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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
5/2020, de 21.05.2020
Data do Parecer: 
21-05-2020
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
PGR
Entidade: 
Procurador(a)-Geral da República
Relator: 
JOÃO EDUARDO CURA MARIANO ESTEVES
Votantes / Tipo de Voto / Declaração: 
João Alberto de Figueiredo Monteiro

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



João Alberto de Figueiredo Monteiro

Votou em conformidade



João Eduardo Cura Mariano Esteves

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



João Eduardo Cura Mariano Esteves

Votou em conformidade



Maria Isabel Fernandes da Costa

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Maria Isabel Fernandes da Costa

Votou em conformidade



João Conde Correia dos Santos

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



João Conde Correia dos Santos

Votou em conformidade



Maria da Conceição Silva Fernandes Santos Pires Esteves

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Maria da Conceição Silva Fernandes Santos Pires Esteves

Votou em conformidade



Maria de Fátima da Graça Carvalho

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Maria de Fátima da Graça Carvalho

Votou em conformidade



Eduardo André Folque da Costa Ferreira

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Eduardo André Folque da Costa Ferreira

Votou em conformidade

Descritores e Conclusões
Descritores: 
SANÇÃO ADMINISTRATIVA
MINISTÉRIO PÚBLICO
RECURSO
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
INTERVENÇÃO PROCESSUAL
CONTRAORDENAÇÃO
DIREITO DE MERA ORDENAÇÃO SOCIAL
ACUSAÇÃO
INDÍCIOS SUFICIENTES
ARQUIVAMENTO
DEVOLUÇÃO
HIERARQUIA
Conclusões: 
Conclusões
Em síntese do acima exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

              1.ª O artigo 62.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações, dispõe que, interposta pelo arguido impugnação judicial da decisão de autoridade administrativa que o sancionou pela prática de uma contraordenação, deve essa autoridade enviar os autos ao Ministério Público que os tornará presentes ao juiz, valendo este ato como acusação.
              2.ª Com a apresentação dos autos ao juiz não se verifica uma conversão da decisão sancionatória impugnada numa acusação.
              3.ª O que corresponde a uma acusação é o ato de apresentação dos autos do processo contraordenacional ao juiz, não existindo uma acusação em sentido formal, enquanto indicação precisa pelo Ministério Público da factualidade que conforma o objeto do processo e das infrações que são imputadas ao arguido.
               4.ª A apresentação do processo contraordenacional ao juiz não se traduz, pois, na dedução de uma acusação, mas tem os mesmos efeitos desse ato em processo penal – manifesta a pretensão do Ministério Público de que o arguido seja submetido a julgamento e delimita a temática do julgamento.
               5.ª Mas esta não é a única opção de que dispõe o Ministério Público quando a autoridade administrativa lhe remete os autos do processo contraordenacional, não sendo aquele magistrado um mero núncio que se limita a proceder à entrega do processo no Tribunal.
               6.ª A intervenção do Ministério Público na denominada fase intermédia do processo contraordenacional só pode ter um significado que seja compatível com a estrutura deste tipo de processo, designadamente na fase judicial subsequente, e com as funções do Ministério Público que lhe são cometidas pela lei.
               7.ª Conforme resulta da tramitação da fase judicial do processo contraordenacional regulada no RGCO, esta tem uma estrutura acusatória, sendo atribuída à magistratura do Ministério Público, à semelhança do que sucede no processo penal, a representação dos interesses do Estado no sancionamento das práticas contraordenacionais.
               8.ª Nas funções de promoção da ação contraordenacional na sua fase judicial, o Ministério Público, como órgão autónomo da administração da justiça, encontra-se incondicionalmente sujeito aos valores da descoberta da verdade e da realização da justiça, pelo que só deve solicitar o julgamento daqueles arguidos sobre os quais recaem indícios seguros de que cometeram um ilícito contraordenacional.
               9.ª O artigo 62.º, n.º 1, do RGCO, ao determinar a intervenção do Ministério Público na fase intermédia do processo contraordenacional, pretendeu que este magistrado examinasse o processo que lhe é remetido, designadamente a decisão sancionatória proferida e a contestação apresentada, e ponderasse, obedecendo a critérios de legalidade e objetividade, se o arguido devia ou não ser sujeito a julgamento judicial pela prática da contraordenação ou contraordenações que foram objeto temático do processo que lhe foi remetido.
              10.ª Assim, após exame dos autos do processo contraordenacional, o Ministério Público deve apresentá-los ao tribunal competente, para serem distribuídos a um juiz, equivalendo essa opção à dedução de uma acusação em processo penal, caso entenda que existem indícios suficientes da prática da contraordenação ou contraordenações que foram objeto daquele processo; ou pode, pelo contrário, determinar o seu arquivamento, se tiver verificado a existência de prova bastante desses ilícitos não se terem verificado ou de o arguido não os ter praticado, de ser legalmente inadmissível o respetivo procedimento ou ainda de não existirem indícios suficientes da verificação da atividade contraordenacional ou dos seus agentes, tal como sucede no processo penal, por aplicação do disposto no artigo 277.º, n.º 1 e 2, do respetivo Código.
               11. ª Quando porém se verificarem vícios sanáveis na decisão impugnada ou no processo contraordenacional, que nem justificam o arquivamento do processo, nem a sua apresentação no tribunal, deve o Ministério Público antecipar-se à decisão judicial de devolução do processo à autoridade administrativa e proceder ele a essa remessa, de modo a que tais vícios sejam sanados, proferindo a autoridade administrativa nova decisão, sem que seja necessária uma intervenção judicial.
               12.ª Numa leitura integrada, que tenha presente os princípios que subjazem à intervenção do Ministério Público no Processo Penal, é possível entender-se que estes poderes se encontram ínsitos na competência que lhe é atribuída pelo artigo 62.º, n.º 1, do RGCO, ou então, para quem se sinta limitado pela literalidade deste preceito, deve considerar-se que, com as necessárias adaptações, é aplicável aos poderes do Ministério Público, nesta fase intermédia, o disposto no artigo 277.º e seg., do Código de Processo Penal, como legislação subsidiária.
              13.ª Nesta fase, o arquivamento do processo contraordenacional não está dependente da concordância do arguido, nem da auscultação da autoridade administrativa.
              14.ª Com o arquivamento ou a devolução do processo contraordenacional à autoridade administrativa, a decisão sancionatória impugnada fica sem efeito, sem ter chegado a ser necessária uma intervenção judicial.
              15.ª Arquivado o processo, por decisão do Ministério Público, o processo contraordenacional só pode ser reaberto se surgirem novos elementos de prova que invalidem os fundamentos da opção de arquivamento, numa aplicação subsidiária do disposto no artigo 279.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, ou caso se verifiquem situações análogas às previstas no artigo 449.º, n.º 1, a) e b), do mesmo diploma.
              16.ª O Ministério Público não pode, no entanto, face à inexistência de indícios suficientes da prática de qualquer contraordenação pelo arguido, ordenar à entidade administrativa a repetição ou a realização de novas diligências de prova, nem pode devolver-lhe os autos para realização dessas diligências, uma vez que não existe qualquer relação de subordinação hierárquica entre a autoridade administrativa e o Ministério Público.
 
Texto Integral
Texto Integral: 
                                          Senhora Conselheira
                                          Procuradora Geral da República

                                          Excelência:
 
 
I. A consulta
Solicita Vossa Excelência que o Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, com vista à uniformização de procedimentos, tome posição, nos termos do artigo 44.º, a), do Estatuto do Ministério Público, sobre quais são os poderes processuais do Ministério Público, no âmbito do recurso de impugnação judicial da decisão de autoridade administrativa, entre o momento em que recebe os autos da entidade administrativa e o momento em que procede à respetiva apresentação ao juiz, nos termos do n.º 1, do artigo 62.º, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro.
 
II - O processo contraordenacional
O direito de mera ordenação social foi introduzido no nosso sistema jurídico pelo Decreto-Lei n.º 232/79, de 24 de julho, num movimento tardio de saneamento do apelidado direito penal administrativo, cuja multiplicação exponencial tinha as suas causas no crescente desenvolvimento das políticas do modelo do Estado Social.
A autonomização deste ramo do direito já havia ocorrido nos anos 50 do século passado na República Federal Alemã, tendo sido posteriormente seguida noutros países europeus.
A justificação para a introdução de um regime geral das contraordenações, como expressão de um direito de mera ordenação social, no nosso país, foi assim explicada no preâmbulo do referido Decreto-Lei n.º 232/79, de 24 de julho:
A necessidade de dotar o nosso país de um adequado «direito de mera ordenação social» vem sendo, de há muito e de muitos lados, assinalada. Tanto no plano da reflexão teórica como no da aplicação prática do direito se sente cada vez mais instante a necessidade de dispor de um ordenamento sancionatório alternativo e diferente do direito criminal. 
Ordenamento que permita libertar este ramo de direito das infrações que prestam homenagem a dogmatismos morais ultrapassados e desajustados no quadro de sociedades democráticas e plurais, bem como do número inflacionário e incontrolável das infrações destinadas a assegurar a eficácia dos comandos normativos da Administração, cuja desobediência se não reveste da ressonância moral característica do direito penal. E que permita, outrossim, reservar a intervenção do direito penal para a tutela dos valores ético-sociais fundamentais e salvaguardar a sua plena disponibilidade para retribuir e prevenir com eficácia a onda crescente de criminalidade, nomeadamente da criminalidade violenta. 
Este diploma, devido a problemas de constitucionalidade orgânica, foi inicialmente alterado pelo Decreto-Lei n.º 411-A/79, de 1 de outubro, e mais tarde substituído, com algumas modificações pontuais, pelo Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro [1], sem que a sua aplicação se tenha consolidado, devido à impreparação inicial dos serviços da Administração Pública.
Os termos do regime geral das contraordenações foram naturalmente influenciados pela lei-quadro das contraordenações alemã na altura vigente, a “nova” OWiG de 1968 (Gesetz über Ordnungswidrigkeiten).
Posteriormente à aprovação do regime geral das contraordenações (doravante RGCO) pelos diplomas acima referidos, além de uma crescente utilização de sanções contraordenacionais por um Estado regulador, de um considerável agravamento dos montantes das coimas e de um alargamento do leque de sanções acessórias aplicáveis, foram aprovados múltiplos regimes jurídicos gerais sectoriais [2], num movimento de fragmentação e atomização do direito de mera ordenação social que coloca em causa a sua unidade e remete o regime geral constante do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, para um papel meramente residual [3].
Nos objetivos da autonomização deste ramo de direito incluía-se também a conveniência de revestir o processamento destas infrações de especificidades que permitissem a aplicação das sanções pelos agentes administrativos encarregados da fiscalização e controlo estadual das respetivas atividades, libertando os tribunais desta competência emergente [4]. Efetivamente, o processo contraordenacional carateriza-se pelo cumprimento de um dos grandes objetivos da autonomização do direito de mera ordenação social - a desjudicialização [5]. As entidades que tramitam e decidem o processamento das contraordenações são autoridades administrativas, não se encontrando o direito de mera ordenação social incluído na reserva absoluta de jurisdição cometida aos tribunais, sem que isso signifique a exclusão total da sua intervenção nestes processos.
Esta caraterística do processo contraordenacional encontra-se, a título marginal, viabilizada no próprio texto constitucional (artigo 37.º, n.º 3, da Constituição), estando garantido, contudo, que o desfecho deste processo nunca fará perigar a liberdade física dos visados e é dotado de uma reserva judicial de última instância [6].
Apesar de as autoridades administrativas estarem obrigadas a decidir com imparcialidade, não privilegiando, nem discriminando ninguém, elas devem sempre prosseguir, na sua atuação, o interesse público, além de que, reunindo em si, na maior parte dos casos, a função investigatória e decisória, sem preocupações de respeito pelo princípio do acusatório, não deixam de agir, nesta dupla perspetiva, com um grau de parcialidade que não permite dispensar a possibilidade de intervenção posterior de um juízo jurisdicional [7].
Assim, ao direito contraordenacional não só está vedada a utilização de sanções de privação da liberdade física, como, no seu processamento, após uma primeira fase tramitada e decidida por autoridades administrativas, é colocada à disposição da pessoa sancionada o recurso aos tribunais, os quais julgarão a causa contraordenacional. O preenchimento destas duas condições foi considerado necessário e suficiente para que se cumprisse um dos grandes desideratos do direito de mera ordenação social.
No termo da apelidada fase administrativa, durante a qual a autoridade administrativa competente procede à investigação e instrução da contraordenação participada ou denunciada, aquela entidade deverá concluir pelo arquivamento do processo contraordenacional ou pela aplicação de uma sanção (artigo 54.º, n.º 2, da RGCO).
Na hipótese da opção ter sido o arquivamento ou de o arguido se conformar com a sanção que lhe foi aplicada, o processo contraordenacional limitar-se-á a esta fase administrativa, não se abrindo uma segunda fase de natureza jurisdicional [8]. Estamos perante decisões definitivas e exequíveis.
Caso, ao invés, tenha sido aplicada uma sanção e o arguido não se conforme com essa decisão, este tem o direito de a impugnar judicialmente (artigo 59.º, n.º 1, do RGCO) [9].
Os termos da impugnação judicial encontram-se regulados nos artigos 59.º e seg. do RGCO, determinando o artigo 41.º do mesmo diploma que o direito subsidiário é constituído pelas normas que regulam o processo criminal.
Apesar de, na fase jurisdicional, não se colocarem dúvidas sobre a plenitude da subsidiariedade do direito processual penal, contrariamente ao que sucede na fase administrativa, em que essa subsidiariedade é disputada entre aquele ramo do direito processual e os princípios e regras do procedimento administrativo [10], a natureza da intervenção judicial nestes processos não deixa de suscitar algumas discussões na doutrina, com reflexos práticos na integração do RGCO, designadamente sobre se estaremos perante uma espécie de julgamento em 1.ª instância ou de um recurso.
Se é habitual ouvirmos referências à natureza híbrida da fase judicial, porquanto mistura elementos próprios de um recurso com os de um julgamento penal em 1.ª instância, esta segunda perspetiva parece muito mais próxima do regime legal da segunda fase do processo contraordenacional [11].
Como bem analisou o recente Acórdão de Fixação de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, proferido por unanimidade em 23 de maio de 2019 [12]:
Em sede de 1.ª instância, o Tribunal conhece de toda a questão em discussão — “o objeto da sua apreciação não é a decisão administrativa, mas a questão sobre a qual incidiu a decisão administrativa”
O âmbito de cognição deste tribunal é bastante amplo: não se limita a um controlo da legalidade do ato, mas procede a uma apreciação de todo o ato administrativo, uma “apreciação da veracidade e exatidão dos factos (e da sua qualificação)”, e também uma apreciação da medida da coima aplicada, considerando‑se que o Tribunal tem “poderes de jurisdição plena”. Isto é, “são admissíveis, na fase judicial do processo contraordenacional, todos os tipos de pronúncia que incidem sobre o mérito da causa, designadamente a manutenção da decisão administrativa, a sua revogação in totum, por via da absolvição, e a sua modificação, quer da qualificação jurídica quer da sanção”. Não se trata, pois, de um mero controlo da legalidade, mas de um pleno poder de conhecimento do mérito da questão, de uma plena jurisdição à semelhança do que ocorre atualmente nos tribunais administrativos.
Daqui decorre que a impugnação da decisão da autoridade administrativa não é um verdadeiro recurso. A causa é retirada do âmbito administrativo e entregue a um órgão independente e imparcial, o tribunal. E o tribunal irá decidir do mérito da causa como se fosse a primeira vez — o julgador não estará vinculado, nem limitado pelas questões abordadas na decisão impugnada, nem estará limitado pelas questões que tenham sido suscitadas aquando da impugnação, estando apenas limitado pelo objeto do processo definido pela decisão administrativa.
...
Decidindo o tribunal de 1.ª instância o mérito da causa como se fosse a primeira vez, os seus poderes de cognição são plenos, abarcando as questões de facto e de direito, e com possibilidade de determinação do âmbito de prova a produzir (cf. art. 72.º, n.º 2, do RGCO). Não se limita a analisar a prova trazida pela Administração e eventualmente a proceder a uma renovação para assim evitar o reenvio do processo para a autoridade administrativa, valorando ainda a prova que o impugnante, eventualmente, tenha indicado. O que nos permite afastar o entendimento desta fase de processo como uma fase de recurso. Além de que, o Ministério Público pode “promover a prova de todos os factos que considera relevantes para a decisão” (art.º 72.º, n.º 1, do RGCO).
Assim sendo, a impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa tem um âmbito alargado a toda a situação sob escrutínio. Não pode, pois, ser classificada como recurso, uma vez que o tribunal de 1.ª instância tem poderes de cognição alargados ao conhecimento do mérito da questão, podendo conhecer de todas as questões que pudesse conhecer
O Tribunal decidirá ex novo com respeito pelo princípio da proibição da reformatio in pejus, consagrado no art.º 72.º-A, do RGCO  — isto é, ainda que em 1.ª instância o Tribunal qualifique, por exemplo, a infração praticada como sendo uma contraordenação mais grave do que a considerada na decisão da autoridade administrativa, não poderá, apesar de uma nova qualificação jurídica, agravar a coima aplicada (proibição extensível aos não recorrentes —“não pode a sanção aplicada ser modificada em prejuízo de qualquer dos arguidos, ainda que não recorrentes”, art.º 72.º-A, do RGCO).
E assim também deve ser entendido nos casos em que a proibição da reformatio in pejus, consagrada no art.º 72.º-A, do RGCO, esteja afastada. Aliás, esta proibição foi introduzida em “ordem ao reforço dos direitos e garantias dos arguidos”, pelo que qualquer regime contraordenacional que, contrariamente ao disposto no art.º 72.º-A, do RGCO, determine a não aplicabilidade da proibição da reformatio in pejus poderá gerar um tratamento distinto entre arguidos julgados pela prática de diferentes contraordenações a suscitar questões de conformidade constitucional “atenta a limitação excessiva do direito ao recurso, garantia de defesa aplicável ao processo contraordenacional por força do n.º 10 do art.º 32.º da CRP”.
De tudo podemos concluir que a fase judicial não constitui uma reapreciação da questão, mas uma primeira apreciação judicial da questão contraordenacional sem limite dos poderes de cognição do juiz, que abarcam todo o objeto do processo. A impugnação judicial não constitui  “um recurso em sentido próprio, mas de uma fase judicial do processo de contraordenação em que o tribunal julga do objeto de uma acusação consistente na decisão administrativa de aplicação da sanção na fase administrativa, com ampla discussão e julgamento da matéria de facto e de direito e de decisão final”.
Também o Tribunal Constitucional, na fundamentação, do Acórdão n.º 373/2015, proferido em 14 de julho de 2015 [13], constatou o seguinte:
A impugnação dá lugar, não a um recurso propriamente dito, mas a um novo processo de natureza jurisdicional, em que o tribunal não se limita a apreciar a decisão, mas todo o processado nos autos, podendo ser produzida prova neste processo judicial, quer pela autoridade administrativa recorrida, quer pelo arguido, sendo que o tribunal valora em conjunto toda a prova produzida nos autos, quer a já produzida na fase administrativa, quer a realizada na fase jurisdicional, particularmente a que venha a ter lugar em audiência.
Ou seja, o tribunal, ao apreciar a impugnação da decisão administrativa, não está vinculado à qualificação efetuada pela entidade administrativa que proferiu a decisão, apreciando quer os factos (com base nas provas que são apresentadas no âmbito do recurso), quer a matéria de direito (qualificação jurídica dos factos e sanções aplicadas). Quando o processo é enviado para o Tribunal, na sequência da impugnação do arguido, tudo se passa, assim, como se tivesse lugar um novo julgamento, em que a decisão passa a ser tida como acusação e, como tal, passa a delimitar o objeto do processo.
Nesta linha, pode, pois, dizer-se que a impugnação judicial da decisão sancionatória da autoridade administrativa é dotada de regras próprias que a aproximam mais do quadro legal de um julgamento penal em 1.ª instância, em que a instrução foi realizada pela autoridade administrativa, do que de um recurso para um tribunal de 2.ª instância, sem que esta constatação ignore a relevância e a influência do conteúdo da decisão impugnada, a qual passa a valer como uma proposta decisória.
 
III - Uma fase intermédia
Apresentada a impugnação judicial, nos termos do artigo 59.º, n.º 3, do RGCO, junto da entidade administrativa sancionadora, dispõe o artigo 62.º deste diploma, numa redação muito próxima do texto original do artigo 69.º da OWiG alemã de 1968.
1 – Recebido o recurso, e no prazo de cinco dias [14], deve a autoridade administrativa enviar os autos ao Ministério Público, que os tornará presentes ao juiz, valendo este ato como acusação.
2 – Até ao envio dos autos, pode a autoridade administrativa revogar a decisão de aplicação da coima.
Está aqui desenhada uma antecâmara da segunda fase do processo contraordenacional, situada entre a fase administrativa e a fase judicial, da qual poderá resultar a desnecessidade da existência de um controle jurisdicional.
Na OWiG alemã de 1968 , a qual serviu de modelo ao nosso RGCO, esta antecâmara sofreu obras de remodelação, primeiro pela OWiGStVGÄnd de 1986, e posteriormente pela OWigÄnd de 1998 [15]. Estas modificações tiveram como objetivo permitir o saneamento do processo contraordenacional previamente à sua admissão a um julgamento jurisdicional, o que terá sido bem sucedido, uma vez que diminuiu consideravelmente o julgamento de contraordenações nos tribunais alemães (menos 150.000 processos) [16].
Como resultado destas alterações, podemos constatar que foram conferidos poderes à autoridade administrativa para controlar o cumprimento das formalidades legais pelo requerimento de impugnação judicial da decisão administrativa sancionatória (alínea 1 do § 69), sendo esse despacho judicialmente recorrível através de uma Anfechtung, além de manter o poder-dever de reapreciação da decisão impugnada, podendo revogá-la (alínea 3 do § 69) . Nesta atividade de reapreciação, a autoridade administrativa pode socorrer-se da realização de novas diligências probatórias ou de pedidos de esclarecimento relativos a diligências já efetuadas (alínea 2 do § 69), sendo dada oportunidade ao arguido de se defender (2.º período da alínea 2 do § 69). Concluindo a autoridade administrativa que a sua anterior decisão sancionatória não pode manter-se, ou porque a contraordenação não se verificou, ou porque a prova recolhida sobre a sua prática é manifestamente insuficiente, deve dar sem efeito a sua anterior decisão, determinando o arquivamento do processo. Caso entenda que não há razões que justifiquem a revogação da decisão sancionatória a autoridade administrativa deve remeter os autos ao Ministério Público, acompanhados de uma decisão justificativa desta opção, quando uma explicação se revelar necessária, passando o Ministério Público a deter os poderes persecutórios que anteriormente couberam à autoridade administrativa (alínea 3 do § 69).
Examinados os autos que lhe foram remetidos, o Ministério Público pode proceder à realização de novos atos de instrução, caso considere que não se encontra suficientemente esclarecida a prática da contraordenação pela qual o arguido se mostra sancionado (alínea 4 do § 69); pode determinar o arquivamento dos autos caso considere que não foi cometida a contraordenação pela qual o arguido foi sancionado (alínea 4 do § 69); ou pode remeter os autos ao Tribunal local para que tenha lugar uma apreciação judicial do processo contraordenacional, dando seguimento à impugnação da decisão administrativa sancionatória deduzida pelo arguido (alínea 4 do § 69). Ao fazer esta remessa, o Ministério Público pode fazê-la acompanhar de um parecer sobre a admissibilidade da impugnação ou da sugestão dos autos serem devolvidos à autoridade administrativa para aprofundamento das diligências instrutórias.
Ainda no âmbito desta fase intermédia, com finalidades saneadoras, o Tribunal Local além de poder rejeitar a impugnação por incumprimento das formalidades legais para a sua dedução (alínea 1 do § 70); pode remeter os autos à autoridade administrativa para completar a sua instrução, obtido o consentimento do Ministério Público (alínea 5 do § 69); pode conhecer de qualquer vício formal da decisão sancionatória ou do processo contraordenacional; pode devolver o processo à entidade administrativa para arquivamento, por não haver indícios suficientes da prática da contraordenação pela qual o arguido foi sancionado (alínea 5 do § 69); ou pode dar início à fase do julgamento do arguido pela prática da contraordenação pela qual foi sancionado pela autoridade administrativa (§ 71 e seg.), abrindo-se a fase judicial do processo contraordenacional.
Nos casos em que o processo é devolvido à autoridade administrativa, para esclarecimento, renascem nela todas as competências que possuía previamente ao envio dos autos ao Ministério Público, podendo repetir a decisão, proferir nova decisão com diferente conteúdo ou arquivar o processo, retirando a decisão proferida (alínea 5 do § 69).
Com este novo e complexo figurino, a OWiG alemã conferiu uma maior complexidade a esta fase intermédia, tendo em vista não só o descongestionamento dos tribunais, através da realização de uma triagem multinível rigorosa, mas também que os processos que acedem à fase judicial se encontrem devidamente instruídos e limpos de quaisquer vícios, encontrando-se o juiz na posse de todos os elementos necessários à prolação de uma decisão informada [17].
Apesar das vantagens acima enunciadas, o legislador português, pese embora ter procedido a várias reformas do RGCO posteriormente à reconstrução da fase intermédia do processo contraordenacional na Alemanha, promovida, sobretudo, pela OWiGStVGÄnd de 1986, manteve esta fase com a configuração inicial, a qual foi decalcada da versão primitiva da OWiG de 1968. Ter-se-á entendido que as propaladas vantagens não justificavam a introdução de uma fase demasiado complexa num processo que se deveria caraterizar pela sua simplicidade.
Assim, o artigo 62.º do RGCO limita-se, ainda hoje, a dizer que a autoridade administrativa, após ser recebida a impugnação judicial, pode revogar a decisão impugnada, ou, se assim não o entender, enviar os autos ao Ministério Público, em cinco dias, o qual, por sua vez, os remete ao juiz, valendo este ato como acusação.
Prevê-se, em primeiro lugar, a possibilidade da autoridade administrativa, face aos argumentos esgrimidos pelo arguido nas alegações e conclusões da impugnação judicial que lhe é apresentada, revogar a decisão sancionatória (artigo 62.º, n.º 2, do RGCO). Recebida a impugnação da decisão sancionatória proferida pela autoridade administrativa, esta tem o dever [18] de analisar os argumentos aduzidos nas respetivas alegações e conclusões, reapreciando a sua decisão, podendo, se assim o entender, revogá-la, no prazo máximo de 5 dias (dentro do prazo que dispõe para a enviar ao Ministério Público).
Em primeiro lugar, constata-se que a autoridade administrativa não tem poderes para verificar se a impugnação apresentada cumpre os requisitos legais.
E, conforme revela a curta duração do prazo para a autoridade administrativa reexaminar a decisão sancionatória, contrariamente ao que prevê a atual redação da OWiG alemã, resultante da reforma legislativa de 1986, também não lhe é possível realizar novas diligências de prova, com vista a tomar posição sobre a impugnação deduzida pelo arguido [19].
A autoridade administrativa já poderá, todavia, revogar a decisão sancionatória. A revogação deve basear-se no reconhecimento da existência de uma ilegalidade processual (v.g. a não audição do arguido) ou substantiva (v.g. aplicação de uma sanção acessória não prevista na lei) [20], pelo que, apesar da terminologia utilizada, estamos perante uma situação que se equipara à anulação de um ato administrativo com efeitos retroativos (artigo 163, n.º 2, do C.P.A.), o que permitirá, para além da possibilidade de uma revogação parcial (v.g. revogação limitada à aplicação da sanção acessória) [21], o suprimento, se possível, da ilegalidade existente, seguida de prolação de nova decisão pela autoridade administrativa [22].
Em alternativa à revogação da decisão, poderá a autoridade administrativa proferir despacho de sustentação, em que contrarie as razões apresentadas pelo arguido nas suas alegações [23].
Não reconhecendo a autoridade administrativa que haja motivos para revogar a decisão sancionatória, deve enviar os autos do processo contraordenacional ao Ministério Público, no prazo de cinco dias após ter sido deduzida a impugnação judicial (artigo 62.º, n.º 1, do RGCO) [24].
Dispõe o analisado artigo 62.º, n.º 1, do RGCO, que, enviados os autos do processo contraordenacional ao Ministério Público, na sequência da impugnação da decisão administrativa sancionatória pelo arguido, aquele Magistrado os tornará presentes ao juiz, valendo este ato como acusação [25].
Conforme se refere expressamente na alínea 4, do artigo 69.º da OWig alemã, com a receção dos autos pelo Ministério Público as funções persecutórias da autoridade administrativa transferem-se para aquela magistratura.
Não se verifica uma conversão da decisão sancionatória impugnada numa acusação [26], assim como não é o despacho do Ministério Público que determina a apresentação dos autos ao juiz (o que corresponde à sua entrada no tribunal, para distribuição a um juiz) que vale como acusação, o qual não define minimamente o objeto do processo. O que corresponde a uma acusação é o ato de apresentação dos autos do processo contraordenacional ao juiz, não existindo no processo contraordenacional uma acusação em sentido formal, enquanto indicação precisa pelo Ministério Público da factualidade que conforma o objeto do processo e das infrações que são imputadas ao arguido, tal como exige o Código de Processo Penal no artigo 283.º, n.º 3.
A apresentação do processo contraordenacional no Tribunal, para ser distribuído a um juiz, revela a assunção pelo Ministério Público da função estadual persecutória inerente àquele processo, em substituição da autoridade administrativa que o investigou e decidiu, delimitando a decisão impugnada, ou melhor dizendo, a questão contraordenacional sobre a qual incidiu a decisão impugnada [27], o tema do julgamento a efetuar pelo tribunal [28].
A apresentação do processo contraordenacional não se traduz, pois, na dedução de uma acusação, mas tem os mesmos efeitos desse ato em processo penal – manifesta a pretensão do Ministério Público que o arguido seja submetido a julgamento e delimita a temática do julgamento.
É apenas este o significado e o alcance da expressão contida no artigo 62.º do RGCO que a apresentação dos autos do processo contraordenacional pelo Ministério Público no Tribunal vale como acusação.
A apresentação dos autos do processo contraordenacional a um juiz é apenas uma das várias opções que o Ministério Público dispõe na atual redação da OWiG alemã, a qual prevê que este magistrado também possa proceder à realização de atos de instrução ou determinar o arquivamento dos autos.
Será no próximo capítulo que iremos verificar se estas são também alternativas viáveis no regime contraordenacional português, respondendo à consulta efetuada.
Mas, nesta fase intermédia de saneamento do processo, o juiz também desempenha um papel necessário, não se encontrando ainda a exercer os seus poderes de julgamento da causa.
Assim, nos termos do artigo 63.º do RGCO compete, desde logo, ao juiz rejeitar a impugnação deduzida pelo arguido quando esta tenha sido deduzida fora do prazo ou sem respeito pelas exigências de forma.
Mas, de igual forma, tem sido reconhecida, como integrando ainda a antecâmara da fase judicial do processo contraordenacional, a possibilidade de o juiz, considerando a decisão impugnada inepta ou detetando outros vícios do conhecimento oficiosos no processo contraordenacional, determinar a remessa dos autos à autoridade administrativa para que esta sane esses vícios, aplicando-se subsidiariamente, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 311.º do Código de Processo Penal [29].
Comparando o regime no RGCO desta fase intermédia com o que vigora na Alemanha, é flagrante a maior rigidez e a minimização do leque dos poderes de intervenção dos diferentes intervenientes no processo contraordenacional em Portugal.
Há quem advogue, de iure condendo, a transposição do complexo de regras da OWiG que atualmente regem a fase intermédia do processo contraordenacional alemão para o RGCO, alegando as seguintes vantagens:
A montante...: a) impele a autoridade administrativa à elaboração de decisões condenatórias bem sustentadas e fundamentadas, na medida em que ela sabe que todo o seu trabalho poderá vir a ser sindicado pelo MP e pelo tribunal, correndo o risco de vir a ser obrigada a repetir alguns atos; b) obrigaria à elaboração de impugnações judiciais sólidas, devidamente sustentadas sob o ponto de vista jurídico, diminuindo, desse modo, a tentação de as apresentar com fins meramente dilatórios; c) sendo as decisões condenatórias mais perfeitas, os recursos melhor sustentados e tendo a autoridade administrativa ainda o poder de rever a sua decisão mesmo depois da entrada do recurso, o número de impugnações judiciais que chegaria a tribunal diminuiria, assim contribuindo para o descongestionamento dos tribunais.
A jusante...: a) a atividade desenvolvida depois da entrada do recurso, quer pela autoridade administrativa, quer pelo MP, permite que o processo, quando chegar ao tribunal, tenha algumas questões diluídas, de forma a que o juiz esteja em condições de decidir; b) na medida em que o processo intermédio permite a recolha de novos meios de prova, uma vez chegada a hora da audiência, o juiz tem praticamente toda a prova produzida ao seu dispor, encontrando-se em condições de decidir [30].
No entanto, também existem razões válidas para rejeitar esta proposta de transposição do direito contraordenacional alemão, a qual iria seguramente aumentar a esperança média de vida dos processos contraordenacionais, provocando algum entorpecimento na sua tramitação, em resultado da introdução de um tempo de pausa intermédio mais prolongado.
Em alternativa, propõe AUGUSTO SILVA DIAS [31]:
Parece-nos adequada e pertinente a intervenção saneadora da autoridade administrativa, do MP e dos tribunais, mas cremos que a introdução formal de uma fase intermédia viria aumentar a complexidade e consequentemente a morosidade do processo contraordenacional. Os benefícios apontados a esta solução, nomeadamente a dissuasão do uso formal e materialmente infundado do mecanismo de impugnação e o desanuviamento dos tribunais, podem ser conseguidos com melhores resultados por três vias: um entendimento correto dos poderes de triagem da impugnação conferidos pela lei à autoridade administrativa, ao MP e ao tribunal; um reforço dos mecanismos de triagem da impugnação judicial em sede de revisão do RGCO, consagrando nomeadamente a possibilidade de o juiz devolver o processo  autoridade administrativa para ser corrigido e melhor documentado, a previsão da reformatio in pejus no domínio das contraordenações “tradicionais” ou de pequena gravidade.
Como referimos no início deste parecer, para além do regime geral das contraordenações constante do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, o legislador tem vindo a criar inúmeros regimes gerais sectoriais que estabelecem regras diferenciadas, quer no domínio do direito substantivo, quer no do direito processual, aplicáveis ao conjunto de contraordenações previstas no âmbito de uma determinada matéria.
Da pesquisa efetuada pelos diversos regimes sectoriais, relativamente à intervenção do Ministério Público na fase intermédia do processo contraordenacional, não se detetou qualquer distanciamento da solução contida no RGCO, limitando-se alguns desses regimes a dilatar o prazo para a autoridade administrativa remeter o processo contraordenacional ao Ministério Público [32] e a exigir que a desistência da “acusação” tenha também a concordância da autoridade administrativa sancionadora [33].
Traçado o panorama em que se encontra a fase intermédia do processo contraordenacional, chega o momento de procurarmos dar uma resposta à pergunta formulada nesta consulta – quais são os poderes processuais do Ministério Público, no âmbito do recurso de impugnação judicial da decisão de autoridade administrativa, nesta fase intermédia ?
 
IV – Os poderes do Ministério Público na fase intermédia
A redação do n.º 1, do artigo 62.º, do RGCO, enfatizada pelo termo “deve”, sugere que a única opção do Ministério Público, após a receção dos autos do processo de contraordenação que lhe são enviados pela autoridade administrativa, após aí ter proferido decisão sancionatória, sem que a tenha revogado, é a de os apresentar a um juiz, equivalendo essa apresentação à dedução de uma acusação, nos termos já acima analisados.
No entanto, é unânime a opinião de que o Ministério Público não pode, nesta situação, ser um mero núncio ou um serviço de distribuição postal que se limita a proceder à entrega em Tribunal de um processo que lhe foi remetido por uma autoridade administrativa para que se proceda à tramitação da fase judicial.
Divergem já as opiniões quanto às alternativas que se oferecem ao Ministério Público para além daquela que o artigo 62.º, n.º 1, do RGCO, equivocamente, refere como um dever.
ANTÓNIO DE OLIVEIRA MENDES e JOSÉ DOS SANTOS CABRAL [34], entendem que o Ministério Público deve proceder ao reexame da fase administrativa e pronunciar-se sobre questões incidentais no mesmo suscitadas, sendo-lhe, no entanto, vedada a possibilidade de proferir qualquer decisão que subtraia o conhecimento judicial da impugnação deduzida. Só posteriormente à apresentação ao juiz dos autos do processo contraordenacional, poderia, então, o Ministério Público, retirar “a acusação”, com a concordância do arguido, nos termos previstos no artigo 65.º-A, do RGCO.
Nesta perspetiva, a atividade do Ministério Público, nesta fase intermédia, resumir-se-ia à possibilidade de emissão de um parecer sobre as questões relativas à admissibilidade da impugnação ou à legalidade do processo contraordenacional na sua fase administrativa.
A mesma ideia é sustentada por LEONES DANTAS [35], revendo anterior opinião [36], por MANUEL FERREIRA ANTUNES [37] e por CARLOS ADÉRITO TEIXEIRA [38].
BEÇA PEREIRA [39], além da emissão de parecer sobre a admissibilidade da impugnação, sustenta que, por maioria de razão, relativamente à possibilidade de o Ministério Público retirar “a acusação”, também pode não a deduzir, ordenando o arquivamento do processo contraordenacional, após o receber da autoridade administrativa, sem que seja necessário o acordo do arguido. Para se decidir pelo arquivamento, o Ministério Público teria em consideração o critério estabelecido pelo artigo 277.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Penal – juízo de não cometimento do ilícito pelo arguido ou de inexistência de indícios suficientes do seu cometimento pelo arguido - ou qualquer circunstância que justificasse tal solução, como por exemplo a aplicação de uma amnistia ou a constatação da prescrição do ilícito contraordenacional.
Igual possibilidade de arquivamento admite SIMAS SANTOS [40], afastando-se de opinião contrária expressa anteriormente em obra em autoria conjunta com JORGE LOPES DE SOUSA [41] .
Também AUGUSTO SILVA DIAS [42], com o já referido argumento de “maioria de razão”, defende que a conversão da decisão impugnada em “acusação” não é obrigatória, devendo antes o Ministério Público ponderar a sua legalidade e sustentabilidade, antes de remeter ao juiz o processo contraordenacional, podendo determinar o seu arquivamento.
A mesma opinião é professada por ALEXANDRA VILELA [43], invocando as competências estatutárias do Ministério Público.
PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE [44], defende que, tendo o Ministério Público o poder de retirar a acusação a todo o tempo e até à sentença em 1.ª instância ou até ser proferido o despacho previsto no n.º 2, do artigo 64.º, do RGCO, nos termos expressamente previstos no artigo 65.º-A, do mesmo diploma, evitando a prática de atos processuais inúteis, pode-o exercer antes de apresentar os autos do processo contraordenacional ao juiz, não havendo lugar à aplicação subsidiaria do disposto no artigo 277.º do Código de Processo Penal. Na opinião deste autor, a retirada da acusação está, contudo, sujeita à concordância do arguido, devendo também ser auscultada a autoridade administrativa que aplicou a sanção impugnada, embora sem caráter vinculativo.
GERMANO MARQUES DA SILVA [45], refere que o artigo 65.º-A dispõe que o Ministério Público pode retirar a acusação até à decisão judicial e se pode retirar a acusação, sem necessidade de consentimento da autoridade administrativa, não se entenderia que tivesse de formular “acusação” se com ela não concordar.
O Acórdão da Relação de Évora da 28 de outubro de 2008 [46], na sua fundamentação, tomou posição sobre esta questão, nos seguintes termos:
 Tal normativo (artigo 65.º-A, do RGCO) atribui ao MP um poder de determinar o destino do processo já em fase judicial que, por arrastamento, significa o “deixar cair” a decisão administrativa, sendo dispensável a intervenção do juiz.
E, nesta fase judicial – já deduzida a acusação – faz todo o sentido, em homenagem aos direitos de defesa, que o arguido deva ser ouvido e tenha que dar o seu assentimento à retirada da acusação.
Já assim não será na fase anterior, na fase acusatória. Aí ainda não foi deduzida acusação, ainda não há processo judicial “contraditório” e o consentimento do arguido não faz qualquer sentido. Não tem que ser ouvido, não tem que dar opinião sobre a decisão de deduzir, ou não, acusação. Essa é matéria da exclusiva competência do MP que, caso entenda conveniente, apenas deverá ouvir a entidade administrativa.
Se o MP deve, nesta fase judicial posterior, fazer o controlo da legalidade da decisão administrativa e se é possível à entidade administrativa revogar a sua decisão na fase administrativa do processo contraordenacional com fundamento no mesmo princípio da legalidade, não se vê como pode o MP demitir-se da sua autonomia e obrigação de velar pelo controlo da legalidade na fase acusatória do mesmo processo, ou seja, a obrigação de não deduzir a acusação com fundamento no princípio da legalidade.
Por outro lado não se descortina como o princípio da legalidade, na concretização dada pelo Código de Procedimento Administrativo – plenamente aplicável na fase administrativa aos órgãos das entidades administrativas e plenamente vinculante da sua atuação – poderá tolher a ação do MP na fase acusatória, cujo direito subsidiário se sedia nos artigos 277º e 283º do Código de Processo Penal e é enformada pelos princípios processuais penais.  
O único óbice substancial e substantivo a este entendimento está na existência da impugnação judicial do arguido.
Manter-se-á um valor vinculante da decisão da entidade administrativa? O não envio “automático” do processo ao juiz não será a negação efetiva do direito do arguido a ver a sua impugnação apreciada, de facto e de direito, por um tribunal?
Ora, o RGCO resolve expressamente tal problema ao afirmar no artigo 65º-A do RGCO que o MP pode “retirar” o recurso a todo o tempo e até à sentença em 1ª instância.
A “retirada“ da acusação pelo MP corresponde, de facto e de direito, a uma revogação da decisão da entidade administrativa. Outro não pode ser o entendimento e outras não podem ser as consequências de tal “retirada”. A decisão da entidade administrativa passa a ser não vinculante e não executória por via da revogação. 
Se tal conduta é possível ao MP já em fase judicial – e nesta sujeita aos requisitos de audição da entidade decisora (facultativo) e concordância do arguido (obrigatória) - nada obsta a que, em fase anterior (acusatória) o MP não tenha os mesmos poderes, apenas vinculado ao princípio da legalidade do ato e ao requisito de audição (facultativo) da entidade que decidiu. Nesta fase “acusatória”, não sujeita, em si, ao contraditório, a audição do arguido é dispensável.
Relativamente ao destino da impugnação judicial do arguido ele será o mesmo da fase posterior: a não “acusação” e consequente arquivamento dos autos, corresponderá à revogação da decisão da entidade administrativa e à inutilidade superveniente da impugnação judicial.  
Nesta fase processual nem o arguido nem o juiz têm qualquer necessidade de intervenção. Quer para o consentimento (ineficaz), quer para qualquer “homologação” da decisão do MP (fase não judicial do procedimento). 
Também aqui o MP é “dominus” da acusação e “garante” da legalidade, não valendo argumentar com o princípio da legalidade para, com o único apelo a uma leitura literal de preceitos, homologar práticas que violam … o princípio da legalidade.
Relembre-se que na atual versão da OWiG alemã, o Ministério Público pode proceder à realização de novos atos de instrução; pode determinar o arquivamento dos autos; ou pode remeter os autos ao juiz para julgamento da contraordenação pela qual o arguido foi sancionado pela autoridade administrativa.
Tendo nós concluído na primeira parte deste parecer (capítulo II) que a fase judicial do processo contraordenacional não se traduz na apreciação de um verdadeiro recurso de uma decisão administrativa, aproximando-se mais de uma primeira apreciação judicial da questão contraordenacional objeto da decisão administrativa impugnada, como se de um primeiro julgamento se tratasse, a opção legislativa da remessa dos autos ao Ministério Público, após a dedução da impugnação judicial, não pode deixar de ter um significado que importa descortinar.
É impensável, desde logo, que o legislador tivesse encarado o Ministério Público como um simples “estafeta” da autoridade administrativa, a quem foi confiada a única missão de apresentar os autos do processo contraordenacional em tribunal para que tivesse início a fase judicial.
Também não faz sentido que a entrega dos autos do processo contraordenacional ao Ministério Público visasse apenas permitir o seu conhecimento e exame por este magistrado, tendo em consideração que seria ele a representar os interesses persecutórios estaduais na fase judicial. Esse conhecimento e estudo do processo sempre seria possível após a sua distribuição no tribunal, não havendo quaisquer razões para uma antecipação desse momento.
Quanto à descortinada finalidade de permitir ao Ministério Público emitir um parecer sobre as questões relativas à admissibilidade da impugnação ou à legalidade do processo contraordenacional na sua fase administrativa, o que encontraria paralelo na vista ao Ministério Público que desempenha funções no tribunal superior, prevista no artigo 416.º do Código de Processo Penal, em fase de recurso, ela contrariaria o figurino da fase judicial do processo contraordenacional que, tal como se afirmou, se afasta da figura do recurso de controle da correção da decisão recorrida e se aproxima da tramitação de um primeiro julgamento penal. Não se olvide que a decisão sancionatória proferida pela autoridade administrativa, ao ser apresentada pelo Ministério Público em tribunal, em consequência da sua impugnação pelo arguido, vai desempenhar algumas das finalidades da acusação em processo penal, correspondendo, neste processo, as alegações e conclusões da impugnação à contestação do arguido, pelo que, neste desenho, não há lugar para um parecer que seria emitido por quem, com a apresentação do processo em tribunal, assume a “dedução” da acusação.
A intervenção do Ministério Público na denominada fase intermédia do processo contraordenacional só pode ter um significado que seja compatível com a estrutura do processo contraordenacional, designadamente na fase judicial subsequente, e com as funções do Ministério Público que lhe são cometidas pela lei.
Conforme resulta da tramitação da fase judicial do processo contraordenacional regulada no RGCO, esta tem uma estrutura acusatória, sendo atribuída à magistratura do Ministério Público, à semelhança do que sucede no processo penal, a representação dos interesses do Estado no sancionamento das práticas contraordenacionais. Daí que se possa afirmar que, tal como lhe incumbe a promoção da ação penal (artigo 4.º, d), do Estatuto do Ministério Público, aprovado pela Lei n.º 68/2019, de 27 de agosto), também é função desta magistratura a promoção da ação contraordenacional na sua fase judicial. E essa promoção inicia-se precisamente pela apresentação dos autos do processo contraordenacional em juízo, a qual, nos termos do artigo 62.º, n.º 1, do RGCO, corresponde à dedução de uma acusação em processo penal, isto é à manifestação da pretensão que o arguido seja sujeito a julgamento.
Ora, tal como sucede no processo penal, cujas regras são aplicáveis subsidiariamente, a decisão de promover a submissão de alguém a julgamento deve obedecer a um juízo de estrita objetividade jurídica. O Ministério Público como órgão autónomo da administração da justiça, encontra-se incondicionalmente submisso aos valores da descoberta da verdade e da realização da justiça, pelo que, interessando à comunidade de um Estado de direito democrático, não só a punição de todos os prevaricadores, mas também a punição só daqueles que prevaricaram, num modelo acusatório, o Ministério Público só deve solicitar o julgamento daqueles sobre os quais recaem indícios seguros de que cometeram um ilícito, neste caso contraordenacional. Este dever de objetividade contribuirá, aliás, como reflexo útil, para o desejado alívio dos tribunais judiciais.
Ponderando a estrutura acusatória da fase judicial do processo contraordenacional, a sua manifesta proximidade com a tramitação de um primeiro julgamento em processo penal, e a atribuição ao Ministério Público das funções de promoção da ação contraordenacional, quer na denominada fase intermédia, quer na subsequente fase de julgamento, a remessa dos autos ao Ministério Público, após a impugnação da decisão sancionatória proferida pela autoridade administrativa, nos termos do artigo 62.º, n.º 1, do RGCO, com um valor idêntico ao de uma acusação em processo penal, só pode ter como finalidade permitir que este Magistrado, vinculado a critérios de legalidade e objetividade, pondere se o arguido deve ser sujeito a julgamento em processo contraordenacional.
Atentas as caraterísticas estruturais do processo contraordenacional e a autonomia do Ministério Público, é impensável que esta magistratura pudesse ter na introdução do processo contraordenacional em juízo o papel de um mero núncio da autoridade administrativa.
A lei, ao determinar a sua intervenção nesta fase, pretendeu que o Ministério Público examinasse o processo contraordenacional que lhe é remetido, designadamente a decisão sancionatória proferida e a contestação apresentada, e ponderasse, obedecendo a critérios de legalidade e objetividade, se o arguido devia ou não ser sujeito a julgamento judicial pela prática da contraordenação ou contraordenações que foram objeto temático do processo que lhe foi remetido. A atribuição desta disponibilidade da promoção do processo contraordenacional, ultrapassada a fase administrativa, ao Ministério Público, é confirmada pelo disposto no artigo 65.º-A, do RGCO, que, mesmo após a apresentação do processo contraordenacional ao juiz, num ato equivalente à dedução de acusação, e até à prolação da sentença em 1.ª instância, permite a sua retratação, facultando ao Ministério Público a retirada da “acusação”, embora nesta fase, já sujeita à concordância do arguido, sendo a audição da entidade administrativa facultativa e não vinculativa.
Assim, após exame dos autos do processo contraordenacional, o Ministério Público deve apresentá-los ao tribunal competente, para serem distribuídos a um juiz, equivalendo essa opção à dedução de uma acusação em processo penal [47], caso entenda que existem indícios suficientes da prática da contraordenação ou contraordenações que foram objeto daquele processo; ou pode, pelo contrário, determinar o seu arquivamento, se tiver verificado a existência de prova bastante de esses ilícitos não se terem verificado ou de o arguido não os ter praticado, de ser legalmente inadmissível o respetivo procedimento (v.g. prescrição, amnistia, imunidade, violação do caso julgado, ne bis in idem) ou ainda de não existirem indícios suficientes da verificação da atividade contraordenacional ou dos seus agentes, tal como sucede no processo penal, por aplicação do disposto no artigo 277.º, n.º 1 e 2, do respetivo Código [48].
Quando porém se verificarem vícios sanáveis na decisão impugnada ou no processo contraordenacional (v.g. falta ou ininteligibilidade da fundamentação da decisão impugnada, inobservância do direito de audiência, utilização de provas proibidas, erro na pessoa do sancionado) que nem justificam o arquivamento do processo, nem a sua apresentação no tribunal, deve o Ministério Público antecipar-se à decisão judicial de devolução do processo à autoridade administrativa e proceder ele a essa remessa, de modo a que tais vícios sejam sanados, proferindo a autoridade administrativa nova decisão, sem que seja necessária uma intervenção judicial.
Face ao exposto, numa leitura integrada, que tenha presente os princípios que subjazem à intervenção do Ministério Público no Processo Penal, é possível entender-se que estes poderes se encontram ínsitos na competência que lhe é atribuída pelo artigo 62.º, n.º 1, do RGCO, ou então, para quem se sinta limitado pela literalidade deste preceito, deve considerar-se que, com as necessárias adaptações, é aplicável aos poderes do Ministério Público nesta fase intermédia o disposto no artigo 277.º do Código de Processo Penal, como legislação subsidiária.
Não parece é que esta solução possa ser colhida diretamente do disposto no artigo 65.º-A, do RGCO, apesar do seu conteúdo funcionar como um bom argumento adjuvante da leitura proposta para o artigo 62.º, n.º 1, do mesmo diploma, porque, apesar de aí se referir que a retirada da acusação pode ocorrer a todo o tempo, até ser proferida sentença em 1.ª instância, essa faculdade pressupõe, obviamente, que a acusação, ou o seu sucedâneo, já teve lugar, o que só poderá ocorrer precisamente com a intervenção do Ministério Público na fase intermédia do processo contraordenacional. Não é, pois, possível invocar o poder de retirar uma acusação já deduzida, atribuído pelo artigo 65.º-A, do RGCO, para diretamente fundamentar a possibilidade de determinar o arquivamento dos autos antes de ser deduzida qualquer acusação ou praticado ato equivalente a essa dedução.
O reconhecimento ao Ministério Público do poder de determinar o arquivamento do processo contraordenacional, na sua fase intermédia, suscita a interrogação sobre a sua sindicabilidade [49].
Em primeiro lugar, o arquivamento do processo contraordenacional pelo magistrado do Ministério Público, não é totalmente insindicável, uma vez que poderá ser sempre objeto de controle por iniciativa do seu superior hierárquico, aplicando-se subsidiariamente, nessa parte, o disposto no artigo 278.º do Código de Processo Penal.
Em segundo lugar, o facto de não se encontrar previsto uma forma de controle mais atuante desta opção do Ministério Público, não nos deve impressionar, uma vez que essa ausência de controle também ocorre, relativamente a muitas das decisões de revogação da decisão sancionatória por parte das autoridades administrativas, assim como à retirada da acusação pelo magistrado do Ministério Público nos termos previstos no artigo 65.º-A do RGCO, onde, no regime geral, apenas se exige a concordância do arguido. Em todas estas situações, a prossecução dos interesses estaduais é atribuída, inicialmente à autoridade administrativa e, posteriormente, ao Ministério Público, sem que se revele necessária a previsão de específicos mecanismos de controle dessa atividade, até porque não é admissível a constituição de assistentes no processo contraordenacional, apesar de a prática de contraordenações poder causar danos a particulares. Aliás, o mesmo ocorre no próprio processo penal nos denominados crimes sem vítimas.
Contrariamente ao que sucede com a retirada da acusação quando o processo já se encontra em plena fase judicial, a qual está dependente da concordância do arguido e, em regra, deve ser precedida da audição da autoridade administrativa [50], o arquivamento do processo contraordenacional, antes de ser introduzido em juízo não está sujeito a essas condicionantes [51], o que se compreende, uma vez que ainda não foi proferido um juízo de suspeita sobre o comportamento do arguido por parte de um órgão de administração da justiça que justifique que aquele possa exigir um julgamento que o ilibe dessa suspeita, e a autoridade administrativa, nesta fase intermédia, já teve oportunidade de sustentar a sua decisão sancionatória após ter recebido a impugnação deduzida pelo arguido.
Com o arquivamento ou a devolução à entidade administrativa do processo contraordenacional, a decisão sancionatória impugnada fica sem efeito, sem ter chegado a ser necessária uma intervenção judicial, alcançando-se, também, por esta via, um dos desígnios do direito de mera ordenação social.
Arquivado o processo, por decisão do Ministério Público, o processo contraordenacional só pode voltar a ser reaberto se surgirem novos elementos de prova que invalidem os fundamentos da opção de arquivamento, numa aplicação subsidiária do disposto no artigo 279.º, n.º 1, do Código de Processo Penal [52], ou caso se verifiquem situações análogas às previstas no artigo 449.º, n.º 1, a) e b), do mesmo diploma.
O Ministério Público não pode, no entanto, face à inexistência de indícios suficientes da prática de qualquer contraordenação pelo arguido, ordenar à entidade administrativa a repetição ou a realização de novas diligências de prova, nem pode devolver-lhe os autos para realização dessas diligências, uma vez que não existe qualquer relação de subordinação hierárquica entre a autoridade administrativa e o Ministério Público [53].
O Ministério Público também está impedido de proceder à conversão do processo contraordenacional em processo criminal, caso entenda que os factos resultantes das diligências levadas a cabo pela autoridade administrativa indiciam a existência de um ilícito criminal e não de uma contraordenação, devendo, nesta hipótese, limitar-se a requerer essa conversão ao juiz, conforme prevê o artigo 76.º do RGCO [54]. Na hipótese, porém, desses factos não terem sido objeto de julgamento contraordenacional, nada obsta a que o Ministério Público proceda à abertura de inquérito criminal destinado a averiguar a prática de um ilícito criminal, conforme resulta do disposto nos artigos 79.º, n.º 2, e 90.º, n.º 2, do RGCO) [55].
 
Conclusões
Em síntese do acima exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

              1.ª O artigo 62.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações, dispõe que, interposta pelo arguido impugnação judicial da decisão de autoridade administrativa que o sancionou pela prática de uma contraordenação, deve essa autoridade enviar os autos ao Ministério Público que os tornará presentes ao juiz, valendo este ato como acusação.
              2.ª Com a apresentação dos autos ao juiz não se verifica uma conversão da decisão sancionatória impugnada numa acusação.
              3.ª O que corresponde a uma acusação é o ato de apresentação dos autos do processo contraordenacional ao juiz, não existindo uma acusação em sentido formal, enquanto indicação precisa pelo Ministério Público da factualidade que conforma o objeto do processo e das infrações que são imputadas ao arguido.
               4.ª A apresentação do processo contraordenacional ao juiz não se traduz, pois, na dedução de uma acusação, mas tem os mesmos efeitos desse ato em processo penal – manifesta a pretensão do Ministério Público de que o arguido seja submetido a julgamento e delimita a temática do julgamento.
               5.ª Mas esta não é a única opção de que dispõe o Ministério Público quando a autoridade administrativa lhe remete os autos do processo contraordenacional, não sendo aquele magistrado um mero núncio que se limita a proceder à entrega do processo no Tribunal.
               6.ª A intervenção do Ministério Público na denominada fase intermédia do processo contraordenacional só pode ter um significado que seja compatível com a estrutura deste tipo de processo, designadamente na fase judicial subsequente, e com as funções do Ministério Público que lhe são cometidas pela lei.
               7.ª Conforme resulta da tramitação da fase judicial do processo contraordenacional regulada no RGCO, esta tem uma estrutura acusatória, sendo atribuída à magistratura do Ministério Público, à semelhança do que sucede no processo penal, a representação dos interesses do Estado no sancionamento das práticas contraordenacionais.
               8.ª Nas funções de promoção da ação contraordenacional na sua fase judicial, o Ministério Público, como órgão autónomo da administração da justiça, encontra-se incondicionalmente sujeito aos valores da descoberta da verdade e da realização da justiça, pelo que só deve solicitar o julgamento daqueles arguidos sobre os quais recaem indícios seguros de que cometeram um ilícito contraordenacional.
               9.ª O artigo 62.º, n.º 1, do RGCO, ao determinar a intervenção do Ministério Público na fase intermédia do processo contraordenacional, pretendeu que este magistrado examinasse o processo que lhe é remetido, designadamente a decisão sancionatória proferida e a contestação apresentada, e ponderasse, obedecendo a critérios de legalidade e objetividade, se o arguido devia ou não ser sujeito a julgamento judicial pela prática da contraordenação ou contraordenações que foram objeto temático do processo que lhe foi remetido.
              10.ª Assim, após exame dos autos do processo contraordenacional, o Ministério Público deve apresentá-los ao tribunal competente, para serem distribuídos a um juiz, equivalendo essa opção à dedução de uma acusação em processo penal, caso entenda que existem indícios suficientes da prática da contraordenação ou contraordenações que foram objeto daquele processo; ou pode, pelo contrário, determinar o seu arquivamento, se tiver verificado a existência de prova bastante desses ilícitos não se terem verificado ou de o arguido não os ter praticado, de ser legalmente inadmissível o respetivo procedimento ou ainda de não existirem indícios suficientes da verificação da atividade contraordenacional ou dos seus agentes, tal como sucede no processo penal, por aplicação do disposto no artigo 277.º, n.º 1 e 2, do respetivo Código.
               11. ª Quando porém se verificarem vícios sanáveis na decisão impugnada ou no processo contraordenacional, que nem justificam o arquivamento do processo, nem a sua apresentação no tribunal, deve o Ministério Público antecipar-se à decisão judicial de devolução do processo à autoridade administrativa e proceder ele a essa remessa, de modo a que tais vícios sejam sanados, proferindo a autoridade administrativa nova decisão, sem que seja necessária uma intervenção judicial.
               12.ª Numa leitura integrada, que tenha presente os princípios que subjazem à intervenção do Ministério Público no Processo Penal, é possível entender-se que estes poderes se encontram ínsitos na competência que lhe é atribuída pelo artigo 62.º, n.º 1, do RGCO, ou então, para quem se sinta limitado pela literalidade deste preceito, deve considerar-se que, com as necessárias adaptações, é aplicável aos poderes do Ministério Público, nesta fase intermédia, o disposto no artigo 277.º e seg., do Código de Processo Penal, como legislação subsidiária.
              13.ª Nesta fase, o arquivamento do processo contraordenacional não está dependente da concordância do arguido, nem da auscultação da autoridade administrativa.
              14.ª Com o arquivamento ou a devolução do processo contraordenacional à autoridade administrativa, a decisão sancionatória impugnada fica sem efeito, sem ter chegado a ser necessária uma intervenção judicial.
              15.ª Arquivado o processo, por decisão do Ministério Público, o processo contraordenacional só pode ser reaberto se surgirem novos elementos de prova que invalidem os fundamentos da opção de arquivamento, numa aplicação subsidiária do disposto no artigo 279.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, ou caso se verifiquem situações análogas às previstas no artigo 449.º, n.º 1, a) e b), do mesmo diploma.
              16.ª O Ministério Público não pode, no entanto, face à inexistência de indícios suficientes da prática de qualquer contraordenação pelo arguido, ordenar à entidade administrativa a repetição ou a realização de novas diligências de prova, nem pode devolver-lhe os autos para realização dessas diligências, uma vez que não existe qualquer relação de subordinação hierárquica entre a autoridade administrativa e o Ministério Público.
 
[1] Este diploma já foi objeto de alterações pelos Decretos-Lei n.º 356/89, de 17 de outubro, n.º 244/95, de 14 de setembro, n.º 323/2001, de 17 de dezembro, e pela Lei n.º 109/2001, de 24 de dezembro.
 

[2] V.g. as contraordenações no Regime Geral das Instituições de Crédito, na Lei da Atividade Seguradora, no Código dos Valores Mobiliários, na Lei-Quadro das Contraordenações Ambientais, na Lei da Concorrência, no Regime Geral das Infrações Tributárias, no Regime Sancionatório do Setor Energético, ou no Código do Trabalho.
 

[3] Referindo-se a este facto, PAULO PINTO ALBUQUERQUE, em A reforma do direito das contraordenações, em “Contraordenações laborais”, 2.ª ed., e-book, CEJ, acessível em www.cej.mj.pt, pág. 20, afirma que o caráter geral do processo de contraordenações previsto no RGCO tem sido frustrado em face da multiplicação de regimes extravagantes que contrariam o regime geral. Desta forma o processo contraordenacional tornou-se o âmbito do direito sancionatório público onde mais gravemente se viola o princípio da igualdade, e ALEXANDRA VILELA, em A fase jurisdicional do processo contraordenacional, em Anatomia do Crime, n.º 5, pág. 131, diz que o que se verifica é que, em sentido contrário ao que temos vindo a defender há já alguns anos, praticamente todos os setores regulados, ao mesmo tempo que criam as suas respetivas contraordenações, criam também mini-regimes contraordenacionais, postergando o regime geral para o papel de direito subsidiário.
 

[4] FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal. Parte Geral, Tomo I, 2.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2007, pág. 158.
 

[5] Esse objetivo é claramente enunciado por EDUARDO CORREIA no escrito que antecedeu e anunciou a criação do direito de mera ordenação social em Portugal – Direito penal e de mera ordenação social, publicado no Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, n.º 49 (1973), pág. 271 e seg. e 275 e seg.
   VITOR SEQUINHO DOS SANTOS, em O dever de fundamentação da decisão administrativa condenatória em processo contraordenacional, em “Contraordenações laborais”, 2.ª ed., e-book., CEJ, acessível em www.cej.mj.pt, pág. 111, chega mesmo a afirmar:
A atribuição da competência para a instrução e julgamento das contraordenações a uma autoridade administrativa, assim aliviando os tribunais de inúmeras infrações, consideradas de menor gravidade comparativamente com aquelas que se entendeu conservar no âmbito do Direito Penal, constitui, porventura, a principal razão da autonomização de um Direito das Contraordenações, seguramente mais importante que qualquer “purificação do Direito penal”, objetivo algo abstrato e cujo posterior cumprimento é, porventura, duvidoso.
 

[6] NUNO BRANDÃO, Crimes e Contra-Ordenações: da Cisão à Convergência Material, Coimbra Editora, Coimbra, 2016, pág. 876 e seg. e MARTA BORGES CAMPOS, Os poderes de cognição do tribunal na fase de impugnação judicial do processo de contraordenação, em “Estudos sobre Law Enforcement, Compliance e Direito Penal”, coord. por Fernanda Palma, Almedina, Coimbra, 2018, pág. 387 e seg.
 

[7] Sobre o diferente grau de imparcialidade na atuação das autoridades administrativas e jurisdicionais, RUI MEDEIROS / MARIA JOÃO FERNANDES, Constituição Portuguesa anotada, Tomo III, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, pág. 43-44, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 595/2012, de 6-12-2012, acessível em www.tribunalconstitucional.pt., e o Parecer deste Conselho Consultivo, n.º 29/2017, de 9-11-2017.
 

[8] Poderá, contudo, durante a fase administrativa, haver lugar à impugnação judicial de decisões, despachos e demais medidas tomadas pela autoridade administrativa durante essa fase que prejudiquem direitos materiais ou processuais autónomos quer dos sujeitos processuais quer de terceiros (artigo 55.º, n.º 1, do RGCO).
 

[9] Seguindo o exemplo do sistema alemão, apesar de nos encontrarmos perante a impugnação de uma decisão tomada por uma autoridade administrativa e do disposto no artigo 212.º, n.º 3, da Constituição, optou-se por conferir competência aos tribunais comuns para decidir estas impugnações, em detrimento dos tribunais administrativos, opção à qual não terão sido completamente alheias as insuficiências da rede dos tribunais administrativos para dar resposta a novas competências (Vide FREITAS DO AMARAL e MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo, Almedina, 2002, pág. 24).
   O Tribunal Constitucional pronunciou-se no Acórdão n.º 522/08, de 29-10-2008, acessível em www.tribunalconstitucional.pt, sobre a constitucionalidade desta solução, tendo proferido um juízo de não inconstitucionalidade, com o fundamento de que a Constituição não estabelece uma reserva absoluta, quer no sentido de exclusiva, quer no sentido de excludente, de atribuição à jurisdição administrativa da competência para o julgamento de litígios emergentes das relações administrativas e fiscais, sendo constitucionalmente admissíveis desvios num sentido ou noutro desde que materialmente fundados e insuscetíveis de descaraterizar o núcleo essencial de cada uma das jurisdições. Relativamente à matéria processual contraordenacional, considerou-se que, estando ela, pelo menos na fase judicial, gizada à imagem do processo penal, a atribuição da competência aos tribunais comuns para conhecer da impugnação da decisão sancionatória proferida pela autoridade administrativa não desfigurava o figurino constitucional dos tribunais em jogo.
   Constituem exceções, as impugnações das decisões sancionatórias em processo de contraordenação da Autoridade Tributária que são apreciadas pelos tribunais tributários de 1.ª instância, salvo os casos em que estas devam ser julgadas pelos tribunais comuns por indicação da lei (artigos 53.º e 80.º e seg. do RGIT), e as proferidas em matéria de contraordenações urbanísticas que são julgadas pelos tribunais administrativos (artigo 4.º, n.º 1, l), do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro).
   Sobre esta questão, MIGUEL PRATA ROQUE, O direito sancionatório público enquanto bissetriz (imperfeita) entre o direito penal e o direito administrativo – a pretexto de alguma jurisprudência constitucional, em Revista de Concorrência e Regulação, Ano IV, número 14/15, abril-setembro 2013, pág. 137-141.
 

[10] Sobre esta disputa, MIGUEL PRATA ROQUE, ob. cit., pág. 124-134, CARLOS ADÉRITO TEIXEIRA, Questões processuais da responsabilidade das pessoas coletivas no domínio do direito sancionatório, em “Direito Sancionatório das Autoridades Reguladoras”, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, pág. 115-116, e o Parecer deste Conselho Consultivo n.º 29/2017, de 9-11-2017.
 

[11] JOSÉ LOBO MOUTINHO, Direito das Contraordenações, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2008, pág. 38, AUGUSTO SILVA DIAS, Direito das Contraordenações, Almedina, Coimbra, 2019, pág. 239, NUNO BRANDÃO, O controlo judicial da decisão administrativa condenatória manifestamente infundada no processo contraordenacional, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 94/1 (2018), pág. 32, MANUEL SIMAS SANTOS, Recursos e contra-ordenações: a propósito da impugnação judicial, em “Jornadas de direito das contraordenações”, Universidade Católica Editora, Porto, 2019, pág. 69-70, e J.P.F. CARDOSO DA COSTA, O recurso para os Tribunais Judiciais da Aplicação das Coimas pelas Autoridades Administrativas, Ciência e Técnica Fiscal, n.º 366, (abril-junho de 1992), pág. 36 e seg.
 

[12] Proferido no processo n.º 13/17.3T8PTB.G1-A.S1, relatado por HELENA MONIZ, acessível em www.dgsi.pt.

[13] Acessível em www.tribunalconstitucional.pt.

[14] Na redação inicial este prazo era de 48 horas.
 

[15] É a seguinte a atual redação do § 69 da OWiG, sendo da nossa responsabilidade a sua tradução:
  1. Se a impugnação não for apresentada em tempo útil, na forma prescrita ou sofrendo de qualquer invalidade, a autoridade administrativa rejeitá-la-á por inadmissibilidade. O pedido de impugnação judicial deduzido nos termos do § 62 pode ser apresentado contra a decisão administrativa no prazo de duas semanas após a notificação.
  2. Se a impugnação for admissível, a autoridade administrativa deve avaliar se mantém ou retira a decisão administrativa que aplicou a coima. Para esse efeito pode:
        1. Ordenar a realização de novas diligências investigatórias ou efetuá-las ela mesmo,
        2. Tomar declarações às entidades ou organismos sobre constatações, exames ou conclusões que tenham produzido na instrução dos autos.
        A autoridade administrativa pode igualmente conceder ao arguido a oportunidade de indicar, num determinado prazo, se e quais os factos e elementos de prova que tenciona apresentar, em sua defesa, no âmbito do processo judicial; ao fazê-lo deve informar o arguido de que, nos termos da lei, é livre de se pronunciar sobre os termos da acusação ou de não prestar depoimento sobre o mérito da mesma.
  1. A autoridade administrativa envia os processos ao Ministério Público competente do Tribunal Local, se não retirar a decisão administrativa que aplicou a coima ou não proceder em conformidade com o primeiro período da alínea 1; dá nota das razões desta opção nos processos, na medida em que tal se justifique. A decisão sobre um pedido de exame dos processos e a efetivação desse exame (alínea 1 do § 49.º, da presente lei, e § 147 do Código de Processo Penal) deve ter lugar antes do envio dos processos.
  2. Após a receção dos processos pelo Ministério Público, as funções persecutórias da autoridade administrativa são transferidas para aquele. O Ministério Público submeterá os processos ao Juiz do Tribunal Local, se não decidir arquivar o processo ou proceder à realização de novas investigações.
  3. Se os factos não estiverem suficientemente esclarecidos, o Juiz do Tribunal Local pode, com o consentimento do Ministério Público, remeter o processo à autoridade administrativa, indicando os motivos desta decisão; após receção dos autos, a autoridade administrativa é novamente responsável pela ação contraordenacional e pela aplicação da sanção. Se o Juiz do Tribunal Local entender que não há indícios suficientes da prática de uma contraordenação, pode determinar a devolução do processo à autoridade administrativa, mediante decisão irrecorrível.
     Encontra-se uma descrição detalhada desta fase intermédia na OWiG alemã em ALEXANDRA VILELA, O direito de mera ordenação social. Entre a ideia de “recorrência” e a de “erosão”, do direito penal clássico, Coimbra Editora, Coimbra, 2013 pág. 444-454.
 

[16] Dados indicados por ALEXANDRA VILELA, ob. cit., pág. 445.
 

[17] Sobre as vantagens da existência de uma fase intermédia dotada desta complexidade, ALEXANDRA VILELA, ob. cit., pág. 454-456.
 

[18] PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenações à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2011, pág. 260, anotação 14.
 

[19] PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., pág. 260, anotação 14.
 

[20] ANTÓNIO DE OLIVEIRA MENDES e JOSÉ DOS SANTOS CABRAL, Notas ao Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, 3.ª ed., Almedina, Coimbra, pág. 222, MANUEL SIMAS SANTOS e JORGE LOPES DE SOUSA, Contra-ordenações. Anotações ao Regime Geral, 6.ª ed., Áreas Editora, Lisboa, 2011, pág. 490, ALEXANDRA VILELA, ob. cit., pág. 458.
     No sentido de que a revogação da decisão sancionatória poderá ter outros fundamentos, AUGUSTO SILVA DIAS, ob. cit., pág. 243.
     PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., pág. 260, anotação 16, apesar de referir que a revogação da decisão pela autoridade só pode basear-se em razões de legalidade, exemplifica como  uma das situações em que é possível a revogação, a necessidade de um esclarecimento mais sólido dos factos.
 

[21] BEÇA PEREIRA, Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, 10-ª ed., Almedina, Coimbra, 2014, pág. 178., e PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., pág. 260, anotação 15.
 

[22] ANTÓNIO DE OLIVEIRA MENDES e JOSÉ DOS SANTOS CABRAL, ob. cit., pág. 222, MANUEL SIMAS SANTOS e JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., pág. 490, e ALEXANDRA VILELA, ob. cit., pág. 458.
    PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., pág. 260, anotação 17, admitindo também os efeitos retroativos da revogação da decisão sancionatória, invocando o disposto no anterior CPA, aponta como limite da nova decisão que venha a ser proferida não poder ser mais gravosa para o arguido que a decisão revogada, com fundamento na proibição da reformatio in pejus.
 

[23] PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., pág. 261, anotação 20, e JOÃO SOARES RIBEIRO, Contra-ordenações laborais, 2.ª ed., Almedina, Coimbra, 2003, pág. 203-204.
 

[24] PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., pág. 259, anotação 13, considera a falta de envio do processo ao Ministério Público uma nulidade insanável, nos termos do artigo 119.º, b), do Código de Processo Penal, o que determinará o arquivamento do processo contraordenacional, seguindo a posição dos Acórdãos do S.T.A. de 6-3-1996 e de 31-1-2001, acessíveis em www.dgsi.pt.
 

[25] Esta expressão, como faz notar LEONEL DANTAS, O Ministério Público no processo das contra-ordenações, em Questões Laborais, Ano VIII (2001), n.º 17, pág. 27, faz lembrar o disposto, relativamente às transgressões, no § único, do artigo 2.º, do Decreto-lei n.º 35007, de 13 de outubro de 1945, segundo o qual a remessa dos autos de notícia ao tribunal equivale para todos os efeitos à acusação proferida em processo penal, relembrando-se também que o próprio Decreto-Lei n.º 387-E/87, de 29 de dezembro, referente ao processamento das contravenções e transgressões, no seu artigo 1.º, n.º 1, alínea a), estabeleceu igual equivalência.

[26] VITOR SEQUINHO DOS SANTOS, em O dever de fundamentação da decisão administrativa condenatória em processo contraordenacional, em “Contraordenações laborais”, 2.ª ed., e-book., CEJ, acessível em www.cej.mj.pt, pág. 108.
 

[27] MARTA BORGES CAMPOS, ob. cit. pág. 390, e NUNO BRANDÃO, ob. cit., pág. 322.
 

[28] Como referem LOBO MOUTINHO e PEDRO GARCIA MARQUES, Lei da Concorrência: Comentário Conimbricense, Almedina, Coimbra, 2013, pág. 849, anot. 5 ao artigo 88.º, a totalidade dos autos do processo contraordenacional não é idónea a desempenhar a função delimitadora do objeto do julgamento pelo tribunal por três razões: porque são um conjunto inorgânico inapto para definir o objeto do processo; porque pôr-se-iam em causa os direitos de defesa do arguido, que não saberia ao certo do que se defender; e porque desconsiderar-se-ia qual é a decisão da autoridade administrativa que é o objeto da impugnação judicial.
    No mesmo sentido, AUGUSTO SILVA DIAS, ob. cit., pág. 239, nota 556.

[29] Neste sentido, PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., pág. 263, anotação 5, NUNO BRANDÃO, ob. cit., pág. 325-332, e os seguintes acórdãos:
- da Relação de Lisboa, de 19-3-1996, acessível em www.colectaneadejurisprudencia.com.
- do S.T.J., de 10-1-2007, acessível em www.dgsi.pt.
- da Relação de Évora, de 28-10-2008, acessível em www.dgsi.pt.
- da Relação de Évora, de 3-12-2009, acessível em www.dgsi.pt.
 
 

[30] ALEXANDRA VILELA, A fase jurisdicional do processo contraordenacional, em Anatomia do Crime, n.º 5, pág. 136-137.
 

[31] Ob. cit., pág. 243-244.

[32] Quinze dias úteis nos processos das contraordenações previstas no Regime Geral das Instituições de Crédito (artigo 228.º, n.º 1), e na Lei da Atividade Seguradora (artigo 28.º, n.º 1), vinte dias úteis nos processos das contraordenações previstas no Código dos Valores Mobiliários (artigo 416.º, n.º 1) e das contraordenações ambientais (artigo 52.º, n.º 1, da Lei-Quadro das Contraordenações Ambientais), e trinta dias úteis nos processos contraordenacionais em matéria de concorrência (artigo 87.º, n.º 1, da Lei da Concorrência), e no Regime Sancionatório do Setor Energético (artigo 49.º, n.º 2).
 

[33] Artigos 231.º, n.º 2, do RGIC, 52.º, n.º 7, da Lei-Quadro das Contraordenações Ambientais, 31.º, n.º 2, da Lei da Atividade Seguradora, 416.º, n.º 7, do Código dos Valores Mobiliários, 87.º, n.º 6, da Lei da Concorrência, e 49.º, n.º 6, do Regime Sancionatório do Setor Energético.

[34] Ob. cit., pág. 221-222.
 

[35] Ob. cit., pág. 29.
 

[36] Expressa em Considerações sobre o processo das contra-ordenações: as fases de recurso e da execução, Revista do Ministério Público, n.º 57, Janeiro-Março de 1994, pág. 74.
 

[37] Em Contra-Ordenações e Coimas. Regime Geral, 2.ª ed., Petrony, Lisboa, pág. 395-398.
 

[38] Ob. cit., pág. 135-137.
 

[39] Ob. cit., pág. 177-178.
 

[40] Ob. cit., pág. 75.
 

[41] Ob. cit., pág. 489-490.
 

[42] Ob. cit., pág. 241.
 

[43] O direito de mera ordenação social. Entre a ideia de “recorrência” e a de “erosão”, do direito penal clássico, pág. 459-462.
 

[44] Ob. cit., pág. 257-259.
 

[45] Direito Processual Penal Português. Do procedimento (marcha do processo), vol. 3, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2015, pág. 413.
 

[46] Proferido no processo n.º 1441/08-1, relatado por JOÃO GOMES DE SOUSA, acessível em www.dgsi.pt.

[47] No despacho que determine essa apresentação o Ministério Público poderá pronunciar-se sobre a admissibilidade da impugnação.
 

[48] O arquivamento pode ser apenas parcial, sendo o processo apresentado ao juiz para prosseguir na fase judicial, relativamente à parte que não foi objeto de arquivamento.
 

[49] CARLOS ADÉRITO TEIXEIRA, ob. cit., pág. 136-137.
 

[50] Em alguns processos contraordenacionais, sujeitos a regimes gerais sectoriais, como vimos acima, a retirada da acusação está também dependente do acordo da autoridade administrativa, mas não o seu arquivamento em alternativa à dedução da acusação.
 

[51] BEÇA PEREIRA, ob. cit., pág. 178.
 

[52] PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., pág. 259, anotação 12.
 

[53] PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., pág. 258, anotação 4, e ALEXANDRA VILELA, em A fase jurisdicional do processo contraordenacional, em Anatomia do Crime, n.º 5, pág. 136.
 

[54] PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., pág. 257, anotação 3, e SIMAS SANTOS e JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., pág. 490.
 

[55] PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, ob. cit., pág. 257, anotação 3, SIMAS SANTOS e JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., pág. 490.
 
 
Anotações
Legislação: 
DL 433/82 DE 1982/10/27 ART62 ART59 ART41; DL 232/79 DE 1979/07/24; CPP ART277;
 
Jurisprudência: 
AC STJ DE 2019/05/23; AC TRIB CONST N 373/2015 DE 2015/07/14
 
Referências Complementares: 
DIR ADM / DIR PROC CIV / ORG JUD
 
Divulgação
Número: 
204
Data: 
20-10-2021
Página: 
119
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