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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
73/1999, de 29.03.2000
Data de Assinatura: 
29-03-2000
Tipo de Parecer: 
Informação-Parecer
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério dos Negócios Estrangeiros
Relator: 
LUÍS DA SILVEIRA
Descritores e Conclusões
Descritores: 
CONVENÇÃO
RATIFICAÇÃO
INIBIÇÃO DA FACULDADE DE CONDUZIR
INFRACÇÃO RODOVIÁRIA
MEDIDAS DE POLÍCIA
MEDIDA DE SEGURANÇA
SANÇÃO ACESSÓRIA
CONTRA-ORDENAÇÃO
CASSAÇÃO
LICENÇA DE CONDUÇÃO
INTERDIÇÃO DE CONCESSÃO
PROIBIÇÃO DE CONDUZIR
COOPERAÇÃO JUDICIÁRIA
SENTENÇA ESTRANGEIRA
EXECUÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
REVISÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
ESTADO DA RESIDÊNCIA
ESTADO DA INFRACÇÃO
NOTIFICAÇÃO
AUTORIDADE CENTRAL
PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA
DIRECÇÃO GERAL DE VIAÇÃO
TRIBUNAL JUDICIAL
LACUNA
Conclusões: 
1ª - O mero facto de a Convenção em apreciação prever a possibilidade de execução de decisões de inibição de conduzir tomadas pela via administrativa não constitui, só por si mesmo, perante o teor dos artigos 29º a 32º da Constituição, obstáculo à sua ratificação;
2ª - Em todo o caso, se, em Portugal, a certo facto ou situação corresponder uma decisão de inibição de conduzir de natureza judicial, mas, no Estado estrangeiro em causa a idêntico facto ou situação couber decisão de inibição de condução de índole administrativa, esta última não poderá ser executada no nosso país, por respeito das normas constitucionais indicadas na conclusão anterior, salvo se se formular a declaração de conversão adiante preconizada;
3ª - A execução, em Portugal, de qualquer eventual decisão de inibição de conduzir estrangeira, de índole judicial ou administrativa, que constitua efeito necessário de uma pena criminal ou outra sanção, só será admissível, face ao nº 4 do artigo 30º da nossa Lei Fundamental, se se formular a declaração adiante sugerida, no sentido da respectiva conversão;
4ª - Declaração semelhante à referida na conclusão anterior deverá ser feita se, porventura, o Tribunal Constitucional vier a declarar, com efeitos gerais, a inconstitucionalidade do actual nº 2 do artigo 65º do Código Penal;
5ª - A economia geral da Convenção em análise apresenta-se, ressalvados os aspectos abordados nas conclusões 2ª a 4ª, compatível com o ordenamento jurídico português;
6ª - Sugere-se que se deixe expresso que:
"A República Portuguesa formula as seguintes declarações:
a) Nos termos do artigo 4º, nº 5, da Convenção, aplicará, em geral, como modalidade de execução da decisão de inibição de conduzir tomada em Estado estrangeiro, a contemplada na alínea b) do nº 1 do mesmo preceito, recorrendo, contudo, à da alínea c) nas seguintes hipóteses:
- tratando-se de decisão administrativa de inibição de condução tomada, no Estado da infracção, sobre facto ou situação aos quais corresponderia, em Portugal, enquanto Estado da residência, decisão de inibição de conduzir de natureza judicial;
- estando em causa decisão de inibição de conduzir, judicial ou administrativa, que, no Estado da infracção, constitua efeito necessário da aplicação de certa pena criminal ou outra sanção;
b) Ao abrigo do artigo 6º, nº 3, aplicará sempre, enquanto Estado da residência, os motivos de recusa de execução da decisão de inibição de conduzir constantes das alíneas a) e b) do nº 2 do mesmo preceito;
c) Relativamente ao disposto no artigo 7º, nº 2, indica, para efeitos da aplicação do precedente nº 1, que será a Procuradoria-Geral da República a autoridade central aí mencionada, bem como, também, a autoridade competente para apresentar as notificações mencionadas no artigo 3º;
d) No tocante ao previsto no artigo 9º, nº 2, que os documentos indicados no nº 1 desse artigo lhe sejam transmitidos pelo Estado da infracção acompanhados de uma tradução em língua portuguesa;
e) Reportando-se ao artigo 11º, nº 2, não aplicará, enquanto Estado da infracção, o nº 1 dessa norma, salvo se o Estado da residência vier a comunicar-lhe que não pode assegurar o cumprimento da decisão em causa;
f) No concernente ao consignado no artigo 14º, nº 2, aceita a competência do Tribunal de Justiça para decidir a título prejudicial sobre a interpretação da presente Convenção, especificando que, para esse efeito, qualquer órgão jurisdicional nacional pode pedir ao Tribunal de Justiça que se pronuncie a título prejudicial sobre uma questão suscitada em processo pendente perante esse órgão jurisdicional relativa à interpretação da Convenção, se considerar que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa;
g) (Facultativo) Baseando-se no artigo 15º, nº 4, aceita que a Convenção, com excepção do artigo 14º, seja, mesmo antes da respectiva entrada em vigor, aplicável nas suas relações com os outros Estados-membros que tenham feito idêntica declaração;
7ª - A Convenção não aborda a questão da eventual suspensão da inibição de conduzir e sua possível revogação – lacuna que, embora possa vir a criar algumas dificuldades de aplicação, não é de molde a justificar a não ratificação deste instrumento internacional;
8ª - Cabe promover um sistema de coordenação entre a Procuradoria-Geral da República e a Direcção-Geral de Viação, com vista a assegurar a adequada aplicação, na prática, da presente Convenção;
9ª - Justifica-se – se tal iniciativa não ocorreu já – voltar a ponderar acerca da eventual ratificação das Convenções sobre matérias afins que não foram ratificadas, antes da entrada em vigor do actual Código da Estrada, porque então a inibição de conduzir era, na nossa ordem jurídica, regulada sempre sob a perspectiva penal.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Secretário de Estado dos Assuntos
Europeus,
Excelência:



1.


1.1. Por despacho de 20 de Outubro de 1999 ([1]), solicitou Vossa Excelência a esta Procuradoria-Geral da República parecer respeitante à instrução do processo de ratificação da “Convenção estabelecida com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativa às decisões de inibição de conduzir”, assinada e adoptada por Acto do Conselho de 17 de Junho de 1998(98/C216/01) ([2]).


1.2. A referida Convenção tem fundamentalmente por objectivo assegurar que as decisões de inibição de conduzir veículo a motor, em resultado da prática de uma infracção rodoviária, possam ser executadas, não apenas no âmbito do Estado cujas autoridades as tenham proferido, mas também nos territórios dos demais países membros da União Europeia.

O conteúdo essencial da aludida Convenção vem assim adequadamente sintetizado na citada Informação da Direcção dos Assuntos Comunitários:

“-Define “decisão de inibição de conduzir”, de modo a abranger qualquer medida, relacionada com a prática de uma infracção rodoviária, que tenha por efeito retirar ou suspender a carta de condução ou o direito de conduzir e da qual já não caiba recurso (reconhecendo a diversidade de legislações e sistemas relativos à decisão de inibição de conduzir em funcionamento nos Estados-membros da Comunidade Europeia).
-Vincula os Estados-membros a cooperarem entre si, e de acordo com o disposto na Convenção em apreço, com o fim de evitar que os condutores inibidos de conduzir num Estado-–membro que não aquele em que habitualmente residem possam furtar-se aos efeitos dessa inibição simplesmente por abandonar o Estado da infracção.
-Estipula a notificação obrigatória do Estado da infracção ao Estado de residência da decisão de inibição de conduzir por ele imposta, prevendo que a mesma seja feita “sem demora”.
-Faculta ao Estado de residência a possibilidade de recusar executar a decisão de inibição de conduzir no caso de a conduta pela qual a decisão de inibição de conduzir foi imposta no Estado da infracção não constituir infracção nos termos do direito do Estado de residência, ou seja, se não houver dupla criminalização.
-Prevê em consequência do art. 8º da Directiva acima mencionada ([3]), que o Estado-membro obrigado a notificar seja outro que não aquele em que foi emitida a carta de condução em causa, sendo em tal caso este último informado da situação pelo Estado de residência.
-Estabelece no art. 4º, três modos possíveis através dos quais os Estados-membros, actuando como Estado de residência, podem executar a decisão de inibição de conduzir (execução directa, execução indirecta e conversão da decisão da inibição de conduzir).
-Concede ao Estado de residência que executou uma decisão de inibição de conduzir imposta a um dos seus residentes por um Estado da infracção a possibilidade de aplicar medidas complementares de segurança rodoviária.
-Fixa no art. 6º, as circunstâncias que podem justificar a recusa por parte do Estado de residência em executar uma notificação enviada por Estado da infracção.
-Exige aos Estados-membros que adoptem as medidas necessárias que lhes permitam punir a condução de um veículo a motor no respectivo território durante o período de inibição no Estado de residência.
-Não admite quaisquer reservas.


1.3. Na solicitação do presente parecer, menciona-se que o mesmo “deverá conter nomeadamente informação relativa à intenção de formular às declarações previstas na Convenção e, em caso afirmativo, a apresentação dos respectivos textos, bem como a indicação da autoridade ou autoridades designadas e a língua ou línguas oficiais da União Europeia a utilizar nos termos da Convenção (conforme previsto, nomeadamente, nos artigos 4º, nº 5, 6º, nº 3, 7º, nº 2, 9º, nº 2, 11º, nº 2, 14º, nº 2, 15º, nº 4)”.

Os preceitos acabados de enumerar reportam-se, respectivamente, a:

- declaração sobre qual dos procedimentos será utilizado pelo Estado da residência, para executar decisão de inibição proferida por autoridade do Estado da infracção (artigo 4º, nº 5);

- declaração, facultativa, por parte de qualquer Estado-Membro, no sentido de que aplicará sempre parcial ou integralmente o nº 2 do artigo 6º, no qual se enumeram os possíveis motivos de inexecução de decisão de inibição de conduzir tomada no âmbito do Estado da infracção (artigo 6º, nº 3);

- indicação da autoridade central ou autoridades centrais designadas para receber as notificações de decisões de inibição de conduzir tomadas por autoridades de outros países, bem como das autoridades competentes encarregadas de apresentar as notificações de decisões de inibição de conduzir proferidas no seu âmbito, enquanto Estado de infracção;

- declaração, facultativa, de que os documentos recebidos do Estado da infracção devam ser acompanhados de tradução em determinada língua oficial da União Europeia (artigo 9º, nº 2);

- declaração, facultativa, de que, enquanto Estado da infracção, o país em causa não exercerá o direito de executar no seu território a totalidade do período de inibição de conduzir fixado pelas suas autoridades, independentemente da decisão do Estado de residência (artigo 11º, nº 2);

- declaração, facultativa, de aceitação da competência do Tribunal de Justiça para decidir a título prejudicial sobre a interpretação da presente Convenção (artigo 14º, nº 2);

- declaração, facultativa, no sentido de que, ainda antes da entrada em vigor da Convenção ([4]) ,esta será aplicável com - excepção do respectivo artigo 14º, respeitante à intervenção do Tribunal de Justiça – nas suas relações com os outros Estados-–membros que houverem feito idêntica declaração (artigo 15º, nº 4).

Cumpre, pois, emitir o parecer solicitado.

O parecer ocupar-se-á, em termos gerais, sucessivamente, do enquadramento comunitário da Convenção, da sua admissibilidade face à Constituição portuguesa e da sua compatibilidade com o restante ordenamento vigente no nosso país.

Seguidamente, tomar-se-á posição acerca das declarações e indicações previstas, a título obrigatório ou facultativo, no âmbito do instrumento internacional em causa.





2.

2.1. Consoante consta do acto do Conselho que a teve por objecto, a presente Convenção foi por essa instituição comunitária estabelecida com base no originário artigo K.3 do Tratado da União Europeia ([5]) em vigor à data do estabelecimento desse instrumento internacional, e cujo teor era o seguinte, na parte relevante:

“Artigo K.3

1. Nos domínios a que se refere o artigo K.1, os Estados-–membros devem informar-se e consultar-se mutuamente no âmbito do Conselho, de modo a coordenarem a sua acção. Para o efeito, devem instituir uma colaboração entre os competentes serviços das respectivas administrações.

2. O Conselho pode:

- por iniciativa de qualquer Estado-membro ou da Comissão, nos domínios a que se referem os pontos 1 a 6 do artigo K.1;

- por iniciativa de qualquer Estado-membro, nos domínios a que se referem os pontos 7 a 9 do artigo K.1:

……………………………………………………………………….

c) Sem prejuízo do disposto no artigo 220º do Tratado que institui a Comunidade Europeia, elaborar convenções e recomendar a sua adopção pelos Estados-membros, nos termos das respectivas normas constitucionais.

Salvo se essas convenções previrem disposições em contrário, as eventuais medidas de aplicação dessas convenções serão adoptadas no Conselho, por maioria de dois terços das Altas Partes Contratantes.

Essas convenções podem prever a competência do Tribunal de Justiça para interpretar as respectivas disposições e decidir sobre todos os diferendos relativos à sua aplicação, de acordo com as modalidades que essas convenções possam especificar.”

Por seu turno, no nº 7 do artigo K.1., para o qual a estipulação transcrita remete, estabelecia-se que:


“Artigo K.1

Para a realização dos objectivos da União, nomeadamente o da livre circulação de pessoas, e sem prejuízo das atribuições e competências da Comunidade Europeia, os Estados-membros consideram questões de interesse comum os seguintes domínios:
……………………………………………………………..……….
7. A cooperação judiciária em matéria penal;
……………………………………………………………………… .”


2.2. Como pôde verificar-se, o artigo K.3, nº 2, alínea c), do Tratado da União, na versão primeira, veio admitir que as convenções estabelecidas ao seu abrigo previssem a competência do Tribunal de Justiça para “interpretar as respectivas disposições e decidir sobre todos os diferendos relativos à sua aplicação”.

Dissiparam-se, assim, as dúvidas anteriormente suscitadas acerca da possibilidade de recorrer ao Tribunal de Justiça, para resolver litígios respeitantes a convenções celebradas, em termos similares, entre os Estados-membros, bem como para acerca da interpretação das mesmas se pronunciar a título prejudicial ([6]).

A essa regra comunitária foi buscar fundamento, pois, o artigo 14º da Convenção em apreciação. Esta cláusula consagrou, aliás, procedimento análogo ao já antes adoptado em instrumentos similares. Isso mesmo vem apontado, de resto, na parte correspondente ao aludido preceito do Relatório Explicativo da presente Convenção ([7]): “Foi redigido tanto quanto possível com base nas disposições já existentes relativas à competência do tribunal de Justiça noutros instrumentos aprovados ao abrigo do Tratado VI do Tratado da União Europeia”.

Este tipo de regulamentação veio a ser consagrado no próprio âmbito do Tratado da União, mediante alteração nele introduzida pelo Tratado de Amesterdão – deste modo conferindo ao artigo 14º em causa um apoio expresso e directo, mesmo em termos de conteúdo (e não apenas de legitimação por remissão), a nível de Direito Comunitário primário.

Assim é que, presentemente, o actual artigo 35º do Tratado da União prescreve o seguinte:

“Artigo 35º

1. O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias é competente, sob reserva das condições constantes do presente artigo, para decidir a título prejudicial sobre a validade e a interpretação das decisões-quadro e das decisões, sobre a interpretação das convenções estabelecidas ao abrigo do presente Título e sobre a validade e a interpretação das respectivas medidas de aplicação.

2. Mediante declaração feita no momento da assinatura do Tratado de Amesterdão, ou posteriormente, a todo o tempo, qualquer Estado-membro pode aceitar a competência do Tribunal de Justiça para decidir a título prejudicial, nos termos do nº 1.

3. Qualquer Estado-membro que apresente uma declaração nos termos do nº 2 deve especificar que:

a) Qualquer órgão jurisdicional desse Estado cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial previsto no direito interno pode pedir ao Tribunal de Justiça que se pronuncie a título prejudicial sobre uma questão suscitada em processo pendente perante esse órgão jurisdicional relativa à validade ou interpretação de um acto a que se refere o nº 1, se considerar que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa; ou que

b) Qualquer órgão jurisdicional desse Estado pode pedir ao Tribunal de Justiça que se pronuncie a título prejudicial sobre uma questão suscitada em processo pendente perante esse órgão jurisdicional relativa à validade ou interpretação de um acto a que se refere o nº 1, se considerar que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa.

4. Qualquer Estado-membro, quer tenha ou não feito uma declaração nos termos do nº 2, tem o direito de apresentar ao tribunal alegações ou observações escritas nos casos previstos no nº 1.

5. O Tribunal de Justiça não é competente para fiscalizar a validade ou a proporcionalidade de operações efectuadas pelos serviços de polícia ou outros serviços responsáveis pela aplicação da lei num Estado-membro, ou o exercício das responsabilidades que incumbem aos Estados-membros em matéria de manutenção da ordem pública e de garantia da segurança interna.

6. O Tribunal de Justiça é competente para fiscalizar a legalidade das decisões no âmbito dos recursos com fundamento em incompetência, violação de formalidades essenciais, violação do presente Tratado ou de qualquer norma jurídica relativa à sua aplicação, ou em desvio de poder, interpostos por um Estado-membro ou pela Comissão. Os recursos previstos no presente número devem ser interpostos no prazo de dois meses a contar da publicação do acto.

7. O Tribunal de Justiça é competente para decidir sobre qualquer litígio entre Estados-membros decorrente da interpretação ou da execução dos actos adoptados em aplicação do nº 2 do artigo 34º , sempre que o diferendo não possa ser resolvido pelo Conselho no prazo de seis meses a contar da data em que lhe tenha sido submetido por um dos seus membros. O Tribunal de Justiça é igualmente competente para decidir sobre qualquer litígio entre os Estados-membros e a Comissão decorrente da interpretação ou da aplicação das convenções elaboradas ao abrigo do nº 2, alínea d), do artigo 34º”.


2.3. Consoante explicita o respectivo preâmbulo, a Convenção em referência tomou em consideração as regras comunitárias constantes do artigo 8º da Directiva do Conselho 91/439/CEE, de 29 de Julho de 1991 ([8]), que prescreve:

“Artigo 8º

1. No caso de o titular de uma carta de condução válida emitida por um Estado-membro ter adquirido residência habitual noutro Estado-membro, pode solicitar a troca da sua carta de condução por outra carta equivalente; compete ao Estado-membro que proceder à troca verificar, se necessário, se a carta apresentada permanece efectivamente válida.

2. Sem prejuízo do cumprimento do princípio da territorialidade das leis penais e das disposições de polícia, o Estado-membro de residência habitual pode aplicar ao titular de uma carta de condução emitida por outro Estado-membro as suas disposições nacionais em matéria de restrições, suspensão, retirada ou anulação do direito de conduzir e, se necessário, proceder, para o efeito, à troca dessa carta.

3. O Estado-membro que proceder à troca enviará a antiga carta às autoridades do Estado-membro que a tiver emitido, especificando os motivos desta formalidade.

4. Um Estado-membro pode recusar, a uma pessoa que seja objecto no seu território de uma das medidas referidas no nº 2, reconhecer a validade de qualquer carta de condução emitida por outro Estado-membro.
Um Estado-membro pode igualmente recusar emitir uma carta de condução a um candidato que seja objecto de uma dessas medidas noutro Estado-membro.
………………………………………………………………………. “.


3.

A natureza jurídica da inibição da faculdade de conduzir tem sido, tanto antes como depois da entrada em vigor da Constituição de 1976, bastante discutida, tanto na doutrina como na jurisprudência portuguesas.

Dessa discussão se fez eco, nomeadamente, o parecer deste Conselho nº 1/85 ([9]), que sintetizava do modo seguinte as principais opiniões em confronto:

“3.2. A natureza jurídica da inibição da faculdade de conduzir tem sido largamente discutida na doutrina e na jurisprudência (x).
Para uns deve considerar-se pena acessória (MAIA GONÇALVES, Código Penal, 1968, pág. 114), podendo, em certos casos, ter-se como medida de segurança aplicável administrativamente opinam outros, (VÍTOR FAVEIRO, Prevenção Criminal, pág. 20 e VITOR FAVEIRO e SILVA ARAÚJO, Código Penal, 3ª edição, 1960, pág. 214).

Para PINHEIRO FARINHA (Scientia Juridica, ano V, 1956, págs. 177 e segs.) a inibição da faculdade de conduzir assumiria a natureza de pena complementar ou acessória, nos casos do nº 2 do artigo 61º, de efeito da pena nos casos do artigo 46º, nº 2, alíneas a), nºs 1º e 2º, b) c) e d), e ainda nos casos do nº 4 do mesmo artigo e, finalmente, de medida de segurança nos casos previstos no artigo 46º, nº 2, alínea a), nº 1º, alínea e) e ainda no artigo 61º, nº 1, alíneas b) e c). Para este autor a interdição seria medida de segurança quando, estabelecida por período indeterminado, se destinasse a impedir o cometimento de violações de direito estradal, previsíveis em virtude da conduta anterior do condutor; seria pena complementar quando, tendo duração predeterminada e devendo ser decretada a termo final certo, se não verificasse que o seu fim dependia da cessação da periculosidade; finalmente, seria mero efeito da pena nos casos em que, resultante de uma ou várias condenações penais, não assumisse a natureza complementar por não ter duração variável, conforme as circunstâncias.

Para CAVALEIRO DE FERREIRA (Direito Penal, parte IV, pág. 202), a interdição seria efeito de pena quando constituísse uma incapacidade resultante de uma ou várias condenações penais, caso das alíneas a), b), c), d) e e) do nº 2 do artigo 46º, e medida de segurança nos restantes casos, designadamente os previstos nas alíneas b) e c) do nº 1 e no nº 2 do artigo 61º.

A orientação dominante da nossa jurisprudência é no sentido de a considerar como medida de segurança, como, aliás, o próprio Código da Estrada a qualifica no seu artigo 46º, nº 2, alínea f).

Todavia, já houve decisões considerando que tal medida pode revestir a natureza de “pena de polícia” ou de “simples medida de polícia”.

Como pena de polícia seria uma sanção aplicada por autoridades policiais por violação de medidas preventivas de segurança e tranquilidade públicas e que teria lugar “por virtude da prática de um delito de polícia: uma transgressão ou contravenção”.

Assim deveria interpretar-se em parte o artigo 55º do Código de Estrada, pois, com a apreensão da licença de condução, ou interdição de conduzir, como pena de polícia, o que se visa, principalmente, é estabelecer meios de coacção para cumprimento de disposições regulamentares.

Pelo que a interdição de conduzir poderia “consoante as circunstâncias do caso assumir a natureza de pena acessória de polícia nas situações previstas na alínea b), 1º e 2º do nº 2 do artigo 61º do Código da Estrada” (XX).

Como “simples medida de polícia” deveria ser considerada naqueles casos em que a inibição não tem qualquer ligação com a prática dos crimes previstos pelos nºs 2 a 4 do artigo 58º, pelo artigo 54º e pelo artigo 60º do Código da Estrada porquanto “nessas situações, tal medida – embora destinada a prevenir a delinquência – tem tão só a finalidade última de procurar afastar ou imunizar factores externos relevantes da perigosidade…” ([10]).


4.

Constata-se, de todo o modo, que, uma vez entrada em vigor a Constituição de 1976, começou a ser posta em causa a constitucionalidade da medida de inibição de conduzir decretada por via administrativa.

E, isto, por tal medida ser maioritariamente considerada como assumindo natureza penal – ou enquanto medida de segurança, ou enquanto pena acessória ([11]).

Essa posição fora já manifestada pela Comissão Constitucional no seu parecer nº 3/76 ([12]), e foi retomada por tribunais de diversa índole, a ponto de dar azo a uma verdadeira corrente jurisprudencial.

Revelou-se particularmente incisiva, nessa perspectiva, a orientação adoptada pelo Tribunal Constitucional, que logo no acórdão nº 28/83, de 21 de Dezembro de 1983 ([13]), sublinhou que “a atribuição de competência à Direcção-Geral de Viação para aplicação da inibição da faculdade de conduzir ao infractor que pague voluntariamente a multa pela contravenção é inconstitucional, por isso que viola as garantias de defesa que o artigo 32º, nºs 1, 3 e 5 da Constituição da República impõe que o processo criminal assegure”. Realçando que nem interessaria saber se a inibição da faculdade de conduzir se deveria considerar como medida de segurança, pena acessória ou efeito da pena, já que, em qualquer caso, a sua aplicação não deveria ocorrer “por outro meio que não seja um julgamento, uma vez que, tratando-se, como se trata, duma contravenção, achamo-nos no caso no domínio criminal”.

Este Conselho adoptou, de resto, a mesma posição, nomeadamente definida no parecer nº 1/85, de 5 de Dezembro de 1985 ([14]), no qual se concluiu:

“1º- A medida de inibição da faculdade de conduzir prevista para comportamentos lesivos das regras do Código da Estrada nos termos aí definidos, é uma medida de natureza criminal, ora punitiva ora medida de segurança;

2º- O nº 9 do artigo 61º do mesmo Código, na parte em que atribui à, hoje, Direcção-Geral de Viação competência para, nos termos aí estabelecidos, aplicar tal medida, contraria os princípios de jurisdicionalização da aplicação das medidas sancionatórias de natureza criminal, extraídos dos artigos 27º, nº 2, 29º, nº 1, 32º, nºs 2, 4, 5, 6 e 7, e do artigo 205º da Constituição da República de 1976.

3º- A referida Direcção-Geral não tem, portanto, competência para aplicar a medida de inibição de conduzir a que se referem as conclusões anteriores, cabendo tal competência aos tribunais.”

As conclusões transcritas assentaram, pois, na ideia da natureza penal da inibição da faculdade de conduzir constante do Código da Estrada – de algum modo deixando sugerido que diversa seria (ou poderia ser) a posição assumida se essa medida constituísse sanção acessória duma contraordenação.

Ponderou-se, de todo o modo, a este propósito, que apenas por via legislativa se poderia porventura vir a operar uma tal modificação de índole jurídica das infracções em causa e correspondentes sanções: “Enquanto reacção acessória de certas infracções, pelo que se disse, nunca ela (a inibição de conduzir) poderia perder a natureza de reacção penal enquanto o legislador não transformasse em contraordenação as infracções penais a que actualmente se encontra ligada.”

A perspectiva assim adoptada conduziu, consequentemente, este corpo consultivo, no parecer nº 82/87, de 3 de Dezembro de 1987, a entender que:

“1º- No caso de autuação por infracção estradal a que corresponda multa e inibição da faculdade de conduzir é inadmissível o pagamento voluntário da multa nos termos do artigo 70º, nº 1, do Código da Estrada.”

Com efeito, se a inibição da faculdade de conduzir teria, em todo o caso, sempre de ser decretada pelo tribunal, deixava de ter cabimento a possibilidade de pagamento voluntário da multa, “ditado fundamentalmente por razões de interesse público de simplificação e aligeiramento do processo contravencional.”


5.

5.1 – A questão de constitucionalidade acabada de abordar foi naturalmente considerada por este Conselho a propósito de duas Convenções do Conselho da Europa em cujo âmbito se suscita a possibilidade de execução, no Estado da residência, de inibição de conduzir decretada por autoridade administrativa do Estado da infracção.

O primeiro desses instrumentos internacionais é a Convenção Europeia para a Repressão das Infracções de Estrada, de 30 de Novembro de 1964.

Prevê-se, na verdade, no respectivo artigo 1º, que:

“Artigo 1º

1. Quando uma pessoa com residência habitual no território de uma Parte Contratante tiver cometido uma infracção rodoviária no território de uma outra Parte Contratante, o Estado da infracção poderá ou, se a sua lei interna assim o determinar, deverá pedir ao Estado da residência o exercício do correspondente procedimento se ele próprio o não instaurar ou, tendo-o instaurado, se considerar impossível prosseguir até à decisão definitiva ou à execução integral da sanção.

2. Quando uma sentença ou decisão administrativa se torne executória no Estado da infracção depois de o autor desta ter tido a oportunidade de apresentar a sua defesa, este Estado poderá pedir ao Estado da residência a execução da referida sentença ou decisão.

3. O Estado da residência dará seguimento ao pedido de procedimento ou de execução nas condições a seguir fixadas. No entanto, a execução das decisões proferidas à revelia será facultativa.”

Aliás, o artigo 24º, al. f) da dita Convenção explicita que, para os respectivos fins,

“f) a expressão “decisão administrativa” aplica-se às decisões proferidas em certos Estados, por autoridades administrativas competentes para decretar as sanções previstas na lei, para a repressão de determinadas categorias de infracções rodoviárias”.

Chamado a pronunciar-se sobre a assinatura da Convenção em causa, este Conselho, no Parecer nº 23/78, de 14 de Novembro de 1978, não deixou de ponderar que:

“Ora, no sistema jurídico português apenas as autoridades judiciais, e não as administrativas, têm competência para decretar sanções para repressão de quaisquer infracções. Assim sendo, afigura-se indiscutível que Portugal deve declarar que não aceita a obrigação de executar no seu território as decisões das autoridades administrativas estrangeiras – mesmo quando competentes à face dos respectivos ordenamentos nacionais – que imponham sanções para repressão de quaisquer categorias de infracções rodoviárias.”

Por estas razões, e conquanto se admitisse que a faculdade de recusa da execução consignada no artigo 9º, nº 2, alínea c) ([15]) já daria satisfação “às preocupações manifestadas relativamente às decisões das autoridades administrativas em matéria de repressão penal”, entendeu-se que, “por cautela”, deveria desde logo formular-se uma reserva a tal respeito.

Por isso se concluiu, nomeadamente, que:

“2. Portugal deve declarar que recusa a execução, no seu território, de decisões de autoridades administrativas estrangeiras que tenham por objecto a repressão de infracções rodoviárias.”


5.2 –Em 3 de Junho de 1976, foi assinada, em Estrasburgo, a “Convenção Europeia sobre os Efeitos Internacionais de Inibição do Direito de Conduzir Veículos a Motor”.

Esta Convenção está intimamente relacionada com a antes referida, assentando numa idêntica noção de infracção rodoviária e reportando-se a um idêntico elenco (designado “Fundo Comum”) de infracções de tal natureza.

Semelhantemente, estabelece o seu artigo 1º, al. a), que:

“Artigo 1º
Nos termos da presente Convenção:
a) a expressão “inibição do direito de conduzir” (adiante designada por “inibição de conduzir”) significa qualquer medida definitiva que tenha por objectivo restringir o direito de conduzir do condutor que tenha cometido uma infracção rodoviária. Esta medida tanto pode ser uma pena principal como uma pena acessória ou uma medida de segurança e pode ter sido aplicada por uma autoridade judicial ou administrativa.”

No parecer nº 99/84, de 22 de Fevereiro de 1985, proferido sobre o mencionado instrumento internacional, este corpo consultivo não deixou de chamar a atenção para a posição assumida no parecer nº 23/78, acerca da inviabilidade de execução, em Portugal, de decisões de inibição de conduzir emandas de autoridades administrativas.

No tocante à Convenção sobre “Efeitos Internacionais da Inibição do Direito de Conduzir”, suscitava-se, ademais, o problema decorrente de a mesma não prever a formulação de quaisquer reservas nem a possibilidade de, em certas situações, ser recusada a execução de determinadas decisões de inibição.

De todo o modo, e atendendo a que estavam, então, em curso trabalhos preparatórios de revisão, tanto do Código da Estrada, como do Código de Processo Penal, a qual poderia produzir importantes alterações na regulamentação da matéria em causa, concluíu-se no sentido de que o processo de ratificação de ambas as aludidas Convenções – a conduzir e apreciar em conjunto, dada a íntima ligação existente entre elas – deveria “ter presente” essas previstas modificações a operar na ordem jurídica nacional.

5.3- Ambas as Convenções em causa vieram a ser assinadas por Portugal, mas, até à data, ainda não foram pelo nosso país ratificadas – presumivelmente em função de razões do tipo das alvitradas nos referidos pareceres deste Conselho.


6.

6.1. A Lei nº 63/93, de 21 de Agosto, veio autorizar o Governo a aprovar um novo Código da Estrada, definindo para tanto princípios gerais que alterariam substancialmente o enquadramento jurídico relativos às sanções por infracções rodoviárias.

Referimo-nos, nomeadamente, aos preceitos contidos nas seguintes alíneas do nº 2 do artigo 2º da mencionada Lei:

“a) A punição, como actos ilícitos de mera ordenação social, da violação das normas disciplinadoras do trânsito nas vias abertas ao trânsito público;
……………………………………………………………………….
d) A consagração da sanção acessória de inibição de conduzir, com o limite máximo de um ano de inibição por cada infracção;
……………………………………………………………………….
h) A atribuição ao pagamento voluntário da coima do efeito de aceitação da aplicação da sanção acessória de inibição, pelo mínimo;
……………………………………………………………………….
o) A adopção, como medida de segurança, da cassação da carta ou licença de condução quando, em face da gravidade das contraordenações praticadas e da personalidade do agente, este deva ser julgado inapto para a condução de veículo motorizado;
p) A interdição de obtenção de carta ou licença de condução, por período até três anos, em caso de cassação, da carta ou licença e condenação por condução de veículo motorizado sem habilitação legal.”

Os princípios acabados de transcrever foram concretizados no âmbito de novo Código da Estrada aprovado pelo Decreto-Lei nº 114/94, de 3 de Maio, nomeadamente através dos respectivos artigos 135º, 141º a 147, 150º, 151º, 152º e 154 – que nos dispensamos de transcrever, por terem sido parcialmente modificados pela revisão autorizada, pela Assembleia da República, mediante a Lei nº 97/97, de 23 de Agosto.

As alterações de fundo mais relevantes incluídas por este diploma parlamentar constam das seguintes alíneas do respectivo artigo 2º:

“a) A alteração do limite máximo da sanção de inibição de conduzir para dois anos;
b) O alargamento para cinco anos do período de ausência de contra-ordenações graves ou muito graves de que depende a dispensa ou atenuação especial da aplicação de sanção da inibição de conduzir;
……………………………………………………………………….
f) A adopção, como medida de segurança, da cassação da carta ou licença de condução quando, em face da gravidade das contra-ordenações praticadas e à personalidade do condutor, este deva ser considerado inidóneo para a condução de veículo com motor, bem como quando revele dependência ou tendência para abusar do álcool, estupefacientes ou psicotrópicos;
g) A possibilidade de prorrogação do prazo de interdição de obtenção de carta ou licença de condução por período de um a três anos, no caso de cassação da carta ou licença de condução;
h) A atribuição de competência aos tribunais para aplicarem a cassação da carta ou licença de condução, mediante promoção do Ministério Público, na sequência de comunicação administrativa, podendo aplicar-se os termos do processo penal comum ou sumaríssimo;
………………………………………………………………………”.


6.2- Das alterações produzidas no Código da Estrada, ao abrigo da Lei nº 97/97, pelo Decreto-Lei nº 2/98, de 3 de Janeiro, resultou a seguinte actual redacção para as normas com pertinência para a questão em análise:

“Artigo 133º
Legislação aplicável

1- As infracções às disposições deste Código e legislação complementar têm a natureza de contra-ordenações, salvo se constituírem crimes, sendo então puníveis e processadas nos termos gerais da lei penal.

2- As contra-ordenações são sancionadas e processadas nos termos da respectiva lei geral, com as adaptações constantes deste Código.

Artigo 139º
Inibição de conduzir

1- As contra-ordenações graves e muito graves são sancionadas com coima e com a sanção acessória de inibição de conduzir;

2- A sanção de inibição de conduzir tem a duração mínima de um mês e máxima de um ano, ou mínima de dois meses e máxima de dois anos, consoante seja aplicável às contra-–ordenações graves ou muito graves, respectivamente.

3. A sanção de inibição de conduzir é cumprida em dias seguidos e refere-se a todos os veículos a motor.

4. Quem conduzir veículo a motor estando inibido de o fazer por sentença transitada em julgado ou decisão administrativa definitiva é punido por desobediência qualificada.

Artigo 148º
Cassação da carta ou licença

1- O tribunal pode ordenar a cassação da carta ou licença de condução quando:
a) Em face da gravidade da contra-ordenação praticada e da personalidade do condutor, este deva ser julgado inidóneo para a condução de veículos a motor;
b) O condutor seja considerado dependente ou com tendência para abusar de bebidas alcoólicas ou de substâncias estupefacientes ou psicotrópicas.
2- É susceptível de revelar a inidoneidade para a condução de veículos a motor a prática, num período de cinco anos, de:
a) Três contra-ordenações muito graves;
b) Cinco contra-ordenações graves ou muito graves.
………………………………………………………………”.

Artigo 149º
Interdição da concessão de carta ou licença

1- Quando ordenar a cassação da carta ou licença de condução, o tribunal determina que não pode ser concedida ao seu titular nova carta ou licença de condução de veículos a motor, de qualquer categoria, pelo período de um a cinco anos.

2- Quando a cassação da carta ou licença de condução for ordenada ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo anterior, o período de interdição de concessão de carta ou licença de condução pode ser prorrogado por outro período de um a três anos se, findo o prazo determinado na sentença, o tribunal considerar que se mantém a situação que motivou a cassação.

3- O condutor a quem tiver sido cassada carta ou licença de condução só pode obter novo título após aprovação em exame especial, nos termos a fixar em regulamento.


CAPITULO III
Disposições processuais

SECÇÃO I
Regras do processo

Artigo 150º
Legislação aplicável

1- Às contra-ordenações previstas neste Código e legislação complementar são aplicáveis as normas gerais que regulam o processo das contra-ordenações, com as adaptações constantes dos artigos seguintes.

2- Se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contra-ordenação, a aplicação da sanção acessória, nos termos do nº 1 do artigo 136º, é da competência do tribunal competente para o julgamento do crime.

Artigo 153º
Cumprimento voluntário

1- É admitido o pagamento voluntário da coima, pelo mínimo, nos termos e com os efeitos dos números seguintes.

……………………………………………………………………

4- O pagamento voluntário da coima nos termos dos números anteriores determina o arquivamento do processo, salvo se a contra-ordenação for grave ou muito grave, caso em que prossegue restrito à aplicação da inibição de conduzir.”


6.3. Em síntese, afigura-se lícito afirmar que, presentemente, vigora o princípio geral de que as infracções estradais são qualificadas como contra-ordenações.

Este Conselho já proclamara, mesmo, no seu parecer nº 22/95, de 22 de Junho de 1995 ([16]), que “A grande novidade trazida pelo Código da Estrada de 94 consistiu na “Conversão” das contravenções ainda existentes em contra-ordenações”.

Isto, naturalmente, salvo se essas infracções constituirem também crimes – caso em que serão puníveis e processadas nos termos gerais da lei penal (CE, art. 133º, nº 1, parte final e 150º, nº 1).

O processamento da apreciação das referidas contra-–ordenações e aplicação das correspondentes sanções obedece, assim, salvo disposição especial em contrário, às regras gerais aplicáveis a esse tipo de infracções (CE, artigos 133º, nº 2 e 150º, nº 1).

Essa apreciação e aplicação cabem, pois, como regra, à autoridade administrativa competente (a Direcção-Geral de Viação), por força do artigo 33º do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro ([17]), que prescreve:

“Artigo 33º
Regra da competência das autoridades administrativas

O processamento das contra-ordenações e a aplicação das coimas e das sanções acessórias competem às autoridades administrativas, ressalvadas as especialidades previstas no presente diploma.”

Isto vale, nomeadamente, para a sanção acessória de inibição de conduzir consignada no artigo 139º - já que a tal respeito inexiste qualquer preceito especial em sentido diverso ([18]).

Diferente é a situação relativa às medidas de cassação da carta ou licença de condução e de interdição da concessão da carta ou licença, cuja aplicação os artigos 148º e 149º, respectivamente, do Código da Estrada, atribuem expressamente aos tribunais ([19]).

Não é líquida a natureza jurídica das aludidas cassação e interdição. Para uns, trata-se de medidas de segurança, sem qualquer especificação ([20]). Falam outros de “espécie de medida de segurança embora sem natureza criminal” ([21]), ou de “medida de segurança de direito estradal” ([22]). Este Conselho, no parecer nº 1/96, de 10 de Julho de 1996, preferiu falar, por não ter de então tomar posição definida sobre o assunto, em “medida de segurança sui generis”, - não sem contudo deixar de sublinhar que o facto de se tratar de medidas da competência dos tribunais lhes não conferia natureza penal.


7.

7.4- A lei penal em vigor contempla, por seu turno, medidas similares ou análogas às acabadas de mencionar, inseridas no Código da Estrada.

O Código Penal estabelece, como princípios gerais relativos a penas acessórias e efeitos das penas (Capítulo III, artigo 65º), o de que “a lei pode fazer corresponder a certos crimes a proibição do exercício de determinados direitos ou profissões “ (nº 2) – conquanto salvaguarde que “nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de direitos civis, profissionais ou políticos” (nº 1).

Neste enquadramento sistemático surge, como pena acessória, a proibição de conduzir veículos motorizados, assim caracterizada no artigo 69º do Código:

“Artigo 69º
(Proibição de conduzir veículos motorizados)

1. É condenado na proibição de conduzir veículos motorizados por um período fixado entre 1 mês e 1 ano quem for punido:
a) Por crime cometido no exercício daquela condução com grave violação das regras do trânsito rodoviário; ou
b) Por crime cometido com utilização de veículo e cuja execução tiver sido por este facilitada de forma relevante.
2. A proibição produz efeito a partir do trânsito em julgado da decisão e pode abranger a condução de veículos motorizados de qualquer categoria ou de uma categoria determinada.
3. A proibição de conduzir é comunicada aos serviços competentes e implica, para o condenado que for titular de licença de condução, a obrigação de a entregar na secretaria do tribunal ou em qualquer posto policial que a remeterá àquela. Tratando-se de licença emitida em país estrangeiro, com valor internacional, a entrega é substituída por anotação, naquela licença, da proibição decretada.
4. Não conta para o prazo da proibição o tempo em que o agente estiver privado da liberdade por força de medida de coacção processual, pena ou medida de segurança.
5. Cessa o disposto no nº 1 quando, pelo mesmo facto, tiver lugar a aplicação da cassação ou da interdição da concessão de licença, nos termos dos artigos 101º e 102º ([23])”

Comentando esta norma, MAIA GONÇALVES ([24]) chama a atenção para a sua similitude com a sanção acessória (de contra-ordenação) hoje prevista no artigo 139º do Código da Estrada, ponderando: “O conteúdo é idêntico ao da proibição de conduzir veículos motorizados deste artigo do CP, mas tem natureza administrativa e é apenas aplicável à condução de veículos, motorizados ou não, para que seja necessário habilitação legal, enquanto que a sanção deste art. 69º só é aplicável à condução de veículos motorizados, seja ou não necessária habilitação legal para a respectiva condução” ([25]).

Mas o paralelismo, em termos sancionatórios, entre a legislação penal e a contra-ordenacional, não fica por aqui.

Assim é que, enquadradas nas “medidas de segurança não privativas da liberdade”, o Código Penal analogamente consagra, nos termos a seguir expostos, providências de cassação da licença e interdição da concessão da licença de condução de veículo motorizado:

“Artigo 101º
(Cassação da licença e interdição da concessão da licença de condução de veículo motorizado)

1. Em caso de condenação por crime praticado na condução de veículo motorizado ou com ela relacionado, ou com grosseira violação dos deveres que a um condutor incumbem, ou de absolvição só por falta de imputabilidade, o tribunal decreta a cassação da licença de condução quando, em face do facto praticado e da personalidade do agente:
a) Houver fundado receio de que possa vir a praticar outros factos da mesma espécie; ou
b) Dever ser considerado inapto para a condução de veículo motorizado.
2. É susceptível de revelar a inaptidão referida na alínea b) do número anterior a prática, entre outros, de factos que integram os crimes de:
a) Omissão de auxílio, nos termos do artigo 200º, se for previsível que dele pudessem resultar graves danos para a vida, o corpo ou a saúde de alguma pessoa;
b) Condução perigosa de veículo rodoviário, nos termos do artigo 291º;
c) Condução de veículo em estado de embriaguez, nos termos do artigo 292º; ou
d) Facto ilícito típico cometido em estado de embriaguez, nos termos do artigo 295º, se o facto praticado for um dos referidos nas alíneas anteriores.
3. Quando decretar a cassação da licença de condução, o tribunal determina que ao agente não pode ser concedida nova licença de condução de veículos motorizados, de qualquer categoria ou de uma categoria determinada. É correspondentemente aplicável o disposto nos nºs 3 e 4 do artigo 69º.
4. Se o agente relativamente ao qual se verificarem os pressupostos dos nºs 1 e 2 não for titular de licença de condução, o tribunal limita-se a decretar a interdição de concessão de licença, nos termos do número anterior, sendo a sentença comunicada à entidade competente. É correspondentemente aplicável o disposto no nº 4 do artigo 69º.
5. Se contra o agente tiver sido já decretada interdição de concessão de licença nos 5 anos anteriores à prática do facto, o prazo mínimo de interdição é de 2 anos.
6. É correspondentemente aplicável o disposto nos nºs 2, 3 e 4 do artigo 100º.
7. Quando seja decretada cassação da licença ou carta, a obtenção de novo título, quando possível, depende de exame especial.”

Também a respeito desta providência MAIA GONÇALVES ([26]) refere que “O Código da Estrada prevê no artigo 150º (hoje 148º) a aplicação de uma medida de conteúdo e efeito idêntico aos deste artigo do CP”, acrescentando que tem, todavia, “natureza administrativa”.

Por seu turno, Germano Marques da Silva ([27]), depois de afirmar que a cassação consiste na “invalidação da licença de que o agente seja titular e na proibição de obtenção de nova licença de qualquer categoria ou de categoria determinada por um determinado período”, acrescenta, similarmente, que “também o Código da Estrada prevê a aplicação de uma medida de conteúdo e efeito idênticos (artigo 150º do CE) ([28]), sendo diversa apenas nos respectivos pressupostos da sua aplicação e no período de interdição de obtenção da nova licença. Diferentemente da medida de segurança penal prevista no artigo 101º do Código Penal, a medida de segurança prevista no Código da Estrada tem natureza administrativa”.


7.2. O Código de Processo Penal curou, naturalmente, de regular o procedimento correspondente à aplicação da decisão de proibição de condução, fazendo-o nos seguintes moldes:


“Artigo 500º
Proibição de condução

1- A decisão que decretar a proibição de conduzir veículos motorizados é comunicada à Direcção-Geral de Viação.
2- No prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da sentença, o condenado entrega na secretaria do tribunal, ou em qualquer posto policial, que a remete àquela, a licença de condução, se a mesma não se encontrar já apreendida no processo.
3- Se o condenado na proibição de conduzir veículos motorizados não proceder de acordo com o disposto no número anterior, o tribunal ordena a apreensão da licença de condução.
4- A licença de condução fica retida na secretaria do tribunal pelo período de tempo que durar a proibição. Decorrido esse período a licença é devolvida ao titular.
5- O disposto nos nºs 2 e 3 é aplicável à licença de condução emitida em país estrangeiro.
6- No caso previsto no número anterior, a secretaria do tribunal envia a licença à Direcção-Geral de Viação, a fim de nela ser anotada a proibição. Se não for viável a apreensão, a secretaria, por intermédio da Direcção-Geral de Viação, comunica a decisão ao organismo competente do país que tiver emitido a licença.”


8.

8.1. Parece legítimo sintetizar, em termos esquemáticos, o regime acabado de descrever, apontando que, no ordenamento jurídico português actual, vigoram:

a) Duas medidas de proibição de conduzir por certo período, com conteúdo idêntico, mas:
- uma constituindo uma pena acessória, de natureza criminal, aplicável pelos tribunais;
- outra consistindo numa sanção acessória de natureza contraordenacional, decretada administrativamente.
b) Dois conjuntos de providências, com igual conteúdo, de cassação de licença de condução e de interdição de concessão de licença por certo prazo:
- um deles desdobrando-se em correspondentes medidas de segurança de índole penal, decretadas judicialmente;
- o outro constituído por medidas de segurança sem carácter penal (mas sim “administrativa”, ou estradal), embora também da competência dos tribunais.

Esta dicotomia sancionatória, de feição penal, por um lado, de índole estradal, por outro, já foi objecto de crítica, em termos de política legislativa, por parte de Anabela Rodrigues ([29]) – até por as sanções em causa se reportarem a factos e situações que, por vezes, podem parcialmente coincidir.

A autora mencionada põe, mesmo, em causa a constitucionalidade da medida de segurança estradal de cassação da licença de conduzir, que entende poder desrespeitar o princípio da proporcionalidade.

Esta última posição apresenta-se, contudo, de algum modo isolada na doutrina e na jurisprudência que sobre a matéria se têm pronunciado.

De todo o modo, o que é facto é que, não tendo sido posta em causa a sua constitucionalidade nos termos previstos na Lei Fundamental, tal regime vigora efectivamente na nossa ordem jurídica.


8.2. A apontada circunstância de o mesmo facto poder constituir crime e contraordenação estradal é susceptível de criar um problema de razoabilidade e proporcionalidade, se a cada uma dessas infracções corresponderem sanções acessórias, de carácter diferente, também, mas com conteúdo idêntico.

Afigura-se que Germano Marques da Silva ([30]) propõe para esta questão uma solução lógica e afastada, ao ponderar que:

“Quando o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contra-ordenação, o agente será punido a título de crime, sem prejuízo da aplicação das sanções acessórias previstas para a contra-ordenação (artigo 20º do DL nº 433/82 e 138º do Código da Estrada). É o que se passa com a condução sob o efeito do álcool, quando a TAS for igual ou superior a 1,2g/l.

A regra atrás enunciada pode suscitar algumas dificuldades, nomeadamente quando por força da norma penal for aplicável ao agente do facto a sanção penal acessória de proibição de conduzir veículos motorizados. Com efeito, se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contra-ordenação e a norma penal previr a aplicação de sanção acessória com conteúdo material idêntico à prevista no Código da Estrada, o princípio resultante do artigo 20º do DL nº 433/82 e 138º do Código da Estrada tem necessariamente de ser interpretado em termos amplos, sob pena de o agente ser punido plurimamente com sanções de conteúdo material idêntico pela prática do mesmo facto.

A mesma razão que justifica que o mesmo facto não seja cumulativamente punido como crime e como contra-ordenação justifica também que ao agente não sejam cumulativamente aplicáveis as sanções acessórias previstas para o crime e para a contra ordenação, quando o facto seja o mesmo, sobretudo quando as sanções acessórias aplicáveis tenham idêntico conteúdo e idêntica finalidade. Não o justificaria o fim das sanções, sejam de natureza penal ou de mera ordenação social.

A interpretação que atrás defendemos parece-nos também a que se impõe em razão do princípio da proporcionalidade que o artigo 18º da CRP consagra.

Na verdade, devendo as restrições dos direitos limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, parece-nos que uma dupla restrição, com a mesma finalidade, quando na aplicação concreta se entendeu que uma delas não deveria atingir o máximo legalmente consentido, carece de necessidade.”


9.

9.1- A descriminalização operada, através do Código da Estrada de 1994, em relação às infracções rodoviárias, conferindo-lhes a todas a natureza de contra-ordenações, teve por consequência o desaparecimento do obstáculo que antes se opunha, em termos gerais, à ratificação, por Portugal, de convénios que, nesta área, admitissem a aplicação da inibição de conduzir por via administrativa.

Revela-o, aliás, o facto de, em resultado dessa descriminalização, e apesar de continuarem a vigorar, neste âmbito, penas acessórias e medidas de seguranças penais, a aplicar por via judicial, e até medidas de segurança “estradais” também da competência dos tribunais, a ordem jurídica portuguesa ter passado a integrar, em relação às contra-ordenações rodoviárias, uma sanção acessória de inibição de conduzir a decretar pela Administração Pública.


9.2- A aplicação, em Portugal, deste último tipo de sanção, enquanto determinada noutro Estado, passou, de resto, a ser possibilitada pelo novo regime de “cooperação judiciária em matéria penal”, aprovado pela Lei nº 144/99, de 31 de Agosto.

Na verdade, o regime de cooperação judiciária internacional antes vigente, definido no Decreto-Lei nº 43/91, de 22 de Janeiro, não previa a possibilidade de execução, no nosso país, de decisões sancionatórias tomadas, no estrangeiro, por via administrativa.

Reconheciam-no, aliás, expressamente, Lopes Rocha e Teresa Alves Martins ([31]), quando, ao comentarem o nº 2 do artigo 2º desse Decreto-Lei - que dispunha: “Exclui-se do âmbito do presente diploma a cooperação relativa a procedimentos penais que não relevam da competência das autoridades judiciárias do Estado requerente” -, ponderavam:

“3. O nº 2 significa que a cooperação é restrita a processos da competência das autoridades judiciárias, o que, desde logo, exclui aqueles que são da competência exclusiva das autoridades administrativas.
Casos residuais de intervenção de entidades administrativas são os previstos nos artigos 150º a 152º, no âmbito do auxílio geral em matéria penal regulado no título VI.
6. A cooperação internacional regulada no presente diploma cinge-se claramente ao domínio penal, como se infere do preâmbulo e resulta de variadas disposições. Não parece, assim, que a cooperação se estenda ao processo de contra-ordenação, regulado no Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, não obstante este processo (capítulo IV) prever a possibilidade de abertura de uma fase judicial.
Eventualmente, tal cooperação será admissível em casos de concurso de infracções, de remessa do processo ao Ministério Público por a entidade administrativa considerar que a infracção constitui crime, de conversão em processo criminal, e de o processo versar sobre crimes e contra-ordenações, previstos e regulados nos artigos 20º, 38º, 40º, 56º, 76º, 77º e 78º daquele decreto-lei.
Fora destes casos, a cooperação deve ter-se por excluída, ainda que o processo permita recorrer ao juiz, em sede de impugnação da decisão da autoridade administrativa.
Questão mais difícil é a de saber se, tratando-se de processo penal da competência de uma autoridade administrativa, todavia, a lei do Estado requerente permite fazer apelo ao juiz, o que acontece em alguns países.
Neste caso, pelo menos relativamente à fase processual em que intervém o juiz, parece não haver razões para recusar a cooperação, se outros motivos de recusa não concorrerem.”
Em contraposição, o artigo 1º da Lei nº 144/99, ao definir o âmbito de aplicação da cooperação judiciária a que se reporta, afirma, expressamente, no seu nº 3, que:

“3. O presente diploma é subsidiariamente aplicável à cooperação em matéria de infracções de natureza penal, na fase em que tramitem perante autoridades administrativas, bem como de infracções que constituam ilícito de mera ordenação social, cujos processos admitam recurso judicial”.

Consequentemente, dispõe-se, no mesmo diploma, acerca da execução das decisões proferidas por autoridades administrativas, que:

“Artigo 97º
Execução de decisões proferidas por autoridades administrativas

1- É também possível a execução de decisões finais proferidas em processos por infracções a que se refere o nº 3 do artigo 1º, desde que o interessado tenha tido a possibilidade de recorrer a uma instância jurisdicional.
2- A transmissão de pedido de execução efectua-se conforme o disposto dos tratados, convenções ou acordos de que Portugal seja parte ou, na sua falta, através da Autoridade Central, nos termos previstos neste diploma.”


9.2- Se, em abstracto, a mera admissão de decisões administrativas de inibição de conduzir deixou de constituir óbice, sob a perspectiva da constitucionalidade, à ratificação duma Convenção do tipo da que ora se aprecia, isso não significa que, em concreto, não possam verificar-se tipos de situações que exijam, de todo o modo, uma análise mais específica.

Trata-se, por um lado, da possibilidade de a certo facto ou situação corresponder, no Estado da infracção, uma sanção inibitória de natureza judicial, enquanto que em Portugal, como Estado da residência, a reacção para tanto prevista consistiria tão-somente numa decisão de inibição de conduzir de carácter administrativa.
E, por outro lado, em contraponto, da hipótese de, no Estado da infracção, a inibição de conduzir ter sido decretada por via administrativa, enquanto que, no nosso país, a facto ou situação dessa índole corresponderia uma decisão de “inibição de conduzir” (no sentido lato utilizado pela Convenção) decidida pelo tribunal, ou por se tratar de pena acessória criminal, ou por estar em causa “medida de segurança” rodoviária ou estradal.

Quanto à primeira das mencionadas situações, não parece suscitar-se dificuldade de maior, nomeadamente sob a perspectiva constitucional.

A decisão tomada no Estado da infracção tem a natureza de sentença judicial, e é este mesmo acto que, enquanto tal, poderá, preenchidos certos requisitos, ser executado em Portugal.

Isso se deduz, com nitidez, das regras de cooperação judiciária penal constantes do Código de Processo Penal e da Lei nº 144/99, em particular dos artigos 234º e 95º, respectivamente, do primeiro e segundo desses diplomas:

“Artigo 234º
(Necessidade de revisão e confirmação)

1. Quando, por força da lei ou de tratado ou convenção, uma sentença penal estrangeira dever ter eficácia em Portugal, a sua força executiva depende de prévia revisão e confirmação.
………………………………………………………………………”.

“Artigo 95º
Princípio

1. As sentenças penais estrangeiras, transitadas em julgado, podem ser executadas em Portugal nas condições previstas neste diploma.
…………………………………………………….………………”.

Segundo o regime geral definido nestes diplomas, pois, as sentenças estrangeiras, para serem executadas em Portugal, têm de ser revistas e confirmadas judicialmente por tribunal português – mas, uma vez revistas e confirmadas, são elas próprias, sentenças estrangeiras, a ser executadas na nossa ordem jurídica, enquanto decisões judiciais.

Isto é corroborado, de resto, pelo preceituado no artigo 101º da Lei nº 144/99, quando dispõe:


“Artigo 101º
Direito aplicável e efeito da execução

1. A execução de uma sentença estrangeira faz-se em conformidade com a lei portuguesa.
2. As sentenças estrangeiras executadas em Portugal produzem os efeitos que a lei portuguesa confere às sentenças proferidas pelos tribunais portugueses”.


Os efeitos das ditas sentenças estrangeiras, em Portugal, após revistas e confirmadas, consubstanciam-se, deste modo, em efeitos de decisões judiciais – e não de qualquer outro acto sancionatório, eventualmente de índole administrativa, porventura aplicável, em Portugal, se se tratasse de infracção cometida no nosso país.

E se assim é no tocante à execução de sentenças penais, também o deverá ser no concernente a decisões judiciais estrangeiras proferidas em procedimentos não penais relativos à inibição de conduzir. Se a Lei nº 144/99 não o diz explicitamente, tal é a conclusão que pode extrair-se da economia desse diploma; por um lado, atentando no claro propósito de nele se abarcar a cooperação judiciária em sede de contra-ordenações sociais (artigo 1º, nº 3)); por outro, por maioria de razão, tendo em consideração que o regime relativo à execução das sentenças penais é mandado aplicar até às decisões administrativas tomadas em matéria contraordenacional (artigo 97º, nº 1).

Não se detecta, sob este prisma, qualquer incompatibilidade com o teor da nossa Lei Fundamental.

Se esta cura, sobretudo, de garantir os direitos da defesa no procedimento penal (ou sancionatório, em geral), em nada se poderá ter por afectada por este aparente “excesso” de garantia que possa transparecer do facto da adopção, num Estado que não o nosso, da via judicial para decretar certas medidas de inibição de condução que, a serem aplicadas em Portugal, assumiriam natureza administrativa.


9.3. Maior dificuldade implica o tratamento a dar à questão inversa, ou seja, a que se traduz na execução de decisões de inibição de conduzir de índole administrativa, proferidas em país estrangeiro, relativas a factos ou situações aos quais corresponderiam, na ordem jurídica portuguesa, decisões de inibição de natureza judicial – quer enquanto penas criminais acessórias, quer enquanto medidas de segurança, penais ou de carácter “estradal”.

A dificuldade da abordagem deste problema surge agravada pela circunstância de a Convenção em análise não consentir a formulação de qualquer reserva. Com efeito, o seu artigo 17º é expresso em proclamar que:

“Artigo 17º
Não são admitidas reservas em relação à presente convenção”.

Tudo ponderado, afigura-se que não seria aceitável - embora, como se constatou, admitida, em termos gerais, pela Lei nº 144/99 (arts. 1º, nº 3 e 97º - a execução de tais decisões operada pela via administrativa.

Trata-se, com efeito, de factos ou situações relativamente aos quais o ordenamento português considera que as decisões de inibição de conduzir (no sentido lato da Convenção) que lhes correspondam há-de ser tomadas pelos tribunais – quer em função da superior garantia que proporciona o procedimento que perante estes corre, quer por atenção à gravidade do cerceamento de direitos que implicam.

Note-se, aliás, que esta terá sido, em boa verdade, a razão que terá fundamentado a não ratificação, por Portugal, de convenções anteriores que admitiam a inibição de conduzir por acto da Administração Pública, em época em que uma tal decisão só poderia, na nossa ordem jurídica, provir dum tribunal.

Com efeito, a verdadeira razão dessa não ratificação não terá sido, propriamente e enquanto tal, o facto de a lei portuguesa não permitir, então, genericamente, a inibição de condução por acto administrativo.

O real fundamento de tal atitude terá consistido, a nosso ver, na circunstância de, para os casos ou situações em que certas legislações estrangeiras consentiam a inibição de conduzir por via administrativa, a nossa lei exigir que uma tal decisão só pudesse consistir numa sentença judicial.

Acresce que, se se adoptasse a posição contrária à que aqui se preconiza, passariam a efectivar-se e a subsistir, no seio da ordem jurídica portuguesa, para o mesmo tipo de factos ou situações, decisões de inibição de conduzir de natureza diversa, umas administrativas, outras judiciais.

É certo que uma análoga situação de desigualdade ocorrerá na hipótese, que considerámos admissível, abordada no anterior nº 9.2. Só que, aí, essa desigualdade ocorre no sentido de um reforço de garantias, em relação às impostas pela lei portuguesa, o que não se apresenta inconciliável com o espírito desta; aqui, ao invés, a disparidade traduzir-se-ia numa redução de garantias face às proporcionadas pelo nosso ordenamento jurídico – o que constituirá motivo para a rejeitar, dado tratar-se de decisões que, umas e outras, seriam executadas e aplicadas no âmbito da ordem jurídica portuguesa.

Pensamos, não obstante, que este problema pode ser satisfatoriamente resolvido nos termos da Convenção em estudo, e por forma compatível com o direito português.

É que a Convenção admite três modos de execução, pelo Estado da residência, das decisões de inibição de conduzir tomadas no Estado da infracção. Tais modalidades são, em termos gerais, a da execução da decisão estrangeira enquanto tal, da sua revisão e confirmação e a da respectiva conversão em decisão nacional. Os Estados devem, ao comunicar ao Secretário-Geral do Conselho da Europa a conclusão das formalidades internas que constituem condição da sua vinculação à Convenção, indicar, em declaração (susceptível de posterior substituição), por qual dessas modalidades de execução optam.

Tanto é o que resulta do artigo 4º da Convenção, do seguinte teor:

“Artigo 4º

1. Sob reserva do disposto no artigo 6º, o Estado da residência que tenha sido notificado nos termos do artigo 3º executará sem demora de um dos seguintes modos a decisão de inibição de conduzir tomada no Estado da infracção:
a) Dando execução directa à decisão de inibição de conduzir, caso em que tomará em consideração a parte do período de inibição de conduzir fixado pelo Estado da infracção que já tiver sido cumprida neste último; ou
b) Dando execução à decisão de inibição de conduzir por meio de uma decisão judicial ou administrativa nas condições referidas no nº 2; ou
c) Convertendo a decisão de inibição de conduzir numa decisão judicial ou administrativa própria, substituindo assim, sem prejuízo do artigo 11º, a decisão do Estado da infracção por uma nova decisão nas condições referidas no nº 3 do presente artigo.
2. Se aplicar o procedimento referido na alínea b) do nº 1, o Estado de residência:
a) Tomará em consideração a parte do período de inibição de conduzir fixado pelo Estado da infracção que já tiver sido cumprida neste Estado;
b) Poderá reduzir a duração do período de inibição de conduzir embora exclusivamente ao prazo máximo previsto para factos da mesma natureza no seu direito nacional;
c) Não prolongará a duração do período de inibição de conduzir fixado pelo Estado da infracção.
3. Se aplicar o procedimento referido na alínea c) do nº 1, o Estado de residência:
a) Ficará vinculado aos factos constatados na medida em que estes constem explícita ou implicitamente da decisão de inibição de conduzir no Estado da infracção;
b) Tomará em consideração a parte do período de inibição de conduzir fixado pelo Estado da infracção que já tenha sido cumprida neste Estado;
c) Poderá reduzir a duração do período de inibição de conduzir por forma a alinhá-la pela que, nos termos do seu direito nacional, teria sido aplicada ao caso em questão;
d) Não prolongará a duração do período de inibição de conduzir fixado pelo Estado da infracção;
e) Não poderá substituir a decisão de inibição de conduzir por uma sanção pecuniária ou qualquer outra medida.
4. Ao dar execução, nos termos do presente artigo, a uma decisão de inibição de conduzir, o Estado de residência deverá, eventualmente, fixar a data a partir da qual a decisão de inibição de conduzir é aplicável.
5. Ao proceder à notificação referida no nº 2 do artigo 15º, cada Estado-membro indicará, numa declaração, qual dos procedimentos previstos no nº 1 do presente artigo aplicará na sua qualidade de Estado de residência.
A declaração feita pode ser substituída, em qualquer momento, por uma nova declaração.”

Importa, todavia, ter em conta em que moldes o próprio Conselho, do qual emanou o texto da Convenção, entende o significado e alcance da escolha a fazer ao abrigo dos artigos 4º e 15º, nº 2, deste instrumento internacional.

Lê-se, com efeito, no Relatório Explicativo da Convenção ([32]), a propósito do citado artigo 4º:

“É também possível para um Estado-membro declarar que irá aplicar um destes métodos como regra geral, mas que aplicará um dos outros métodos em certos casos, a especificar na sua declaração por referência a critérios objectivos.
Por exemplo, um Estado-Membro poderá declarar que, regra geral, irá aplicar a alínea a) do nº 1 (execução directa), mas que aplicará a alínea b) do nº 1 (execução imediata) nos casos em que a duração da inibição de conduzir imposta pelo Estado da infracção exceda o período máximo previsto para actos da mesma natureza no Estado-Membro que faz a declaração”.

Nos termos da Convenção, é assim possível, pois, que Portugal declare que, como sistema geral, escolhe o de dar execução à decisão de inibição de conduzir por meio de uma decisão judicial ou administrativa nos termos dos nºs 1, al. b) e 2 do artigo 4º da Convenção.

Este sistema corresponde, na essência, ao regime de revisão e confirmação da sentença (ou, hoje, também da decisão administrativa) estrangeira que a nossa lei consagra como procedimento geral – consoante decorre dos artigos 234º e seguintes do Código de Processo Penal e artigos 100º e seguintes da Lei nº 144/99.

Mas a Convenção admite, pois, que o Estado-Membro declare que, para certas situações específicas, definidas segundo critérios objectivos, esse país escolha um outro dos três regimes de execução propostos.

No caso concreto em apreciação, tratar-se-ia de Portugal declarar que, ao abrigo dessa interpretação do Relatório Explicativo, escolhia o sistema da conversão – em decisão judicial, nos termos da legislação portuguesa – das decisões administrativas estrangeiras sobre inibição de conduzir correspondentes a factos ou situações relativamente aos quais a lei dos nosso país exija que uma tal decisão seja necessariamente da competência dum órgão judicial.

Afigura-se que a caracterização deste regime especial obedece a critério nitidamente objectivo – e de fácil enquadramento -, único requisito que, nos termos convencionais, se impõe para que essa declaração especial seja possível.

O procedimento assim proposto também se apresenta compatível com o ordenamento nacional.

É que as acima mencionadas regras que definem o regime de revisão e confirmação de sentenças (e decisões administrativas) estrangeiras têm, essencialmente, carácter suplectivo, cedendo perante disposições diversas constantes de tratados ou convenções internacionais.

É isso que decorre dos artigos 229º do Código de Processo Penal e 3º da Lei nº 144/99, respectivamente do seguinte teor:

Código de Processo Penal

“Artigo 229º
(Prevalência dos acordos e convenções internacionais)

As rogatórias, a extradição, a delegação do procedimento penal, os efeitos das sentenças penais estrangeiras e as restantes relações com as autoridades estrangeiras relativas à administração da justiça penal são reguladas pelos tratados e convenções internacionais e, na sua falta ou insuficiência, pelo disposto em lei especial e ainda pelas disposições deste livro”.

“Lei nº 144/99
“Artigo 3º

Prevalência dos tratados, convenções e acordos internacionais

1- As formas de cooperação a que se refere o artigo 1º regem-se pelas normas dos tratados, convenções e acordos internacionais que vinculem o Estado Português e, na sua falta ou insuficiência, pelas disposições deste diploma.

2- São subsidiariamente aplicáveis as disposições do Código de Processo Penal”.

Deste modo, a superação da dificuldade acima detectada poderá, não só ao abrigo da Convenção, mas também em moldes compatíveis com o ordenamento jurídico português, ocorrer através da conversão, de decisões administrativas de inibição de conduzir proferidas em país estrangeiro, em decisões emanadas por tribunal português, desde que relativas a factos ou situações a que, no nosso Direito, corresponderia medida desse tipo mas tomada pela via judicial.



10.

Um outro problema de possível desconformidade com princípios consagrados na nossa Lei Fundamental pode ocorrer a respeito de eventuais decisões de inibição de conduzir que, no Estado (estrangeiro) da infracção, se configurem como efeitos necessários de certas penas.

Na realidade, a forma ampla como na Convenção vem caracterizado o seu campo de aplicação parece não excluir deste decisões daquele tipo.

A Convenção assenta, com efeito, na seguinte definição de “decisão de inibição de conduzir”:

“Artigo 1º
Para efeitos da presente Convenção, entende-se por:

a) “Decisão de inibição de conduzir”, qualquer medida, relacionada com a prática de uma infracção rodoviária, que tenha por efeito retirar ou suspender o direito de conduzir do condutor de um veículo a motor e da qual já não cabe recurso. Essa medida pode consistir quer numa sanção principal, complementar ou acessória, quer numa medida de segurança, e pode ser tomada por uma autoridade judicial ou por uma autoridade administrativa;

…………………………………………………………………”.

A referência a “medida…tomada por uma autoridade judicial ou por uma autoridade administrativa” poderá sugerir que, na economia da Convenção, se pressupusesse sempre a existência de uma verdadeira decisão de aplicação da inibição em causa.

Todavia, a utilização do termo “medida” – melhor: “qualquer medida” -, de significado vago e pouco preciso, qualificado pela sua eficácia (“quer tenha por efeito retirar ou suspender o direito de conduzir”), não parece excluir sem mais a possibilidade de caberem também no âmbito da Convenção casos em que tal inibição constitua o efeito automático e necessário da aplicação de certa sanção ou da condenação por determinada infracção.

Esta eventualidade pode, ademais, surgir corroborada pela circunstância de se afirmar, genericamente, no preceito acima transcrito, que “essa medida pode consistir quer numa sanção principal, complementar ou acessória…” – sem se operar expressamente qualquer restrição no tocante à índole destas duas últimas modalidades.

Que este parece ser o critério que norteou a definição do campo de aplicação da Convenção pode mesmo resultar do modo como no já antes aludido Relatório Explicativo se explicita o sentido da alínea a) do respectivo artigo 1º:

1.1. A definição de “decisão de inibição de conduzir” na alínea a) reconhece a diversidade de legislações e sistemas relativos à decisão de inibição de conduzir que estão em funcionamento dos Estados-Membros. Nalguns países, a inibição de conduzir é imposta a título principal, por exemplo como parte de uma sanção criminal; noutros, é uma medida complementar ou acessória, eventualmente imposta como consequência de uma condenação; noutros ainda, pode ser imposta independentemente de uma condenação penal – mesmo por uma autoridade administrativa -, puramente como medida de segurança. Para efeitos da convenção, a expressão “decisão de inibição de conduzir” destina-se a abranger qualquer medida, relacionada com a prática de uma infracção rodoviária (1), que tenha por efeito retirar ou suspender a carta de condução ou o direito de conduzir (2).

A inibição de conduzir que porventura constitua efeito automático ou necessário da aplicação de certa pena não poderia, enquanto tal, ser executada no nosso país, por não se coadunar com o nº 4 do artigo 30º da Constituição, quando dispõe que:

“4. Nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos”.([33])

Apesar de directamente aplicável no âmbito penal, afigura-se que este princípio é extensível, de resto, a todo o domínio sancionatório, nomeadamente de índole contraordenacional – já que a este se aplicam, supletivamente, os princípios relativos ao direito criminal, nos termos do artigo 32º do Decreto-Lei nº 433/82 ([34]).

Face a esta verificação, entendemos que também a este propósito se justifica, ao abrigo dos artigos 4º, nº 1, al. c) e 15º, nº 2, da Convenção, emitir declaração no sentido de que medidas de inibição de condução que porventura decorram, necessária e automaticamente, da aplicação de determinada pena criminal ou sanção contraordenacional ou similar ([35]), serão executadas, em Portugal, mediante conversão numa decisão judicial ou contraordenacional própria.

Isto, portanto, para propiciar que a inibição de condução, a efectivar no nosso país, não constitua uma mera consequência “ope legis” de outra punição, mas sim o efeito duma decisão precedida de adequada ponderação das circunstâncias para tanto relevantes.

A este propósito surge, ainda, uma dificuldade que se não pode escamotear.

Trata-se do regime a aplicar em relação a medidas de inibição de condução que resultem, necessária e automaticamente, não já da aplicação de certa pena ou outra sanção, mas sim da condenação por certo crime ou outra infracção, contraordenacional ou administrativa.

Divergem, na nossa ordem jurídica, as opiniões a este respeito.

De uma banda, há quem, como GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA ([36]), considere que a proibição expressa no nº 4 do artigo 30º da Constituição se estende “também por identidade de razão aos efeitos automáticos ligados à condenação pela prática de certos crimes, pois não se vê razão para distinguir”.

Semelhante tem sido a posição sustentada pelo Tribunal Constitucional, que ainda recentemente, no acórdão nº 470/99,ponderava ([37]):

“A motivação humanística que está na base do programa da norma constitucional – para seguir outro aresto do Tribunal – pretende impedir que, “em resultado de quaisquer condenações penais, se produzissem automaticamente, pura e simplesmente ope legis, efeitos que envolvessem a perda de direitos civis, profissionais e políticos, e pretende-se que assim fosse, porque, em qualquer caso, essa produção de efeitos, meramente mecanicista, não atenderia afinal aos princípios da culpa, da necessidade e da jurisdicionalidade, princípios esses de todo em todo inafastáveis de uma lei fundamental como a CRP, que tem por referente imediato a dignidade da pessoa humana (cf., em particular, o artigo 1º) – Acórdão nº 284/89, publicado no Diário da República, 2ª série, suplemento, de 22 de Junho de 1989. Como mais se escreveu noutro aresto, o princípio constitucional vertido no artigo 30º, nº 4, proíbe que a privação de direitos seja uma simples consequência – por via directa da lei – da condenação por infracções de qualquer tipo” (Acórdão nº 282/86, no citado Diário da República, 1ª série, de 11 de Novembro de 1986).
Esta orientação jurisprudencial e doutrinária foi também acolhida pelo Supremo Tribunal de Justiça, que, por exemplo, no seu Acórdão de uniformização de jurisprudência nº 14/96 – publicado no Diário da República, 1ª série-A, de 27 de Novembro de 1996 – segue uma linha semelhante no que toca à proibição da aplicação automática. Aí se ponderou que a proibição dos efeitos decorrentes dessa aplicação, seja na sequência da imposição de uma certa pena, seja na de condenação por certos crimes, não obstando a que a lei os preveja “com o conteúdo possível da condenação por determinado crime ou simples consequência, também possível, de uma pena” parte da premissa de que “a sua ocorrência em cada caso concreto tenha como pressuposto a apreciação judicial de que, in casu, se mostram adequados e justificados pelas circunstâncias do crime”.

Perspectiva diversa terá, em contraposição, adoptado o legislador ordinário, quando, no próprio artigo 65º do Código Penal, inscreveu ([38]) um nº 2, estatuindo que:

“2. A lei pode fazer corresponder a certos crimes a proibição do exercício de determinados direitos ou profissões”.

E não falta, aliás, quem, como MAIA GONÇALVES ([39]), entenda que esta norma não ofende a regra constitucional antes transcrita.

A disparidade de critérios mencionada aconselha a que, por ora, não se emita a este respeito declaração no sentido da execução da decisão estrangeira mediante conversão.

Aliás, a verdade é que, não tendo ainda sido objecto de qualquer declaração de inconstitucionalidade, o nº 2 do artigo 65º do Código Penal vigora, plenamente ([40]).

E só ao Tribunal Constitucional compete apreciar e declarar, com eficácia geral e abstracta, se determinada disposição de lei ordinária é inconstitucional.

Se assim vier porventura a suceder, com respeito ao actual nº 2 do artigo 65º do Código Penal, então se poderá emanar declaração do aludido tipo – já que o nº 5 (2ª parte) do artigo 4º da Convenção expressamente permite que a declaração inicialmente feita possa ser substituída por nova declaração “a qualquer momento”.


11.

11.1. Cuidando, agora, de apreciar a compatibilidade do conteúdo da Convenção com o sistema jurídico português, a nível infra–constitucional, cabe ter em conta, antes de mais, o teor dos transcritos artigos 229º do Código de Processo Penal e 3º da Lei nº 144/99.

Deles decorre expressamente – sem necessidade de se tomar posição acerca do problema geral das relações entre o direito internacional e o direito interno – que as regras dos tratados e convenções internacionais gozam de prevalência, face às normas de direito português, em matéria de cooperação jurídica e, concretamente, no tocante à execução de sentenças estrangeiras.

Os preceitos do Código de Processo Penal e da Lei nº 144/99 que regulam a execução de sentenças estrangeiras assumem, pois, em princípio, natureza suplectiva, face às prescrições, com idêntico objecto, de tratados e convenções internacionais.


11.2. Isto, naturalmente, sujeito à limitação genérica excludente da cooperação internacional constante do artigo 6º da Lei nº 144/99, de cujas alíneas apenas a a) poderá, porventura, ter alguma relevância na matéria em causa, quando dispõe:

“O pedido de cooperação é recusado quando:

a) O processo não satisfizer ou não respeitar as exigências da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, de 4 de Novembro de 1950, ou de outros instrumentos internacionais relevantes na matéria, ratificados por Portugal”.

Quanto ao mais, o regime previsto nos artigos 3º e seguintes da Convenção afigura-se congruente com o dos artigos 237º a 240º do Código do Processo Penal e o dos artigos 95º a 103º da Lei nº 144/99.


11.3. A única questão susceptível de se pôr poderia, porventura, advir da circunstância de tanto o Código de Processo Penal como a Lei nº 144/99 estipularem como condição da revisão de sentença estrangeira que o facto que constitua seu objecto seja considerado como crime, tanto no Estado da infracção como em Portugal.

Recorde-se, na verdade, o teor da alínea b) do nº 1 do artigo 237º do Código de Processo Penal:

“1. Para confirmação de sentença penal estrangeira é necessário que se verifiquem as condições seguintes:

…………………………………………………………….

b) Que o facto que motivou a condenação seja também punível pela lei portuguesa;

…………………………………………………………..”.

e da alínea e) do nº 1 do artigo 96º da Lei nº 144/99:

“1. O pedido de execução, em Portugal, de uma sentença estrangeira só é admissível quando, para além das condições gerais estabelecidas neste diploma, se verificarem as seguintes:

……………………………………………………………….…..
e) O facto seja também previsto como crime pela legislação penal portuguesa”.

A Lei nº 144/99 fala expressamente em “crime”, e o Código de Processo Penal também pressupõe, naturalmente, que o “facto ... punível” a que se reporta o seja também em sede criminal.

É certo que a Lei nº 144/99 admite, como se verificou, a execução, em Portugal, de decisões administrativas estrangeiras, nomeadamente relativas a ilícitos de mera ordenação social.

Mas a questão que se pode levantar é a de saber se só pode ser executada em Portugal decisão (judicial ou administrativa) estrangeira que se reporte a ilícito ostentando a mesma natureza nos dois países.

Ou seja: só poderiam executar-se condenações penais estrangeiras se o facto sobre que incidissem constituísse também crime em Portugal; e apenas poderiam executar-se decisões administrativas estrangeiras, nomeadamente relativas a ilícitos de mera ordenação social, se, no nosso país, os factos que consubstanciassem o seu objecto igualmente configurassem uma contra-ordenação.

A correspondente disposição da Convenção é a da alínea a) do nº 2 do artigo 6º, que estatui:

“2. O Estado de residência poderá recusar executar a decisão de inibição de conduzir se:

a) A conduta pela qual a decisão de inibição de conduzir foi imposta no Estado da infracção não constitui infracção nos termos do direito do Estado de residência;”

Segundo a Convenção, pois, os Estados podem fazer relevar este factor limitativo da execução, mas não são obrigados a assim proceder.

De todo o modo, o que se apresenta mais digno de atenção é que, ao empregar o termo genérico “infracção”, a Convenção parece querer arredar o supramencionado óbice que poderia decorrer da eventual diversa qualificação, nos Estados envolvidos, do ilícito em causa.

E esta será, decerto, a atitude mais adequada, face ao carácter oscilante das infracções rodoviárias ou estradais.

Sabe-se, na verdade, como varia, entre os Estados, a caracterização destes ilícitos – umas vezes considerados penais, outras meramente contraordenacionais.

Essa oscilação tem-se observado, mesmo, no seio da ordem jurídica de certos Estados – umas vezes coexistem, nas respectivas ordens jurídicas, ilícitos estradais penais com outros de mera ordenação social; outras vezes, como no nosso país sucedeu, ilícitos estradais de índole criminal passaram a ser qualificados como simples contraordenações.

Aliás, o que para os fins da Convenção importa não é tanto a natureza das infracções em causa, mas sim a execução da medida de inibição de conduzir, aplicada como sanção principal ou acessória.

E se no tocante à natureza desta medida se suscitarem discrepâncias, pode, para efeitos da respectiva execução, recorrer-se ao procedimento de conversão, e não já de mera revisão, como antes se apontou.

Regressando, agora, à consideração do sistema português, afigura-se legítimo admitir que o nosso legislador, ao configurar as normas acima transcritas apenas sob a perspectiva penal, não terá pensado no tipo de situações de que presentemente nos ocupamos.

Mas ele não teria pretendido, decerto, que uma inibição de conduzir decretada em país estrangeiro cuja lei a correlacionasse com uma contraordenação deixasse de ser executada em Portugal porque entre nós aquele facto seria considerado crime (infracção mais grave, atente-se).

E, por seu turno, também não seria de imaginar que o legislador português tivesse preferido recusar a execução de uma medida de inibição proferida noutro Estado, em conexão com um facto aí qualificado de crime, por esse evento ser caracterizado pelo nosso direito como ilícito de mera ordenação social. É que, afinal, em ambos os países essa conduta seria considerada ilícita. E, sobretudo, num e noutro a lei lhe faria corresponder a sanção da inibição de conduzir.


12.

12.1. Passando agora a abordar as declarações e indicações previstas na Convenção, e respeitada a ordem dos respectivos preceitos, verifica-se que a primeira a ter em conta é a prevista no nº 5 do artigo 4º, acerca das modalidades de execução, no Estado de residência, da decisão de inibição de conduzir tomada no Estado da infracção.

Essa declaração deve operar-se, como consta da referida norma, ao fazer-se a notificação prevista no nº 2 do artigo 15º, o qual é do seguinte teor:
“2. Os Estados-membros notificarão o secretário-geral do Conselho da Europa do cumprimento da formalidades previstas nas respectivas normas constitucionais para a adopção da presente Convenção.”

A mencionada declaração pode, todavia “ser substituída, em qualquer momento, por nova declaração”, conforme se prescreve na parte final do aludido nº 5 do artigo 4º da Convenção.

Afigura-se que o regime geral sem dúvida adoptado na nossa ordem jurídica é o da revisão e confirmação da sentença estrangeira, consoante resulta dos artigos 233º e seguintes do Código de Processo Penal, 100º e seguintes da Lei nº 144/99, e, mesmo, dos artigos 1094º a 1102º do Código de Processo Civil.

Este sistema é também o que presentemente se deverá aplicar à execução das decisões administrativas estrangeiras, por força da conjugação dos já considerados artigos 1º, nº 3, e 97º da Lei nº 144/99.

O mencionado procedimento de execução mediante revisão e confirmação da decisão tomada no Estado da infracção é o que se encontra previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 4º da Convenção, já atrás transcrito, e cujo teor se recorda:
“b) Dando execução à decisão de inibição de conduzir por meio de uma decisão judicial ou administrativa nas condições referidas no nº 2.”

Todavia, e tendo em conta que a interpretação expendida no próprio Relatório Explicativo assim o consente, caberia acrescentar, na dita declaração, nos termos e pelas razões acima expostas, que Portugal escolhe o sistema de conversão da decisão estrangeira, numa decisão judicial ou administrativa própria, em dois casos específicos:

- tratando-se de decisões administrativas estrangeiras relativas a casos ou situações aos quais corresponderiam, no nosso país, decisões de inibição de conduzir proferidas pelos tribunais;

- estando em causa decisões de inibição de conduzir que, no estado (estrangeiro) da infracção constituam efeito automático ou necessário da aplicação de certa pena ou outra sanção.


12.2 Cabe de seguida considerar a declaração prevista no nº 3 do artigo 6º da Convenção – que, como aí se diz, pode (é, pois, facultativa) ser feita ao proceder à notificação contemplada no nº 2 do artigo 15º, ou em qualquer outro momento, e é susceptível de ser retirada também em qualquer ocasião –, relativa à recusa de execução pelo Estado da residência.

Acresce que a recusa em questão pode abranger todos ou apenas parte dos casos enumerados no nº 2 do artigo 6º da Convenção.

É o seguinte o teor desse preceito:

“2. O Estado de residência poderá recusar executar a decisão de inibição de conduzir se:
a) A conduta pela qual a decisão de inibição de conduzir foi imposta no Estado da infracção não constitui infracção nos termos do direito do Estado da residência;
b) O período remanescente da inibição de conduzir a executar no Estado de residência for inferior a um mês;
c) A inibição de conduzir não for uma medida prevista na legislação do Estado de residência para os factos que originaram a decisão de inibição de conduzir imposta pelo Estado da infracção.”

Tudo ponderado, afigura-se que se justifica emitir uma declaração deste tipo em relação às situações descritas nas alíneas a) e b) do nº 2 do referido artigo 6º, mas não já a contemplada na respectiva alínea c).

Na verdade, o caso indicado na mencionada alínea a) corresponde ao sistema de cooperação jurídica definido, em geral, na ordem jurídica portuguesa.

Assim é que o artigo 237º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Penal aponta como requisito de confirmação da sentença penal estrangeira: “a) Que o facto que motivou a condenação seja também punível pela lei portuguesa:”

E, na mesma linha, o artigo 96º, nº 1, alínea e) da Lei nº 144/99 afirma que o pedido de execução, em Portugal, de sentença penal estrangeira só é admissível quando” e) O facto seja também previsto como crime pela legislação penal portuguesa.”

No âmbito que concerne, por sua vez, ao fundamento de recusa admitido na alínea b) do nº 2 do artigo 6º da Convenção, detecta-se análoga ponderação na alínea i) do nº 1 do artigo 96º da Lei nº 144/99, quando só permite a aceitação do pedido de execução se “A duração das penas ou medidas de segurança impostas na sentença não for inferior a um ano...”.

É certo que se não trata de hipóteses rigorosamente idênticas – num caso, contempla-se o período de pena ainda por cumprir, no outro a integral medida desta.

Mas é patente a similitude do objectivo das duas normas: arredar a execução de pena de duração despicienda.

E atente-se em que a referida alínea i) fala, latamente, de “penas ou medidas de segurança”, sem as restringir às de privação de liberdade.

Já, ao invés, não parece ajustado ao regime geral entre nós vigente na matéria o motivo de recusa de execução consignado na alínea c) do nº 2 do artigo 6º da Convenção.

É que, por um lado, a nossa lei apenas estipula como condição da execução, nesta perspectiva, uma hipótese mais extrema que aquela – a indicada na alínea e) do nº 1 do artigo 237º do Código de Processo Penal:

“c) Que a sentença não tenha aplicado pena ou medida de segurança proibida pela lei portuguesa;”

Confirma este ponto de vista, aliás, a constatação de que o nº 3 do mesmo artigo 237º até prevê expressamente a eventualidade de aplicação, pela sentença estrangeira, de pena que a lei portuguesa não prevê – não configurando essa situação como justificativa da recusa de execução da pena, mas sim da respectiva conversão.


12.3 – O artigo 7ºda Convenção prevê que, ao fazer a notificação mencionada no artigo 15º, nº 2, cada Estado-membro indique a autoridade ou autoridades competentes para remeter pedido dessa natureza.

Fá-lo nos seguintes termos:

“Artigo 7º

1. A autoridade competente do Estado da infracção remeterá a notificação referida no artigo 3º à autoridade central do Estado da residência.

2. Para efeitos de aplicação do nº 1, ao proceder à notificação referida no nº 1 do artigo 15º, cada Estado-membro deverá indicar:
a) A autoridade central ou as autoridades centrais por si designadas;
b) As autoridades competentes encarregadas de apresentar as notificações referidas no artigo 3º.”

A notificação prevista no artigo 3º, e referida no preceito supratranscrito, consiste, efectivamente, no pedido de execução da decisão de inibição de conduzir formulado pelo Estado da infracção.

É o que decorre do teor do respectivo nº 1:

“Artigo 3º

1. O Estado da infracção notificará sem demora o Estado da residência de qualquer decisão de inibição de conduzir imposta por uma infracção consubstanciada nos comportamentos descritos em anexo.
.............................................................................................”.

Na falta de indicação específica constante da própria Convenção, releva, no tocante ao nosso país, o disposto no artigo 21º da Lei 144/99, acerca da tramitação geral do processo de cooperação judiciária internacional:

“Artigo 21º
Tramitação do pedido

1 – Para efeitos de recepção e de transmissão dos pedidos de cooperação abrangidos pelo presente diploma, bem como para todas as comunicações que aos mesmos digam respeito, é designada, como Autoridade Central, a Procuradoria-Geral da República.

2 – O Procurador-Geral da República submete o pedido de cooperação formulado a Portugal ao Ministro da Justiça com vista a decisão sobre a sua admissibilidade.

3 – O pedido de cooperação formulado por uma autoridade portuguesa é remetido ao Ministro da Justiça pelo Procurador–Geral da República.

4 – O disposto no nº 1 não prejudica os contactos directos relativos a pedidos de cooperação a que se reporta a alínea f) do nº 1 do artigo 1º.”

Note-se, ademais, que, nos termos do nº 2 do artigo 97º do mesmo diploma legal, a transmissão (interna) do pedido de execução de decisões administrativas se faz também através da Autoridade Central – sendo legítimo concluir, perante o nº 3 do artigo 1º, que a mesma via se deve utilizar no pedido de execução de tais medidas a efectivar no estrangeiro.

Face ao estatuído nos preceitos acabados de referir, entende-se que é a Procuradoria-Geral da República que deverá ser indicada, nos termos do artigo 7º, nº 2 da Convenção, quer como autoridade central, quer como autoridade competente para apresentar as notificações previstas no artigo 3º deste instrumento internacional.

Isto, sem prejuízo de, a nível interno, poder surgir a necessidade de estabelecer um correlacionamento entre a Procuradoria-Geral da República e as autoridades administrativas para formular ou executar o pedido de cooperação em causa, tal como o prevê o artigo 25º da Lei nº 144/99:

“Artigo 25º
Competência interna em matéria de cooperação internacional

1 – A competência das autoridades portuguesas para formulação de um pedido de cooperação ou para a execução de um pedido formulado a Portugal determina-se pelas disposições dos títulos seguintes.

2 – São subsidiariamente aplicáveis o Código de Processo Penal e respectiva legislação complementar, bem como a legislação relativa ao ilícito de mera ordenação social.”

Sob esta perspectiva, considera-se que cabe estabelecer esse correlacionamento – em termos administrativos (p.e. mediante protocolo), ou, se necessário, pela via legislativa – entre a Procuradoria-Geral da República e a Direcção-Geral de Viação.

Foi este último organismo, por um lado, que passou, por força do artigo 4º do Decreto–Lei nº 114/94, de 3 de Maio ([41]), a dispor do registo de infracções dos condutores, instituto esse regulado no artigo 145º do Código da Estrada.

Por outro lado, é ainda à Direcção-Geral de Viação que compete assegurar a execução das decisões de inibição de conduzir, consoante se deduz – directamente, quanto às decisões judicias, e implicitamente, no tocante a decisões dessa natureza tomadas pela própria Direcção-Geral em sede contraordenacional – artigo 5º do Decreto–Lei nº 2/98, de 3 de Janeiro, ao determinar que:

“Artigo 5º
1 – Quando o tribunal condenar em proibição de conduzir veículo a motor ou em qualquer sanção por contra-ordenação grave ou muito grave, determinar a cassação da carta ou licença de condução ou a interdição de obtenção dos referidos títulos, comunica a decisão à Direcção-Geral de Viação, para efeitos de registo e controlo da execução da pena, medida de segurança ou sanção aplicada.

2 – Para os mesmos efeitos e quando a condenação for em proibição ou inibição de conduzir efectivas ou for determinada a cassação do título de condução, o tribunal ordena ao condenado que, no prazo que lhe fixar, não superior a 20 dias, proceda à entrega daquele título no serviço regional da Direcção-Geral de Viação da área da sua residência.

3 – A Direcção-Geral de Viação deve informar o tribunal da data de entrega da carta ou licença de condução.

4 – Na falta de entrega da carta ou licença de condenação nos termos do nº 2, e sem prejuízo da punição por desobediência, a Direcção-Geral de Viação deve proceder a apreensão daquele título, recorrendo, se necessário e para o efeito, às autoridades policiais e comunicando o facto ao tribunal.

5 – A carta ou licença de condução mantém-se apreendida na Direcção-Geral de Viação pelo tempo que durar a proibição ou inibição de conduzir, após o que é devolvida ao seu titular.


12.4 – O nº 2 do artigo 9º da Convenção permite que, mais uma vez ao emitir a notificação prevista no nº 2 do ser artigo 15º, qualquer Estado-membro declare que os documentos contemplados no seu nº 1 lhe sejam transmitidos pelo Estado da infracção numa das línguas oficiais “das instituições das Comunidades Europeias” ([42]).

Esses documentos são a notificação, constante do anterior artigo 3º, e que representa o próprio pedido de cooperação, através da execução da decisão de inibição de conduzir, e os correspondentes documentos instrutórios enumerados no artigo 8º.

Entende-se adequado formular declaração no sentido de esses documentos deverem ser acompanhados da sua tradução em língua portuguesa.

É esse, de resto, o princípio consignado no artigo 20º da Lei nº 144/99, onde se lê:

“Artigo 20º
Língua aplicável

1 – O pedido de cooperação é acompanhado de tradução na língua oficial do Estado a quem é dirigido, salvo convenção ou acordo em contrário ou se aquele Estado a dispensar.

2 – O disposto no número anterior aplica-se ao pedido de cooperação dirigido a Portugal.

3 – As decisões de admissibilidade ou recusa do pedido de cooperação são notificadas à autoridade do Estado que o formulou, acompanhadas de uma tradução na respectiva língua oficial, salvo nos casos previstos na parte final do nº 1.

4 – O disposto neste artigo aplica-se aos documentos que devam acompanhar o pedido.”

Aliás, a tradução em português facilita sem dúvida a compreensão dos documentos em causa, não só em termos gerais, como, especificamente, no tocante aos aspectos técnico-jurídicos neles tratados.


12.5 – O nº 1 do artigo 11º da Convenção prescreve que:


“Artigo 11º

1. O direito do Estado da infracção de executar no seu território a totalidade do período de inibição de conduzir por si fixado não será afectado pela decisão do Estado de residência.”

O subsequente nº 2 admite que, ao proceder à notificação referida no nº 2 do artigo 15º, qualquer Estado-membro declare que, enquanto Estado da infracção, não aplicará o transcrito nº 1.

No nosso direito, releva, a este respeito, como regra geral, o artigo 106º da Lei nº 144/99, que determina:

“Artigo 106º
Efeitos da delegação

1 – A aceitação, pelo Estado estrangeiro, da delegação da execução implica renúncia de Portugal à execução da sentença.

2 – Aceita a delegação da execução, o tribunal suspende–a desde a data do seu início naquele Estado até ao integral cumprimento ou até que ele comunique não poder assegurar o cumprimento.

3 – No acto da entrega da pessoa condenada, o Estado estrangeiro é informado do tempo de privação de liberdade já cumprido em Portugal, bem como do tempo ainda por cumprir.

4 – O disposto no nº 1 não obsta a que Portugal recupere o seu direito de execução da sentença, nos casos em que o condenado se evadir ou, tratando-se de pena pecuniária, a partir do momento em que for informado da não execução, total ou parcial, dessa pena.”

Entende-se que a posição mais consentânea com este regime será, pois, a de produzir declaração no sentido de que Portugal, enquanto Estado da infracção, não aplicará o nº 1 do artigo 11º da Convenção, salvo se o Estado da residência vier a comunicar-lhe que não pode assegurar o cumprimento da decisão em causa.


12.6 – No artigo 14º, nº 2, da Convenção, prevê-se que qualquer Estado-membro possa, no momento da notificação a que se reporta o artigo 15º, nº 2, ou em qualquer outro momento, declarar que aceita a competência do Tribunal de Justiça para decidir a título prejudicial sobre a interpretação deste instrumento internacional.

Ao fazer uma declaração em tais termos, o Estado terá de nela fazer uma das especificações descritas, em alternativa, no nº 3 desse artigo 14º.

O teor deste normativo corresponde ao do artigo 35º do Tratado da União (já anteriormente transcrito neste parecer), inserido no respectivo Título VI, relativa à “cooperação policial e judiciária em matéria penal”.

Por seu turno, o conteúdo desse artigo 35º aproxima-se bastante do actual artigo 234º do Tratado de Roma, que constitui a norma geral básica relativa à competência do Tribunal de Justiça para decidir a título prejudicial.

A diferença principal reside em que, nos termos do artigo 35º, o pedido de intervenção do Tribunal de Justiça a título prejudicial é sempre facultativo – podendo, ademais, restringir-se a decisões não susceptíveis de recurso –, enquanto que no parágrafo final do artigo 234º se dispõe que, no âmbito da sua previsão, tal pedido é obrigatório, se a questão surgir perante tribunal cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial previsto no direito interno.

Esta diferença pode, todavia, esbater-se, na prática, em função da Declaração nº 10 anexa à acta final do Tratado de Amesterdão, na qual se lê: ”A Conferência toma nota de que os Estados-membros, ao apresentarem uma declaração nos termos do nº 2 do artigo 35º do Tratado da União Europeia, podem reservar-se a possibilidade de introduzir disposições no seu direito interno que prevejam que, sempre que uma questão relativa à validade ou à interpretação de um acto a que se refere o nº 1 do artigo 35º seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial previsto no direito, esse órgão é obrigado a submetê-la à apreciação do Tribunal de Justiça.”

Portugal já formulou a declaração prevista no artigo 35º do Tratado da União Europeia.

Fê-lo, aliás, logo através do Decreto do Presidente da República nº 65/99, de 19 de Fevereiro, que ratificou o Tratado de Amesterdão, diploma aquele cujo artigo 2º é do teor seguinte:

“Artigo 2º

Ao abrigo do disposto no artigo 35º (ex-artigo K.7) do Tratado da União Europeia, na redacção dada pelo nº 11) do artigo 1º do Tratado de Amesterdão, a República Portuguesa formula as seguintes declarações:

a) Aceita a competência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias para decidir a título prejudicial sobre a validade e a interpretação das decisões quadro e das decisões sobre a interpretação das convenções estabelecidas ao abrigo do título VI do Tratado da União Europeia e sobre a validade e a interpretação das respectivas medidas de aplicação;
b) Para o efeito, de acordo com as regras previstas na alínea b) do nº 3 do artigo 35º (ex-artigo K.7) do Tratado da União Europeia, qualquer órgão jurisdicional nacional pode pedir ao Tribunal de Justiça que se pronuncie a título prejudicial sobre uma questão suscitada em processo pendente perante esse órgão jurisdicional relativa à validade ou interpretação de um acto a que se refere o nº 1 do mesmo artigo, se considerar que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa.”

Considera-se, pois, que, em termos de coerência de procedimento e de harmonia do sistema jurídico, se justifica emanar declaração semelhante em relação à Convenção em apreciação.

Ao fazê-lo, opta-se pela alternativa que corresponde a uma mais ampla competência do Tribunal de Justiça – solução que assim propicia uma mais profunda influência, na ordem jurídica portuguesa, da perspectiva comunitária.


12.7 – O nº 4 do artigo 15º da Convenção é do teor seguinte:

“4. Até à entrada em vigor da presente convenção, qualquer Estado-membro poderá, ao proceder à notificação referida no nº 2 ou em qualquer momento posterior, declarar que a convenção, com excepção do artigo 14º, será aplicável nas suas relações com os Estados-membros que tiverem feito idêntica declaração. Estas declarações serão aplicáveis 90 dias após a data do respectivo depósito.”


A decisão sobre a emanação ou não de uma declaração ao abrigo da disposição transcrita consubstancia-se numa opção de tipo político, sobre a qual não cabe a este Conselho pronunciar-se.

Apenas caberá anotar, porventura, que a opção afirmativa poderá assumir o significado de representar uma atitude favorável à melhor e mais célere efectividade da Convenção.


13.

Não pode deixar de se apontar que há pelo menos uma matéria que não aparece tratada na Convenção, consubstanciando uma lacuna que poderá vir a originar dificuldades de aplicação.

É ela a da eventual suspensão da decisão de inibição de conduzir (se e na medida em que for admitida), bem como a do regime relativo à sua revogação, devida à prática de nova infracção durante o período de suspensão.

Trata-se, contudo, de lacuna cujo relevo não é de molde a justificar a não ratificação da Convenção.


14.

Em conclusão:

1ª - O mero facto de a Convenção em apreciação prever a possibilidade de execução de decisões de inibição de conduzir tomadas pela via administrativa não constitui, só por si mesmo, perante o teor dos artigos 29º a 32º da Constituição, obstáculo à sua ratificação;

2ª - Em todo o caso, se, em Portugal, a certo facto ou situação corresponder uma decisão de inibição de conduzir de natureza judicial, mas, no Estado estrangeiro em causa a idêntico facto ou situação couber decisão de inibição de condução de índole administrativa, esta última não poderá ser executada no nosso país, por respeito das normas constitucionais indicadas na conclusão anterior, salvo se se formular a declaração de conversão adiante preconizada;

3ª - A execução, em Portugal, de qualquer eventual decisão de inibição de conduzir estrangeira, de índole judicial ou administrativa, que constitua efeito necessário de uma pena criminal ou outra sanção, só será admissível, face ao nº 4 do artigo 30º da nossa Lei Fundamental, se se formular a declaração adiante sugerida, no sentido da respectiva conversão;

4ª - Declaração semelhante à referida na conclusão anterior deverá ser feita se, porventura, o Tribunal Constitucional vier a declarar, com efeitos gerais, a inconstitucionalidade do actual nº 2 do artigo 65º do Código Penal;

5ª - A economia geral da Convenção em análise apresenta-se, ressalvados os aspectos abordados nas conclusões 2ª a 4ª, compatível com o ordenamento jurídico português;

6ª - Sugere-se que se deixe expresso que:
“A República Portuguesa formula as seguintes declarações:

a) Nos termos do artigo 4º, nº 5, da Convenção, aplicará, em geral, como modalidade de execução da decisão de inibição de conduzir tomada em Estado estrangeiro, a contemplada na alínea b) do nº 1 do mesmo preceito, recorrendo, contudo, à da alínea c) nas seguintes hipóteses:
- tratando-se de decisão administrativa de inibição de condução tomada, no Estado da infracção, sobre facto ou situação aos quais corresponderia, em Portugal, enquanto Estado da residência, decisão de inibição de conduzir de natureza judicial;
- estando em causa decisão de inibição de conduzir, judicial ou administrativa, que, no Estado da infracção, constitua efeito necessário da aplicação de certa pena criminal ou outra sanção;
b) Ao abrigo do artigo 6º, nº 3, aplicará sempre, enquanto Estado da residência, os motivos de recusa de execução da decisão de inibição de conduzir constantes das alíneas a) e b) do nº 2 do mesmo preceito;
c) Relativamente ao disposto no artigo 7º, nº 2, indica, para efeitos da aplicação do precedente nº 1, que será a Procuradoria-Geral da República a autoridade central aí mencionada, bem como, também, a autoridade competente para apresentar as notificações mencionadas no artigo 3º;
d) No tocante ao previsto no artigo 9º, nº 2, que os documentos indicados no nº 1 desse artigo lhe sejam transmitidos pelo Estado da infracção acompanhados de uma tradução em língua portuguesa;
e) Reportando-se ao artigo 11º, nº 2, não aplicará, enquanto Estado da infracção, o nº 1 dessa norma, salvo se o Estado da residência vier a comunicar-lhe que não pode assegurar o cumprimento da decisão em causa;
f) No concernente ao consignado no artigo 14º, nº 2, aceita a competência do Tribunal de Justiça para decidir a título prejudicial sobre a interpretação da presente Convenção, especificando que, para esse efeito, qualquer órgão jurisdicional nacional pode pedir ao Tribunal de Justiça que se pronuncie a título prejudicial sobre uma questão suscitada em processo pendente perante esse órgão jurisdicional relativa à interpretação da Convenção, se considerar que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa;
g) (Facultativo) Baseando-se no artigo 15º, nº 4, aceita que a Convenção, com excepção do artigo 14º, seja, mesmo antes da respectiva entrada em vigor, aplicável nas suas relações com os outros Estados-membros que tenham feito idêntica declaração;

7ª - A Convenção não aborda a questão da eventual suspensão da inibição de conduzir e sua possível revogação – lacuna que, embora possa vir a criar algumas dificuldades de aplicação, não é de molde a justificar a não ratificação deste instrumento internacional;

8ª - Cabe promover um sistema de coordenação entre a Procuradoria-Geral da República e a Direcção-Geral de Viação, com vista a assegurar a adequada aplicação, na prática, da presente Convenção;

9ª - Justifica-se – se tal iniciativa não ocorreu já – voltar a ponderar acerca da eventual ratificação das Convenções sobre matérias afins que não foram ratificadas, antes da entrada em vigor do actual Código da Estrada, porque então a inibição de conduzir era, na nossa ordem jurídica, regulada sempre sob a perspectiva penal.








[1]) Proferido sobre a Informação da Direcção Geral dos Assuntos Comunitários INF/JUR/Nº 5097 (Proc. 213.09, de 14 de Outubro de 1999), e transmitido através do ofício do Chefe do Gabinete nº 1462, de 22 de Outubro de 1999.
[2]) JOCE, C 216, de 10 de Julho de 1998.
[3]) A Directiva 91/439/CEE, do Conselho, de 29 de Julho de 1991, relativa à carta de condução.
[4]) Entrada em vigor que ocorrerá, segundo o nº 3 do artigo 15º, noventa dias depois de feita a notificação, no sentido de estarem cumpridas as formalidades previstas nas respectivas normas constitucionais para adopção da Convenção, por parte do Estado que, sendo membro da União Europeia à data do Acto do Conselho que estabeleceu este instrumento internacional, efectivar tal notificação em último lugar.

[6]) Não faltava, mesmo, quem apontasse o perigo de, através da escolha da via convencional, se escapar ao controlo judicial pelo Tribunal de Justiça – v. Moura Ramos, “Das Comunidades à União Europeia”, Coimbra, 1999, págs. 87-89.
[7]) JO, C211, de 23 de Julho de 1999.
[8]) JOL 237, de 24 de Agosto de 1991 (alterada, nomeadamente, pela Directiva 97/26/CE, do Conselho, de 2 de Junho de 1997 – JOL150, de 7 de Junho de 1997).
[9]) De 5 de Dezembro de 1985 (DR, II Série, de 5 de Março de 1985).
x) “Cfr. o Parecer da Procuradoria-Geral da República nº 128/76, publicado no Diário da República, II Série, de 21 de Fevereiro de 1977, e no Boletim do Ministério da Justiça nº 272, págs. 70 e segs., o Parecer da Comissão Constitucional nº 3/76, in Pareceres da Comissão Constitucional, 1º volume, Edições INCM, págs. 31 e segs., o Acórdão da Comissão Constitucional nº 164, no Apêndice ao Diário da República, de 31 de Dezembro de 1979, e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 291, págs. 318 e segs.”
XX) “Despacho de 11.2.65 do Juiz do 2º Juízo de Polícia da Comarca de Lisboa, in Scientia Juridica, tomo XVI, nºs 86-88, Julho-Dezembro-1967, págs. 487 e 489.”
[10]) Análoga exposição das teses em presença sobre a matéria já constava, conquanto mais abreviada, do parecer deste corpo consultivo nº 128/76, de 16 de Dezembro de 1976. E pode também apreciar-se, nomeadamente, por modo mais desenvolvido, in “Dez temas de Direito Estradal”, de Margarida Pimenta e Maria A. Furtado, in “Estudos sobre a Jurisprudência do Tribunal Constitucional”, Lisboa, 1993, págs. 112 e segs.
[11]) Subsistia, na verdade, a falta de uniformidade, na doutrina e na jurisprudência, acerca da exacta caracterização desse instituto – a ponto de Figueiredo Dias chegar a designar de “caótica” a situação que a tal respeito se verificava na ordem jurídica portuguesa, mesmo depois de o Assento do STJ de 29 de Abril de 1992 (DR, I Série, de 10 de Julho de 1992) ter qualificado a inibição de conduzir estabelecida no artigo 61º do Código da Estrada como medida de segurança: v. “Direito Penal Português”, Parte Geral, II, Lisboa, 1993, págs. 502-503.
[12]) “Pareceres da Comissão Constitucional”, 1º vol., págs 31 e segs.
[13]) V., ainda, de entre outros, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 29 de Novembro de 1984 (Acds. Douts., 278, pág. 171 e segs.).
[14]) DR, II Série, de 5 de Março de 1986.
[15]) Segundo a qual o Estado da residência pode recusar a execução “na medida em que entenda que a execução é de molde a ofender os princípios fundamentais da sua ordem jurídica ou é incompatível com os princípios que presidem à aplicação do seu direito penal,…”.
[16]) DR, II Série, de 8 de Janeiro de 1996,
[17]) Alterado pelos Decretos-Leis nºs 356/89, de 17 de Outubro, e 244/95, de 14 de Setembro.
[18]) V., nomeadamente, ANTÓNIO SERRA AMARAL, “Código da Estrada”, 3ª ed., Rev., de 1998, pág. 165.
[19]) Desapareceu, nomeadamente, a prescrição do nº 3 do originário artigo 151º do CE (hoje art. 139º), que previa uma hipótese de interdição de concessão de licença aplicável a condenados por condução sem habilitação legal – não reportada explicitamente à competência judicial.
[20]) SERRA AMARAL, “Código da Estrada Anotado e Legislação Complementar”, Coimbra, 1995, pág. 382; Jerónimo Freitas “Código da Estrada anotado e Legislação complementar”, 4ª ed., 1998, pág. 278.
[21]) Germano Marques da Silva, “Código da Estrada e Legislação complementar”, Lisboa, 1995, págs. 4-10.
[22]) Anabela Rodrigues, “O ilícito de mera ordenação social na circulação rodoviária.”
[23]) A referência ao artigo 102º resulta de lapso manifesto no âmbito da revisão de 1998, pois, que, por virtude destes, a matéria que antes era regulada nos mencionados dois preceitos passou a constar integralmente do artigo 101º.
[24]) “Código Penal Português”, 13ª ed., Coimbra, 1999, pág. 243.
[25]) Anote-se, ademais, que, enquanto esta pena acessória de inibição de conduzir se pode referir apenas a “categoria determinada” de veículos, a similar sanção acessória contraordenacional se reporta a todo o tipo de veículos motorizados – o que se explicará, porventura, pela particular severidade que pretendeu imprimir-se ao regime sancionatório do Código da Estrada.
[26]) Op. cit., pág. 366.
[27]) “Crimes Rodoviários. Pena acessória e medidas de segurança”, Lisboa, 1996, pág. 33.
[28]) Hoje 148º.
[29]) Op. e loc. cit.
[30]) “Crimes rodoviários. Pena acessória e Medidas de segurança”, págs. 41-42.
[31]) “Cooperação judicial internacional em matéria penal”, Lisboa, 1992.
[32]) Aprovado pelo Conselho em 24 de Junho de 1999, e publicado no JO nº C’211, de 23 de Julho de 1999.
[33]) Regra esta reproduzida, aliás, no nº 1 do artigo 65º do Código Penal.
[34]) V. neste sentido, nomeadamente, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, “Constituição da República Portuguesa anotada”, 3ª ed., Coimbra, 1993, pag. 198.
[35]) Utiliza-se esta expressão por cautela, para abranger casos em que às situações do tipo considerado correspondam sanções administrativas, sem natureza especificamente contraordenacional.
[36]) Op. e loc. cit.
[37]) DR, II Série, de 14 de Março de 2000. V. também, no mesmo sentido, o acórdão nº 77/87, DR, II Série, de 8 de Agosto de 1990.
[38]) Na revisão operada pelo Decreto-Lei nº 48/95, de 15 de Março.
[39]) “Código Penal Português”, 13ª ed., Coimbra, 1999, pág 237.
[40]) Anote-se, a propósito,que a proibição de conduzir prevista, como pena acessória, no artigo 69º do Código Penal, não constitui aplicação deste nº 2 do anterior artigo 65º, já que os termos em que recorta os pressupostos de tal medida implicam sempre uma apreciação e ponderação pelo tribunal que a determine.
[41]) Alterado pelo artigo 6º do Decreto-Lei nº 2/98, de 3 de Janeiro.
[42])Leia-se da União Europeia”.
Anotações
Legislação: 
CONST76 - ART29.º; ART30.º N4; ART31.º; ART32.º
L 63/93, DE 21 1993/08/21 – ART2.º N2 A) D) H) O) P)
CE94 - ART4.º; ART54.º; ART55.º, ART58.º N2 N3 N4; ART60.º; ART133.º N1 N2; ART135.º; ART139.º N1 N2 N3 N4; ART141.º; ART145.º; ART147.º;
ART148.º N1 A) B) N2 A) B); ART149.º N1 N2 N3; ART145.º; ART150.º N1 N2; ; ART151.º; ART152.º; ART153.º N1 N4
L97/97, DE 1997/08/23 - ART 2.º A) B) F) G) H)
DL 2/98, DE 1998/01/03 - ART5.º N1 N2 N3 N4 N5;
DL 433/82, DE 1982/10/27 - ART32.º; ART33.º
CP82- ART65.º N1 N2; ART69.º N1 A) B) N2 N3 N4 N5; ART101.º N1 A) B) N2 A) B) C) D) N3 N4 N5 N6 N7
CPP - ART 234.º N1; ART229.º; ART233.º; ART237.º N1 B) E) N3; ART240.º; ART500.º N1 N2 N3 N4 N4 N5 N6;
DL 43/91, DE 1991/01/22 - ART2.º N2; ART95.º N1
CPC67 - ART1094.º; ART1102.º
L144/99, DE 1999/08/ 31 - ART 1.º N3; ART3.º N1 N2; ART6.º A); ART20.º N1 N2 N3 N4; ART21.º N1 N2 N3 N4; ART25.º N1 N2; ART95.º N1; ART96.º N1 E) I); ART97.º N1 N2; ART100.º; ART101.º N1 N2; ART103.º; ART106.º N1 N2 N3 N4
DPR 65/99, DE 1999/02/19 - ART2 A) B)
Jurisprudência: 
AC TC 28/83 DE 1983/12/21
AC TC 470/99 IN DR II S DE 2000/03/14
P CC 3/76 IN PCC VOL1 PAG31
Referências Complementares: 
DIR CONST * DIR FUND / DIR CRIM / DIR ESTRAD/ DIR ORDN SOC*****
DIR CONS CEE 91/439 DE 1991/07/29 - ART8.º N1 N2 N3 N4
T DE AMESTERDÃO
T DA UNIÃO EUROPEIA - ART35.º N1 N2 N3 A) B) N4 N5 N6 N7
T DE ROMA - ART234.º*****
CONV EUR PARA A REPRESSÃO DAS INFRACÇÕES DA ESTRADA - ART1.º N1 N2 N3; ART9.º N2 C); ART24.º F)
CONV EUR SOBRE OS EFEITOS INTERNACIONAIS DE INIBIÇÃO DO DIREITO DE CONDUZIR VEÍCULOS A MOTOR- ART 1.º
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