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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
26/2020, de 18.02.2021
Data do Parecer: 
18-02-2021
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Maioria
Número de votos vencidos: 
2
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Presidência do Conselho de Ministros
Relator: 
Maria de Fátima da Graça Carvalho
Votantes / Tipo de Voto / Declaração: 
João Alberto de Figueiredo Monteiro

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



João Alberto de Figueiredo Monteiro

Votou em conformidade



Maria de Fátima da Graça Carvalho

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Maria de Fátima da Graça Carvalho

Votou em conformidade



Maria Isabel Fernandes da Costa

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Maria Isabel Fernandes da Costa

Votou em conformidade



Maria da Conceição Silva Fernandes Santos Pires Esteves

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Maria da Conceição Silva Fernandes Santos Pires Esteves

Votou em conformidade



Marta Cação Rodrigues Cavaleira

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Marta Cação Rodrigues Cavaleira

Votou em conformidade



Eduardo André Folque da Costa Ferreira

Votou todas as conclusões, aderindo à declaração de outro



Eduardo André Folque da Costa Ferreira

Votou parcialmente vencidoe



João Conde Correia dos Santos

Votou todas as conclusões, aderindo à declaração de outro



João Conde Correia dos Santos

Votou parcialmente vencidoe

Descritores e Conclusões
Descritores: 
SISTEMA DE SEGURANÇA INTERNA
SECRETÁRIO-GERAL
COMISSÃO DE SERVIÇO
MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
ESTATUTO REMUNERATÓRIO
REMUNERAÇÃO BASE
SUBSÍDIO DE COMPENSAÇÃO
SUBSÍDIO DE REFEIÇÃO
PRESTAÇÕES SOCIAIS
DIREITOS ADQUIRIDOS
CARGO PÚBLICO
CARGO POLÍTICO
EQUIPARAÇÃO
REDUÇÃO REMUNERATÓRIA
Conclusões: 

     1.ª – Nos termos dos artigos 14.º, n.º 1 e 2, e 15.º, da Lei de Segurança Interna, aprovada pela Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto, o Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna é um órgão deste Sistema, nomeado e exonerado pelo Primeiro-Ministro e que funciona na sua direta dependência, com competências de coordenação, direção, controlo e comando operacional, equiparado, para todos os efeitos legais, exceto os relativos à sua nomeação e exoneração, a secretário de Estado;

              2.ª – Nos termos do n.º 4 do artigo 14.º da mesma lei, o Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna que seja trabalhador em funções públicas ou esteja vinculado à magistratura judicial, do Ministério Público, às Forças Armadas ou às forças e serviços de segurança pode optar pelo estatuto remuneratório do seu lugar de origem;

              3.ª – Sendo, assim, consagrada a possibilidade de opção pelo estatuto remuneratório de origem e não apenas por um dos seus componentes – a remuneração base –, formulação mais restritiva constante da lei geral aplicável aos trabalhadores em funções públicas e da lei aplicável ao pessoal dirigente;

               4.ª – A opção da Secretária-Geral do Sistema de Segurança Interna, magistrada do Ministério Público, pelo seu estatuto remuneratório de origem, permite, pois, a perceção de outros componentes remuneratórios, para além da remuneração base;

              5.ª – Consequentemente, deve ser-lhe pago o subsídio de compensação que, na vigência do anterior Estatuto do Ministério Público, integrava o estatuto remuneratório do seu lugar de origem, nos termos dos artigos 95.º, n.º 1, e 102.º, e que, na vigência do novo Estatuto do Ministério Público, continua a integrar o mesmo estatuto remuneratório e, dentro deste, a componente remuneração base, nos termos dos artigos 128.º, n.º 2, 129.º e 130.º, em especial, do n.º 3 deste último artigo;

              6.ª. – O subsídio de refeição, previsto no artigo 133.º do novo Estatuto do Ministério Público, caracteriza-se como uma prestação social, de natureza não retributiva; não constituindo componente remuneratório, a sua perceção não resulta da opção pelo estatuto remuneratório de origem feita pela Secretária-Geral do Sistema de Segurança Interna;

              7.ª – Contudo, enquanto benefício social de que a mesma usufruía no seu lugar de origem, deve continuar a ser-lhe atribuído, por força da norma do n.º 2 do artigo 50.º da Constituição, segundo a qual «Ninguém pode ser prejudicado na sua colocação, no seu emprego, na sua carreira profissional ou nos benefícios sociais a que tem direito, em virtude do exercício de direitos políticos ou do desempenho de cargos públicos»;

              8.ª – A proibição de prejuízos e a garantia dos direitos adquiridos, salvaguardadas pela referida norma constitucional, implica, no que aos benefícios sociais concerne, que estes se mantenham durante o tempo em que o cargo é exercido;

               9.ª – A norma do n.º 2 do artigo 14.º da Lei de Segurança Interna, que equipara o Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna a Secretário de Estado, para todos os efeitos legais, exceto os relativos à nomeação e à exoneração, constitui uma norma remissiva de grande amplitude, que permite a aplicabilidade dos vários regimes estabelecidos para os titulares de cargos políticos, mesmo que o Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna não conste expressamente do elenco dos cargos que figura em cada um dos respetivos diplomas legais;

              10.ª - Só assim não será se resultar da letra ou da ratio de determinado regime que o mesmo apenas visa aqueles que exercem efetivamente funções políticas;

             11.ª – Aplica-se, assim, ao Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna, a norma da Lei n.º 12-A/2010, de 30 de junho, que, no âmbito de um conjunto de medidas destinadas à redução do défice orçamental, determina a redução de 5/prct. nas remunerações dos titulares de cargos políticos, gestores públicos e equiparados, apesar de o elenco constante do artigo 11.º da referida lei não mencionar expressamente os cargos equiparados a cargos políticos;

             12ª – Não obsta a tal aplicabilidade a opção feita pela remuneração de origem, pois que, não é a remuneração auferida, mas sim o estatuto adquirido pela equiparação, que a determina.

Texto Integral
Texto Integral: 

N.º 26/2020

MFC

                Senhor Secretário de Estado

                da Presidência de Conselho de Ministros,

                Excelência:

I

1. Dignou-se Vossa Excelência solicitar parecer deste corpo consultivo acerca das seguintes questões respeitantes ao estatuto remuneratório da Exm.ª Senhora Secretária Geral do Sistema de Segurança Interna (doravante, SG do SSI)[1]:

                «i) A SG do SSI tem direito ao abono do subsídio de         compensação da carreira de origem?

                 ii) A SG do SSI tem direito a receber subsídio de refeição?

                 iii) Sobre a remuneração auferida como SG do SSI incide a redução de 5/prct., aplicável aos membros do Governo, não obstante ter optado pelo estatuto remuneratório de origem?»

Na génese do pedido de parecer reside uma exposição da interessada, que deu origem à emissão de três pareceres, subscritos pela Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros (SGPCM), pela Direção-Geral da Administração e Emprego Público (DGAEP) e pelo Centro de Competências Jurídicas do Estado (JurisAPP), cujas conclusões e/ou fundamentos nem sempre são coincidentes.

Assim, quanto à primeira questão, apenas a SGPCM entende que o subsídio de compensação é devido, pronunciando-se as duas outras entidades em sentido negativo; quanto à segunda questão, o entendimento foi unânime no sentido de não ser devido o subsídio de refeição; por fim, quanto à terceira questão, todos se pronunciaram no sentido de haver lugar à redução de 5/prct..

2. Para melhor enquadramento das questões colocadas, destacamos, do expediente enviado, os seguintes pressupostos em que se alicerçaram os pareceres emitidos:

             «1. Pelo despacho do Senhor Primeiro Ministro n.º 9928-B/2014, de 28/7, publicado no Diário da República n.º 146, 2.ª Série, de 31/7/2014, a Dr.ª Helena Fazenda foi nomeada para o cargo de SG do SSI, com efeitos a partir de 1 de agosto de 2014.

              2. A Magistrada optou pelo estatuto remuneratório de origem ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 14.º da Lei n.º 53/2008, de 29/8, que aprova a Lei de Segurança Interna.

              3. Dispõe o n.º 4 do artigo 14.º da Lei n.º 53/2008, de 29/8, que: «O Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna pode optar pelo estatuto remuneratório de origem quando seja trabalhador que exerça funções públicas ou quando esteja vinculado à magistratura judicial, do Ministério Público, às Forças Armadas ou às forças e serviços de segurança».

              4. O cargo de SG do SSI é equiparado para todos os efeitos, exceto quanto à nomeação e à exoneração, a Secretário de Estado, conforme dispõe o n.º 2 do artigo 14.º da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto, pelo que se tem considerado que lhe é aplicável a redução remuneratória de 5/prct. prevista na alínea e) do n.º 2 do artigo 11.º da Lei n.º 12-A/2010, de 30 de junho.

              5. A Dr.ª Maria Helena Pereira Loureiro Correia Fazenda integra a magistratura do MP possuindo, na origem, a categoria de Procuradora-Geral Adjunta, cujo estatuto se encontra previsto na Lei n.º 68/2019, de 27 de agosto, alterada pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março, que aprova o Estatuto dos Magistrados do Ministério Público.

              6. De acordo com o referido estatuto do MP o sistema retributivo dos magistrados do MP é exclusivo, próprio e composto por uma remuneração base e pelos suplementos remuneratórios expressamente previstos no estatuto e na lei.

               7. De entre os suplementos previstos no estatuto dos magistrados do MP destaca-se o subsídio de compensação, que lhe é abonado na carreira de magistrada do Ministério Público.

               8. Os magistrados do MP têm ainda direito a subsídio de refeição por cada dia de trabalho efetivamente prestado, correspondente ao valor do subsídio de refeição previsto para os restantes trabalhadores em funções públicas.

               9. Tendo em consideração as questões controvertidas em causa a SGPCM enquanto entidade processadora dos abonos e descontos à SG do SSI não lhe está a efetuar o pagamento do i) subsídio de compensação (…); ii) do subsídio de refeição, e iii) está a efetuar a redução remuneratória de 5/prct. prevista na alínea e) do n.º 2 do artigo 11.º da Lei n.º 12-A/2010, de 30 de junho.»

Complementarmente, resulta ainda do expediente enviado que, no que concerne ao subsídio de compensação e ao subsídio de refeição, as dúvidas se colocaram com a entrada em vigor, em 1 de janeiro de 2020, da Lei n.º 68/2019, de 27 de agosto, que aprovou o novo Estatuto do Ministério Público, já que, pelo menos durante parte do período anterior, terão sido pagos à SG do SSI os subsídios de compensação e de refeição (o primeiro, pela Direção-Geral da Administração da Justiça).

3. Cumpre emitir o parecer solicitado.

II

1. Pela Resolução n.º 45/2007, de 19 de março, o Conselho de Ministros resolveu promover a aprovação de uma nova lei de segurança interna, assente num conceito estratégico que, além do mais, correspondesse ao «quadro de ameaças e riscos típicos do atual ciclo histórico» e atuasse «a partir de um conceito alargado de segurança interna executado através de um sistema integrado liderado por um secretário-geral (SG-SISI), apoiado por um conjunto diversificado de recursos partilháveis»».

Entre as medidas visadas, constava já a criação, na dependência direta do Primeiro-Ministro, do cargo de Secretário-Geral do, então designado, Sistema Integrado de Segurança Interna, com estatuto equiparado a Secretário de Estado, exercendo «graus de autoridade variáveis», em funções, essencialmente de direção, comando, gestão, controlo e coordenação.

Em conformidade com estes propósitos, foi apresentada a Proposta de Lei n.º 184/X, na sequência da qual seria aprovada a Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto[2] (lei de segurança interna), que criou o cargo de Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna, e que passaremos a analisar.

2. Do Capítulo I, sobre “Princípios gerais”, destacamos o artigo 1.º, cujo n.º 1 define a atividade de segurança interna como «atividade desenvolvida pelo Estado para garantir a ordem, a segurança e a tranquilidade públicas, proteger pessoas e bens, prevenir e reprimir a criminalidade e contribuir para assegurar o normal funcionamento das instituições democráticas, o regular exercício dos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos e o respeito pela legalidade democrática»; nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, tal atividade «exerce-se nos termos da Constituição e da lei, designadamente da lei penal e processual penal, da lei-quadro da política criminal, das leis sobre política criminal e das leis orgânicas das forças e dos serviços de segurança».

As medidas previstas na referida lei destinam-se, em especial, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, «a proteger a vida e a integridade das pessoas, a paz pública e a ordem democrática, designadamente contra o terrorismo, a criminalidade violenta ou altamente organizada, a sabotagem e a espionagem, a prevenir e reagir a acidentes graves ou catástrofes, a defender o ambiente e a preservar a saúde pública».

Do artigo 2.º, que consagra os “Princípios fundamentais”, destaca-se que a atividade de segurança interna «pauta-se pela observância dos princípios do Estado de direito democrático, dos direitos, liberdades e garantias e das regras gerais de polícia» e que «as medidas de polícia são as previstas na lei, não devendo ser utilizadas para além do estritamente necessário e obedecendo a exigências de adequação e proporcionalidade».

Por seu turno, o artigo 3.º, sobre “Política de segurança interna”, refere que esta consiste «no conjunto de princípios, objetivos, prioridades, orientações e medidas tendentes à prossecução dos fins definidos no artigo 1.º».

Por fim, e ainda no âmbito do primeiro capítulo da lei, o artigo 6.º, sobre “Coordenação e cooperação das forças de segurança”, estatui que «as forças e os serviços de segurança exercem a sua atividade de acordo com os princípios, objetivos, prioridades, orientações e medidas da política de segurança interna e no âmbito do respetivo enquadramento orgânico» e que estes «cooperam entre si, designadamente através da comunicação de informações que, não interessando apenas à prossecução dos objetivos específicos de cada um deles, sejam necessárias à realização das finalidades de outros, salvaguardando os regimes legais do segredo de justiça e do segredo de Estado».

O Capítulo II da Lei de Segurança Interna é dedicado à “Política de segurança interna”, destacando-se o artigo 8.º, que, após estabelecer que «a condução da política de segurança interna é, nos termos da Constituição, da competência do Governo», elenca as seguintes competências do Conselho de Ministros:

               «a) Definir as linhas gerais da política de segurança interna e as orientações sobre a sua execução;

               b) Programar e assegurar os meios destinados à execução da política de segurança interna;

               c) Aprovar o plano de coordenação, controlo e comando operacional das forças e dos serviços de segurança e garantir o seu regular funcionamento;

               d) Fixar, nos termos da lei, as regras de classificação e controlo de circulação dos documentos oficiais e de credenciação das pessoas que devem ter acesso aos documentos classificados.»

Nos termos do artigo 9.º, o Primeiro-Ministro é «politicamente responsável pela direção da política de segurança interna» e compete-lhe, além do mais, «Nomear e exonerar o Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna, mediante proposta conjunta dos Ministros da Administração Interna e da Justiça, após audição do indigitado em sede de comissão parlamentar» (alínea f) do n.º 2).

             Já no Capítulo III, sobre “Sistema de Segurança Interna”, o artigo 11.º dispõe sobre os órgãos do Sistema de Segurança Interna, que são o Conselho Superior de Segurança Interna, o Secretário-Geral e o Gabinete Coordenador de Segurança. O artigo 14.º dispõe, especificamente sobre o Secretário-Geral, órgão particularmente relevante no âmbito deste parecer, em termos que se reproduzem:

«Artigo 14.º

Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna

              1 - O Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna funciona na direta dependência do Primeiro-Ministro ou, por sua delegação, do Ministro da Administração Interna.

              2 - O Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna é equiparado, para todos os efeitos legais, exceto os relativos à sua nomeação e exoneração, a Secretário de Estado.

              3 - O Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna dispõe de um gabinete de apoio, ao qual é aplicável o regime jurídico dos gabinetes ministeriais.

               4 - O Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna pode optar pelo estatuto remuneratório de origem quando seja trabalhador que exerça funções públicas ou quando esteja vinculado à magistratura judicial, ao Ministério Público, às Forças Armadas ou às forças e serviços de segurança.»

No que respeita às “Competências do Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna”, dispõe o artigo 15.º que «O Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna tem competências de coordenação, direção, controlo e comando operacional». Os artigos seguintes desenvolvem, pela seguinte forma, o conteúdo de cada uma destas vertentes da competência do referido órgão[3]:

- Nos termos do n.º 1 do artigo 16.º, «No âmbito das suas competências de coordenação, o Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna tem os poderes necessários à concertação de medidas, planos ou operações entre as diversas forças e serviços de segurança, à articulação entre estas e outros serviços ou entidades públicas ou privadas e à cooperação com os organismos congéneres internacionais ou estrangeiros, de acordo com o plano de coordenação, controlo e comando operacional das forças e dos serviços de segurança»;

- Nos termos do n.º 1 do artigo 17.º, «No âmbito das suas competências de direção, o Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna tem poderes de organização e gestão administrativa, logística e operacional dos serviços, sistemas, meios tecnológicos e outros recursos comuns das forças e dos serviços de segurança»;

- Nos termos do n.º 1 do artigo 18.º, «No âmbito das suas competências de controlo, o Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna tem poderes de articulação das forças e dos serviços de segurança no desempenho de missões ou tarefas específicas, limitadas pela sua natureza, tempo ou espaço, que impliquem uma atuação conjunta, de acordo com o plano de coordenação, controlo e comando operacional das forças e dos serviços de segurança»;

- Por fim, o n.º 1 do artigo 19.º, sobre “Competências de comando operacional», dispõe que «Em situações extraordinárias, determinadas pelo Primeiro-Ministro após comunicação fundamentada ao Presidente da República, de ataques terroristas ou de acidentes graves ou catástrofes que requeiram a intervenção conjunta e combinada de diferentes forças e serviços de segurança e, eventualmente, do Sistema Integrado de Operações de Proteção e Socorro, estes são colocados na dependência operacional do Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna, através dos seus dirigentes máximos».

Não se mostrando de interesse, no âmbito da consulta, percorrer as demais normas da Lei de Segurança Interna, retenhamos o que, no essencial, se dispõe sobre o SG do SSI.

               

Em suma, este é um dos órgãos do sistema de segurança interna, nomeado e exonerado pelo Primeiro-Ministro (mediante proposta conjunta dos Ministros da Administração Interna e da Justiça e após audição parlamentar), sob a dependência do qual funciona (ou, por sua delegação, do Ministro da Administração Interna), com competências de coordenação, direção, controlo e comando operacional. O Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna é equiparado, «para todos os efeitos legais, exceto os relativos à sua nomeação e exoneração», a Secretário de Estado.

A lei não estabelece, como vimos, requisitos específicos para a nomeação para este cargo, que é precedida de audição parlamentar, mas admite que possa tratar-se de trabalhador em funções públicas ou de pessoa vinculada às magistraturas, às forças armadas e às forças e serviços de segurança, casos em que poderá optar pelo respetivo estatuto remuneratório de origem.

No caso subjacente à consulta, a titular do cargo exerceu esse direito, manifestando por escrito, em 1 de agosto de 2014, a opção pelo seu estatuto remuneratório, enquanto Procuradora-Geral Adjunta.

III

1. O acesso a cargos públicos (numa aceção ampla) constitui um direito de todos os cidadãos, dispondo a Constituição, no n.º 1 do artigo 50.º que «Todos os cidadãos têm direito de acesso, em condições de igualdade e liberdade, aos cargos públicos» e, no n.º 2, que «Ninguém pode ser prejudicado na sua colocação, no seu emprego, na sua carreira profissional ou nos benefícios sociais a que tem direito, em virtude do exercício de direitos políticos ou do desempenho de cargos públicos».

               Em anotação a este artigo, referem Gomes Canotilho e Vital Moreira[4] que, o direito a não ser prejudicado pelo exercício de cargos públicos, implica, “designadamente”:

              «(a) garantia de estabilidade no emprego, com a consequente proibição de discriminação ou favorecimento na colocação ou emprego; (b) garantia de dimensões prestacionais e estatutárias e, consequentemente, proibição da lesão das posições juridicamente alicerçadas (benefícios sociais, segurança social, progressão na carreira, antiguidade); (c) direito a retomar as funções exercidas à data da posse para os cargos públicos (as quais, portanto só podem ser providas a título interino enquanto durar o cargo público)».

              E acrescentam:

             «Note-se que a garantia de dimensões prestacionais e estatutárias não significa imodificabilidade jurídica destas dimensões. A lei pode reestruturar o estatuto dos cargos públicos (…) mas as medidas legais retrospetivamente restritivas devem obedecer às exigências das leis restritivas (art. 18.º/2).»

2. O exercício de funções ou o desempenho de cargos fora da magistratura, por magistrados do Ministério Público, são permitidos nos termos previstos, quer no anterior, quer no atual Estatuto do Ministério Público.

No âmbito do anterior Estatuto, aprovado pela Lei n.º 60/98, de 27 de agosto[5], o artigo 139.º permitia a nomeação de magistrados em comissões de serviço “estranhas” às funções do MP, desde que autorizadas pelo Conselho Superior do Ministério Público, exigindo que o magistrado a nomear tivesse um mínimo de antiguidade (cinco anos) e fixando, em geral, em três anos, renováveis, a duração dessas comissões[6]; o artigo 23.º do Regulamento Interno da PGR, n.º 1/2002, de 28 de fevereiro, especificava que, salvo caso de excecional interesse público, só era autorizada uma renovação. E o n.º 5 do artigo 140.º dispunha que «o tempo em comissão de serviço é considerado, para todos os efeitos, como efetiva atividade na função».

Para além disso, eram exercidos, em regime de comissão de serviço interna, diversas funções ou cargos no âmbito da magistratura do MP[7], bem como, nos termos do artigo 81.º, n.º 3, os de magistrado vogal do Conselho Superior do Ministério Público, de magistrado membro do gabinete do Procurador-Geral da República, de diretor ou docente no Centro de Estudos Judiciários, de responsável no âmbito do Ministério da Justiça pela preparação e revisão de diplomas legais.

Já no âmbito do novo EMP, aprovado pela Lei n.º 68/2019, de 27 de agosto[8], e inserido em capítulo sobre “Comissões de serviço”, o artigo 178.º estabelece a distinção entre comissões de serviço internas e comissões de serviço externas, sendo internas as que respeitam às funções do MP ou equiparadas e sendo externas as restantes.

Nos termos do n.º 1 do artigo 95.º, do EMP, são funções do Ministério Público «as exercidas em procuradorias, tribunais, órgãos e departamentos do Ministério Público previstos no presente Estatuto»[9]. E, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, consideram-se equiparadas a funções de Ministério Público:
 

             «a) As funções correspondentes às de magistratura e de assessoria em tribunais internacionais e no âmbito da cooperação judiciária internacional;
b) As funções exercidas na Procuradoria Europeia;
c) As funções de direção exercidas na Polícia Judiciária;
d) As funções de direção, coordenação ou docência exercidas no Centro de Estudos Judiciários;

               e) As funções de apoio técnico-legislativo relativo à reforma do sistema judiciário no âmbito do Ministério da Justiça;
f) Todas as funções que a lei expressamente estabelecer que devem ser exercidas exclusivamente por magistrado.»

Competindo ao Conselho Superior do Ministério Público a nomeação, autorização e renovação de comissões de serviço de magistrados do Ministério Público, no caso das comissões de serviço externas, a autorização de nomeação só pode ser concedida «se existir compatibilidade entre o cargo do magistrado e a categoria funcional do lugar a prover, desde que esse lugar tenha forte conexão com a área da justiça, da sua administração ou com áreas de intervenção do Ministério Público, ou quando o seu desempenho por magistrado do Ministério Público se mostre particularmente relevante para a prossecução do superior interesse público».

Nos termos do artigo 179.º (“Prazos e efeitos”) é, em geral, de três anos a duração das comissões de serviço, renovável; no caso das comissões de serviço externas (e em algumas comissões de serviço internas) apenas pode haver uma renovação, salvo por motivo de excecional interesse público, caso em que poderá haver uma outra renovação (n.ºs 1, 2 e 3).

Ainda nos termos do n.º 6 do artigo 179.º, as comissões de serviço externas originam abertura de vaga no lugar de origem (salvo situações previstas em legislação especial); e, nos termos do n.º 7 do mesmo artigo, o tempo em comissão de serviço é considerado, para todos os efeitos, como de efetiva atividade na função.

3. A comissão de serviço foi definida, por João Alfaia[10], como «desempenho de certo cargo público, por prazo limitado, com carater amovível, através de nomeação provisória», distinguindo o Autor, as comissões de serviço extraordinárias, enquanto forma de desempenho pelos funcionários «de funções “estranhas” à Administração pública, como sucede com as funções políticas, em geral, ou as governativas, em especial» e as comissões de serviço ordinárias, «destinadas a preencher certos lugares e o desempenho dos cargos respetivos, podendo incidir sobre funcionários ou indivíduos estranhos aos serviços públicos».

Concretizando o princípio geral de que o exercício de cargos públicos não deve determinar prejuízo para o respetivo titular, designadamente no que respeita à «garantia de dimensões prestacionais e estatutárias», a legislação ordinária consagra, desde há muito, a possibilidade de, por opção do respetivo titular, ser mantida a remuneração correspondente ao lugar de origem.

3.1. No âmbito da legislação em que se materializou a reforma do sistema retributivo da função pública, ocorrida em 1989[11], e que perduraria durante cerca de duas décadas – essencialmente o Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de junho, que estabeleceu os princípios gerais em matéria de emprego público, remuneração e gestão do pessoal da função pública, e o Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de outubro, que desenvolveu e regulamentou os princípios estabelecidos no diploma anterior – dispunha o artigo 7.º deste último diploma legal:

«Artigo 7.º

Opção de remuneração

               Em todos os casos em que o funcionário passe a exercer transitoriamente funções em lugar ou cargo diferente daquele em que está provido é-lhe reconhecida a faculdade de optar a todo o tempo pelo estatuto remuneratório devido na origem».

Esta disposição (e, de um modo geral, todo o regime jurídico introduzido em 1989) foi revogada pela Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro[12], que estabeleceu os regimes de vinculação, carreiras e remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas. Neste novo diploma, a comissão de serviço foi prevista como uma das formas de constituição da relação jurídica de emprego (além da nomeação e do contrato): a) em caso de exercício de cargos não inseridos em carreiras, designadamente cargos dirigentes; b) para frequência de certos cursos de formação ou aquisição de certos graus académicos ou títulos profissionais antes do período experimental, para o exercício de funções integrado em carreira, por quem já fosse sujeito de uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado (artigo 9.º, n.º 4).

E dispunha o artigo 72.º, sobre “Opção de remuneração base”:

              «Quando a relação jurídica de emprego público se constitua por comissão de serviço ou haja lugar a cedência de interesse público, o trabalhador tem o direito de optar, a todo o tempo, pela remuneração base devida na situação jurídico-funcional de origem que esteja constituída por tempo indeterminado».

Atualmente, a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho[13], contém disposições de conteúdo similar. No que respeita a comissões de serviço, a LGTFP define-a como uma forma de constituição do vínculo de emprego público, dispondo no artigo 9.º:

«Artigo 9.º

Comissão de serviço

               1 - O vínculo de emprego público constitui-se por comissão de serviço nos seguintes casos:

               a) Cargos não inseridos em carreiras, designadamente cargos dirigentes;
b) Funções exercidas com vista à aquisição de formação específica, habilitação académica ou título profissional por trabalhador com vínculo de emprego público por tempo indeterminado.

               2 - Na falta de norma especial, aplica-se à comissão de serviço a regulamentação prevista para o vínculo de emprego público de origem e, quando este não exista, a regulamentação prevista para os trabalhadores contratados.»

E o artigo 154.º, sobre “Opção pela remuneração base”, estabelece, no n.º 1, que «Quando o vínculo de emprego público se constitua por comissão de serviço ou haja lugar a cedência de interesse público, o trabalhador tem o direito de optar, a todo o tempo, pela remuneração base devida na situação jurídico-funcional de origem que esteja constituída por tempo indeterminado».

              4. Resulta do exposto que, no âmbito da legislação geral aplicável aos funcionários ou trabalhadores com vínculo de emprego público, que exercem funções em regime de comissão de serviço, a possibilidade de opção reportava-se, inicialmente, ao «estatuto remuneratório de origem» mas, com a entrada em vigor da Lei n.º 12-A/2008, tal opção passou a restringir-se à remuneração base.

Essa tendência tinha-se já manifestado relativamente ao pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado, cujo estatuto, aprovado pela Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro[14], na alteração introduzida pela Lei n.º 51/2005, de 30 de agosto, passou a estabelecer, no n.º 3 do artigo 31.º, que «O pessoal dirigente pode, mediante autorização expressa no despacho de nomeação, optar pelo vencimento ou retribuição base da sua função, cargo ou categoria de origem, não podendo, todavia, exceder, em caso algum, o vencimento base do Primeiro-Ministro»; o n.º 5 do mesmo artigo concretizava que, para esse efeito, «é adotado como referência o vencimento ou retribuição base médio percebido durante o ano anterior à data do despacho de nomeação».


               Entretanto, diversas leis orgânicas de serviços e entidades públicas contêm normas que consagram a possibilidade de opção dos seus dirigentes pela remuneração de origem, utilizando, para o efeito, formulações nem sempre coincidentes.

A finalizar este capítulo, retemos, pois, que a formulação inicialmente adotada pelo legislador, ou seja, a possibilidade de opção pelo «estatuto remuneratório de origem» foi substituída, na lei geral aplicável aos trabalhadores em funções públicas e na lei dos dirigentes, por outra formulação, mais restritiva, a opção pela «remuneração base». No entanto, no caso que nos ocupa, a lei de segurança interna, aprovada em agosto de 2008, adotou, quanto à possibilidade de opção do SG do SSI, a referência expressa ao «estatuto remuneratório de origem» (artigo 14.º, n.º 4).

                                                         

                                                         

IV

1. Antes de iniciarmos a análise do estatuto remuneratório de origem da SG do SSI, tanto no âmbito do anterior, como do atual EMP, mostra-se conveniente recordar a composição do sistema retributivo no âmbito da lei geral aplicável aos funcionários e trabalhadores em funções públicas, recolhendo aí as definições e a caracterização dos diversos componentes remuneratórios, em especial, da retribuição base e dos suplementos. 

Assim, no âmbito da reforma ocorrida em 1989, o sistema retributivo dos funcionários era composto pela remuneração-base, pelas prestações sociais e subsídio de refeição e pelos suplementos, não sendo admitida a atribuição de qualquer outro tipo de abono que não se enquadrasse em tais componentes (artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 184/89).

Nos termos do n.º 1 do artigo 17.º, a remuneração-base era determinada pelo índice correspondente à categoria e escalão em que o funcionário ou agente estava posicionado.

Por seu turno, o artigo 19.º, do mesmo decreto-lei, sobre “Suplementos”, dispunha que «Os suplementos são atribuídos em função de particularidades específicas da prestação de trabalho», só podendo ser considerados os que tivessem fundamento nas situações expressamente elencadas (entre elas, o trabalho extraordinário, noturno, em dias de descanso semanal ou feriados, a disponibilidade permanente ou outros regimes especiais de trabalho); nos termos do n.º 3, a fixação das condições de atribuição dos suplementos era estabelecida por decreto-lei.

Desenvolvendo este princípio, dispunha o n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89:

              «Consideram-se suplementos os acréscimos remuneratórios atribuídos em função das particularidades específicas da prestação de trabalho, cujos fundamentos obedecem ao estabelecido nos n.ºs 1 e 2 do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de junho, considerando-se extintos todos os que neles não se enquadrem.»

Já no âmbito da Lei n.º 12-A/2008, a remuneração dos trabalhadores que exerciam funções ao abrigo de relações jurídicas de emprego público era composta pela remuneração base, pelos suplementos remuneratórios e pelos prémios de desempenho (artigo 67.º), sendo a remuneração base definida pelo artigo 70.º, nos seguintes termos:

               «1. A remuneração base mensal é o montante pecuniário correspondente ao nível remuneratório, conforme os casos, da posição remuneratória onde o trabalhador se encontra na categoria de que é titular ou do cargo exercido em comissão de serviço.

               2. A remuneração base está referenciada à titularidade, respetivamente, de uma categoria e ao respetivo posicionamento remuneratório do trabalhador ou à de um exercido em comissão de serviço.

               (…).»

Sobre “Condições de atribuição dos suplementos remuneratórios” dispunha o artigo 73.º da mesma lei:

               «1. São suplementos remuneratórios os acréscimos remuneratórios devidos pelo exercício de funções em postos de trabalho que apresentam condições mais exigentes relativamente a outros postos de trabalho caracterizados por idêntico cargo ou por idêntica carreira e categoria.

               2. Os suplementos remuneratórios estão referenciados ao exercício de funções nos postos de trabalho referidos na primeira parte do número anterior, sendo apenas devidos a quem os ocupe.

               3. São devidos suplementos remuneratórios quando trabalhadores, em postos de trabalho determinados nos termos do n.º 1, sofram, no exercício das suas funções, condições de trabalho mais exigentes:

               a) De forma anormal e transitória, designadamente as decorrentes de prestação de trabalho extraordinário, noturno, em dias de descanso semanal, complementar ou feriados e fora do local normal de trabalho; ou

               b) De forma permanente, designadamente as decorrentes de prestação de trabalho arriscado, penoso ou insalubre, em turnos, em zonas periféricas e de secretariado de direção.

               4. Os suplementos remuneratórios são apenas devidos enquanto perdurem as condições de trabalho que determinaram a sua atribuição.

               5. Os suplementos remuneratórios são apenas devidos enquanto haja exercício efetivo de funções.

               6. (…)

               7. Com observância do disposto nos números anteriores, os suplementos remuneratórios são criados e regulamentados por lei (…).»

Por fim, a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas continua a dispor que são componentes da remuneração, a remuneração base, os suplementos remuneratórios e os prémios de desempenho (artigo 146.º), sendo o conceito de “remuneração base “ definido pelo artigo 150.º como «(…) o montante pecuniário correspondente ao nível remuneratório da posição remuneratória onde o trabalhador se encontra na categoria de que é titular ou do cargo exercido em comissão de serviço»[15].

E, acerca de “Condições de atribuição dos suplementos remuneratórios”, o artigo 159.º dispõe em termos essencialmente idênticos aos anteriormente estabelecidos pelo artigo 73.º da Lei n.º 12-A/2008, atrás transcrito.

2. Na data da nomeação da SG do SSI e sequente manifestação de opção pelo estatuto remuneratório de origem, estava em vigor o Estatuto do Ministério Público, aprovado pela Lei n.º 60/98, de 27 de agosto, cujo artigo 95.º, sobre “Componentes do sistema retributivo”, dispunha:

                             

               «1. O sistema retributivo dos magistrados do Ministério Público é composto por:

                a) Remuneração base;

                b) Suplementos.

                2. Não é permitida a atribuição de qualquer tipo de abono que não se enquadre nas componentes remuneratórias referidas no número anterior, sem prejuízo do disposto no artigo 98.º[16]

Por seu turno, dispunha o artigo 96.º, sobre “Remuneração base e suplementos”:

             «1. A estrutura da remuneração base a abonar mensalmente aos magistrados do Ministério Público é a que se desenvolve na escala indiciária constante do mapa anexo a esta lei, de que faz parte integrante.

               (…)[17]

               4. A título de suplementos, mantêm-se as compensações a que se referem os artigos 97.º a 100.º e 102.º da presente lei.»

Os suplementos mencionados no n.º 4 do artigo 96.º eram o subsídio de fixação (devido a magistrados em funções nas regiões autónomas), o subsídio de despesas de representação (devido ao Procurador-Geral da República, ao Vice-Procurador-Geral da República e aos Procuradores-Gerais Distritais), as despesas de deslocação (reembolso das despesas contraídas com a deslocação do magistrado e família e com o transporte de bens em caso de promoção, transferência ou colocação por motivos não disciplinares), as ajudas de custo (devidas em caso de deslocação do magistrado, em serviço, para fora da comarca onde se encontrasse sediado o respetivo tribunal ou serviço) e, por fim, o suplemento previsto no artigo 102.º, com a epígrafe “Casa de habitação”, que, pela sua importância no âmbito da consulta, se transcreve:

«Artigo 102.º

Casa de habitação

              1. Nas localidades em que se mostre necessário, o Ministério da Justiça põe à disposição dos magistrados do Ministério Público, durante o exercício da sua função, casa de habitação mobilada, mediante o pagamento de uma contraprestação mensal, a fixar pelo Ministério da Justiça, de montante não superior a um décimo do total das respetivas remunerações.

              2. Os magistrados que não disponham de casa de habitação nos termos referidos no número anterior ou não a habitem conforme o disposto na parte final do n.º 2 do artigo 85.º[18] têm direito a um subsídio de compensação fixado pelo Ministro da Justiça, ouvidos o Conselho Superior do Ministério Público e as organizações representativas dos magistrados, tendo em conta os preços correntes do mercado local de habitação.»

O EMP não previa, então, expressamente, o direito a subsídio de refeição. Contudo, o artigo 108.º (“Disposições transitórias”) estabelecia que era subsidiariamente aplicável aos magistrados do Ministério Público, quanto a incompatibilidades, deveres e direitos, o regime vigente para a função pública, que previa tal atribuição. A esse assunto voltaremos mais adiante, neste parecer.

3. Na vigência do anterior EMP, o Conselho Consultivo pronunciou-se, por diversas vezes, acerca da natureza jurídica do subsídio de compensação e analisou situações específicas de magistrados que se encontravam a exercer funções em comissão de serviço, fora da magistratura, no sentido de saber se mantinham ou não o direito a esse subsídio[19].

O entendimento que se consolidou foi sintetizado, entre outros, no parecer n.º 89/2003, de 26 de setembro de 2003, que procedeu a uma exegese de diversas situações relevantes, e que concluiu nos termos que aqui se reproduzem:

             «1ª. Na perspetiva dos Estatutos dos Magistrados Judiciais e do Ministério Público, o subsídio de compensação, enquanto sucedâneo do direito a casa de habitação mobilada, pressupõe o exercício efetivo de funções de magistrado;

              2ª. No caso de magistrado a exercer funções dirigentes em comissão de serviço em organismo ou serviço da administração central, que opte pelo estatuto de origem, o direito ao subsídio de compensação depende da forma como se encontre disciplinado, na lei orgânica do serviço de destino, a faculdade de opção pelo estatuto remuneratório de origem e demais direitos;

              3ª. São várias as formas utilizadas pelo legislador que apontam no sentido da manutenção do direito ao subsídio de compensação, designadamente: quando faça equivaler as funções exercidas em comissão às de magistrado; considere o exercício de funções em comissão, para todos os efeitos legais, como prestadas no serviço de origem; exija que o nomeado seja magistrado; diga expressamente que se mantêm todos os direitos, subsídios, regalias sociais, remuneratórias e quaisquer outras correspondentes ao lugar de origem; assegure expressamente que os magistrados conservam todos os direitos consagrados nos respetivos estatutos; faculte a opção pelo estatuto remuneratório de origem por forma global; associe ao estatuto remuneratório ou à remuneração integral as demais regalias; ou considere o serviço prestado em comissão como se o tivesse sido nas categorias e funções próprias dos quadros de origem. 

              4ª. Se a lei orgânica do serviço de destino se limita, sem mais, a reproduzir a faculdade de opção pelo estatuto remuneratório de origem, prevista no artigo 7º do Decreto-Lei nº 353-A/89, de 16 de outubro, esta forma segue a regra geral, o que implica a perda do direito aos suplementos, gratificações ou regalias que pressuponham o exercício efetivo de funções no lugar de origem;

              5ª. O Magistrado do Ministério Público a exercer o cargo de Inspetor-Geral da Administração do Território e do Ambiente mantém o direito ao subsídio de compensação, por a sua situação se enquadrar nas conclusões 2ª e 3ª»[20].

Alguns anos mais tarde, o Parecer n.º 57/2006, de 29 de maio de 2008, deu conta de que a evolução legislativa, entretanto ocorrida, quer na lei geral dos trabalhadores da Administração Pública, quer na lei aplicável ao pessoal dirigente, ia no sentido de restringir expressamente a possibilidade de opção à “remuneração-base”, tendo o legislador passado a utilizar «uma formulação juridicamente muito mais precisa e restritiva do que a expressão estatuto remuneratório de origem constante do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89».

Reafirmando a doutrina do anterior parecer, no sentido de que a atribuição do subsídio de compensação pressupunha que os magistrados se encontrassem no exercício efetivo das suas funções próprias ou de funções que por lei lhes fossem equivalentes ou equiparadas, este parecer acrescentou que, para além dessas situações, teriam ainda direito à perceção desse subsídio os magistrados chamados a exercer, em comissão de serviço, funções dirigentes em organismos ou serviços da Administração Pública, desde que existisse previsão legal nesse sentido, designadamente nos respetivos diplomas orgânicos.

Seguidamente, no Parecer n.º 18/2011, de 27 de outubro de 2011, referente à situação de um magistrado judicial a exercer o cargo de diretor do Serviço de Informações e Segurança e em que se questionava se o mesmo tinha direito a acumular o subsídio de residência, previsto em norma aplicável a esse Serviço, com o subsídio de compensação, então previsto no artigo 29.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, este Conselho reafirmou a natureza compensatória do subsídio de compensação, pela não atribuição de casa de habitação mobilada, e evidenciou que a sua atribuição «pressupõe, em princípio, que tais funções sejam equivalentes ou equiparadas àquelas ou que exista previsão legal que contemple a perceção desse abono».

Embora, dado o objeto específico do parecer, não tivesse sido aprofundada a extensão da opção feita pelo magistrado em causa pelo “estatuto remuneratório de origem”, tal como permitia a lei aplicável - artigo 57.º da Lei n.º 9/2007[21] - tal opção, que incluiu a perceção do subsídio de compensação, foi considerada «admissível», tendo o parecer concluído, contudo, pela inadmissibilidade da cumulação do subsídio de compensação com o subsídio de residência, por visarem a mesma finalidade compensatória.

Mais recentemente, há a mencionar o Parecer n.º 5/2016, de 7 de abril de 2016[22], referente ao eventual direito de militares em comissão de serviço normal em gabinete ministerial, que tinham optado pelo estatuto remuneratório de origem, tal como lhes permitia a lei aplicável a membros de gabinetes ministeriais (Decreto-Lei n.º 11/2012, de 20 de janeiro), de continuarem a auferir o suplemento da condição militar previsto no Estatuto dos Militares das Forças Armadas.

Nesse parecer, o Conselho evidenciou também que, tanto no âmbito da Lei n.º 12-A/2008, como no âmbito da LGTFP, então em vigor, a possibilidade de opção se cingia apenas à remuneração base e recordou, ainda, que outras disposições da lei geral, assim como a doutrina, apontavam para que os suplementos remuneratórios apenas são devidos enquanto haja exercício efetivo das funções nas condições mais exigentes que os fundamentam.

Contudo, não deixou de ter em consideração a circunstância de a lei geral não ser aplicável ao caso e de a norma aplicável (artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 11/2012) ter estabelecido que «o membro do gabinete que seja trabalhador com relação jurídica de emprego público com a Administração Pública, central, regional ou local, pode optar pelo estatuto remuneratório correspondente ao posto de trabalho de origem ou às funções que exercia à data da designação». Perante essa constatação, entendeu este Conselho que fora, «assim», consagrada «a possibilidade de opção pelo estatuto remuneratório de origem e não apenas por um dos componentes (a remuneração base) de tal estatuto, diferentemente do que ocorre no âmbito da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas». 

4. Em síntese, a doutrina deste Conselho, elaborada na vigência do anterior EMP ou do EMJ, este na redação anterior a 2020, era no sentido de que os magistrados em comissão de serviço externa, que optavam pelo estatuto remuneratório do lugar de origem, apenas podiam continuar a auferir o subsídio de compensação nas seguintes situações: exercício de cargo que tivesse de ser preenchido por magistrado; equivalência, estabelecida pela lei, entre as funções exercidas e as de magistrado; disposição legal no sentido de que o exercício de funções se considerava, para todos os efeitos, como prestado no lugar de origem; previsão legal, designadamente na legislação aplicável ao cargo exercido em comissão de serviço, que contemplasse tal perceção.

Quanto à última situação, entendeu-se, na vigência do Decreto-Lei n.º 353-A/89 e de outros diplomas que aludiam à opção pelo “estatuto remuneratório de origem”, que tal formulação genérica e usual era insuficiente para permitir a inclusão de eventuais acréscimos à remuneração base, exigindo-se que algo mais se acrescentasse, revelando a intenção do legislador de os incluir nessa opção (designadamente, referindo que se mantinham todos os acréscimos, subsídios, regalias, etc.).

Em pareceres subsequentes, emitidos na vigência da legislação geral aplicável aos funcionários ou trabalhadores em funções públicas, bem como da legislação aplicável ao pessoal dirigente, que passaram a consagrar a opção pela remuneração base, admitiu-se que, nos casos em que, apesar disso, os diplomas orgânicos dos serviços em que era exercido o cargo tinham mantido a opção pelo «estatuto remuneratório de origem», se consagrara «a possibilidade de opção pelo estatuto remuneratório de origem e não apenas por um dos componentes (a remuneração base) de tal estatuto».

5. Ora, aquando da aprovação da lei de segurança interna, tinha já ocorrido essa evolução nos conceitos utilizados, quer na lei geral aplicável aos trabalhadores da Administração Pública, quer na lei aplicável ao pessoal dirigente.

Porém, o n.º 4 do artigo 14.º da lei de segurança interna manteve a referência à possibilidade de o SG do SSI optar pelo estatuto remuneratório de origem e não apenas pela remuneração base.

Não havendo outros elementos que permitam confirmar a intenção do legislador para a utilização de uma e não de outra formulação, não podemos deixar de aceitar que, ao permitir a opção pelo estatuto remuneratório de origem, num momento em que a tendência geral era para apenas permitir a «opção pela remuneração base», o legislador consagrou um regime especial, que permite incluir nessa opção outros componentes remuneratórios, tal como muitos outros diplomas o fizeram, através dessa ou de outras formulações, porventura mais especificadas.

A essa opção poderá não ter sido alheia a possibilidade – evidenciada pelo legislador - de o cargo vir a ser preenchido por magistrados, membros das Forças Armadas ou das forças e serviços de segurança, detentores de estatutos remuneratórios próprios, de modo a viabilizar a sua aceitação para o exercício do cargo. De facto, caso a lei de segurança interna nada dissesse, aplicar-se-ia ao SG do SSI - por força da equiparação desse cargo a Secretário de Estado - o estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, aprovado pela Lei n.º 4/85, de 9 de abril, que não prevê a possibilidade de opção pelo estatuto remuneratório de origem[23].

O entendimento de que, perante a evolução registada na lei geral, a manutenção da formulação anterior permite a opção por outros componentes que não a remuneração base, parece resultar também da seguinte anotação de VEIGA E MOURA e CATIA ARRIMAR[24] à norma da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas que, para o respetivo universo de aplicação, restringe a opção à remuneração base:

             «Ao limitar a possibilidade de opção apenas à remuneração base, o legislador aponta no sentido de que, não obstante tal opção pela remuneração de origem, o trabalhador possa acumular no serviço de destino regalias ou outras componentes não reconduzíveis a tal remuneração e que sejam decorrentes do exercício das funções que efetivamente presta neste último serviço ou inerentes ao estatuto remuneratório do cargo que ocupa ou exerce em tal serviço. Se esta não tivesse sido a intenção do legislador, seguramente teria determinado a possibilidade de opção pelo estatuto remuneratório de origem e não apenas por uma das componentes (a remuneração base) de tal estatuto.»

Assim, a referência ao estatuto remuneratório de origem, acolhida na lei aplicável, permitia incluir, na opção feita pela SG do SSI, o subsídio de compensação a que respeita a consulta. Tendo presente a informação segundo a qual, na vigência do anterior EMP, foram efetivamente pagas à SG do SSI as prestações referentes a esse subsídio, concluímos que tal pagamento tinha sustentação na norma do n.º 4 do artigo 14.º da lei aplicável.

V

1. Contudo, como começámos por referir, a questão coloca-se, agora, face ao atual EMP, aprovado pela Lei n.º 68/2019, de 27 de agosto, cujas correspondentes disposições nem sempre se mostram coincidentes.

Começamos, assim, por transcrever as normas relevantes do atual Estatuto, inseridas na Secção IV, sobre “Retribuição”:

«Artigo 128.º

Da retribuição e suas componentes

             1- A remuneração dos magistrados do Ministério Público deve ser ajustada à dignidade das suas funções e à responsabilidade de quem as exerce, garantindo as condições de autonomia desta magistratura.
2 - O sistema retributivo dos magistrados do Ministério Público é exclusivo, próprio e composto por uma remuneração base e pelos suplementos expressamente previstos no presente Estatuto e na lei.
3 - As componentes remuneratórias elencadas no número anterior não podem ser reduzidas, salvo em situações excecionais e transitórias, sem prejuízo do disposto no n.º 1.

              4 - O nível remuneratório dos magistrados do Ministério Público colocados como efetivos não pode sofrer diminuições em resultado de alterações ao regime da organização judiciária que impliquem movimentação obrigatória.»

        

«Artigo 129.º

Remuneração base e subsídios

                 1 - A estrutura da remuneração base a abonar mensalmente aos magistrados do Ministério Público é a que se desenvolve na escala indiciária constante do anexo ii, o qual faz parte integrante do presente Estatuto.
2 - A antiguidade, para efeitos de aferição do escalão indiciário, conta-se do início da formação como auditor de justiça no Centro de Estudos Judiciários.
3 – Os magistrados auferem pelo índice 135 da escala indiciária constante do anexo ii, a partir da data em que tomam posse como procuradores da República.

               4 - A remuneração base é anual e automaticamente revista, sem pendência de qualquer formalidade, mediante atualização do valor correspondente ao índice 100, nos termos do disposto no artigo 2.º da Lei n.º 26/84, de 31 de julho, na sua redação atual.

                5 - A remuneração base anual é paga em 14 mensalidades, das quais 12 correspondem à remuneração mensal, incluindo a do período de férias, e as demais a um subsídio de Natal, pago em novembro de cada ano, de valor igual à remuneração auferida naquele mês, e a um subsídio de férias, pago no mês de junho de cada ano, de valor igual à remuneração auferida naquele mês.»

«Artigo 130.º

Subsídio de compensação

                  1 - Nas localidades onde se mostre necessário, o Ministério da Justiça, através do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I. P., coloca à disposição dos magistrados do Ministério Público, durante o exercício da sua função, casa de habitação mobilada, mediante o pagamento de uma contraprestação mensal, a fixar pelo membro do Governo responsável pela área da justiça.

               2 - Os magistrados do Ministério Público que não disponham de casa de habitação nos termos referidos no número anterior ou não a habitem, conforme o disposto no n.º 3 do artigo 106.º[25], têm direito ao subsídio de compensação, constante do anexo iii do presente Estatuto, equiparado a ajudas de custo e que de igual modo se destina a compensar a disponibilidade e exclusividade absolutas, cujo valor pode ser fixado pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas da justiça e das finanças, ouvidos o Conselho Superior do Ministério Público e as organizações representativas dos magistrados, sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 129.º.

               3 - O subsídio referido no número anterior é, para os efeitos previstos no presente Estatuto e na alínea d) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS, integrado na remuneração referida no artigo 129.º, sendo pago 14 vezes por ano e sujeito apenas à dedução da correspondente quota para a Caixa Geral de Aposentações ou da quotização para a segurança social.
4 - A contraprestação mensal referida no n.º 1 é devida desde a data da publicação do despacho de nomeação até àquela em que for publicado o despacho que altere a situação anterior, ainda que o magistrado não habite a casa.»

             

O artigo 131.º (“Execução de serviço urgente”) prevê um suplemento remuneratório diário devido aos magistrados pelo serviço urgente executado aos sábados, nos feriados que recaiam em segunda-feira e no segundo dia feriado, em caso de feriados consecutivos.

 O artigo 132.º (“Fixação nas regiões autónomas”) prevê a possibilidade de atribuição (por despacho dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça) de um suplemento de fixação aos magistrados do Ministério Público que exerçam funções nas regiões autónomas.

O artigo seguinte dispõe sobre “Subsídio de refeição”, em termos que se transcrevem:

«Artigo 133.º

Subsídio de refeição

              Os magistrados do Ministério Público têm direito a subsídio de refeição por cada dia de trabalho efetivamente prestado, correspondente ao valor do subsídio de refeição previsto para os trabalhadores em funções públicas.»

O artigo 134.º prevê o direito a despesas de representação, de que podem agora beneficiar, para além do Procurador-Geral da República e do Vice-Procurador-Geral da República, os Procuradores-Gerais Regionais, o diretor do DCIAP, os diretores dos departamentos de contencioso do Estado e interesses coletivos e difusos, os diretores dos departamentos de investigação e ação penal regional e os magistrados do Ministério Público coordenadores de procuradorias da República de comarca e administrativa e fiscal.

O artigo 135.º, sobre “Despesas de movimentação”, consagra o direito ao reembolso (caso não tenha havido recebimento adiantado) das despesas resultantes da deslocação do magistrado e seu agregado familiar, bem como, sob certas condições, do transporte dos bens pessoais, quando nomeados, promovidos, transferidos, colocados ou reafetados, fora de motivos disciplinares.

O artigo 136.º, sobre “Exercício de funções em acumulação e substituição”, estabelece, sob determinadas condições e limites, o direito a uma remuneração em virtude do exercício de funções em tal regime.

Sobre ajudas de custo, dispõem os artigos 137.º e 138.º, referentes, respetivamente à deslocação de magistrados em exercício de funções nos tribunais de primeira instância e a outras deslocações no país e estrangeiro.

2. De referir que o Estatuto dos Magistrados Judiciais[26], na redação introduzida pela Lei n.º 67/2019, de 27 de agosto, contém normas similares[27], transcrevendo-se apenas a que respeita a “Retribuição e seus componentes”, por conter algumas especificidades de redação:

«Artigo 22º

Retribuição e seus componentes

               1 - O sistema retributivo dos magistrados judiciais é exclusivo, próprio e composto por uma remuneração base e pelos suplementos expressamente previstos no presente Estatuto.

                2 - A remuneração dos magistrados judiciais deve ser ajustada à dignidade das suas funções de soberania e à responsabilidade de quem as exerce, de modo a garantir as condições de independência do poder judicial.
3 - As componentes remuneratórias elencadas no n.º 1 não podem ser reduzidas, salvo em situações excecionais e transitórias, sem prejuízo do disposto no número anterior.

               4 - O nível remuneratório dos magistrados judiciais colocados como efetivos não pode sofrer diminuições em resultado de alterações ao regime da organização judiciária que impliquem movimentação obrigatória.»

Seguidamente, o artigo 23.º, sobre “Remuneração base e subsídios” corresponde, com as devidas adaptações, ao que dispõe o artigo 129.º do EMP; do mesmo modo, o artigo 26.º, sobre “Subsídio de refeição”, corresponde ao artigo 133.º do EMP; o artigo 26.º A, sobre “Subsídio de compensação”, ao artigo 130.º do EMP, todos com idêntica epígrafe.

3. Mostra-se evidente a evolução registada no âmbito do EMP (e também do EMJ), no que concerne às disposições sobre retribuição.

Desde logo, no que releva no âmbito da presente consulta, destacamos três aspetos essenciais: a caraterização do sistema retributivo destes magistrados como «exclusivo, próprio e composto por uma remuneração base e pelos suplementos expressamente previstos no presente Estatuto e na lei» (artigo 128.º do EMP); a consagração de uma norma que, expressa e diretamente, lhes atribui o direito a subsídio de refeição (artigo 133.º do EMP); a nova caracterização e natureza do subsídio de compensação (artigo 130.º do EMP), a que passamos a dedicar maior desenvolvimento.

Apesar de a previsão deste subsídio, no n.º 1 do artigo 130.º, começar por se apresentar, na linha tradicional, como um sucedâneo da não disponibilização, pelo Ministério da Justiça, nas localidades em que tal se mostre necessário, de casa de habitação mobilada – ao definir o universo dos beneficiários deste subsídio como «os magistrados que não disponham de casa de habitação nos termos referidos no número anterior» – a verdade é que a mesma norma atribui-lhe também («do mesmo modo») uma finalidade compensatória da disponibilidade e exclusividade absolutas, que caracterizam o exercício da magistratura.

Passou, assim, a ser conferida a este subsídio natureza mista, pois, para além de continuar a compensar a falta de disponibilização de casa de habitação, visa agora compensar, também, a prestação de atividade em regime de disponibilidade e exclusividade absolutas.

De referir que esta alteração da natureza do subsídio de compensação foi evidenciada pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, da Assembleia da República, no parecer que emitiu no âmbito dos respetivos trabalhos preparatórios[28].

Não obstante, por opção expressa do legislador, consignada na mesma norma, manteve-se a equiparação deste subsídio a ajudas de custo.

Porém, o n.º 3 do artigo que analisamos – artigo 130.º do EMP – contém outros aspetos inovadores. O primeiro consiste em que «para os efeitos previstos neste Estatuto e na alínea d) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS»[29], o subsídio de compensação é integrado na remuneração referida no artigo 129.º, ou seja, na remuneração base; o segundo consiste em que passou a ser pago 14 vezes por ano; e o terceiro consiste na previsão expressa de que apenas é sujeito a dedução para a Caixa Geral de Aposentações ou para a segurança social.

A redação do n.º 3, contendo o segmento que consagra estes aspetos inovadores, foi introduzida aquando da discussão na especialidade[30]. E, de forma conjugada com esta previsão, foram então apresentadas propostas de alteração ao n.º 2 do artigo 188.º (atual artigo 189.º), sobre “Aposentação e reforma”, e ao n.º 6 do artigo 189.º (atual artigo 190.º), sobre “Jubilação”, que foram aprovadas, e que passaram, respetivamente, a dispor:

              «Integra a remuneração mensal relevante o subsídio previsto no n.ºs 2 e 3 do artigo 130.º, pelo número de meses correspondente à quotização para a Caixa Geral de Aposentações ou da quotização para a segurança social»;

               «A pensão calculada nos termos do n.º 4 inclui o valor correspondente ao subsídio previsto no artigo atual 130.º, independentemente do número de anos da quotização prevista no n.º 3 do mesmo preceito».

Ora, é a integração do subsídio de compensação na remuneração base, conjugada com o seu pagamento catorze vezes por ano e a sua não sujeição a outras deduções que não as atrás referidas, que preside à argumentação invocada, designadamente num dos pareceres emitidos previamente ao pedido de consulta, no sentido de que, face à opção da Senhora SG do SSI pelo estatuto remuneratório de origem, lhe deve continuar a ser pago aquele subsídio.

Vejamos.

De acordo com o n.º 1 do artigo 129.º do atual EMP, «a estrutura da remuneração base a abonar mensalmente aos magistrados do Ministério Público é a que se desenvolve na escala indiciária constante do anexo ii, o qual faz parte integrante do presente Estatuto», sendo que, nos termos do n.º 3, «os magistrados auferem pelo índice 135 da escala indiciária constante do anexo ii, a partir da data em que tomam posse como procuradores da República».

A estrutura da remuneração base, assente numa escala indiciária, consta do anexo ii; por seu turno, o subsídio de compensação está previsto em outro anexo – iii – tendo um valor fixo e idêntico para todos os magistrados, que acresce, em cada caso, ao respetivo valor indiciário.

A integração do subsídio de compensação na remuneração base dos magistrados, ditada pelo n.º 3 do artigo 130.º, não se assimila a outras que tiveram lugar através de outros diplomas legais, visando outros grupos profissionais, na sequência de um propósito geral de eliminar suplementos diversificados que se mantinham e que, para o efeito, foram absorvidos no valor da remuneração base, deixando, assim, de estar autonomamente previstos[31].

Na opção do novo EMP, o subsídio de compensação configura-se como uma parcela que, integrando embora a remuneração base, «para os efeitos previstos no presente Estatuto e na d) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS», conserva autonomia, expressa em valor específica e autonomamente estabelecido e em fundamentos próprios de atribuição - visando compensar o modo mais oneroso como é concretamente exercida a atividade, a saber, sem disponibilização de casa de habitação e em regime de disponibilidade e exclusividade absolutas - e na não sujeição a outros descontos para além dos indicados.

Na formulação da norma - que continua a fazer depender a atribuição do subsídio da não disponibilização de casa de habitação pelo Ministério da Justiça, quando tal é exigível - poderia equacionar-se a situação de magistrado que, por dispor de casa de habitação fornecida pelo mesmo Ministério, não auferiria tal subsídio. Porém, essa solução suscita reservas, na medida em que privaria o magistrado da compensação pela exclusividade e pela disponibilidade absolutas com que exerce as funções, finalidade também prosseguida por aquele subsídio, já que não estão previstos valores correspondentes a cada uma das condições de exercício das funções que o subsídio visa compensar.

Diversamente, no caso de magistrado que se encontre fora do exercício das funções da magistratura e investido em cargo não equiparado nem exercido necessariamente por magistrado, nenhum dos fundamentos para a atribuição do subsídio parece subsistir: nem o direito à atribuição de casa de habitação mobilada – que apenas existe «durante o exercício da sua função» – nem a compensação pela disponibilidade e exclusividade absolutas inerentes ao exercício da magistratura.

Contudo, apesar das questões que o atual regime e natureza do subsídio de compensação podem suscitar[32], não podemos ignorar a disposição legal que, expressamente, integra esse subsídio na remuneração base dos magistrados, para efeitos do EMP e do Código do IRS, face à qual se mostra difícil sustentar que uma opção pela remuneração de origem não integra a perceção desse subsídio.

Mas, acresce, que se mantém em vigor a norma do n.º 4 do artigo 14.º da lei de segurança interna, que permite à SG do SSI a manutenção do estatuto remuneratório de origem, numa aceção que, tal como atrás concluímos, sempre abrangeria, não só a remuneração base, como também outros componentes remuneratórios.

Assim, até por maioria de razão, concluímos que o subsídio de compensação deve continuar a ser pago à SG do SSI.

VI

1. A segunda questão colocada respeita ao eventual direito à perceção, pela SG do SSI, do subsídio de refeição, direito que, como vimos, não estava expressamente consagrado no anterior EMP (embora estivesse previsto na legislação aplicável aos funcionários da Administração Pública, subsidiariamente aplicável), mas que está consagrado agora, expressamente, no artigo 133.º do atual EMP.

O argumento invocado pelas três entidades que se pronunciaram no sentido de tal subsídio não ser devido, reside na natureza do subsídio de refeição, que, enquanto prestação social, não integra o estatuto remuneratório pelo qual foi exercida opção.

2. De facto, a qualificação do subsídio de refeição como prestação social e não como componente remuneratório mostra-se atualmente pacífica.

Embora, inicialmente, esse subsídio tivesse figurado como componente remuneratório (na vigência do Decreto-Lei n.º 305/77, de 29 de julho, que o criou e, mais tarde, do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de junho[33]), simultaneamente surgia já qualificado como prestação social (no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 57-B/84, de 20 de fevereiro, ainda em vigor, e no Decreto- Lei n.º 352-A/89, de 16 de outubro).

Com a entrada em vigor da Lei n.º 12-A/2008, o subsídio de refeição deixou de estar consagrado como componente remuneratório; recorde-se que, nos termos do artigo 67.º deste diploma legal, a remuneração dos trabalhadores em funções públicas era composta por remuneração base, suplementos remuneratórios e prémios de desempenho. Contudo, o artigo 114.º da mesma lei, inserido nas disposições finais e transitórias e com a epígrafe “Proteção social e benefícios sociais”, manteve uma referência expressa a esse subsídio, estabelecendo que «Todos os trabalhadores têm direito, nos termos da lei, a proteção social, a outros benefícios sociais e a subsídio de refeição».

Já a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, cujo artigo 146.º continua a considerar, como componentes da remuneração, a remuneração base, os suplementos remuneratórios e os prémios de desempenho, deixou de fazer referência ao subsídio de refeição. Isso não significa, porém, que os trabalhadores em funções públicas tivessem perdido esse direito, pois o mesmo estava e continuou consagrado no Decreto-Lei n.º 57-B/84, de 20 de fevereiro[34], que estabeleceu o regime e valor do subsídio de refeição «a atribuir aos funcionários e agentes da administração central e local, bem como dos organismos de coordenação económica e demais institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos».

Conforme referem Veiga e Moura e Catia Arrimar[35], a não inclusão deste subsídio como componente remuneratório «só reforça o entendimento de que se está perante uma prestação social atípica».

Refira-se, ainda, que o direito ao subsídio de refeição está previsto em diplomas que consagram os estatutos de diversas categorias de titulares de cargos públicos, aplicando-se, por remissão, os termos e os valores estabelecidos para a Administração Pública (eleitos locais[36], dirigentes[37], juízes do Tribunal Constitucional[38]). Já o estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, aprovado pela Lei n.º 4/85, de 9 de abril, não consagra tal direito, o mesmo acontecendo com o Estatuto dos Deputados[39].

3. Como referimos, a natureza de benefício social foi afirmada no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 54-B/84, onde se consignou: «(…) entende o Governo dever proceder à revisão do regime do subsídio de refeição, atribuindo-lhe a natureza de benefício social a conceder como comparticipação nas despesas resultantes de uma refeição tomada fora da residência habitual, nos dias de prestação efetiva de trabalho».

Segundo João Alfaia[40], trata-se de «um subsídio social de montante uniforme de que são beneficiários, na sua maioria, os funcionários e agentes da Administração Pública central, regional e local, que tem por finalidade essencial comparticipar a despesa de uma refeição diária (em regra, o almoço), em princípio, nos dias de prestação de um certo mínimo de horas de trabalho».

Também Veiga e Moura[41] considera que, «apesar de estar intimamente ligado à prestação do trabalho», o subsídio de refeição não constitui um complemento remuneratório. Contudo, releva a especificidade de esta prestação social – diversamente das restantes – exigir a prestação efetiva de trabalho por determinado período de tempo, qualificando-a assim como prestação social atípica «destinada a compensar o acréscimo de encargos que, presumivelmente, o trabalhador é obrigado a realizar pela prestação de serviço efetivo durante um determinado período de tempo».

Na vertente laboral, Pedro Ferreira de Sousa e FABIO Nave Moreira[42] analisaram o mesmo tema, embora com referência ao Código do Trabalho, cujo artigo 260.º, com a epígrafe “Prestações incluídas ou excluídas da retribuição” dispõe, na parte pertinente:

              «1. Não se consideram retribuição:

              a) As importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abono de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outros equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador, salvo quando, sendo tais deslocações ou despesas frequentes, essas importâncias, na parte que exceda os respetivos montantes normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador;

               (…)

               2- O disposto na alínea a) do número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, ao abono para falhas e ao subsídio de refeição.

               (…).»

Os referidos Autores citam diversos acórdãos, designadamente de tribunais superiores, que reafirmam a natureza, por regra, não retributiva mas sim compensatória deste subsídio[43]; excecionadas são as situações em que o valor do subsídio excede os valores normalmente pagos a esse título, cabendo nestes casos aos trabalhadores o ónus de alegarem e demonstrarem os respetivos factos, de modo a afastarem a presunção resultante da lei.

Também em anteriores pareceres deste Conselho[44], o subsídio de refeição tem sido caracterizado como prestação social, de natureza não retributiva mas compensatória, que, tal como as ajudas de custo, não integra a remuneração.  

O Parecer n.º 20/2015, de 25 de junho de 2015, evidenciou que o subsídio de refeição depende do exercício efetivo de funções e que, nos termos do artigo 152.º da LGTFP, não integra a remuneração do período de férias, aspeto que, segundo este Conselho, confirma que esta prestação «não integra, efetivamente, a remuneração base, na medida em que esta continua, obviamente, a ser paga durante o período de férias».

Do mesmo modo, encontramos, na jurisprudência do Tribunal Constitucional, referências ao subsídio de refeição, caraterizado como prestação pecuniária não qualificável como suplemento remuneratório nem mesmo como componente remuneratória[45].

4. A consagração expressa do direito dos magistrados do MP a subsídio de refeição, «por cada dia de trabalho efetivamente prestado, correspondente ao valor do subsídio de refeição previsto para os trabalhadores em funções públicas», no artigo 133.º do atual EMP, é feita em termos similares aos que constam da legislação geral, nada permitindo conferir-lhe diversa natureza.

Apesar de o sistema retributivo destes magistrados ser, nos termos do n.º 1 do artigo 128.º, «exclusivo, próprio e composto por uma remuneração base e pelos suplementos expressamente previstos no presente Estatuto e na lei», daí não resulta que todas as prestações previstas no mesmo capítulo do EMP constituam suplementos e, como tal, componentes remuneratórios. Aliás, entre as várias prestações previstas no referido capítulo do EMP encontram-se as ajudas de custo, que, tal como é unanimemente reconhecido, não têm natureza remuneratória.

Não obstante o regime especial que foi previsto pelo n.º 3 do artigo 130.º para o subsídio de compensação – que atrás analisámos – consideramos que o conceito de suplemento acolhido no n.º 1 do artigo 128.º do atual EMP deve continuar a harmonizar-se com o conceito consagrado na lei geral, na jurisprudência e na doutrina, ou seja, um acréscimo à remuneração-base destinado a remunerar condições específicas e mais exigentes em que as funções são prestadas, conceito em que não se integra o subsídio de refeição.

5. Apesar de acompanharmos, quanto à qualificação do subsídio de refeição, os pareceres das entidades que se pronunciaram antes do pedido de parecer, consideramos que outra deve ser a resposta final à questão colocada.

De facto, a qualificação do subsídio como prestação ou benefício social implica, nos termos previstos na Constituição, que o mesmo deva continuar a ser pago.

Recorde-se a norma do artigo 50.º, n.º 2, da Constituição, com a qual iniciámos o ponto III deste parecer: «Ninguém pode ser prejudicado na sua colocação, no seu emprego, na sua carreira profissional ou nos benefícios sociais a que tem direito, em virtude do exercício de direitos políticos ou do desempenho de cargos públicos».

Em anotação a esta norma, dizem Jorge Miranda e Rui Medeiros[46]:

             «O titular de cargo público não perde nem o lugar profissional nem a antiguidade e o direito a progressão na carreira, nem os correspondentes benefícios sociais e tem o direito de reocupar o lugar logo que cesse o exercício do cargo público. A fórmula constitucional é suficientemente expressiva para não deixar dúvidas acerca da vinculatividade imediata tanto das entidades públicas, como, sem adaptações, das privadas.»

Do mesmo modo, Gomes Canotilho e Vital Moreira[47], em anotação à mesma norma, inserem este direito a não ser prejudicado nos benefícios sociais numa das garantias – a garantia de dimensões prestacionais e estatutárias – em que se desdobra o direito a não ser prejudicado pelo exercício de cargos públicos.

As normas constantes dos n.ºs 1 («Todos os cidadãos têm o direito de acesso, em condições de igualdade e liberdade, aos cargos públicos») e 2 (atrás transcrita) do artigo 50.º da Constituição foram introduzidas no âmbito da revisão constitucional de 1982. Aquando da sua discussão e aprovação (por unanimidade), o deputado Fernando Condesso realçou a importância do n.º 2, referindo que «vem, no fundo, consagrar, generalizando a todos os que exercem cargos públicos ou direitos políticos, o princípio hoje consagrado em relação aos deputados, de que nenhum cidadão pode ser prejudicado na sua profissão ou benefícios sociais por virtude de exercício dos mesmos»[48].

No entanto, há a evidenciar que a Constituição continha já, desde a sua origem, uma norma similar; de facto, dispunha o n.º 6 do artigo 276.º, com a epígrafe “Defesa da Pátria e serviço militar»:

           

             «Nenhum cidadão pode ser prejudicado na sua colocação, nos seus benefícios sociais ou no seu emprego permanente por virtude do cumprimento serviço militar ou do serviço cívico obrigatório».

A mesma norma consta, atualmente, do n.º 7 do mesmo artigo 276.º, que passou a intitular-se “Defesa da Pátria, serviço militar e serviço cívico”.

E, em anotação a esta norma, dizem GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA[49]

           

             «O direito a não ser profissionalmente prejudicado em virtude do cumprimento do serviço militar ou do serviço cívico obrigatório é idêntico ao estabelecido para o desempenho de cargos públicos (art. 50.º-2), sendo a justificação ainda mais evidente aqui, uma vez que se trata do cumprimento de serviços que são obrigatórios. Nos termos gerais do regime dos direitos, liberdades e garantias, aqui aplicável por força do artigo 17.º, esta garantia é de aplicação imediata, vinculando diretamente as entidades públicas e privadas (art. 18.º - 1).

               A densificação do direito aqui consagrado deve ter em conta pelo menos as seguintes dimensões: (a) garantia da segurança no emprego, não podendo ser despedidos, demitidos ou considerados desligados, conforme os casos, durante a prestação dos erviço militar ou do serviço cívico; (b) garantia dos direitos adquiridos (em matéria de benefícios sociais, progressão na carreira, etc.); (c) direito a retomar as funções exercidas à data da chamada ao cumprimento do serviço militar ou serviço cívico, com readmissão na mesma categoria ou categoria equivalente à que possuíam.»

6. Tal como foi evidenciado nos debates que precederam a aprovação do n.º 2 do artigo 50.º da Constituição, com esta norma, «generalizou-se», a todos os titulares de cargos públicos, o princípio já então consagrado em relação aos deputados.

De facto, os sucessivos diplomas que, desde 1976[50], aprovaram o Estatuto dos Deputados, contêm uma norma similar, a qual consta, atualmente, do artigo 19.º do Estatuto dos Deputados, aprovado pela Lei n.º 7/93, de 1 de março[51]Os deputados não podem ser prejudicados na sua colocação, no seu emprego permanente ou nos seus benefícios sociais, por causa do desempenho do mandato»).

E, cabe referir também, o artigo 18.º, sobre “Regime de previdência”:

«Artigo 18.º

Regime de previdência

 1. Os deputados beneficiam do regime geral de segurança social.

              2. No caso de os Deputados optarem pelo regime de previdência da sua atividade profissional, cabe à Assembleia da República a satisfação dos encargos que corresponderiam à entidade patronal.»

Normas de conteúdo idêntico ou similar foram introduzidas em vários outros diplomas, aplicáveis a outros titulares de cargos públicos.

Assim, no Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, aprovado pela Lei n.º 13/91, de 5 de junho[52], os artigos 25.º e 26.º, e os artigos 66.º e 67.º, consagram normas similares, respetivamente para os deputados à Assembleia Legislativa e para os membros do Governo Regional.

Por seu turno, o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, aprovado pela Lei n.º 39/80, de 5 de agosto[53], determina, no artigo 97.º, que são aplicáveis aos deputados à Assembleia Legislativa «com as devidas adaptações», os direitos, regalias e imunidades consagrados no Estatuto dos Deputados à Assembleia da República e, no artigo 104.º, que são aplicáveis aos membros do Governo Regional, «com as devidas adaptações», os direitos, regalias e imunidades consagrados no estatuto dos membros do Governo da República.

O Estatuto dos Eleitos Locais, aprovado pela Lei n.º 29/87, de 30 de Junho[54], dispõe no artigo 22.º:

«Artigo 22.º
        Garantia dos direitos adquiridos

              1 - Os eleitos locais não podem ser prejudicados na respetiva colocação ou emprego permanente por virtude do desempenho dos seus mandatos.
(…).
3 - Durante o exercício do respetivo mandato não podem os eleitos locais ser prejudicados no que respeita a promoções, concursos, regalias, gratificações, benefícios sociais ou qualquer outro direito adquirido de caráter não pecuniário.

              (…).»

Já a Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional – Lei n.º 28/82, de 15 de novembro[55] – dispõe, no n.º 1 do artigo 35.º, sobre “Estabilidade de emprego”:

              «1. Os juízes do Tribunal Constitucional não podem ser prejudicados na estabilidade do seu emprego, na sua carreira e no regime de segurança social de que beneficiem por causa do exercício das suas funções.»

Sendo que, o artigo 23.º-A, sobre “Regime de previdência e aposentação”, dispõe:

              «1 – Os juízes do Tribunal Constitucional beneficiam do regime de previdência mais favorável aplicável ao funcionalismo público.

               2 – No caso de os juízes do Tribunal Constitucional optarem pelo regime de previdência da sua atividade profissional, cabe ao Tribunal Constitucional a satisfação dos encargos que corresponderiam à entidade patronal.»

O Estatuto do Pessoal Dirigente, aprovado pela Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro[56], dispõe no artigo 28.º, sobre “Salvaguarda de direitos”:

              «1 - Os titulares de cargos dirigentes gozam, independentemente do seu vínculo de origem, dos direitos gerais reconhecidos aos trabalhadores em funções públicas do serviço ou órgão em que prestam funções.

               2 – O pessoal dirigente conserva o direito ao lugar de origem e ao regime de segurança social por que está abrangido, não podendo ser prejudicado na sua carreira profissional por causa do exercício daquelas funções, relevando para todos os efeitos no lugar de origem o tempo de serviço prestado naquele cargo».

Por fim, refira-se, também, o diploma aplicável aos gabinetes dos membros do Governo – Decreto-Lei n.º 11/2012, de 20 de janeiro – que dispõe, no artigo 10.º:

«Artigo 10.º

Garantias dos membros dos gabinetes

               1 - Os membros dos gabinetes não podem ser prejudicados, por causa do exercício transitório das suas funções, na estabilidade do seu emprego, na sua carreira profissional e no regime de segurança social de que beneficiem, bem como nos seus direitos, regalias e subsídios e outros benefícios sociais de que gozem na sua posição profissional de origem, ficando assegurado o regresso à situação jurídico-funcional que exerciam à data da sua designação.

               2 - O tempo de serviço prestado no gabinete considera-se, para todos os efeitos, nomeadamente antiguidade e promoção, como prestado na categoria e na carreira que ocupava no momento da designação, mantendo o designado todos os direitos, subsídios, regalias sociais, remuneratórias e quaisquer outras correspondentes a essa categoria e carreira, não podendo, pelo não exercício de atividade, ser prejudicado nas alterações de posicionamento remuneratório a que, entretanto, tenha adquirido direito, nem nos procedimentos concursais a que se submeta.

               (…).»

O percurso feito permite constatar que o princípio consagrado no n.º 2 do artigo 50.º da Constituição foi desenvolvido, nos diplomas estatutários ou orgânicos aplicáveis a diversas categorias de titulares de cargos públicos, salvaguardando, em especial, a manutenção dos regimes previdenciais e dos benefícios sociais de que gozavam em razão das funções anteriormente exercidas.

Algumas questões suscitadas com a aplicabilidade destas disposições, designadamente no que respeita à manutenção dos benefícios durante o exercício do cargo, foram objeto de análise, direta ou indiretamente, em alguma (escassa) jurisprudência de tribunais superiores.

7. Pelo acórdão n.º 448/93, de 15 de julho de 1993, o Tribunal Constitucional, a propósito da apreciação da constitucionalidade de normas do estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, aprovado pela Lei n.º 4/85, de 9 de abril, que consagravam o direito ao subsídio de reintegração[57], analisou a natureza desta subvenção em termos que se revelam pertinentes para a presente consulta.

Disse aquele Tribunal:

              «(…) é sabido que as situações de emprego e as garantias de trabalho e benefícios sociais dos titulares de cargos políticos se acham protegidos pela Constituição e pela lei.

              Em conformidade com o disposto no artigo 50.º, n.º 2, do texto constitucional, “ninguém pode ser prejudicado na sua colocação, no seu emprego, na sua carreira profissional ou nos benefícios sociais a que tenha direito, em virtude do exercício de direitos políticos ou do desempenho de cargos públicos”.

              Este preceito constitui uma garantia essencial dos direitos políticos, pondo os cidadãos a coberto de prejuízos ou discriminações profissionais que lhes vedassem ou tornassem arriscado o exercício de direitos políticos (incluindo o desempenho de cargos públicos).  O direito a não ser prejudicado na colocação, emprego, carreira ou benefícios sociais, tem por destinatários não apenas as entidades públicas, mas também, mercê do disposto no artigo 18.º, n.º 1, da Constituição as entidades privadas.

               A proibição de prejuízos que assim é constitucionalmente assegurada implica, designadamente: a) garantia da estabilidade no emprego, com a consequente proibição de discriminação ou favorecimento na colocação ou emprego; b) garantia dos direitos adquiridos e, consequentemente, proibição da lesão dos direitos adquiridos (benefícios sociais, progressão na carreira, antiguidade); c) direito a retomar as funções exercidas, à data da posse para os cargos públicos as quais, portanto, só podem ser providas a título interino enquanto durar o cargo público (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed., p. 273).

               Este princípio constitucional teve tradução, ao nível da lei ordinária, nos estatutos dos diversos cargos políticos e em outros diplomas respeitantes aos serviços e organismos da Administração Pública, como se pode extrair, entre outros, dos seguintes: Lei n.º 26/84, de 31 de Julho (Regime de remuneração do Presidente de República), Lei n.º 3/85, de 13 de março (Estatuto dos Deputados), Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional), Lei n.º 29/87, de 30 de junho (Estatuto dos Eleitos Locais), Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de setembro (Estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, local do Estado e regional, bem como, dos institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos).

               Pode assim dizer-se que o específico regime do subsídio de reintegração, só com alguma dificuldade consentirá que a este seja atribuída a caracterização que lhe foi dada no acórdão recorrido, isto é, natureza idêntica à de uma compensação indemnizatória devida por prejuízos sofridos na retoma de uma atividade profissional anteriormente interrompida.

              E isto porque, a ser assim, a disciplina e o regime do subsídio de reintegração haveriam de ser fixados em conformidade com as regras próprias do direito indemnizatório: a indemnização apenas seria devida nos casos de eletivo prejuízo, e o seu montante, estimado segundo critérios objetivos de avaliação dos diferentes graus de lesão ou de penosidade no retorno a profissão originária, haveria de corresponder em todos os casos, à real dimensão dos prejuízos sofridos.

              Contrariamente, porém, o subsídio de reintegração contempla de modo uniforme diferentes situações individuais com alheamento da verificação ou inverificação de prejuízo e da existência ou não de fundamento real para indemnização. A sua atribuição deriva da aplicação de um mero critério aritmético, alheio àqueles diferentes fatores de ponderação (um semestre de exercício do cargo político equivale a um mês de subsídio, de montante igual ao vencimento mensal do cargo à data da cessação da função).

              Do exposto, resulta não se ter por adequada a caracterização que no acórdão recorrido se fez do subsídio de reintegração: instrumento compensatório dos prejuízos sofridos pelos titulares dos cargos políticos na decorrência do exercício das respetivas funções.»

Parece, pois, resultar desta passagem, o entendimento de que, através da norma do artigo 50.º, n.º 2, da Constituição, reproduzida depois em diplomas estatutários aplicáveis a várias categorias de titulares de cargos públicos, ficou prevenida a verificação de prejuízos efetivos pelo desempenho do cargo, nas diversas vertentes abrangidas, entre as quais a dos direitos adquiridos, designadamente em matéria de antiguidade, promoções e benefícios sociais. Daí que a posterior atribuição de um subsídio de reintegração não prosseguisse já uma finalidade indemnizatória.

Ora, para que, por força daquele princípio constitucional, não existam prejuízos efetivos, impõe-se: que o tempo em que é exercido o cargo público conte para efeitos de antiguidade; que o titular não seja afastado dos procedimentos de promoção atinentes à sua carreira de origem; e que se mantenham, durante esse período, os benefícios sociais de que usufruía, não bastando, para o efeito, a garantia de que, após o regresso às funções de origem, a perceção de tais benefícios será retomada.

Particularmente impressivo, afigura-se-nos o caso do cidadão que cumpre serviço militar ou serviço cívico obrigatório e, relativamente ao qual, a Constituição concede idêntica proteção, através do n.º 7 do artigo 276.º. A finalidade visada não seria decerto conseguida se se entendesse que essa norma se limitava a garantir que, terminado o cumprimento do serviço militar ou do serviço cívico, esse cidadão voltaria a usufruir dos benefícios sociais a que tinha direito; aliás, não se vê como poderia deixar de assim ser, desde que continuasse a reunir os requisitos de que tais benefícios dependem.

7.1. Refira-se, também, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 22 de janeiro de 1991 (processo n.º 028178), acerca da aplicação da norma do artigo 50.º, n.º 2, da Constituição, à situação do Presidente da Câmara do Corvo, que, antes de assumir esse cargo, e enquanto médico exercendo na mesma ilha, dispunha de casa de habitação fornecida pela Direção Regional de Saúde.

Considerou o STA que a norma constitucional e a norma do Estatuto dos Eleitos Locais não autorizavam que o recorrente «sofra diminuição dos benefícios sociais que auferia originados na sua integração numa determinada carreira e, dentro esta, numa certa categoria, pelo facto de assumir as funções de presidente da CMC». Contudo, considerou que, no caso, a atribuição de casa ao recorrente não integrava o conceito de benefício social relevante para esse efeito, pois que se inseria num esquema global de incentivos à fixação de pessoal de saúde em zonas com dificuldades de recrutamento «sem a preocupação de atribuir benefícios sociais, mas antes de satisfazer o interesse público da cobertura médico-sanitária de zonas carenciadas»

Retemos, pois, da fundamentação deste acórdão, o entendimento de que a garantia concedida pelo n.º 2 do artigo 50.º da Constituição, no que concerne aos benefícios sociais de que o titular de cargo público já beneficiava, por razões relacionadas com a sua atividade profissional anterior, implica que os mesmos sejam mantidos durante o exercício do cargo público.

Saber se determinada vantagem, de que o titular de cargo público dispunha, constitui ou não «benefício social» para efeitos dessa proteção constitucional, é matéria que deve ser casuisticamente ponderada.

8. Recorde-se a preocupação do legislador infraconstitucional em garantir que os titulares de cargos públicos mantivessem, durante o exercício desses cargos, os direitos de natureza previdencial de que gozavam no âmbito das funções anteriormente exercidas; diversos normativos consagram mesmo, expressamente, o direito a manterem o regime de segurança social mais favorável, cabendo às respetivas entidades públicas os encargos daí decorrentes.

Ora, os benefícios ou prestações sociais apresentam conexão com o sistema previdencial, compreendendo-se que gozem de idêntica proteção.

VEIGA E MOURA[58] refere que as prestações sociais[59], são uma «decorrência do direito à segurança social consagrado no artigo 63.º da Constituição», acrescentando:

             

             «Constituem abonos de segurança social que espelham a solidariedade social devida ao acréscimo de encargos suportados pelo agregado familiar do funcionário ou agente com a satisfação de algumas necessidades básicas.

              Porém, as prestações sociais não se destinam apenas a compensar o acréscimo de despesas do agregado familiar com a satisfação de necessidades básicas (…) mas, igualmente, a funcionar como medida de prevenção e proteção de algumas necessidades decorrentes da relação jurídica de emprego com a Administração Pública (…).

              Resultam diretamente da existência de uma relação de emprego com a Administração Pública, sem embargo de não pressuporem uma efetiva prestação de serviço nem constituírem contrapartida da mesma (…).»

O subsídio de refeição partilha desta natureza de abono que visa compensar um acréscimo de encargos derivados da atividade profissional, embora, diferentemente de outros, exija uma efetiva prestação de trabalho e, mesmo, um mínimo de tempo de prestação de trabalho diário. Daí a sua possível qualificação como “prestação social atípica”[60].

Essa especificidade não permite, contudo, excluí-lo da categoria de benefícios sociais a que alude o n.º 2 do artigo 50.º da Constituição. Aliás, a sua integração nesse conceito foi feita, expressamente, pelo legislador infraconstitucional, ao qualificá-lo, no preâmbulo do diploma que, desde 1984, consagra o seu regime, precisamente como «benefício social».

Retomando o caso que nos ocupa, consideramos que o subsídio de refeição que era auferido pela SG do SSI, em razão da sua anterior atividade profissional, como magistrada do Ministério Público, enquanto benefício social de que beneficiava, deve continuar a ser-lhe pago.

VII

1. Coloca-se, por fim, a questão que respeita à eventual incidência de uma dedução (de 5/prct.) na remuneração da SG do SSI, ou seja, se lhe é aplicável a disposição do artigo 11.º da Lei n.º 12-A/2010, de 30 de junho[61], diploma que «aprova um conjunto de medidas adicionais de consolidação orçamental que visam reforçar e acelerar a redução do défice excessivo e o controlo do crescimento da dívida pública no Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC)».

Entre essas medidas, o Capítulo V da referida lei impunha a redução dos vencimentos dos titulares de cargos políticos, gestores públicos e equiparados, nos seguintes termos:

«Artigo 11.º

Redução do vencimento dos titulares de cargos políticos

              1 - O vencimento mensal ilíquido dos titulares de cargos políticos é reduzido a título excecional em 5 /prct..

              2 - Para efeitos do disposto na presente lei, são titulares de cargos políticos:

               a) O Presidente da República;

               b) O Presidente da Assembleia da República;

               c) O Primeiro-Ministro;

               d) Os Deputados à Assembleia da República;

               e) Os membros do Governo;

               f) Os Representantes da República para as regiões autónomas;

               g) Os deputados às Assembleias Legislativas das regiões autónomas;

               h) Os membros dos governos regionais;

               i) O governador e vice-governador civil;

               j) O presidente e vereador a tempo inteiro das câmaras municipais.

               3 - O regime excecional previsto no presente artigo não implica a alteração do vencimento dos titulares de cargos cujos vencimentos se encontram indexados aos de qualquer dos titulares de cargos políticos referidos no número anterior, tomando-se como referência, para efeitos da referida indexação, os valores em vigor antes da data de entrada em vigor da presente lei.»

      «Artigo 12.º

      Redução dos vencimentos dos gestores públicos e equiparados

              1 - A remuneração fixa mensal ilíquida dos gestores públicos executivos e não executivos, incluindo os pertencentes ao sector público local e regional, e dos equiparados a gestores públicos, é reduzida a título excecional em 5 /prct..

              2 - Para efeitos do presente artigo, consideram-se equiparados a gestores públicos os membros dos conselhos diretivos ou de administração dos institutos públicos, incluindo os de regime especial, com exceção daqueles cujo estatuto determine que a remuneração dos seus membros é estabelecida por referência à remuneração estabelecida para o cargo de diretor-geral.»

As normas transcritas, cuja aplicação se iniciou em 1 de junho de 2010, mantêm-se em vigor.

A questão que vem colocada consiste em saber se, sobre a remuneração auferida pela titular do cargo de SG do SSI, incide essa dedução. O argumento invocado, no sentido de que há lugar à dedução (entendimento em que convergem as três entidades que se pronunciaram) assenta na circunstância de este cargo ser equiparado, «para todos os efeitos legais, exceto os relativos à sua nomeação e exoneração» a um titular de cargo político, o secretário de Estado.

2. Numa abordagem meramente literal da Lei n.º 12-A/2010, constata-se que o artigo 11.º não inclui, expressamente, no elenco de titulares de cargos políticos, para os efeitos da mesma lei, cargos equiparados. Diversamente, o artigo 12.º, referente aos gestores públicos, procede à inclusão expressa de cargos equiparados a gestores públicos, para efeitos deste diploma.

Do mesmo modo, enquanto o artigo 11.º tem por epígrafe “Redução do vencimento dos titulares de cargos políticos”, o artigo 12.º tem por epígrafe “Redução dos vencimentos dos gestores públicos e equiparados”. Assim, embora o capítulo em que as duas normas se inserem se intitule “Titulares de cargos políticos, gestores públicos e equiparados”, dir-se-ia que o termo “equiparados” se reporta apenas ao segundo, mas já não ao primeiro grupo.

Por outro lado, o n.º 3 do artigo 11.º, ao referir que «o regime excecional» estabelecido nesse artigo não implica alteração dos vencimentos indexados aos vencimentos de qualquer dos titulares de cargos políticos enunciados no n.º 2 do mesmo artigo, presta-se a diferentes leituras.

No entender das entidades que emitiram pareceres, previamente à consulta, e naquilo que será um argumento a contrario, daí resultaria que os casos não referidos (entre eles, os dos cargos já equiparados) seriam abrangidos por esse regime excecional.

Mas a esse propósito não será demais recordar o alerta de DIAS MARQUES[62], para uma utilização cautelosa deste argumento, «por isso que nem sempre que o legislador exprime uma norma para certo caso, há de por força querer para o caso oposto a regra inversa. Ao contrário, sucede muitas vezes que a afirmação que o legislador profere para uns casos, não é mais do que a afloração de um princípio geral suscetível de ser alargado a todos os casos semelhantes, de acordo com o já citado princípio da coerência analógica».

Pensamos que a solução da questão colocada exigirá o recurso a outros elementos interpretativos, designadamente ao elemento sistemático, através da análise de outros regimes estabelecidos pelo legislador para os titulares de cargos políticos, em ordem a verificar o modo como, em cada um deles, o legislador estabeleceu o respetivo âmbito de aplicação subjetiva.

3. Sobre o estatuto dos titulares de cargos políticos[63], dispõe o artigo 117.º da Constituição:

«Artigo 117.º

Estatuto dos titulares de cargos políticos

              1. Os titulares de cargos políticos respondem política, civil e criminalmente pelas ações e omissões que pratiquem no exercício das suas funções.

               2. A lei dispõe sobre os deveres, responsabilidades e incompatibilidades dos titulares de cargos políticos, as consequências do respetivo incumprimento, bem como sobre os respetivos direitos, regalias e imunidades.

               3. A lei determina os crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos, bem como as sanções aplicáveis e os respetivos efeitos, que podem incluir a destituição do cargo ou a perda do mandato.»

Gomes Canotilho e Vital Moreira[64], em anotação a este artigo, evidenciam que «a densificação do conceito “cargos políticos” tem uma extensão e intenção diferentes da de «cargos públicos» e apresenta algumas dificuldades. Após procederem a uma delimitação negativa, concluem que «a noção que melhor parece corresponder à razão de ser deste preceito constitucional é aquela que considera cargos políticos todos aqueles aos quais estão constitucionalmente confiadas funções políticas (sobretudo as de direção política)».

E os mesmos Autores evidenciam que as leis sobre estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, sobre o controlo de riqueza dos titulares de cargos políticos e sobre as incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, nas redações então em vigor, «têm vindo a densificar, nem sempre de forma concordante, os titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos».

Vejamos.

A Lei n.º 34/87, de 16 de julho[65], que prevê os crimes da responsabilidade de titulares de cargos políticos ou de altos cargos públicos, cometidos no exercício das suas funções e estabelece as respetivas sanções, considera que, «para os efeitos da presente lei» são cargos políticos: Presidente da República; Presidente da Assembleia da República; deputado à Assembleia da República; membro do Governo; deputado ao Parlamento Europeu; Representante da República nas regiões autónomas; membro de órgão de governo próprio de região autónoma; membro de órgão representativo de autarquia local (artigo 3.º, n.º 1).

E o n.º 2 dispõe que «Para efeitos do disposto nos artigos 16.º a 19.º[66] equiparam-se aos titulares de cargos políticos nacionais os titulares de cargos políticos de organizações de direito internacional público, bem como os titulares de cargos políticos de outros Estados, independentemente da nacionalidade e residência, quando a infração tiver sido cometida, no todo ou em parte, em território português».

Por seu turno, o artigo 3.º-A contém o seguinte elenco de altos cargos públicos, «para efeitos da presente lei»: gestores públicos; titulares de órgão de gestão de empresa participada pelo Estado, quando designados por este; membros de órgãos executivos das empresas que integram o sector empresarial local; membros dos órgãos diretivos dos institutos públicos; membros das entidades públicas independentes previstas na Constituição ou na lei; titulares de cargos de direção superior do 1.º grau e equiparados.

A Lei n.º 4/85, de 9 de abril[67], que consagra o estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, dispõe, no artigo 1.º:

«Artigo 1º

Titulares de cargos políticos

              1. A presente lei regula o estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos.

              2. São titulares de cargos políticos, para efeitos da presente lei:

              a) O Presidente da República;

              b) Os membros do Governo;

              c) Os deputados à Assembleia da República

              d) Os Representantes da República nas Regiões Autónomas;

              e) Os membros do Conselho de Estado.

              3. São equiparados a titulares de cargos políticos para os efeitos da presente lei os juízes do Tribunal Constitucional.»

O artigo 13.º respeita às remunerações dos secretários de Estado e tem a seguinte redação:

              «1. Os secretários de Estado percebem mensalmente um vencimento correspondente a 60/prct. do vencimento do Presidente da República.

               2. Os secretários de Estado têm direito a um abono mensal para despesas de representação no valor de 35/prct. do respetivo vencimento.»

Por fim, a Lei n.º 52/2019, de 31 de julho[68], que regula o regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, suas obrigações declarativas e respetivo regime sancionatório, contém, nos artigos 2.º e 3.º, os seguintes elencos de cargos políticos e de altos cargos públicos, respetivamente, em ambos os casos «para os efeitos da presente lei».

«Artigo 2.º

Cargos políticos

1 - São cargos políticos para os efeitos da presente lei:

a) O Presidente da República;

b) O Presidente da Assembleia da República;

c) O Primeiro-Ministro;

d) Os Deputados à Assembleia da República;

e) Os membros do Governo;

f) O Representante da República nas Regiões Autónomas;

g) Os membros dos órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas;

h) Os Deputados ao Parlamento Europeu;

i) Os membros dos órgãos executivos do poder local;

                j) Os membros dos órgãos executivos das áreas metropolitanas e entidades intermunicipais.

               2 - (…)[69]

               3 - Para efeitos das obrigações declarativas previstas na presente lei são equiparados a titulares de cargos políticos:

               a) Membros dos órgãos executivos dos partidos políticos aos níveis nacional e das regiões autónomas;

               b) Candidatos a Presidente da República;

               c) Membros do Conselho de Estado;

              d) Presidente do Conselho Económico e Social.»

«Artigo 3.º

Altos cargos públicos

              1 - Para efeitos da presente lei, são considerados titulares de altos cargos públicos:

               a) Gestores públicos e membros de órgão de administração de sociedade anónima de capitais públicos, que exerçam funções executivas;

               b) Titulares de órgão de gestão de empresa participada pelo Estado, quando designados por este;

               c) Membros de órgãos de gestão das empresas que integram os sectores empresarial regional ou local;

               d) Membros de órgãos diretivos dos institutos públicos;

               e) Membros do conselho de administração de entidade administrativa independente;

               f) Titulares de cargos de direção superior do 1.º grau e do 2.º grau, e equiparados, e dirigentes máximos dos serviços das câmaras municipais e dos serviços municipalizados, quando existam.

              2 - Para efeitos das obrigações declarativas previstas na presente lei são equiparados a titulares de altos cargos públicos:

               a) Os chefes de gabinete dos membros dos governos da República e regionais;

               b) Os representantes ou consultores mandatados pelos governos da República e regionais em processos de concessão ou alienação de ativos públicos.»

O artigo 4.º determina que ficam também sujeitos às obrigações declarativas da mesma lei os juízes do Tribunal Constitucional e do Tribunal de Contas, o Provedor de Justiça, o Procurador-geral da República, os membros dos Conselhos Superiores da Magistratura, do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais e do Ministério Público. E o artigo 5.º determina que os magistrados judiciais e do Ministério Público, «de acordo com os respetivos estatutos», ficam também sujeitos às mesmas obrigações declarativas.

4. O percurso efetuado revela que, para cada um destes regimes, o legislador enumera os respetivos cargos políticos e, nalguns casos, também os altos cargos públicos, abrangidos, sendo que tais elencos nem sempre são coincidentes. E, de um modo geral, o legislador enumera ainda os cargos que, para os mesmos efeitos, são considerados cargos equiparados àqueles, enumeração que também varia de diploma para diploma.

Por outro lado, constata-se que o cargo de Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna não é expressamente mencionado em qualquer destes diplomas.

Ora, se se entender que os cargos equiparados, para os efeitos de cada um desses regimes, são, apenas, aqueles que o legislador expressamente enumerou no respetivo diploma legal, daí resulta que o cargo de SG do SSI, embora equiparado pela lei de segurança interna a um cargo político (secretário de Estado) «para todos os efeitos legais, exceto os relativos à nomeação e à exoneração», está excluído do campo de aplicação de todos aqueles regimes que caracterizam o estatuto do titular do cargo político a que foi equiparado. Desde logo, do próprio regime remuneratório ou do regime de exclusividade e impedimentos.

Algo paradoxalmente, uma equiparação para todos os efeitos legais (exceto os relativos à nomeação e à exoneração), resultaria, afinal, numa equiparação desprovida de importantes efeitos legais.

Não se mostrando razoável essa consequência, e não se vislumbrando razões para uma tal exclusão do SG do SSI, há que ponderar se a norma de equiparação do n.º 3 do artigo 14.º não contém uma ampla virtualidade remissiva, que permite a aplicabilidade de todas as disposições referentes ao estatuto dos secretários de Estado, exceto nos casos em que o legislador expressamente ressalve tal aplicabilidade ou em que tal ressalva resulte da própria ratio do regime em causa.

5. Este Conselho pronunciou-se já, anteriormente, sobre questões suscitadas pela equiparação a cargos políticos.

Assim, no parecer n.º 4/1991, de 21 de fevereiro de 1991[70], referente à situação do Governador de Macau, com «categoria correspondente à de Ministro da República», estabelecida pelo artigo 8.º do Estatuto de Macau[71], questionava-se se tal equiparação permitia que o tempo em que exerceu o cargo relevava para efeitos da contagem de tempo necessária à atribuição da subvenção vitalícia então prevista no artigo 24.º[72] da Lei n.º 4/85 (entretanto revogado), diploma que consagra o regime remuneratório dos titulares de cargos políticos.

Após análise aprofundada da Lei n.º 4/85, que continha, então, vários e nem sempre coincidentes elencos de titulares de cargos políticos para efeitos da aplicação das normas sobre remunerações e das normas sobre subvenções, o parecer do Conselho Consultivo considerou que «o contexto da Lei n.º 4/85 e de outros diplomas respeitantes a aspetos vários do “estatuto” dos cargos políticos revela que o legislador tem optado, pragmaticamente, pelo uso do método enunciativo dos cargos, em vez de uma cláusula ou definição geral do que seja cargo político» e deu conta da diversidade dos elencos enunciados para efeitos do controlo da riqueza dos titulares de cargos políticos, dos crimes de responsabilidade ou das incompatibilidades dos cargos políticos e altos cargos públicos.

Apesar de se ter pronunciado pelo «caráter fechado» do regime da subvenção vitalícia, não aplicável a outros cargos que não os mencionados no n.º 1 do artigo 24.º, o Conselho teve em conta o “sentido da equiparação”, resultante da norma do Estatuto de Macau que atribuía ao Governador a categoria de Ministro da República, qualificando-a como vaga, e concluiu que não o equiparava a qualquer dos cargos políticos enumerados para os efeitos previstos na Lei n.º 4/85[73].

Já no parecer n.º 96/90, de 6 de dezembro de 1990[74], referente ao estatuto do Alto-Comissário contra a Corrupção, cargo a que a Lei n.º 45/86, de 1 de outubro, conferia «estatuto equivalente ao de ministro, com as inerentes honras, regalias, categoria, remuneração e demais direitos», em que se questionava o seu direito à subvenção vitalícia e ao subsídio de reintegração previstos na Lei n.º 4/85, este Conselho concluiu de forma diferente.

Isto porque, embora o cargo de Alto-Comissário contra a Corrupção não constasse também do elenco de titulares de cargos políticos expressamente enunciado para os efeitos da referida lei, entendeu-se que tal inclusão era desnecessária face à clareza da norma remissiva e que tal inclusão sempre seria incorreta, «em boa técnica legislativa», já que não se tratava de um cargo político mas de um alto cargo público, de natureza administrativa.

Foi a seguinte a conclusão deste parecer:

             «A remissão do n.º 3 do artigo 11.º da Lei n.º 45/86, de 1 de outubro, ao conferir ao Alto-Comissário contra a Corrupção estatuto equivalente ao de ministro, deve ser entendida como abrangendo a matéria das subvenções vitalícias e do subsídio de reintegração previstos no Título II da Lei n.º 4/85, de 9 de abril, alterada pela Lei n.º 16/87, de 1 de junho».

Também o Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 7 de novembro de 2006 (processo 0360/06), se pronunciou sobre questão similar e concluiu nos seguintes termos:

              «O artigo 4.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 3-A/98, de 26 de janeiro (…) ao dispor que o Alto-Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas usufruirá do estatuto remuneratório equivalente ao de subsecretário de Estado não lhe dá o direito à subvenção vitalícia prevista no artigo 24.º, n.º 1, da Lei n.º 4/85, de 9 de abril».

Na fundamentação do acórdão, foi dada relevância à distinção entre remuneração (matéria abrangida pela equiparação) e subvenção (matéria não abrangida pela equiparação), previstas aliás em títulos e normas distintas da Lei n.º 4/85.

Por fim, o acórdão do pleno da 1.ª Secção do mesmo Supremo Tribunal, de 17 de junho de 1993 (recurso n.º 25.580), considerou que o citado artigo 24.º da Lei n.º 4/85, que continha o elenco de cargos políticos para efeitos de atribuição da subvenção vitalícia, apenas era aplicável às entidades nele expressamente previstas e não aos cargos equiparados, aduzindo para o efeito vários argumentos que relevavam da ratio e da letra da norma em causa, designadamente a exigência de exercício efetivo de funções políticas[75].

6. Resulta do exposto que as questões suscitadas com a equiparação a cargos políticos não são isentas de dúvidas.

Verifica-se, contudo, que o conteúdo e a extensão concreta da equiparação, estabelecida em cada um dos casos, foi sempre ponderada e, no caso em que a mesma se mostrou mais ampla (equiparação do Alto Comissário contra a Corrupção a Ministro «com as inerentes honras, regalias, categoria, remuneração e demais direitos»), a mesma foi considerada suficiente, por este Conselho, para aquele titular beneficiar do subsídio de reintegração previsto para os titulares de cargos políticos, embora o respetivo cargo não constasse do elenco de cargos políticos previsto na norma que o atribuía.

Retomando o estatuto do SG do SSI, cargo equiparado a Secretário de Estado «para todos os efeitos legais, exceto os relativos à nomeação e à exoneração», releva, desde logo, a grande amplitude de tal equiparação.

Essa equiparação foi evidenciada, quer na Resolução do Conselho de Ministros, que precedeu a apresentação da proposta de lei, quer no decurso dos debates parlamentares, que precederam a aprovação da lei de segurança interna, sempre associada à relevância do cargo e ao amplo leque de competências atribuídas. Por outro lado, estabeleceu-se, assim, um paralelismo com idêntico estatuto de que já gozava o Secretário-Geral do Sistema de Informações da República Portuguesa.

A amplitude da norma remissiva aponta para uma similitude de regimes com o titular do cargo político a que respeita a equiparação, com a particularidade de não se limitar a remeter para os direitos e regalias desse titular, mas antes para todo o leque de direitos e deveres que lhe são inerentes.

Embora este cargo não conste no elenco de titulares de cargos políticos ou equiparados, expressamente enunciados em diversos diplomas que consagram regimes próprios para esses titulares, isso não significa que os mesmos não lhe sejam aplicáveis. De outro modo, a ampla equiparação estabelecida pela lei ficaria vazia de conteúdo.

Deste modo, entende-se que a inclusão de determinado titular de cargo político no elenco a que se aplica determinado regime, permite a sua aplicabilidade aos titulares de cargos que lhe estão já equiparados por lei, desde que a extensão e o sentido dessa equiparação se mostre para tanto suficiente.

Neste entendimento, os cargos especificamente equiparados para efeitos de cada um desses regimes, enunciados nos diplomas legais que os consagram, são outros, que não aqueles que já beneficiavam de equiparação; não resulta, assim, da técnica legislativa adotada, a inaplicabilidade do regime em causa àqueles que já beneficiavam da necessária e suficiente equiparação, apenas por não estarem, de novo, expressamente mencionados em cada um desses diplomas legais.

Só assim não será se a ratio desse regime, em concreto, revelar que apenas visa aqueles que exercem efetivamente funções políticas, expressamente enunciados no respetivo diploma legal, tal como foi entendido no caso da subvenção mensal vitalícia prevista no artigo 24.º da Lei n.º 4/85, entretanto revogado.

Ora, no que concerne à norma do artigo 11.º da Lei n.º 12-A/2010, que determina a redução de 5/prct. na remuneração dos titulares de cargos políticos, entre eles, o secretário de Estado, não se vê razão que obste à sua aplicação ao titular de cargo a ele equiparado «para todos os efeitos legais, exceto os relativos à nomeação e à exoneração».

Por um lado, mostra-se evidente a suficiência da norma de equiparação. Por outro, e apesar de os trabalhos preparatórios pouco adiantarem a esse respeito, a verdade é que se trata de uma medida adotada no âmbito de um conjunto de medidas destinadas à redução do défice orçamental que, de um modo ou de outro, atingiram políticos e não políticos.

Por fim, não se vê também que a circunstância de a SG do SSI ter optado pela remuneração correspondente ao lugar de origem obste à aplicabilidade da norma que determina a redução. De facto, não é o valor ou a fonte da remuneração, mas sim o estatuto da pessoa em causa, enquanto titular de cargo equiparado a cargo político, que constitui o fator determinante dessa aplicabilidade.

VIII

Em face do exposto, extraem-se as seguintes conclusões:

              1.ª – Nos termos dos artigos 14.º, n.º 1 e 2, e 15.º, da Lei de Segurança Interna, aprovada pela Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto, o Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna é um órgão deste Sistema, nomeado e exonerado pelo Primeiro-Ministro e que funciona na sua direta dependência, com competências de coordenação, direção, controlo e comando operacional, equiparado, para todos os efeitos legais, exceto os relativos à sua nomeação e exoneração, a secretário de Estado;

              2.ª – Nos termos do n.º 4 do artigo 14.º da mesma lei, o Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna que seja trabalhador em funções públicas ou esteja vinculado à magistratura judicial, do Ministério Público, às Forças Armadas ou às forças e serviços de segurança pode optar pelo estatuto remuneratório do seu lugar de origem;

              3.ª – Sendo, assim, consagrada a possibilidade de opção pelo estatuto remuneratório de origem e não apenas por um dos seus componentes – a remuneração base –, formulação mais restritiva constante da lei geral aplicável aos trabalhadores em funções públicas e da lei aplicável ao pessoal dirigente;

               4.ª – A opção da Secretária-Geral do Sistema de Segurança Interna, magistrada do Ministério Público, pelo seu estatuto remuneratório de origem, permite, pois, a perceção de outros componentes remuneratórios, para além da remuneração base;

              5.ª – Consequentemente, deve ser-lhe pago o subsídio de compensação que, na vigência do anterior Estatuto do Ministério Público, integrava o estatuto remuneratório do seu lugar de origem, nos termos dos artigos 95.º, n.º 1, e 102.º, e que, na vigência do novo Estatuto do Ministério Público, continua a integrar o mesmo estatuto remuneratório e, dentro deste, a componente remuneração base, nos termos dos artigos 128.º, n.º 2, 129.º e 130.º, em especial, do n.º 3 deste último artigo;

              6.ª. – O subsídio de refeição, previsto no artigo 133.º do novo Estatuto do Ministério Público, caracteriza-se como uma prestação social, de natureza não retributiva; não constituindo componente remuneratório, a sua perceção não resulta da opção pelo estatuto remuneratório de origem feita pela Secretária-Geral do Sistema de Segurança Interna;

              7.ª – Contudo, enquanto benefício social de que a mesma usufruía no seu lugar de origem, deve continuar a ser-lhe atribuído, por força da norma do n.º 2 do artigo 50.º da Constituição, segundo a qual «Ninguém pode ser prejudicado na sua colocação, no seu emprego, na sua carreira profissional ou nos benefícios sociais a que tem direito, em virtude do exercício de direitos políticos ou do desempenho de cargos públicos»;

              8.ª – A proibição de prejuízos e a garantia dos direitos adquiridos, salvaguardadas pela referida norma constitucional, implica, no que aos benefícios sociais concerne, que estes se mantenham durante o tempo em que o cargo é exercido;

               9.ª – A norma do n.º 2 do artigo 14.º da Lei de Segurança Interna, que equipara o Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna a Secretário de Estado, para todos os efeitos legais, exceto os relativos à nomeação e à exoneração, constitui uma norma remissiva de grande amplitude, que permite a aplicabilidade dos vários regimes estabelecidos para os titulares de cargos políticos, mesmo que o Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna não conste expressamente do elenco dos cargos que figura em cada um dos respetivos diplomas legais;

              10.ª - Só assim não será se resultar da letra ou da ratio de determinado regime que o mesmo apenas visa aqueles que exercem efetivamente funções políticas;

             11.ª – Aplica-se, assim, ao Secretário-Geral do Sistema de Segurança Interna, a norma da Lei n.º 12-A/2010, de 30 de junho, que, no âmbito de um conjunto de medidas destinadas à redução do défice orçamental, determina a redução de 5/prct. nas remunerações dos titulares de cargos políticos, gestores públicos e equiparados, apesar de o elenco constante do artigo 11.º da referida lei não mencionar expressamente os cargos equiparados a cargos políticos;

             12ª – Não obsta a tal aplicabilidade a opção feita pela remuneração de origem, pois que, não é a remuneração auferida, mas sim o estatuto adquirido pela equiparação, que a determina.

 

[1] Por ofício n.º 640/2020, de 21 de outubro de 2010.

[2] Alterada pelo Decreto-Lei n.º 126-A/2011, de 29 de dezembro; pela Lei n.º 59/2015, de 24 de junho;

   pelo Decreto-Lei n.º 49/2017, de 24 de maio; e pela Lei n.º 21/2019, de 25 de fevereiro.

   A Lei n.º 53/2008 revogou a anterior lei de segurança interna, aprovada pela Lei n.º 20/87, de 12

  de junho.

[3]  Para além do n.º 1 de cada uma das disposições, que estabelece o enquadramento geral do tipo de competência em causa, os números seguintes concretizam, de forma detalhada, o exercício de cada uma.

[4] Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2007, 4.ª edição revista, volume I,

página 677.

[5] Que republicou e redenominou a anterior Lei Orgânica do Ministério Público, aprovada pela Lei n.º 47/86, de 15 de outubro. A Lei n.º 60/98 foi alterada pelas Leis n.º 42/2005, de 29 de agosto; n.º 67/2007, de 31 de dezembro; n.º 52/2008, de 28 de agosto; n.º 37/2009, de 20 de julho; n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro; n.º 9/2011, de 12 de Abril; n.º 114/2017, de 29 de dezembro. Revogada pela Lei n.º 68/2019, de 27 de agosto, que aprovou o atual EMP.

[6] Sobre o tema das comissões de serviço, no âmbito do anterior e do novo EMP, foram recentemente emitidos por este Conselho os pareceres n.º 2/2020, de 21 de janeiro de 2020, e n.º 34/2019, de 3 de dezembro de 2020, inéditos.

[7] Eram exercidos em comissão de serviço interna as funções ou cargos de Vice-Procurador-Geral da República, Procurador-Geral Distrital, inspetor, auditor jurídico, Procurador-Geral Adjunto nos supremos tribunais e nos tribunais da Relação, vogal do Conselho Consultivo, procurador coordenador no DCIAP e em outros departamentos especializados, coordenadores de comarca e de procuradorias administrativas e fiscais.

[8] Alterada pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março.

[9] Correspondendo, de um modo geral, aos já referidos na nota 7.

[10] João Alfaia, Dicionário da Administração Pública, “Comissão de serviço”, 2.ª edição, Lisboa, 1990, 2.º volume, página 526.

[11] Conforme preâmbulo do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de junho, esta reforma destinou-se a «pôr cobro à vasta teia de subsistemas retributivos e remunerações acessórias praticadas, os quais originavam a complexidade e desconexão do atual [anterior] sistema».

Segundo VEIGA E MOURA – Regime Jurídico, Direitos e Deveres dos Funcionários e Agentes, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2001, 1.º volume, páginas 267/268 - o sistema anterior «assentava num vencimento principal, referenciado por uma letra, e num conjunto de vencimentos acessórios que iam desde as diuturnidades às gratificações especiais pelo desempenho de funções, passando pelos subsídios e abonos destinados a indemnizar despesas ou riscos especiais decorrentes do exercício de funções, etc.».

[12] Revogada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, com exceção das normas transitórias dos artigos 88.º a 115.º.

[13] Alterada pelas Leis n.ºs 82-B/2014, de 31 de dezembro; n.º 84/2015, de 7 de agosto; n.º 18/2016, de 20 de junho; n.º 42/2016, de 28 de dezembro; n.º 25/2017, de 30 de maio; n.º 70/2017, de 14 de agosto; n.º 73/2017, de 16 de agosto; n.º 49/2018, de 14 de agosto; n.º 71/2018, de 31 de dezembro; n.º 6/2019, de 14 de janeiro; n.º 79/2019, de 2 de setembro; n.º 82/2019, de 2 de setembro; e n.º 2/2020, de 31 de março.

[14] Alterada pelas Leis n.ºs 51/2005, de 30 de agosto; n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro; n.º 3-B/2010, de 28 de abril; n.º 64/2011, de 22 de dezembro; n.º 68/2013, de 29 de agosto; e n.º 128/2015, de 3 de setembro.

[15] A lei deixou de conter a tradicional referência à decomposição da remuneração base em remuneração de categoria (cinco sextos) e de exercício (um sexto). A esse propósito, dizem VEIGA E MOURA e CATIA ARRIMAR (Comentários à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, Coimbra Editora, 2014, 1.º volume, página 456), que, por isso, «a remuneração base é a remuneração correspondente à categoria em que o trabalhador está provido ou por cuja referência exerce funções, prevendo-se apenas situações em que essa remuneração pode ser objeto de privação, total ou parcial, em virtude do não exercício de tais funções».

[16] O artigo 98.º respeitava ao subsídio para despesas de representação a que tinham direito o Procurador-Geral da República, o Vice-Procurador-Geral da República e os Procuradores-Gerais Distritais.

[17] Os n.ºs 2 e 3 respeitam à atualização da remuneração base.

[18] O artigo 85.º, sobre “Domicílio necessário”, dispunha que os magistrados do Ministério Público têm domicílio necessário na sede do tribunal ou serviço. Contudo, permitia-se que, perante determinadas circunstâncias e não havendo inconveniente para o serviço, pudessem ser autorizados a residir noutro local, dentro ou fora da respetiva circunscrição.

[19] Pareceres n.º 64/83, de 9 de julho de 1983, homologado mas não publicado; n.º 5/85, de 30 de maio de 1985, publicado no Diário da República, II Série, de 18 de setembro de 1985; n.º 42/98, de 27 de janeiro de 2000, publicado no Diário da República, II Série, de 30 de junho de 2000; n.º 23/2000, de 28 de setembro, publicado no Diário da República, II Série de 28 de fevereiro de 2001; n.º 89/2003, de 26 de setembro de 2003, homologado mas não publicado; n.º 57/2006, de 29 de maio de 2008, inédito; n.º 18/2011, de 27 de outubro de 2011, inédito.

[20] De referir que a lei aplicável ao caso (artigo 37.º da lei orgânica da IGAT) previa que o cargo de inspetor-geral pudesse ser exercido por magistrado em comissão de serviço, podendo este optar «pelo estatuto remuneratório e demais regalias do lugar de origem».

[21] O artigo 57.º da Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro, sobre “Opção de remuneração”, tinha a seguinte redação: «O Secretário-Geral, os membros do seu gabinete e os funcionários do SIS e das estruturas comuns já vinculados aos quadros e organismos da Administração Pública, da magistratura judicial ou do Ministério Público, das Forças Armadas ou das forças e dos serviços de segurança podem optar pelo estatuto remuneratório de origem, sem prejuízo de auferirem os suplementos atribuídos ao pessoal do SIED e do SIS».

[22] Inédito.

[23] Sobre o tema, cfr. o parecer deste Conselho n.º 22/2001, de 10 de abril de 2001,publicado no Diário da República, 2.ª Série, de 29 de janeiro de 2003 (com retificação publicada no Diário da República, 2.ª Série, de 13 de fevereiro de 2003), em que se evidenciou que o estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos não contempla, de forma deliberada, a possibilidade de opção pelo estatuto remuneratório de origem. Apesar de, inicialmente, tal possibilidade ter sido prevista para os deputados, mesmo essa situação excecional foi afastada, através da revogação expressa da norma que a contemplava.

[24] Comentários à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, Coimbra Editora, 2014, 1.º volume, página 466.

[25]

«Artigo 106.º

Domicílio necessário

      1- Os magistrados do Ministério Público têm domicílio necessário na área da comarca onde se encontra sedeado o tribunal ou instalado o serviço no qual exercem funções, podendo, todavia, residir em qualquer local da comarca, desde que não haja prejuízo para o exercício de funções.
2 - Os magistrados do Ministério Público do quadro complementar consideram-se domiciliados na sede da respetiva procuradoria-geral regional ou, em caso de desdobramento, da respetiva procuradoria da República de comarca ou administrativa e fiscal, podendo, todavia, residir em qualquer local da circunscrição judicial, desde que não haja prejuízo para o exercício de funções.
3 - Quando as circunstâncias o justifiquem e não haja prejuízo para o exercício das suas funções, os magistrados do Ministério Público podem ser autorizados, pelo Conselho Superior do Ministério Público, a residir em local diferente do previsto nos números anteriores.
4 - Os magistrados do Ministério Público devem manter o domicílio atualizado e não podem indicar mais do que uma morada.»

[26]. O EMJ foi aprovado pela Lei n.º 21/85, de 30 de julho, alterada sucessivamente, pelo Decreto-Lei n.º 342/88, de 28 de setembro; pelas Leis n.ºs 2/90, de 20 de janeiro; n.º 10/94, de 5 de maio; nº 44/96, de 3 de setembro; n.º 81/98, de 3 de dezembro; n.º 143/99, de 31 de agosto; n.º 3-B/2000, de 4 de abril; n.º 42/2005, de 29 de agosto; n.º 26/2008, de 27 de junho; n.º 52/2008, de 28 de agosto; n.º 63/2008, de 18 de novembro; n.º 37/2009, de 20 de julho; n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro; n.º 9/2011, de 12 de abril; n.º 114/2017, de 29 de dezembro; n.º 67/2019, de 27 de agosto; e pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março (que alterou o respetivo Anexo I).

[27]. Prevê, contudo, o EMJ, no que respeita a ajudas de custo, para além das que são devidas por deslocações nos tribunais de primeira instância e por outras deslocações no país e no estrangeiro, também ajudas de custo e despesas de deslocação no Supremo Tribunal de Justiça e nos Tribunais da Relação (artigos 30.º e 30.º-A, respetivamente).

[28] O parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, da Assembleia da República, foi aprovado em reunião de 17 de outubro de 2018 (cfr. Diário da Assembleia da República, II Série-A, de 17 de outubro de 2018).

[29] O imposto sobre o rendimento das pessoas singulares incide, nos termos do artigo 1.º do Código do IRS, sobre o valor anual dos rendimentos de determinadas categorias, depois de efetuadas as correspondentes deduções e abatimentos; o n.º 2 dispõe que «os rendimentos, quer em dinheiro quer em espécie, ficam sujeitos a tributação, seja qual for o local onde se obtenham, a moeda e a forma por que sejam auferidos».

Na categoria A, incluem-se os rendimentos do trabalho dependente e, sobre estes rendimentos, dispõe o artigo 2.º, nos seguintes termos:

«Artigo 2.º

Rendimentos da categoria A

               1. Consideram-se rendimentos do trabalho dependente todas as remunerações pagas ou postas à disposição do seu titular provenientes de:

               (…)

              d) As ajudas de custo e as importâncias auferidas pela utilização de automóvel próprio em serviço da entidade patronal, na parte em que ambas excedam os limites legais ou quando não sejam observados os pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado e as verbas para despesas de deslocação, viagens ou representação de que não tenham sido prestadas contas até ao termo do exercício;

               (…).»

[30] Cfr. relatório da discussão e votação na especialidade desta e de outras propostas de alteração apresentadas, no Diário da Assembleia da República, II Série-A, de 16 de julho de 2019.

[31] Ver, a este propósito, a situação a que respeita o parecer, deste Conselho, n.º 29/2014, de 3 de agosto (publicado no Diário da República, II Série, de 29 de dezembro de 2014), referente à integração do suplemento de função inspetiva, a que tinha direito o pessoal de inspeção, na respetiva remuneração base, operada pelo Decreto-Lei n.º 170/2009, de 3 de agosto.

[32] Cfr. declarações de voto manifestadas, quer no âmbito do processo legislativo que deu origem ao EMP (Diário da Assembleia da República, I Série-A, n.º 108, de 20 de julho de 2019, página 158/159), quer no âmbito do processo legislativo que deu origem ao EMJ (Diário da Assembleia da República, I Série-A, n.º 91, de 1 de junho de 2019, página 64 e seguintes), que referem, como uma das razões da sua divergência na parte referente à “questão remuneratória”, os segmentos introduzidos, em sede de discussão na especialidade, às normas que consagram o subsídio de compensação. O deputado Carlos Peixoto discordou de que, simultaneamente, o subsídio de compensação passasse a integrar o «vencimento base» e continuasse a não ser tributado em IRS.

[33] De acordo com o artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 184/89, sobre “Prestações sociais e subsídio de refeição”, «As prestações sociais são constituídas pelo abono de família e prestações complementares, bem como pelo subsídio de refeição e prestações de natureza social atribuídas no âmbito da ação social complementar».

[34] Alterado pelo Decreto-Lei n.º 70-A/2000, de 5 de maio.

[35] Comentários …, ob. cit., página 448.

[36] Nos termos do artigo 5.º da Lei n.º 29/87, os eleitos locais têm direito a subsídio de refeição «a abonar nos termos e quantitativos fixados para a Administração Pública».

[37] Nos termos do artigo 28.º da Lei n.º 2/2004, os dirigentes beneficiam dos «direitos gerais» reconhecidos aos trabalhadores em funções públicas dos respetivos órgãos ou serviços

[38]  Nos termos do artigo 30.º da Lei n.º 28/82, os juízes do Tribunal Constitucional «têm honras, direitos, categorias, tratamento, vencimentos e regalias iguais aos dos juízes do Supremo Tribunal de Justiça».

      Sobre a conjugação do direito a subsídio de refeição com a perceção de ajudas de custo, segundo o regime estabelecido na Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, cfr. os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 22 de março de 2018, processo 01037/15 (plenário), e de 1 de junho de 2016 (processo n.º 01037/15), disponíveis em www.dgsi.pt.

[39] Contudo, o artigo 16.º do Estatuto dos Deputados consagra um regime especial de ajudas de custo, que permite a sua perceção em cada dia de presença em reunião plenária, de comissões ou em outras reuniões convocadas pelo Presidente da Assembleia da República e em mais dois dias por semana.

[40] Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público, Almedina, Coimbra, 1988, 2.º volume, página 925.

[41] Função Pública (Regime Jurídico, Direitos e Deveres dos Funcionários e Agentes), Coimbra Editora, 2001, página 310.

[42] ”O subsídio de refeição: em particular a alteração da forma de pagamento: perspetiva laboral, fiscal e contributiva”, Prontuário de Direito do Trabalho, Lisboa, n.º 2 (2.º semestre de 2017), página 211 e seguintes.

[43] Entre outros, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de maio de 2010, disponível em www.dgsi.pt.

[44] Entre outros, o parecer n.º 20/2015, de 25 de junho de 2015, e o parecer n.º 14/2016, de 14 de julho de 2016, ambos inéditos.

[45] Cfr, o acórdão n.º 260/2015, de 5 de maio de 2015, disponível em www.dgsi.pt.

[46] Constituição Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2005, tomo I, página 487.

[47] Constituição…, ob. cit, volume I, página 677.

[48] Diário da Assembleia da República, I Série, n.º 103, de 16 de junho de 1982, página 4264.

[49] Ob cit., volume II, páginas 876/877.

[50] O Estatuto dos Deputados, aprovado pela Lei n.º 5/76, de 10 de setembro, dispunha (artigo 6.º):

              «Os Deputados não podem ser prejudicados na sua colocação, nos seus benefícios sociais ou no seu emprego permanente por virtude do desempenho do mandato».

[51] Com sucessivas alterações, a última das quais, introduzida pela Lei n.º 60/2019, de 13 de agosto.

[52] Alterada pelas Leis n.º 130/99, de 21 de agosto; e n.º 12/2000, de 21 de junho.

[53] Alterada pelas Leis n.º 9/87, de 26 de março; n.º 61/98, de 27 de agosto; e n.º 2/2009, de 12 de

janeiro.

[54] Com sucessivas alterações, a última das quais, introduzida pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março.

[55] Com sucessivas alterações, a última das quais pela Lei n.º 4/2019, de 13 de setembro.

[56]Cfr. nota 14.

[57] O acórdão n.º 448/93 analisou um pedido de declaração de inconstitucionalidade do artigo 31.º, n.º 1, conjugado com o artigo 33.º, do estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, na sua versão originária, que consagrava o direito a subsídio de reintegração, quando interpretada no sentido de reconhecer tal direito aos titulares que cessassem funções em data posterior a 1 de janeiro de 1985. O Tribunal Constitucional declarou a inconstitucionalidade, por violação do artigo 13.º da Constituição.

[58] Função Pública …, ob. cit., página 277 e seguintes.

[59] De acordo com a legislação então em vigor (em especial, o artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89), as prestações sociais eram constituídas por: abono de família e prestações complementares do abono de família; subsídio de refeição; prestações de ação social complementar; e subsídio por morte.

Atualmente, o regime do abono de família e da proteção dos encargos familiares consta do Decreto-Lei n.º 176/2003, de 2 de agosto (com sucessivas alterações, a última das quais pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro), segundo um novo modelo, em que deixaram de integrar «o elenco material da proteção conferida aos trabalhadores nos regimes de proteção social de natureza laborista» (conforme preâmbulo).

O regime da ação social complementar dos trabalhadores da administração direta e indireta do Estado está consagrado no Decreto-Lei n.º 122/2007, de 27 de abril (alterado pelo Decreto-lei n.º 146/2008, de 29 de julho).

[60] Cfr. nota 35.

[61] Alterada pelas Leis n.ºs 64-B/2011, de 30 de dezembro; n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro; e n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro.

[62] Introdução ao Estudo do Direito, Centro de Estudos de Direito Civil da Faculdade de Direito da

    Universidade de Lisboa, Lisboa, 1972, página 290.

[63] Sobre o tema, cfr. o parecer deste Conselho, n.º 25/2019, de 19 de setembro de 2019, publicado

    no Diário da República, II Série, de 20 de setembro de 2019.

[64] Constituição…, ob. cit., volume II, página 117 e seguintes.

[65] Alterada pelas Leis nº 108/2001, de 28 de novembro; n.º 30/2008, de 10 de julho; n.º 41/2010, de

    3 de setembro; n.º 4/2011, de 16 de fevereiro; n.º 4/2013, de 14 de janeiro; e n.º 30/2015, de 22

    de abril.

[66] Estes artigos respeitam aos crimes de recebimento indevido de vantagem, de corrupção passiva e ativa e violação de regras urbanísticas.

[67] Alterada pelas Leis n.º 16/87, de 1 de junho; n.º 102/88, de 25 de agosto; n.º 26/95, de 18 de agosto; n.º 3/2001, de 23 de fevereiro; n.º 52-A/2005, de 10 de outubro; e n.º 44/2019, de 21 de junho.

[68] Alterada pela Lei n.º 69/2020, de 9 de novembro.

[69] O n.º 2 prevê uma exceção ao disposto na alínea i) do número 1 relativamente aos vogais das

     Juntas de Freguesia com menos de 10 000 eleitores, em regime de não permanência.

[70] Publicado no Diário da República, II Série, de 7 de maio de 1991.

[71] Aprovado pela Lei n.º 13/90, de 10 de maio.

[72] Dispunha o artigo 24.º da Lei n.º 4/85, na redação vigente na data da emissão do parecer n.º 4/1991:

«Artigo 24.º

Subvenção mensal vitalícia

               1. Os membros do Governo, os deputados à Assembleia da República e os juízes do Tribunal Constitucional que não sejam magistrados de carreira têm direito a uma subvenção mensal vitalícia desde que tenham exercido os cargos ou desempenhadas as respetivas funções após 25 de abril durante 8 ou mais anos, consecutivos ou interpolados.

               2. Os ex-Presidentes da Assembleia da República e os ex-Primeiros Ministros na vigência da Constituição da República têm direito a uma subvenção mensal vitalícia nos termos do artigo (…).»

[73] O acórdão do Tribunal Constitucional n.º 545/99, de 13 de outubro de 1999 (disponível em www.dgsi.pt.), analisou situação similar respeitante ao Secretário Adjunto do Governo de Macau (equiparado a Secretário de Estado) e decidiu «Julgar inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, a norma constante do n.º 1 do artigo 24.º da lei n.º 24/85, de 9 de abril, enquanto interpretada no sentido de que não releva, para o efeito da contagem do tempo de serviço, nela previsto, o exercício de funções de Secretário Adjunto do Governo de Macau».

[74] Inédito.

[75] Analisou-se, nesse acórdão, o direito do Provedor de Justiça à subvenção vitalícia, que, nos termos da lei então aplicável, tinha «honras, direitos, categoria, remunerações e regalias idênticas às de Ministro».

  
(Eduardo André Folque da Costa Ferreira)
 
VOTO DE VENCIDO
 
Embora concorde, na generalidade, com a fundamentação e conclusões do parecer, não acompanho o segmento final da conclusão 6.ª, relativo ao posicionamento do subsídio de refeição, e divirjo das conclusões 11.ª e 12.ª, concernentes à redução remuneratória de 5%, prevista no artigo 11.º, n.º 2, alínea e), da Lei n.º 12-A/2010, de 30 de junho.
I. Quanto às conclusões 11.ª e 12.ª, considero afastarem-se do sentido que observo na opção facultada a quem, sendo trabalhador em funções públicas, juiz ou magistrado do Ministério Público, militar das Forças Armadas ou agente das forças e serviços de segurança e seja investido no cargo de Secretário-Geral do SSI, pretenda conservar o estatuto remuneratório de origem (cf. artigo 14.º, n.º 4, da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto).
A opção do titular é, no meu entender, global e unitária, na linha do entendimento que perfilhámos, em questão não substancialmente diversa, no Parecer n.º 5/2016, votado em 7 de abril de 2016[1].  
Por outras palavras, a opção não recai sobre a remuneração-base nem sobre cada um dos concretos suplementos remuneratórios, mas incide na disciplina remuneratória, em toda a sua extensão, e que toma a designação de estatuto remuneratório: o conjunto das normas que se aplicam ao abono de prestações pecuniárias sinalagmáticas, justificado pelo desempenho de funções abrangidas por um estatuto de direito público e os direitos, deveres, ónus e garantias que decorrem para os beneficiários respetivos.
O estatuto remuneratório do Secretário-Geral do SSI é, em princípio, o dos secretários de Estado, pois, de acordo com o artigo 14.º, n.º 2, da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto, este cargo é «para todos os efeitos» equiparado a secretário de Estado, excetuando o modo de nomeação e exoneração.
A verdade, porém, é que a equiparação a secretário de Estado conhece, ainda, outras exceções de largo alcance:

              — O estatuto remuneratório, pois o titular que possua vínculo de emprego público, que seja magistrado, militar das Forças Armadas ou integre as forças e serviços de segurança pode optar pelo estatuto remuneratório de origem, declinando o estatuto remuneratório de secretário de Estado (cf. artigo 14.º, n.º 4, da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto);
              — O dever de obediência hierárquica ou de sujeição ao poder de direção e aos demais poderes típicos da relação hierárquica, exercidos pelo Primeiro-Ministro ou pelo Ministro da Administração Interna (cf. artigo 14.º, n.º 1, da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto), contrariamente à posição interorgânica dos ministros e secretários de Estado no seio do Governo (cf. artigo 183.º, n.º 3, e artigo 191.º, n.º 3, da Constituição).

Materialmente, o Secretário-Geral do SSI, apesar da aludida equiparação, desempenha um alto cargo público e que não pode dizer-se corresponda a um cargo político.
Bem se considera no parecer que deve considerar-se sujeito ao regime de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos (Lei n.º 52/2019, de 31 de julho), apesar de não figurar em nenhum dos elencos. Entendo que, para esse efeito, releva — não a equiparação, que já vimos ser residual — mas o facto de ser titular de um cargo de direção superior de 1.º grau (secretário-geral).
Contudo, a atual Secretária-Geral do SSI permanece desvinculada às incompatibilidades e inibições que provêm do EMP (cf. artigos 107.º e 108.º), pois, de acordo com o artigo 94.º, n.º 1, os «magistrados do Ministério Público estão sujeitos às disposições do presente Estatuto, qualquer que seja a situação em que se encontrem».
II. A opção admitida pelo artigo 14.º, n.º 4, da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto, incide no estatuto remuneratório pessoal como alternativa ao estatuto remuneratório funcional (de secretário de Estado).
Opção que não é sequer facultada a quem seja indigitado para vir a fazer parte do Governo, como entendeu este Conselho, perante a Lei n.º 4/85, de 9 de abril, no Parecer n.º 22/2001, de 10 de abril de 2001[2].
Ora, se a opção é estatutária — entre estatutos remuneratórios — só pode cumprir-se de forma unitária e, não, compósita, nem parcelar.
A lei não estabelece nem reconhece outras alternativas. Como tal, o magistrado do Ministério Público nomeado para este cargo não pode ver-se privado de nenhum elemento do seu estatuto remuneratório, como também não pode combinar os elementos do estatuto remuneratório de origem com outros tantos do estatuto remuneratório dos membros do Governo e compor, destarte, um estatuto remuneratório que, ao fim, não é o de magistrado do Ministério Público nem o de secretário de Estado.
Ao declinar o estatuto remuneratório que lhe assistiria pelo exercício de funções equiparadas às de secretário de Estado, o referido magistrado adota o estatuto remuneratório que consta, atualmente, dos artigos 128.º e seguintes da Lei n.º 68/2019, de 27 de agosto, sob a designação sistema retributivo «composto por uma remuneração base e pelos suplementos expressamente previstos no presente Estatuto e na lei» (cf. artigo 128.º, n.º 2).
Os estatutos remuneratórios, contudo, não se circunscrevem ao elenco da remuneração-base, dos suplementos remuneratórios (mesmo apenas dos que são abonados de modo universal) e de outras prestações retributivas (v.g. prémios de desempenho), pois também compreendem garantias, como é o caso da irreversibilidade remuneratória consignada no artigo 128.º, n.º 3, do EMP, e, segundo a qual, a remuneração e os suplementos remuneratórios dos magistrados do Ministério Público não podem ser reduzidos, «salvo em situações excecionais e transitórias» e, sem dúvida alguma, por lei que se aplique a todos os magistrados do Ministério Público. 
Por conseguinte, a opção pelo estatuto remuneratório dos magistrados do Ministério Público exime o titular à redução remuneratória de 5%, prevista no artigo 11.º, n.º 2, alínea e), da Lei n.º 12-A/2010, de 30 de junho, a qual afeta um estatuto remuneratório por que não optou.
III. Este é um ponto que leva a descortinar, muito nitidamente, a diferença entre componentes remuneratórios e estatuto remuneratório. Diferença que me leva a considerar o direito ao subsídio de refeição, desde a entrada em vigor do novo EMP, como fazendo parte do estatuto remuneratório dos magistrados do Ministério Público, sem prejuízo da bondade das conclusões 7.ª e 8.ª. Quero com isto dizer que não ponho de lado a aplicação direta da garantia constitucional invocada no parecer (cf. artigo 50.º, n.º 2, da Constituição).
A objeção, da minha parte, dirige-se à conclusão 6.ª e, estritamente, à afirmação de que o subsídio de refeição, por representar um benefício social, fica liminarmente excluído do estatuto remuneratório dos magistrados do Ministério Público.
Se o subsídio de compensação (cf. artigo 130.º, n.º 3 do EMP) é considerado parte da retribuição, exceto, para efeitos tributários (em que é tratado como ajuda de custo) o subsídio de refeição, embora «isento de quaisquer taxas, contribuições e impostos» (cf. artigo 5.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 57-B/84, de 20 de fevereiro[3]) não faz parte da remuneração-base.
Contudo, faz hoje parte do estatuto remuneratório dos magistrados do Ministério Público (cf. artigo 133.º), como faz parte do estatuto remuneratório dos magistrados judiciais (cf. artigo 26.º do EMJ) e do estatuto remuneratório dos membros dos gabinetes de apoio aos membros do Governo (cf. artigo 13.º, n.º 7, do Decreto-Lei n.º 11/2012, de 20 de fevereiro[4]).
IV. É, pelo contrário, a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), a não incluir o subsídio de refeição entre os componentes remuneratórios, ao dispor do seguinte modo:

«Artigo 146.º

(Componentes da remuneração)
                   A remuneração dos trabalhadores com vínculo de emprego público é composta por:
                   a) Remuneração base;
                   b) Suplementos remuneratórios;
                   c) Prémios de desempenho».
O subsídio de refeição, com efeito, não pode contar-se entre os suplementos remuneratórios[5], tendo o seu regime permanecido à margem da LGTFP.
Conserva-se no Decreto-Lei n.º 57-B/84, de 20 de fevereiro, apesar de ali se dispor que é pago «a todos os funcionários e agentes da Administração Pública central, regional e local, bem como dos organismos de coordenação económica e demais institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos» (cf. artigo 1.º, n.º 1).
E, com efeito, no preâmbulo, dá-se conta da intenção de lhe atribuir «a natureza de benefício social a conceder como comparticipação nas despesas de uma refeição tomada fora da residência habitual, nos dias de prestação efetiva de trabalho». Isto, em reação ao diploma que instituíra o subsídio de refeição com carácter universal no regime da função pública, abolindo as senhas de almoço que eram distribuídas.
O subsídio de refeição, na vigência do Decreto-Lei n.º 305/77, de 29 de julho, de acordo com a interpretação fixada pelo Despacho Normativo n.º 392/80, de 31 de dezembro, chegava, em alguns casos, a ser calculado com base no vencimento mensal do trabalhador (cf. 4.2.). O valor permitiria sempre custear as refeições fornecidas pelos próprios serviços públicos ou seus concessionários, «tendo em vista o padrão português no que se refere a valores nutricionais do homem adulto tipo médio», na expressão usada pelo preâmbulo da Portaria n.º 426/78, de 29 de julho.
O citado decreto-lei fixava «um quantitativo de 700$00 mensais, correspondente a um subsídio de refeição de 35$00, relativos a 11 meses e 22 dias por mês, pago durante os doze meses do ano», inculcando que se trataria, afinal, de um suplemento remuneratório. Além do mais, no artigo 2.º determinava-se que «as interrupções de serviço» que dessem «origem à suspensão do pagamento de vencimento de categoria inerente à função» acarretavam «a perda do direito à perceção do abono[6]». Como tal, em relação aos dias sem prestação de trabalho efetivo, mas em que apenas se descontava o chamado vencimento de exercício, seria devido subsídio de refeição.
A publicação do Decreto-Lei n.º 57-B/84, de 20 de fevereiro, visou, confessadamente, romper com uma tal conceção. De onde, a insistência em reforçar o seu carácter de prestação ou benefício social:

              «O regime deste subsídio, que determinou o seu pagamento constante pelos 12 meses do ano, levou a que tal benefício fosse configurado como um verdadeiro componente de vencimento».

Nesta linha, o artigo 2.º, n.º 2, veio pôr termo ao abono do subsídio de refeição por cada dia de férias gozado, nas situações de licença por doença, nojo, casamento ou assistência a familiares e no exercício do direito de greve, entre outras situações em que o beneficiário não tivesse prestado efetivamente trabalho «de, pelo menos, 6 horas de serviço ou do período correspondente às plataformas fixas estabelecidas em horários flexíveis».
V. Embora sob a condição de prestação social e de ajuda de custo, o subsídio de refeição, todavia, não é alheio ao estatuto remuneratório.
É a própria LGTFP a reconhecê-lo, no artigo 152.º, n.º 1, ao estatuir que «a remuneração do período de férias corresponde à remuneração que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efetivo, com exceção do subsídio de refeição[7]».
A bem dizer, o abono do subsídio de refeição, excetuado à remuneração nos dias de férias, entre outros, faz parte do estatuto remuneratório dos seus beneficiários, tanto mais que o seu percebimento fica dependente da prestação de serviço efetivo, contrariamente à generalidade dos apoios e prestações sociais.
É que, na verdade, as típicas prestações da chamada ação social complementar (cf. Decreto-Lei n.º 122/2007, de 27 de abril) mostram-se relativamente independentes da prestação de trabalho (beneficiando, até, os agregados familiares e alguns aposentados) e pode ser sujeita à chamada condição de recursos, aferida, em especial, pela respetiva situação socioeconómica (cf. artigo 2.º, n.º 4).
VI. Ainda, porém, que seja sobrestimada a autonomia do regime com relação à LGTFP, o certo é que o estatuto remuneratório dos magistrados do Ministério Público contempla, atualmente, o direito ao subsídio de refeição, segundo o valor que se encontrar fixado para os trabalhadores em funções públicas (cf. artigo 133.º do novo EMP).
O anterior EMP[8] omitia qualquer referência ao subsídio de refeição, que, todavia, era abonado à generalidade dos magistrados do Ministério Público, uma vez que no artigo 108.º se determinava a aplicação subsidiária «quanto a incompatibilidades, deveres e direitos» do «regime vigente para a função pública». Regime que sempre se entendeu incluir o citado Decreto-Lei n.º 57-B/84.
Como tal, podia afirmar-se, então, que o subsídio de refeição não fazia parte do estatuto remuneratório dos magistrados do Ministério Público.
A partir do momento, porém, em que o percebimento do subsídio de refeição deixou de fundar-se numa aplicação subsidiária do regime do trabalho em funções públicas e ingressou no EMP, tal direito tomou lugar próprio no estatuto remuneratório dos magistrados do Ministério Público, sem prejuízo de, à semelhança do subsídio de compensação, permanecer equiparado a ajuda de custo para efeitos tributários (cf. artigo 130.º, n.º 2 e n.º 3). Igual vicissitude, como referi, conheceu o estatuto remuneratório dos juízes e o dos membros dos gabinetes ministeriais.
VII. Opor-se-á que também as ajudas de custo se encontram previstas no estatuto remuneratório dos magistrados do Ministério Público (cf. artigos 137.º e 138.º do EMP) e nem por isso adquirem a natureza de remuneração ou de suplemento remuneratório.
Tal argumento, a meu ver, não é convincente, pois não é isso que está em causa. O subsídio de refeição não retribui o trabalho prestado, antes ajuda nos encargos com refeição tomada fora do domicílio, mas só é pago se ocorrer efetiva prestação de trabalho.
O direito dos magistrados do Ministério Público a perceberem ajudas de custo— por sinal, calculadas «nos termos fixados para os membros do Governo» (cf. artigo 138.º, n.º 1 e n.º 3) — faz parte do seu estatuto remuneratório, ainda que o abono, em concreto — contingente e incidental — não consista num componente remuneratório.
A Secretária-Geral do SSI tem direito a ajudas de custo por conta das deslocações em serviço que efetue em território nacional (fora de Lisboa) ou no estrangeiro, porque o seu estatuto remuneratório o consente.
Entendo, em conformidade, que deve ser-lhe abonado subsídio de refeição por cada dia de trabalho efetivamente prestado, desde que tal subsídio, apesar da sua natureza atípica, passou, em 1 de janeiro de 2020[9], a ter lugar no estatuto remuneratório por que a titular do cargo optara, sendo atribuído universalmente (a todos os magistrados do Ministério Público em serviço efetivo) e segundo um valor fixo, igual e indexado ao valor do subsídio de refeição previsto para os trabalhadores em funções públicas (cf. artigo 133.º do EMP).
Admitir que representa, igualmente, um benefício social não é, em si, incongruente com a aludida natureza afim de ajuda de custo nem com o reconhecimento de que obedece ao estatuto remuneratório. O facto de o subsídio de refeição ser atribuído por igual e de ter em vista compensar encargos com a prestação de serviço deve conjugar-se com o pressuposto da prestação diária efetiva de trabalho, o que leva a reconhecer-lhe uma natureza mista a vários títulos: social, compensatória, remuneratório e, em certa medida, até, de incentivo à assiduidade.
Pôde este corpo consultivo reconhecer, entre as conclusões do Parecer n.º 20/2015, de 25 de junho de 2015, o seguinte:

              «[A] teleologia do subsídio de refeição e das ajudas de custo é a mesma: a compensação por despesas realizadas, de alimentação num caso, e de alimentação, deslocação e alojamento no outro caso (do artigo 8.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 106/98, de 24 de abril, resulta claramente que as percentagens a abonar a título de ajudas de custo incluem o pagamento de refeições, razão pela qual essas percentagens não serão pagas integralmente quando a refeição seja fornecida em espécie)».

Aliás, se o subsídio de refeição visa contribuir para os encargos com uma refeição tomada fora do domicílio, nem sempre o regime das ajudas de custo permite compensar quem, pelas funções que exerce, haja de suportar encargos acrescidos com refeições. É o caso dos motoristas dos membros do Governo e da Presidência da República quando deslocados em serviço que não dê origem ao pagamento de ajudas de custo e sempre que, em virtude da função desempenhada, a refeição não possa ser tomada no local habitual (Decreto-Lei n.º 437/85, de 11 de novembro[10]).
VIII. De resto, o subsídio de refeição possui vocação geral. A delimitação do âmbito por referência a «todos os funcionários e agentes da Administração» vem de um tempo em que os conceitos de agente administrativo e de agente político eram bem mais extensos do que, posteriormente, viria a ser-lhes dado, em especial pelo Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de dezembro.
A preocupação do legislador, ao delimitar o âmbito de beneficiários do regime do subsídio de refeição, no Decreto-Lei n.º 57-B/84, de 20 de fevereiro, terá sido, como se enfatizou no Parecer n.º 14/2016, de 14 de julho de 2016, a de excluir «o pessoal em regime de contrato de prestação de serviços, designadamente tarefa e avença» (cf. artigo 1.º, n.º 2), o pessoal civil das Forças Armadas (cf. artigo 1.º, n.º 3) e delinear adaptações aos funcionários e agentes sujeitos a horários especiais (cf. artigos 3.º e 4.º).
A equiparação da Secretária-Geral do SSI a secretário de Estado não lhe retira a condição de agente administrativo, decorrente do alto cargo público para o qual foi nomeada.
IX. Em breve recapitulação diremos que, ao ter optado pelo estatuto remuneratório da sua carreira e categoria, a magistrada do Ministério Público investida no cargo de Secretária-Geral do SSI:

              — Deve auferir a remuneração-base correspondente ao índice em que se posiciona, em 14 prestações mensais/ano, das quais, duas correspondem aos subsídios de férias e de Natal;
              — Deve ser-lhe abonado subsídio de compensação, em 14 prestações mensais/ano (isentas de IRS, mas não da quotização mensal para a Caixa Geral de Aposentações, I.P., ou para a Segurança Social);
              —  Beneficia da garantia de irreversibilidade da remuneração-base e suplementos, salvo reduções que excecional e transitoriamente atinjam os demais magistrados do Ministério Público, no seu estatuto remuneratório;
              — Não pode perceber nenhum dos suplementos que, eventualmente, se encontrasse a auferir por motivo de situações funcionais específicas em que se encontrasse no Ministério Público ou no desempenho de funções legalmente equiparadas (v.g. suplemento remuneratório por serviço urgente, suplemento de fixação nas regiões autónomas, despesas de representação);
              — Deve conservar os demais abonos igual e universalmente atribuídos (a todos os magistrados do Ministério Público), incidentais ou permanentes, como é o caso das ajudas de custo e do subsídio de refeição.

Tudo isto, sem prejuízo de lhe assistirem os benefícios e regalias funcionais dos secretários de Estado que decorrem, estes sim, da equiparação, revelando-se alheios ao estatuto remuneratório:

              — Apoio direto e pessoal através de gabinete composto por chefe de gabinete, três adjuntos e dois secretários pessoais (cf. artigo 3.º, alínea a) e artigo 4.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 11/2012, de 20 de janeiro);
 
              — Direito à utilização de viatura oficial (cf. artigo 4.º, n.º 1, alínea d), do Decreto-Lei n.º 50/78, de 28 de março).

Estes benefícios constituem suporte do exercício das funções, na lógica da equiparação a certos membros do Governo.
São estas as razões, todas elas radicadas numa conceção compreensiva do estatuto remuneratório, que me levaram a não acompanhar algumas conclusões do parecer.
 
 
[1] Reconhecendo o direito dos militares que sejam membros do gabinete do Ministro da Defesa Nacional a conservarem o suplemento de condição militar, ali se concluiu que, «nos termos do disposto no n.º 11 do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 11/2012, os membros dos gabinetes ministeriais que hajam exercido o direito de opção previsto nos números 8.º, 9.º e 10.º do mesmo artigo, não auferem as despesas de representação ou o suplemento remuneratório a que se referem, respetivamente, os seus números 1 e 2».

[2] Diário da República, 2.ª Série, de 29 de janeiro de 2003.

[3] Alterado pelo artigo 42.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 70-A/2000, de 5 de maio.

[4] «Os membros dos gabinetes têm direito a subsídio de férias, de Natal e a subsídio de refeição, bem como a ajudas de custo e de transporte, nos termos da lei».

[5] Cf. Decreto-Lei n.º 25/2015, de 16 de fevereiro.

[6] Sublinhado nosso.

[7] Sublinhado nosso.

[8] Lei n.º 60/98, de 27 de agosto, com as sucessivas alterações até à revogação global.

[9] Quando da entrada em vigor da Lei n.º 68/2019, de 27 de agosto (cf. artigo 287.º).

[10] Alterado pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março

(João Conde Correia dos Santos)

Voto de vencido
 

João Conde Correia dos Santos: Voto parcialmente vencido pelas razões que, a seguir, sinteticamente, se expõem:

Discordo da 11.ª e da 12.ª conclusões na medida em que, nos termos do artigo 14.º, n.º 4, da Lei de Segurança Interna (aprovada pela lei n.º 53/2008, de 29 de agosto), o Secretário-Geral do Sistema de Segurança) pode optar pelo estatuto remuneratório do lugar de origem.

Esta possibilidade significa que ou se aplica o estatuto remuneratório de origem ou o estatuto remuneratório previsto para o cargo de Secretário- ‑Geral do Sistema de Segurança, não podendo o intérprete construir, à revelia da lei, um terceiro sistema, hibrido, com normas extraídas de ambos os regimes. Tudo isto, é claro, sem prejuízo de poder receber quaisquer quantias que tenham caráter compensatório (v.g. ajudas de custo).

Anotações
Legislação: 
L 53/2008 DE 29/08/2008 ART1 ART2 ART3 ART8 ART9 ART14 N4 ART16 ART17 ART18 ART19; L 12-A/2010 DE 30/06/2010 ART11 N2 E) ART12 ART67 ART70 ART114 ART146 ART73; L 68/2019 DE 27/08/2019 ART95 N1 ART128 ART129 ART 130 ART133 ART179; L 2/2020 DE 31/03/2020; CRP ART50 ART117 ART276 N6 N7; DL 184/89 DE 2/06/1989; DL 353-A/89 DE 16/10/1989 ART7 ART9 ART11; L 35/2014 DE 20/06/2014 ART9; L 82-B/2014 DE 31/12/2014; L 84/2015 DE 7/08/2015; L 18/2016 DE 20/06/2016; L 42/2016 DE 28/12/2016; L 25/2017 DE 30/05/2017; L 70/2017 DE 14/08/2017; L 73/2017 DE 16/08/2017; L 49/2018 DE 14/08/2018; L 71/2018 DE 31/12/2018; L 6/2019 DE 14/01/2019; L 79/2019 DE 2/09/2019; L 82/2019 DE 2/09/2019; L 2/2020 DE 31/03/2020; L 2/2004 DE 15/01/2004; L 51/2005 DE 30/08/2005; L 64-A/2008 DE 31/12/2008; L 3-B/2010 DE 28/04/2010; L 64/2011 DE 22/12/2011; L 68/2013 DE 29/08/2013; L 128/2015 DE 3/09/2015; L 67/2019 DE 27/08/2019 ART22 ART23; DL 305/77 DE 29/07/1977; DL 184/89 DE 02/06/1989; DL 57-B/84 DE 20/02/1984; DL 352-A/89 DE 16/10/1989; L 45/85 DE 09/04/1985; L 7/93 DE 1/03/1993 ART18; L 13/91 DE 05/06/1991 ART25 ART26 ART66 ART67; L 39/80 DE 5/08/1980; L 29/87 DE 30/06/1987 ART22; L 28/82 DE 15/11/1982 ART35; L 2/2004 DE 15/01/2004 ART28; DL 11/2012 DE 20/01/2012 ART10; L 34/87 DE 16/07/1987 ART3 N1; L 108/2001 DE 28/11/2001; L 30/2008 DE 10/07/2008; L 41/2010 DE 03/09/2010; L 4/2011 DE 16/02/2011; L 4/2013 DE 14/01/2013; L 30/2015 DE 22/04/2015; L 4/85 DE 9/04/1985 ART1 ART13; L 52/2019 DE 31/07/2019 ART2 ART3 ART4; L 69/2020 DE 9/11/2020
Jurisprudência: 
AC. TC 448/93 DE 15/07/1993
AC STA 028178 DE 22/01/1991
AC STA 0360/06 DE 7/11/2006
Divulgação
Link Directiva: 
nao
Número: 
87
Data: 
05-05-2021
Página: 
81
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