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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
11/1992, de 25.02.1993
Data do Parecer: 
25-02-1993
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Maioria
Iniciativa: 
PGR
Entidade: 
Procurador(a)-Geral da República
Relator: 
HENRIQUES GASPAR
Descritores e Conclusões
Descritores: 
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
ADMINISTRAÇÃO ASSOCIATIVA
ASSOCIAÇÃO PÚBLICA
ASSOCIAÇÃO PROFISSIONAL
ORDEM PROFISSIONAL
INTERESSE PROFISSIONAL
ACTIVIDADE DE REPRESENTAÇÃO PROFISSIONAL
INCOMPATIBILIDADE
INTERPRETAÇÃO DA LEI
Conclusões: 
1 - O artigo 2, alínea a), da Lei n 9/90, de 1 de Março, considera incompatível com o exercício com o exercício de cargos políticos e de altos cargos públicos a que se aplica, o exercício de actividades de representação profissional;
2 - As Ordens Profissionais, que prosseguem interesses públicos traduzidos na garantia de confiança no exercício de determinadas profissões envolvendo particulares exigências de natureza científica, técnica e deontológica, detêm, simultaneamente, atribuições de representação da própria profissão perante a sociedade e o Estado;
3 - Os Estatutos das diversas Ordens Profisssionais enunciam atribuições de representação da profissão e de defesa de interesses ideais, não económicos ou laborais dos respectivos profissionais;
4 - Consequentemente, a titularidade de órgãos sociais das Ordens Profissionais, deve ser considerada, em princípio, como exercício de actividades de representação profissional para os efeitos previstos no referido artigo 2, alínea a), da Lei n 9/90, de 1 de Março.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Conselheiro Procurador-Geral da República,

Excelência:



I
1. No Gabinete de Vossa Excelência foi elaborada uma informação onde se pondera o seguinte:
"1. Nos termos do artigo 2º, alínea a), da Lei nº 9/90, de 1 de Março, a titularidade de cargos enunciados no artigo 1º implica, durante a sua pendência, e para além de outras aí previstas ou na Constituição, a incompatibilidade de exercer actividades de representação profissional."
"2. No presente processo (...) suscita-se a questão de saber se o exercício de determinados cargos no âmbito de ordem profissional se subsume àquele segmento normativo.

As dúvidas para as quais se torna necessária obter uma resposta interpretativa situam-se em dois planos:
a) Têm as ordens profissionais funções de representação profissional enquadráveis na Lei nº 9/90?
b) Em caso de resposta afirmativa a essa questão, que órgãos dessas entidades exprimem essa representação?"
Vossa Excelência, acolhendo a proposta formulada no sentido da obtenção de parecer sobre a referida matéria, determinou a distribuição pelo Conselho Consultivo.

Cumpre, assim, emitir parecer.


II

1. A Lei nº 9/90, de 1 de Março, alterada pela Lei nº 56/90, de 5 de Setembro, definiu o regime das incompatibilidades de cargos políticos e de altos cargos públicos.
Delimitando no artigo 1º 1 o respectivo âmbito através da enumeração dos cargos políticos e dos altos cargos públicos para efeitos da aplicação da lei, estabelece no artigo 2º a extensão das incompatibilidades entre o exercício de tais cargos e outras funções, desempenhos ou actividades.

Dispõe o artigo 2º:
"A titularidade dos cargos enumerados no artigo antecedente implica, durante a sua pendência, para além das previstas na Constituição, as seguintes incompatibilidades:
a) O exercício remunerado de quaisquer outras actividades profissionais ou de função pública que não derive do seu cargo e o exercício de actividades de representação profissional";
b) (...)
c) (...)
d) (...).
No que interessa ao objecto da consulta, retenha-se, assim, que são incompatíveis a titularidade dos cargos políticos e de altos cargos públicos enumerados no artigo 1º 2 e o exercício de actividades de representação profissional.


2. Incompatibilidade pode definir-se como a impossibilidade legal de desempenho de certas funções públicas por indivíduo que exerça determinadas actividades ou que se encontre em alguma das situações públicas ou particulares, enumeradas na lei 3.
As incompatibilidades ou são comuns a todas as funções públicas ou especiais de certo cargo ou função e podem classificar-se em naturais e morais, por um lado, e absolutas e relativas, por outro.
As incompatibilidades naturais são "as que resultam da impossibilidade material de desempenhar simultaneamente dois cargos ou duas actividades dentro das mesmas horas de serviço, em diferentes localidades ou dentro da mesma hierarquia" e as morais "as que resultam da necessidade de impedir que o agente possa ser suspeito de utilizar a função pública para favorecer interesses privados em cuja dependência se encontrasse, em virtude de prestar serviços remunerados a particulares ou por estar ligado por laços de parentesco a quem possa influir na marcha dos negócios públicos, para seu proveito pessoal" 4.
"As incompatibilidades absolutas são as que não podem ser removidas, forçando o funcionário a optar por um dos cargos incompatíveis e relativas as que podem ser removidas mediante a obtenção de autorização, dada pela autoridade competente, para o exercício dos dois cargos ou de um cargo e de uma actividade privada" 5.
A disciplina sobre incompatibilidades quanto ao exercício de certos cargos assenta, essencialmente, na ideia de que duas ou mais funções ou actividades não podem ser exercidas convenientemente por uma mesma pessoa.
Fundamentalmente, pretende-se proteger a independência das funções e, do mesmo passo, manter na acção administrativa a normalidade, objectividade e serenidade que lhe deve imprimir o cariz indiscutível do interesse geral e que mais não é do que a afloração, no Estado democrático de direito, do princípio segundo o qual os agentes públicos não devem encontrar-se em situação de confronto entre o interesse próprio, de natureza pessoal, e o interesse do Estado ou dos entes públicos que representam e que lhes cumpre defender 6.


III

1. A aproximação ao sentido do segmento da norma da alínea a) do artigo 2º da Lei nº 9/90, - "o exercício de actividades de representação profissional" -, cuja interpretação suscita as dificuldades salientes, poderá perspectivar-se de um modo geral, pluridimencional, partindo de uma generalidade conceitual para especificas concretizações, ou, diversamente, através de metodologia gradualista, analisando a possibilidade de integração, caso a caso, na referida norma de especificas situações envolvendo natureza fragmentária.
A particularidade da consulta aconselha este segundo modelo metodológico de abordagem; à questão concreta não interessará tanto discorrer em termos gerais sobre a noção de "representação profissional", mas essencialmente determinar se as actividades concretas que se referem devem, ou não devem ser consideradas no âmbito daquele segmento normativo, como actividades de representação profissional.
No caso, trata-se de analisar se a titularidade de órgãos sociais de uma Ordem Profissional - Presidente do Conselho Directivo da Secção Sul da Ordem dos Engenheiros - integra o exercício de actividades de representação profissional, incompatível com a titularidade de cargos políticos e de altos cargos públicos definidos no artigo 1º da Lei nº 9/90.
Algumas notas, pois, se impõem em redor da caracterização jurídica das Ordens Profissionais.

2. A Administração moderna do Estado Social, com interpenetração ou compenetração de interesses, "que se apoiam, se associam, se tocam e seccionam em planos diversos" em "indiscutível pluralismo social" 7, traduz-se numa Administração conformadora e de prestação, em que "para obter maior eficiência ou racionalidade processual, num contexto agora permeável a ideias de participação e de promoção de interesses de grupos, se serve de diferentes formas de colaboração dos administrados"8.
A crescente complexidade e diversidade da acção administrativa está numa relação directa com a adopção de instâncias e técnicas participativas, relação directa e imediata entre uma Administração carregada de tarefas e tensões e uma descentralização que opera através de múltiplas autarquias institucionais e corporacionais.
"Conhecem-se ainda as vantagens desta Administração associativa: a proximidade das pessoas e dos problemas, o apelo à sua dedicação voluntária e interessada, a adaptabilidade dos recursos disponíveis. Assim como os seus inconvenientes e riscos: fluidez das estruturas jurídicas, a volubilidade das decisões, a burocratização do social ou, ao invés, a desagregação do estadual" 9.
Entre as várias formas ou modos de administração associativa relevam as associações públicas em sentido restrito, que existem "quando se constituam pessoas colectivas tendo por objecto a colaboração entre a Administração e os administrados ou, em certos casos, entre diversos entes administrativos para uma obra comum". As associações públicas distinguem-se de outras formas de colaboração ou participação "pelo carácter institucionalizado e pela personificação jurídica em que se traduzem: a Administração dá o poder e a forma jurídica, os administrados a participação e a conjugação de esforços" 10.
Associações públicas, são, na definição de FREITAS DO AMARAL 11, "as pessoas colectivas públicas, de tipo associativo, criadas para assegurar a prossecução de interesses públicos determinados, pertencentes ao Estado ou a outra pessoa colectiva pública".
Constituem entidades que a lei cria ou reconhece para assegurar a prossecução de interesses colectivos, às quais, para tanto, atribui poderes públicos, sujeitando-as, em correspondência, a algumas especiais restrições de carácter público - administração de interesses públicos (de interesses do Estado) que a entidade titular transfere através da devolução de poderes.
Seguindo a lição de JORGE MIRANDA 12, pode definir-se o conceito numa fórmula sintética, dizendo que a associação pública é a associação submetida a um regime específico de direito administrativo, ou a "a pessoa colectiva de tipo corporacional constituída para a prossecução de interesses públicos e dotada dos necessários poderes jurídico-administrativos".
Decompõe-se o conceito em três elementos: a natureza associativa - os associados são os destinatários da actividade administrativa; a prossecução de interesses públicos - seja de interesses públicos colectivos específicos, seja de interesses públicos primários e a inserção no âmbito da Administração - enquanto expressão de descentralização funcional.

4. A revisão de 1982 constitucionalizou o conceito de associações públicas.
Enunciando os princípios constitucionais relativos à estrutura organizatória da administração, o artigo 267º, nº 1, impõe que a Administração Pública seja estruturada de modo a evitar a burocratização, a aproximar os serviços das populações e a assegurar a participação dos interessados na sua gestão efectiva, designadamente por intermédio de associações públicas, organizações populares de base ou outras formas de representação democrática.
As associações públicas só podem ser constituídas para a satisfação de necessidades específicas, não podem exercer funções próprias das associações sindicais e terão organização interna baseada no respeito dos direitos dos seus membros e na formação democrática dos seus órgãos - artigo 267º, nº 3.
É, por outro lado, da exclusiva competência da Assembleia da República, salvo autorização ao Governo, legislar sobre associações públicas - artigo 168º, nº 1, alínea t), da Constituição.
As associações públicas são, assim, constitucionalmente consideradas como formas de participação dos interessados na administração pública; integram-se na administração, participando da actividade administrativa.
Através delas o Estado confere aos interessados certos poderes públicos, submetendo-as, consequentemente, a um regime de direito público - na criação, na conformação organizatória, no controlo de legalidade dos actos.
O reconhecimento constitucional expresso das associações públicas efectuado na primeira revisão constitucional veio dar cobertura a este tipo de associações - em grande parte provenientes do sistema constitucional de 1933 - cuja legitimidade podia ser questionada face ao texto originário da Constituição da República, que as não mencionava 13.
Na verdade, como refere JORGE MIRANDA 14, o conceito de associação pública levanta, não raras vezes, certa hesitação ou perplexidade.
"Por causa do elemento associativo, haverá quem não anteveja o carácter público ou quem suponha que as regras das associações privadas ou do direito constitucional de liberdade de associação valem directamente, como tais, para as associações públicas". "Por causa do elemento finalístico, haverá quem questione o carácter associativo".
Não se pode, por isso, negar a dialéctica que ocorre nas associações públicas entre a associação e o regime administrativo, entre o elemento pessoal do substracto e o elemento institucional das atribuições, entre a possibilidade da escolha dos meios e a fixidez (relativa) dos fins, entre um conteúdo essencial ou mínimo de liberdade, se não na formação, pelo menos na condução da associação, e a constante referência ao bem público 15.
Para a resolução desta dialéctica (onde reside justamente o cerne do conceito, aquilo que lhe confere a sua irredutibilidade), tudo está, como escreve JORGE MIRANDA, "em apreender a associação pública com um tertium genus a aditar à associação privada e ao instituto público".
Porém, mais do que rotular certos substractos associativos, importa essencialmente analisar os respectivos requisitos essenciais, integradores do seu conteúdo jurídico e, por isso, determinantes do regime que lhes é aplicável.
Podem, para isso, distinguir-se as manifestações próprias do elemento pessoal, do elemento finalístico e da interpenetração entre ambos.
No elemento pessoal podem referir-se alguns índices de relevância: a existência de interesses sociais passíveis de conformação como interesses públicos; a participação dos membros na formação e na alteração das normas estatutárias; a gestão (ou, ao menos, a predominância da gestão) por órgãos representativos dos associados.
No que se refere ao elemento finalístico ou institucional são de sublinhar os seguintes índices: a intervenção do Estado (ou de outra entidade pública) na constituição da associação, seja por lei ou por acto administrativo, seja precedendo deliberação ou solicitação de interessados ou suscitando-a, seja remodelando uma associação privada anterior ou criando ex novo a associação; a dependência da alteração estatutária da intervenção do Estado; a impossibilidade de dissolução por mera deliberação dos associados; a prática de actos administrativos recorríveis contenciosamente; a sujeição a formas de intervenção ou de tutela do Estado; a existência de prerrogativas de autoridade pública.
No que diga respeito à ligação entre os referentes associativo e institucional, são de acentuar os seguintes índices: não sujeição às regras civilísticas da tipicidade das formas de constituição e extinção 16; reconhecimento individualizado da personalidade jurídica; a inscrição obrigatória dos associados; o princípio da existência de uma só associação para uma determinada área de interesses; o exercício de um poder disciplinar sobre os associados.

4. As associações profissionais - as "Ordens" profissionais em sentido estrito e outras associações finalisticamente equiparáveis - constituem uma referência relevante na construção conceitual das associações públicas, e muito particularmente na promoção que levou à constitucionalização da figura.
A categoria das "Ordens" e das "Câmaras" foi mesmo a que mais custou a aceitar nos "quadros do novo regime democrático português" 17, e a problemática que as envolvia foi referente constante nas discussões travadas na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional a propósito do artigo 267º da Constituição.
Com efeito, não obstante as ordens profissionais existirem em grande parte dos países europeus desenvolvendo modalidades de administração independentemente dos sistemas políticos, a continuidade da sua estrutura funcional, a partir de 1974 e da instauração do novo sistema político, foi causa de algumas hesitações e perplexidades.
Dúvidas motivadas pela assimilação que imediatamente foi tentada com a organização política corporativa, instituída pela Constituição de 1933 na qual as associações profissionais denominadas "Ordens" se integrariam 18.
Este tipo de organizações, porém, pela respectiva estrutura, finalidades e funções, conquanto associadas ao regime do Estado corporativo em virtude de simples coincidências históricas (e de assimilação legislativa), não constituíam manifestação directa do espírito do corporativismo, eram dele essencialmente autónomas e ter-se-iam formado mesmo que tal sistema não tivesse presidido à estruturação política do país durante determinado período histórico.
Na verdade, nem todas as formas de organização vindas do regime anterior a 1974 se podem considerar coessenciais ou conaturais a esse regime; alguns modelos organizatórios dele se podem desprender, sem ligação essencial ao seu espírito 19.
Se é impensável, com efeito, uma organização integral das actividades profissionais em termos de organismos representativos, únicos para cada categoria e dotados de poderes de autoridade - que significaria uma insuportável rigidificação económico-social e o estiolar de princípios fundamentais de liberdade de associação e de liberdade sindical - não significa isso que, relativamente a certas profissões e para determinados efeitos, não seja aconselhável e possível, os limites de um regime e de uma Constituição democráticos, a adopção e a criação de estruturas organizatórias profissionais com aquelas características especiais.
Isto é patente na estruturação e organização de algumas actividades profissionais, como (pelo menos) a experiência europeia democrática demonstra 20.
Há, com efeito 21, profissões que apresentam como traços distintivos um elevado grau de formação científica e técnica, regras de exercício ou de prática de actos extremamente relevantes e exigentes, necessidade de confiança pública ou social tão marcada, que se torna indispensável uma disciplina capaz de abranger todos os profissionais, traduzida não apenas em normas técnicas e deontológicas, mas também em verdadeiras normas jurídicas. É do interesse dos próprios profissionais que a disciplina jurídica do exercício da profissão seja definida e cumprida, mas é isso também (ou sobretudo) do interesse dos que recebem os serviços desses profissionais (que podem ser quaisquer cidadãos) e do interesse da sociedade no seu conjunto.
Para regular e disciplinar o exercício de uma profissão de interesse público, o Estado poderia eventualmente, em alternativa, utilizar vários modos ou modelos de actuação e intervenção.
Poderia organizar um serviço administrativo integrado na administração directa, ao qual competisse reconhecer a qualificação profissional e fiscalizar o cumprimento das normas fundamentais relativas ao exercício da profissão; poderia aceitar uma (ou mais) organização dos profissionais interessados como entidade privada, delegando nela o exercício de certos poderes públicos, mas sem a considerar como entidade pública; ou reconhecer a organização profissional como entidade, associação pública, devolvendo-lhe os poderes públicos necessários à regulamentação e disciplina de exercício da profissão 22.
Uma tendência não estatista e favorável ao pluralismo social, que a Constituição acolhe, privilegiará este último modo de actuação do Estado. Aqui se integram as "ordens profissionais", já com a estrutura com que passaram ao regime instituído em 1974 e agora expressamente constitucionalizadas, com a introdução da figura das associações públicas nas formas de descentralização da actividade administrativa.
As "ordens profissionais", são, assim, "as associações públicas formadas pelos membros de certas profissões livres, com o fim de regular e disciplinar o exercício da respectiva actividade profissional por devolução de poderes do Estado 23.
Qualificadas nesta categorização, como a realidade social e organizativa que constituiu o padrão conceitual das associações públicas 24, e, entre nós, manifestamente, a realidade que impôs a constitucionalização do instituto na revisão constitucional de 1982, participam das características das associações públicas, e assumem na respectiva estruturação, natureza e regime jurídico a dialéctica entre as (possíveis) exigências dos princípios constitucionais próprios dos direitos e liberdades fundamentais, pela consideração de um substracto pessoal de sujeitos privados, e a função pública que desenvolvem, integrando formas de administração descentralizada.
A natureza pública, integrando a estrutura administrativa, e os princípios constitucionais em redor dos quais se podem organizar (excepcionalidade, especificidade, exclusão de funções sindicais e democraticidade interna), conduzem o ponto de equilíbrio na tensão daqueles princípios a um campo prevalente de interesse público.
E, assim, tipicamente, neste tipo de associações públicas estão presentes o privilégio da unicidade, o princípio da inscrição obrigatória (e, como seu corolário ou consequência, a quotização obrigatória de todos os seus membros), a função de controlo do acesso à profissão (verificação dos pressupostos legais e, eventualmente, da própria formação prévia à inscrição - v. g., o estágio) e o exercício do poder disciplinar sobre os respectivos membros.


IV

1. A natureza pública dos interesses prosseguidos pelas Ordens Profissionais e a consideração prioritária de tais interesses no plano das finalidades deste tipo de associações públicas e das atribuições que a lei lhes consigna, não é incompatível, porém, com a prossecução, promoção e defesa dos interesses profissionais dos respectivos membros.
O interesse público envolvido não exclui, mas, antes, pressupõe, a defesa de interesses profissionais 25.
As Ordens Profissionais, como se salientou, prosseguem determinadas finalidades de natureza pública estadual, ligadas à especificidade e caracterização de certas profissões e à elevada qualificação científica e técnica de quem seja apto (qualificado) a exercê-las. A defesa das qualificações profissionais e da deontologia e a defesa dos interesses sócio-profissionais estão permanentemente presentes nas atribuições estatutariamente configuradas das Ordens Profissionais.
Mas, por isso mesmo, na defesa dos interesses sócio-profissionais relativamente a determinadas profissões com as referidas exigências coenvolve-se muito do interesse público (a qualificação, a garantia de adequada preparação, o respeito pelas regras deontológicas) e do interesse dos próprios profissionais na defesa do prestígio sociológico e da confiança pública na respectiva profissão.
Nesta medida, pode dizer-se, seguramente, que as Ordens detêm poderes (atribuições) de representação relativamente aos respectivos membros; não, é certo, de uma representação de interesses privados, particulares ou particularizados de cada membro individualmente considerado, mas da função de representação institucional da profissão 26.
Não se trata de uma representação individual, sócio-laboral, de interesses económicos dos respectivos membros, mas de uma representação dos interesses ligados à profissão titulada - representação perante a sociedade e perante o Estado, no interesse de todos e de cada um dos que exercem a profissão.
A defesa dos interesses dos respectivos membros (interesses sócio-profissionais dos membros) como grupo idealmente considerado , satisfaz, hoc sensu, finalidades também particulares, articulando-se, neles e por via deles, com o referido interesse público. Não no sentido da defesa de interesses económicos de um grupo ou de indivíduos pertencentes a esse grupo, mas de interesses profissionais num sentido também eminentemente público, social, sociológico e deontológico 27.

2. Não obstante algumas diferenças sobre a respectiva natureza jurídica, subsídios neste mesmo sentido se podem colher na análise e no plano do direito comparado.
Em França, as Ordens Profissionais, estando sobretudo encarregadas de organizar a profissão e de assegurar a sua disciplina, têm um papel de representação da profissão junto dos poderes públicos; perante o Estado, a ordem representa a profissão junto dos poderes públicos, podendo, nomeadamente, ser consultada sobre os problemas gerais e sobre os projectos que digam respeito à profissão 28.
As Ordens Profissionais em Itália ('Ordinamenti professionali'), por entre as respectivas atribuições, tutelam os interesses da respectiva categoria, encontrando-se presentes finalidades que respeitam directamente ao interesse da própria categoria profissional, enquanto se destinam a manter e defender a dignidade da categoria profissional e a tutelar o interesse moral e o prestígio da profissão 29.
Em Espanha, os "Colégios Profissionales", dotados de personalidade jurídica de direito público, detêm atribuições que se enunciam numa fórmula geral que compreende a ordenação do exercício da profissão, a representação exclusiva da profissão e a defesa dos interesses profissionais dos membros; concretizam-se em funções de colaboração com a Administração, ordenação e deontologia da profissão, disciplina do exercício da profissão e assistência social aos respectivos membros 30.
Pode, assim, ser constatado, nesta breve referência comparada, que por entre, ou a par das finalidades públicas das Ordens Profissionais estão presentes funções de representação profissional, pelo menos no sentido de representação institucional e sociológica da profissão perante os poderes públicos e a sociedade.

3. Na enunciação das respectivas atribuições, os Estatutos das várias Ordens Profissionais assumem, concretizam e desenvolvem os aludidos princípios e planos sobre as funções e finalidades de tais associações públicas.
Revela-se, pois, de interesse anotar como e com que amplitude.
O Estatuto da Ordem dos Advogados foi aprovado pelo Decreto-Lei nº 84/84, de 16 de Março, manifestando o legislador a intencionalidade, entre o mais, de articular harmoniosamente interesses profissionais dos advogados com o interesse público de justiça 31.
De entre as várias atribuições da Ordem dos Advogados, enumera o Estatuto a de "zelar pela função social, dignidade e prestígio da profissão de advogado e promover o respeito pelos respectivos princípios deontológicos" - artigo 3º, nº 1, alínea c), e "defender os interesses, direitos, prerrogativas e imunidades dos seus membros - alínea d). A Ordem detém também atribuições de previdência social - artigo 3º, nº 2.
Nos termos do artigo 4º, nº 2 do Estatuto, "para defesa dos seus membros em todos os assuntos relativos ao exercício da profissão ou ao desempenho de cargos nos órgãos da Ordem dos Advogados, quer se trate de responsabilidades que lhes sejam exigidas, quer de ofensas contra eles praticadas, pode a Ordem exercer os direitos de assistente ou conceder patrocínio em processos de qualquer natureza".
A Ordem dos Médicos, que abrange os licenciados em Medicina que exerçam ou tenham exercido em qualquer regime de trabalho a profissão médica, rege-se actualmente pelo Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei nº 282/77, de 5 de Julho 32.
Nos termos do artigo 6º, a Ordem dos Médicos tem por finalidades, entre outras, "fomentar e defender os interesses da profissão médica a todos os níveis, nomeadamente no respeitante à promoção sócio-profissional, à segurança social e às relações de trabalho" - alínea b) 33 e "dar parecer sobre todos os assuntos relacionados com o ensino, com o exercício da medicina e com a organização dos serviços que se ocupem da saúde, sempre que julgue conveniente fazê-lo, junto das entidades oficiais competentes ou quando por estes for consultada" - alínea b).
Segundo o disposto no artigo 15º, alínea d), constitui direito dos médicos solicitar o patrocínio da Ordem sempre que dele careçam para a defesa dos seus interesses profissionais ou quando haja ofensa dos seus direitos e garantias, enquanto médicos".
A Ordem dos Engenheiros rege-se actualmente pelo Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei nº 352/81, de 28 de Dezembro 34.
Na concretização dos objectivos estatutariamente definidos, a Ordem deverá, nos termos do artigo 5º, entre outras atribuições, "fomentar e defender os interesses dos engenheiros, nomeadamente no campo social, cultural e profissional e "assumir, no seu âmbito, a representação e defesa dos valores da engenharia portuguesa - alíneas b) e c).
A Associação dos Arquitectos Portugueses, que existia como pessoa colectiva de direito privado, foi convertida em associação pública pelo artigo 1º, nº 1, do Decreto-Lei nº 465/88, de 15 de Dezembro.
Nos termos do artigo 1º, nº 1 do Estatuto, que faz parte integrante do referido diploma, a Associação dos Arquitectos Portugueses é a instituição representativa dos licenciados e diplomados em Arquitectura que, em conformidade com o Estatuto e demais disposições legais aplicáveis, exercem a profissão de arquitecto.
Entre as atribuições da Associação, definidas no artigo 3º do Estatuto, refiram-se as de zelar pela função social, dignidade e prestígio da profissão de arquitecto, promovendo a valorização profissional e científica dos seus associados e a defesa e o respeito pelos respectivos princípios deontológicos (alínea a), representar os arquitectos junto aos órgãos de soberania (alínea d) e defender os interesses, direitos e prerrogativas dos associados (alínea e).
Pelo Decreto-Lei nº 212/79, de 12 de Julho, foi aprovado o Estatuto da Ordem dos Farmacêuticos.
De acordo com o disposto no artigo 1º, "a Ordem dos Farmacêuticos abrange e representa os diplomados em Farmácia que exercem a profissão farmacêutica ou praticam actos próprios desta profissão em território português; e tem como fins "a defesa da dignidade da profissão farmacêutica" e "o fomento e a defesa dos interesses da profissão farmacêutica no que respeita à promoção sócio-profissional e à segurança social" - artigo 3º, alíneas b) e c).
A Ordem dos Médicos Veterinários rege-se pelo Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei nº 368/91, de 4 de Outubro 35. Constitui uma associação pública e é a definida com a instituição representativa dos licenciados em Medicina Veterinária ou equiparados legais que, em conformidade com o Estatuto e demais disposições legais aplicáveis, exercem actividades veterinárias - artigo 1º, nºs 1 e 2 do Estatuto.
Entre as atribuições enunciadas no artigo 3º, a Ordem dos Veterinários deve "zelar pela função social, dignidade e prestígio da profissão de médico veterinário e promover o respeito pelos respectivos princípios deontológicos", "representar os médicos veterinários perante quaisquer entidades públicas ou privadas", bem como "emitir parecer sobre os projectos de diplomas legislativos que interessem à prossecução das suas atribuições" - alíneas b), c) e f).
Além disso, constitui direito dos membros, "solicitar a intervenção da Ordem na defesa dos seus direitos e interesses profissionais - artigo 16º, alínea f).
Disposições de natureza semelhante, definindo idênticas finalidades e atribuições, encontram-se no artigo 1º do Estatuto da Câmara dos Solicitadores (aprovado pelo Decreto-Lei nº 483/76, de 19 de Junho 36, e no artigo 169º, alíneas d) e e) do Estatuto dos Revisores Oficiais de Contas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 519-L2/79, de 29 de Dezembro 37.
Percorrendo as disposições estatutárias das várias Ordens Profissionais, verifica-se, pois, um constante espaço de atribuições de defesa dos interesses profissionais, de promoção e defesa da respectiva profissão, ou seja, verdadeiramente, de representação da profissão. Defesa de interesses, direitos e prerrogativas dos membros, fomento e defesa dos interesses da profissão e, mesmo, expressamente, representação da profissão e dos respectivos profissionais, constituem também finalidades estatutariamente cometidas às associações deste tipo.
A permanência nos diversos diplomas estatutários de semelhantes tipos e definições de atribuições projecta, suficientemente, um espaço onde se conjugam e coordenam os referidos interesses públicos relevando da confiança, prestígio, dignidade e deontologia de certas profissões e os interesses dos próprios profissionais; nesta medida, desenham-se funções de representação profissional, seja numa perspectiva meramente institucional, seja também, e do mesmo modo, uma perspectiva social e sociológica de uma certa profissão e dos respectivos profissionais.


V

1. A norma do artigo 2º, alínea a), da Lei nº 9/90, de 1 de Março, exige, como se referiu, uma actividade interpretativa, quanto ao elemento de determinação relevante na espécie concreta. A interpretação na hipótese concreta, significa, na metodologia escolhida, indagar se a representação profissional como atribuição das associações públicas corresponde e pode integrar o exercício de actividades de representação profissional previsto com fundamento da incompatibilidade estabelecida.
O elemento base de toda a interpretação, simultaneamente texto de partida e limite da interpretação, é a letra, o texto da norma 38.
A apreensão literal do texto é já interpretação, mas nenhuma interpretação fica ainda completa; será sempre necessária "uma tarefa de interligação e valoração que escapa ao domínio literal" 39.
Na tarefa de interligação e valoração que acompanha a apreensão do sentido literal, intervêm elementos lógicos, - de ordem sistemática, histórica e racional ou teleológica 40.
O elemento sistemático "compreende a consideração de outras disposições que formam o complexo normativo do instituto em que se integra a norma interpretanda, isto é, que regulam a mesma matéria (contexto da lei), assim como a consideração de disposições legais que regulam problemas normativos paralelos ou institutos afins (lugares paralelos). Compreende ainda o 'lugar sistemático' que compete à norma interpretanda no ordenamento global, assim como a sua consonância com o espírito ou unidade intrínseca de todo o ordenamento jurídico" 41.
O elemento histórico compreende todas as matérias relacionadas com a história do preceito, a evolução do instituto e do tratamento normativo-material do mesmo ou de idêntica questão, a fontes da lei e os trabalhos preparatórios.
O elemento racional ou teleológico consiste haja razão de ser da norma (ratio legis), no fim visado pelo legislador ao editar a norma, nas soluções que teve em vista e que pretende realizar 42.

2. Há, assim, que analisar o referido comando normativo da alínea a) do artigo 2º da Lei nº 9/90 com base nestes critérios e elementos de interpretação.
O elemento literal, quer como base, quer como limite, é, no caso, fortemente condicionante do sentido da norma; a identidade de linguagem entre a definição normativa da fonte da incompatibilidade e a síntese qualificativa de algumas das atribuições das Ordens Profissionais permite abranger todo o exercício de actividades de representação profissional, nestas se incluindo, também, as atribuições de tais entidades.
A extensão permitida pelo elemento literal tem, por isso, de ser confrontada com os critérios lógicos de interpretação.
A consideração do elemento histórico não se reveste de valor significativo. O processo legislativo relativo à norma da alínea a) do artigo 2º da Lei nº 9/90 apenas salienta que, no projecto inicial, o âmbito da incompatibilidade se apresentava institucionalmente mais limitado, referindo-se a actividades de representação profissional de "índole nacional" 43 44.
A ratio legis, por seu lado, permite alinhar alguns dados significativos de interpretação.
O fim visado pelo legislador com o estabelecimento de incompatibilidades entre o exercício de cargos políticos e de altos cargos públicos e o desempenho de outras actividades radica fundamentalmente na preocupação de evitar a colisão entre o interesse público e privado, pretendendo-se contribuir para a dignificação do exercício do mandato dos titulares dos cargos evitando a osmose entre o interesse público e privado e salvaguardando o interesse público como valor superior da colectividade 45.
As incompatibilidades enunciadas na Lei 9/90 pretendem - na intencionalidade legislativa - evitar a colisão de interesses e salvaguardar a acumulação de cargos ou funções e do seu exercício em prejuízo do interesse colectivo, e criar condições à realização da justiça, imparcialidade e dedicação no exercício de cargos públicos 46.
Neste aspecto, a defesa dos interesses de determinadas profissões, a representação de determinadas profissões como atribuição de entidades distintas do Estado - representação institucional perante a sociedade e o próprio Estado - é (pode ser) susceptível de gerar situações de conflito de interesses entre tais profissões (e, por reflexo, entre os respectivos profissionais) e o Estado.
A prossecução de interesses públicos que constituiu atribuição das Ordens Profissionais (e que se assume mesmo como a matriz essencial do conceito de associação pública) não é, como se salientou, incompatível com a cumulativa defesa de interesses profissionais dos respectivos membros. Mesmo no ponto em que a defesa e representação institucional da profissão se conjugue e se assimile com o próprio interesse público (de confiança, de rigor, de deontologia), podem existir - existem - divergências e posições contraditórias entre a visão política e/ou administrativa do Estado e os interesses próprios de cada profissão constituída em Ordem.
Nesta conformidade, os princípios, os valores, os interesses e as finalidades pressupostos pelo legislador no estabelecimento das incompatibilidades, relevam de modo saliente na prevenção de conflitos de interesses entre a titularidade de cargos políticos e de altos cargos públicos e o exercício de actividades de representação profissional no âmbito das atribuições das 'Ordens Profissionais' ou instituições equiparadas.

VI

1. As Ordens Profissionais têm, pois, atribuições de representação profissional enquadráveis no artigo 2º, alínea c), da Lei nº 9/90, de 1 de Março.
Resta saber - e esta é, recorde-se, outra questão colocada na consulta - que órgãos de tais entidades exprimem essa representação.
O modelo organizatório das diversas Ordens Profissionais é relativamente complexo, tanto na especificidade dos diversos órgãos (representativos, executivos, fiscalizadores, disciplinares), como nos vários níveis de organização em que se estruturam (nacional, regional e local).
Não interessará, porém, no ponto específico, e em princípio, uma análise estatutária das várias instituições e, no seu interior, da repartição de competências pelos diversos órgãos de cada uma.
Com efeito, o nível de representação profissional relevante no contexto da referida norma, em concordância com as atribuições das ordens profissionais, situa-se no plano institucional, social e sociológico da profissão. Constitui representação profissional como atribuição, como função de cada Ordem em si mesma e incindível da Ordem como instituição. A profissão é representada perante a sociedade e o Estado pela sua Ordem, e, neste sentido, independentemente da concreta repartição interior das competências pelos vários órgãos.
Deste modo, exercício de funções de representação profissional, hoc sensu, estará, em princípio, assimilado à titularidade dos órgãos da instituição representativa da profissão, independentemente da concreta repartição das respectivas competências 47.

2. Todavia, a amplitude de eventuais consequências do critério fixado como modelo de apreciação do conteúdo do conceito de "actividades de representação profissional" no âmbito das Ordens Profissionais impõe o estabelecimento de algumas referências limitativas.
A primeira respeita à própria noção de órgãos sociais de representação profissional. Estes, neste sentido, e pela própria natureza das coisas, serão os órgãos constituídos por membros eleitos, ou designados segundo o próprio modelo interno, para exercerem competências estatutariamente definidas e por mandatos determinados. Não são órgãos, neste sentido, de representação institucional ou externa aqueles que sejam integrados por todos os membros da associação, isto é, aqueles cuja titularidade depende apenas (e seja próprio direito decorrente) da mera qualidade de membro da associação.
A segunda referência limitativa poderá situar-se na análise da própria especificidade (no plano da constituição e também no plano das competências estatutárias) de algum órgão eventualmente previsto nos estatutos de uma associação pública e que, de todo, não possa ser considerado, nesse plano de análise, como representação externa, ou com projecção típica para o exterior da própria associação , rectius, da profissão sociológica e institucionalmente assimilada à própria associação .


3. As dificuldades interpretativas que se constatam a propósito da determinação do sentido da noção «exercício de actividades de representação profissional», e que se podem, eventualmente, multiplicar quando estiverem em conta outras situações, deixa saliente alguma obscuridade no texto legal, a merecer adequada intervenção legislativa.

Conclusão:

VII

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:
1ª. O artigo 2º, alínea a), da Lei nº 9/90, de 1 de Março, considera incompatível com o exercício de cargos políticos e de altos cargos públicos a que se aplica, o exercício de actividades de representação profissional;
2ª. As Ordens Profissionais, que prosseguem interesses públicos traduzidos na garantia de confiança no exercício de determinadas profissões envolvendo particulares exigências de natureza científica, técnica e deontológica, detêm, simultaneamente, atribuições de representação da própria profissão perante a sociedade e o Estado;
3ª. Os Estatutos das diversas Ordens Profissionais enunciam atribuições de representação da profissão e de defesa de interesses ideais, não económicos ou laborais dos respectivos profissionais;
4ª. Consequentemente, a titularidade de órgãos sociais das Ordens Profissionais, deve ser considerada, em princípio, como exercício de actividades de representação profissional para os efeitos previstos no referido artigo 2º, alínea a), da Lei nº 9/90, de 1 de Março.

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1 O artigo 1º, actualmente com a redacção introduzida pelo artigo 1º da Lei nº 56/90.
2 Presidente da República, Primeiro-Ministro e membro do Governo; Ministro da República para as regiões autónomas; membro do governo regional; Alto-Comissário Contra a Corrupção; membro da Alta Autoridade para a Comunicação Social; Governador e vice-governador civil; Governador e secretário-adjunto do governo de Macau; Presidente e vereador a tempo inteiro das câmaras municipais; Presidente de instituto público autónomo, de empresa pública ou de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos e vogal da direcção de instituto público autónomo, desde que exerçam funções executivas; Director-geral e subdirector-geral ou equiparado.

3 Definição de MARCELLO CAETANO, "Manual de Direito Administrativo", tomo II, 1983, pág. 720.

4 Cfr., ibidem, págs. 720-722.

5 Cfr., ibidem.

6 Cfr., v. g. Pareceres deste Conselho nº 100/82, de 22/Julho/82, publicado no "Diário da República", II Série, de 25/Junho/1983 e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 326, págs. 224 e segs. e 54/80, de 11/Outubro/1990.

7 ROGÉRIO SOARES, "Direito Público e Sociedade Técnica", Coimbra, 1969, págs. 91 e segs. Neste ponto segue-se, de perto, o Parecer deste Conselho nº 26/88, de 10./Novembro/1988.

8 Cfr. JORGE MIRANDA, "As Associações Públicas no Direito Português", ed. Cognitio, 1985, pág. 11.

9 Cfr. JORGE MIRANDA, ibidem.

10 Cfr. JORGE MIRANDA, ibidem, pág. 14.

11 "Curso de Direito Administrativo", vol. I, Coimbra, 1986, pág. 370.

12 "As Associações Públicas", cit. págs. 14/15.

13 Cfr. J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA , "Constituição da República Portuguesa Anotada", 2ª edição, 2º volume, pág. 424.

14 Cfr. "Associações Públicas", cit., págs. 15/16.

15 Cfr. JORGE MIRANDA, loc. cit., pág. 16 e, desenvolvidamente, o Parecer deste Conselho Consultivo nº 114/85, de 31 de Janeiro de 1986, publicado no Diário da República, II Série, nº 123, de 31 de Julho de 1986, e no Boletim do Ministério da Justiça, nº 359, pág. 190.

16 Artigos 167º e seguintes do Código Civil e artigo 6º do Decreto-Lei nº 594/74, de 7 de Novembro.

17 Cfr. FREITAS DO AMARAL , ibidem, pág. 373.

18 Notar-se-á, contudo, v. g. a anterioridade (remontando a 1926) da Ordem dos Advogados.

19 Cfr. Parecer da Comissão Constitucional, nº 2/78, in Pareceres da Comissão Constitucional, 4º volume, págs. 152 e segs., desig. 167-168.

20 Cfr., ANDRÉ DE LAUBADÈRE, "Traité de Droit Administratif", Tomo I, LGDJ, 1984, págs. 708 e segs.; CHARLES DEBBASCH, Institutions et droit administratif, 1. Les structures administratives", págs. 531 e segs.; JEAN RIVERO, "Direito Administrativo" (trad.), Coimbra, 1981, págs. 560 e segs.; FERNANDO GARRIDO FALA, "Tratado de Derecho Administrativo", vol. I, Madrid, 1958, pág. 300; ALDO SANDULLI, "Manuale di Diritto Amministrativo", vol. 3º, Giuffré, 1958, pág. 235; MASSIMO GIANNINI, "Diritto Amministrativo", vol. I, Giuffré, 1970, págs. 186 e segs.; Novissimo Digesto Italiano, Ordinamenti Professionali, vol. XII, págs. 6 e segs.

21 Segue-se, de perto, o Parecer da Comissão Constitucional nº 2/78, citado na nota (19), pág. 171.

22 Cfr. FREITAS DO AMARAL , "Curso de Direito Administrativo", cit., vol. I, pág. 377; cfr., também, o Parecer da Comissão Constitucional, nº 2/78, citado, ibidem, pág. 172.

23 Definição de FREITAS DO AMARAL , ibidem, pág. 375.

24 As organizações profissionais de algumas actividades são seculares (actividades profissionais típicas com uma particular função social: v. g. médico e advogado). Cfr. Novissimo Digesto Italiano, Ordinamenti professionali, vol. XII, pág. 6.

25 Cfr., FREITAS DO AMARAL , op. cit., págs. 384-385.

26 Cfr., v. g., SOARES MARTINEZ, "Manual de Direito Corporativo", 3ª ed., págs. 391 e segs., desig., pág. 402.

27 Cfr. ROGÉRIO SOARES, "A Ordem dos Advogados. Uma Corporação Pública", "Revista de Legislação e de Jurisprudência", ano 124º, (1991-1992), págs. 163-165 e 230.

28 Cfr., v. g., ANDRÉ DE LAUBADÈRE, op. cit., págs. 754-755 e JEAN RIVERO, op. cit., págs. 561-562.

29 Cfr., v. g., 'Novissimo Digesto Italiano', "Ordinamenti professionali", cit., págs. 9-10.

30 Cfr. JOSE RAMON PARADA VAZQUEZ, "Derecho Administrativo (organizacion y Emples Público", 2ª ed., Madrid, 1987, pág. 243.

31 Do preâmbulo.
Sobre a evolução histórica da Ordem dos Advogados, cfr., AUGUSTO LOPES CARDOSO, "Da Associação dos Advogados de Lisboa à Ordem dos Advogados", na "Revista da Ordem dos Advogados", Ano 48º, 1988, págs. 329 e segs.

32 Rectificado no Diário da República, de 29 de Julho de 1977, 12 de Setembro de 1977 e 23 de Setembro de 1977.

33 O artigo 6º, alínea b), na parte em que se refere a "relações de trabalho" foi declarado inconstitucional, com força obrigatória geral, pela Resolução do Conselho da Revolução nº 11/78, publicada no Diário da República, I Série, de 26 de Janeiro de 1978.

34 Através da Lei nº 4/92, de 4 de Abril, a Assembleia da República concedeu autorização ao Governo para alterar o Estatuto da Ordem dos Engenheiros, no prazo de 180 dias.

35 Rectificado no Diário da República, I Série A, de 30 de Novembro de 1991 (Delaração de rectificação nº 257/91).

36 Rectificado no Diário da República, I Série, de 3 de Setembro de 1976.

37 Rectificado no Diário da República, I Série, de 5 de Março de 1980.

38 Cfr. KARL LARENZ, "Metodologia da Ciência do Direito", trad. da 2ª ed., pág. 369.

39 Cfr. JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, "O Direito, Introdução e Teoria Geral", 2ª edição, págs. 360 e segs.

40 Cfr. J. OLIVEIRA ASCENSÃO, ibidem; J. BAPTISTA MACHADO, "Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador", 1985, págs. 181 e segs.

41 Cfr. J. BAPTISTA MACHADO, ibidem, pág. 183.

42 Cfr. KARL LARENZ, "Metodologia", cit., pág. 379.

43 Cfr. Projecto nº 277/V no , Diário da Assembleia da República , I Série, nº 91, de 9 de Julho de 1988 e o Relatório e texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, no Diário da Assembleia da República, II Série-A, nº 3, de 27 de Outubro de 1989.

44 A consideração, no processo de formação legislativa, de noções com o "âmbito nacional" das actividades de representação profissional pode, porventura, significar que o legislador perspectivava como modelo de referência entes institucionais estruturados segundo determinado modo orgânico - que é precisamente o modelo institucional de organização das Ordens Profissionais e entidades equiparáveis.

45 Cfr., v. g. pareceres deste Conselho nºs 26/90, de 28 de Julho e 59/80, de 11 de Outubro.

46 Cfr. Diário da Assembleia da República, I Série, de 18 de Novembro de 1988, pág. 356 e de 25 de Outubro de 1989, págs. 176 e 177.

47 Para além da representação no âmbito estritamente orgânico e institucional, poder-se-ão, também, suscitar questões relacionadas com actividades de representação ad hoc, em grupos, comissões, ou delegações, por membros da associação e por esta designados.
Para tais situações - que igualmente podem traduzir "exercício de actividades de representação profissional - devem valer, por igualdade de razão, os mesmos princípios afirmados para a representação profissional de nível institucional
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART168 N1 T ART267 N1 N3. L 9/90 DE 1990/03/01 ART1 ART2.
DL 519-L2/79 DE 1979/12/29 ART169 D E QUE APROVA O ESTATUTO DOS REVISORES OFICIAIS DE CONTAS.
EOADV84 ART3 N1 N2 ART4 N2. L 56/90 DE 1990/09/05.
DL 282/77 DE 1977/07/05 ART6 ART15 D QUE APROVA O ESTATUTO DA ORDEM DOS MÉDICOS.
DL 352/81 DE 1981/12/28 ART5 QUE APROVA O ESTATUTO DOS ENGENHEIROS.
DL 465/88 DE 1988/12/15 ART1 N1 ART3 QUE APROVA A ASSOCIAÇÃO DE ARQUITECTOS PORTUGUESES.
DL 212/79 DE 1979/07/12 ART1 ART3 B C.
DL 368/91 DE 1991/10/04 ART1 N1 N2 ART3 ART16 F QUE APROVA O ESTATUTO DA ORDEM DOS MÉDICOS VETERINÁRIOS.
DL 483/76 DE 1976/06/19 ART1 QUE APROVA O ESTATUTO DA CÂMARA DOS SOLICITADORES.
Jurisprudência: 
P CC 2/78 IN PCC VOL4 PAG152.
Referências Complementares: 
DIR ADM * FUNÇÃO PUBL.
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