unidades orgânicas de carácter local dos serviços periféricos da DGAIEC, criados e extintos por portaria do Ministério das Finanças (artigo 17.º).

Às delegações e postos aduaneiros incumbe, em geral, executar as actividades de natureza operativa e de gestão corrente da DGAIEC, que, por lei ou decisão superior, devam ser prosseguidas a nível local no âmbito da área de jurisdição de uma alfândega (artigo 18.º).

As delegações são dirigidas por chefes de delegação, directamente dependentes dos directores de alfândega (artigo 19.º, n.º 1).

Os postos aduaneiros são dirigidos por coordenadores, directamente dependentes dos directores de alfândega ou dos chefes de delegação (n.º 2 do artigo 19.º, tal como os anteriores, do Decreto-Lei n.º 360/99, de 16 de Setembro).

O artigo 112.º da Reforma Aduaneira prevê a existência de depósitos ou armazéns fiscalizados, locais onde podem ser guardadas as «mercadorias estrangeiras e nacionais ou nacionalizadas, cativas de direitos ou de outros impostos a cobrar pelas alfândegas» ([68]).


6.

Está em causa a titularidade de um bem imóvel que, enquanto foi utilizado como armazém do Posto Aduaneiro de Santa Cruz das Flores, fazia parte do domínio privado indisponível do Estado porque se encontrava afecto e se mostrava indispensável – no âmbito da missão legalmente cometida à Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo – ao funcionamento daquele posto aduaneiro, dependente da Alfândega de Ponta Delgada.

O serviço público em causa – o controlo da fronteira externa comunitária e do território nacional – continua a ser um serviço estadual não regionalizado, reconhecidamente inserido no núcleo de atribuições e competências que, na integração do conteúdo da autonomia regional, são reservados para o Estado.

A desafectação do bem do serviço público ficou a dever-se, não à transferência de serviços estaduais para a Região Autónoma dos Açores, mas tão-só ao reordenamento aduaneiro da Ilha das Flores, onde a intervenção aduaneira passou a ser assegurada pelo Posto Aduaneiro de Lajes das Flores, mantendo a gestão e controlo da fronteira externa e dos impostos especiais sobre consumo a sua natureza de serviço estadual.

Na verdade, por razões que se prendem com a racionalidade e operacionalidade dos serviços alfandegários, a Portaria n.º 31/2001, de 17 de Janeiro, extinguiu o Posto Aduaneiro de Santa Cruz das Flores e criou o Posto Aduaneiro de Lajes das Flores, o qual «assegura a intervenção aduaneira na ilha das Flores, designadamente no âmbito da gestão da fronteira externa comunitária e dos impostos especiais sobre o consumo» (n.º 2.º).

É neste contexto que terão que ser interpretadas as normas pertinentes do EPARAA.

A questão, se bem vemos as coisas, há-de ser resolvida no âmbito do artigo 113.º do Estatuto, mais precisamente com recurso ao disposto na sua alínea a) – integram o domínio privado da Região os «bens do domínio privado do Estado existentes no território regional, excepto os afectos aos serviços estaduais não regionalizados».

Demos já conta de duas interpretações possíveis para esta norma.

As Autoridades Regionais defendem que se trata de uma norma de aplicação permanente que, a todo o tempo, permite à Região adquirir a titularidade de qualquer bem do domínio privado do Estado, que deixe de estar afecto a serviços públicos não regionalizados.

Na Direcção-Geral do Património do Ministério das Finanças entende-se que a mesma norma deve ser interpretada restritivamente de forma a considerar-se que contém uma solução transitória cujo alcance se esgotou no momento da entrada em vigor do Estatuto.

Estas posições encontram eco na escassa doutrina existente sobre a matéria, a qual, todavia, mais do que certezas e convicções exprime, a este respeito, dúvidas e perplexidade ([69]).

Ora, cremos ser possível ensaiar, no quadro de repartição de atribuições e competências entre o Estado e as regiões autónomas, uma via interpretativa alternativa.

É o que vamos tentar.


7.

Os artigos 111.º a 113.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, na redacção actual ([70]), correspondem, sem alterações de redacção, aos artigos 89.º a 91.º da versão originária do Estatuto ([71]). É idêntica a própria epígrafe do capítulo em que se incluem: «Bens da Região».

Procuram tais disposições resolver a questão de saber quais, na Região Autónoma dos Açores, os bens que ficam a pertencer à Região e os que ficam a pertencer ao Estado.

Com a entrada em vigor do Estatuto, logrou-se a estabilidade dos domínios público e privado do Estado e da Região, passando um e outra, relativamente aos bens de que são titulares, a exercer os correspondentes poderes de administração.

A estabilidade alcançada não significa que as normas das disposições referidas, todas as normas, hajam esgotado a sua eficácia no momento da entrada em vigor do Estatuto.

Se é admissível que isso aconteceu – e estamos a reportar-nos ao artigo 113.º –, em relação à alínea b) (integração no domínio da Região dos bens do domínio privado dos três antigos distritos autónomos), há-de reconhecer-se que as normas das alíneas d) e e) são normas de eficácia permanente.

Mas é na alínea a) do artigo 113.º que devemos procurar a solução para a questão que nos ocupa [a alínea c) refere-se a coisas e direitos afectos a serviços estaduais transferidos para a Região].

Foi a partir das normas das alíneas a) e c) do artigo 113.º e por virtude da sua estatuição, que se constituiu e consolidou, no essencial, o domínio privado da Região. As duas disposições têm como finalidade clara a manutenção da afectação de bens, coisas e direitos à satisfação de certas e determinadas necessidades públicas, donde a sua integração no património da pessoa colectiva (Estado ou Região) que tiver a incumbência de as satisfazer.


8.

Na interpretação de uma norma jurídica, isto é, na tarefa de fixar o sentido e o alcance com que ela deve valer, intervêm, para além do elemento gramatical (o texto, a letra da lei), elementos lógicos, que a doutrina subdivide em elementos de ordem sistemática, histórica e racional ou teleológica ([72]).

O elemento teleológico consiste na razão de ser da lei (ratio legis), no fim visado pelo legislador ao elaborar a norma.

«O conhecimento deste fim – escreveu BAPTISTA MACHADO ([73]) –, sobretudo quando acompanhado do conhecimento das circunstâncias (políticas, sociais, económicas, morais, etc.) em que a norma foi elaborada ou da conjuntura político-económico-social que motivou a “decisão” legislativa (occasio legis) constitui um subsídio da maior importância para determinar o sentido da norma. Basta lembrar que o esclarecimento da ratio legis nos revela a “valoração” ou ponderação dos diversos interesses que a norma regula e, portanto, o peso relativo desses interesses, a opção entre eles traduzida pela solução que a norma exprime. Sem esquecer ainda que, pela descoberta daquela “racionalidade” que (por vezes inconscientemente) inspirou o legislador na fixação de certo regime jurídico particular, o intérprete se apodera de um ponto de referência que ao mesmo tempo o habilita a definir o exacto alcance da norma e a discriminar outras situações típicas com o mesmo ou com diferente recorte.»

O objectivo visado pelo legislador ao introduzir no EPARAA um capítulo dedicado aos «bens da Região», foi atribuir a esta um conjunto alargado de bens que, no âmbito da autonomia regional, a habilitassem a prosseguir as suas atribuições.

Tal propósito ressalta com nitidez das normas das alíneas a), b) e c) do artigo 113.º, aquelas que maior acervo patrimonial trouxeram ao domínio privado da Região.

A solução da alínea b) – integração no património da Região dos bens do domínio privado dos três distritos autónomos –, impõe-se pela extinção destes.

Nos termos da alínea c) as coisas e direitos afectos a serviços estaduais transferidos para a Região passam a integrar o domínio privado regional. Se as coisas e direitos estão afectos a um determinado serviço e se este é transferido para a Região, é natural que se mantenha tal afectação e, por consequência, que as coisas e direitos em causa passem a integrar o domínio privado da Região.

De acordo com a alínea a) do artigo 113.º, integram o domínio privado da Região os bens do domínio privado do Estado, excepto os afectos aos serviços estaduais não regionalizados.

A razão de ser da regra radica no propósito genérico de transferir para a Região os bens do domínio privado do Estado.

O fim visado pelo legislador com a excepção reside na necessidade de manter na titularidade do Estado os bens afectos a serviços por que é responsável, serviços, portanto, que não foram objecto de regionalização.

A ratio legis «revela a valoração ou ponderação dos diversos interesses que a norma jurídica disciplina» ([74]).

A descoberta da racionalidade da norma permite ao intérprete precisar o seu exacto alcance, sobretudo em situações em que não existem ou – como é o caso ([75]) – são escassos e pouco esclarecedores os trabalhos preparatórios ([76]).

Há, como se vê, na norma em análise interesses do Estado e interesses da Região.

A distinção entre serviços regionalizados e serviços estaduais é essencial para a correcta ponderação dos interesses em jogo e para a apreensão do sentido e alcance da norma da alínea a) do artigo 113.º

A existência de serviços estaduais responsabiliza o Estado pela sua organização, administração, gestão e funcionamento. E as normas de transferência de bens constantes do artigo 113.º do EPARAA, se visam disponibilizar à Região os meios de que necessita para satisfazer as necessidades dos serviços para ela transferidos, não podem ter o efeito (colateral) de coarctar ou restringir os poderes de gestão e administração do Estado quanto aos bens afectos aos serviços que permanecem na sua esfera de acção.

O serviço público em causa consiste no controlo da fronteira externa comunitária e do território nacional e na administração dos impostos especiais sobre o consumo, tarefas cometidas à DGAIEC.

Esta Direcção-Geral dispõe de serviços centrais e de serviços periféricos (alfândegas, delegações aduaneiras e postos aduaneiros).

Os postos aduaneiros são criados e extintos por portaria do Ministro das Finanças.

A alteração operada pela Portaria n.º 31/2001, de 17 de Janeiro – extinção do Posto Aduaneiro de Santa Cruz das Flores e criação do Posto Aduaneiro de Lajes da Flores –, filiada em razões de racionalidade e operacionalidade dos serviços, originou com certeza a necessidade de instalar o novo posto aduaneiro e terá libertado as instalações do posto extinto, sem que isto signifique necessariamente a sua inutilidade em relação aos próprios serviços, que mantêm a natureza estadual.

No quadro exposto não se afigura razoável que, face ao disposto na alínea a) do artigo 113.º do EPARAA, se pretenda que qualquer bem do domínio privado do Estado, que deixe de estar materialmente afecto, ainda que transitoriamente, a serviços que mantêm a sua natureza de serviços estaduais não regionalizados, passe a integrar, por esse facto, o domínio privado da Região.

Não se afigura, na verdade, razoável supor que o legislador tenha pretendido limitar ou condicionar o Estado na administração do seu património afecto a serviços estaduais.

Ora, na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil).

Com a entrada em vigor do Estatuto, alcançou-se na Região Autónoma dos Açores, como dissemos, a delimitação dos respectivos domínios, uma delimitação tendencialmente estável, ao menos enquanto se mantiver a repartição de atribuições entre o Estado e a Região.

Neste quadro, relativamente aos serviços estaduais não regionalizados, incumbe ao Estado definir as soluções que melhor satisfizerem o interesse público e, ao nível logístico, desenvolver as opções que se mostrem adequadas.

Em suma, a alínea a) do artigo 113.º do EPARAA, não sendo uma norma que tenha esgotado o seu alcance no momento da sua entrada em vigor – admite-se, numa perspectiva dinâmica da autonomia regional, a sua aplicação em caso de transferência de serviços estaduais para a Região – também não permite a integração no domínio privado da Região de todo e qualquer bem que, quaisquer que sejam as circunstâncias, deixe de estar afecto aos serviços estaduais não regionalizados.

Propendemos, pois, para o entendimento de que tal norma, atentas as suas teleologia e inserção sistemática, deve ser interpretada no sentido de que os bens do domínio privado do Estado afectos a serviços estaduais não regionalizados permanecem no domínio privado do Estado, desde que os serviços em causa mantenham a sua natureza, isto é, não tenham sido objecto de transferência para a Região.

Assim, o Antigo Armazém da Alfândega, sito em Santa Cruz das Flores, ao ser desafectado da respectiva utilidade pública, e não tendo sido afectado a outra, deixou de pertencer ao domínio privado indisponível do Estado para, com as legais consequências, passar a integrar o domínio privado disponível do Estado.

Não havendo ou tendo deixado de existir afectação a um fim de utilidade pública, os bens podem, no dizer de MARCELLO CAETANO ([77]), «ser alienados ou onerados pela Administração, ainda que tão-somente pelas formas prescritas na lei administrativa», ou, segundo RUI MEDEIROS e PEREIRA DA SILVA, ser afectos «a serviços de outras entidades públicas não estaduais que se integrem na administração indirecta ou autónoma do Estado» ([78]).

Esta matéria, porém, é já alheia ao objecto da consulta.

A Direcção-Geral do Património é o serviço do Ministério das Finanças encarregado de assegurar de forma integrada a gestão e administração do património do Estado nos domínios da aquisição, administração e alienação de bens, competindo-lhe, designadamente, proceder à aquisição ou arrendamento de bens imóveis destinados à instalação de serviços públicos, bem como administrar e alienar os bens do património do Estado [artigo 22º, n.º 1 e n.º 2, alíneas b) e c), do Decreto-Lei n.º 158/96, de 3 de Setembro].


9.

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1. O Estado e as regiões autónomas (bem como as autarquias locais) são titulares de domínio público e de domínio privado (indisponível e disponível);

2. De acordo com o disposto na alínea a) do artigo 113.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores:
2.1. Integram o domínio privado da Região os bens do domínio privado do Estado existentes no território regional, excepto os afectos aos serviços estaduais não regionalizados;
2.2. Integram o domínio privado indisponível do Estado os bens a este pertencentes, que, na Região Autónoma dos Açores, se encontrem afectos ao funcionamento de serviços estaduais não regionalizados, como os serviços integrados na Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo;

3. Os bens a que se refere a parte final da conclusão 2.2., uma vez terminada a sua afectação ao funcionamento de serviços estaduais integrados na Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, continuam na titularidade do Estado, passando, com as legais consequências, a integrar o seu domínio privado disponível;

4. Compete à Direcção-Geral do Património, serviço do Ministério das Finanças encarregado de assegurar de forma integrada a gestão e administração do património do Estado, proceder à aquisição, administrar e alienar os bens do património do Estado [artigo 22.º, n.º 1, e n.º 2, alíneas b) e c), do Decreto-Lei n.º 158/96, de 3 de Setembro].






([1]) Citámos o ofício n.º 138, de 25 de Setembro de 2001, do Auditor Jurídico junto do Ministério das Finanças, onde se retoma a sugestão de pedido de parecer do Conselho Consultivo, antes sucessivamente efectuada pelo Gabinete do Ministro da República para a Região Autónoma dos Açores (ofício n.º L-123, Proc. n.º 93-92/01, de 28 de Junho de 2001) e pela Direcção-Geral do Património do Ministério das Finanças (despachos de 25 e 26 de Julho de 2001, proferidos sobre a Informação n.º 99/DSAI/2001/Jurídica, de 19 de Julho de 2001).
([2]) O Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores (EPARAA) foi aprovado pela Lei n.º 39/80, de 5 de Agosto, e posteriormente revisto pela Lei n.º 9/87, de 26 de Março, e pela Lei n.º 61/98, de 27 de Agosto. Salvo menção em contrário, reportam-se à versão vigente as referências feitas ao EPARAA.
Antes deste Estatuto vigorara o Estatuto Provisório da Região Autónoma dos Açores, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 318-B/76, de 30 de Abril.
([3]) Cfr. ofício n.º 2277, de 29 de Maio de 2001, do Gabinete do Secretário Regional da Presidência para as Finanças e Planeamento da Região Autónoma dos Açores e memorando anexo, sobre o Antigo Armazém da Alfândega em Santa Cruz das Flores, onde se refere que se trata «das antigas instalações do Armazém do Posto Aduaneiro de Santa Cruz das Flores, disponibilizado pela Alfândega de Ponta Delgada em Fevereiro de 2000». Complementarmente (fax de 4 de Março de 2002, da Alfândega de Ponta Delgada), obteve-se a informação de que está em causa o prédio inscrito, em nome do Estado Português, sob o n.º 815 da matriz urbana de Santa Cruz das Flores.
([4]) V. Informação n.º 99/DSAI/2001/Jurídica, de 19 de Julho, referida na nota 1.
([5]) CARLOS BLANCO DE MORAIS, A Autonomia Legislativa Regional – Fundamentos das relações de prevalência entre actos legislativos estaduais e regionais, Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1993, págs. 401-405.
([6]) Cfr. GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª edição revista, Coimbra Editora, 1993, págs. 74-76.
([7]) A figura das regiões autónomas constava já da Constituição de 1933 (revisão de 1971), aí vocacionada para abranger «os territórios da Nação Portuguesa situados fora da Europa» (artigos 5.º e 133.º).
Remonta a 1895 (Decreto de 29 de Março) a criação, para os arquipélagos dos Açores e da Madeira, de uma organização administrativa própria, passando a haver, em cada distrito, uma Junta Geral a que competia «administrar os bens e interesses particulares do distrito, promover e realizar todos os seus melhoramentos morais e materiais».
Mais tarde, a organização administrativa das chamadas «ilhas adjacentes» passou a ser regulada pelo Estatuto dos Distritos Autónomos das Ilhas Adjacentes, datado de 31 de Dezembro de 1940 (revisto pelo Decreto-Lei n.º 36453, de 4 de Agosto de 1947); o Estatuto qualificava os distritos das ilhas como pessoas morais de direito público, dotadas de autonomia administrativa e financeira, e de um órgão de administração autónoma – a Junta Geral –, que exercia as suas atribuições e competências directamente ou por intermédio de uma Comissão Executiva; o Governo da República era representado, em cada distrito, por um governador de distrito autónomo, que tinha a seu cargo a gestão dos interesses políticos e administrativos do Estado, a superintendência na polícia e a tutela da administração distrital autónoma (v., para mais desenvolvimentos, EDUARDO PAZ FERREIRA, As Finanças Regionais, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, págs. 130-141; ANTÓNIO DE SOUSA FRANCO, “As Finanças das Regiões Autónomas: uma tentativa de síntese”, em JORGE MIRANDA e JORGE PEREIRA DA SILVA (organiz.), Estudos de Direito Regional, págs. 517-519; e ÁLVARO MONJARDINO, “Fórmula provisória ou definitiva? O porquê das soluções adoptadas em 1976”, em Direito e Justiça, volume X, 1996, tomo I, págs. 15-45).
Era o regime de autonomia administrativa limitada estabelecido no Estatuto de 1947 que vigorava ainda em 25 de Abril de 1974 e é para os distritos autónomos nele previstos que remetem os actuais estatutos político-administrativos das regiões autónomas, designadamente os já nossos conhecidos artigos 112.º e 113.º do EPARAA.
([8]) A afirmação constitucional do carácter unitário do Estado, a par de outros factores – como a circunstância de as regiões autónomas não disporem do poder de se auto-organizarem livremente, a inexistência de uma segunda câmara parlamentar representativa dos Estados-membros e o facto de, nas regiões autónomas, não existirem, por ex., tribunais próprios nem forças militares e de segurança privativas – afastam pacificamente a qualificação do Estado Português como Estado federal (cfr. EDUARDO PAZ FERREIRA, As Finanças Regionais, cit., págs. 157-162; e SOUSA FRANCO, “As Finanças das Regiões Autónomas...”, cit., pág. 529). Já quanto à sua qualificação pela positiva, enquanto GOMES CANOTILHO afirma que, embora tivesse havido na 4.ª revisão constitucional (1997) uma proposta para transformar os Açores e a Madeira em estados federais, «o fenótipo organizatório continua o mesmo: Estado unitário» (Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 4.ª edição, Almedina, págs. 354-355), JORGE MIRANDA defende que Portugal é hoje um Estado unitário regional (Manual de Direito Constitucional, tomo III, 4ª edição, revista e actualizada, Coimbra Editora, Limitada, 1998, pág. 300 e seguintes); esta última qualificação é também usada por MARCELO REBELO DE SOUSA/JOSÉ DE MELO ALEXANDRINO (Constituição da República Portuguesa Comentada, Lex, Lisboa, 2000, pág. 355).
([9]) GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, ob. cit., págs. 844-845.
([10]) JORGE MIRANDA, Manual..., cit., tomo III, págs. 184 e 285-286.
([11]) Sob a epígrafe «Regime político-administrativo dos Açores e da Madeira», o artigo 225.º da Constituição dispõe:
«1. (...)
2. A autonomia das regiões visa a participação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico-social e a promoção e defesa dos interesses regionais, bem como o reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses.
3. A autonomia político-administrativa regional não afecta a integridade da soberania do Estado e exerce-se no quadro da Constituição.»
([12]) Cfr. JORGE PEREIRA DA SILVA, entrada “Região Autónoma”, Dicionário Jurídico da Administração Pública, volume VII, Lisboa, 1996, pág. 132, e FERNANDO AMÂNCIO FERREIRA, As Regiões Autónomas na Constituição Portuguesa, Livraria Almedina, Coimbra, 1980, pág. 22. V. também, do Conselho Consultivo, o parecer n.º 86/86, de 4 de Dezembro de 1986 (Diário da República, II série, n.º 34, de 10 de Fevereiro de 1987, e Procuradoria-Geral da República – Pareceres, vol. I, pág. 144 e segs.).
([13]) Não se justifica, aqui e agora, analisar as alterações legislativas verificadas, desde 1976, no âmbito da autonomia regional. Merece, todavia, referência pontual a circunstância de, após a revisão constitucional de 1997, a Constituição ter passado a elencar (no artigo 228.º) as matérias consideradas de interesse específico das regiões, referenciadas, até então, apenas nos estatutos político-administrativos. Trata-se de inovação que, no plano do direito comparado, tem paralelo nas constituições italiana (artigo 117.º) e espanhola (artigo 148.º). Aquele artigo 228.º, pelo seu carácter exemplificativo, constitui, aliás, uma manifestação do alargamento da autonomia regional operado pela 4.ª revisão constitucional – a 5.ª revisão, expressa na Lei Constitucional n.º 1/2001, de 12 de Dezembro, deixou intocadas estas matérias.
([14]) GOMES CANOTILHO, ob. cit., págs. 353-355.
([15]) REBELO DE SOUSA/MELO ALEXANDRINO, ob. cit., págs. 354-355;
([16]) ANTÓNIO DE ARAÚJO, A Revisão Constitucional de 1997 – Um ensaio de história político-constitucional, Coimbra Editora, 1999, pág. 183. Sem embargo, JORGE MIRANDA (Manual..., tomo V, Coimbra Editora, 1997, pág. 389) entende que, na revisão constitucional de 1997, com o n.º 9 do artigo 112.º – «A transposição de directivas comunitárias para a ordem jurídica interna assume a forma de lei ou de decreto-lei, conforme os casos» – se introduziu uma «verdadeira e muito grave limitação dos poderes regionais».
([17]) Cfr. ANTÓNIO VITORINO, “O estatuto jurídico-político das regiões autónomas: tensões e ambiguidades”, em Direito e Justiça, volume X, 1996, tomo I, págs. 66-67; v. igualmente GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, ob. cit., pág. 858, e JORGE MIRANDA, entrada “Ministro da República”, Dicionário Jurídico da Administração Pública, vol. V, Lisboa, 1993, pág. 612.
([18]) Abordando a questão de saber se existe, em matéria de regionalização, uma proibição do retrocesso, J. L. PEREIRA COUTINHO (“Existe uma proibição do retrocesso na regionalização efectuada?”, em Direito e Justiça, volume X, 1996, tomo I, págs. 109-110) afirma que «o grau de regionalização é instrumental relativamente ao que vem disposto no artigo 227.º [actual artigo 225.º] da Constituição, devendo nós admitir que conheça tanto avanços como recuos, dentro do espaço de conformação que se abre entre o respeito pela integridade da soberania do Estado e o respeito pela autonomia político-administrativa das Regiões»; a estas, o que a Constituição confere «é uma garantia institucional, oponível perante o poder de revisão constitucional e perante o legislador estatutário, com o alcance da preservação de um grau de autonomia compatível com os fundamentos, os fins e os limites pretendidos com a instituição das Regiões». Sobre a mesma questão, PEREIRA DA SILVA (“Região Autónoma”, cit., pág. 154) escreve: «A regionalização de uma determinada matéria levada a efeito pelos estatutos político-administrativos só é passível de retrocesso mediante revisão dos estatutos, a qual está condicionada pelo artigo 228.º [agora 226.º] a uma iniciativa da região enquadrada num processo legislativo agravado. Já a regionalização operada como mera delegação de poder executivo é passível de retrocesso por simples decisão do órgão de soberania envolvido na delegação, obviamente com respeito do dever de audição consagrado no artigo 231.º, n.º 2 [actual artigo 229.º, n.º 2]».
([19]) CLAUDE PALAZZOLI, Les Régions Italiennes, Paris, 1966, págs. 39-40, apud AMÂNCIO FERREIRA, As Regiões Autónomas..., cit., pág. 158.
([20]) J. PEREIRA DA SILVA, entrada “Região Autónoma”, cit., págs. 153-154.
([21]) Sobre a reserva de competência do Estado, v. PAZ FERREIRA, Finanças Regionais, cit., págs. 235-237.
Em Espanha, a própria Constitução estabelece que o Estado tem competência exclusiva sobre o regime aduaneiro e tarifário e o comércio externo (artigo 149.º, n.º 1, 10.º). Do mesmo modo, a Lei Fundamental da República Federal Alemã reserva à Federação legislar sobre a unidade do território aduaneiro e comercial, a livre circulação de mercadorias, bem como o intercâmbio comercial e financeiro com o estrangeiro, incluindo a protecção aduaneira e de fronteiras (artigo 73.º, n.º 5).
([22]) Do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 360/99, de 16 de Setembro, que aprova a orgânica dessa Direcção-Geral, adiante objecto de maior desenvolvimento (infra, n.º 5).
([23]) JORGE MIRANDA, ob. cit., pág. 249.
([24]) MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, 10.ª edição (6.ª reimpressão), tomo II, Almedina, Coimbra, pág. 893.
([25]) GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA (ob. cit., pág. 412).
([26]) SOUSA FRANCO (“As Finanças das Regiões Autónomas...”, cit., pág. 529). No mesmo sentido, v. PAZ FERREIRA, As Finanças Regionais, cit., págs. 297-300, e o parecer da Comissão Constitucional n.º 26/80, de 31 de Julho de 1980, sobre a constitucionalidade do decreto da Assembleia da República n.º 322/I, de 27 de Junho de 1980, que continha o «Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira» (Pareceres da Comissão Constitucional, 13.º volume, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1982, pág. 183 e segs.).
([27]) JOSÉ PEDRO FERNANDES, entrada “Domínio público”, em Dicionário Jurídico da Administração Pública, volume IV, Lisboa, 1991, pág. 166; v., do mesmo Autor, “Domínio Público”, na Revista de Direito e de Estudos Sociais, Ano XX, Janeiro-Março, n.º 1, pág. 25 e segs.
([28]) MARCELLO CAETANO, Manual..., cit., tomo II, págs. 894-896, J. PEDRO FERNANDES, loc. cit., pág. 172.
([29]) O artigo 202.º do Código Civil dispõe no n.º 2: «Consideram-se (...) fora do comércio todas as coisas que não podem ser objecto de direitos privados, tais como as que se encontram no domínio público e as que são, por sua natureza, insusceptíveis de apropriação individual.»
([30]) Cfr. Curso de Direito Administrativo (sumários desenvolvidos e indicações bibliográficas), de acordo com as lições de VITAL MOREIRA ao ano lectivo de 1999/2000, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, ponto 10, pág. 8.
([31]) Dispõem:
«Artigo 4.º
(Domínio público)
Para efeitos do presente diploma, integram o domínio público do Estado:
a) As águas territoriais com os seus leitos, as águas marítimas interiores com os seus leitos e margens e a plataforma continental;
b) Os lagos, lagoas e cursos de água navegáveis ou flutuáveis com os respectivos leitos e margens e, bem assim, os que por lei forem reconhecidos como aproveitáveis para produção de energia eléctrica ou para irrigação;
c) Os outros bens do domínio público hídrico referidos no Decreto n.º 5787-4I, de 10 de Maio de 1919, e no Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro;
d) As valas abertas pelo Estado e as barragens de utilidade pública;
e) Os portos artificiais e docas, os aeroportos e aeródromos de interesse público;
f) As camadas aéreas superiores aos terrenos e às águas do domínio público, bem como as situadas sobre qualquer imóvel do domínio privado para além dos limites fixados na lei em benefício do proprietário do solo;
g) Os jazigos minerais e petrolíferos, as nascentes de águas mineromedicinais, os recursos geotérmicos e outras riquezas naturais existentes no subsolo, com exclusão das rochas e terras comuns e dos materiais vulgarmente empregados nas construções;
h) As linhas férreas de interesse público, as auto-estradas e as estradas nacionais com os seus acessórios, obras de arte, etc.
i) As obras e instalações militares, bem como as zonas territoriais reservadas para a defesa militar;
j) Os navios da armada, as aeronaves militares e os carros de combate, bem como outro equipamento militar de natureza e durabilidade equivalentes;
l) As linhas telegráficas e telefónicas, os cabos submarinos e as obras, canalizações e redes de distribuição pública de energia eléctrica;
m) Os palácios, monumentos, museus, bibliotecas, arquivos e teatros nacionais, bem como os palácios escolhidos pelo Chefe do Estado para a Secretaria da Presidência e para a sua residência e das pessoas da sua família;
n) Os direitos públicos sobre imóveis privados classificados ou de uso e fruição sobre quaisquer bens privados;
o) As servidões administrativas e as restrições de utilidade pública ao direito de propriedade;
p) Quaisquer outros bens do Estado sujeitos por lei ao regime do domínio público.
Artigo 5.º
(Domínio privado)
Para efeitos do presente diploma, integram o inventário geral os seguintes bens e direitos do domínio privado do Estado:
a) Os imóveis, nomeadamente os prédios rústicos e urbanos do Estado, e os direitos a eles inerentes;
b) Os direitos de arrendamento de que o Estado é titular como arrendatário;
c) Os bens móveis corpóreos, com excepção das coisas consumíveis e daquelas que, sem se destruírem imediatamente, se depreciam muito rapidamente, nos termos a definir em instruções regulamentares;
d) Quaisquer outros direitos reais sobre coisas.
Artigo 6.º
(Património financeiro)
1 – Constituem o património financeiro do Estado:
a) Os créditos;
b) Os débitos;
c) As participações;
d) Os direitos relativos ao estabelecimento dos institutos públicos estaduais;
e) Os saldos de tesouraria.
2 – O disposto na alínea d) do n.º 1 deste artigo não exclui a existência ou o reconhecimento da propriedade dos institutos públicos sobre os bens do seu próprio património.»
([32]) Para uma análise destes critérios, v. MARCELLO CAETANO, Manual... cit., tomo II, págs. 881-886, e J. PEDRO FERNANDES, loc. cit., págs. 174-180; este último Autor (ibid., págs. 182-183), com base no tipo específico ou primordial de utilidade pública produzida pelas coisas, subdivide o domínio público do Estado nas seguintes categorias: domínio público da circulação, domínio público militar, domínio cultural, domínio público económico e domínio público inominável.
([33]) Manual..., cit., tomo II, págs. 896-919.
([34]) Cfr., no mesmo sentido, Curso de Direito Administrativo (sumários desenvolvidos e indicações bibliográficas), cit., ponto 10.3.5., pág. 11.
([35]) «O facto de existirem coisas cuja dominialidade tem por fundamento legal a Constituição e outras cuja dominialidade resulta da lei ordinária, só pode significar que, na ordem jurídica portuguesa, ficaram implicitamente reconhecidas duas categorias de coisas públicas com base no grau de utilidade pública que produzem: as primeiras ficam desde logo mais protegidas que as segundas, pois não podem, como estas, ser privatizadas pela simples lei ordinária.» (J. PEDRO FERNANDES, “Domínio Público”, cit., pág. 184; no mesmo sentido, GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, ob. cit., pág. 411).
([36]) J. PEDRO FERNANDES, loc. cit., pág. 185.
([37]) MARCELLO CAETANO, Manual..., cit.., tomo II, págs. 922-923.
([38]) J. PEDRO FERNANDES, “Domínio Público”, cit., págs. 185-186; v. também, sobre a matéria, MARCELLO CAETANO (Manual..., cit., tomo II, pág. 953 e segs.), que começa por acentuar a ideia de que há um limite funcional à mutabilidade: «a transferência só pode verificar-se entre pessoas colectivas que desempenhem as mesmas atribuições administrativas».
([39]) Estivemos a seguir, por vezes a citar, MARCELLO CAETANO, Manual..., cit., tomo II, págs. 956-959.
([40]) J. PEDRO FERNANDES, entrada “Domínio privado”, em Dicionário Jurídico da Administração Pública, volume IV, Lisboa, 1991, pág. 166.
([41]) Com a referência indiscriminada ao «domínio das coisas pertencentes ao Estado ou a quaisquer outras pessoas colectivas públicas», constante deste artigo, «o legislador quis abranger toda a espécie de domínio, seja ele público, seja privado» (PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, volume III, 2.ª edição revista e actualizada (reimpressão), pág. 89; no mesmo sentido, JOSÉ PEDRO FERNANDES, “Domínio Público”, em Revista de Direitos e de Estudos Sociais, ano XX, pág. 25 e segs.); aqueles Autores acrescentam (ibidem) que a inclusão do domínio público «também resulta claramente da parte final deste artigo. Só, na verdade, o domínio público tem uma “natureza própria”; o domínio privado pode ter, quando muito, um regime especial.»
Ver, a propósito, os pareceres do Conselho Consultivo n.º 38/91, de 21 de Novembro de 1991 (Diário da República, II série, n.º 99, de 28 de Abril de 1995), n.º 41/95, de 29 de Março de 1995 (Diário..., cit., n.º 151, de 7 de Julho de 1995) e n.º 61/96, de 19 de Fevereiro de 1997 (Diário..., cit., n.º 283, de 9 de Dezembro de 1997).
([42]) MARCELLO CAETANO, Manual..., cit., tomo II, pág. 962.
([43]) MARCELLO CAETANO, Manual..., cit., tomo II, págs. 968-969.
([44]) De há muito objecto de tratamento doutrinal, a distinção entre domínio privado indisponível e domínio privado disponível tem igualmente suporte legislativo no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 477/80, de 15 de Outubro:
«Artigo 7.º
(Âmbito do domínio do Estado)
Quanto ao regime legal a que se encontram submetidos os bens do domínio do Estado e a natureza dos serviços e organismos a que estão afectos, o inventário abrange:
1.º O domínio público, qualquer que seja a entidade encarregada da gestão;
2.º O domínio privado indisponível, compreendendo:
a) Bens e direitos do Estado afectos aos departamentos e organismos da Administração Pública estadual desprovidos de personalidade jurídica;
b) Bens e direitos do Estado português no estrangeiro afectos a missões diplomáticas, consulados, delegações, etc.;
c) Bens e direitos do Estado afectos aos serviços e fundos autónomos dotados de personalidade jurídica própria, que não pertençam aos respectivos patrimónios privativos;
d) Bens do Estado expropriados ou mantidos ao abrigo da Lei de Bases da Reforma Agrária;
e) Bens e direitos do Estado afectos a quaisquer outras entidades.
3.º O domínio privado disponível, que compreende os bens do Estado não afectos a fins de utilidade pública e que se encontram na administração directa da Direcção-Geral do Património do Estado.» (Itálico acrescentado.)
([45]) Encontramos uma terminologia distinta em Itália, onde – como se referiu no parecer n.º 7/99, de 24 de Junho de 1999, n.º 2, nota 11 (Diário da República, II série, n.º 281, de 3 de Dezembro de 1999) – em vez de se falar de domínio público e domínio privado, se privilegia a distinção entre domínio e património: designam-se bens dominiais os pertencentes ao Estado ou a outro ente público territorial (a região, a província e a comuna) e sujeitos a um regime de direito público; são bens patrimoniais os que pertencem à Administração a título de propriedade privada, sujeitos, por regra, ao regime de propriedade privada disciplinado no Código Civil. Distingue-se, nesta segunda categoria, entre bens patrimoniais indisponíveis – bens finais utilizados pelo seu valor de uso; por se destinarem ao serviço gozam de uma tutela particular, que cessa quando termina tal afectação – e bens patrimoniais disponíveis – que se destinam a produzir um rendimento (bens instrumentais); enquadram-se também aqui os bens dominiais que deixaram de ser idóneos à utilização pública e os bens patrimoniais indisponíveis uma vez terminada a sua afectação ao serviço público (PIETRO VIRGA, Diritto Amministrativo, I Principi, 1, 4ª ed., Giuffrè editore, Milão, 1995, págs. 361-362; cfr. também ANGELO BUSCENA, entrada “Patrimonio dello Stato e degli Enti pubblici”, em Digesto delle Discipline Pubbliscistiche, XI, Utet, págs. 27-43).
([46]) MARCELLO CAETANO, ibidem; no mesmo sentido, Curso de Direito Administrativo (sumários desenvolvidos e indicações bibliográficas), de acordo com as lições de VITAL MOREIRA, cit., ponto 10.2.1., pág. 3; v. também, do Conselho Consultivo, os pareceres n.º 4/95, ponto 4. (Diário da República, II série, n.º 151, de 7 de Julho de 1995) e n.º 7/99, ponto 2. (Diário..., II série, n.º 281, de 3 de Dezembro de 1999).
([47]) Manual..., cit., tomo II, págs. 969-970, e Curso de Direito Administrativo (sumários desenvolvidos e indicações bibliográficas), de acordo com as lições de VITAL MOREIRA, cit., ponto 10.2.1., págs. 3-4.
«(x) Quando se diz que os bens disponíveis podem ser alienados não se quer evidentemente excluir a hipótese, de resto muito frequente, de a respectiva alienação ser considerada não apenas possível mas obrigatória, nomeadamente em virtude das leis de desamortização (...).»
([48]) O Decreto-Lei n.º 158/96, de 3 de Setembro (objecto de alterações posteriores), aprovou a actual Lei Orgânica do Ministério das Finanças. Sobre a Direcção-Geral do Património, serviço integrado na administração directa do Estado, dispõe-se:
«Artigo 22.º
Direcção-Geral do Património
1 – A Direcção-Geral do Património (DGP) é o serviço do Ministério das Finanças encarregado de assegurar de forma integrada a gestão e administração do património do Estado nos domínios da aquisição, administração e alienação dos bens do Estado, bem como no domínio da intervenção em operações patrimoniais do sector público, nos termos a definir por lei.
2 – Compete em geral à DGP:
a) Elaborar o cadastro e o inventário dos bens do património do Estado;
b) Proceder à aquisição de bens imóveis e ao arrendamento de imóveis destinados à instalação de serviços públicos;
c) Administrar e alienar os bens do património do Estado;
d) Coordenar e controlar a actividade gestionária patrimonial do sector público estatal, nos termos que a lei definir;
e) Organizar, gerir e racionalizar o parque automóvel do Estado;
f) Exercer outras funções que lhe sejam atribuídas por lei ou determinadas superiormente.»
([49]) Para mais desenvolvimentos, v. MARCELLO CAETANO, Manual..., cit., tomo II, pág. 993-999. Sobre a reversão de bens expropriados, v., do Conselho Consultivo, o parecer n.º 86/98, de 11 de Março de 1999 (Diário da República, II série, n.º 281, de 3 de Dezembro).
([50]) J. PEDRO FERNANDES, “Domínio privado”, cit., págs. 165-166.
([51]) Sobre questões relacionadas com o património das autarquias locais, v. o parecer n.º 7/99 do Conselho Consultivo, referido na nota 44.
([52]) Para uma ampla referência a diplomas que efectivaram as transferências, v. AMÂNCIO FERREIRA, ob. cit., pág. 110 e segs.
([53]) O EPARAA foi, como referimos (supra, nota 2), aprovado pela Lei n.º 39/80, de 5 de Agosto, e posteriormente revisto pelas Leis n.º 9/87, de 26 de Março, e n.º 61/98, de 27 de Agosto.
([54]) Enquanto nas alíneas a), b), d) e e) se utiliza o vocábulo bens, na alínea c) fala-se em coisas e direitos. O termo bem é normalmente utilizado pela doutrina e pela lei como sinónimo de coisa; todavia, por vezes – como parece acontecer nas alíneas a) e b) –, a lei designa por bens todos os elementos integrantes ou susceptíveis de integrarem um património (cfr. ANA PRATA, Dicionário Jurídico, 3.ª edição, Almedina, Coimbra, 1993, pág. 119).
([55]) As disposições paralelas do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira (Lei n.º 13/91, de 5 de Junho, alterada pela Lei n.º 130/99, de 21 de Agosto) estabelecem o seguinte:
«Artigo 143.º
Património próprio
1 – A Região Autónoma da Madeira dispõe de património próprio e de autonomia patrimonial.
2 – A Região tem activo e passivo próprios, competindo-lhe administrar e dispor do seu património.
Artigo 144.º
Domínio público
1 – Os bens do domínio público situados no arquipélago, pertencentes ao Estado, bem como ao antigo distrito autónomo, integram o domínio público da Região.
2 – Exceptuam-se do domínio público regional os bens afectos à defesa nacional e a serviços públicos não regionalizados não classificados como património cultural.
Artigo 145.º
Domínio privado
Integram o domínio privado da Região:
a) Os bens do domínio privado do Estado existentes no território regional, excepto os afectos aos serviços estaduais não regionalizados;
b) Os bens do domínio privado do antigo distrito autónomo;
c) As coisas e os direitos afectos a serviços estaduais transferidos para a Região;
d) Os bens adquiridos pela Região dentro ou fora do seu território ou que por lei lhe pertençam;
e) Os bens abandonados e os que integram heranças declaradas vagas para o Estado, desde que uns e outros se situem dentro dos limites territoriais da Região;
f) Os bens doados à Região;
g) Os bens que, na Região, sejam declarados perdidos a favor do Estado e a que lei especial, em virtude da razão que determine tal perda, não dê outro destino.»
([56]) Onde lhes correspondiam os artigos 89.º a 91.º
O Estatuto Provisório da Região Autónoma dos Açores, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 318-B/76, de 30 de Abril, dedicava ao património da Região uma secção, com um único artigo, o artigo 60.º: «Integram o património da Região os bens dos extintos distritos autónomos, os que por ela vierem a ser adquiridos e os que vierem a ser definidos por lei da Assembleia da República.»
([57]) Supra, n.º 3.1.
([58]) Cfr. PAZ FERREIRA, Finanças Regionais, cit., págs. 297-298, e “Domínio público e privado da Região”, cit., págs. 169-172.
([59]) RUI MEDEIROS/JORGE PEREIRA DA SILVA, Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores Anotado, Principia, Lisboa, 1997, pág. 249. Cfr. também JOÃO LIZARDO/CARLOS CUNHA, As Leis da Autonomia, Funchal, 1997, págs. 68-69.
([60]) Neste sentido, o parecer da Comissão Constitucional n.º 26/80, de 31 de Julho de 1980, sobre a constitucionalidade do decreto da Assembleia da República n.º 322/I, de 27 de Junho de 1980, que continha o «Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira» (Pareceres da Comissão Constitucional, 13.º volume, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1982, pág. 183 e segs.). Também o Tribunal Constitucional se tem pronunciado sobre questões que envolvem a delimitação do domínio público do Estado e das Regiões Autónomas – v. os acórdãos n.º 280/90 (Diário da República, I-A série, n.º 1, de 2 de Janeiro de 1991) e n.º 330/99 (Diário..., I-A série, n.º 151, de 1 de Julho de 1999).
Do Conselho Consultivo, v., sobre tal matéria, os pareceres n.º 162/78, de 19 de Outubro de 1978 (Diário..., II série, n.º 290, de 19 de Dezembro de 1978), n.º 10/82, de 4 de Fevereiro de 1982 (Diário..., II série, n.º 162, de 16 de Julho de 1982), n.º 16/91, de 11 de Fevereiro de 1993 (Diário..., II série, n.º 219, de 20 de Setembro de 1996, e Procuradoria-Geral da República – Pareceres, volume I, pág. 420 e segs.).
Na Doutrina, v. GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, ob. cit., págs. 412 e 858; SOUSA FRANCO, “As Finanças das Regiões Autónomas...”, cit., pág. 529; PAZ FERREIRA, As Finanças Regionais, cit., págs. 297-300.
Refira-se, por fim, o parecer da Comissão do Domínio Público Marítimo n.º 3984/87, de 26 de Novembro de 1987, no qual se conclui que «as áreas do domínio público marítimo situadas nos Açores, porque interessam à defesa nacional por declaração implícita da lei, não podem ser integradas no elenco dos bens dominiais pertencentes à Região Autónoma, pelo que continuam pertencendo ao Estado» (Boletim da Comissão do Domínio Público Marítimo, n.º 101, 1987, pág. 158 e segs.).
([61]) Ob. cit., págs. 255-256.
([62]) Note-se, todavia, que este artigo tem um teor literal mais amplo que o do artigo 113.º do EPARAA (cfr. nota 54).
([63]) FERNÃO REBELO DE FREITAS, Da Autonomia Política – Estatuto da Região Autónoma da Madeira (Notas e comentários), 2001, pág. 482.
([64]) Supra, nota 3.
([65]) As bases da política e do regime de protecção e valorização do património cultural constam da Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro.
([66]) O Decreto-Lei n.º 158/96 foi alterado pelos Decretos-Leis n.º 21/99, de 28 de Janeiro, n.º 289/2001, de 13 de Novembro, e n.º 315/2001, de 10 de Dezembro.
([67]) Alterado pelo Decreto-Lei n.º 3/2000, de 29 de Setembro.
([68]) A Reforma Aduaneira foi promulgada pelo Decreto-Lei n.º 46311, de 27 de Abril de 1965, posteriormente objecto de múltiplas alterações; sobre aspectos específicos de tal diploma e notícia das respectivas alterações, v. o parecer do Conselho Consultivo n.º 327/00, de 12 de Janeiro de 2001, maxime ponto 4.1. e nota 13.
([69]) Supra, n.ºs 4.2. e 4.3.
([70]) Proveniente da Lei n.º 61/98, de 27 de Agosto.
([71]) Lei n.º 39/80, de 5 de Agosto.
([72]) Cfr. J. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, Coimbra, 1990, pág. 181 e seguintes. Sobre a interpretação da lei, v., do Conselho Consultivo, por ex., os pareceres n.º 61/91, de 14 de Maio de 1992 (Diário da República, II série, n.º 274, de 26 de Novembro de 1992), n.º 66/95, de 20 de Março de 1996, n.º 8/98, de 7 de Outubro de 1998 (Diário da República, II série, n.º 64, de 17 de Março de 1999) e n.º 53/99, de 11 de Novembro de 1999.
([73]) Ob. cit., págs. 182-183.
([74]) A. SANTOS JUSTO, Introdução ao Estudo do Direito, Coimbra Editora, 2001, pág. 329; cfr. também JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÂO, O Direito – Introdução e Teoria Geral, 10.ª edição, Almedina, Coimbra, págs. 412-413.
([75]) Na origem do EPARAA esteve a proposta de lei n.º 300/I, apresentada pela Assembleia Regional dos Açores, que continha um capítulo, com os artigos 89.º a 91.º, dedicado aos bens da Região (Diário da Assembleia da República, II série, n.º 37, de 26 de Março de 1980). Tais artigos passaram, sem alterações e com a mesma numeração, para o texto final do estatuto, constante da Lei n.º 39/80, onde, mantendo a redacção que já vinha da proposta, são agora os artigos 111.º a 113.º A matéria não suscitou controvérsia na discussão na generalidade, feita em simultâneo com a proposta n.º 295/I, apresentada pela Assembleia Regional da Madeira (Diário..., I série, n.ºs 58 e 59, respectivamente, de 29 e de 30 de Maio de 1980); anote-se, em todo o caso, um passo de intervenção do Deputado Almeida Santos (PS), reportado, aliás, à proposta madeirense: «Prevê-se neste artigo que os bens do domínio público e privado do Estado, situados no arquipélago, passem a integrar os correspondentes domínios da região. Apenas se exceptuam os bens que interessam à defesa nacional. Eis uma norma globalizante que parece dever ser repensada em função de elementares realidades e cautelas. Nada na Constituição impõe ou sugere essa transferência de plano. Agir impensadamente, neste domínio, seria imperdoável.» (Diário..., cit., n.º 58, pág. 2577).
A proposta n.º 300/I foi aprovada por unanimidade (Diário..., cit., n.º 59, pág. 2637).
A discussão na especialidade nada trouxe de novo (Diário..., cit., n.ºs 70 e 71, de 26 e 27 de Junho de 1980).
([76]) Cfr. CHAÏM PERELMAN, Lógica Jurídica, Martins Fontes, São Paulo, 1998, pág. 80.
([77]) Manual..., cit., tomo I, pág. 970.
([78]) Ob. cit., pág. 256. Havendo esta (re)afectação, o bem mantém (recupera) a sua utilidade pública, bem como a relação de pertença ao domínio privado indisponível.
Anotações
Legislação: 
CONST76 - ART1 ART3 ART5 N1 ART6 N1 N2 ART84 N1 A) B) C) D) E) F) N2 ART112 N1 N2 N4 ART164 T) ART225 N1 N2 N3 ART226 ART227 N1 D) G) H) I) J) ART228 ART229 N3 ART231 ART232 ART234 ART255 ART262
L 61/98 DE 1998/08/27 - ART111 ART112 N1 N2 ART113 A) B) C) D) E)
EPARAA80- ART89 ART90 ART91
EMP98 - ART36 ART37
DL 477/80 DE 1980/10/15 - ART1 ART2 ART3 ART4 M) ART5 ART6
D 5787-4I DE 1919/05/10
CCIV66 ART9 N3 ART203 ART1304
DL 158/96 DE 1996/09/03 - ART4 M) I) ART19 ART22 N1 N2 B) C)
EPRAM76 - ART145
DL 360/99 DE 1999/09/16 - ART2 B) D) F) G) I) ART8 ART10 N1 A) C) ART12 N1 N2 ART13 ART14 N1 ART15 N1 ART17 ART18 ART19 N1 N2
DL 46311 DE 1965/04/27 - ART112
PORT 31/2001 DE 2001/01/17 - N2
L 39/80 DE 1980/08/05 - ART89 ART90 ART91
Referências Complementares: 
DIR CONST * ORG PODER POL / DIR ADM * ADM PUBL / DIR ADUAN / DIR CIV * TEORIA GERAL
Divulgação
Data: 
24-12-2002
Página: 
20945
3 + 5 =
Por favor indique a resposta à questão apresentada para descarregar o pdf