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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
33/1991, de 24.04.1991
Data do Parecer: 
24-04-1991
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Defesa Nacional
Relator: 
OLIVEIRA BRANQUINHO
Descritores e Conclusões
Descritores: 
DEFICIENTE DAS FORÇAS ARMADAS
JUNTA DE SAUDE DA FORÇA AEREA
PARECER
INCAPACIDADE GERAL DE GANHO
Conclusões: 
1 - A qualificação como deficiente das Forças Armadas, para alem de exigir, no dominio da materia de facto - estranho a competencia deste corpo consultivo - que o acidente, ocorrido em situação de risco agravado, se encontre numa dupla relação de causalidade adequada com aquela situação e com a incapacidade sofrida pelo sinistrado, importa a verificação de um grau minimo de incapacidade geral de ganho de 30%;
2 - A determinação da existencia ou não de incapacidade e do respectivo grau compete as Juntas de Saude dos ramos das Forças Armadas, estando as suas decisões sujeitas a homologação pelo Chefe do Estado-Maior respectivo, nos termos do artigo 6º, nºs 1 a 4, do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, e nº 5, alinea a), da Portaria nº 162/76, de 24 de Março;
3 - Tal determinação e previa ao exercicio da competencia de qualificação prevista no artigo 2º, nº 4, do Decreto-Lei nº 43/76 e no artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/88, de 8 de Fevereiro;
4 - O exercicio de salto em para-quedas de uma aeronave em voo corresponde a um tipo de actividade com risco agravado enquadravel no nº 4 do artigo 2º, referido ao nº 2 do artigo 1º, ambos do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro;
5 - O acidente de que foi vitima o requerente 1º cabo para-quedista (...), corresponde a situação de risco agravado descrita na conclusão 4ª, impedindo, todavia, que este possa ser qualificado como deficiente das forças armadas a circunstancia de não se encontrar estabelecida diminuição de incapacidade geral de ganho na percentagem minima fixada no artigo 2º, nº 1, alinea a), do Decreto-Lei nº 43/76, e nos termos das conclusões 2ª e 3ª.
Texto Integral
Texto Integral: 
SENHOR SECRETÁRIO DE ESTADO ADJUNTO
MINISTRO DA DEFESA NACIONAL,

EXCELÊNCIA:



1

1.1.(...), 1º Cabo Pára-quedista NM (...), na situação de disponibilidade, requereu revisão de processo ao abrigo dos nºs 1, 3, 5, alínea a), da Portaria nº 162/76, de 24 de Março, e do nº 1 da Portaria nº 114/79, de 12 de Março, "a fim de que o seu acidente e a consequente desvalorização que lhe venha a ser atribuída, seja considerado de risco agravado, equiparado ao serviço de campanha, e lhe seja reconhecida a qualificação de DFA" (1 .

Com o requerimento juntou atestado médico no qual se opina, com relação à fractura bimaleolar que sofreu, e às sequelas que nele se referem, poder atribuir--se-lhe uma "incapacidade parcial permanente de 30% de acordo com o artigo 72º do Código dos Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais" (2 .
1.2.Reaberto o processo de averiguações por acidente em serviço (3 e ultimados os seus termos, veio a ser remetido a Vossa Excelência, de quem foi recebido neste Conselho Consultivo para parecer nos termos do nº 4 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro, que, por isso, cumpre emitir.

2

Da análise dos elementos processuais colhe-se, com interesse, o seguinte:


A)Do processo de averiguações nº 32/86:
-O requerente, então em serviço na Base Operacional de Tropas Pára-quedistas nº 1, participou numa sessão de lançamento em pára-quedas de aeronave em vôo no dia 17 de Julho de 1986;
-Ao aterrar na Quinta da Aroeira, lesionou-se no embate violento com o solo, sofrendo fractura tíbio-társica direita com 628 dias de incapacidade total e 270 dias de incapacidade parcial para o serviço, no termo dos quais foi considerado clinicamente curado, com duas cicatrizes de primeira intenção na face interna e externa distal da perna direita, sem aleijão, deformidade ou incapacidade permanente para o serviço;
-O requerente sofreu o acidente no desempenho de funções para as quais estava legalmente nomeado, sem culpabilidade da sua parte ou de outrem (Despacho de 30.12.88 do Comandante);
-A prova colhida neste processo refere, quanto às causas do acidente, que houve embate violento no solo quando o requerente aterrou, provocado pela velocidade do vento que se fazia sentir no momento, consoante o depoimento das duas testemunhas, das quais uma refere como excessiva essa velocidade (fls. 6-6v.).

B)Do processo de revisão:
- O requerente apresenta, em consequência do acidente verificado em 17 de Julho de 1986, uma cicatriz com cerca de 6 cm de comprimento, longitudinal, sobre a face interna da articulação tíbio-társica direita e duas cicatrizes com cerca de 10 cm de comprimento, longitudinais, sobre a face externa da articulação tíbio társica direita. Refere frequentes episódios de dor e impotência funcional da perna direita, encontrando-se clinicamente curado sem sequelas nem desvalorização (cfr. exames a fls. 58, 61, 63 e 70, e informação da Direcção de Saúde da Força Aérea);
-As lesões são resultantes do acidente em serviço ocorrido em 17 de Julho de 1986, referindo-se como origem do acidente a irregularidade do solo (4 ;
-Segundo informação 11/JUS de 16.1.91 do Serviço de Justiça e Disciplina, o Parecer da Repartição de Justiça é no sentido de que "as lesões são resultantes do acidente ocorrido em 17JUL86. O averiguando não atinge o grau de desvalorização necessário para eventual aplicação do Decreto-Lei nº 43/76, de 20.1, nos termos do seu artigo 2º, nº 1, b)" e não resulta do processo responsabilidade dele ou de outrem (nº 7, a) e b));
-Sobre esta informação, que concluía indicando Vossa Excelência como entidade competente para a qualificação do evento nos termos do artigo 2º do mesmo diploma, recaiu despacho do CCESF por Delegação do CEMFA ordenando remessa ao Gabinete de Vossa Excelência.

3

3.1.Como resulta do disposto no artigo 2º, nº 3, do Decreto-Lei nº 43/76, é indispensável incapacidade geral de ganho no grau mínimo de 30% para o efeito da definição de deficiente das forças armadas e aplicação deste diploma.

A determinação do grau de incapacidade compete à Junta de Saúde de cada ramo das forças armadas, estando as suas deliberações sujeitas a homologação do Chefe do Estado-Maior do respectivo ramo (artigo 6º, nºs 1 a 4), o que se aplica aos casos de revisão porquanto, como dispõe o nº 5, alínea a), da Portaria nº 162/76, "nos casos em que a percentagem de incapacidade não for conhecida do antecedente, o requerente será mandado apresentar às Juntas de Saúde (JS) para a obter".

Ora, no caso presente, em que no termo do processo de averiguações não se atribuiu ao requerente qualquer grau de incapacidade, tem aplicação o disposto naquele artigo 6º do Decreto-Lei nº 43/76 e neste nº 5, alínea a) da Portaria nº 162/76.

O requerente na fase de revisão não foi presente à Junta de Saúde da Força Aérea.

Na verdade, constam dos autos um exame médico realizado na Base Aérea nº 6 em 6.12.89, subscrito por um médico (fls. 58), um relatório médico da especialidade de ortopedia, datado de 19.2.90, realizado no Hospital da Força Aérea, também subscrito por um médico (fls. 61), dois exames de sanidade finais, como expressamente se intitulam, respectivamente, de 10.4.90 e 21.5.90, do Serviço de Saúde da Base Aérea nº 6, feitos por dois peritos médicos e por eles subscritos (fls. 63 e 70).

A inexistência de parecer da Junta de Saúde da Força Aérea terá resultado do entendimento da sua desnecessidade, que parece estar ínsito na parte final da Informação 255/89, da 4ª Repartição da Força Aérea (fls. 55), em que se propõe que "o processo seja reaberto com vista à verificação e atribuição ou não de grau de incapacidade em novo exame de sanidade final e subsequente apresentação à JSFA no caso de existir incapacidade".

De resto,, na informação 11/JUS do Serviço de Justiça e Disciplina, está em branco (nº 4) a rubrica "Parecer da J.S.F.A.".

Ora, sendo à JSFA que compete pronunciar-se sobre a incapacidade, sendo as suas deliberações carentes de homologação do Chefe do Estado-Maior do ramo, como se viu, a omissão detectada impede o exercício da competência de qualificação que reside no Ministro da Defesa Nacional, ou de Vossa Excelência por delegação.
3.2.Na suposição de que tal omissão venha a ser suprida e emitido parecer da mesma Junta, homologado pelo Chefe do Estado-Maior da Força Aérea, concordando com o exame de sanidade final, que nenhuma desvalorização atribuiu, falece ao requerente um requisito indispensável à pretendida qualificação como deficiente das Forças Armadas.

3.3.Não obstante isso, à semelhança do que tem ocorrido em outros pareceres, caberá aqui reflectir sobre o acidente em causa como suporte da pretendida qualificação.

3.3.1. Dispõe o nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 43/76:
"2.É considerado deficiente das forças armadas portuguesas o cidadão que:
No cumprimento do serviço militar e na defesa dos interesses da Pátria adquiriu uma diminuição na capacidade geral de ganho;
quando em resultado de acidente ocorrido:
Em serviço de campanha ou em circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha, ou como prisioneiro de guerra;
Na manutenção da ordem pública;
Na prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública; ou
No exercício das suas funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores;
vem a sofrer, mesmo "a posteriori", uma diminuição permanente, causada por lesão ou doença, adquirida ou agravada, consistindo em:
Perda anatómica; ou
Prejuízo ou perda de qualquer órgão ou função;
Tendo sido, em consequência, declarado, nos termos da legislação em vigor:
Apto para o desempenho de cargos ou funções que dispensem plena validez ; ou
Incapaz do serviço activo; ou
Incapaz de todo o serviço militar".
E acrescenta-se no artigo 2º, nº 1, alínea b):
"1.Para efeitos da definição constante do nº 2 do artigo 1º deste decreto-lei, considera-se que:
a) (...)
b)É fixado em 30% o grau de incapacidade geral de ganho mínimo para o efeito da definição de deficiente das forças armadas e aplicação do presente decreto-lei".

Os nºs 2, 3 e 4 do mesmo artigo 2º esclarecem:
"2.O "serviço de campanha ou campanha" tem lugar no teatro de operações onde se verifiquem operações de guerra, de guerrilha ou de contraguerrilha e envolve as acções directas do inimigo, os eventos decorrentes de actividade indirecta de inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade terrestre, naval ou aérea de natureza operacional.
"3.As "circunstâncias directamente relacionadas com o serviço de campanha" têm lugar no teatro de operações onde ocorram operações de guerra, guerrilha ou de contraguerrilha e envolvem os eventos directamente relacionados com a actividade operacional que pelas suas características implicam perigo em circunstâncias de contacto possível com o inimigo e os eventos determinados no decurso de qualquer outra actividade de natureza operacional ou em actividade directamente relacionada, que pelas suas características próprias possam implicar perigosidade.
"4."O exercício de funções e deveres militares e por motivo do seu desempenho, em condições de que resulte, necessariamente, risco agravado equiparável ao definido nas situações previstas nos itens anteriores", engloba aqueles casos especiais, aí não previstos, que, pela sua índole, considerado o quadro de causalidade, circunstâncias e agentes em que se desenrole, seja identificável com o espírito desta lei (redacção rectificada no Diário da República, I Série, 2º Suplemento, de 26/6/76).

A qualificação destes casos compete ao Ministro da Defesa Nacional, após parecer da Procuradoria-Geral da República".

3.3.2. Este corpo consultivo tem interpretado as disposições conjugadas dos artigos 1º, nº 2, e 2º, nº 4, do Decreto-Lei nº 43/76 no sentido de que o regime jurídico dos deficientes das Forças Armadas, para além das situações expressamente contempladas no primeiro preceito - de serviço de campanha ou em circunstâncias com ela relacionadas, de prisioneiros de guerra, de manutenção da ordem pública e de prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública -, só é aplicável aos casos que, "pelo seu circunstancialismo, justifiquem uma equiparação, em termos objectivos, àquelas situações de facto, dado corresponderem a actividades próprias da função militar ou inerentes à defesa de altos interesses públicos, importando sujeição a um risco que excedendo significativamente o que é próprio do comum das actividades castrenses, se mostra agravado em termos de se poder equiparar ao que caracteriza aquelas situações paradigmáticas".
"Assim implica esse regime não só que o acidente tenha ocorrido em serviço, mas também que a actividade militar que o gera envolva, por sua natureza, objectiva e necessariamente um risco agravado em termos de poder equiparar-se ao que decorre em situações de campanha ou a elas por lei igualadas (5 .
3.3.3. Como se tem referido, a este Conselho não cabe apreciar a prova colhida e emitir um juízo de causalidade entre o salto em pára-quedas concreto e o acidente sofrido pelo requerente, nem tão-pouco com as lesões determinantes da incapacidade ou do agravamento desta.
Sem embargo de se reconhecer que o risco inerente ao salto em pára-quedas de uma aeronave em vôo surge agravado relativamente ao comum das actividades castrenses, em termos de permitir a sua equiparação abstracta a qualquer das outras actividades directamente contempladas na lei (6 .

Na generalidade dos casos os acidentes vêm descritos segundo uma tipicidade própria que aponta para a relevância do risco, designadamente porque se mostram observadas as regras técnicas e de segurança, ausência de culpabilidade do sinistrado ou de outrem, intromissão no processo causal de factores condicionantes ou agravantes (fortes rajadas de vento, dificuldades na abertura do pára-quedas ou "enganche" noutros). Estes factores aparecem de tal modo ligados ao processo causal normal, típico, que não podem ser considerados imprevistos ou ocasionais (7 .
3.3.4. No caso em apreço, do mesmo modo que se opina a ausência de culpa do requerente - culpa que, aliás, só por si não descaracterizaria o acidente (nº 3 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 43/76) - alude-se como causa dele ao choque violento com o solo originado pela velocidade do vento, que no dizer de uma das testemunhas seria excessiva (supra 2. A)) e à irregularidade do solo (supra 2.B), circunstâncias cujo relevo causal na perspectiva do risco agravado, não será de excluir, em abstracto, de modo que possam integrar as circunstâncias que constituem esse risco.


CONCLUSÃO:


4.

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1ª.A qualificação como deficiente das Forças Armadas, para além de exigir, no domínio da matéria de facto - estranho à competência deste corpo consultivo - que o acidente, ocorrido em situação de risco agravado, se encontre numa dupla relação de causalidade adequada com aquela situação e com a incapacidade sofrida pelo sinistrado, importa a verificação de um grau mínimo de incapacidade geral de ganho de 30%;
2ª.A determinação da existência ou não de incapacidade e do respectivo grau compete às Juntas de Saúde dos ramos das Forças Armadas, estando as suas decisões sujeitas a homologação pelo Chefe do Estado-Maior respectivo, nos termos do artigo 6º, nºs 1 a 4, do Decreto-Lei nº 43/ /76, de 20 de Janeiro, e nº 5, alínea a), da Portaria nº 162/76, de 24 de Março;
3ª.Tal determinação é prévia ao exercício da competência de qualificação prevista no artigo 2º, nº 4, do Decreto-Lei nº 43/76 e no artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/88, de 8 de Fevereiro;
4ª.O exercício de salto em pára-quedas de uma aeronave em voo corresponde a um tipo de actividade com risco agravado enquadrável no nº 4 do artigo 2º, referido ao nº 2 do artigo 1º, ambos do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro;
5ª.O acidente de que foi vítima o requerente 1º cabo pára-quedista no NM (...) (...), corresponde à situação de risco agravado descrita na conclusão 4ª. impedindo, todavia, que este possa ser qualificado como deficiente das forças armadas a circunstância de não se encontrar estabelecida diminuição de incapacidade geral de ganho na percentagem mínima fixada no artigo 2º, nº 1, alínea a), do Decreto-Lei nº 43/76, e nos termos das conclusões 2ª e 3ª.





________________________________________________________

(1Requerimento de 11.4.89, que dirigiu ao Chefe do Estado-Maior da Força Aérea.

(2Atestado passado em 3.4.89.

(3O processo reaberto tinha o nº 32/86 da Base Aérea nº 6 e coube-lhe pela reabertura o nº 59/89, a que corresponde no Serviço de Justiça e Disciplina o nº 116/90.

(4Referência do requerente (fls. 57), reflectida na conclusão a) do relatório final de fls. 65.

(5Dos pareceres nºs 55/87, de 29 de Julho de 1987, e 80/87, de 19 de Novembro de 1987, homologados mas não publicados, e reflectindo orientação uniforme desta instância consultiva. Cfr. também o Parecer nº 10/89, de 12-4-89.

(6Cfr. Parecer nº 33/86, de 29-7-87, homologado, e outros aí citados, v. g., Pareceres nºs 4/80, de 7-2-80, 86/81, de 11-06-81, 147/81, de 22-10-81, 219/81, de 4-3-82, 42/82, de 1-4-82, e 6/86, de 27-2-86, não publicados.

(7Cfr., Parecer nº 5/88, de 11-3-88.
Anotações
Legislação: 
DL 43/76 DE 1976/01/20 ART2 N3 N4 ART1 N2 ART6.
PORT 162/76 DE 1976/03/24 N5 A.
Referências Complementares: 
DIR ADM * DEFIC FFAA.
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