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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
9/1996, de 02.12.1998
Data do Parecer: 
02-12-1998
Tipo de Parecer: 
Parecer Complementar
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Administração Interna
Relator: 
LUCAS COELHO
Descritores e Conclusões
Descritores: 
GOVERNADOR CIVIL
COMPETÊNCIA REGULAMENTAR
REGULAMENTO
REGULAMENTO POLICIAL
LICENÇA POLICIAL
LICENÇA DE PORTA ABERTA
LEI HABILITANTE
REVOGAÇÃO
CADUCIDADE
VIGÊNCIA
SUCESSÃO DE LEI HABILITANTE
Conclusões: 
1. Em virtude da alteração introduzida no artigo 4º, nº 3, do Decreto-Lei nº 252/92, de 19 de Dezembro, pelo artigo 2º do Decreto--Lei nº 316/95, de 28 de Novembro, com início de vigência em 1 de Outubro de 1995, os governadores civis perderam as competências regulamentares em matéria policial que lhes assistiam em virtude da alínea c) do citado artigo 4º, nº 3, na sua redacção originária, transferindo-se estas para o Ministro da Administração Interna;

2. Os regulamentos policiais emanados pelos governadores civis no exercício dessas competências regulamentares não cessaram a sua vigência pelo simples facto da aludida transferência de competência, operada em 1 de Outubro de 1995, apenas ficando revogados se e na medida em que o novo titular a exerça no mesmo domínio normativo, ou este domínio seja disciplinado mediante actos de adequado nível e valor formal;

3. Sem prejuízo desta ressalva, as licenças policiais denominadas «de porta aberta» previstas nesses regulamentos (cfr., v.g., os artigos 10º e segs. do “Regulamento Policial do Distrito de Beja”) e, bem assim, as taxas associadas à sua emissão continuaram, consequentemente, a ser exigíveis após 1 de Outubro de 1995;

4. Todavia, a partir de 1 de Julho de 1997, com a entrada em vigor dos Decretos-Leis nºs 167/97 e 168/97, de 4 de Julho do mesmo ano, foram abolidas as licenças de porta aberta, assim como as taxas inerentes, suprimindo-se do mundo jurídico as competências tendentes à sua emissão;

5. Mercê dos Decretos-Leis nºs 167/97 e 168/97 os regulamentos policiais aludidos nas conclusões 2. e 3. cessaram, por conseguinte, a sua vigência, em 1 de Julho de 1997, no tocante às denominadas licenças de porta aberta e respectivas taxas.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Ministro da Administração Interna,
Excelência:




I

1. Por despacho de 5 de Fevereiro de 1996, o antecessor de Vossa Excelência solicitou o parecer do Conselho Consultivo acerca de aspectos relacionados com as competências regulamentares dos governadores civis em matéria policial.

Emitido o parecer nº 9/96 em 19 de Agosto, foi este homologado por despacho de 17 de Outubro e publicado no “Diário da República”, II Série, nº 277, de 29 de Novembro de 1996 (págs. 16731 e segs).

Vossa Excelência solicita um novo parecer urgente tendo por objectivo o esclarecimento de questões e dúvidas que em alguns governos civis suscitou o primeiro parecer, sintetizadas na seguinte interrogação:

“Podem os governos civis continuar a emitir licenças policiais de funcionamento relativamente aos estabelecimentos hoteleiros e similares, e cobrar pelas mesmas as taxas previstas no respectivo Regulamento Policial do distrito?”

2. O cerne das dúvidas aludidas reside no facto de o parecer nº 9/96 ter considerado como “licenças de porta aberta” os “alvarás de abertura”, “cuja emissão dá lugar ao pagamento (por uma única vez) das taxas presentemente previstas na Portaria nº 247/96, de 08/07”.

Com efeito, o parecer interpretou as “licenças de porta aberta”, a que se referia a primitiva consulta, como sendo as “autorizações/alvarás de abertura” previstas e reguladas nos artigos 36º e segs. do Decreto-Lei nº 328/86, de 30 de Setembro (cfr., v.g., os seus pontos II, 3.2.4., e III) – a conexão normativa das citadas licenças que o Conselho detectou no universo em que se moveu.

Observa-se, porém, no pedido de esclarecimento endereçado ao Conselho que as “licenças de porta aberta” “sempre foram entendidas como licenças policiais de funcionamento, dando lugar ao pagamento de taxas anuais ou semestrais, previstas nos Regulamentos Policiais dos Distritos”.

Em precisão do pedido solicitou-se ao Gabinete de Vossa Excelência:

- a identificação das fontes normativas, legais ou regulamentares, a que se referia a primeira consulta quando aludia a “licenças de porta aberta” dos governos civis;

- a remessa, ou indicação de publicação, de um dos regulamentos policiais distritais considerado, a propósito, paradigmático.

Foi recebida fotocópia dos regulamentos policiais dos distritos de Beja e Santarém, publicados em Suplemento do “Diário da República”, II Série, nº 127, de 1 de Junho de 1993, págs. 5736-(3) e segs., e nº 304, de 31 de Dezembro de 1993, págs. 13904-(7) e segs., respectivamente.

Qualquer deles prevê e regula nos artigos 10º e segs., ao lado das licenças de abertura, as denominadas licenças de funcionamento dito de “porta aberta”, e, em tabela anexa, as taxas devidas pela sua concessão, tudo em termos que se diriam praticamente decalcados do mesmo modelo.

3. Resulta assim clarificado que as “licenças de porta aberta” a que se referia a primeira consulta são as previstas nos artigos 10º e segs. do “Regulamento Policial do Distrito de Beja”, por exemplo – ao qual, por facilidade de exposição e leitura, subsequentemente nos reportaremos -, e não aquelas a que se referem os artigos 36º e segs. do Decreto-Lei nº 328/86.

Cumpre nas condições expostas emitir parecer.


II

O Decreto-Lei nº 252/92, de 19 de Novembro, definindo o estatuto e a competência dos governadores civis, assim como o regime dos órgãos e serviços deles dependentes, dispunha no seu artigo 4º, nº 3:

“Artigo 4º
Competências do governador civil

1- (…)
2- (…)
3- Compete ao governador civil, no exercício de funções de polícia:
a) Tomar as providências necessárias para manter a ordem e a segurança públicas, requisitando, quando necessária, a intervenção das forças de segurança, aos comandantes da PSP e da GNR, instaladas no distrito;
b) Conceder, nos termos da lei, autorizações ou licenças para o exercício de actividades, tendo sempre em conta a segurança dos cidadãos, a prevenção de riscos ou de perigos vários que àqueles sejam inerentes;
c) Elaborar regulamentos obrigatórios em todo o distrito sobre matérias da sua competência policial que não sejam objecto de lei ou regulamento geral, a publicar no Diário da República, após aprovação do Governo, que pode ser efectuada por despacho do Ministro da Administração Interna.
4- (…)
5- Além de outros poderes que lhe sejam atribuídos por lei, regulamento ou delegação do Ministro da Administração Interna, compete ao Governador civil:
a) (…)
(…)
f) Aplicar as coimas e sanções acessórias a que haja lugar por violações dos regulamentos a que se refere a alínea c) do nº 3.”

O normativo transcrito sofreu, porém, alterações introduzidas pelo artigo 2º do Decreto-Lei nº 316/95, ficando como segue, com destaque para as alíneas c) e d) do nº 3:

“Artigo 4º
(…)

1- (…)
2- (…)
3- (…)
a) Tomar as providências necessárias para manter ou repor a ordem, a segurança e a tranquilidade públicas, requisitando, quando necessária, a intervenção das forças de segurança, aos comandantes da PSP e da GNR, instaladas no distrito;
b) Conceder as autorizações ou licenças previstas na lei para o exercício de actividades, tendo sempre em conta a segurança dos cidadãos, a prevenção de riscos ou de perigos vários que àquelas sejam inerentes;
c) Assegurar a observância das lei e regulamentos e garantir a execução dos actos administrativos e das decisões judiciais;
d) Propor ao Ministro da Administração Interna a elaboração dos regulamentos necessários à execução das leis que estabelecem o modo de exercício das suas competências.
4- (…)
5- (…)
a) (…)
(…)
f) Aplicar as medidas de polícia e as sanções contra--ordenacionais previstas na lei.
6- (…)”

Mercê destas alterações de redacção, a alínea c) do nº 3 deixou de fazer menção à competência regulamentar aludida na redacção originária.

E acrescentou-se uma nova alínea d) configurando a mesma competência em moldes formalmente diferentes.

Antes, competia ao governador civil “elaborar regulamentos” sujeitos a “aprovação do Governo”, nomeadamente mediante “despacho do Ministro da Administração Interna” (alínea c)); agora compete-lhe “propor ao Ministro da Administração Interna a elaboração dos regulamentos” (alínea d)).

Por outro lado, a competência regulamentar prevista na alínea c) era “sobre matérias da sua competência policial que não sejam objecto de lei ou regulamento geral”; enquanto a competência ora definida na actual alínea d) é para a elaboração dos regulamentos “necessários à execução das leis que estabelecem o modo de exercício das suas competências”, quaisquer que estas sejam.

Prima facie os governadores civis foram despojados de competências regulamentares que lhes assistiam pelo seu estatuto.

Neste sentido era de resto intencional o preâmbulo do Decreto-Lei nº 316/95, ao ponderar que “os governadores civis ficam com o exercício das suas competências sujeito a um diploma com força de lei ([1]), como acontece com todos os órgãos administrativos, retirando-se-lhes competências regulamentares em matérias não suficientemente densificadas por lei, obstando com o ensejo à subsistência de regulamentos independentes”.

O parecer nº 9/96 veio a concluir, em suma, pela aludida exautoração ([2]).

A Auditoria Jurídica pronunciara-se no mesmo sentido, preconizando inclusivamente a caducidade dos regulamentos emitidos ao abrigo das pretéritas competências regulamentares.

O Conselho Consultivo não acompanhou, todavia, este ponto de vista, com razões que adiante se reexaminarão.

Na tese da Auditoria os governadores civis tinham perdido a competência regulamentar em matéria policial que lhes assistia na versão originária do seu estatuto.

Consequentemente, os regulamentos emanados no exercício dessa competência perderam “força vinculativa”.

A sua “desaplicação” revelava-se, nomeadamente, no facto de o Decreto-Lei nº 316/95 ter aprovado em Anexo “um conjunto de matérias respigadas dos citados Regulamentos, até aí disciplinadas por eles” ([3]).

E também na circunstância, salientada pela Auditoria, de o “edifício normativo ter ficado completo” mediante a publicação dos Decretos-Leis nºs 315/95, de 28 de Novembro, e 327/95, de 5 de Dezembro.

Anote-se que o parecer nº 9/96 entreviu na alusão a este segundo diploma, em reforço da ideia da caducidade, a eliminação, designadamente, de “licenças de porta aberta” detalhadas normativamente em regulamentos dos governadores civis.

Mas “licenças de porta aberta”, explicite-se, na acepção adoptada pelo Conselho, que vimos introdutoriamente não coincidir com o conceito subjacente à primeira consulta.

Uma correcta clarificação da problemática em questão aconselha se passem novamente em revista os diplomas citados.

E não se estranhe, dada a natureza complementar da consulta, o recurso, por vezes textual, aos blocos discursivos do parecer original.



III

1. O Decreto-Lei nº 315/95, de 28 de Novembro, veio regular a instalação e o funcionamento dos recintos de espectáculos e divertimentos públicos e definir, bem assim, o regime jurídico dos espectáculos de natureza artística, entrando em vigor, na generalidade das suas normas, a 1 de Janeiro de 1996 (artigo 52º).

O Decreto-Lei nº 327/95, de 5 de Dezembro, aprovou, por seu turno, o regime jurídico da instalação e funcionamento dos empreendimentos turísticos constante dos seus Anexos I – regime jurídico dir-se-ia propriamente dito – e II a VIII – regulamentos dos mais característicos empreendimentos previstos -, iniciando vigência também em 1 de Janeiro de 1996 (artigo 18º).

No entanto, a Assembleia da República, mediante a Resolução nº 10/96, de 17 de Fevereiro de 1996, recusou, “nos termos dos artigos 172º, nºs 1 e 4, e 169º, nº 5, da Constituição” ([4]), a ratificação do Decreto-Lei nº 327/95, “com repristinação das normas revogadas por este” ([5]), incidente cuja repercussão na temática que nos ocupa dentro em pouco se aperceberá.


2. Ambos os diplomas foram aprovados no mesmo Conselho de Ministros de 23 de Junho de 1995 e declaradamente editados ao abrigo das alíneas a) e b) do nº 1 do artigo 201º da Constituição ([6]) e da autorização legislativa outorgada pelo artigo 13º da Lei nº 39-B/94, de 27 de Dezembro – Orçamento do Estado para 1995 -, preceito este cujo teor interessa por isso transcrever na parte útil:

“Artigo 13º
Novas competências dos municípios

1. Fica o Governo autorizado a legislar no sentido de transferir para os municípios as seguintes competências:

I – Na área da cultura:

a) (…)
b) Licenciamento e fiscalização de recintos de espectáculos e de divertimentos públicos que tenham por finalidade principal a actividade desportiva, a diversão sem realização de espectáculo artístico, as actividades de bares e restaurantes, mesmo com realização de espectáculo artístico, e a actividade circense ambulante, bem como o licenciamento de qualquer destes recintos ou outros espaços para espectáculos artísticos ocasionais, podendo neste caso ser solicitado parecer não vinculativo ao serviço competente da administração central.

II – Na área da administração interna:

a) (…)
b) Concessão de licenças para abertura de estabelecimentos de venda ao público e exercício das suas actividades, actualmente cometida aos governadores civis, salvaguardada a possibilidade de estas entidades decidirem o encerramento por razões de ordem pública.

III – (…)
IV – (…)
V – (…)
VI – (…)
VII – (…)
VIII – Na área do turismo: licenciamento da instalação e funcionamento dos empreendimentos turísticos, precedendo parecer vinculativo da Direcção-Geral do Turismo, nos municípios com plano director municipal em vigor.
IX – (…)
2- A legislação a elaborar ao abrigo da presente autorização legislativa procederá à concretização específica das matérias abrangidas pelo número anterior, fixando os respectivos procedimentos administrativos.
3- (…)
4- (…)”

3. Vejamos em primeiro lugar o Decreto-Lei nº 315/95, que teve como objectivo, recorde-se, regular, por um lado, “a instalação e o funcionamento dos recintos de espectáculos e divertimentos públicos”, e, por outro lado, estabelecer “o regime jurídico dos espectáculos de natureza artística” (artigo 1º).


3.1. Quanto ao primeiro aspecto, constata-se a inexistência de atribuições especificamente confiadas aos governadores civis. Basta que se atenda aos seguintes aspectos fundamentais.

O diploma aflora na Secção I do Capítulo II (artigos 2º e 3º) as regras gerais aplicáveis à instalação e funcionamento de recintos de quaisquer espectáculos e divertimentos públicos e dedica a Secção II (artigos 4º a 19º) às especialidades concernentes à instalação e funcionamento de recintos destinados a espectáculos de natureza artística.

Ora, a instalação dos recintos em geral “obedece ao regime jurídico do licenciamento municipal de obras particulares” (artigo 3º, nº 1), e o seu funcionamento “depende apenas – ressalvadas excepções previstas – da emissão da licença de utilização e do respectivo alvará” (artigo 3º, nº 3) pela câmara municipal (cfr. o artigo 9º, nº 1).

Quanto às especialidades relativas à instalação dos recintos destinados a espectáculos de natureza artística, isto é, às actividades, designadamente, de canto, dança, música, teatro, literatura, cinema, tauromaquia, circo (artigo 4º, nº 2) – avulta que a “aprovação, pela câmara municipal, do projecto de arquitectura” carece do “parecer favorável da Direcção-Geral dos Espetáculos (DGESP)” configurado no artigo 5º (artigo 4º, nº 1).

O funcionamento do recinto, por seu turno, está sujeito a uma licença de recinto emitida pelo Director-Geral dos Espectáculos mediante, além do mais, a exibição do alvará de licença de utilização emitido pela câmara (artigos 6º a 10º).

Tratando-se, porém, dos denominados “recintos itinerantes ou improvisados” (Secção III do Capítulo II, artigos 20º e 21º), a emissão da licença de recinto compete ao presidente da câmara.

Por último, aluda-se à denominada licença acidental de recinto, regulada no Capítulo III (artigos 22 e 23º), a que fica sujeita “a realização acidental de espectáculos de natureza artística em qualquer recinto cujo funcionamento não esteja sujeito a licença de recinto”.

Esta licença é também da competência da câmara municipal, “podendo ser consultada a DGESP, caso se entenda necessário” (artigo 22º, nº 2).

A sumária revisão do regime de instalação e funcionamento dos recintos de espectáculos e divertimentos públicos permite dar como fundamentada a conclusão inicialmente aduzida.

A emissão das necessárias licenças de utilização e de recinto requer apenas a intervenção das câmaras municipais e da Direcção-–Geral dos Espectáculos, sendo os governos civis completamente alheios aos procedimentos respectivos.


3.2. Resta o segundo aspecto da disciplina consubstanciada no Decreto-Lei nº 315/95: o regime jurídico dos espectáculos de natureza artística, concentrado grosso modo no Capítulo V (artigos 26º a 34º) ([7]).

Também aqui, no entanto, se oferece à consideração do intérprete um complexo normativo totalmente omisso quanto a quaisquer competências dos governadores civis.

Recorte-se apenas nuclearmente do aludido regime que a realização do espectáculo está condicionada à concessão de uma licença de representação.

Os espectáculos de natureza artística só podem ser anunciados ou realizados após a emissão dessa licença pela DGESP, a qual «tem por finalidade garantir a tutela dos direitos de autor e conexos devidos pela representação ou execução» (artigo 26º, nºs. 1 e 2).

O procedimento de emissão da licença vem simplificadamente referido no artigo 27º, ocupando-se os artigos 28º a 34º de pormenores irrelevantes no domínio do presente parecer - publicidade, regime dos bilhetes de ingresso, restituição do preço, reserva de lugares, disciplina dos espectadores.


3.3. Regulando nos termos sumariados a instalação e funcionamento dos recintos e definindo o regime jurídico dos espectáculos de natureza artística, o Decreto–Lei nº 315/95 consagra ainda os Capítulos VI a XI a outros aspectos normativamente implicados, acerca dos quais se justificará ainda um instante de atenção.

É o caso da «segurança e fiscalização» regulada no Capítulo VI (artigos 35º a 38º).

A fiscalização do cumprimento das prescrições legais incumbe, uma vez mais, à DGESP e às câmaras municipais, bem como «às autoridades policiais e administrativas, no âmbito das respectivas competências» (artigo 35º, nº 1º).

Estas últimas deverão, designadamente, remeter à Direcção--Geral ou à câmara, conforme os casos, em 24 horas, os autos de notícia das infracções que verificarem (nº 2), devendo, por outro lado, as entidades sujeitas a fiscalização prestar a estes organismos toda a colaboração que lhes for solicitada com vista ao cumprimento da função fiscalizadora (nº 3).

A própria verificação da necessidade de presença de piquete de bombeiros é da competência da DGESP (artigo 37º).

As funções da DGESP são compreensivelmente exercidas a nível local de forma desconcentrada, mediante delegados municipais daquela Direcção-Geral com estatuto funcional desenhado no Capítulo IX (artigos 41º e 42º).

Assim, nos municípios sede de distrito, é delegado municipal o secretário do governo civil ou outro funcionário designado pelo governador (artigo 41º, nº 1, alínea a)); nos restantes municípios, o funcionário da câmara designado pelo presidente (alínea b)).

As funções do delegado são inerências dos cargos desempenhados no governo civil ou na câmara municipal, e conferem direito a gratificação fixada por despacho conjunto dos ministros da cultura e das finanças (artigo 41º, nº 2).

O cargo é exercido em comissão de serviço anual, que não pode ser renovada no caso de parecer desfavorável do Director-Geral dos Espectáculos comunicado ao governador civil ou ao presidente da câmara com dois meses de antecedência (nºs. 3, 4 e 5).

Compete, enfim, aos delegados municipais da DGESP, inter alia, «receber requerimentos de registo de promotores de espectáculos de natureza artística e conceder licenças de representação, na área do município, mediante delegação do Director-Geral dos Espectáculos» (artigo 42º, alínea b)); «fiscalizar, na área do respectivo município, o cumprimento das disposições relativas a espectáculos de natureza artística e levantar autos de notícia das infracções cometidas» (alínea c)).

O Capítulo X (artigos 43º a 46º) tipifica o regime das contra--ordenações.

Registe-se apenas que a instrução dos processos compete, uma vez mais, à DGESP ou às câmaras municipais, respectivamente (artigo 46º, nº 1), incumbindo ao Director-Geral dos Espectáculos ou ao presidente da câmara a aplicação de coimas e sanções acessórias, cujo produto reverte para o Fundo de Fomento Cultural, no primeiro caso, e para a câmara municipal, no segundo (nº 2).

Os momentos de regime postos em relevo permitem confirmar os juízos concernentes às implicações do governo civil anteriormente formulados.

Em matéria de segurança e fiscalização, que se auguraria da vocacional competência de autoridades com funções de polícia administrativa, tal como os governadores civis, as disposições legais conferem-lhes um papel tão-somente extrínseco e instrumental, que perde, aliás, toda a expressão no plano do procedimento contra--ordenacional.

Uma discreta excepção em sede de “disposições finais e transitórias” – Capítulo XI, artigos 47º a 51º - não chega para modificar esta visão das coisas.

Na verdade, o Decreto-Lei nº 37534, de 30 de Agosto de 1949, viera permitir “montar agências ou postos de venda de bilhetes de entrada nos vários recintos de espectáculos ou divertimentos públicos” (artigo 1º), precedendo “licença concedida pelo governador civil”, ao qual ademais reservava “a regulamentação comum que se torne necessária para defesa dos interesses do público” (artigo 3º).

Sucede, justamente, que o artigo 48º do Decreto-Lei nº 315/95, dando nova redacção aos citados normativos, manteve as aludidas competências regulamentar e de licenciamento do governador civil ([8]).


4. O outro diploma inventariado pela Auditoria Jurídica, o Decreto-Lei nº 327/95, de 28 de Novembro, aprovou, como se disse, o regime jurídico da instalação e funcionamento dos empreendimentos turísticos.

Eram, aliás, estes empreendimentos, nas espécies previstas no citado Decreto-Lei dos “estabelecimentos hoteleiros” e “estabelecimentos de restauração” – categoria esta correspondente, grosso modo, aos “estabelecimentos similares dos hoteleiros” oriundos do precedente Decreto-Lei nº 328/86, de 30 de Setembro ([9]), por aquele revogado (artigo 16º, nº 1, alínea g)), a que ulteriormente se aludirá –, que estavam nuclearmente em causa na primitiva consulta e por isso mesmo constituem também o tema central do presente parecer.

O Decreto-Lei nº 327/95 assume, pois, aqui uma incidência material muito diferente do Decreto-Lei nº 315/95, diploma verdadeiramente lateral ao cerne da consulta.

Sabemos, todavia, que a Assembleia da República lhe recusou ratificação, deixando o mesmo de vigorar, com repristinação, por conseguinte, dos diplomas por ele revogados.

Os fins do parecer não dispensam em todo o caso um apanhado geral do seu regime, a título de elucidação, centrado nas competências subjectivas de regulamentação e licenciamento ([10]).

4.1. No relatório preambular alinham-se os tópicos que presidiram às opções político-legislativas.

Pretendeu-se reformular em profundidade o “regime da instalação e funcionamento dos empreendimentos turísticos” plasmado na denominada “lei hoteleira” – o Decreto-Lei nº 328/86, de 30 de Setembro, há momentos aludido -, tendo em vista aproximá-lo do “previsto para o licenciamento de obras particulares”, quanto aos empreendimentos “a instalar em área abrangida por plano director municipal”.

Comete-se, pois, “às câmaras municipais com plano director municipal aprovado a competência para centralizar o procedimento administrativo e burocrático conducente ao licenciamento da instalação dos empreendimentos turísticos”.

É de tal modo “eliminada a aprovação, em processos autónomos, da localização e do projecto pela Direcção-Geral do Turismo”, que passa a pronunciar-se “através da emissão de parecer no âmbito do licenciamento das obras de construção do empreendimento pela câmara municipal”.

“Assim articuladas as competências centrais e municipais – prossegue ainda o exórdio – tornou-se dispensável a intervenção do governo civil, eliminando-se uma das etapas, até aqui obrigatórias, no processo de licenciamento e início de actividade dos mesmos empreendimentos, com excepção das salas de dança e dos estabelecimentos de bebidas de 2ª e 3ª categorias, empreendimentos cujo funcionamento mais facilmente suscita problemas de segurança e de ordem públicas” – e que por tal motivo continuam sujeitos à intervenção dos governadores, em forma consultiva particularmente qualificada, como vamos ver.

Na programática esboçada se revoga o “Decreto-Lei nº 328/86, de 30 de Setembro, e respectiva legislação complementar”, procedendo-se “à regulação em novos moldes da actividade da instalação e funcionamento dos empreendimentos turísticos”.


4.2. Em precisão da panorâmica esboçada no preâmbulo, saliente-se em primeiro lugar que o Decreto-Lei nº 327/95 aprovara, mediante o seu artigo 1º, nº 1, o “Regime Jurídico de Instalação e Funcionamento dos Empreendimentos Turísticos” que constitui o Anexo I.

Para além deste, são igualmente aprovados regulamentos específicos de quase todas as espécies de empreendimentos previstas, constantes de outros sete Anexos ao diploma (artigo 1º, nº 2).

Os restantes artigos 2º a 18º, contêm, na sua maior parte, disposições transitórias, normas definidoras e de interconexão com interesse muito secundário na resolução dos nossos problemas, além de preceitos relativos à normação revogada, entrada em vigor e aplicação às Regiões Autónomas.

Estão, em segundo lugar, especialmente em causa os “estabelecimentos hoteleiros” e os “estabelecimentos de restauração”, como há pouco se frisou, pelo que lhes vão privilegiadamente endereçadas as breves considerações que a propósito da disciplina acolhida cabe seguidamente aduzir.

No Capítulo I do Anexo I, relativo aos “empreendimentos em geral”, sobressai a Secção II (artigos 2º a 17º), dedicada à “instalação”, domínio em que imperam competências quase exclusivas da Direcção-Geral do Turismo e das câmaras municipais.

A regra geral é a de que a instalação dos empreendimentos “obedece ao regime jurídico de licenciamento municipal de obras particulares” com as especialidades estabelecidas no diploma (artigo 2º, nº 1).

Se o interessado usar da faculdade de requerer à câmara “informação prévia sobre a possibilidade de instalar um empreendimento turístico”, é ouvida a Direcção-Geral do Turismo sempre que a mesma deva pronunciar-se sobre o licenciamento da construção, e o parecer é inclusivamente vinculativo para um eventual pedido de licenciamento em certas condições (artigo 5º, nºs 1 e 4).

Também no tocante ao “licenciamento da construção”, a aprovação pela câmara municipal do projecto de arquitectura carece, em princípio, de parecer da referida Direcção-Geral (artigos 6º, nº 1, e 7º), salvo quanto a determinados empreendimentos (nº 2 do artigo 6º).

Apenas a emissão da “licença de utilização” – da competência da câmara municipal (cfr. os artigos 8º, nº 3, e 12º, nº 1) – fica subordinada a prévio parecer favorável do governador civil do distrito, mas tão-somente no caso das “salas de dança e dos estabelecimentos de bebidas de 2ª e 3ª categorias”, versando o parecer, por outro lado, “exclusivamente sobre os aspectos de segurança e de ordem públicas” implicados (artigo 8º, nºs 2 e 4).

Finalmente, o “início da actividade dos empreendimentos depende exclusivamente de licença de funcionamento a emitir pela Direcção-Geral do Turismo” (artigos 9º, nº 1, e 12º), salvo em se tratando do início de actividade dos empreendimentos referidos no nº 2 do artigo 6º - entre os quais se contam “as salas de dança e os estabelecimentos de bebidas de 2ª e 3ª categorias” -, que “depende apenas da emissão da licença de utilização e do respectivo alvará” (artigo 9º, nº 2).

Em suma. O início da actividade dos empreendimentos depende exclusivamente de “licença de funcionamento” emitida pela Direcção-Geral do Turismo, exceptuadas, entre outros, as salas de dança e os estabelecimentos de bebidas de 2ª e 3ª categoria, que iniciam a sua actividade mediante a emissão de licença de utilização pela câmara precedendo parecer do governador civil favorável no capítulo da segurança e ordem pública.

O que tudo concorda com a advertência, a propósito, do relatório preambular há momentos extractada (supra, 4.1.), dispensando-se realmente a intervenção obrigatória do governo civil, salvo no tocante às salas de dança e estabelecimentos de bebidas de 2ª e 3ª categorias.


5. Tratava-se, neste aspecto, de significativas alterações introduzidas pelo Decreto-lei nº 327/95 relativamente ao regime anteriormente constante do Decreto-Lei nº 328/86, de 30 de Setembro, como a simples leitura deste imediatamente revela.

Assim, nos termos do artigo 36º, nº 1, alínea b), nenhum dos estabelecimentos abrangidos por este diploma legal ([11]) “poderá iniciar a sua exploração sem prévia autorização, precedida de vistoria, dos governos civis” – além das autorizações de outras entidades, exigíveis consoante os casos ([12]).

Por sua vez, o artigo 37º dispõe que a “autorização de abertura dos estabelecimentos (…) constará de alvará a emitir pelo governo civil do distrito onde se situar, nos termos a definir em regulamento” (nº 1), o qual “substitui todas as licenças e alvarás que eram exigidos para efeitos da exploração destes estabelecimentos até à entrada em vigor do presente diploma” (nº 2) – mas “não substitui a licença municipal de utilização dos edifícios onde se encontra instalado o estabelecimento” (nº 3).

Para o efeito, “compete aos governos civis a organização dos processos de autorização de abertura dos estabelecimentos, ainda que haja lugar à intervenção de outras entidades ou serviços, nos termos, prazos e condições a estabelecer em regulamento (artigo 38º, nº 1).

Tramitação essa regulada nos diferentes números dos artigos 38º, 39º, 40º e 41º quanto a diversos aspectos relacionados com a emissão do “alvará de abertura” – prazos de pronúncia das entidades a consultar, taxas devidas ao governo civil e a outras entidades ([13]), consequências da não emissão do alvará dentro do prazo, excepções à necessidade de alvará de abertura, etc.

6. Dos dados normativos pesquisados o parecer nº 9/96 extraiu duas ilações interlocutórias.

Em primeiro lugar, concluiu que a autorização/alvará de abertura dos estabelecimentos a que vem de se aludir, emitida obrigatoriamente pelos governos civis nos termos dos artigos 36º e segs. do Decreto-Lei nº 328/86, fora eliminada pelo Decreto-lei nº 327/95, o que é incontestável, restando ao governador civil a intervenção consultiva nos aspectos de segurança e ordem pública envolvidos na actividade das salas de dança e dos estabelecimentos de bebidas de 2ª e 3ª categorias a que oportunamente se aludiu (cfr. também a medida de polícia prevista no artigo 48º, nº 1, do Anexo ao Decreto-Lei nº 316/95).

É certo, como se referiu introdutoriamente, que o Conselho interpretou essa autorização/alvará de abertura como sendo a “licença de porta aberta” aludida na consulta inicial, conceito para o qual o complexo normativo e doutrinário investigado não oferecia aparentemente outra mais pertinente conexão.

Sabemos, porém, agora que se trata das licenças de funcionamento, ditas de “porta aberta”, como tais previstas nos artigos 10º e segs. do prototípico Regulamento Policial do Distrito de Beja.

Haverá, pois, que extrair as adequadas consequências desta mudança de perspectiva.

A segunda ilação estava de algum modo em ligação com a primeira.

Os artigos 36º e segs. do Decreto-Lei nº 328/86 remetem para regulamento a definição de aspectos relacionados com a concessão das pretensas “licenças de porta aberta”.

Admitiu-se, por conseguinte, que, estando em causa fundamentalmente o exercício de funções policiais, pudesse tratar-se de regulamentos emanados ao abrigo da competência atribuída pela alínea c) do nº 3 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 252/92.

Uma vez, porém, que já não se cura de autorizações/alvarás de abertura, deixa de interessar à inteligência do parecer a questão de saber se os regulamentos que lhes respeitam estão ou não relacionados também com a referida competência.


7. Resta, antes de se regressar à tese da Auditoria Jurídica, ilustrar sumariamente as denominadas licenças de porta aberta, segundo as disposições mais relevantes do “Regulamento Policial do Distrito de Beja”, editado, registe-se desde já, precisamente ao abrigo da alínea c) do nº 3 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 252/92, de 19 de Novembro ([14]).

O artigo 9º, nº 1, é peremptório no sentido de que “nenhum dos estabelecimentos referidos no capítulo anterior ([15]), mesmo quando situados em casas de espectáculos, casinos, associações, clubes e semelhantes, poderá ser explorado sem estar licenciado pelo Governo Civil”.

O artigo 10º, nº 1, refere-se neste conspecto às licenças da sua alçada: “a) De abertura definitiva ou provisória; b) de funcionamento dito de “porta aberta”.

Estas últimas, em que centraremos atenção, podem revestir seis modalidades (artigo 10º, nº 2): “a) Antecipação de abertura a partir das 6 horas; b) Das 8 horas às 21 horas; c) Das 21 horas às 24 horas; d) Das 24 horas às 2 horas; e) Das 24 horas às 4 horas; f) De funcionamento contínuo.”

O licenciamento é, aliás, “condicionado pelo que genericamente dispuserem os regulamentos municipais de abertura e encerramento dos estabelecimentos comerciais” (nº 3).

Por outro lado, com o fim de “acautelar a ordem pública, o descanso da vizinhança e a moral social, pode o governador civil ou a entidade delegada reduzir o limite das horas de funcionamento” acima indicadas (nº 4).

E a licença de antecipação da hora de abertura só é de conceder aos “estabelecimentos de bebidas” (nº 5).

Em quanto concerne ao período de validade das licenças de funcionamento, ou de porta aberta, regem os artigos 12º e 13º.

As licenças são anuais ou semestrais (artigo 12º, nº 1), mas podem ser concedidas por períodos inferiores em casos fundamentados (nº 3).

As licenças devem ser renovadas no último mês do prazo de validade, sob pena de agravação em 30% da taxa de licenciamento (artigo 13º, nºs 1 e 2).

Deduz-se do artigo 14º, nºs 1 e 3, que os requerimentos das licenças de porta aberta são apresentados nas respectivas câmaras municipais, mas no concelho sede do distrito sê-lo-ão sempre no governo civil.

A instrução dos requerimentos inclui o parecer e informação de entidades previstas na lei, referindo em especial as garantias que os requerentes e os estabelecimentos ofereçam quanto à ordem, descanso e tranquilidade dos vizinhos, à decência, e ainda à posse de outras licenças ou requisitos legais (artigo 14º, nº 4).

A outorga das licenças está sujeita a restrições de que se ocupam os artigos 16º e 17º.

Em primeiro lugar, pode a concessão depender de prévia vistoria ou exame pericial a efectuar pelas entidades que o governo civil designar (artigo 16º).

Em segundo lugar, nenhum estabelecimento do grupo das salas de dança pode abrir – e, por consequência, funcionar – em prédios destinados a habitação ou destinados a habitação e a qualquer outro fim simultaneamente (artigo 17º, nº 1).

Admite-se, no entanto, que os estabelecimentos de dança abram em urbanizações destinadas fundamentalmente à habitação, desde que verificadas determinadas garantias de preservação da habitabilidade (artigo 17º, nº 2): “a) O estabelecimento ficar localizado a mais de 100 metros da habitação mais próxima; b) Possuir parque privativo para os seus frequentadores; c) Os acessos ao estabelecimento não provoquem incómodo aos habitantes residentes nas imediações.”

Em terceiro lugar, os estabelecimentos dos grupos de bebidas e de restaurante situados em prédios ou urbanizações destinados fundamentalmente à habitação, cuja abertura seja deferida, não poderão funcionar para além das 24 horas – deixando por isso de aceder, ao que se afigura, às licenças de porta aberta previstas nas alíneas d), e) e f) do nº 2 do artigo 10º -, salvo se, mediante autorização expressa, por escrito, dos vizinhos, se provar que o funcionamento do estabelecimento para além daquele horário não produz qualquer incómodo (artigo 17º, nº 3).

Dentro dos condicionalismos aludidos, são as licenças por fim expedidas pela secretaria do governo civil no concelho sede do distrito e pelas câmaras municipais nos restantes concelhos após despacho favorável do governador (artigo 15º), dando lugar ao pagamento das taxas constantes da tabela anexa ao regulamento (artigo 87º).


IV

1. É tempo de reverter ao parecer da Auditoria Jurídica há momentos deixado em suspenso (cfr. supra, ponto II).

Na tese sustentada, os governadores civis perderam a competência regulamentar em matéria policial que lhes assistia na versão originária do seu estatuto.

Consequentemente, os regulamentos emanados à sombra dessa competência perderam força vinculativa, devendo ser desaplicados.

Há que considerar em separado os dois aspectos focados: a eliminação das competências regulamentares dos governadores civis em matéria policial; e as consequências dessa eliminação no tocante aos regulamentos emanados no seu exercício.


1.1. No parecer nº 9/96 opinou-se pelo acerto da conclusão extraída quanto ao primeiro aspecto, posição que ora se reafirma.

Com efeito, como então se sublinhou, mediante a redacção dada ao artigo 4º do Decreto-Lei nº 252/92, de 19 de Novembro, pelo artigo 2º do Decreto-Lei nº 316/95, de 28 de Novembro (cfr. supra, ponto II), é indubitável que os governadores civis deixaram de possuir a competência regulamentar prevista na redacção original da alínea c) do nº 3 do citado artigo 4º, passando apenas a deter a faculdade de propor ao Ministro da Administração Interna a elaboração dos regulamentos necessários à execução das leis que estabelecem o modo de exercício das suas competências.

O preâmbulo do Decreto-Lei nº 316/95 (supra, ponto II) é, de resto, assaz elucidativo nesse sentido.


1.2. Mas isso não significa necessariamente – afirmava o Conselho – que os regulamentos emanados ao abrigo dessas originárias competências tenham caducado, ou de outro modo cessado a sua vigência, pela simples revogação da lei que os autorizava.

Invocou-se a propósito doutrina formulada no parecer nº 68/91 ([16]), que de novo se torna aconselhável transcrever no passo respectivo (ponto III, 6.) – e pese a sua extensão -, para assegurar tanto quanto possível uma leitura não fragmentária:

“Sabe-se não ser em geral concebível o "exercício do poder regulamentar sem fundamento jurídico numa específica lei anterior", à qual "cumpre a função de habilitação legal necessária para se dar cumprimento ao princípio da primariedade ou da precedência da lei", como tal devendo ser expressamente citada no regulamento (artigo 115º, nº 7, da Constituição), de modo a redundar, corolariamente, na sua ilegitimidade a carência de habilitação legal ou a falta de individualização da lei habilitante (x).

“E a imperatividade da expressa referência nos regulamentos à lei que visam regulamentar - observou-se já em parecer deste corpo consultivo (x1) - "exprime o rigor do carácter instrumental do poder regulamentar e dos limites estritos do seu exercício e visa patentear esse nexo".

“Mas não, porventura, mais do que isto.

“A regra da citação da lei habilitante não pode sobretudo erigir–se em princípio material enformador da relação entre lei e regulamento, mas compreender-se na dimensão que lhe é própria, de simples revelação externa da sua essência deontológica, sintetizada no binómio "preeminência ou preferência e precedência da lei"/"complementaridade ou acessoriedade dos regulamentos" (x2).

“Ora, se assim é, então, salvaguardados estes parâmetros, nada obstará a que deixe de mentar-se aquela relação hermeticamente, como pura conexão formal incindível, excludente, abrindo-se caminho à possibilidade de uma sucessão de habilitações.

“Qual, posto isto, a sorte do regulamento - precisando agora na óptica da consulta -, se, justamente, for revogada a lei regulamentada?

"Uma vez entrados em vigor - pondera-se (x3) -, os regulamentos, se não forem entretanto alterados, suspensos, revogados pura e simplesmente ou substituídos por outros, ou ainda anulados, terão eficácia por tempo indefinido, ou até à verificação da condição resolutiva ou do termo final que neles hajam sido apostos (autoderrogação).

“A revogação e a modificação do regulamento (x4) podem ser expressas ou tácitas, conforme o regulamento ou lei posterior declarem que revogam ou modificam um regulamento anterior ou se limitam a regular a mesma matéria de forma inovativa. Nesta hipótese requer-se um trabalho interpretativo, porventura difícil e melindroso, para estabelecer quais são as normas que, afinal de contas, foram derrogadas pelas normas novas".

“Particulariza-se, ademais (x5), que os "regulamentos de execução devem considerar-se tacitamente revogados se for revogada ou substancialmente modificada a lei regulamentada". Mas, "se houver apenas incompatibilidade parcial entre a nova lei e o regulamento precedente, este sobreviverá na medida em que se harmonizar com ela - salvo se outra for a vontade apurada do legislador".

“Portanto, "em princípio - lê-se noutro autor (x6) -, a revogação da lei a que o regulamento sirva de complemento acarreta também a revogação deste. Mas, se essa lei é substituída por outra lei nova ainda não regulamentada, entendem as nossas doutrina e jurisprudência que ela continua a ser regulamentada pelo regulamento antigo em tudo aquilo em que este a não contrariar."

“Na mesma linha de pensamento, há, porém, quem reconduza as situações aludidas à ideia de caducidade.

"O regulamento caduca também - escreve-se (x7) - se for revogada a lei que ele vinha complementar ou executar, caso esta não seja substituída por outra. Portanto, se havia um regulamento de execução ou complementar de uma lei, e se essa lei foi revogada e não foi substituída por outra, o regulamento caduca. Se tal lei foi substituída por outra, o regulamento manter-se-á em vigor em tudo o que não seja contrário à nova lei" (x8).

Compreende-se – escreveu-se no parecer nº 9/96 à luz dos tópicos explanados – que caduque ou fique revogado, por exemplo, um regulamento de execução se a lei executada for pura e simplesmente revogada ou substituída por outra com ela incompatível.

O regulamento careceria, em qualquer dos casos, de justificação plausível. No primeiro, por falta de objecto; no segundo por radical contraditoriedade normativa com a nova lei sobre o seu objecto.

Não é isso, porém, o que se passa com os denominados “regulamentos independentes” emanados pelos governadores civis ao abrigo da competência regulamentar conferida por lei, quando esta lei foi alterada em termos de se retirar àqueles essa competência para conferi-la a outro diferente órgão da Administração.

Pelo simples facto dessa exautoração, nem os regulamentos passaram a carecer de objecto, nem surgiu nenhuma concreta incompatibilidade normativa entre os regulamentos existentes e a nova lei de competência.

Esclareça-se ter sido justamente a eclosão da aludida transferência de competências regulamentares – assim se interpreta – que permitiu questionar a vigência dos regulamentos policiais editados pelos governadores civis ao abrigo da alínea c) do nº 3 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 252/92, de 19 de Novembro.
Não propriamente a sua eventual natureza de “regulamentos independentes”.

E, qual seria o critério, no caso, desta qualificação, consabidamente não unívoca?

Não pode desde logo duvidar-se de que as denominadas licenças de porta aberta consubstanciam medidas de polícia enquadráveis nos poderes regulamentares conferidos aos governos civis pela aludida norma.

Numa fórmula breve, pode de facto dizer-se que a polícia administrativa representa o “conjunto das intervenções da Administração que tendem a impor à livre acção dos particulares a disciplina exigida pela vida em sociedade” ([17]), orientando-se pelo escopo referencial de “prevenir os atentados à ordem pública”.

E a ordem pública que a polícia tem funcionalmente por fim assegurar caracteriza-se em regra por três vectores:

“a) pelo seu carácter principalmente material, posto que se trata de evitar desordens visíveis;
b) pelo seu carácter público, já que a polícia não tutela matérias do foro privado nem o próprio domicílio pessoal, salvo na medida em que as actividades que aí se desenrolem tenham reflexos no exterior (regulamentação do barulho causado por aparelhagens sonoras, higiene de imóveis);
c) pelo seu carácter limitado, são três os itens tradicionais da ordem pública: tranquilidade (manutenção da ordem na rua, nos lugares públicos, luta contra o ruído); segurança (prevenção de acidentes e de flagelos, humanos ou naturais); salubridade (salvaguarda da higiene pública).”

Ora, os caracteres sintetizados afloram impressivamente no regime das licenças de porta aberta oportunamente respigado no “Regulamento Policial do Distrito de Beja”.
Não se vai, todavia, pretender que a natureza “independente” das licenças e dos regulamentos tenha a ver com insuficiências de densificação da alínea c) do nº 3 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 252/92, à luz, quiçá, de um princípio de tipicidade das medidas de polícia plasmado no artigo 272º, nº 2, da Constituição – “As medidas de polícia são as previstas na lei (…)”.

Parafraseando o parecer que estamos a seguir ([18]), não podia, com efeito, deixar de ser assim numa lógica intrínseca à matéria em causa.

O aludido inciso constitucional há realmente quem o interprete ([19]) na acepção de que “os órgãos e agentes que empregam tais medidas devem ter competência para o efeito nos termos da lei”.

Diverso entendimento apontaria no sentido de que «tais medidas deveriam ser apenas as taxativamente enunciadas na lei», mas esta linha de pensamento «iria contra a realidade das coisas, visto que a pluralidade ilimitada de circunstâncias em que perigos para os interesses públicos exigem acções preventivas por parte da Administração não se compadece com a exigência de uma tipificação normativa de todas as possíveis condutas ou dos seus pressupostos.”([20])

Em suma, e retomando o fio discursivo do parecer nº 9/96, não se divisam materialmente razões para que os regulamentos deixem de vigorar pelo simples facto da transferência de competências regulamentares.

De contrário criar-se-ia subitamente um vazio normativo de consequências imprevisíveis nas relações da vida social.

Posto o que – e revendo como se impõe a fundamentação constante das conclusões 3. e 4. do parecer nº 9/96 – continuamos a entender que os regulamentos dos governadores civis em matéria policial não deixaram de vigorar em 1 de Outubro de 1995, por mero efeito da aludida transferência de competência regulamentar operada pelo Decreto-Lei nº 316/95.

A sua revogação apenas se verifica se e na medida em que o novo titular exerça a sua competência no mesmo domínio normativo, ou se a matéria dos regulamentos for disciplinada mediante actos normativos de adequado nível e valor formal ([21]).

Seria este último o caso, por exemplo, dos aspectos anteriormente regulamentados pelos governadores civis que, sublinha a Auditoria Jurídica, foram tornados objecto do Anexo ao Decreto-Lei nº 316/95.

2. A situação modificou-se, porém, substancialmente com a publicação dos Decretos-Leis nºs 167/97 e 168/97, de 4 de Julho, que aprovaram entretanto um novo regime jurídico da instalação e funcionamento dos empreendimentos turísticos, o primeiro, e dos estabelecimentos de restauração e de bebidas, o segundo, ambos com ínicio de vigência em 1 de Julho de 1997 (artigos 83º e 57º, respectivamente) ([22]).

No preâmbulo do Decreto-Lei nº 167/97 lê-se a determinado passo:

«Do mesmo modo, e no sentido da simplificação e clarificação das relações entre promotores e Administração institui-se uma licença única para a abertura dos empreendimentos turísticos –, a licença de utilização turística –, emitida pela respectiva câmara municipal, a qual substitui todas as licenças actualmente exigíveis.
Extingue-se assim a licença policial dos governos civis.»

Em consonância com a intenção legislativa anunciada, o artigo 24º, nº 1, dispõe, efectivamente, que o «funcionamento dos empreendimentos turísticos ([23]) depende apenas de licença de utilização turística (..)», emitida, de acordo com o nº 1 do artigo 27º, «pelo presidente da câmara municipal».

O Decreto-Lei nº 167/97 não confia directamente nenhuma competência de licenciamento aos governadores civis, seja mesmo no plano consultivo.

O relatório preambular do Decreto-Lei nº 168/97 pondera, por seu turno, paralelamente:

«Com o objectivo de simplificar as relações entre os interessados e as câmaras municipais responsáveis pelo licenciamento dos estabelecimentos, prevê-se que exista apenas uma licença para a abertura dos mesmos, emitida pela câmara municipal competente, a qual substitui todas a actualmente exigidas.
Assim, extingue-se a licença policial dos governos civis, cuja intervenção, nos casos considerados justificados, passa a processar-se ao nível da apreciação do pedido de licenciamento, tornando mais simples a relação entre os interessados e a Administração.»

Com efeito, o artigo 10º, nº 1, estabelece que o «funcionamento dos estabelecimentos de restauração e de bebidas ([24]) depende apenas de licença de utilização para serviços de restauração ou de bebidas (…)», emitida, dispõe o artigo 13º, n º1, pelo presidente da câmara municipal.

Ao governador civil incumbe tão-somente a intervenção consultiva aludida no preâmbulo e prevista, por exemplo, nos artigos 4º e 7º, mostrando-se excluída qualquer outra.

Em resumo. Anteriormente aos Decretos-Leis nºs 167/97 e 168/97 verificara-se uma simples transferência das competências regulamentares dos governadores civis em matéria policial, insusceptível, só por si, de atingir a vigência dos regulamentos emanados no seu exercício e a exigência das licenças de porta aberta neles previstas.

A partir de 1 de Julho de 1997, com a entrada em vigor dos citados diplomas, as aludidas licenças e, bem assim, as taxas associadas à sua emissão deixaram de ser exigíveis como condição de início das actividades dos empreendimentos, suprimindo-se, consequentemente, do mundo jurídico as competências tendentes à sua concessão.

Os regulamentos policiais que as previam tornaram-se, por conseguinte, inúteis e carecidos de todo o sentido normativo no tocante às mesmas licenças, caducando ou resultando logicamente revogados nessa parte.


V


Do exposto se conclui:


1. Em virtude da alteração introduzida no artigo 4º, nº 3, do Decreto-Lei nº 252/92, de 19 de Dezembro, pelo artigo 2º do Decreto--Lei nº 316/95, de 28 de Novembro, com início de vigência em 1 de Outubro de 1995, os governadores civis perderam as competências regulamentares em matéria policial que lhes assistiam em virtude da alínea c) do citado artigo 4º, nº 3, na sua redacção originária, transferindo-se estas para o Ministro da Administração Interna;

2. Os regulamentos policiais emanados pelos governadores civis no exercício dessas competências regulamentares não cessaram a sua vigência pelo simples facto da aludida transferência de competência, operada em 1 de Outubro de 1995, apenas ficando revogados se e na medida em que o novo titular a exerça no mesmo domínio normativo, ou este domínio seja disciplinado mediante actos de adequado nível e valor formal;

3. Sem prejuízo desta ressalva, as licenças policiais denominadas «de porta aberta» previstas nesses regulamentos (cfr., v.g., os artigos 10º e segs. do “Regulamento Policial do Distrito de Beja”) e, bem assim, as taxas associadas à sua emissão continuaram, consequentemente, a ser exigíveis após 1 de Outubro de 1995;

4. Todavia, a partir de 1 de Julho de 1997, com a entrada em vigor dos Decretos-Leis nºs 167/97 e 168/97, de 4 de Julho do mesmo ano, foram abolidas as licenças de porta aberta, assim como as taxas inerentes, suprimindo-se do mundo jurídico as competências tendentes à sua emissão;

5. Mercê dos Decretos-Leis nºs 167/97 e 168/97 os regulamentos policiais aludidos nas conclusões 2. e 3. cessaram, por conseguinte, a sua vigência, em 1 de Julho de 1997, no tocante às denominadas licenças de porta aberta e respectivas taxas.




[1]) Com efeito, pelo citado diploma era aprovado em anexo o regime jurídico do licenciamento, pelos governadores civis, do exercício de determinadas actividades carecendo de medidas de polícia.
[2]) Basta recordar o teor da primeira conclusão:
“1. Mercê da alteração introduzida no artigo 4º, nº 3, do Decreto-Lei nº 252/92, de 19 de Novembro, pelo artigo 2º do Decreto-Lei nº 316/95, de 28 de Novembro, com início de vigência em 1 de Outubro de 1995, os governadores civis perderam as competências regulamentares em matéria policial que lhes assistiam em virtude da alínea c) do citado artigo 4º, nº 3, na sua redacção originária, transferindo-se estas para o Ministro da Administração Interna;”
[3]) Ver-se-á que a posição divergente do Conselho implicava, porém , no tocante a estas matérias, um resultado prático idêntico ao preconizado pela tese sub iudicio.
[4]) Correspondem-lhes após a 4ª Revisão (1997) levada a efeito pela Lei Constitucional nº 1/97, de 20 de Setembro, respectivamente, os artigos 169º e 166º - aquele com alterações de redacção introduzidas pelo artigo 113º da citada Lei, que se afigura deixam intocada, pelo menos em quanto aqui importa, a filosofia nuclear do instituto, agora designado da “apreciação parlamentar de actos legislativos”.
[5]) “A recusa de ratificação – escreviam GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª edição revista, Coimbra, 1993, págs. 697 e segs. – implica o termo da vigência do decreto-lei com eficácia ex nunc.» “O decreto-lei não é revogado desde o início; deixa de ter eficácia a partir do momento em que se realizou a condição resolutiva da qual dependia. Daí que o acto da AR não seja um acto legislativo, não esteja sujeito a promulgação, nem dependa de vacatio legis. Por outro lado, a recusa de ratificação parece implicar a repristinação (i. é, a reposição em vigor) das normas que tivessem sido revogadas ou derrogadas pelo decreto-lei não ratificado.”
Tal, pois, o sentido do actual artigo 169º, nº 4, da Constituição, quando prescreve: “Se for aprovada a cessação da sua vigência, o diploma deixará de vigorar desde o dia em que a resolução for publicada no Diário da República e não poderá voltar a ser publicado no decurso da mesma sessão legislativa.”
[6]) A que correspondem as mesmas alíneas do actual artigo 198º, que a 4ª Revisão fez suceder ao artigo 201º sem modificações.
[7]) Observe-se que também o Capítulo IV (artigos 24º e 25º) pode considerar-se pertinente a esse regime, na medida em que regula de alguma maneira a actividade dos “promotores de espectáculos de natureza artística”, disciplina em todo o caso de interesse despiciendo no plano da consulta.
[8]) O “Regulamento Policial do Distrito de Beja” inicialmente citado dedica precisamente o seu Capítulo VII (artigos 54º a 58º) às “agências de venda de bilhetes para espectáculos e divertimentos”.
[9]) A asserção fundamenta-se no sumário cotejo a que se procedeu na nota 11 do parecer nº 9/96 para que, brevitatis causa, se remete.
[10]) Já no primitivo parecer contudo se observara que o Decreto-Lei nº 327/95 entrou em vigor a 1 de Janeiro de 1996, enquanto a Resolução nº 10/96, que recusou a ratificação, aprovada embora em 1 de Fevereiro seguinte, só em 17 deste mês foi publicada no “Diário da República”. E uma vez que nos termos do nº 4 do artigo 172º da Constituição o diploma não ratificado apenas deixava de vigorar nesta última data, decorreu efectivamente certo lapso de tempo, de 1 de Janeiro a 16 de Fevereiro, em que o Decreto-Lei nº 327/95 chegou a vigorar.
Uma circunstância na realidade susceptível de originar específicos problemas de transitoriedade, que, porém, não vinham nem vêm agora minimamente aflorados em termos de concitarem tratamento jurídico.
Razão por que se justifica continuar a abstrair desse curto período de vigência do diploma em causa.
[11]) Isto é, além dos denominados “meios complementares de alojamento turístico” e dos “conjuntos turísticos” (artigos 16º e segs.), fundamentalmente os “estabelecimentos hoteleiros” e “similares dos hoteleiros”.
Estabelecimentos hoteleiros” – assim também designados, recorde-se, pelo Decreto-Lei nº 327/95 – são os “destinados a proporcionar alojamento, mediante remuneração, com ou sem fornecimento de refeições, e outros serviços acessórios ou de apoio”, tais como hotéis, pensões, pousadas, estalagens, motéis, hotéis-apartamentos, aldeamentos turísticos, hospedarias ou casas de hóspedes (artigos 11º, nº 1, e 12º, nº 1).
“Estabelecimentos similares dos hoteleiros” – a que no Decreto-Lei nº 327/95 correspondem em geral, também o notámos, os “estabelecimentos de restauração” – consideram-se, por seu turno, “qualquer que seja a sua denominação, os destinados a proporcionar ao público, mediante remuneração, alimentos ou bebidas para serem consumidos no próprio estabelecimento” (artigo 13º, nº 1), ou sejam os restaurantes, estabelecimentos de bebidas e salas de dança, com as variantes enunciadas no artigo 14º e detalhadas na nota 11 do parecer nº 9/96 (cfr. supra, nota 9).
[12]) Assim, da Direcção-Geral do Turismo, das câmaras municipais e da Direcção-Geral dos Espectáculos e do Direito de Autor – alíneas a), c) e d) do nº 1 do artigo 36º.
Anote-se que o artigo 1º do Decreto-Lei nº 149/88, de 17 de Abril, deu nova redacção às alíneas a) e c), sem reflexos na problemática em estudo. O mesmo se diga, de resto, no tocante às demais alterações que o Decreto-Lei nº 328/86 sofreu através desse diploma e ainda dos Decretos-Leis nºs 434/88, de 21 de Novembro, e 235/91, de 27 de Junho.
[13]) As quais, nos termos do artigo 40º, nº 1, “serão fixadas por portaria conjunta do Ministro da Administração Interna e do membro do Governo competente”.
Ao abrigo desse preceito, a Portaria nº 247/96, de 8 de Julho – assinada em 12 de Junho e, portanto, em qualquer hipótese, já após a recusa de ratificação do Decreto-Lei nº 327/95 -, dos Ministros da Administração Interna e da Economia, veio aprovar as aludidas taxas.
[14]) “Nestes termos – remata a breve nótula preambular – ao abrigo da alínea c) do nº 3 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 252/92, de 19 de Novembro, o governador civil do distrito de Beja elaborou e o Governo aprovou, por despacho ministerial de 23 de Abril de 1993, o seguinte Regulamento para o distrito”.
[15]) Trata-se fundamentalmente, para além dos salões e “casas de jogos lícitos”, dos “estabelecimentos hoteleiros” e “similares dos hoteleiros”, de que os artigos 1º e 2º dão noções e classificações idênticas às vigentes matrizes do Decreto-Lei nº 328/86 (cfr. supra, nota 11).
[16]) Votado na sessão de 20 de Maio de 1993, inédito.
x) Parecer deste Conselho nº 68/87, de 24 de Março de 1988 (ponto III, 2.), "Diário da República", II Série, nº 221, de 23 de Setembro de 1988, pág. 8830.
x1) Parecer nº 80/89, de 15 de Fevereiro de 1990 (ponto 3.1.3.1), "Diário" citado, II Série, nº 158, de 11 de Julho de 1990, pág. 7680.
(x2) Sobre um mais preciso sentido dos princípios referidos, e, em geral, acerca das relações entre lei e regulamento no plano constitucional, cfr. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional, 5ª edição, totalmente refundida e aumentada, Coimbra, 1991, págs. 932 e seguintes; J. M. COUTINHO DE ABREU, Sobre os Regulamentos Administrativos e o Princípio da Legalidade, Coimbra, 1987, particularmente págs. 131 e seguintes.
(X3) AFONSO RODRIGUES QUEIRÓ, Teoria dos Regulamentos (2ª Parte), "Revista de Direito e de Estudos Sociais", Ano I, 2ª Série (1986), nº 1, pág. 29 - a 1ª parte está publicada na mesma "Revista", Ano XXVII (1980), nºs 1, 2, 3 e 4, págs. 1 a 19.
(X4) AFONSO RODRIGUES QUEIRÓ, op. cit. (2ª Parte), págs. 25 e seg.
(X5) AFONSO RODRIGUES QUEIRÓ, ibidem.
(X6) SÉRVULO CORREIA, Noções de Direito Administrativo, Lisboa, 1982, pág. 113.
(X7) FREITAS DO AMARAL, Direito Administrativo, vol. III (Lições aos alunos do Curso de Direito de 1984-1985), Lisboa, pág. 60.
(X8) Seja caso de caducidade ou de revogação, já se afirmou, inclusivamente - AFONSO RODRIGUES QUEIRÓ, Lições de Direito Administrativo, vol. I, Coimbra, 1976, pág. 483, citando WOLFF-BACHOF -, que os "regulamentos autorizados integrativos não devem considerar-se tacitamente revogados se cessar a vigência da autorização na qual se houver apoiado a sua elaboração".
A asserção consta das Lições, a rematar o texto, há pouco transcrito (cfr. supra, nota x5), reproduzido na Teoria dos Regulamentos, lugar onde, porém, se omitiu esse parágrafo, quiçá por dúvidas de conformidade constitucional.
Na lição do mesmo autor - Lições, págs. 427 e seg. -, trata-se, na verdade, de uma das espécies dos denominados "regulamentos delegados", em que o poder regulamentar se exerce fora do domínio legislativo "por natureza", de forma independente, "em toda a medida em que o parlamento (e entre nós também o Governo-legislador) não haja intervindo", razão pela qual pode o "legislador, com referência a pontos dessa área exterior à reserva da lei", encarregar a Administração de "integrar a regulamentação, por si estabelecida no essencial, de acordo com o fim, o sentido e o sistema perfilhados, editando, dentro destes limites, normas novas, consagradoras de novos direitos e novas obrigações, não previstas na lei".
[17]) JEAN RIVERO, Direito Administrativo, pág. 478, apud parecer nº 52/93, de 2 de Dezembro de 1993, “Diário da República”, II Série, nº 116, de 19 de Maio de 1994, págs. 4994 e segs., que ora se acompanha por momentos.
[18]) Parecer nº 52/93, citado na nota 17, sobre o qual nos debruçamos agora no ponto 3, in fine, e nota 23.
[19]) Assim, SÉRVULO CORREIA, Noções de Direito Administrativo, I, pág. 247, e Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, “Colecção Teses”, Coimbra, 1987, pág. 258, nota 432, apud parecer nº 52/93, nota 23.
[20]) SÉRVULO CORREIA, ibidem.
[21]) Acolheu esta doutrina – incidentalmente, transcrevendo a conclusão 2. do parecer nº 9/96 – o acórdão do Tribunal Constitucional nº 381/97, proc. nº 816/95, de 14 de Maio de 1997, «Diário da República», II Série, nº 144, de 25 de Junho de 1997, págs. 7275 e seguintes.
Em sentido oposto se pronunciara formalmente a Provedoria de Justiça perante o Ministro da Administração Interna , em Abril de 1997, conforme documentação recebida do Gabinete deste membro do Governo.
Salvo o devido respeito, apenas reconhecemos razão à discordância com as conclusões 3. e 4. do parecer nº 9/96, que o Conselho ora também revê.
O argumento nuclear segundo o qual os regulamentos que previam as licenças de porta aberta não possuíam habilitação em qualquer diploma vigente improcede pelas razões aduzidas no parecer nº 9/96 e no presente parecer, assaz persuasivas da habilitação da alínea c) do nº 3 do artigo 4º do Decreto-lei nº 252/92, de 19 de Novembro (redacção originária), que o “Regulamento Policial do Distrito de Beja”, tomado como paradigma dos demais regulamentos policiais dos distritos, aliás expressamente invoca, como se mostrou.
[22]) Foram assim atribuídos efeitos retroactivos aos novos regimes, a menos que se trate de «gralhas», cuja rectificação, todavia, não se detectou.
[23]) Que o artigo 1º, nº 1, define como «os estabelecimentos que se destinam a prestar serviços de alojamento temporário, restauração ou animação turística, designado para o seu funcionamento de um adequado conjunto de estruturas , e equipamentos e serviços complementares».
Podem, segundo as alíneas a) a d) do nº 2 do mesmo artigo ser integradas num dos seguintes tipos: estabelecimentos hoteleiros; meios complementares de alojamento turístico; parques de campismo públicos; conjuntos turísticos.
O artigo 2º define, por sua vez, os estabelecimentos hoteleiros de modo idêntico aos artigos 11º, nº 1, do Regulamento Policial do Distrito de Beja (supra, nota 15).
[24]) Correspondentes grosso modo aos «estabelecimentos similares dos hoteleiros» definidos nos artigos 13º, nº 1, do Decreto-lei nº 328/86 (supra, nota 11) e 2º do Regulamento Policial do Distrito de Beja (supra, nota 15), atenta a similar noção que flui dos nºs 1, 2 e 3 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 168/97.
Anotações
Legislação: 
DL 252/92 DE 1992/11/19 ART4 N3 C.
DL 316/95 DE 1995/11/28 ART2 ART48 N1.
DL 315/95 DE 1995/11/28 ART1 ART2 ART3 N1 N3 ART4 N1 N2 ART6 ART9 N1 ART10 ART20 ART21 ART22 N2 ART23 ART26 ART27 ART28 ART34 ART35 N1 N2 N3 ART37 ART38 ART41 N1 A B N2 N3 N4 N5 ART42 ART43 ART46 N1 N2 ART47 ART48 ART51 ART52.
DL 327/95 DE 1995/12/05 ART1 N1 N2 ART2 ART5 N1 N4 ART6 N1 N2 ART7 ART8 N1 N2 N3 N4 ART9 N1 N2 ART12 N1 ART17 ART18.
RAR 10/96 DE 1996/12/17.
CONST76 ART201 N1 A B ART272 N2.
L 39-B/94 DE 1994/12/27 ART13.
DL 37534 DE 1949/08/30 ART1 ART3.
DL 328/86 DE 1986/09/30 ART16 N1 G ART36 N1 B ART37 N1 N2 N3 ART38 N1 ART39 ART40 ART41.
DL 167/97 DE 1997/07/04 ART24 N1 ART83.
DL 168/97 DE 1997/07/04 ART4 ART7 ART10 N1 ART13 N1 ART57.
Referências Complementares: 
DIR CONST * DIR FUND * ORG PODER POL / DIR ADM
Divulgação
Data: 
03-01-2000
Página: 
9
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