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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
4/2024, de 28.02.2024
Data do Parecer: 
28-02-2024
Tipo de Parecer: 
Parecer
Relator: 
João Conde Correia dos Santos
Descritores e Conclusões
Descritores: 
GREVE
GREVE DE MAIOR PREJUÍZO
RETRIBUIÇÃO
LICITUDE
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
PRINCÍPIO DA BOA-FÉ
ABUSO DE DIREITO
Conclusões: 

1.ª O direito de greve (artigo 57.º da Constituição) é um direito fundamental, integrante do conjunto dos direitos, liberdades e garantias, diretamente aplicável e vinculante para entidades públicas e privadas e consubstancia uma parcela do princípio da socialidade, enquanto vertente fundamental do Estado de direito democrático;

             

 2.ª Nem a Lei Fundamental (artigo 57.º da Constituição), nem a lei ordinária (artigos 530.º a 543.º do Código do Trabalho e artigos 394.º a 405.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas) definiram o direito de greve, remetendo essa tarefa essencial para a doutrina e, sobretudo, para o intérprete;

             

 3.ª O direito de greve é, doutrinal e jurisprudencialmente, definido como «abstenção coletiva e concertada da prestação de trabalho por um conjunto de trabalhadores com vista à satisfação de objetivos comuns», assim se excluindo da respetiva área de tutela alguns fenómenos, socialmente reputados como greve;

                

4.ª O direito de greve não é um direito absoluto, imune a quaisquer restrições ou limites, devendo, em casos de colisão com outros direitos ou valores constitucionalmente protegidos, operar-se a devida harmonização prática, no quadro da unidade de sistema de direitos e valores constitucionalmente protegidos;

            

5.ª Para além das situações em que não estamos perante uma conduta integrável no conceito jurídico-constitucional de greve ou dos casos em que este direito tem que ser harmonizado ou conjugado com outros direitos constitucionais, existem outras formas de declaração ou de exercício do direito que são consideradas abusivas;

               

6.ª A mera desproporção entre os prejuízos causados à entidade empregadora ou a terceiros e os prejuízos assumidos pelos trabalhadores não é, contudo, suficiente para provocar a ilicitude da greve ou para a denominar como «greve de maior prejuízo»;

7.ª O artigo 57.º, n.º 3, da Constituição remete para a lei a fixação das «condições de prestação, durante a greve, de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, bem como de serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis»;

            

8.ª Os serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis e os meios necessários para os assegurar devem ser definidos por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou por acordo entre os representantes dos trabalhadores e os empregadores abrangidos pelo aviso prévio ou a respetiva associação de empregadores (artigo 538.º, n.º 1, do Código do Trabalho e artigo 398.º, n.º 1, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas);

9.ª Na ausência de previsão em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou de acordo sobre a definição desses serviços mínimos, o serviço competente do ministério responsável pela área laboral, assessorado sempre que necessário pelo serviço competente do ministério responsável pelo sector de atividade, convoca as entidades referidas no número anterior para a negociação de um acordo sobre os serviços mínimos e os meios necessários para os assegurar (artigo 538.º, n.º 2, do Código do Trabalho e artigo 398.º, n.º 2, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas);
 

10.ª Na negociação de serviços mínimos relativos a greve substancialmente idêntica a, pelo menos, duas greves anteriores para as quais a definição de serviços mínimos por arbitragem tenha igual conteúdo, o serviço referido na conclusão anterior propõe às partes que aceitem essa mesma definição, devendo, em caso de rejeição, a mesma constar da ata da negociação (artigo 538.º, n.º 3, do Código do Trabalho);

11.ª Na falta de acordo nos três dias posteriores ao aviso prévio de greve, os serviços mínimos e os meios materiais e humanos necessários para os assegurar serão definidos por despacho conjunto, devidamente fundamentado, do ministro responsável pela área laboral e do ministro responsável pelo sector de atividade [artigo 538.º, n.º 4, al.ª a) do Código do Trabalho];

             

12.ª Tratando-se de empresa do sector empresarial do Estado, como é o caso da IP – Infraestruturas de Portugal, S.A., a os serviços mínimos e os meios necessários para os assegurar serão definidos por tribunal arbitral, constituído nos termos de lei específica sobre arbitragem obrigatória [artigo 538.º, n.º 4, al.ª b) do Código do Trabalho];

13.ª A definição dos serviços mínimos e dos meios necessários para os assegurar deve respeitar os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade (artigo 538.º, n.º 5, do Código do Trabalho e artigo 398.º, n.º 7, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas);

              

 14.ª Os representantes dos trabalhadores em greve devem designar os trabalhadores que ficam adstritos à prestação dos serviços mínimos definidos e informar do facto o empregador, até vinte e quatro horas antes do início do período de greve ou, se não o fizerem, deve o empregador proceder a essa designação (artigo 538.º, n.º 7, do Código do Trabalho e artigo 398.º, n.º 6, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas);
 

15.ª Nos casos em que por razões objetivas inultrapassáveis os serviços mínimos pressuponham a presença de todos os trabalhadores e em que estes por força da greve só realizem uma parte das suas tarefas diárias poderá ser reduzida a sua retribuição em função do volume de trabalho por estes efetivamente prestado;

16.º Aliás, a remuneração tem que ser correspondente ao trabalho prestado e à efetiva disponibilidade dos trabalhadores, pois, se assim não for, poderá afrontar as regras da gestão e, até, consubstanciar um enriquecimento indevido; e 

17.ª Por fim, dado o caráter hipotético da consulta, só perante um exaustivo apuramento das funções dos profissionais do Comando e Controlo Ferroviário, será possível aferir se os serviços mínimos podem ser devidamente calibrados por forma a adequar os recursos humanos à satisfação das necessidades sociais impreteríveis fixadas; ou, se assim não acontecer, se deverá recorrer à redução da respetiva remuneração na proporção correspondente ao serviço efetivamente prestado.

Texto Integral
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