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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
81/2007, de 24.07.2008
Data do Parecer: 
24-07-2008
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
PGR
Entidade: 
Procurador(a)-Geral da República
Relator: 
PIMENTEL MARCOS
Descritores e Conclusões
Descritores: 
CÂMARA MUNICIPAL
ELEITO LOCAL
PROCESSO JUDICIAL
APOIO JUDICIÁRIO
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO
EXERCÍCIO DE FUNÇÕES
ACTO DE GESTÃO PRIVADA
ACTO DE GESTÃO PÚBLICA
CRIME DE RESPONSABILIDADE
CORRUPÇÃO
CULPA
DOLO
CUSTAS JUDICIAIS
NEGLIGÊNCIA
CARGO POLÍTICO
CARGO PÚBLICO
ÓRGÃO AUTÁRQUICO
PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL
ASSEMBLEIA MUNICIPAL
ASSEMBLEIA DE FREGUESIA
JUNTA DE FREGUESIA
Conclusões: 
1. O apoio a conceder aos eleitos locais pelas respectivas autarquias, nos termos dos artigos 5.º, n.º 1, alínea o) e 21.º, ambos da Lei n.º 29/87, de 30 de Junho, depende da verificação cumulativa de dois pressupostos: por um lado, que o acto que deu origem ao processo judicial e às inerentes despesas tenha sido praticado pelo eleito local no exercício das suas funções e por causa delas, e, por outro, que não se prove que esse acto foi praticado com dolo ou negligência;

2. O apoio referido na conclusão anterior abrange as despesas relativas aos processos criminais em que os eleitos locais sejam arguidos;

3. Só após a decisão final poderá apurar-se se estão preenchidos os pressupostos de que depende a concessão do apoio, pelo que só então deverá ser proferida a respectiva decisão.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Procurador-Geral da República,
Excelência:


I

O Presidente da C.P.S./P.S.D. de Felgueiras informou Vossa Excelência de que a Câmara Municipal daquela cidade estaria a pagar quantias muito avultadas à respectiva Presidente e a outros arguidos nos denominados processos do «saco azul» e do «Futebol Clube de Felgueiras», para estes fazerem face às despesas resultantes daqueles processos, nomeadamente com os seus advogados, e solicitou que fosse mandado averiguar essa matéria[1].

Vossa Excelência determinou a remessa do expediente à Directora do Departamento de Investigação e Acção Penal (D.I.A.P.) do Porto, a qual, invocando que os alegados factos teriam ocorrido em Felgueiras, remeteu o expediente ao Procurador-Geral Distrital do Porto, com o seu prévio acordo.

O Procurador-Geral Distrital deu conhecimento deste facto a Vossa Excelência[2] e, depois de invocar o artigo 21.º da Lei n.º 29/87, de 30 de Junho (que aprovou o Estatuto dos Eleitos Locais), referiu que a sua interpretação levantava inúmeras dúvidas que deviam ser clarificadas, sugerindo que a questão fosse submetida à análise deste Conselho Consultivo, designadamente para se esclarecer se aquele artigo «abrange a hipótese posta à Procuradoria-Geral da República, ou seja, em síntese»: uma vez que «constituem encargos a suportar pelas autarquias respectivas as despesas provenientes de processos judiciais em que os eleitos locais sejam parte, desde que tais processos tenham tido como causa o exercício das respectivas funções e não se prove o dolo dos eleitos…» «também devem ser incluídas as despesas relativas a processos criminais em que os autarcas sejam arguidos?».

Anuindo a esta sugestão dignou-se Vossa Excelência solicitar a este Conselho Consultivo a emissão de parecer «com carácter de urgência».

Cumpre, pois, emiti-lo.

II
1. Consta do expediente enviado a esta Procuradoria-Geral, em síntese, o seguinte:

- Cópia das partes do despacho de pronúncia que foram julgadas úteis para a elaboração deste parecer;
- Cópias de ordens de pagamento emitidos pelo Município de Felgueiras a favor de várias pessoas;
- Fotocópias de recibos referentes a pagamentos feitos a título de honorários;
- Cópia da acta da reunião da Câmara Municipal de Felgueiras, de 21 de Novembro de 2007, da qual consta que foram feitos vários pagamentos a advogados, a título de honorários, «no âmbito dos processos em curso “Saco Azul, Futebol e Outros”»;
- Pedidos feitos por advogados e dirigidos à Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras, solicitando o envio de várias quantias para “provisão para despesas de honorários”, relativas a processos em que ela é arguida;
- «Pareceres jurídicos» (várias vezes repetidos) no sentido de que o Município de Felgueiras podia proceder ao pagamento de honorários mesmo antes de os processos judiciais estarem findos, subscritos por um jurista da câmara municipal e por outro advogado;
- Cartas da Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras dirigidas à própria autarquia, solicitando o pagamento de várias quantias relativas ao reembolso de despesas que teria efectuado em processos judiciais.

2. Resulta ainda do expediente recebido o seguinte:

- Que a Presidente da Câmara Municipal de Felgueiras foi pronunciada pela prática dos seguintes crimes:
cinco crimes de participação económica em negócio, previstos e punidos pelo artigo 23.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho;
seis crimes de corrupção passiva para acto ilícito, previstos e punidos pelo artigo 16.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho;
quatro crimes de abuso de poder, previstos e punidos pelo artigo 26.º, nºs. 1 e 2, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho;
três crimes de prevaricação previstos e punidos pelo artigo 11.º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho;
dois crimes de peculato, previstos e punidos pelo artigo 20.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho;
um crime de peculato, sob a forma continuada, previsto e punido pelas disposições combinadas dos artigos 30.º, n.º 2. do Código Penal e 20.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho;
dois crimes de peculato de uso, sob a forma continuada, previstos e punidos pelas disposições conjugadas dos artigos 30.º, n.º 2, do Código Penal e 21.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho;
- Que outros sete arguidos foram pronunciados pelos seguintes crimes (cada um deles, e respectivamente):
dois crimes de participação económica em negócio, previstos e punidos pelo artigo 23.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho e artigo 28.º do Código Penal;
cinco crimes de participação económica em negócio, previstos e punidos pelos artigos 23.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, e 28.º do Código Penal;
cinco crimes de participação económica em negócio, previstos e punidos pelo artigo 23.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho e artigo 28.º do Código Penal;
três crimes de participação económica em negócio, sob a forma de cumplicidade, previstos e punidos pelas disposições combinadas dos artigos 23.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, e artigos 27.º e 28.º, ambos do Código Penal;
um crime de participação económica em negócio, sob a forma de cumplicidade, previsto e punido pelas disposições combinadas dos artigos 23.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho e artigos 27.º e 28.º ambos do Código Penal;
um crime de abuso de poderes previsto e punido pelo artigo 26.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho;
um crime de corrupção passiva para acto ilícito previsto e punido pelo artigo 16.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, e 28.º do Código Penal.
- Que outros seis arguidos foram pronunciados pelo crime de corrupção activa, previsto e punido pelo artigo 374.º, n.º 1, do Código Penal.
- Que mais um arguido foi pronunciado pela prática dos seguintes crimes: dois crimes de participação económica em negócio, sob a forma de cumplicidade, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 23.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, e artigos 27.º e 28.º ambos do Código Penal e ainda dois crimes de corrupção passiva para acto ilícito previsto e punido pelo artigo 16.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, e 27.º e 28.º ambos do Código Penal.
- Que outro arguido foi pronunciado pelos seguintes crimes:
dois crimes de participação económica em negócio, sob a forma de cumplicidade, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 23.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, e artigos 27.º e 28.º ambos do Código Penal;
um crime de corrupção passiva para acto ilícito previsto e punido pelo artigo 16.º, n.º 1, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, e 27.º e 28.º ambos do Código Penal.

3. Segundo consta dos elementos fornecidos, o Município de Felgueiras estaria a suportar elevados encargos com o pagamento de avultadas quantias à respectiva Presidente da Câmara e «a outros arguidos», para custearem os honorários dos seus advogados, relativamente a diversos processos judiciais contra eles instaurados.

Tendo em consideração a forma como a questão foi suscitada pelo Procurador-Geral Distrital estaria em causa saber se os arguidos nos denominados processos do «saco azul» e do «Futebol Clube de Felgueiras» poderiam beneficiar do apoio jurídico a que alude o artigo 21.º da Lei n.º 29/87, de 30 de Junho[3], que a seguir se transcreve, mais concretamente se esta norma é aplicável «às despesas relativas a processos criminais em que os autarcas sejam arguidos».

«Artigo 21.º
Apoio em processos judiciais
Constituem encargos a suportar pelas autarquias respectivas as despesas provenientes de processos judiciais em que os eleitos locais sejam parte, desde que tais processos tenham tido como causa o exercício das respectivas funções e não se prove dolo ou negligência por parte dos eleitos».

Sucede que as dúvidas relativas ao pagamento dos honorários podem pôr-se também quanto ao pagamento dos restantes encargos, e tanto no domínio do direito processual civil como no âmbito do direito processual penal. Por isso, este parecer não se limitará ao caso concreto da consulta, nem será sequer analisado em pormenor, pois os dados disponíveis não o permitiriam. As várias questões serão apreciadas, tanto quanto possível, em termos genéricos, embora sem se perder de vista o caso que deu origem ao parecer, até porque, como é sabido, este não vincula os tribunais.

As grandes questões a apreciar consistem em saber quando e em que condições os «eleitos locais» podem beneficiar do apoio a que aludem os artigos 5.º, n.º 1, alínea o), e 21.º, ambos da Lei n.º 29/87[4], pelo que se afigura útil equacionar previamente os casos em que eles podem ser demandados (ou seja, em que termos podem ser responsabilizados civil e/ou criminalmente), pois é aqui que surgirão aquelas dúvidas.

Por isso, far-se-á uma análise sumária à Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro[5], relativa à responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas, por danos resultantes das funções politico-legislativa, jurisdicional e administrativa. Antes, porém, será abordado o regime legal da responsabilidade civil extracontratual que vigorou até à entrada em vigor daquela lei, resultante do Decreto-Lei n.º 48051, de 21 de Novembro de 1967, e dos artigos 96.º e 97.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, e ainda os artigos 22.º, 271.º e 117.º, todos da Constituição da República Portuguesa, também eles referentes à responsabilidade civil do Estado e demais entidades públicas e dos seus funcionários e agentes, e ainda dos titulares de cargos políticos, respectivamente.

Faremos depois uma referência aos chamados crimes de responsabilidade praticados pelos titulares de cargos políticos no exercício de funções e ao do poder local, sobretudo no que concerne aos órgãos representativos dos municípios e das freguesias.

Finalmente será apreciada a questão essencial, ou seja, em que condições podem os eleitos locais beneficiar do apoio jurídico a conceder pelas autarquias nos termos do citado artigo 21.º e, mais especificamente, se, na sua previsão, se incluem «as despesas relativas a processos criminais em que os autarcas sejam arguidos».

III
1. No Código Civil de 1966 não existe qualquer norma relativa à responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas por actos de gestão pública, ao contrário do que sucede quanto aos actos praticados no âmbito da gestão privada (artigos 500.º e 501.º).

Como resulta dos trabalhos preparatórios, era intenção do legislador regular toda a matéria da responsabilidade civil extracontratual da Administração Pública naquele Código, mas fê-lo apenas em relação aos danos causados no domínio dos actos de gestão privada.

Entretanto, para preencher essa lacuna, foi publicado o Decreto-Lei n.º 48.051, de 21 de Novembro de 1967, que veio a fixar o quadro legal da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas por actos de gestão pública (ficando embora excluídos da sua previsão os casos a que fosse aplicável regime diferente constante de leis especiais, ou seja, salvaguardando-se as situações nelas previstas).

Com efeito, estabelecia o seu artigo 1.º: «a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas públicas no domínio dos actos de gestão pública rege-se pelo disposto no presente diploma, em tudo o que não esteja previsto em leis especiais». Consagrava-se assim o princípio de que a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas no domínio dos actos de gestão pública passaria a reger-se por aquele diploma legal. E o seu artigo 3.º contemplava a responsabilidade civil extracontratual dos «titulares do órgão e dos agentes administrativos do Estado e demais pessoas colectivas públicas» perante terceiros pela prática de actos ilícitos que ofendessem os direitos destes ou as disposições legais destinadas a proteger os seus interesses (caso tivessem excedido os limites das suas funções ou se, no desempenho destas e por causa destas, tivessem procedido dolosamente).

Relativamente às autarquias locais regiam os artigos 366.º e 367.º do Código Administrativo de 1936, posteriormente alterados pelo Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março, passando os seus artigos 90.º e 91.º a regular a responsabilidade civil extracontratual das autarquias locais por actos de gestão pública: o artigo 90.º a «responsabilidade funcional» e o artigo 91.º a «responsabilidade pessoal».

Este último diploma veio, contudo, a ser revogado pelo artigo 100.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, a qual «estabelece o quadro de competências, assim como o regime jurídico de financiamento dos municípios e das freguesias». Mas, nos seus artigos 96.º e 97.º, foi reproduzido, ipsis verbis, o que constava dos artigos 90.º e 91.º do Decreto-Lei n.º 100/84, respectivamente, pelo que, não obstante a revogação deste, o regime da responsabilidade civil das autarquias locais e dos titulares dos seus órgãos e agentes manteve-se inalterado.

Coexistiam, assim, no nosso ordenamento jurídico, dois regimes distintos quanto à responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas até à entrada em vigor da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro[6].
a) O regime de responsabilidade civil por actos de gestão privada[7], regido pelo direito privado, nos termos das disposições combinadas dos artigos 500.º e 501.º do Código Civil.
b) O regime de responsabilidade civil por actos de gestão pública nos termos do Decreto-Lei n.º 48.051, de 21 de Novembro de 1967, e dos artigos 96.º e 97.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, estes quanto à responsabilidade civil extracontratual das autarquias locais.

Assim, comenta VAZ SERRA, «em matéria de responsabilidade civil do Estado em consequência de danos causados por agentes deste, há que distinguir consoante o dano seja causado “no exercício de actividades de gestão privada” ou “no exercício de actividades de gestão pública”: no primeiro destes casos, o Estado responde “nos termos em que os comitentes respondem pelos danos causados pelos seus comissários” (Cod. Civil, art. 501.º); no segundo, a responsabilidade do Estado é regulada no Decreto-Lei n.º 48.501, de 21-11-1967, respondendo ele perante terceiros pelas ofensas dos direitos destes ou das disposições legais destinadas a proteger os seus interesses (cfr. Cód. Civil, art. 483.º), resultantes de actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos ou agentes administrativos no exercício da suas funções e por causa desse exercício (art. 2.º, n.º 1), tendo, quando satisfazer a indemnização, direito de regresso contra os titulares do órgão ou os agentes culpados, se estes tiverem procedido com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se achavam obrigados em razão do cargo (art. 2.º, n.º 2) e os titulares do órgão e os agentes respondem civilmente perante terceiros pelos actos ilícitos que ofendam os direitos destes ou as disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, se tiverem excedido os limites das suas funções ou se, no desempenho destas, tiverem procedido dolosamente (art. 3.º, n.º 1) sendo, em caso de procedimento doloso, responsável solidariamente a pessoa colectiva (art. 3.º, n.º 2)»[8].

Com efeito, a doutrina e a jurisprudência têm entendido que gestão privada é a actividade que a Administração Pública desenvolve sob a égide do direito privado e gestão pública é a que é desenvolvida sob a égide do direito público. Nos actos de gestão privada, a pessoa colectiva actua despida do poder público, numa posição de paridade com os particulares, na mesma situação em que poderia actuar um deles, sujeita ao regime do direito privado.

O Tribunal de Conflitos tem considerado que são actos de gestão pública «os praticados pelos órgãos ou agentes da Administração no exercício de um poder público, isto é, no exercício de uma função pública, sob o domínio de normas de direito público, ainda que não envolvam ou representem o exercício de meios de coerção» e que são actos de gestão privada «os praticados pelos órgãos ou agentes da Administração em que esta aparece despida de poder, e, portanto, numa posição de paridade com o particular ou os particulares a que os actos respeitam, nas mesmas condições e no mesmo regime em que poderia proceder um particular, com inteira subordinação às normas de direito privado»[9].

2. Relativamente à responsabilidade civil extracontratual por actos de gestão privada estabelece o artigo 501.º do Código Civil: «[o] Estado e demais pessoas colectivas públicas, quando haja danos causados a terceiro pelos seus órgãos, agentes ou representantes no exercício de actividades de gestão privada, respondem civilmente por esses danos nos termos em que os comitentes respondem pelos danos causados pelos seus comissários».

A responsabilidade civil extracontratual da Administração por actos de gestão privada está, pois, prevista nesta norma. E remete-se para o artigo 500.º do mesmo código, que trata da responsabilidade do comitente, mas apenas em relação às actividades do Estado e demais pessoas colectivas públicas por actos de gestão privada[10]. É que, no domínio desta, como se disse, o Estado e demais entidades públicas actuam como se de simples particulares se tratasse. «Ser aplicável aos factos praticados por certos órgãos, agentes ou representantes o regime que vigora para os actos do comissário, em matéria de responsabilidade civil, significa, além do mais, que as pessoas colectivas públicas só respondem, independentemente de culpa, quando sobre os autores do facto recaia a obrigação de indemnizar e quando o facto haja sido praticado no exercício da função»[11].

Portanto, o Estado e as outras pessoas colectivas públicas respondem, independentemente de culpa[12] (no exercício de actividades de gestão privada), pelos danos causados a terceiros pelos titulares dos seus órgãos, agentes ou representantes, no exercício das suas funções e por causa desse exercício (sempre no exercício da função que lhes foi confiada) mas gozam do direito de regresso contra os autores dos factos danosos, para reembolso de tudo o que tiverem pago, nos termos do artigo 500.º, n.º 3.

É aplicável ao Estado e demais pessoas colectivas públicas, em que se incluem as autarquias locais, quanto aos danos causados pelos seus órgãos, agentes[13] ou representantes, no exercício de actividades de gestão privada, o regime fixado para o comitente, pelo que:
a) respondem perante o terceiro lesado, independentemente de culpa, desde que sobre o autor do facto recaia a obrigação de indemnizar e quando o facto haja sido praticado no exercício da sua função;
b) gozam seguidamente do direito de regresso contra os autores dos danos, a fim de exigirem o reembolso do que tiverem pago, excepto se também houver culpa da sua parte[14].

Os titulares dos órgãos representativos das autarquias poderão, pois, responder civilmente por actos ilícitos praticados no âmbito da gestão privada. Pela prática destes actos, o eleito local responde nos termos gerais de direito (segundo as normas de direito privado).

3. A distinção entre actos de gestão pública e actos de gestão privada tinha grande interesse sobretudo por razões de ordem processual: saber qual o tribunal competente, em razão da matéria, para o julgamento das acções de responsabilidade civil extracontratual interpostas contra o Estado e demais entes públicos e titulares dos seus órgãos e agentes.

Nos termos da alínea h) do artigo 51.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de Abril, competia aos tribunais administrativos de círculo conhecer «das acções sobre responsabilidade civil do Estado e demais entes públicos e dos titulares dos seus órgãos e agentes por prejuízos decorrentes de actos de gestão pública, incluindo acções de regresso». Mas se tais danos fossem decorrentes de actos de gestão privada seriam competentes os tribunais judiciais, uma vez que estaríamos no domínio das relações jurídico-privadas e, portanto, excluídas da jurisdição administrativa, por força da alínea f) do n.º 1 do artigo 4.º do ETAF.

Com o novo ETAF, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro[15], esta situação foi alterada.

Sobre o âmbito da jurisdição dos tribunais administrativos estabelece agora o n.º 1, alíneas g), h) e i) do seu artigo 4.º, que compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham nomeadamente por objecto:
«g) Questões em que, nos termos da lei, haja lugar a responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público, incluindo a resultante do exercício da função jurisdicional e da função legislativa;
h) Responsabilidade civil extracontratual dos titulares de órgãos, funcionários, agentes e demais servidores públicos;
i) Responsabilidade civil extracontratual dos sujeitos privados aos quais seja aplicável o regime específico da responsabilidade do Estado e demais pessoas colectivas de direito público».

Dá-se, assim, um alargamento da jurisdição administrativa, passando os tribunais administrativos a ser os competentes para conhecer de todas as questões de responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público e dos titulares dos seus órgãos e agentes, independentemente de as mesmas serem regidas por normas de direito público ou por normas de direito privado (quer respeitem a actos de gestão pública, quer respeitem a actos de gestão privada).

No entanto, esta distinção continuará a ser feita, nos termos referidos, relativamente às questões de direito substantivo, pois, como veremos, a Lei n.º 67/2007 apenas se aplica aos actos de gestão pública.

4. Quanto à responsabilidade civil extracontratual por actos de gestão pública resultavam do Decreto-Lei n.º 48.051 três regimes distintos:
a) Responsabilidade por factos ilícitos (artigos 2.º e 3.º);
b) Responsabilidade pelo risco (artigo 8.º);
c) Responsabilidade por factos lícitos (artigo 9.º).

Da conjugação daqueles artigos 2.º e 3.º resultava ser o seguinte o regime da responsabilidade civil extracontratual da Administração por factos ilícitos culposos:

- Se o facto danoso fosse praticado pelo titular do órgão ou agente administrativo fora do exercício das suas funções, ou durante o seu exercício, mas não por causa dele, a responsabilidade seria exclusivamente do autor desse facto (artigo 3.º, n.º 1).
- Se o facto fosse praticado pelo titular do órgão ou agente administrativo no exercício das suas funções e por causa desse exercício, havia que distinguir três situações:
a) se aqueles tivessem actuado com dolo haveria responsabilidade solidária da Administração e do autor do facto, podendo o lesado exigir a indemnização da Administração ou do titular do órgão ou agente, ou de ambos (mas aquela sempre teria direito de regresso contra estes);
b) se o facto tivesse sido praticado com culpa grave, ou seja, se aqueles tivessem procedido com diligência e zelo manifestamente inferiores aos que estavam obrigados em razão do cargo (negligência grosseira), haveria responsabilidade exclusiva da Administração perante terceiros, mas esta teria direito de regresso contra o autor do facto danoso (artigo 2.º, n.ºs 1 e 2);
c) se o facto tivesse sido praticado com culpa leve, isto é, com diligência não manifestamente inferior à que era devida em razão do cargo, só a Administração seria responsável, não tendo sequer direito de regresso (artigo 2.º, n.º 1) [16].;

Verifica-se, assim, que, no âmbito da gestão pública, os titulares dos órgãos, funcionários e agentes das referidas pessoas colectivas públicas só respondiam perante terceiros[17] em dois casos:

- se o facto tivesse sido praticado fora do exercício de funções, ou, se praticado no exercício destas, tivessem excedido os seus limites;
- quando, tendo o acto sido praticado no exercício de funções e por causa delas, tivessem procedido dolosamente (mas, neste caso, a pessoa colectiva era sempre responsável solidariamente).

E considera-se que os titulares dos órgãos, funcionários ou agentes «excedem os limites das suas funções» quando, embora os actos sejam praticados no exercício destas e por causa desse exercício, envolvam abuso de autoridade ou excesso de poder ou tenham apenas por finalidade a satisfação dum interesse pessoal. Por isso se justifica que, nestas circunstâncias os entes públicos não respondam pelos actos por eles praticados.

Acentua-se, contudo, que o regime do Decreto-Lei n.º 48051 era aplicável apenas à responsabilidade civil derivada de actos de gestão pública, ficando ainda afastados do seu âmbito de aplicação os actos praticados pelos titulares de órgãos, funcionários e agentes fora do exercício das suas funções. Regime semelhante resultava dos artigos 96.º e 97.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, e já antes dos artigos 90.º e 91.º do Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março, para os titulares dos órgãos e agentes das autarquias locais. Aliás, a disciplina do Decreto-Lei n.º 48051 até seria directamente aplicável às autarquias locais, uma vez que estas são também pessoas colectivas de direito público.

Pelos actos praticados fora do exercício de funções ou no seu exercício, mas não por causa dele, aqueles respondem pessoalmente, nos temos gerais.

IV

Vejamos agora o regime resultante da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, em consonância com a Constituição da República Portuguesa de 1976 (CRP):

1. Determina o artigo 22.º da CRP [18]:
«Artigo 22.º
Responsabilidade das entidades públicas
«O Estado e as demais entidades púbicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem».

Consagra-se aqui um princípio geral de responsabilidade civil do Estado e das demais entidades públicas por factos ilícitos praticados pelos titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes no exercício das suas funções e por causa desse exercício. Com efeito, nos termos deste artigo, o Estado e demais entidades públicas são responsáveis directamente (responsabilidade solidária) pelos actos e omissões dos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes que, ilicitamente, violem direitos liberdades e garantias no exercício das suas funções e por causa desse exercício.

«O sentido geral desta norma constitucional é, sem dúvida, consagrar o princípio da responsabilidade dos poderes públicos (Estado e demais entidades públicas) pelos prejuízos causados por acções ou omissões dos titulares dos seus órgãos, lesivas de direitos e interesses dos particulares.
(…)
«Diferentemente do que acontecia noutros textos constitucionais portugueses, o que está em causa é estabelecer uma responsabilidade do Estado e não apenas uma responsabilidade dos funcionários ou agentes do Estado»[19].

Discutia-se se o regime do Decreto-Lei n.º 48.051, de 21 de Novembro de 1967, devia considerar-se parcialmente caducado, por inconstitucionalidade superveniente. Mas esta questão ficou ultrapassada com a publicação da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, a que nos referiremos mais tarde. A verdade é que ela tinha sido suscitada no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 236/2004, de 13 de Abril de 2004[20]. E foi decidido «[n]ão julgar supervenientemente inconstitucionais as normas dos artigos 2.º e 3.º, n.ºs. 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 48051, enquanto eximem de responsabilidade, no plano das relações externas, os titulares de órgãos, funcionários e agentes e demais entidades públicas por danos causados pela prática de actos ilícitos e culposos (culpa leve ou grave) no exercício das suas funções e por causa delas». No mesmo sentido, e resolvendo oposição de acórdãos, decidiu o Pleno da 1ª secção do Supremo Tribunal Administrativo (STA), por acórdão de 28 de Setembro de 2006, proferido no processo n.º 0855/04[21]. Mas não era este o entendimento dominante na doutrina, havendo também divergências na jurisprudência, mencionando estes acórdãos abundante doutrina em defesa de ambas as posições.

2. Por sua vez, o artigo 271.º da CRP consagra o princípio da responsabilização (civil, criminal e disciplinar) dos funcionários e agentes da Administração Pública por acções ou omissões resultantes do exercício da função administrativa. Com efeito, estabelece o n.º 1, sob a epígrafe «responsabilidade dos funcionários e agentes»: «os funcionários e agentes do Estado e das demais entidades públicas são responsáveis civil, criminal e disciplinarmente pelas acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício de que resulte violação dos direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos».

Procura-se, por um lado, conceder aos cidadãos o direito a serem indemnizados quando se sintam lesados nos seus direitos ou interesses legalmente protegidos e, por outro, responsabilizar os funcionários e agentes do Estado e demais entidades públicas pelas acções e omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício.

O artigo 271.º define a responsabilidade dos funcionários e agentes do Estado e demais entidades públicas (e não a responsabilidade da respectiva pessoa colectiva) por acções e omissões praticadas no exercício das suas funções e por acusa desse exercício, mas, ao contrário do artigo 22.º, que abarca a responsabilidade administrativa, jurisdicional e político-
-legislativa, ocupa-se apenas da responsabilidade pelo exercício da função administrativa e prevê não só a responsabilidade civil, mas também a responsabilidade criminal e disciplinar dos funcionários e agentes das pessoas colectivas de direito público.

3. Acerca da responsabilidade civil extracontratual dos titulares dos órgãos e agentes da Administração por actos de gestão pública já escrevia MARCELO CAETANO que devia fazer-se uma distinção entre actos funcionais e acto pessoais.

«São actos funcionais todos aqueles que, embora ilícitos, sejam praticados durante o exercício das funções do seu autor e por causa desse exercício; pelos danos que produzirem é responsável a pessoa colectiva de direito público a que pertença o órgão ou agente.
São actos pessoais todos os outros isto é, os que forem praticados fora do exercício das funções do seu autor ou que, mesmo praticados durante tal exercício e por ocasião dele, não forem todavia praticados por causa desse exercício; pelos danos que produzirem é responsável, única e exclusivamente, a pessoa do seu autor»[22].

E, depois de se interrogar em que casos se podia dizer, de uma maneira geral, que um órgão ou um agente se comporta, na prática de um facto ilícito, dentro dos limites das suas funções, ou, pelo contrário, excedendo esses limites, afirma que, após a publicação do Decreto-Lei n.º 48051, de 21 de Novembro de 1967, a distinção entre o funcional e o pessoal, para efeito de responsabilizar a pessoa colectiva de direito público ou o autor do facto ilícito, tinha de continuar a fazer-se, mas que, no entanto, tinha de ser transportada do plano da culpabilidade, em que antes se situava[23], para o plano da ilicitude, em que agora se devia colocar. «Já não interessa averiguar se houve culpa funcional ou culpa pessoal, mas antes se o facto ilícito é um acto funcional ou pessoal, ou seja, se o facto ilícito foi ou não praticado no exercício das funções do seu autor e por causa desse exercício. Não importa, pois, para este efeito, apurar se houve falta do serviço e zelo do titular do órgão ou agente ou se, pelo contrário, houve funcionamento normal do serviço mas desprezo do titular do órgão ou agente pelos deveres do seu cargo. O que importa é delimitar objectivamente as funções do autor do facto ilícito e verificar se ele o praticou no exercício de tais funções e por causa desse exercício»[24].

Para que um acto possa ser considerado «funcional» é, pois, necessário que seja praticado pelo titular de um órgão ou agente de uma pessoa colectiva de direito público, no exercício das suas funções e por causa delas, sendo necessário apurar se o autor do facto ilícito actuou ou não no exercício das suas funções e por causa desse exercício, ou seja, se o facto praticado representou o legítimo exercício da competência do seu autor para fins de interesse público ou, pelo contrário, um abuso de autoridade, exorbitando das suas funções.

V

1. É então publicada a Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, em resultado da proposta de lei n.º 56/X[25], que alterou algumas das disposições normativas em que assentava o regime jurídico da responsabilidade civil resultante do Decreto-Lei n.º 48051 e dos artigos 96.º e 97.º da Lei n.º 169/99, já referidos, e regulou globalmente, pela primeira vez na nossa ordem jurídica, a matéria da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas, por danos resultantes das funções politico-legislativa, jurisdicional e administrativa.

Procurou-se adaptar o regime da responsabilidade civil às exigências ditadas pela Constituição, aperfeiçoando-se o regime da responsabilidade pelo exercício da função administrativa, mediante a extensão da responsabilidade solidária às acções e omissões praticadas com culpa grave, estabelecendo-se um regime geral da responsabilidade pelo exercício da função jurisdicional e introduzindo-se um regime inovador em matéria de responsabilidade pelo exercício da função político-legislativa.

Pode ler-se, com efeito, na exposição de motivos: «[o] novo diploma procura, entretanto, dar, finalmente, resposta à necessidade, de há muito sentida, de adaptar o regime legal da responsabilidade civil extracontratual das entidades públicas às exigências ditadas pela Constituição da República. Neste sentido aperfeiçoa-se o regime da responsabilidade pelo exercício da função administrativa, estendendo o campo de aplicação do regime da responsabilidade solidária ao domínio das condutas praticadas com culpa grave; estabelece-se, pela primeira vez em Portugal, um regime geral de responsabilidade pelo exercício da função jurisdicional; e introduz-
-se um regime inovador em matéria de responsabilidade pelo exercício das funções política e legislativa»[26].

No entanto, o âmbito de aplicação da Lei n.º 67/2007 ficou limitado ao regime de direito público da responsabilidade civil extracontratual do Estado e das demais entidades públicas, o que significa que a responsabilidade por factos ilícitos culposos praticados no exercício da gestão privada continua a reger-se pelas normas de direito privado, à semelhança do que se verificava na vigência dos Decretos-Leis n.ºs 48051 e 100/84 e da Lei n.º 169/99.

Como consta ainda da exposição de motivos, «no que se refere à responsabilidade civil da Administração, as principais alterações propostas consistem no (…) alargamento da regra da solidariedade, em conformidade com a Constituição, ao domínio das condutas praticadas com culpa grave; a consagração legal da responsabilidade objectiva da Administração pelo funcionamento anormal dos seus serviços; e a introdução de um regime de presunção de culpa, nos casos em que os danos são causados por actos jurídicos, o que compreende actos administrativos e actos de conteúdo normativo»[27].

Contudo, não se procurou uma ruptura com o regime do (então vigente) Decreto-Lei n.º 48051. Pelo contrário, partiu-se dos princípios nele consagrados e dos ensinamentos colhidos da experiência da sua aplicação pelos tribunais, fazendo-se aperfeiçoamentos no regime da responsabilidade pelo exercício da função administrativa, alterando-se algumas das suas normas, e introduzindo-se inovações significativas, sobretudo no domínio das funções jurisdicional e legislativa.

2. A Lei n.º 67/2007 aprovou o «Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas», que foi publicado em anexo, dela fazendo parte integrante (artigo 1.º).

Nos termos do n.º 1 do artigo 2.º ficam salvaguardados os regimes especiais de responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício da função administrativa. E o n.º 2 esclarece que esta mesma lei «prevalece sobre qualquer remissão legal para o regime de responsabilidade civil extracontratual de direito privado aplicável a pessoas colectivas de direito público».

À responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas dedica aquela lei cinco capítulos.

O Capítulo I contém as «disposições gerais».
O Capítulo II regula a «responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício da função administrativa» e divide-se em duas secções; a secção I ocupa-se da «responsabilidade por facto ilícito» e a secção II da «responsabilidade pelo risco».
O Capítulo III trata da «responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício da função jurisdicional» e o IV da «responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício da função político-legislativa».
O capítulo V ocupa-se da «indemnização pelo sacrifício».

Uma vez que apenas estará em causa a responsabilidade civil extracontratual dos eleitos locais, só nos interessa considerar os capítulos I e II (e quanto a este somente a I secção), ou seja, a responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício da actividade administrativa (e por factos ilícitos culposos). Na verdade, não se justificam referências aos actos praticados no exercício da função jurisdicional e da função legislativa. Também não se justifica que nos ocupemos da responsabilidade da Administração pelo risco (art.º 11.º) e pelo sacrifício (art.º 16.º), pois, nestes casos, apenas responde a entidade pública.

Importa considerar agora sobretudo a responsabilidade civil extracontratual por actos de gestão pública dos titulares dos órgãos, funcionários e agentes do Estado e demais pessoas colectivas de direito público, praticados no exercício das suas funções e por causa desse exercício e, mais especificamente, dos titulares dos órgãos representativos das autarquias, pois é quanto a estes, no exercício das funções para que foram eleitos, que se coloca a questão de saber quando e como podem beneficiar do aludido apoio jurídico[28]. Não obstante, afigura-se útil fazer algumas considerações sobre a responsabilidade civil extracontratual daqueles entes públicos pelos danos resultantes do exercício da função administrativa, face à consagração legal do regime de solidariedade.

3. Convém relembrar que o regime da responsabilidade civil extracontratual das autarquias locais está agora consagrado apenas na Lei 67/2007, ao contrário do que vinha acontecendo no nosso ordenamento jurídico. O seu artigo 5.º revogou expressamente os artigos 96.º e 97.º da Lei n.º 169/99, pelo que as autarquias e titulares dos seus órgãos e agentes respondem nos mesmos termos que o Estado e demais entes públicos e titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes.

No que diz respeito ao «âmbito de aplicação» do regime instituído pela Lei n.º 67/2007 resulta do seu artigo 1.º o seguinte:

- No regime anterior previa-se a responsabilidade civil extracontratual da Administração (só desta) por actos de gestão pública pelos danos resultantes do exercício da função administrativa, mas agora prevê-se também essa responsabilidade pelos danos decorrentes da função jurisdicional e da função legislativa, em tudo o que não estiver previsto em lei especial (n.º 1).
- Para este efeito, correspondem ao exercício da função administrativa as acções e omissões adoptadas no exercício de prerrogativas de poder público ou reguladas por disposições ou princípios de direito administrativo, mantendo-se o regime anterior no que diz respeito à distinção entre actuações administrativas que dão lugar à responsabilidade regida por disposições de direito público e as que fundamentam a responsabilidade ao abrigo de normas de direito privado, circunscrevendo-se o âmbito deste diploma à definição do regime de direito público da responsabilidade civil extracontratual. Os actos praticados no âmbito da gestão privada continuam a reger-se pelas normas de direito privado (n.º 2).
- Esta mesma lei regula ainda a responsabilidade civil dos titulares de órgãos, funcionários e agentes públicos pelos danos decorrentes das acções ou omissões por eles praticadas no exercício da função administrativa e jurisdicional e por causa desse exercício, salvo disposição em contrário em lei especial. Se as acções e omissões não forem praticadas no exercício de funções ou se, embora praticadas durante esse exercício, não o forem por causa dele, responderão a título pessoal (n.º 3).

4. Como se disse, o Capítulo II trata da responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício da função administrativa. E a secção I ocupa-se da «responsabilidade por facto ilícito». Interessam-nos, pois, as questões relativas à responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas e dos titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes, por danos resultantes de factos ilícitos culposos.

A esta responsabilidade referem-se os artigos 7.º a 10.º, dos quais resulta essencialmente o seguinte regime legal:

- No n.º 1 do artigo 7.º[29] consagra-se a responsabilidade exclusiva do Estado e das demais pessoas colectivas de direito público pelos danos decorrentes de acções ou omissões ilícitas cometidas pelos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, com culpa leve, no exercício da função administrativa e por causa desse exercício[30]. Nestes casos, mantém-se o regime do Decreto-Lei n.º 48.051, em conformidade com o que tem sido defendido pela generalidade da doutrina, isto é, quando esteja em causa o exercício de funções públicas a responsabilidade pessoal dos titulares de órgãos e agentes (bem como o direito de regresso) só deve existir nos casos de dolo ou culpa grave, não devendo ser responsabilizados nos casos de culpa leve.
- A responsabilidade civil dos titulares dos órgãos, funcionários e agentes daqueles entes públicos vem consagrada no n.º 1 do artigo 8.º[31], nos termos do qual estes são pessoalmente responsáveis pelos danos que resultem de acções ou omissões ilícitas, por eles cometidas com dolo ou com culpa grave, isto é, com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se encontravam obrigados em razão do respectivo cargo (negligência grosseira)[32].
- O Estado e as demais pessoas colectivas de direito público respondem solidariamente com os titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes se as referidas acções ou omissões tiverem sido cometidas por estes no exercício das suas funções e por causa desse exercício, com dolo ou com diligência e zelo manifestamente inferiores aos que estavam obrigados em razão do cargo (culpa grave), isto é, nos termos do parágrafo antecedente [33] (artigo 8.º, n.º 2).
- Enquanto que no n.º 1 do artigo 7º se prevê a responsabilidade exclusiva do Estado e demais entidades públicas, no n.º 2 do artigo 8.º encontra-se prevista a responsabilidade solidária entre estes e os titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes, conforme referido no parágrafo anterior.
- Uma das inovações mais significativas introduzidas pela Lei n.º 67/2007 (em conformidade com as aludidas normas constitucionais), em matéria de responsabilidade da Administração por actos ilícitos, foi o alargamento da regra da solidariedade no domínio das acções e omissões cometidas com culpa grave. Com efeito, no regime do Decreto-Lei n.º 48051, nos casos de culpa grave só a Administração respondia perante terceiros, embora gozasse depois do direito de regresso contra os titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes. Nos casos de dolo é que a Administração e estes respondiam solidariamente perante terceiros, mas também aqui gozando aquela do direito de regresso. Agora, quer nos casos de dolo, quer nos casos de culpa grave, respondem solidariamente perante terceiros a Administração e os titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes, desde que estes tenham praticado aqueles actos no exercício das suas funções e por causa desse exercício.
- Sempre que satisfaçam qualquer indemnização nos termos referidos, o Estado e as demais pessoas colectivas de direito público gozam do direito de regresso contra os titulares dos órgãos, funcionários ou agentes responsáveis pelos danos causados, em conformidade com o n.º 3 do artigo 8.º, sendo o exercício desse direito obrigatório, nos termos do artigo 6.º da Lei n.º 67/2007.
- Na vigência do Decreto-Lei n.º 48051, a culpa era apreciada nos termos do n.º 2 do artigo 487.º do Código Civil, ou seja, «na falta doutro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso». A culpa dos titulares de órgãos, funcionários ou agentes passou a ser apreciada «pela diligência e aptidão que seja razoável exigir, em função das circunstâncias de cada caso, de um titular de órgão, funcionário ou agente zeloso e cumpridor». Seguiu-se agora orientação diferente: deve tomar-se em consideração não a diligência do “homem médio” (o cidadão comum), mas a diligência e aptidão que seja razoável exigir, em função das circunstâncias do caso concreto, do titular de um órgão, funcionário ou agente zeloso e cumpridor (artigo 10.º, n.º 1).
- Passou a presumir-se a existência de culpa leve na prática de actos jurídicos ilícitos[34], sem prejuízo da prova de dolo ou culpa grave. Para além dos casos previstos na lei geral, também se presume a existência de culpa leve quando não tiver sido cumprido o dever de vigilância. Mas, em qualquer dos casos, a presunção é ilidível.
- Para que a Administração possa ser civilmente responsável é necessário que o facto ilícito tenha sido praticado pelos titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes «no exercício das suas funções e por causa desse exercício». E eles respondem exclusivamente perante terceiros «se tiverem excedido os limites das suas funções», continuando a ser do maior interesse fazer-se a distinção entre actos funcionais e actos pessoais.
- Na responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos culposos, o acto é sempre ilícito, seja cometido no exercício de funções ou fora delas. Mas, se for praticado no exercício de funções e por causa desse exercício, tem de ser também imputado à pessoa colectiva, em virtude do regime de solidariedade.
- Pelos actos praticados no exercício das funções e por causa delas, os titulares dos órgãos e agentes respondem solidariamente se tiverem agido com dolo ou com diligência e zelo manifestamente inferiores aos que estavam obrigados em razão do cargo.
- No artigo 9.º explicitam-se as acções e omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que devem ser consideradas ilícitas[35]. Adoptou-se um conceito de ilicitude muito amplo (mais amplo, por exemplo, do que consta do artigo 483.º do Código Civil), pois abrange não só acções e omissões que violem disposições ou princípios constitucionais e legais ou regulamentares, mas também as que infrinjam regras de ordem técnica ou deveres objectivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos.

E resulta também que os titulares dos órgãos e os agentes das autarquias locais podem responder civilmente perante terceiros:

- quando pratiquem o acto ilícito fora do exercício das suas funções.
- quando pratiquem o acto ilícito no exercício das suas funções, mas não por causa desse exercício.
- quando pratiquem o facto ilícito no exercício das suas funções e por causa desse exercício, mas tenham agido com dolo ou culpa grave.

VI

1. Estabelece o artigo 117.º da CRP[36]:

«Artigo 117.º
Estatuto dos titulares de cargos políticos
1. Os titulares de cargos políticos respondem política, civil e criminalmente pelas acções e omissões que pratiquem no exercício das suas funções.
2. A lei dispõe sobre os deveres, responsabilidades e incompatibilidades dos titulares de cargos políticos, as consequências do respectivo incumprimento, bem como sobre os respectivos direitos, regalias e imunidades.
3. A lei determina os crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos, bem como as sanções aplicáveis e os respectivos efeitos, que podem incluir a destituição do cargo ou a perda do mandato».

Como resulta da própria epígrafe, este preceito constitucional tem por objecto o «estatuto dos titulares de cargos políticos». Também o artigo 118.º alude aos cargos políticos, determinando que ninguém os pode exercer a título vitalício, sejam eles de âmbito nacional, regional ou local.

Já atrás aludimos à responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas e dos titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes, designadamente quando referimos os artigos 22.º e 271.º da Constituição e a Lei n.º 67/2007. Nesta disposição constitucional está em causa a responsabilidade política, civil e criminal dos titulares de cargos políticos pelas acções e omissões que pratiquem no exercício das suas funções.

Diferente da noção de «cargo político» é a de «cargo público» a que alude o artigo 50.º da Constituição, estabelecendo o seu n.º 1 que «todos os cidadãos têm o direito de acesso, em condições de igualdade e liberdade, aos cargos públicos». E o direito de acesso a estes cargos é também distinto do direito de acesso à função pública consagrado no artigo 47.º, n.º 2, também da CRP: «todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso». Mas, como sublinham JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, há uma grande diferença de extensão entre cargos públicos e cargos políticos. «Cargos políticos correspondem a uma espécie dentro daquele género, caracterizados não tanto pelo exercício da função política ou governativa do Estado (contraposto à função administrativa e à jurisdicional) quanto pelo significado político da designação dos seus titulares»[37]. A noção de “cargo público” é mais ampla do que a de “cargo político”, pelo que nem todos os cargos públicos são cargos políticos, mas todos os cargos políticos são cargos públicos.

Serão, assim, titulares de cargos políticos aqueles a quem são constitucionalmente confiadas funções políticas e que, por isso, têm um estatuto constitucionalmente definido; aqueles que recebem directa ou indirectamente poderes ou competências com fundamento na Constituição. Serão sobretudo os que exercem efectivamente funções políticas. De acordo com este critério, serão titulares desses cargos, por exemplo, o Presidente da República, os membros do Governo e os membros dos órgãos do poder local, embora nem todos os titulares de cargos políticos sejam titulares de órgãos de soberania, o que sucede, designadamente, com os dos órgãos autárquicos.

A lei não define, em termos genéricos, o que sejam “cargos políticos”. Por isso, diversas leis avulsas referem-se aos titulares destes cargos, indicando expressamente os que como tal devem ser considerados para os efeitos de cada uma delas. Mas não encontramos em nenhum diploma legal uma enumeração exaustiva dos cargos que devem ser considerados «políticos».

Assim, a Lei n.º 4/85, de 9 de Abril[38], que regula o estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos, enumera no n.º 2 do artigo 1.º os titulares desses cargos, mas apenas para os seus efeitos.

Já a Lei n.º 4/83, de 2 de Abril[39], relativa ao «controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos», estabelecia no artigo 4.º, n.º 1, alínea i), que eram titulares de cargos políticos para os efeitos da mesma lei, nomeadamente, o «presidente e vogal da câmara municipal». Entretanto, na nova redacção dada àquele artigo pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, são agora considerados “cargos políticos”, para efeitos daquela lei, «o presidente e vereador da câmara municipal».

Também a Lei n.º 64/93, de 26 de Agosto[40], que define o regime de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, determina na alínea f) do n.º 2 do artigo 1.º que são considerados titulares de cargos políticos, para os efeitos dela decorrentes, «o presidente e vereador a tempo inteiro das câmaras municipais».

A Lei n.º 34/87, de 16 de Julho[41], que «determina os crimes de responsabilidade que titulares de cargos políticos cometam no exercício das suas funções…», enumera no seu artigo 3.º os cargos que devem ser considerados políticos para os efeitos da própria lei, onde se incluem, nomeadamente, alguns dos referidos na Lei n.º 52-A/2005 e «o de membro de órgão representativo de autarquia local».

Constata-se, assim, que os titulares de cargos políticos nem sempre são coincidentes nas várias leis que expressamente se lhes referem, o que se compreende, uma vez que são diferentes as suas finalidades.

2. No artigo 117.º (anterior 120.º) enunciam-se os princípios gerais que depois são definidos na lei ordinária. Assim, face ao preceituado no seu n.º 2, cabe à lei ordinária concretizar o estatuto dos titulares de cargos políticos relativamente aos seus deveres, responsabilidades, incompatibilidades, direitos, regalias e imunidades, o que tem sido feito, nomeadamente, pelas Leis n.ºs 4/85, de 9 de Abril, 4/83, de 2 de Abril, 64/93, de 26 de Agosto e 7/93, de 1 de Março.

Sobre a responsabilidade civil dos titulares de cargos políticos escreviam GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA em anotação ao então artigo 120.º: «quanto a esta responsabilidade, o sentido do preceito não é o de pretender criar um regime especial de responsabilidade para os titulares de cargos políticos, mas sim o de afirmar que eles respondem como qualquer cidadão pelos danos praticados nas relações jurídico-privadas e como qualquer titular de um órgão do Estado ou entidade pública pelos danos causados por acções ou omissões produzidas no exercício das suas funções e por causa desse exercício (art. 271º). O Estado e as demais entidades públicas respondem solidariamente perante os cidadãos (art. 22.º), tendo depois direito de regresso contra os titulares de cargos públicos e contra os demais funcionários e agentes responsáveis (art. 271º - 4)»[42].

Assim, os titulares de cargos políticos responderão civilmente (desde que se verifiquem os necessários pressupostos) nos mesmos termos em que o fazem os titulares dos órgãos do Estado e demais entidades públicas pelos danos causados a terceiros por acções ou omissões cometidas no exercício das suas funções e por causa delas. No âmbito da gestão privada respondem como qualquer cidadão, ao abrigo do regime de direito privado.

3. O n.º 3 do artigo 117.º preceitua que a lei determina os crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos, ou seja, a Constituição não define o que sejam crimes de responsabilidade, deixando essa tarefa para a lei infraconstitucional. Tal como antes o n.º 3 do artigo 120.º, aquela norma consagrou uma imposição legiferante dirigida ao legislador ordinário no sentido de este definir os crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos e determinar esses titulares.

Com efeito, a Constituição de 1976 (ao contrário das que a antecederam) não indica os titulares de «cargos políticos» nem define o conceito de «crimes de responsabilidade», embora os preveja expressamente. As anteriores Constituições portuguesas, desde a de 1822, ocuparam-se sempre dos chamados «crimes de responsabilidade», mas a primeira lei de responsabilidade apenas surgiu em 1914 (Lei n.º 266, de 27 de Julho) [43].

VII

1. Como se disse, o artigo 117.º da CRP sujeita os titulares de cargos políticos a responsabilidade política, civil e criminal, pelos actos e omissões que pratiquem no exercício das suas funções. No entanto, a definição dos tipos legais de «crime de responsabilidade» e respectivas sanções foram remetidas para a lei ordinária, não tendo aquela norma constitucional imposto qualquer restrição ou dado qualquer orientação específica sobre quais sejam e o que devam ser os titulares desses crimes. A verdade é que a Constituição impõe, sob pena de inconstitucionalidade por omissão, que a lei ordinária defina e concretize aquele comando constitucional, o que foi feito pela referida Lei n.º 34/87, de 16 de Julho[44] (concretizando o princípio constitucional da responsabilidade criminal dos titulares de cargos políticos).

Todos os crimes imputados à presidente da câmara municipal de Felgueiras são expressamente previstos e punidos por esta lei[45], tal como os imputados aos restantes arguidos, excepto o crime de corrupção activa imputado a outros.

Como consta do seu artigo 1.º, esta lei «determina os crimes de responsabilidade que titulares de cargos políticos cometem no exercício das suas funções, bem como as sanções que lhes são aplicáveis e os respectivos efeitos»[46].

E estabelece o artigo 2.º:

«Artigo 2.º
Definição genérica
Consideram-se praticados por titulares de cargos políticos no exercício das suas funções, além dos como tais previstos na presente lei, os previstos na lei penal geral com referência expressa a esse exercício ou os que mostrem terem sido praticados com flagrante desvio ou abuso da função ou com grave violação dos inerentes deveres».

Estão, assim, previstos nesta lei os chamados «crimes de responsabilidade». E o artigo 2.º indica os que se consideram praticados por titulares de cargos políticos no exercício das suas funções:
- os como tais previstos expressamente na Lei n.º 34/87 (artigos 7.º a 27.º);
- os previstos na lei penal geral com referência expressa ao exercício de funções de titulares de cargos políticos;
- os que mostrem terem sido praticados com flagrante desvio ou abuso da função ou com grave violação dos inerentes deveres.

Aos crime de responsabilidade podem ser apontadas, além doutras, as seguintes características comuns:

- são crimes cometidos por titulares de cargos políticos no exercício das suas funções;
- com eles são infringidos bens ou valores particularmente relevantes da ordem constitucional, cuja promoção e defesa constituem dever funcional dos titulares de cargos políticos, assim se justificando algumas derrogações ao regime geral previsto no Código Penal e no Código de Processo Penal;
- existe uma conexão entre a responsabilidade criminal e a responsabilidade política, transformando-se a censura criminal numa censura política, que pode traduzir-se na perda de mandato. Aliás, na Revisão Constitucional de 1997 foi introduzida a parte final do n.º 3 do artigo 117.º no sentido de que a condenação por crimes de responsabilidade pode ter como consequência «a destituição do cargo ou a perda do mandato»[47] [48].

Os «crimes de responsabilidade» são, pois, os praticados por titulares de cargos políticos no exercício das suas funções, infringindo bens ou valores particularmente relevantes na ordem constitucional, contrapondo-se assim aos «crimes comuns» que possam cometer fora do exercício das suas funções. E naqueles incluem-se, naturalmente, os que se encontram expressamente tipificados na Lei n.º 34/87. Mas consideram-se também praticados por titulares de cargos políticos no exercício das suas funções os crimes previstos na lei penal geral com referência expressa a esse exercício ou os que se mostrem terem sido praticados com flagrante desvio ou abuso de funções ou com violação dos inerentes deveres.

Certos crimes só podem ser cometidos por determinadas pessoas, na medida em que possuem uma determinada qualidade ou sobre elas recai um dever especial. São os chamados crimes específicos, como é o caso dos crimes de responsabilidade. Com efeito, é característica essencial destes apenas poderem ser praticados pelos titulares de cargos políticos no exercício das suas funções.

2. No capítulo I da Lei n.º 34/87 (artigos 1.º a 6.º) referem-se os «crimes de responsabilidade de titulares de cargos políticos em geral», aí se prevendo, nomeadamente, que são crimes de responsabilidade, além dos expressamente previstos no capítulo II («Dos crimes de responsabilidade de titulares de cargo político em especial»), os previstos na lei penal em geral com referência expressa ao exercício de cargos políticos ou ainda os que sejam praticados com flagrante desvio ou abuso da função ou com grave violação dos inerentes deveres[49].

No artigo 3.º enumeram-se os cargos que devem ser considerados “políticos” para efeitos dessa mesma lei, aí se incluindo (com interesse para este parecer) «o de membro de órgão representativo de autarquia local» (alínea i). Assim, em relação às autarquias, são considerados cargos políticos, embora somente para os seus efeitos, os membros dos seus órgãos representativos, ou seja, quanto aos municípios, os membros da assembleia municipal e da câmara municipal e, quanto à freguesia, os membros da assembleia de freguesia e da junta de freguesia.

O artigo 5.º prevê uma agravação especial da pena (em um quarto dos seus limites mínimo e máximo) relativamente aos crimes previstos na lei penal geral que tenham sido cometidos por titular de cargo político no exercício das suas funções e qualificados como crimes de responsabilidade nos termos desta lei. Trata-se de crimes que se encontram previstos na lei penal geral, podendo, por isso, ser cometidos por qualquer pessoa (independentemente da sua qualidade) (aplicando-se, nesse caso, a pena aí prevista) mas que, no entanto, foram qualificados como crimes de responsabilidade pela Lei n.º 34/87 (são crimes comuns mas cuja responsabilidade é agravada quando cometidos por titulares de cargos políticos no exercício das suas funções e qualificados como crimes de responsabilidade). Assim, se forem cometidos por um titular de cargo político no exercício das suas funções, a pena será agravada. Se forem cometidos por um titular de cargo político, mas fora do exercício das suas funções, a pena não será agravada, pois o seu autor não cometeu o crime naquela qualidade. Por outro lado, procedeu-se à tipificação de vários «crimes de responsabilidade de titular de cargo político em especial» (artigos 7.º a 27.º).

Portanto, os crimes de responsabilidade praticados por titulares de cargos políticos no exercício das suas funções são os que, como tais, estão expressamente tipificados na Lei 34/87 (artigos 7.º a 27.º), os previstos na lei penal geral (muito especialmente no Código Penal) com referência expressa a esse exercício e, ainda, os que se mostre terem sido praticados com flagrante desvio ou abuso da função ou com grave violação dos inerentes deveres.

«A sua autonomização e a sua consideração como crimes qualificados explicam-se pelo relevo dos bens jurídicos que afectam (os bens jurídico-constitucionais em sentido estrito) e pelo especial dever de zelo a que se vinculam os titulares de cargos politicos e perante o interesse público e perante o povo, donde tiram a sua legitimidade»[50].

Mas nem todos os crimes praticados pelos titulares de cargos políticos no exercício de funções são considerados crimes de responsabilidade, uma vez que a lei que prevê essa infracção pode não fazer referência expressa ao exercício de funções, ou o crime não mostrar um flagrante desvio ou abuso da função ou grave violação dos inerentes deveres[51]. Nestes casos aplicar-se-á o regime geral penal e processual penal. Pode assim dizer-se que existe uma responsabilidade criminal geral e uma responsabilidade criminal específica.

Relativamente aos chamados «crimes cometidos no exercício de funções» (actualmente os artigos 372.º a 385.º do Código Penal) sublinha JORGE DE FIGUEIREDO DIAS[52] que uma sua nota característica (ou mesmo essencial) «consiste, a par doutras circunstâncias, no facto de todos eles traduzirem sempre um “desvio” no exercício dos poderes conferidos pelo titular do cargo que, desse modo, em vez de usados na prossecução dos fins públicos a que se destinam, são deslocados para a satisfação de puros interesses privados do agente ou de terceiro(s). Quer dizer, mesmo quando visam a tutela de outros bens jurídicos específicos, todos os delitos compreendidos naquele capítulo do Código Penal integram cumulativamente a nota comum de significarem, também, uma utilização indevida das faculdades inerentes ao cargo para fins que, não só se encontram fora das respectivas atribuições legais, mas sobretudo assumem natureza particular ou privada». E esta doutrina é plenamente aplicável aos crimes de responsabilidade cometidos por titulares de cargos políticos.

3. No capítulo V da Lei n.º 34/87 alude-se à «responsabilidade civil emergente de crime de responsabilidade de titular de cargo político».

Nos termos do n.º 1 do artigo 45.º «a indemnização de perdas e danos emergentes de crime de responsabilidade cometido por titular de cargo político no exercício das suas funções rege-se pela lei civil». O seu n.º 2 determina que «[o] Estado responde solidariamente com o titular de cargo político pelas perdas e danos emergentes de crime de responsabilidade cometido no exercício das suas funções». E no n.º 3 consagra-se o direito de regresso do Estado contra os titulares de cargos políticos pelos crimes de responsabilidade cometidos no exercício de funções.

A absolvição pelo tribunal criminal não extingue o dever de indemnizar não conexo com a responsabilidade criminal, nos termos gerais de direito, podendo a correspondente indemnização ser pedida através do tribunal civil (artigo 46.º, n.º 1).

VIII

O título VIII da CRP é dedicado ao poder local.

Estabelece o artigo 235.º:
«Artigo 235.º
Autarquias locais[53]
1. A organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais.
2. As autarquias locais são pessoas colectivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respectivas»[54].

As autarquias locais são, pois, pessoas colectivas públicas de natureza associativa e base territorial, dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução dos interesses próprios dos residentes em circunscrições administrativas do território nacional (comunidades de pessoas residentes nas respectivas circunscrições territoriais), dispondo, para o efeito, de autonomia político-administrativa, juridicamente separadas da organização administrativa estatal[55].

Segundo o artigo 236.º, n.º 1, da CRP, «[n]o continente as autarquias locais são as freguesias, os municípios e as regiões administrativas»[56] [57]. A verdade é que actualmente apenas os municípios e as freguesias são autarquias locais [a outra autarquia prevista (a região) ainda não foi criada].

«A organização das autarquias locais compreende uma assembleia eleita dotada de poderes deliberativos e um órgão executivo colegial perante ela responsável»[58]. Trata-se, pois, de dois órgãos[59] colegiais[60], tendo um poderes deliberativos e outro poderes executivos[61].

O artigo 244.º da CRP e o n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 169/99 estabelecem que «os órgãos representativos da freguesia são a assembleia de freguesia e a junta de freguesia». E o n.º 1 do artigo 245.º da Constituição e o artigo 3.º daquela lei dispõem que a «assembleia de freguesia é o órgão deliberativo da freguesia». Por sua vez, os artigos 246.º da CRP e 23.º, n.º 1, da Lei n.º 169/99, referem que «a junta de freguesia[62] é o órgão executivo colegial da freguesia».

Tal como o Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março, também a actual LAL (Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro) não nos dá uma noção de freguesia. Mas FREITAS DO AMARAL define assim «freguesias»: «são as autarquias locais que, dentro do território municipal, visam a prossecução de interesses próprios da população residente em cada circunscrição paroquial»[63].

Como dissemos, os órgãos representativos da freguesia são:
- A Assembleia de Freguesia, que é o seu órgão deliberativo.
- A Junta de Freguesia, que é o seu órgão executivo colegial.

A competência da assembleia de freguesia, cujos membros são eleitos por sufrágio universal directo e secreto, segundo o sistema de representação proporcional, encontra-se definida no artigo 17.º da Lei n.º 169/99 e a do seu Presidente no artigo 19.º.

A Junta de Freguesia é um órgão executivo (colegial) e é composta por um presidente (eleito nos termos do n.º 1 do artigo 24.º da Lei n.º 169/99) e por um certo número de vogais (artigo 24.º, n.º 2). As competências da junta de freguesia podem ser próprias ou delegadas (artigo 33.º da Lei n.º 169/99). As competências próprias vêm elencadas no artigo 34.º desta lei. E do seu artigo 35.º constam as que podem ser delegadas no seu presidente. As competências próprias do presidente constam do artigo 38.º. Este é o órgão executivo das deliberações da junta de freguesia, pois a ele compete representá-la em juízo e fora dele [artigo 38.º, n.º 1, al. a)].

Como estabelece o artigo 250.º da CRP, «[o]s órgãos representativos do município são a assembleia municipal e a câmara municipal», constando igual disposição do n.º 2 do artigo 2.º da Lei n.º 169/99[64]. Tal como sucede com a freguesia, o município é servido por órgãos colegiais[65]. Mas o órgão não se confunde com o cargo, ou estatuto do seu titular, ou seja, o complexo de situações jurídicas de que a pessoa singular, titular de órgão, passa a ser detentor em virtude dessa titularidade.

«A assembleia municipal é o órgão deliberativo do município e é constituída por membros eleitos directamente em número superior ao dos presidentes de junta de freguesia, que a integram», e «a câmara municipal é o órgão executivo colegial do município» (artigos 251.º e 252.º, respectivamente, da CRP). O órgão deliberativo do município é, pois, a assembleia municipal[66], sendo seu órgão executivo a câmara municipal, tal como o seu presidente, embora a lei não o diga, pelo menos expressamente.

A assembleia da freguesia é constituída por membros eleitos directamente em número superior ao dos presidentes de junta de freguesia, que a integram. As suas competências constam do artigo 53.º da Lei n.º 169/99 e as do seu presidente do artigo 54.º, designadamente a de representar a assembleia municipal.

A câmara municipal é constituída por um presidente e por vereadores, um dos quais designado vice-presidente, e é o órgão executivo colegial do município, eleito pelos cidadãos eleitores residentes na sua área (artigo 56.º da Lei n.º 169/99. E o presidente é o primeiro candidato da lista mais votada ou, no caso da vacatura do cargo, o que se lhe seguir na respectiva lista, de acordo com o disposto no artigo 79.º (artigo 57.º, n.º 1, da mesma lei).

O presidente da câmara municipal, cujas competências vêm elencadas no artigo 68.º da Lei n.º 166/99[67], é coadjuvado pelos vereadores no exercício da sua competência e da própria câmara, podendo incumbí-los de tarefas específicas, podendo delegar ou subdelegar neles o exercício da sua competência própria ou delegada (artigo 69.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 166/99), e representa o município em juízo e fora dele, executando as deliberações da câmara municipal [artigo 68.º, n.º 1, alíneas a) e b)]. É, pois, um verdadeiro órgão do município.

IX

Vistos os termos em que os eleitos locais podem responder civil e criminalmente, é tempo de nos debruçarmos sobre a questão essencial: quando e em que circunstâncias podem eles beneficiar do apoio a que aludem os artigos 5.º, n.º 1, alínea o), e 21.º, ambos da Lei n.º 29/87, de 30 de Junho.

1. Com excepção da presidente da câmara, de um ex-presidente da Assembleia Municipal e de um ex-vereador, não vem esclarecido quais os arguidos que eram ou tinham sido titulares de órgãos representativos de autarquias locais, sendo certo que só esses poderiam cometer os crimes previstos na Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, por serem crimes específicos (crimes de responsabilidade que apenas podem ser cometidos por titulares de cargos políticos), só eles podendo beneficiar do referido apoio jurídico a conceder pelas respectivas autarquias locais.

Trata-se, porém, de uma questão irrelevante, na medida em que não será aqui apreciada a situação jurídica de nenhum deles, uma vez que, como dissemos, as questões que forem surgindo serão apreciadas em termos genéricos, embora sem se perder de vista o caso que deu origem ao parecer.

O artigo 1.º da Lei n.º 29/87 tem a seguinte redacção:

«Artigo 1.º
Âmbito
1. O presente diploma define o Estatuto dos Eleitos Locais.
2. Consideram-se eleitos locais, para efeitos da presente lei, os membros dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios e das freguesias».

Portanto, para os efeitos desta lei, consideram-se eleitos locais «os membros dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios e das freguesias». E, nos termos da alínea o) do n.º 1, do artigo 5.º, «os eleitos locais têm direito a apoio nos processos judiciais que tenham como causa o exercício das respectivas funções».

O artigo 21.º, explicitando o conteúdo desse apoio, estabelece, como vimos, que «[c]onstituem encargos a suportar pelas autarquias respectivas as despesas provenientes de processos judiciais em que os eleitos locais sejam parte, desde que tais processos tenham tido como causa o exercício das respectivas funções e não se prove dolo ou negligência por parte dos eleitos».

Esta lei teve origem no projecto de lei n.º 403/IV, de 26 de Março de 1987 (Estatuto dos Eleitos Locais), o qual foi discutido e aprovado em reunião plenária de 10 de Abril de 1987[68]. Um deputado referiu-se nestes termos à necessidade de implementação do estatuto dos eleitos locais:

«As autarquias locais, entes institucionais descentralizados de carácter territorial, constituem simultaneamente um dos alicerces fundamentais do regime democrático saído do 25 de Abril e uma manifestação secular do poder de auto-organização das populações que precedeu o próprio aparecimento do Estado moderno.
(…)
As autarquias passam a pagar as despesas provenientes de processos judiciais em que os autarcas sejam parte, desde que tais processos tenham tido como causa o exercício das respectivas funções e não se prove dolo ou negligência por parte dos eleitos locais».

Constatava-se então que a aprovação do Estatuto dos Eleitos Locais era uma «necessidade imperiosa».

Os eleitos locais estão sujeitos aos direitos e deveres inerentes aos cargos que ocupam, e só em relação a eles se põe o problema de saber em que circunstâncias podem gozar do aludido apoio. As autarquias têm efectivamente de suportar as despesas provenientes dos processos judiciais em que os eleitos locais sejam parte, mas apenas quando esses processos tenham tido como causa o exercício das funções para que estes foram eleitos e não se prove dolo ou negligência da sua parte.

Assim, o apoio a que se refere a alínea o) do n.º 1 do artigo 5.º da Lei n.º 29/87 abrange as despesas que o eleito local tiver que suportar em virtude da sua intervenção nos processos judiciais em que seja parte (as despesas provenientes desses processos),

2. Às autarquias não cabe suportar as despesas de todos os processos em que os eleitos locais sejam parte. Como resulta da conjugação das citadas disposições legais [artigos 5.º, n.º 1, alínea o) e 21.º, ambos da Lei n.º 29/87], é necessária a verificação cumulativa de dois pressupostos: por um lado, que o acto que deu origem ao processo judicial e às inerentes despesas tenha sido praticado pelo eleito local no exercício das suas funções e por causa delas, e, por outro, que não se prove que esse acto foi praticado com dolo ou negligência. Por isso, é necessário averiguar, em cada caso, se os respectivos processos judiciais tiveram origem em actos ou factos praticados pelos eleitos locais no exercício das suas funções e por causa delas (por causa desse exercício) e, na afirmativa, saber se estes actuaram com dolo ou negligência.

Para este efeito, como vimos, consideram-se eleitos locais apenas «os membros dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios e das freguesias». Assim, o apoio apenas pode ser concedido aos membros dos órgãos da freguesia (assembleia de freguesia e junta de freguesia) e do município (assembleia municipal e câmara municipal)[69]. Além disso, é necessário que os encargos a suportar pelas autarquias resultem de processos judiciais em que os eleitos locais sejam parte.

Os eleitos locais são chamados a desempenhar funções públicas, em prol da comunidade (no interesse público), pelo que bem se compreende que beneficiem do apoio jurídico quando, por causa do exercício dessas funções, sejam parte em qualquer processo judicial[70]. A lei procura assegurar a defesa dos seus direitos, dispensando-os de suportarem os inerentes encargos, mas apenas nos processos judiciais directamente relacionados com os cargos que ocupam (no exercício das funções para que foram eleitos). É, pois, necessário que se verifique um nexo causal entre as funções exercidas pelo eleito local e o respectivo processo judicial (como, por exemplo, saber em que qualidade o autarca está a ser julgado: a título pessoal ou na qualidade de membro de um órgão deliberativo ou executivo do município ou da freguesia?).

As autarquias não poderão suportar os encargos resultantes de factos praticados pelos eleitos locais fora do exercício das suas funções, sem qualquer relação com o exercício do cargo que ocupam. E se não cabem na previsão do artigo 21.º da Lei n.º 29/87 os actos praticados fora do exercício de funções, o mesmo sucede quando cometidos por ocasião do seu exercício, mas não por causa dele, sendo necessário apurar em cada caso se o autor do facto ilícito actuou ou não no exercício das suas funções e por causa desse exercício, ou seja, se o facto praticado representou o legítimo exercício da sua competência para fins de interesse público ou, pelo contrário, um abuso de autoridade, excedendo os limites das suas funções.

Da mesma forma, não deverão as autarquias suportar aqueles encargos, ainda que o eleito local tenha actuado no exercício das suas funções e por causa delas, quando se prove que agiu com dolo ou negligência. O presidente duma câmara municipal, por exemplo, pode praticar um acto ilícito no exercício das suas funções e por causa desse exercício. É um acto funcional, porque praticado pelo titular de um órgão de uma pessoa colectiva de direito público, no exercício das suas funções e por causa desse exercício, pelo que, em princípio, a autarquia deverá suportar as despesas resultantes do processo que lhe for movido com esse fundamento. Já não será assim se se provar que agiu com dolo ou negligência.

Os titulares dos órgãos das autarquias locais, como dissemos, não respondem civilmente pelos actos ilícitos praticados com culpa leve no exercício das suas funções. Por isso, deve entender-se que, nestes casos, também lhes deve ser concedido o apoio, pois, embora o artigo 21.º da Lei n.º 29/87 se refira à “negligência”, deverá considerar-se aplicável apenas à culpa grave[71]. Se o eleito local não responde civilmente perante terceiros pelos actos praticados com culpa leve no exercício de funções, nada justificaria que não lhe fosse concedido o apoio numa acção de indemnização intentada contra ele com fundamento em culpa grave e se viesse a provar apenas a culpa leve. A razão de ser é a mesma. «A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento do legislador, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico…»[72].

Portanto, nos casos de culpa leve (quando o acto tiver sido praticado pelo eleito local com diligência e zelo não manifestamente inferiores aos que se encontrava obrigado em razão do cargo) a autarquia deve prestar o apoio.

3. Só existe para as autarquias a obrigação de suportar as despesas dos processos judiciais em que os eleitos locais sejam parte quando os actos donde emergem tiverem sido praticados no exercício das suas funções e por causa desse exercício, como vimos.

Não será o caso dos processos judiciais em que os eleitos locais sejam condenados pela prática de qualquer dos crimes referidos no capítulo VII. O crime de prevaricação[73], por exemplo, é um dos crimes qualificados pela Lei n.º 34/87, como «crime de responsabilidade de titular de cargo político». Neste crime, o titular do cargo, conscientemente, conduziu ou decidiu contra o direito um processo em que interveio no exercício das suas funções, com a intenção de, por essa forma, prejudicar ou beneficiar alguém. Assim, embora no exercício de funções, serviu-se daquela qualidade para praticar um acto contrário aos interesses que devia defender, precisamente por ser detentor de tal cargo. «O agente substitui a vontade da lei pelo arbítrio, praticando, não o acto que é seu dever praticar, mas outro contrário à disposição expressa da lei»[74].

O crime de corrupção passiva para acto ilícito[75] é também um dos crimes praticados no exercício de funções pelos titulares de cargos políticos. Estes, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitam ou aceitam, para eles ou para terceiro, sem que lhes seja devida, uma vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para qualquer acto ou omissão contrários aos deveres do cargo. O corrupto, formalmente no exercício das suas funções, aproveitando-se da qualidade em que foi investido, pratica um acto contrário aos deveres do cargo que ocupa. É «o mercadejar, o transaccionar, o negociar do cargo, e por isso é que o funcionário que ocupa tal cargo “se vende”. Assim acontecendo, prosseguir-se-á, em primeiro lugar, um fim que não é do interesse público, mas do interesse do corruptor que recebe a benesse, e do corrupto que recebe a vantagem oferecida pelo corruptor»[76].

Ao conceder o apoio, o legislador parte do pressuposto de que os seus destinatários exercem a sua actividade em prol da comunidade, ou seja, que o fazem no exercício efectivo das funções para que foram eleitos, o que nem sempre acontece. Embora formalmente em exercício de funções, actuam, por vezes, precisamente contra os interesses que deviam defender.

Aqueles são «crimes de responsabilidade», que só podem ser cometidos pelos titulares de cargos políticos no exercício das suas funções, os quais se contrapõem aos «crimes comuns» que estes possam cometer fora desse exercício, como qualquer outra pessoa.

Ora, é evidente que quem comete um destes crimes não pode beneficiar do apoio jurídico a conceder pelas autarquias, o mesmo acontecendo em relação a qualquer outro, uma vez que constitui pressuposto necessário da condenação do arguido que tenha actuado com dolo ou negligência. Com efeito, como resulta do preceituado no artigo 13.º do Código Penal «[s]ó é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especialmente previstos na lei, com negligência». Portanto, embora na maioria dos casos apenas sejam puníveis os factos praticados com dolo, outros são puníveis a título de negligência, como, por exemplo, o crime de homicídio que é previsto e punido pelo artigo 137.º do Código Penal.

Constitui princípio fundamental do Direito Penal não haver crime sem culpa. O citado artigo 13.º do Código Penal consagra justamente o princípio nulla poena sine culpa e, então, para que haja culpa do agente é necessário que o facto punível lhe possa ser imputado a título de dolo ou de negligência[77].

Estas questões não se suscitam, obviamente, se o crime for cometido fora do exercício das funções do eleito local. Mas este pode ser acusado pela prática de um crime, no exercício de funções, que não seja definido na Lei n.º 34/87 como crime de responsabilidade, pois nem todos os crimes praticados pelos titulares de cargos políticos no exercício de funções são assim considerados, como vimos no capítulo VII. Não obstante, a solução deverá ser a mesma, uma vez que os factos constantes da acusação também teriam sido praticados no exercício de funções, aproveitando-se igualmente o agente da qualidade em que foi investido para praticar o facto ilícito.

Se o eleito local for condenado, não lhe poderá ser concedido o apoio, uma vez que os pressupostos necessários à sua concessão não se mostram satisfeitos, pois, como se disse, é condição essencial para a condenação do arguido ter praticado os factos com dolo ou negligência.

Se for absolvido, em princípio não terá actuado com dolo ou negligência, pois, caso contrário, teria sido condenado, pelo que lhe deveria ser concedido o apoio, verificando-se os outros pressupostos. Mas não será sempre assim, uma vez que poderá provar-se o dolo e/ou a negligência e, apesar disso, o eleito local ser absolvido, por não se verificar um dos outros pressupostos necessário à condenação. E pode não se provar o dolo mas provar-se a negligência. Neste caso, se o crime for punível somente a título de dolo, o arguido será absolvido, mas, apesar disso, não lhe pode ser concedido o apoio jurídico, por ter agido negligentemente.

Na generalidade dos casos, sendo o eleito local absolvido do(s) crime(s) de que foi acusado, as autarquias não terão justificação para recusar o apoio. Todavia, e tendo em consideração o que fica dito, será necessário averiguar, em cada caso, se se justifica a concessão.

4. Só devem ser pagas as despesas que se mostrem necessárias ao normal prosseguimento do processo e que dele decorram directamente, não devendo as autarquias suportar, por exemplo, os encargos resultantes do incumprimento de um mandado de detenção. O arguido que se ausenta para o estrangeiro foge à justiça do seu país. O seu comportamento já não está relacionado com a condição de autarca, mas antes com a de simples cidadão, actuando completamente fora do exercício de funções, e essas despesas não decorrem da tramitação normal do processo.

Como dissemos, o apoio jurídico abrange as despesas que o eleito local tiver que suportar em virtude da sua intervenção nos processos judiciais em que seja parte.

Ora, os processos judiciais estão sujeitos a custas, as quais compreendem a taxa de justiça e os encargos (artigos 1.º e 74.º do Código das Custas Judiciais (CCJ) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 224/96, de 26 de Novembro)[78].

«O conceito de custas em sentido técnico-jurídico significa as despesas ou encargos judiciais com os processos de natureza cível, criminal, administrativa ou tributária, isto é, o dispêndio necessário à obtenção em juízo da declaração de um direito ou da verificação de determinada situação fáctica»[79].

O Capítulo II do CCJ refere-se à taxa de justiça e o Capítulo III aos encargos. O artigo 32.º (relativo às custas em processo civil) enumera os encargos que as custas compreendem. O n.º 2 do artigo 74.º estabelece que o processo penal está sujeito a custas, nos termos desse mesmo código e da lei de processo, ou seja, abrange a taxa de justiça e os encargos. Os artigos 82.º a 88.º do CCJ referem-se à taxa de justiça e os artigos 89.º a 95.º aos encargos em processo penal. Além disso, está a parte (nomeadamente o arguido) sujeita ao pagamento dos honorários.

Relativamente à responsabilidade pelas custas em processo penal regem os artigos 513.º a 524.º do Código de Processo Penal; em Processo Civil regem os artigos 446.º a 455.º.

Entretanto foi publicado o Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, que aprovou o «Regulamento das Custas Processuais» e revogou o Código das Custas Judiciais. O n.º 1 do artigo 1.º deste Regulamento determina que todos os processos estão sujeitos a custas, e o n.º 1 do artigo 3.º que as custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte. Por sua vez, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º, estão isentos de custas ...os eleitos locais…, qualquer que seja a forma de processo, quando pessoalmente demandados em virtude do exercício das suas funções. Assim, os eleitos locais ficarão isentos do pagamento de custas, qualquer que seja a forma de processo em que sejam parte, quando pessoalmente demandados em virtude do exercício das suas funções.

Na redacção resultante daquele decreto-lei estabelecem os artigos 447.º e 447.º – D do Código de Processo Civil o seguinte na parte que agora interessa considerar: as custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte; são encargos do processo todas as despesas resultantes da sua condução, requeridas pelas partes ou ordenadas pelo juiz da causa; as custas de parte compreendem o que cada uma delas haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensada em virtude da condenação da parte contrária, e abrangem, designadamente, os encargos efectivamente suportados pela parte, os honorários do mandatário e as despesas por este efectuadas.

Como resulta do seu artigo 26.º, aquele decreto-lei entrará em vigor no dia 1 de Setembro de 2008, e a generalidade das disposições relativas ao novo Regulamento das Custas Processuais aplica-se apenas aos processos iniciados a partir dessa data (artigo 27.º, n.º 1).

Gozarão, assim, os eleitos locais, dentro de pouco tempo, de isenção de custas, pelo que passarão a ser menos frequentes os casos em que é necessário conceder-se o apoio jurídico. Mas, como resulta do n.º 3 do citado artigo 4.º, apesar dessa isenção, ficam obrigados ao pagamento de custas quando se conclua que os actos respectivos não foram praticados em virtude do exercício das suas funções ou quando tenham actuado dolosamente.

Não obstante, parece-nos que o artigo 21.º da Lei n.º 29/87, de 30 de Junho, se mantém em vigor, pois as situações previstas por ambos os diplomas legais são diferentes, embora directamente relacionadas.

Esta lei concede aos eleitos locais o apoio jurídico, assumindo as autarquias, nos aludidos termos, os encargos que eles teriam de suportar. Com a isenção de custas ficam dispensados do seu pagamento, e as autarquias passarão a suportar apenas as despesas se e na media em que forem devidas pelos eleitos locais. Apesar da isenção, haverá casos em que estes terão necessidade de suportar encargos decorrentes dos processos em que sejam parte. Quando isso acontecer, e verificados os outros pressupostos, ser-lhes-á concedido o apoio.

5. É da maior importância para este parecer indagar quando deve ser feito o pagamento das despesas resultantes dos processos judiciais. São admissíveis duas soluções: a) pode ser feito apenas no final do processo, quando já é conhecido o seu resultado e o montante das despesas; b) pode ser feito à medida que é devido.

A doutrina tem entendido que o pagamento das despesas só deve ser feito no final do processo porque, por um lado, só então poderá saber-se qual a quantia efectivamente despendida e, por outro, a inexistência de dolo ou negligência só poderá ser determinada, em princípio, após o julgamento. GONÇALO RIBEIRO DA COSTA[80] opinou em anotação ao artigo 21.º da Lei n.º 29/87: «Uma vez que a inexistência de dolo ou negligência por parte dos eleitos locais só se encontrará a final dos processos judiciais, os encargos com estes deverão apenas ser objecto de reembolso».

Também a letra da lei parece apontar nesse sentido quando se refere aos processos que «tenham tido» como causa o exercício de funções (ao utilizar-se no artigo 21.º esta forma verbal no particípio passado).

Parece-nos, com efeito, que o eleito local apenas poderá exigir o pagamento das despesas após a decisão final do processo, porquanto só nessa fase estarão preenchidos os pressupostos de que depende a concessão do apoio: que o processo tenha tido efectivamente como causa o exercício de funções e que não se prove dolo ou negligência por parte dos eleitos.

Sobretudo em relação aos crimes imputados aos eleitos locais não se vêem razões válidas para que o pagamento possa ser feito antes de o processo terminar, pois, supostamente, os factos que lhe são imputados, embora formalmente praticados no exercício de funções, não o foram por causa desse exercício. E não vemos que deva ser deixado ao critério dos órgãos autárquicos decidir, em cada caso, se o pagamento deve ser feito antes ou depois de o processo terminar, assim fazendo uma espécie de “pré-julgamento”. Tal como não cremos que para o efeito possa ser invocado o princípio da «presunção de inocência».

Seria incompreensível, e contrário ao espírito da lei, e da sua razão de ser, estar um município a suportar os encargos resultantes de um ou vários processos judiciais em que um ou mais autarcas estivessem acusados da prática de tantos e de tão graves crimes como, por exemplo, os referidos no n.º 2 do capítulo II deste parecer.

Não devem, pois, as autarquias suportar os encargos antes de ser proferida a decisão final. Os pagamentos feitos noutras circunstâncias são ilegais, pelo que deve ser exigida a devolução das respectivas quantias.

6. Desconhecemos as circunstâncias em que foram feitos os pagamentos relativos aos aludidos processos do “caso Felgueiras” e com que fundamentos.

Todavia, sempre se dirá o seguinte:

- Nos termos do artigo 135.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA) «são anuláveis os actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção».
- Nos termos do artigo 55.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA), o Ministério Público tem legitimidade para impugnar um acto administrativo.
- «A impugnação de um acto administrativo tem por objecto a anulação ou a declaração de nulidade ou inexistência desse acto», podendo o pedido ser feito através da denominada “acção administrativa especial” [artigos 50.º, n.º 1, e 46.º, n.º 2, alínea a), ambos do CPTA].
- Poderá o Ministério Público impugnar o acto administrativo que tiver sido proferido na Câmara Municipal de Felgueiras justificativo do pagamento das aludidas quantias (tendo o prazo de um ano para o impugnar se for anulável, não estando sujeito a qualquer prazo se for nulo ou inexistente – artigos 58.º e 59.º do CPTA).

7. Como é sabido, há processos em que não chega a ser proferida formalmente uma sentença, terminando por qualquer outra razão. Nestes casos, o dolo ou a negligência não estarão provados, pelo que, quando isso acontecer e estejam verificados os restantes pressupostos, deve ser concedido o apoio.

Num processo penal movido contra um autarca que não chegou a ser pronunciado, também não terá ficado provado o dolo ou a negligência, pelo que a solução deverá ser a mesma que defendemos para os casos de absolvição, e até por maioria de razão. E o mesmo deve suceder nos casos em que, tendo sido proferido despacho de pronúncia não se procedeu a julgamento.

8. Diga-se finalmente que não é necessário que o eleito local se mantenha em funções à data em que o pagamento das despesas deva ser feito, uma vez que a razão de ser do preceito legal em causa é precisamente o ressarcimento das despesas feitas com os processos judiciais relacionados com o exercício das respectivas funções, independentemente de serem julgados, e mesmo instaurados, durante ou após o exercício de funções. Pode suceder que contra um autarca seja instaurado um processo depois de findo o mandato. Se esse processo tiver como causa o exercício de funções, nada obsta a que seja concedido o apoio, desde que se verifiquem os restantes pressupostos.

X

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1. O apoio a conceder aos eleitos locais pelas respectivas autarquias, nos termos dos artigos 5.º, n.º 1, alínea o) e 21.º, ambos da Lei n.º 29/87, de 30 de Junho, depende da verificação cumulativa de dois pressupostos: por um lado, que o acto que deu origem ao processo judicial e às inerentes despesas tenha sido praticado pelo eleito local no exercício das suas funções e por causa delas, e, por outro, que não se prove que esse acto foi praticado com dolo ou negligência;

2. O apoio referido na conclusão anterior abrange as despesas relativas aos processos criminais em que os eleitos locais sejam arguidos;

3. Só após a decisão final poderá apurar-se se estão preenchidos os pressupostos de que depende a concessão do apoio, pelo que só então deverá ser proferida a respectiva decisão.






[1] Ofícios registados nesta Procuradoria-Geral em 15 de Novembro de 2007 e 10 de Dezembro de 2007, respectivamente.
[2] Ofício n.º 825 – RM, registado nesta Procuradoria-Geral em 6 de Dezembro de 2007.
[3] Com as alterações introduzidas pelas seguintes Leis: 97/89, de 15 de Dezembro; 1/91, de 10 de Janeiro; 11/91, de 17 de Maio; 11/96, de 18 de Abril; 127/97, de 11 de Dezembro; 50/99, de 24 de Junho; 86/2001, de 10 de Agosto; 22/2004, de 17 de Junho; 52-A/2005, de 10 de Outubro, e 53-F/2006, de 29 de Dezembro.
[4] Que define o Estatuto dos Eleitos Locais.
[5] Alterada pela Lei n.º 31/2008, de 17 de Julho.
[6] Para conhecimento da evolução da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas pode consultar-se:”Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado” – Trabalhos Preparatórios, Coimbra Editora, 2002, MARCELO REBELO DE SOUSA e ANDRÉ SALGADO, Direito Administrativo Geral, Tomo III, Dom Quixote, Fevereiro de 2007, págs. 410 s.s. e FREITAS DO AMARAL, Direito Administrativo, vol.III, pág. 477.
[7] Actos de gestão privada são, de modo geral, no dizer de PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, «aqueles que, embora praticados pelos órgãos, agentes ou representantes do Estado ou de outras pessoas colectivas públicas, estão sujeitos às mesmas regras que vigorariam para a hipótese de serem praticados por simples particulares. São actos em que o Estado ou a pessoa colectiva pública intervém como um simples particular, despido do seu poder público» (Código Civil Anotado, vol. I, 2ª edição, Coimbra Editora, 1979, págs. 443 e 444).
[8] Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 110 (1977-1978), pág. 314.
[9] Acórdão do Tribunal de Conflitos, de 4 de Abril de 2006, Proc. n.º 08/03-70 , publicado no apêndice do Diário da República de 15 de Junho de 2007, págs. 72/78.
[10] O artigo 501.º do Código Civil trata da responsabilidade civil em relação aos órgãos (deliberativos ou executivos), agentes ou representantes das entidades públicas, no âmbito da sua gestão privada.
[11] ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, vol. I, Almedina, 3ª Edição, 1980, págs. 541 e 542.
[12] A responsabilidade destas entidades é objectiva, pois não depende de culpa sua.
[13] Numa acepção, agentes são as pessoas que, por incumbência ou sob a direcção dos órgãos da pessoa colectiva, executam determinadas operações materiais.
[14] Sobre a aplicação do regime do comitente a que nos vimos referindo veja-se ANTUNES VARELA, “Das Obrigações e Geral”, vol. I, 3ª Edição, Almedina, 1980, págs. 539 e s.s.
[15] Rectificada pela declaração de rectificação n.º 14/2002, de 20 de Março, publicada no Diário da República n.º 67, 1ª série, de 20 de Março de 2002, e pela declaração de rectificação n.º 18/2002, de 12 de Abril de 2002, publicada no Diário da República n.º 86, 1ª série, de 12 de Abril de 2002, e alterada pelas Leis n.ºs 4-A/2003, de 19 de Fevereiro, e 107-D/2003, de 31 de Dezembro.
[16] Este regime justifica-se pela necessidade de protecção dos lesados pelas consequências dos actos praticados pelos órgãos e agentes das entidades públicas e também estes, pois, caso contrário, estariam sujeitos a suportar indemnizações eventualmente elevadas por faltas leves cometidas no desempenho das suas funções.
[17] “Terceiro” é alguém que não é o autor do facto ilícito nem a pessoa colectiva de direito público em causa.
[18] Na versão original, esta matéria constava do artigo 21.º.
[19] JJ GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4ª edição revista, 2007, págs. 426 e 427.
[20] Processo n.º 92/2003, 1ª secção, publicado no Diário da República n.º 131, II série, de 4 de Junho de 2004, págs. 8752/8758.
[21] Publicado no Apêndice do Diário da República, de 19 de Fevereiro de 2007, págs. 1142/1153

[22] Manual de Direito Administrativo, 9.ª Edição, Revista e actualizada por DIOGO FREITAS DO AMARAL, Tomo II, Coimbra Editora, 1972, pág. 1204.
[23] Escreve o mesmo autor que, até à entrada em vigor do novo regime da responsabilidade civil da Administração (com o Decreto-Lei n.º 48051, de 21 de Novembro de 1967), a doutrina e a jurisprudência se baseavam na lei para fazer a distinção entre casos de culpa funcional e de culpa pessoal. Fundamentalmente a diferença seria esta: a culpa funcional resultaria do mau funcionamento do serviço em que o agente estava integrado, sendo portanto compatível com o próprio zelo do causador do prejuízo; ao passo que a culpa pessoal traduziria, em condições normais de funcionamento do serviço, a conduta incorrecta do agente com desprezo da natureza e objectivos da sua função ou dos deveres do seu cargo (ob. cit. em nota a págs. 1204 e 1205).
[24] Ob. loc. cit., pág.1205 (em nota).
[25] Outras propostas com a mesma finalidade já tinham sido apresentadas, mas caducaram.
[26] DAR, de 28 de Janeiro de 2006, II série – A, n.º 81, pág. 11.
[27] DAR de 28 de Janeiro de 2006, II série - A, n.º 81, pág. 12.
[28] Por exemplo, no domínio da responsabilidade contratual, a questão não se põe, uma vez que a mesma será sempre e só da pessoa colectiva pública (município ou freguesia).
[29] Que tem por epígrafe: «responsabilidade exclusiva do Estado e demais pessoas colectivas de direito público».
[30] As questões relativas ao exercício da função legislativa e da função jurisdicional não têm relevância para a economia deste parecer.
[31] Que tem por epígrafe: «responsabilidade solidária em caso de dolo ou culpa grave».
[32] Esta terminologia já constava do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 48051.
[33] Encontramo-nos no domínio dos factos ilícitos culposos. O autor do facto pode actuar com dolo ou com negligência. Esta pressupõe a violação, consciente ou inconsciente, de deveres de cuidado; quando a diligência empregue for manifestamente inferior à que o titular do órgão ou agente se encontrava obrigado em razão do cargo que ocupava, a negligência diz-se «grosseira» (culpa grave); caso contrário diz-se «ligeira» (culpa leve).
[34] Acolheu-se o entendimento há muito seguido pelos tribunais administrativos no sentido de que a culpa é inerente à prática dos actos administrativos ilegais pela Administração Pública, pelo que não carece de demonstração.
[35] Também o artigo 6.º do Decreto-lei n.º 48051, de 21 de Novembro de 1967, definia o conceito de actos jurídicos ilícitos para os efeitos desse diploma.
[36] Na primitiva redacção esta matéria constava do artigo 120.º, sob a epígrafe «responsabilidade dos titulares de cargos políticos». As actuais redacção e numeração remontam à revisão de 1997; o n.º 3 dispunha então apenas o seguinte: «a lei determina os crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos, bem como as sanções aplicáveis e os respectivos efeitos».
[37] Constituição da Republica Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2006, Tomo II, pág. 319.
[38] Alterada pelas Leis nºs 16/87, de 1 de Junho, 102/88, de 25 de Agosto, 26/95, de 18 de Agosto, 3/2001, de 23 de Fevereiro, e 52-A/2005, de 10 de Outubro.
[39] Alterada pelas Leis nºs 38/83, de 25 de Outubro, 25/95, de 18 de Agosto, 19/2008, de 21 de Abril, e 30/2008, de 10 de Julho.
[40] Alterada pelos seguintes diplomas legais: Leis n.ºs 39-A/94, de 27 de Dezembro, 28/95, de 18 de Agosto, 12/96, de 18 de Abril, 42/96, de 31 de Agosto, e 12/98, de 24 de Fevereiro e Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27 de Março.
[41] Alterada pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro.
[42] Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª edição revista, Coimbra Editora, 1993, págs. 543 e 544.
[43] Sobre os chamados «crimes de responsabilidade» nas Constituições Portuguesas e a eventual revogação da Lei n.º 266, de 27 de Julho de 1914 (que estabelecia a responsabilidade penal dos membros do poder executivo e seus agentes e do Presidente da Republica), pode ver-se o parecer n.º 85/86 deste Conselho Consultivo, de 7 de Maio de 1987, publicado no BMJ 377, pág. 55. Mas parece agora claro que a Lei n.º 266 foi implicitamente revogada pela Lei 34/87, de 16 de Julho, a que nos referiremos mais em pormenor.
[44] Antes da publicação desta lei foi pedida ao Tribunal Constitucional a verificação de inconstitucionalidade por omissão das normas legislativas destinadas a tornar exequível o então artigo 120.º da CRP (hoje 117.º). Entretanto, o acórdão do TC n.º 276/89, de 28 de Fevereiro, concluiu pela inexistência de inconstitucionalidade por omissão, em virtude de, entre a data daquele pedido e a data da sua emissão, ter o Parlamento aprovado esta lei (DR, II série, n.º 133, de 12 de Junho de 1989).
[45] Os artigos 3.º, 16.º, 17.º, 18.º e 19.º foram alterados pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro, que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2002.
[46] Dos trabalhos preparatórios resulta que foi muito discutido se os membros do Conselho de Estado, do Tribunal Constitucional e o Provedor de Justiça deviam ser considerados titulares de cargos políticos para este efeito, tendo-se optado pela sua não inclusão. Mas também foi claramente referido que se tem entendido que não devem considerar-se titulares de cargos políticos os titulares da função jurisdicional.
[47] Veja-se a este propósito JJ GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª edição revista, Coimbra Editora, 1993, pág. 545.
[48] No acórdão do Tribunal. Constitucional n.º 274/90, de 17 de Outubro de 1990, publicado no Diário da República de 20 de Fevereiro de 1991, II série, foi referido que, face à introdução pela revisão constitucional de 1989 da parte final do n.º 3 do então artigo 120.º, ficou esclarecido que a «perda de mandato é inerente à própria ideia de condenação em crime de responsabilidade, não repugnando aceitar que ela se configure, in casu, como efeito automático da condenação. Por isso, o artigo 120.º, n.º 3, ao remeter para a lei a determinação dos efeitos da condenação em tal espécie de crimes não podia deixar de ter em vista a perda do mandato, tendo o acrescento efectuado em 1989 sido introduzido apenas com a intenção de dissipar quaisquer dúvidas que, porventura, existissem».
[49] JORGE MIRANDA, Direito e Justiça, Vol. XV, 2001, Tomo 2, pág. 32, dá como exemplo destes últimos crimes os seguintes: crime contra pessoa que goze de protecção internacional (art.º 322.º do CP), crimes eleitorais (art.ºs. 336.º e segs. do CP) e crime de abandono de funções (art. 385.º do CP).
[50] J ORGE MIRANDA/RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo II, Coimbra Editora, 2006, pág. 322.
[51] Além disso existem excepções previstas na própria Constituição ao princípio da responsabilidade dos titulares de cargos políticos, como, por exemplo, no artigo 157.º, relativo às imunidades parlamentares.
[52] Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 121-1988-1989, nºs 3766-3777, págs. 380/381.
[53] Nos termos da alínea n) do artigo 164.º da CRP é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre a criação, extinção e modificação das autarquias locais e respectivo regime. Consagrou-se, pois, uma reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República relativamente à criação, extinção e modificação territorial das autarquias locais e respectivo regime, sem prejuízo dos poderes das regiões autónomas. E a Lei n.º 11/82, de 2 de Junho, determina no artigo 1.º que «compete à Assembleia da República legislar sobre a criação ou extinção das autarquias locais e fixação dos limites da respectiva circunscrição territorial». Portanto, a criação e extinção das autarquias locais só pode ser feita por lei da Assembleia da República.
[54] No mesmo sentido os nºs. 1 e 2 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março, entretanto revogado pela Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, a qual «estabelece o quadro de competências, assim como o regime jurídico de funcionamento, dos órgãos dos municípios e das freguesias».
[55] As autarquias são pessoas colectivas, distintas do Estado, não se confundindo com a administração local deste. Estão, contudo, sujeitas à tutela administrativa nos termos do artigo 242º da CRP e da Lei n.º 27/96, de 1 de Agosto. Mas a tutela consiste apenas na verificação do cumprimento da lei por parte dos órgãos autárquicos.
[56] O n.º 3 do artigo 1.º do citado Decreto-Lei n.º 100/84 previa que, no continente, as autarquias eram a região administrativa, o município e a freguesia e, nas regiões autónomas, o município e a freguesia.
[57] Antes da Constituição de 1976 eram autarquias locais a freguesia, o concelho e o distrito. Na sua vigência, o distrito deixou de ser considerado autarquia, passando a mera circunscrição administrativa, esvaziada de poderes, e o concelho passou a designar-se município.
[58] Artigo 239.º, n.º 1, da CRP.
[59] Órgão é, na definição de MARCELO CAETANO, «o elemento da pessoa colectiva que consiste num centro institucionalizado de poderes funcionais a exercer pelo indivíduo ou pelo colégio de indivíduos que nele estiverem providos com o objectivo de exprimir a vontade juridicamente imputável a essa pessoa colectiva», Manual de Direito Administrativo, Tomo I, 10ª Edição, Coimbra Editora, 1973, pág. 204. Sobre o conceito de “órgãos” veja-se o parecer n.º 519/2000, de 17 de Julho de 2000, publicado do Diário da República, II série, de 5 de Fevereiro de 2002.
[60] Órgãos colegiais são aqueles que têm mais do que um titular, geralmente três ou mais em número ímpar, aos quais se contrapõem os órgãos singulares, que têm um único titular. É aos órgãos da pessoa colectiva que compete exprimir o seu pensamento e executar a sua vontade.
[61] Órgãos deliberativos são os órgãos colegiais amplos, como uma assembleia, sendo eles que tomam as grandes decisões. E são órgãos executivos os órgãos colegiais restritos e os singulares, os quais aplicam as deliberações tomadas por aqueles, ou seja, aos órgãos executivos compete executar as decisões ou deliberações dos órgãos decisórios (FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, Vol. I, 2ª Edição, 1996, Almedina, pág. 481).
[62] «A junta é constituída por um presidente e por vogais, sendo que dois exercerão as funções de secretário e de tesoureiro» (artigo 23.º, n.º 2, da Lei n.º 166/99).
[63] Curso De Direito Administrativo, 2ª edição (Reimpressão), vol. I – pág. 1996.
[64] FREITAS DO AMARAL entende que também o presidente da câmara deve ser considerado órgão do município, face às funções que efectivamente exerce (Curso de Direito Administrativo, 2ª Edição, Vol. I, Livraria Almedina, 1996, págs. 481 e 496 e s.s.).
[65] O Código do Procedimento Administrativo (CPA) dedica os artigos 14.º a 28.º aos órgãos colegiais.
[66] Ver também o artigo 41.º da Lei n.º 169/99.
[67] O presidente da câmara municipal tem também competências delegadas (artigo 65.º da Lei n.º 166/99).
[68] Diário da Assembleia da República, n.º 68, I série, de 11 de Abril de 1987, págs. 2668 e 2669.
[69] Relativamente aos arguidos nos denominados processos «saco azul» e «Futebol Clube de Felgueiras», o apoio só poderia ser concedido aos que possuíssem esta qualidade.
[70] Os titulares dos órgãos deliberativos e executivos das autarquias locais são eleitos democraticamente pelas respectivas populações – as chamadas eleições locais ou eleições autárquicas (artigos 108.º, 109.º, 113.º e 235.º, todos da CRP).
[71] Quando as acções ou omissões tiverem sido cometidas pelos eleitos locais com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se encontravam obrigados em razão do respectivo cargo.
[72] Artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil.
[73] O crime de prevaricação está previsto no artigo 11.º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho: «o titular de cargo político que conscientemente conduzir ou decidir contra direito um processo em que intervenha no exercício das suas funções, com a intenção de por essa forma prejudicar ou beneficiar alguém, será punido com prisão de dois a oito anos».
[74] NÉLSON HUNGRIA, citado por LEAL-HENRIQUES e SIMAS SANTOS [«O Código Penal de 1982», Edição Rei dos Livros, vol. 4 (1987) pág. 533].
[75] Este crime está previsto no artigo 16.º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, alterada pela Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro, estabelecendo o seu n.º 1: «o titular de cargo político que no exercício das suas funções, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para qualquer acto ou omissão contrários ao dever do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão de dois a oito anos».
[76] SOUTO DE MOURA, Revista do Ministério Público, Ano 14º, Abril-Junho 1993, n.º 54, pág. 15.
[77] Sobre a distinção entre dolo e negligência vejam-se os artigos 14.º e 15.º do Código Penal.
[78] Alterado pelo Decreto-Lei n.º 91/97, de 22 de Abril, pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, e pelos Decretos-Leis n.ºs 304/99, de 6 de Agosto, 320-B/2000, de 15 de Dezembro, 323/2001, de 17 de Dezembro, 38/2003, de 8 de Março, e 324/2003, de 27 de Dezembro.
[79] SALVADOR DA COSTA, Código das Custas Judiciais, Anotado e Comentado, 2.ª Edição, 1997, Almedina, pág. 32.
[80] Legislação Autárquica e Complementar, Anotada e Comentada, Editora Pergaminho Lda., Março de 1999, pág. 158.
Anotações
Legislação: 
CONST76- ART22 ART117 N1 N2 N3 ART118 ART150 ART235 N1 N2 ART236 N1 ART244 N1 ART245 N1 ART250 ART251 ART252 ART271 N1 N2 N3 N4
L 29/87 DE 1987/06/30 - ART1 N1 N2 ART5 N1 O) ART21
L 67/2007 DE 2007/12/31 - ART1 N1 N2 N3 ART2 N1 N2 ART5 ART7 N1 ART8 N1 N2 ART9 ART10 ART11 ART16
D48051 DE 1967/11/21 - ART2 N1 N2 ART3 N1 N2 ART8 ART9
L 169/99 DE 1999/09/18 - ART2 ART17 ART19 ART23 ART24 N1 N2 ART33 ART34 ART35 ART38 ART68 N1 A) B) ART69 N1 N2
CCIV66 - ART483 ART500 ART501
CADM36 - ART366 ART367
DL 100/84 DE 1984/03/29 - ART90 ART91
DL 129/84 DE 1984/04/27 - ART4 F) ART51 H)
DL 13/02 DE 2002/02/19 - ART4 N1 G) H) I)
L 4/85 DE 1985/04/09 - ART1 N1 N2
L 4/83 DE 1983/04/02 - ART4 N1 I)
L 64/93 DE 1993/08/26 - ART1 N2 F)
L 34/87 DE 1987/07/16 - ART1 ART2 ART3 ART4 ART5 ART6 ART7 ART27 ART45 N1 N3
L N 266 DE 1914/07/27
CP82 - ART13 ART137
CCJ96 - ART32 ART74 N2 ART82 ART83 ART88 ART95
CPP87 - ART513 ART524
CPC67 - ART446 ART447ART455
DL 34/08 DE 2008/02/26 - ART1 N1 ART3 N1 ART4 N1 ART26 ART27N1
CPADM91 - ART135
CPTA - ART46 N2 A) ART50 N1 ART55 N1 B) ART58 ART59
Jurisprudência: 
AC DO TC N 236/04 DE 2004/04/13
AC DO STA DE 2006/09/26 IN AP AO DR DE 2007/02/12
Referências Complementares: 
DIR CONST/DIR ADM/ADM PUBL/FUNÇÃO PUBL/DIR CRM/DIR PROC PENAL
Divulgação
Data: 
09-10-2009
Página: 
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