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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
103/1989, de 25.01.1990
Data do Parecer: 
25-01-1990
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Defesa Nacional
Relator: 
FERREIRA RAMOS
Descritores e Conclusões
Descritores: 
DEFICIENTE DAS FORÇAS ARMADAS
Conclusões: 
O exercicio de tiro instintivo comandado, em carreira de tiro, no decurso do qual instruendo se acidentou em consequência da espingarda automatica G-3 com que fazia fogo, não constitui situação enquadrável no nº 4 do artigo 2º, referido ao nº 2 do artigo 1º, ambos do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional,

Excelência:


1.

Dignou-se Vossa Excelência remeter à Procuradoria-Geral da República o processo relativo ao soldado NM (...), (...), com vista a uma eventual qualificação como deficiente das forças armadas, nos termos do nº 4 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro.

Cumpre emiti-lo.


2.

2.1. No dia 5 de Setembro de 1964, pelas 16 horas, decorriam no Campo de Tiro da Serra da Carregueira exercícios de tiro instintivo comandado com arma automática.

0 requerente era um dos intervenientes, que fazia fogo com a espingarda automática C3, modelo 1961, nº 63HK067849-61, arma cujo cano viria a rebentar junto à câmara, atingindo aquele na mão esquerda, o que viria a determinar a amputação do terceiro dedo da mesma mão, tendo resultado "aleijão, deformidade, com privação completa do terceiro dedo da mão esquerda, dificuldade de realizar os movimentos da mesma mão e cicatriz na palma da referida mão e incapacidade para todo o serviço militar".

No processo então instaurado concluiu-se não ter havido "culpabilidade ou negligência nem do sinistrado nem de qualquer outra pessoa", tendo o acidente sido considerado como ocorrido em serviço, por despacho de 4 de Setembro de 1965 do General Governador Militar de Lisboa.

2.2. Requerida em 30/7/85 a revisão do processo, foi o interessado presente a nova JHI, em 15/1/88, que o julgou "incapaz de todo o serviço militar, apto parcialmente para o trabalho com uma desvalorização de 30,7%" (homologada por despacho de 4/1/89).

A CPIP foi de parecer que "o motivo pelo qual a JHI/HMP julgou este militar incapaz de todo o serviço com 30,7% de desvalorização, resultou das lesões sofridas no acidente ocorrido em 5/12/8C (parecer homologado por despacho de 3/3/89).


3.

3.1. Vem este corpo consultivo entendendo, na interpretação, conjugada, das disposições dos artigos 1º, nº 2, e 2º, nº 4, do referido Decreto-Lei nº 43/76, que, para além das situações expressamente consagradas na primeira dessas normas - as de serviço de campanha ou em circunstâncias directamente com ela relacionadas, de prisioneiro de guerra, de manutenção da ordem pública e da prática de acto humanitário ou de dedicação à causa pública -, o regime jurídico dos deficientes das forças armadas só é aplicável aos casos que, pelo respectivo circunstancialismo, justifiquem a sua equiparação, em termos objectivos, àquelas situações por virtude de, correspondendo a actividades próprias da função militar ou serem inerentes à defesa de altos interesses públicos, importarem sujeição a um risco que, excedendo significativamente o que é próprio das actividades militares correntes, se mostra agravado em termos de poder ser equiparado ao que caracteriza aquelas situações paradigmáticas.

Importa, assim, para poder aplicar-se o regime dos deficientes das forças armadas, que o acidente causador das lesões, além de ter ocorrido em serviço, corresponda a uma actividade militar que, objectiva e necessariamente envolva, por sua natureza, um risco agravado em termos tais que possa equivaler ao que concorre na situação de campanha ou naquelas que a lei a esta equipara, não relevando, deste modo, o risco próprio das actividades militares correntes.

3.2. De acordo com este entendimento, que não há razões para modificar ou abandonar, tem sido apreciada a actividade militar de exercício de fogo em carreira de tiro - que é a que ocorre no caso em apreço considerando-a como mera actividade castrense corrente que não envolve risco superior ao das demais dessa natureza.

Assim, no parecer nº 99/76, de 30 de Julho de 1976 (1), escreveu-se:

"Afigura-se-nos que o tiro realizado em carreira, contrariamente aos exercícios com fogos reais, tem lugar com requisitos mínimos de segurança que, em regra, obstam a quaisquer acidentes. Só em casos muito excepcionais e imprevisíveis, como o defeito de armamento, são possíveis acidentes, pelo que não se considera esta actividade equiparada às referidas no nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 43/76".

Considerando o caso de treino em tiro de precisão, no parecer nº 78/76, de 30 de Julho de 1976 (2) ponderou-se que ele "pressupõe um prévio conhecimento no manejo de armas de fogo que afasta aquele risco (3) que poderá existir para quem não tenha a conveniente instrução. 0 tiro é uma actividade vulgar e que não apresenta perigo para o militar preparado".

A propósito de um caso de exercício de tiro na Escola de Fuzileiros e na mesma linha de pensamento, ponderou-se no parecer nº 185/76, de 13 de Janeiro de 1977 (4) :

"Ora aquela actividade não se integra em exercícios de fogos reais, envolvendo acções de fogo de certos elementos contra outros, supostamente inimigos, com risco agravado, que a tais acções é próprio, de os que nelas intervêm se sujeitarem a ser atingidos por disparos de armas de fogo em ambiente de campanha ou que lhe seja equivalente.

Com efeito, os simples exercícios de tiro só excepcionalmente dão lugar a acidentes, pelo que não se podem considerar como um tipo de acção comportando risco superior ao que a actividade militar genericamente envolve" (5) .

3.3. Efectivamente, nos exercícios de tiro em carreira o instruendo não está sujeito a qualquer acção de fogo, limitando-se a fazer o disparo da arma que lhe está entregue nas condições de segurança próprias e observando os ensinamentos do instrutor.

0 único risco que corre não lhe advém especificamente da perigosidade do exercício que, em si, é mínima, mas unicamente de um eventual funcionamento deficiente da arma, o que sucedeu no caso concreto, ou de negligência própria ou de terceiro - risco este que é objectivamente inerente ao comum das actividades militares e que, por isso, não releva para os efeitos do disposto no artigo 2º, nº 4, referido ao nº 2 do artigo 1º do Decreto-lei nº 43/76, sem embargo de o acidente poder ser qualificado como de serviço.

Sendo assim, não pode concluir-se que o acidente sofrido pelo soldado (...) em consequência do facto, meramente ocasional, do rebentamento do cano da arma com que fazia fogo em carreira, tenha ocorrido em actividade de risco agravado em termos equiparáveis ao da situação de campanha ou das que legalmente lhe equivalham.


4.

Em face do exposto, conclui-se:

0 exercício de tiro instintivo comandado, em carreira de tiro, no decurso do qual o instruendo se acidentou em consequência do rebentamento da espingarda automática G-3 com que fazia fogo, não constitui situação enquadrável no nº 4 do artigo 2º, referido ao nº 2 do artigo 1º, ambos do Decreto-Lei nº 43/76, de 20 de Janeiro.



(1) Publicado no Boletim do Ministério da Justiça, nº 264, pág. 59.

(2) Publicado no Boletim do Ministério da Justiça, nº 265, pág. 40.

(3) Refere-se ao risco de situações de perigo, como, por exemplo, as de exercícios de fogos reais, de minas e armadilhas, de saltos de paraquedas ou de acrobacia aérea.

(4) Publicado no Boletim do Ministério da Justiça, nº 273, pág. 71.

(5) Muitos outros pareceres, também homologados, têm feito aplicação desta doutrina. Assim, por exemplo, os pareceres nºs. 207/76, de 13-1-77; 162/77, de 31-8-77; 179/77, de 27-10-77; 220/77, de 27-10-77; 243/77, de 2-12-77; 271/77, de 5-1-78; 158/78, de 27-7-78; 268/78, de 18-1-79; 169/79, de 8-11-79; 102/80, de 10-7-80 e 151/80, de 23/10/80.
Anotações
Legislação: 
DL 43/76 DE 1976/01/20 ART2 N4 ART1 N2.
Referências Complementares: 
DIR ADM * DEFIC FFAA.
Divulgação
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