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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
52/1989, de 18.08.1989
Data do Parecer: 
18-08-1989
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
PGR
Entidade: 
Procurador(a)-Geral da República
Relator: 
PADRÃO GONÇALVES
Descritores e Conclusões
Descritores: 
ALTA AUTORIDADE CONTRA A CORRUPÇÃO
COMPETENCIA
EMPRESA PRIVADA
PARTICIPAÇÃO DO SECTOR PUBLICO
EMPRESA DE ECONOMIA MISTA
EMPRESA DE CAPITAIS PUBLICOS
EMPRESA CONTROLADA
Conclusões: 
1 - O conceito de "empresas participadas pelo Estado", constante do artigo 1 da Lei n 45/86, de 1 de Outubro, deve o interprete deduzi-lo do conceito de "participações do sector publico no capital de sociedades", tal como e definido no artigo 1 do Decreto-Lei n 285/77, de 13 de Julho;
2 - A "EMINCO - Empreendimentos Industriais e Comerciais, SA" e uma "empresa participada pelo Estado", para os fins do artigo 1 da Lei n 45/86, na medida em que diversas empresas publicas detem participações directas no capital social dessa sociedade anonima;
3 - A "SLIL - Sociedade de Lubrificantes Ingleses, Lda", no momento da alienação da quota de 60% que a "EMINCO, SA" nela possuia, era, de igual modo, uma "empresa participada pelo Estado", para os referidos fins, na medida em que uma quota do seu capital era detida por uma sociedade - a "EMINCO, SA" - em que uma percentagem superior a 50% do respectivo capital pertencia conjuntamente a diversas empresas publicas;
4 - A qualificação de "empresas participadas pelo Estado", para os fins do artigo 1 da Lei n 45/86, não depende, tratando-se de participações directas, de participação maioritaria por parte das pessoas publicas; tratando-se de participações indirectas, em qualquer grau, a qualificação exige que as participações, de qualquer montante, sejam detidas por sociedades dominadas pelas referidas entidades de direito publico, directamente ou por intermedio de outras sociedades que por elas sejam dominadas (artigo 1, ns 1, in fine, 2 e 3 do Decreto-Lei n 285/77);
5 - O n 2 do artigo 4 do Decreto-Lei n 371/83, de 6 de Outubro, e irrelevante para a questão de saber quais as "empresas participas pelo Estado" em que a Alta Autoridade pode intervir.
Texto Integral
Texto Integral: 
Excelentíssimo Senhor
Procurador-Geral da República:

1. A Alta Autoridade Contra a Corrupção solicitou à "EMINCO - Empreendimentos Industriais e Comerciais, S.A." fotocópias de actas e de outros documentos relativos à alienação de participações, nomeadamente à venda da quota da "EMINCO", S.A." na "SLIL _ Sociedade de Lubrificantes Ingleses, Ldª", quota que correspondia a 60% do capital social desta sociedade (1.

Essa solicitação foi feita - esclareceu aquela entidade - ao abrigo da Lei nº 45/86, de 1 de Outubro, e tinha em vista averiguar da (i) licitude da venda da referida quota, pela "EMINCO", S. A.", que era (e é) sociedade anónima, com o capital social de 150 000 000$00, do qual inicialmente
participavam apenas entidades privadas, e, a partir de data não esclarecida, diversas instituições de crédito (diversos Bancos) (2 e a Caixa Geral de Depósitos (3, que, para viabilização financeira e recuperação de créditos, adquiriram 86% do capital social da "EMINCO", S.A.".

A venda da quota da "EMINCO", S.A." na "SLIL", Ldª" operou-se depois da compra de 86% do capital social da "EMINCO", S.A." pelas referidas instituições de crédito.

A referida solicitação respondeu o presidente do conselho de administração da "EMINCO", S.A." não lhes parecer "que no âmbito das incumbências conferidas por lei à Alta Autoridade Contra a Corrupção venha incluída a possibilidade de solicitar elementos a uma sociedade anónima de direito privado, como é o caso da "Eminco S.A.", e concomitante obrigação da resposta".

Posteriormente, perante a insistência da Alta Autoridade, acrescentou o referido conselho de Administração: "sendo a EMINCO uma sociedade anónima e tendo alguns dos seus actuais accionistas adquirido as respectivas acções ao abrigo de um normal contrato de compra e venda, não tutelado ou condicionado, por qualquer forma, por via administrativa, pensamos que será no âmbito do Código das Sociedades Comerciais que os actos do seu conselho de administração têm de ser avaliados. Caberá aos accionistas promoverem, querendo, as vias legais que entenderem por adequadas para apurar o âmbito, características e natureza de qualquer decisão do conselho de administração da empresa".

Tendo a Alta Autoridade Contra a Corrupção outro entendimento sobre o assunto, afigurou-se ao Senhor Alto Comissário ser pertinente colher a "apreciação daquela problemática em instância ajustada, promovendo-se a formulação de doutrina clarificadora a usar quer por (aquele) Organismo quer por instâncias judiciárias que sejam solicitadas na matéria".

Para o efeito veio o Senhor Alto Comissário "expor o assunto a Vossa Excelência, na perspectiva de ser apreciado, para os fins em vista, nos termos da alínea e) do artigo 34º da Lei Orgânica do Ministério Público" (4 , suscitando, a final, as seguintes questões:

"A) A Sociedade Eminco, SA, sendo presentemente participada maioritariamente com capitais dos Bancos acima referidos e da Caixa Geral de Depósitos poderá ser considerada como uma das empresas a que alude o artigo 1º da lei nº 45/86, nomeadamente "empresa participada pelo Estado"?

B) A Sociedade SLIL-Sociedade de Lubrificantes Ingleses, Ldª., antes de ter sido alienada a quota de 60% que a Eminco possuía, poderia, da mesma maneira, ser considerada como uma das empresas a que se refere aquele artigo 1º da Lei nº 45/86, nomeadamente "empresa participada pelo Estado"?

C) Considerando por mera hipótese, (e com interesse para apreciação da situação presente e eventual aplicabilidade em outras que se nos deparem) que quer a Eminco, SA, quer a SLIL, Ldª eram participadas com capitais de empresas públicas ou de sociedades anónimas de capitais públicos ou de maioria de capitais públicos sem que, no entanto, tal participação fosse maioritária, poder-se-iam considerar incluídas nos conceitos de empresas referidas no artigo 1º da Lei nº 45/86, nomeadamente no conceito de "empresa participada pelo Estado"?

D) O disposto no nº 2 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 371/83 de 6 de Outubro, que equipara a funcionários os trabalhadores das empresas com participação maioritária de capital público, tem algum reflexo na determinação da capacidade de intervenção da AA nas empresas referidas no artigo 1º da Lei nº 45/86 ?".

Tendo V. Exa determinado a distribuição pelo Conselho Consultivo, cumpre emitir parecer sobre as questões postas.


2.1. No Programa do IX Governo Constitucional (5 inscreveu-se como uma das "principais orientações de carácter geral" a de "defender a moralidade na Administração e nos comportamentos e combater por todos os meios legítimos a corrupção".

Mais adiante, no capítulo destinado à "Administração Pública e modernização administrativa", após se reafirmar entre as "principais orientações" o "propósito firme de combate a todas as formas e aflorações de corrupção, nepotismo e fraude, numa perspectiva de moralização da Administração Pública" (5.1.6), inserem-se como "principais medidas":
......................................................

"5.2.6. Instituir uma alta autoridade especialmente vocacionada para funcionar como caixa de ressonância e de canalização de denúncia de casos de corrupção e outras fraudes, ao nível da Administração Pública ou fora dela, para entidades competentes nos domínios da investigação criminal e do exercício da acção penal, e ainda para proceder a averiguações oficiosas, por amostragem, ou inquéritos relacionados com actividades que coloquem em jogo valores monetários elevados e outros interesses públicos relevantes (concursos de obras públicas e fornecimento de materiais, aquisição de combustíveis, e outras matérias-primas, bens alimentares, etc.).

.....................................................".


2.2. Pouco depois foi publicado o Decreto-Lei nº 369/83, de 6 de Outubro, que assim rezava, no seu preâmbulo:

"O Governo tem manifestado reiteradamente o seu empenho em prevenir e reprimir possíveis actos de corrupção praticados nos serviços do Estado, nos institutos públicos e nas empresas públicas, na prossecução do objectivo de elevar a actuação da Administração Pública em geral a um nível de moralidade e transparência de processos que a imponham à consideração e ao respeito unânimes dos cidadãos.

"Impõe-se, por isso, que quaisquer suspeitas ou indícios de práticas irregulares ou desonestas nesta área sejam investigados e esclarecidos com a maior brevidade, dando-se pronta e completa satisfação à opinião pública.

"Procurando, por um lado, não criar zonas de sobreposição com atribuições de instituições já existentes e, por outro, não sobrecarregar a Administração Pública com mais um serviço de estrutura complexa, entendeu o Governo cometer a investigação de eventuais casos de corrupção praticados no aparelho do Estado a uma alta autoridade, cujo titular será nomeado de entre cidadãos de conduta insuspeita e irrepreensível perfil moral, o qual, com a maior economia de encargos e usando processamentos expeditos, livres de formalismos inadequados à protecção dos interesses em jogo, mas sem que sejam postos em causa os interesses legítimos e garantias dos cidadãos, deverá procurar o total apuramento de responsabilidades no mais curto prazo possível.

"Espera-se que a sua actuação possa constituir o instrumento moralizador que se pretende".
E dispôs o Decreto-Lei nº 369/83, no seu artigo 1º:

"É criada uma alta autoridade, tendo por finalidade a prevenção, a averiguação e a denúncia à entidade competente para a acção penal ou disciplinar de actos de corrupção e de fraudes cometidos no exercício da função administrativa no âmbito da actividade dos serviços da administração pública central, regional e local e das Forças Armadas, dos institutos públicos e das empresas públicas e de capitais públicos participadas pelo Estado ou concessionárias de serviços públicos".


2.3. Analisando este preceito legal, escreveu-se no parecer nº 145/85, de 5 de Junho de 1986, deste corpo consultivo (6 :

"Deste preceito resultam três ordens de delimitação das atribuições da alta autoridade:

- uma primeira, quanto ao próprio tipo de actuação da alta autoridade: atribuem-se-lhe funções de prevenção, averiguação e denúncia, com exclusão, portanto, de interferência nas fases posteriores à denúncia, designadamente de funções de investigação criminal, e, muito menos, de instrução criminal;

- a segunda, quanto à natureza dos actos sujeitos à sua intervenção: são - e são apenas - actos de corrupção e fraudes e desde que cometidos no exercício da função administrativa; estão-lhe, assim, vedados quaisquer actos cometidos no exercício da função política, da função legislativa, da função governativa ou da função jurisdicional, e, no âmbito da função administrativa, todos os actos, por ilícitos ou criminosos que sejam, que não sejam qualificáveis como de corrupção ou como integrando fraudes;

- finalmente, em terceiro lugar, quanto ao âmbito subjectivo, estão sob a sua alçada os serviços da administração pública central, regional e local, as Forças Armadas, os institutos públicos, as empresas públicas (X , as empresas de capitais públicos participadas pelo Estado e as empresas concessionárias de serviços públicos".


2.4. Em 1 de Outubro de 1986, foi publicada a Lei nº 45/86, que assim dispõe no seu artigo 1º:

"Junto da Assembleia da República funciona a Alta Autoridade contra a Corrupção, tendo por incumbência desenvolver as acções de prevenção, de averiguação e de denúncia à entidade competente para a acção penal ou disciplinar dos actos de corrupção e de fraudes cometidos no exercício de funções administrativas, nomeadamente no âmbito da actividade dos serviços da administração pública central, regional e local, das Forças Armadas, dos institutos públicos, das empresas públicas e de capitais públicos, participadas pelo Estado ou concessionárias de serviços públicos, de exploração de bens do domínio público, incluindo os praticados por titulares dos órgãos de soberania" (7 .

O novo diploma resultou do impulso de diversos partidos políticos (8 , que motivou o seguinte relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (9 :

"1 - Os projectos de Lei nºs 30/IV, 85/IV, 96/IV e 97/IV, da responsabilidade, respectivamente, do MDP/CDE, do PRD, do CDS e do PSD, visam rever o estatuto legal para a Alta Autoridade contra a Corrupção.

2 - Estas iniciativas entroncam numa reiterada preocupação da Assembleia da República com o alastrar da fraude, da imoralidade administrativa e dos comportamentos corruptos, e seguem-se a outras, assumidas em anteriores legislaturas.

3 - Criada a Alta Autoridade contra a Corrupção, pelo Decreto-Lei nº 369/83, de 6 de Outubro, junto da Presidência do Conselho de Ministros, foi-lhe vedada a intervenção na esfera de acção dos titulares dos órgãos de soberania. Tal impedimento limitou, segundo declarações públicas do alto-comissário e a opinião generalizada, a actuação pretendida em favor da moralização da Administração, tanto mais quanto se sabe que a lei especial que deveria regular o enquadramento desses titulares nunca foi elaborada.

4 - Não obstante, os resultados conhecidos do exercício da Alta Autoridade traduzem um apreciável empenho e revelam um movimento processual que, de acordo com os últimos dados (não muito recentes), forneciam o seguinte quadro:
......................................................
Questões consideradas nodais são a existência de fundos autónomos, a nomeação de altos agentes administrativos segundo critérios político-partidários, as práticas desonestas na banca e nas alfândegas. Perifericamente, assinala-se a necessidade de uma revisão legislativa, sobretudo nos domínios penal e processual penal, o aumento dos meios a colocar na disponibilidade da Alta Autoridade e o aperfeiçoamento do seu estatuto.
....................................................

6 - Para lá das áreas coincidentes, em torno das quais se não vislumbram controvérsias, um problema axial se coloca: o da opção pelas soluções propostas quanto à colocação orgânica da Alta Autoridade. Junto da Assembleia da República e por esta eleita, conforme proposta do PRD, do CDS e do MDP/CDE? Junto da Presidência da República, nomeado pelo Presidente da República e sob proposta do Governo, nos termos do normativo enunciado pelo PSD? Num e noutro caso se advoga a transferência da actual dependência (do Governo) para órgãos de soberania garantes de uma maior isenção, seja pelo pluripartidarismo da composição do Parlamento seja pelas características suprapartidárias da mais alta magistratura do País, legitimada igualmente pelo sufrágio popular directo. No que a esta eventualidade dispositiva concerne, foram suscitadas objecções de fundo político e de constitucionalidade por deputados do PS, do PRD, do PCP e do CDS.

7 - Assinale-se, entretanto que todas as iniciativas legislativas em presença apontam no sentido de alargar a malha de competência da Alta Autoridade à investigação e ao eventual procedimento, visando os titulares dos órgãos de soberania, o que se reputa de grande relevância.
.....................................................".

Não resulta da discussão dos mencionados projectos de lei e do texto posteriormente elaborado pela referida Comissão, que veio a ser aprovado (10 , qualquer explicação relevante para a economia do presente parecer, tanto mais que a discussão quase se circunscreveu à matéria dos nºs 3, 6 e 7 do Parecer atrás transcrito (11 .

E as alterações introduzidas à norma do artigo 1º do Decreto-Lei nº 369/83, na parte ora em causa - isto é, quanto ao âmbito objectivo de intervenção da Alta Autoridade -, em nada bolem com a matéria em apreço: para além da introdução, sem qualquer explicação por parte do Plenário, da expressão "nomeadamente" (12 , e do acrescentamento de novas entidades, que não interessam à economia do parecer, apenas houve pequenas alterações formais que tornaram mais inteligível o elenco das empresas objecto de averiguação por parte da Alta Autoridade, a saber: empresas públicas, empresas de capitais públicos, empresas participadas pelo Estado, e empresas concessionárias de serviços públicos ou de exploração de bens do domínio público (13 , estas últimas - pelos elementos fornecidos - notoriamente fora do âmbito do parecer.

Por interessar à economia do parecer importa, pois, uma breve incursão sobre os conceitos de empresas "públicas", de "capitais públicos" e "participadas pelo Estado".


3.1. Dispõe o artigo 1º do Decreto-Lei nº 260/76, de 8 de Abril:

"1. São empresas públicas as empresas criadas pelo Estado, com capitais próprios ou fornecidos por outras entidades públicas, para a exploração de actividades de natureza económica ou social, de acordo com o planeamento económico nacional, tendo em vista a construção e desenvolvimento de uma sociedade democrática e de uma economia socialista.
2. São também empresas públicas e estão, portanto, sujeitas aos princípios consagrados no presente diploma as empresas nacionalizadas."

É manifesto que as duas empresas em causa não constituem empresas públicas, tal como são definidas no antecedente preceito legal: nem foram criadas pelo Estado (com capitais próprios ou fornecidos por outras entidades públicas) nem foram nacionalizadas.


3.2. Dispõe o artigo 48º, do mesmo diploma legal:

"1. As sociedades constituídas em conformidade com a lei comercial, em que se associem capitais públicos e privados nacionais ou estrangeiros, não são aplicáveis as disposições do presente decreto-lei, salvo na medida em que os respectivos estatutos mandem aplicar alguns dos princípios aqui consagrados.
2. Igualmente não é aplicável o presente decreto-lei às sociedades constituídas em conformidade com a lei comercial, associando o Estado e outras entidades públicas dotadas de personalidade de direito público ou de direito privado, salvo na medida em que os respectivos estatutos remetam para os princípios aqui consagrados."

Este preceito, nos seus dois números, engloba duas realidades distintas, como aliás, logo resulta da sua epígrafe: "sociedade de economia mista e sociedade de capitais públicos".

Trata-se, em ambos os casos, de empresas que revestem a forma de sociedades comerciais.

Mas, enquanto no segundo caso (nº 2), as empresas associam o Estado e/ou outras entidades públicas como (únicos) titulares do respectivo capital, excluindo qualquer participação de particulares - o que não se passa nos casos em apreço -, no primeiro caso (nº 1) há associação de capitais públicos e privados, como ocorre nas duas sociedades (empresas) em causa.

Daí que tenhamos de concentrar a nossa atenção nestas últimas, as "sociedades de economia mista".


3.3. Referindo-se a estas empresas, escreve N. Sá Gomes (14 :

"Trata-se, neste caso, de sociedades de economia mista "constituídas em conformidade com a lei comercial, isto é, tendo por fonte o contrato de sociedade, definido no Código Civil e segundo as formas previstas na legislação comercial, ou seja, actualmente, no Código das Sociedades Comerciais.
"Portanto, o artigo 48º, nº 1, em vigor, refere-se exclusivamente às sociedades constituídas logo inicialmente como empresas mistas, tendo por acto constitutivo o contrato de sociedade, não abrangendo, portanto, as aquisições posteriores pelos entes públicos de partes sociais por acto jurídico ou contrato, etc.
"No entanto, parece inegável que igualmente não se aplica o Decreto-Lei nº 260/76 relativamente às sociedades inicialmente constituídas de harmonia com a legislação comercial como sociedades privadas que, por força de facto posterior de direito privado que tenha por efeito a transmissão para os entes públicos de partes sociais, venham a transformar as sociedades privadas em sociedades de economia mista.
"Daqui decorre, portanto, que há sociedades de economia mista, originárias e subsequentes, constituídas de harmonia com a legislação comercial.
"Mas a participação pública pode ser obrigatória ou facultativa e ter por fonte, além do acto ou contrato de direito privado, a própria lei, designadamente o diploma de nacionalização."

E escreve Simões Patrício (15 :

"O Estado - ou, como sempre pressupomos ao usar esta palavra, as demais entidades publicas - não intervém apenas (nem, aliás, necessariamente) na gestão da empresa privada: o seu concurso vai mais longe e é mais duradouro, por isso que participa na própria formação (do capital) da empresa - quer originariamente, i. e., como sócio fundador, quer subsequentemente, i.e., adquirindo de outrem certa parte do capital (acções, v.g.).

"Tal é o sentido restrito, e também jurídico, em que se fala de economia mista. Mais latamente, designa-se com tal expressão o papel activo e acentuado que o Estado, parceiro económico e factor da concertação, passou a ter na economia, em geral e não - como especificamente agora consideramos - ao nível da sua associação empresarial aos agentes económicos.
......................................................
"Antes, porém, de esquematizarmos o regime legal das nossas empresas de economia mista, convém estabelecer uma distinção fundamental.

"Com efeito, ao tomar uma parte do capital de certa empresa, o Estado tanto pode ficar, como não, com o respectivo domínio, quer dizer, a controlar o poder de decisão dentro dela; ou dela mesma, melhor dizendo. Tal sucederá quando a parcela de capital que incumbe ao Estado seja maioritária, isto é, superior a 50%.

"Temos, assim, uma classificação a fazer entre as empresas de economia mista ou simplesmente participadas (em sentido amplo): as empresas controladas, também ditas maioritariamente participadas, dominadas ou ainda participadas, controladas (X2 , por um lado, e, por outro, as empresas participadas em sentido restrito: simplesmente (ou minoritariamente) participadas.

"Quando se alude às empresas de economia mista, visam-se geralmente as controladas pelo Estado por via da detenção, por este, de mais do que 50% do seu capital. É nesses casos, com efeito, que opera o regime especial das empresas participadas (lato sensu), embora não deva esquecer-se que, por vezes, mas rara e limitadamente, a simples participação minoritária do Estado no capital duma empresa pode acarretar especialidades no seu regime privado" (16 .


3.4. Perante o exposto cabe perguntar: em que sentido foi empregue a expressão "empresas [...] participadas pelo Estado", no artigo 1º da Lei nº 45/86?

Como interpretar tal expressão?


4.1. Interpretar uma lei consiste em fixar o sentido e o alcance com que ela deve valer, em determinar o seu sentido e alcance decisivos. Como acentua Manuel de Andrade, o escopo final a que converge todo o processo interpretativo é o de pôr a claro o verdadeiro sentido e alcance da lei; interpretar, em matéria de leis, quer dizer não só descobrir o sentido que está por detrás da expressão, como também, de entre as várias significações que estão cobertas pela expressão, eleger a verdadeira e decisiva (17 .

E como escreve Dias Marques (18 :

"O artigo 9º do Código Civil, no seu nº 1, acentua, com grande nitidez, a distinção existente entre o texto ou "letra da lei" e os elementos não textuais da interpretação, nomeadamente, o enquadramento sistemático resultante da consideração da "unidade do sistema jurídico", as circunstâncias em que a lei foi elaborada" e, também, as "condições específicas do tempo em que é aplicada".
......................................................
"Naturalmente, é de supor que o autor da lei, bom conhecedor que deve ser da língua portuguesa e da terminologia jurídica, terá procurado cuidadosamente as palavras mais adequadas para exprimir a norma de que se trata ou, em outros termos, terá sabido "exprimir o seu pensamento em termos adequados" (Código Civil, artigo 9º, nº 3).
"Por isso, o sentido da lei há-de buscar-se, antes de mais e principalmente, nas suas próprias palavras, as quais constituem o que habitualmente se designa por elemento textual ou elemento literal.
......................................................
"Note-se que a determinação do significado gramatical das palavras comporta dificuldades que interessa considerar.
"/.../ as palavras devem entender-se na sua conexão, isto é, não como vocábulos isolados, destacados no conjunto do texto, mas dentro da sua significação sintáctica e globalística /.../.
"/.../ o sentido das palavras deve ser, em princípio, o que resulta do seu uso corrente. Salvo, é claro, quando se trate de termos que possuam um significado técnico e aos quais esse significado deverá ser de preferência atribuído.
"Também importa observar que certas palavras usadas pelo legislador possuem, ao mesmo tempo, um sentido vulgar e um sentido técnico-jurídico /.../. Será então este último, e não aquele, o que deverá prevalecer. Assim como, se interpretarmos uma lei que regule certas matérias particulares (por exemplo, o transporte marítimo, a indústria siderúrgica, a produção de energia eléctrica) há que dar às palavras o sentido técnico que é próprio dessas actividades especiais".


4.2. Como resulta de todo o exposto não existe uma definição legal de "empresas participadas pelo Estado", mas pode ser deduzida do conceito de "participações do sector público", que vem sendo definido em diversos textos legais (19 . E por se tratar de um conceito técnico-jurídico elaborado em época anterior muito próxima (do Decreto-Lei nº 369/83 e da Lei nº 45/86), deverá o intérprete adoptá-lo, para os fins ora em causa, visto não existirem razões que nos conduzam a diferente solução. Isto é, é de presumir que o legislador, ao referir-se a "empresas participadas pelo Estado", tenha tido em mente o conceito (e as diversas situações) de "participações do sector público".

Vejamos:


4.3. Uma primeira definição consta do nº 2 do artigo 4º do estatuto do Instituto das Participações do Estado (I.P.E.), aprovado pelo Decreto-Lei nº 496/76, de 26 de Junho, como sendo "participações do sector publico" as "participações directas e indirectas do Estado, dos fundos autónomos e institutos públicos, das autarquias locais, das instituições de previdência e das empresas públicas". Esta definição foi explicitada pelo Decreto-Lei nº 151/77, de 14 de Abril, artigo 1º (20 , que alterou a redacção do artigo 3º, nºs 2 e 3, do estatuto do gestor público, aprovado pelo Decreto-Lei nº 831/76, de 25 de Novembro, e pelo Decreto-Lei nº 285/77, de 13 de Julho, artigo 1º (diploma que regula as transferências das participações do sector público para o IPE). Os preceitos são semelhantes no seu alcance, embora com redacções diferentes (21 , e "deles se deduz analiticamente que são participações do sector público (22 :

1º Participações directas - aquelas que o Estado e outras pessoas colectivas de direito público detêm em sociedades de direito privado, qualquer que seja o seu montante, em termos absolutos ou relativos;

2º Participações indirectas (em 2º grau) - aquelas que são detidas por sociedades de direito privado em que a maioria do capital social pertence ao Estado ou a outras pessoas colectivas de direito público;

3º Participações indirectas (em 3º, 4º. ... grau) - aquelas que são detidas por sociedades de direito privado indirectamente dominadas pelo Estado ou outras pessoas de direito público, isto é, em que a maioria do capital pertence a sociedades de direito privado por sua vez dominadas por entidades públicas" (23 .



4.4. Uma dificuldade pode ser levantada: referindo-se o artigo 1º da Lei nº 45/86 a "empresas participadas pelo Estado", deverá limitar-se essa expressão aos casos em que a participação é feita (apenas ou também) com capitais da pessoa Estado (24 , ou, pelo contrário, estendê-la às empresas em que as participações são exclusivamente dos demais entes públicos, referidos no nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 285/77? (25 .

Cremos haver razões bastantes para entender tal expressão em sentido amplo, abrangendo assim, toda a participação do sector público, com o sentido atrás exposto.

De facto, segundo o preâmbulo do Decreto-Lei nº 369/83 visa-se elevar a actuação da "administração pública em geral" a um nível de moralidade e transparência de processos, e os artigos 1ºs do Decreto-Lei nº 369/83 e da Lei nº 45/86, em conformidade, abrangem toda a Administração Central (directa e indirecta), regional e local, incluindo as empresas (sociedades) de capitais públicos (associando o Estado e ou outras entidades públicas dotadas de personalidade de direito público ou de direito privado, como se vê do nº 2 do artigo 48º do citado Decreto-Lei nº 260/76).

Assim sendo, se a acção da Alta Autoridade abrange as sociedades em que todos os capitais são públicos - do Estado ou de quaisquer outros entes públicos -, não se vê razão para não abranger as sociedades mistas em que intervenham as referidas entidades públicas, cujos representantes podem agir por forma a justificar a intervenção daquela Alta Autoridade.

A palavra "Estado" aparece, pois, aí usada no seu sentido mais amplo, abrangendo todo o "sector público", os referidos "entes públicos".


5. Estão recolhidos os elementos de direito que nos permitem responder às questões postas.


5.1. Questão A

É a "Eminco, S.A." uma sociedade de economia mista em que 86% do seu capital pertence a empresas públicas, e o restante a entidades privadas. Trata-se, pois, de uma sociedade (empresa) controlada (ou maioritariamente participada) por entidades públicas (C.G.D. e diversos Bancos).

Assim sendo, e independentemente da percentagem do capital detido por essas entidades públicas, está-se perante uma empresa do sector público empresarial, tratando-se de participações directas previstas no nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 285/77.

Pelas razões atrás apontadas cabe tal sociedade (empresa) no âmbito do artigo 1º da Lei nº 45/86, como "empresa participada pelo Estado", expressão usada em sentido amplo, como atrás se entendeu, sendo indiferente, como também se concluiu, que a participação pública não seja inicial, mas, sim, subsequente.


5.2. Questão B

Também se náo podem oferecer dúvidas de que a "SLIL - Sociedade de Lubrificantes Ingleses, Ldª", no momento da alienação da quota de 60% que a "Eminco, S.A." possuía, era uma empresa de sector público empresarial, estando em causa participações indirectas (em 2º grau) - nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 285/77 -, detidas por sociedade de direito privado (a "EMINCO, S.A.") em que a maioria do capital social pertencia a entes públicos (empresas públicas) referidos no mesmo preceito legal.

Pelas razões atrás indicadas relativamente à "EMINCO, S.A.", a "SLIL, Ldª" deve ser igualmente considerada como "empresa participada pelo Estado", para os fins do artigo 1º da Lei nº 45/86.


5.3. Questão C

A resposta à questão C decorre claramente da análise (feita no nº 4.3) dos nºs 1 e 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 285/77:

- tratando-se de participações directas - portanto, por parte do Estado e outras pessoas colectivas de direito público -, a qualificação de "empresas participadas pelo Estado", para os fins do artigo 1º da Lei nº 45/86, não depende de participação maioritária por parte dessas pessoas públicas, podendo essa qualificação afirmar-se qualquer que seja o montante das acções ou quotas de capital detidas;

- tratando-se de participações indirectas, em qualquer grau, a qualificação como "empresa participada pelo Estado", para os fins em causa, exige que as participações, de qualquer montante, sejam detidas por sociedades dominadas, separada ou conjuntamente, pelas referidas entidades de direito público, quer directamente, quer por intermédio de outras sociedades que por elas sejam dominadas (cfr. artigo 1º, nºs 1, in fine, 2 e 3).



5.4. Questão D


Em causa o reflexo da norma do nº 2 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 371/83, de 6 de Outubro, na determinação da capacidade de intervenção da Alta Autoridade nas empresas referidas no artigo 1º da Lei nº 45/86.


5.4.1- Diz-se no preâmbulo do Decreto-Lei nº 371/83, de 6 de Outubro:

"Os dispositivos do Código Penal que tipificam crimes cometidos no exercício de funções públicas (26 jogam com o conceito estrito de funcionário (27 .
"Pelo presente diploma alarga-se esse conceito a funções cujo paralelismo, do ponto de vista da política criminal, é de todo o ponto evidente.
"Por outro lado, os tipos legais de crime da secção I do capítulo IV, sob. a rubrica "da corrupção", reportam-se a um conceito de vantagem patrimonial, que deixa de fora valores e vantagens igualmente atendíveis de natureza pessoal, ou não patrimonial.
"O presente diploma visa estender a situações em tudo dignas de igual tratamento soluções previstas por forma demasiado estrita no novo Código Penal.
......................................................
"Tudo na linha de uma política de pragmático combate à corrupção e outras fraudes e de moralização dos comportamentos administrativos".

Para o efeito, o diploma, nos seus artigos 1º e 2º, alargou a previsão dos crimes de corrupção passiva e activa (previstos nos artigos 420º a 423º do Código Penal) aos casos em que a vantagem proporcionada, prometida, solicitada ou aceite seja "não patrimonial" e dela beneficiem além do funcionário ou equiparado, o seu cônjuge, parentes ou afins até ao 3º grau.

E dispôs nos artigos 4º e 5º:
"Art. 4º - 1- Para efeitos do presente diploma, a expressão funcionário tem o alcance fixado pelo nº 1 do artigo 437º do Código Penal (28 .
2 - Para os mesmos efeitos, e ainda para os efeitos dos artigos 420º a 423º do Código Penal, são equiparados a funcionários os titulares dos órgãos e os funcionários da administração autárquica regional e local ou de institutos públicos e os gestores, titulares dos órgãos de fiscalização e trabalhadores de empresas públicas nacionalizadas, de capitais públicos ou com participação maioritária de capital público, e ainda de empresas concessionárias de serviços públicos".
"Art. 5º A equiparação prevista no nº 2 do artigo antecedente faz igualmente incorrer os equiparados:
a) No crime de favorecimento pessoal praticado por funcionário previsto e punido pelo artigo 411º do Código Penal;
b) No crime de promoção dolosa previsto e punido pelo artigo 413º do Código Penal;
c) No crime de não promoção previsto e punido pelo artigo 414º do Código Penal;
d) No crime de prevaricação previsto e punido pelo artigo 415º do Código Penal;
e) Nos crimes de peculato previstos e punidos pelos artigos 424º, 425º e 426º do Código Penal;
f) No crime de participação económica em negócio previsto e punido pelo artigo 427º do Código Penal;
g) No crime de recusa de cooperação previsto e punido pelo artigo 431º do Código Penal;
h) No crime de abuso de poderes previsto e punido pelo artigo 432º do Código Penal;
i) No crime de violação de segredo por funcionário ou ex-funcionário previsto e punido pelos artigos 433º e 435º do Código Penal".


5.4.2. Visou o citado Decreto-Lei nº 371/83 (29combater a "corrupção e outras fraudes" e moralizar os "comportamentos administrativos". Para isso, e como se escreveu no citado parecer nº 145/85:

a) - alargou a previsão dos crimes de corrupção, nos termos apontados (artigos 1º e 2º);
"b) - alargou a possibilidade de isenção da pena no caso de participação do crime às autoridades por parte de qualquer dos agentes e não apenas em relação ao agente de corrupção activa, como até então acontecia (artigo 3º);
"c) - equiparou aos funcionários definidos no artigo 437º do Código Penal, para efeitos (de incriminação pelos) crimes de corrupção, favorecimento pessoal, promoção dolosa, não promoção, prevaricação, peculato, participação económica em negócio, recusa de cooperação, abuso de poderes e violação de segredo, previstos nos artigos 420º a 423º, 411º, 413º, 414º, 415º, 424º a 426º, 427º, 431º, 432º e 433º e 435º do mesmo Código, "os titulares dos órgãos e os funcionários da administração autárquica regional e local ou de institutos públicos e os gestores, titulares dos órgãos de fiscalização e trabalhadores de empresas públicas nacionalizadas, de capitais públicos ou com participação maioritária de capitais públicos, e ainda de empresas concessionárias de serviços públicos" (artigos 4º e 5º);
"d) - considerou sempre punível a tentativa destes crimes, independentemente da medida legal da pena (artigo 6º);
"e) - especificou as situações em que, atenta a finalidade da corrupção, se considera manifesta e grave a violação dos deveres inerentes à função pública, determinante da aplicação da pena acessória de demissão" (artigo 7º).

O diploma não contém nenhuma norma de natureza processual.


5.4.3. Perante tais normativos pergunta-se se o disposto no nº 2 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 371/83 - ao estabelecer a equiparação aí referida - teve algum reflexo na determinação da capacidade de intervenção da Alta Autoridade nas empresas mencionadas no artigo 1º da Lei nº 45/86.

Cremos que na formulação desta questão estará saber se a "equiparação" feita pela referida norma (do nº 2 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 371/83) poderá de algum modo contribuir para fixar o sentido da expressão "empresas participadas pelo Estado", constante do artigo 1º da Lei nº 45/86.

Sendo este o sentido da pergunta, a resposta é negativa, porquanto o nº 2 do referido artigo 4º apenas tem em vista delimitar a imputação penal, alargando-a subjectivamente. Ou seja, esse alargamento apenas acarreta a possibilidade de averiguação de factos imputáveis aos trabalhadores aí referidos, o que antes não era possível, sendo alheio à questão de saber quais as empresas em que a Alta Autoridade pode intervir.
Conclusão:

6. Termos em que se conclui:

1. O conceito de "empresas participadas pelo Estado", constante do artigo 1º da Lei nº 45/86, de 1 de Outubro, deve o interprete deduzi-lo do conceito de "participações do sector público no capital de sociedades", tal como é definido no artigo 1º do Decreto-Lei nº 285/77, de 13 de Julho;

2. A "EMINCO - Empreendimentos Industriais e Comerciais, S.A." é uma "empresa participada pelo Estado", para os fins do artigo 1º da Lei nº 45/86, na medida em que diversas empresas públicas detêm participações directas no capital social dessa sociedade anónima;

3. A "SLIL- Sociedade de Lubrificantes Ingleses, Ldª", no momento da alienação da quota de 60% que a "EMINCO, S.A." nela possuía, era, de igual modo, uma "empresa participada pelo Estado", para os referidos fins, na medida em que uma quota do seu capital era detida por uma sociedade - a "EMINCO, S.A." - em que uma percentagem superior a 50% do respectivo capital pertencia conjuntamente a diversas empresas públicas;

4. A qualificação de "empresas participadas pelo Estado", para os fins do artigo 1º da Lei nº 45/86, não depende, tratando-se de participações directas, de participação maioritária por parte das pessoas públicas; tratando-se de participações indirectas, em qualquer grau, a qualificação exige que as participações, de qualquer montante, sejam detidas por sociedades dominadas pelas referidas entidades de direito público, directamente ou por intermédio de outras sociedades que por elas sejam dominadas (artigo 1º, nºs 1, in fine, 2 e 3 do Decreto-Lei nº 285/77);

5. O nº 2 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 371/83, de 6 de Outubro, é irrelevante para a questão de saber quais as "empresas participadas pelo Estado" em que a Alta Autoridade pode intervir.







(1 O capital social da "SLIL", Ldª" era de 60 000 contos, sendo sócios a "EMINCO", S.A." com 36 000 contos (60%), Herdeiros de Félix da Costa com 15 600 contos (26%), e António Maria Carneiro Pacheco, com 8 400 contos (14%).
(2Trata-se do B.P.A., B.P.S.M., B.N.U., B.E.S.C.L., B.T.A., U.B.P., B.B.I., B.F.N., C.P.P. e B.F.B..
Estas instituições de crédito foram nacionalizadas pelos Decretos-Leis nºs 451/74, de 13 de Setembro (o B.N.U.) e 132-A/75, de 14 de Março (as restantes). De acordo com o artigo 2º do Decreto-Lei nº 729-F/75, de 22 de Dezembro, estas instituições são pessoas colectivas de direito público, com a natureza de empresas públicas.
(3Nos termos do artigo 2º do Decreto-Lei nº 48953, de 5 de Abril de 1969, a Caixa Geral de Depósitos é uma pessoa colectiva de direito público, competindo-lhe o exercício das funções de instituto de crédito do Estado e a administração das instituições a que se referem os artigos 4º e 6º do diploma.
Como escreveu Marcello Caetano - Manual de Direito Administrativo, 10ª edição (Reimpressão), Tomo I, pág. 379 - a C.G.D. é "um importantíssimo estabelecimento bancário com carácter de empresa pública".
Para a economia do parecer é indiferente tratar-se de empresa pública ou de instituto público (tipo não empresarial).
(4Alínea e) do artigo 34º da L.O.M.P. (Lei nº 47/86, de 15 de Outubro):
"Compete ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República: [...] e) Pronunciar-se sobre as questões que o Procurador-Geral da República, no exercício das suas funções, submeta à sua apreciação".
(5"Diário da Assembleia da República", III Legislatura, 1ª Sessão Legislativa, II Série, Suplemento ao nº 6, de 21 de Junho de 1983.
(6Não publicado. O parecer em causa era dirigido a V. Exa..
(X"Trata-se de uma referência supérflua, já que as "empresas públicas" são uma espécie do género "institutos públicos", pelo que a menção destes já englobava aquelas".
(7Dispõe o nº 1 do artigo 14º da Lei nº 45/86 que o Governo (devia) publicar a regulamentação da presente lei no prazo de 60 dias, o que ainda não ocorreu. Até à publicação dessa regulamentação - diz-se no nº 2 do mesmo artigo 14º - "mantém-se em vigor, em tudo o que não for contrariado pela presente lei, o Decreto-Lei nº 369/83, de 6 de Outubro, o Decreto Regulamentar nº 3/84, de 12 de Janeiro, e o Decreto-Lei nº 327/84, de 12 de Outubro".
(8Cfr. os respectivos projectos no Diário da Assembleia da República, II Série, de 15/11/85, 7/1/86 e 15/1/86.
(9Cfr. Diário da Assembleia da República, I Série, de 17/1/86.
(10Cfr. Diário da Assembleia da República, I Série, de 171/86 e 26/7/86, respectivamente.
(11Refira-se, no entanto, que o projecto do PRD, no nº 2 do artigo 4º, previa poder a Alta Autoridade proceder a averiguações no âmbito de (quaisquer) sociedades privadas, "em casos excepcionais, devidamente fundamentados, de dolo ou grave negligência. Esta norma (alteração) foi vivamente criticada pelo deputado Costa Andrade, não tendo seguimento.
(12Não se afigura fácil, no contexto, a compreensão (sentido e alcance) de tal expressão, que, seguramente não interessa à economia do parecer.
(13As empresas (sociedades) concessionárias de serviços públicos ou de exploração de bens do domínio público constituem "sociedades de interesse colectivo", isto é, instituições particulares de interesse público que Freitas do Amaral - Curso de Direito Administrativo, vol. I, 1987, pág. 558 - define como "empresas privadas, de fim lucrativo, que por exercerem poderes públicos ou serem submetidas a uma fiscalização especial da Administração Pública, ficam sujeitas a um regime jurídico, traçado pelo Direito Administrativo". Nessa categoria inclui o mesmo autor, também, as empresas de economia mista e as sociedades participadas pelo Estado.
(14"Notas sobre a Função e Regime Jurídico das Pessoas Colectivas Públicas de Direito Privado", 1987, pág. 152.
(15"Curso de Direito Económico", 2ª edição, 1981, edição de A.A.F.D.L., págs. 423 e segs..
(X2"Expressão, esta, usada v.g. no Decreto-Lei nº 453/78, de 30 de Dezembro (artigo 1º - 2). Aludindo, em sentido amplo, a empresas participadas, a epígrafe do artigo 48º do Decreto-Lei nº 260/76 usa a expressão "sociedades de economia mista" [...].
(16Sobre esta matéria cfr., entre outros, C. Ferreira de Almeida, Direito Económico, 1ª parte, edição da A.A.F.D.L., 1979, págs. 203 e segs..
(17"Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leis", 2ª edição, 1963, págs. 21 e 26.
(18"Introdução ao Estudo do Direito", Lisboa, 1972, págs. 275 e segs..
(19Cfr. C. Ferreira de Almeida, ob. e loc. cits., aqui seguido de muito perto.
(20Antes, o Despacho Normativo nº 70/77, de 16 de Março - Diário da República, I Série, de 25 de Março - desenvolveu o referido conceito de "participação do sector público no capital de sociedades", em termos idênticos aos actuais.
(21Artigo 1º do Decreto-Lei nº 285/77, de 13 de Julho:
"1. Para efeitos do disposto no presente diploma, consideram-se como participações do sector público no capital de sociedades quaisquer acções ou quotas de capital detidas pelo Estado, fundos autónomos e institutos públicos, instituições de previdência e empresas públicas, bem como as detidas por sociedades em que uma percentagem superior a 50% do respectivo capital pertença, separada ou conjuntamente, às entidades anteriormente referidas.
2. São também de considerar como participações do sector público as acções ou quotas de capital detidas por sociedades dominadas, separada ou conjuntamente, pelas entidades referidas no número anterior, quer directamente, quer por intermédio de outras sociedades que por elas sejam dominadas.
3. Considera-se, para esse efeito, que uma participação no capital de uma sociedade assegura o domínio desta, quando representa mais de 50% do respectivo capital social".
A definição contida no artigo 1º do Decreto-Lei nº 285/77 não inclui as participações das autarquias locais. Ferreira de Almeida, ob. e loc. cit., entende que se trata "provavelmente, de mero lapso, visto que o Estatuto do IPE (artigo 4º, nº 2= as considera entre aquelas que constituem objecto da gestão desta empresa pública".
A economia do parecer - tendo em conta as entidades (empresas) aqui em causa - dispensa-nos de esclarecer tal questão.
(22C.Ferreira de Almeida, ob. e loc. cits. .
(23No mesmo sentido cfr. Simões Patrício, ob. cit., pág. 427, e "Regime Jurídico do Sector Empresarial do Estado", 1983, pág. 20, N. Sá Gomes, ob. cit., pág. 154, e L. Cabral de Moncada, "Direito Económico", 2ª edição, 1988, pág. 257.
(24Note-se, por exemplo, que o nº 1 do artigo 88º da Lei nº 49/86, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 1987) distingue essas participações, dispondo:
"1. O regime de alienação de participações do Estado ou de qualquer fundo autónomo, instituto público, instituições de segurança social, empresa pública ou sociedade de capitais públicos no capital de sociedades, será estabelecido mediante decreto-lei .....................".
(25A alínea b) do nº 2 do artigo 1º da Lei nº 71/88, de 24 de Maio (regime de alienação das participações do sector público) define participações públicas como "participações sociais detidas por entes públicos"; e a alínea e) do mesmo preceito considera entes públicos (para efeitos de aplicação deste diploma): O Estado, fundos autónomos, institutos públicos, instituições de segurança social, empresas públicas, sociedades de capitais exclusivamente públicos e sociedades de economia mista com maioria de capitais públicos".
(26Funções - entenda-se - ao serviço do Estado e demais pessoas colectivas de direito público. Cfr., sobre o assunto, Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol. II, 9ª edição (Reimpressão), 1980, págs. 641 e segs..
As noções de funcionário e agente administrativo assentam também nesse mesmo pressuposto - exercício de funções públicas, isto é, ao serviço de pessoas colectivas de direito público (a., ob. e loc. cits.).
(27Conceito estrito, entenda-se, tendo em conta as entidades (apenas de direito público) a quem o serviço é prestado, pois, quanto aos servidores tidos por "funcionários", pela lei penal, deverá concluir-se pelo uso de uma noção ampla desse conceito (cfr. artigo 437º, nº 1, do Código Penal, transcrito na nota seguinte).
Como escreve Maia Gonçalves - Código Penal Português, anotado e comentado, 3ª edição, 1986, em anotação do artigo 437º:
"Este artigo foi inspirado no artigo 327º do C.P. de 1886, onde também se dava uma definição ampla de funcionário, para efeitos penais. Como acentuámos na anot. a esse artigo 327º, no nosso Código Penal Português, os fins específicos da tutela penal não se compadeceriam com uma fórmula restrita, que excluísse designadamente aqueles a quem são cometidas funções em serviços públicos sem permanência bastante para que, em Direito Administrativo, possam considerar-se funcionários públicos. E daí terem sido, com frequência, considerados funcionários, para efeitos penais, certos indivíduos desempenhando aquelas funções, não obstante poderem ser livremente nomeados ou exonerados.
"Independentemente do formalismo do investimento de que cura o Direito Administrativo, é funcionário público para efeitos penais todo aquele que é chamado a desempenhar uma actividade compreendida na função pública ou que, nas mesmas circunstâncias, desempenhe funções em organismos de utilidade pública ou nelas participe, e isto mesmo que tenha sido chamado provisória ou temporariamente, e ainda que não seja remunerado".
(28Nº 1 do artigo 437º do Código Penal:
"Para efeitos da lei penal, a expressão funcionário abrange:
a) O funcionário civil;
b) O agente administrativo;
c) Quem, mesmo provisória ou temporariamente, mediante remuneração ou a título gratuito, voluntária ou obrigatoriamente, tenha sido chamado a desempenhar ou a participar no desempenho de uma actividade compreendida na função pública administrativa ou jurisdicional, ou, nas mesmas circunstâncias, desempenhe funções em organismos de utilidade pública ou nelas participe".
(29Rectificado no "Diário da República", I Série, nº 301, de 31 de Dezembro de 1983.
Anotações
Legislação: 
L 45/86 DE 1986/10/01 ART1.
DL 371/83 DE 1983/10/06 ART4 N2.
DL 369/83 DE 1983/10/06 ART1.
DRGU 3/84 DE 1984/01/12.
DL 327/84 DE 1984/10/12.
DL 260/76 DE 1976/04/08 ART1 ART48.
DL 496/76 DE 1976/06/26 ART4 N2.
DL 151/77 DE 1977/04/14.
DL 285/77 DE 1977/07/13.
CP82 ART420 ART421 ART422 ART423 ART437.
Referências Complementares: 
DIR ECON / DIR ADM * ADM PUBL / DIR CRIM.
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