30/2024, de 28.11.2024
Eduardo André Folque da Costa Ferreira
Votou em conformidade
Helena Maria de Carvalho Gomes de Melo
Votou em conformidade
Amadeu Francisco Ribeiro Guerra
Votou em conformidade
Ricardo Lopes Dinis Pedro
Votou em conformidade
Maria Carolina Durão Pereira
Votou em conformidade
José Joaquim Arrepia Ferreira
Votou em conformidade
João Conde Correia dos Santos
Votou em conformidade
José Manuel Gonçalves Dias Ribeiro de Almeida
Votou em conformidade
Carlos Alberto Correia de Oliveira
Votou em conformidade
PARIDADE
IGUALDADE DE GÉNERO
SORTEIO
COMISSÃO DE COORDENAÇÃO REGIONAL
INSTITUTO PÚBLICO
INTEGRAÇÃO DE LACUNAS
Considerando o que foi exposto, formulam-se as seguintes conclusões:
1.ª As mudanças climáticas têm assumido cada vez maior relevância no mundo atual, razão pela qual se tem procurado desenvolver mecanismos de mitigação, de modo a reduzirem-se os “stresses climáticos” nos humanos e nos sistemas naturais. É neste contexto que o legislador nacional aprovou a Lei n.º 98/2021, de 31 de dezembro, que define as bases da política do clima, prevendo um vasto conjunto de objetivos de política do clima.
2.ª A referida Lei veio prever, no artigo 12.º, a criação do Conselho para a Ação Climática, enquanto órgão de consulta, especializado, composto por personalidades de reconhecido mérito, com conhecimento e experiência nos diferentes domínios afetados pelas alterações climáticas, incluindo gestão de risco e políticas públicas, e atuando com estrita isenção e objetividade, em obediência a critérios técnicos devidamente explicitados, não podendo ser sujeito a direção, superintendência ou tutela governamental.
3.ª Posteriormente, a Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, que estabelece a composição, organização e funcionamento do Conselho para a Ação Climática, previsto no n.º 4, do artigo 12.º, da Lei de Bases do Clima, determina, no artigo 6.º, n.º 1, que este Conselho é composto por 17 membros de reconhecido mérito, com conhecimento e experiência nos diferentes domínios afetados pelas alterações climáticas.
4.ª Esta Lei prevê também, no artigo 6.º, n.º 2, que a designação dos membros deste Conselho deve assegurar uma representação paritária, não podendo integrar menos de oito elementos de cada sexo. Apesar desta previsão, tal como resulta da Consulta, não foi possível assegurar, na prática, a paridade ali exigida, em virtude de as várias entidades envolvidas terem indicado representantes maioritariamente do sexo masculino.
5.ª Independentemente de o referido artigo, sobre a representação paritária, revelar uma norma imperfeita, uma vez que não apresenta uma sanção jurídica pelo seu incumprimento, dada a necessidade de instituir o Conselho para a Ação Climática, o Presidente da Assembleia da República deve assegurar o cumprimento da legalidade, não apenas por ser o único que está em condições de garantir a paridade de género em sede de cômputo global dos membros integrantes deste Conselho, tal como imposto pelo artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, mas, ainda, por tal resultar de um poder funcional geral, radicado no artigo 162.º, alínea a), da Constituição da República Portuguesa, que lhe impõe o dever de vigiar pelo cumprimento da Constituição e da lei.
6.ª Solicitada a análise do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, em razão da situação de impasse em que a Assembleia da República se encontra no cumprimento prático do disposto no artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, uma proposta que, para além de permitir a prossecução do interesse público que a constituição do órgão em crise representa, pode permitir celeridade, imparcialidade e transparência, resume-se na mobilização de um critério aleatório, por meio de sorteio, do género, feminino ou masculino, dos representantes que as entidades, previstas no artigo 6.º, n.º 1, devem designar.
7.ª Para ultrapassar a referida situação real de impasse e à falta de outros critérios que evitem a subjetividade, que a lei não oferece, o critério do sorteio apresenta-se como o mais objetivo e prático. Devem, assim, ser previstas 8 «quotas» para cada sexo (em cumprimento do disposto no artigo 6.º, n.º 2), seja por via informática, seja por via manual (e.g. tômbola), desenvolvendo-se uma operação de sorteio de cada uma dessas «quotas», por exemplo, seguindo a ordem dos representantes prevista nas várias alíneas do artigo 6.º, n.º 1, com exceção do membro por inerência.
8.ª Adicionalmente, uma vez que, nos termos da alínea k), do n.º 1, do artigo 6.º, do referido diploma, deve ser designado um representante por cada uma das cinco comissões de coordenação e desenvolvimento regional, pode seguir-se a ordem de sequência, em relação a cada uma destas comissões, prevista no artigo 15.º, n.º 7, do Decreto-Lei n.º 32/2024, de 10 de maio, que aprova o regime de organização e funcionamento do XXIV Governo Constitucional e no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 36/2023, de 26 de maio, que procede à conversão das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional em institutos públicos.
9.ª Por apelo à unidade do sistema jurídico, na medida em que o instituto do sorteio se revela presente em vários regimes nacionais, enquanto modo de ultrapassar situações de impasse, sendo mobilizado, nomeadamente, em sede de designação de pessoas para o exercício de determinadas tarefas públicas, o referido critério aleatório de resolução da situação de impasse criada na aplicação prática do disposto no artigo 6.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, encontra respaldo jurídico por via da integração de lacunas nos termos do disposto no artigo 10.º, n.º 3, do Código Civil, resolvendo-se a situação segundo «a norma que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema».
10.ª Tendo por base a habilitação legal, prevista no n.º 4, do artigo 12.º, da Lei de Bases do Clima, o referido critério e procedimento de designação que assegure a igualdade paritária deveriam encontrar a sua definição em resolução da Assembleia da República. Apesar de a Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto se dedicar à constituição do Conselho para a Ação Climática, entende-se que este diploma não esgota o âmbito legislativo previsto no referido artigo 14.º, n.º 2, da Lei de Bases do Clima.
N.º 30/2024
RP
Senhor Presidente da Assembleia da República,
Excelência:
Dignou-se Vossa Excelência, por meio do «Despacho n.º 62/XVI – Instituição do Conselho para a Ação Climática», de 30 de outubro de 2024[1]-[2], solicitar a emissão pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República de parecer urgente sobre o regime de representação paritária previsto na composição do Conselho para a Ação Climática, de modo a assegurar o cumprimento do disposto no artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto.
Cumpre, assim, emitir parecer, ao abrigo do disposto no artigo 44.º, alínea a), do Estatuto do Ministério Público[3].
I.
Consulta
A consulta foi formulada nos termos seguintes:
«1. Na ausência de qualquer mecanismo que assegure a efetivação do requisito da paridade de representação de cada sexo no universo dos membros do CAC (como o critério da intercalação previsto na Lei da Paridade), pode o Presidente da Assembleia da República dar posse ao CAC sem que se mostre cumprido o n.º 2 do artigo 6.º da Lei n.º 43/2023, de 14 de Agosto, bastando a mera advertência, junto das entidades designadoras, de que a indicação dos membros do CAC deveria assegurar uma representação paritária?
2. Não sendo admissível, questiona-se se é possível ultrapassar a inexistência de qualquer mecanismo legal de cumprimento ou de operacionalização do limite mínimo fixado no n.º 2 do artigo 6.º da Lei n.º 43/2023, de 14 de Agosto, designadamente por via da analogia ou por via da interpretação extensiva, ou qualquer outro, nomeadamente através da solução apresentada no presente despacho: apreendida a razão de ser da lei (ratio legis), que é a de garantir que a composição do CAC assegure a igualdade de género, cada entidade designadora (com exceção dos membros designados por inerência) deve indicar não um, mas dois representantes, um de cada sexo. Por conseguinte, com o objetivo fixado de assegurar a paridade, perante dois candidatos de dois sexos com idênticas qualificações, deverá ser dada prioridade ao sexo sub-representado, assim se assegurando a conformidade dos objetivos com a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia, em matéria de ação positiva.»
II.
O Conselho para a Ação Climática
1. Hoje a mudança climática («climate change») é um dos assuntos mais sérios e controvertidos da experiência humana e a situação tende a intensificar-se[4], razão pela qual se têm procurado desenvolver mecanismos de mitigação («climate mitigation»)[5]. As medidas de mitigação impõem uma ação ao nível individual, local, regional, nacional e supranacional de modo a reduzir os seus efeitos e nos prepararmos para os impactos de adicionais mudanças projetadas para o futuro[6] – em suma, visam reduzir-se os “stresses climáticos” nos humanos e nos sistemas naturais.
Para além de leis gerais[7], que possam ter impacto na melhoria climática, têm-se desenvolvido leis “específicas”, como acontece, entre nós[8], com a Lei n.º 98/2021, de 31 de dezembro, que define as bases da política do clima e que, em abstrato, refere, no artigo 1.º, n.º 1, que «É reconhecida a situação de emergência climática»[9]. Em geral, como resulta do artigo 3.º, preveem-se os seguintes objetivos da política do clima:
«As políticas públicas do clima visam o equilíbrio ecológico, combatendo as alterações climáticas, e prosseguem os seguintes objetivos:
a) Promover uma transição rápida e socialmente equilibrada para uma economia sustentável e uma sociedade neutras em gases de efeito de estufa;
b) Garantir justiça climática, assegurando a proteção das comunidades mais vulneráveis à crise climática, o respeito pelos direitos humanos, a igualdade e os direitos coletivos sobre os bens comuns;
c) Assegurar uma trajetória sustentável e irreversível de redução das emissões de gases de efeito de estufa;
d) Promover o aproveitamento das energias de fonte renovável e a sua integração no sistema energético nacional;
e) Promover a economia circular, melhorando a eficiência energética e dos recursos;
f) Desenvolver e reforçar os atuais sumidouros e demais serviços de sequestro de carbono;
g) Reforçar a resiliência e a capacidade nacional de adaptação às alterações climáticas;
h) Promover a segurança climática;
i) Estimular a educação, a inovação, a investigação, o conhecimento e o desenvolvimento e adotar e difundir tecnologias que contribuam para estes fins;
j) Combater a pobreza energética, nomeadamente através da melhoria das condições de habitabilidade e do acesso justo dos cidadãos ao uso de energia;
k) Fomentar a prosperidade, o crescimento verde e a justiça social, combatendo as desigualdades e gerando mais riqueza e emprego;
l) Proteger e dinamizar a regeneração da biodiversidade, dos ecossistemas e dos serviços;
m) Dinamizar o financiamento sustentável e promover a informação relativa aos riscos climáticos por parte dos agentes económicos e financeiros;
n) Assegurar uma participação empenhada, ambiciosa e liderante nas negociações internacionais e na cooperação internacional;
o) Estabelecer uma base rigorosa e ambiciosa de definição e cumprimento de objetivos, metas e políticas climáticas; e
p) Reforçar a transparência, a acessibilidade e a eficácia da informação, do quadro jurídico e dos sistemas de informação, reporte e monitorização;
q) Garantir que todas as medidas legislativas e investimentos públicos de maior envergadura sejam avaliados estrategicamente em relação ao seu contributo para cumprir os pressupostos enunciados, integrando os riscos associados às alterações climáticas nas decisões de planeamento e de investimento económico nacional e setorial.»
1.1. A Lei n.º 98/2021, de 31 de dezembro, que define as bases da política do clima, prevê várias normas sobre as competências e a composição do Conselho para a Ação Climática – órgão que poderá desempenhar um papel fulcral na definição da política de ação climática[10] -, merecendo destaque as seguintes:
«Artigo 8.º
Sujeitos
São sujeitos da ação climática:
a) O Estado;
b) Os institutos públicos;
c) As empresas públicas;
d) As regiões autónomas;
e) As autarquias locais e respetivas associações públicas;
f) O Conselho para a Ação Climática, nos termos a definir em diploma próprio;
g) As entidades administrativas independentes com funções de regulação da atividade económica;
h) As organizações não-governamentais de ambiente (ONGA), centros e grupos de investigação e reflexão, e outras organizações não-governamentais, associações ou entidades da sociedade civil;
i) Os cidadãos, as empresas privadas e outras entidades de direito privado.»
«Artigo 12.º
Conselho para a Ação Climática
1 - É criado o Conselho para a Ação Climática, doravante designado por CAC.
2 - O CAC é um órgão especializado, composto por personalidades de reconhecido mérito, com conhecimento e experiência nos diferentes domínios afetados pelas alterações climáticas, incluindo gestão de risco e políticas públicas, e atua com estrita isenção e objetividade, em obediência a critérios técnicos devidamente explicitados, não podendo ser sujeito a direção, superintendência ou tutela governamental.
3 - O CAC é suportado por uma estrutura de apoio técnico, que integra os serviços da Assembleia da República.
4 - A composição, a organização, o funcionamento e o estatuto do CAC e da estrutura de apoio técnico são definidos em resolução da Assembleia da República, considerando os seguintes parâmetros:
a) O Presidente do CAC é o coordenador da estrutura de apoio técnico, sendo designado pela Assembleia da República;
b) O CAC integra obrigatoriamente o presidente do Conselho Nacional de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, um representante das ONGA e, pelo menos, um cidadão jovem residente em Portugal.»
«Artigo 13.º
Competências do Conselho para a Ação Climática
1 - O CAC colabora com a Assembleia da República e com o Governo, nomeadamente na elaboração de estudos, avaliações e pareceres sobre a ação climática e legislação relacionada.
2 - Compete ao CAC pronunciar-se, a título consultivo, sobre o planeamento, a execução e a eficácia da política climática e contribuir para a discussão pública sobre a condução da mesma, tendo em conta as experiências internacionais.
3 - Compete ainda ao CAC:
a) Pronunciar-se regularmente sobre cenários de descarbonização da economia, de acordo com os indicadores de custo e de desenvolvimento de tecnologia mais recentes e com as opções das políticas de apoio à conversão dos setores e agentes económicos envolvidos;
b) Apresentar bienalmente recomendações sobre o desenvolvimento das infraestruturas de energia e transportes;
c) Pronunciar-se em consultas solicitadas pelo Governo e pela Assembleia da República sobre a elaboração, discussão e aprovação de atos legislativos, relatórios e instrumentos de política pública em matéria de ação climática;
d) Emitir parecer sobre o Orçamento do Estado e sobre a Conta Geral do Estado, em matéria de ação climática;
e) Emitir pareceres sobre a evolução da estratégia climática de descarbonização e dos desafios relacionados com os demais gases com efeito de estufa, a médio, longo e muito longo prazos;
f) Apresentar recomendações sobre a aplicação de recursos públicos, investigação e desenvolvimento em áreas relacionadas com o combate às alterações climáticas.
4 - As entidades responsáveis pelo planeamento das redes de distribuição e transporte de eletricidade e gás, das redes de abastecimento de água, de saneamento e tratamento de águas residuais, das redes rodoviárias e ferroviárias nacionais, das infraestruturas de transportes aéreos e marítimos e dos sistemas de transportes públicos das autoridades metropolitanas e das comunidades intermunicipais devem colaborar com o CAC na prossecução das atividades inerentes às suas competências.»
«Artigo 20.º
Instrumentos de planeamento para a mitigação
1 - O Governo elabora e apresenta na Assembleia da República os seguintes instrumentos de planeamento com vista à consecução dos objetivos climáticos em matéria de mitigação:
a) Estratégia de longo prazo;
b) Orçamentos de carbono; e
c) Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC).
2 - O Governo, antes de apresentar um instrumento de planeamento ou a respetiva proposta, consulta o CAC e toma em consideração o seu parecer, sendo este publicado em simultâneo com a apresentação daquele na Assembleia da República.
3 - O CAC emite um parecer sobre os instrumentos de planeamento referidos no número anterior no prazo de 20 dias após ser consultado.
4 - Antes da sua apresentação na Assembleia da República, o Governo submete a consulta pública um projeto de instrumento de planeamento, acompanhado pelo respetivo parecer do CAC, assegurando a audição das seguintes entidades:
a) Regiões autónomas;
b) Comissões de coordenação e desenvolvimento regional;
c) Associação Nacional de Municípios Portugueses;
d) Associação Nacional de Freguesias;
e) Conselho Económico e Social; e
f) Conselho Nacional do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
5 - O Governo pode atualizar, de cinco em cinco anos, os instrumentos de planeamento, devendo apresentar tais atualizações na Assembleia da República e assegurar o cumprimento do disposto no presente artigo.
6 - A estratégia de longo prazo estabelece os objetivos e as linhas gerais de condução da política climática com uma perspetiva de 30 anos.
7 - Os orçamentos de carbono estabelecem um limite total de cinco anos de emissões de gases de efeito de estufa, em alinhamento com os restantes instrumentos de política climática e as orientações internacionais, fazendo uma análise prospetiva da política climática para assegurar o cumprimento daquele limite.
8 - Os orçamentos de carbono para o período 2023-2025 e para o quinquénio 2025-2030 são, excecionalmente, definidos no prazo de um ano após a entrada em vigor da presente lei.
9 - O PNEC adota a estratégia nacional da política climática para o período de 10 anos subsequente à sua aprovação.
10 - Os instrumentos de planeamento previstos no presente artigo são consistentes com as metas previstas na presente lei e coerentes entre si.
11 - Os instrumentos de planeamento previstos no presente artigo são discutidos e votados no prazo de 90 dias após a data da sua admissão pela Assembleia da República.»
«Artigo 23.º
Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas
1 - O Governo elabora e apresenta na Assembleia da República uma Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas (ENAAC), a vigorar por um período de 10 anos, e as suas revisões ou atualizações.
2 - A ENAAC adota um horizonte temporal compatível com o período de referência do PNEC.
3 - A ENAAC adota a estratégia nacional para o período em referência no que concerne à adaptação do território, das comunidades e das atividades económicas e sociais às alterações climáticas, aos seus riscos e aos seus impactes.
4 - Na análise prospetiva de riscos e impactes, a ENAAC considera os seguintes elementos:
a) Vários cenários, entre os quais de políticas invariantes;
b) Objetivos nacionais, regionais e setoriais de ações de adaptação, devidamente calendarizadas;
c) Medidas a adotar baseadas no cenário mais provável ou mais prudente;
d) Avaliação do custo-eficácia e necessidade de avaliações de impacte ambiental das medidas a adotar.
5 - O Governo, antes de apresentar a ENAAC ou o seu projeto ou anteprojeto, consulta o CAC e toma em consideração o seu parecer, sendo este publicado em simultâneo com a apresentação daquela na Assembleia da República.
6 - O CAC emite parecer sobre a ENAAC no prazo máximo de 20 dias após ser consultado.
7 - O Governo submete a consulta pública o projeto da ENAAC, acompanhado de parecer do CAC, assegurando a audição das seguintes entidades:
a) Regiões autónomas;
b) Comissões de coordenação e desenvolvimento regional;
c) Associação Nacional de Municípios Portugueses;
d) Associação Nacional de Freguesias;
e) Conselho Económico e Social; e
f) Conselho Nacional do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
8 - Decorrido metade do prazo de vigência da ENAAC, o Governo apresenta na Assembleia da República uma atualização da mesma, nos termos dos números anteriores.
9 - A ENAAC e as suas atualizações são discutidas e votadas no prazo de 90 dias após a data da sua admissão pela Assembleia da República.»
«Artigo 26.º
Avaliação contínua, intermédia e ex post
1 - O Governo elabora e apresenta na Assembleia da República um relatório anual sobre:
a) O estado de execução dos instrumentos de planeamento;
b) As políticas e medidas em matéria de gases de efeito de estufa, bem como o progresso alcançado em matéria de emissões nacionais de gases de efeito de estufa por fontes e remoções por sumidouros; e
c) As ações de adaptação às alterações climáticas.
2 - O Governo elabora e apresenta na Assembleia da República um relatório anual sobre a utilização de receitas geradas através do leilão de licenças de emissão.
3 - O CAC elabora um parecer sobre os relatórios referidos nos números anteriores no prazo de 20 dias após a sua apresentação na Assembleia da República.
4 - Os relatórios e pareceres referidos no presente artigo são disponibilizados ao público.»
«Artigo 29.º
Programação orçamental
1 - Sem prejuízo da sua inscrição em diversos programas orçamentais setoriais, a dotação orçamental para fins de política climática deve ser consolidada numa conta do Orçamento do Estado.
2 - O Governo assegura a integração dos cenários climáticos nos modelos que subjazem às previsões e cenários macroeconómicos que sustentam o Orçamento do Estado, devendo incluir explicitamente uma previsão das emissões de gases de efeito de estufa para o ano económico a que respeita.
3 - O Orçamento do Estado deve, no relatório que o acompanha:
a) Identificar as medidas a adotar pelo Governo em matéria de política climática;
b) Indicar a dotação orçamental consolidada a disponibilizar para a execução da política climática nos vários programas orçamentais; e
c) Apresentar uma estimativa do contributo das medidas inscritas para o cumprimento das metas previstas na presente lei.
4 - A Conta Geral do Estado deve, no relatório que a acompanha:
a) Identificar as medidas executadas pelo Governo em matéria de política climática;
b) Indicar a execução orçamental consolidada das iniciativas de ação climática dos vários programas orçamentais; e
c) Apresentar uma estimativa da redução obtida ou prevista de gases de efeito de estufa para cada uma das medidas.
5 - O CAC emite parecer sobre o Orçamento do Estado e sobre a Conta Geral do Estado, nos termos previstos na presente lei.»
«Artigo 62.º
Investigação, desenvolvimento e inovação no âmbito das alterações climáticas
O Estado promove a investigação, o desenvolvimento e a inovação em matéria de alterações climáticas, utilizando para este efeito, a título consultivo, as recomendações do CAC.»
«Artigo 68.º
Estratégia industrial verde
1 - O Governo elabora e apresenta na Assembleia da República, até 24 meses após a entrada em vigor da presente lei, a estratégia industrial verde.
2 - A estratégia industrial verde visa proporcionar um enquadramento estratégico que apoie as empresas no processo de transição climática do setor industrial e no cumprimento dos objetivos fixados na presente lei, reforçando a sua competitividade sustentável.
3 - O Governo, antes de apresentar a proposta de estratégia industrial verde, consulta o CAC e toma em consideração o seu parecer, sendo este publicado em simultâneo com a apresentação daquela na Assembleia da República.
4 - O CAC emite parecer sobre a estratégia industrial verde no prazo de 20 dias após ser consultado.
5 - O Governo submete a consulta pública um projeto de estratégia industrial verde, acompanhado pelo respetivo parecer do CAC, devendo assegurar a audição das seguintes entidades:
a) Regiões autónomas;
b) Comissões de coordenação e desenvolvimento regional;
c) Associação Nacional de Municípios Portugueses;
d) Associação Nacional de Freguesias;
e) Conselho Económico e Social;
f) Conselho Nacional do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável;
g) Confederação Empresarial de Portugal.
6 - O Governo articula a agenda de inovação e desenvolvimento no combate às alterações climáticas com a estratégia industrial verde.»
1.2. Como resulta da Lei de Bases do Clima, para além da previsão do Conselho para a Ação Climática, os parâmetros conformadores deste órgão são relativamente escassos, sendo aquele melhor compreendido pelas vastas competências que lhe são atribuídas ao longo deste diploma. Assim, apenas são definidos alguns parâmetros[11], assumindo destaque que o Conselho para a Ação Climática deve ser definido em diploma próprio e surgindo este como um dos sujeitos da ação climática. Caracteriza-se como um órgão especializado, composto por personalidades de reconhecido mérito, com conhecimento e experiência nos diferentes domínios afetados pelas alterações climáticas, incluindo gestão de risco e políticas públicas, e atua com estrita isenção e objetividade, em obediência a critérios técnicos devidamente explicitados, não podendo ser sujeito a direção, superintendência ou tutela governamental. Ao abrigo da Lei de Bases do Clima, em referência, a sua composição, a organização, funcionamento e estatuto e da estrutura de apoio técnico são definidos em resolução da Assembleia da República, tendo em conta que o seu Presidente é o coordenador da estrutura de apoio técnico, sendo designado pela Assembleia da República; integrando obrigatoriamente o presidente do Conselho Nacional de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, um representante das ONGA e, pelo menos, um cidadão jovem residente em Portugal.
Em matéria de competências, é de destacar que este órgão deve colaborar com a Assembleia da República e com o Governo, nomeadamente na elaboração de estudos, avaliações e pareceres sobre a ação climática e legislação relacionada, devendo pronunciar-se, a título consultivo, sobre o planeamento, a execução e a eficácia da política climática e contribuir para a discussão pública sobre a condução da mesma, tendo em conta as experiências internacionais. Em particular, e a título exemplificativo, deve ser consultado pelo Governo, antes de este apresentar um instrumento de planeamento ou a respetiva proposta e antes de apresentar a Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas ou o seu projeto ou anteprojeto. Devendo ser consultado pelo Estado, sempre que este promova a investigação, o desenvolvimento e a inovação em matéria de alterações climáticas e, ainda, antes de o Governo apresentar a sua proposta de estratégia industrial verde.
2. Posteriormente à Lei de Bases do Clima foi aprovada a Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, que estabelece a composição, organização e funcionamento do Conselho para a Ação Climática, previsto no n.º 4 do artigo 12.º da Lei de Bases do Clima. Este diploma é composto por dezoito artigos. Assume especial destaque o regime previsto nos artigos 5.º, 6.º e 7.º do referido diploma:
«Artigo 5.º
Competências
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 13.º da Lei de Bases do Clima, compete ao CAC pronunciar-se sobre o planeamento, a execução e a eficácia da política climática, contribuindo para a discussão pública sobre a condução da mesma, tendo em conta a realidade internacional.
2 - Compete ainda ao CAC:
a) Pronunciar-se regularmente sobre cenários de descarbonização da economia, de acordo com os indicadores de custo e de desenvolvimento de tecnologia mais recentes e com as opções das políticas de apoio à conversão dos setores e agentes económicos envolvidos;
b) Apresentar bienalmente recomendações sobre o desenvolvimento das infraestruturas de energia e transportes;
c) Pronunciar-se em consultas solicitadas pelo Governo e pela Assembleia da República sobre a elaboração, discussão e aprovação de atos legislativos, relatórios e instrumentos de política pública em matéria de ação climática
d) Emitir parecer sobre o Orçamento do Estado e sobre a Conta Geral do Estado;
e) Emitir pareceres sobre a evolução da estratégia climática de descarbonização e dos desafios relacionados com os demais gases com efeito de estufa, a médio, longo e muito longo prazos;
f) Emitir pareceres sobre políticas e medidas de adaptação às alterações climáticas a nível nacional, regional e setorial;
g) Apresentar recomendações sobre a aplicação de recursos públicos, investigação e desenvolvimento em áreas relacionadas com o combate às alterações climáticas.»
«Artigo 6.º
Composição
1 - O CAC é composto por 17 membros de reconhecido mérito, com conhecimento e experiência nos diferentes domínios afetados pelas alterações climáticas:
a) Presidente e vice-presidente do CAC, designados pela Assembleia da República, a indicar pelos partidos com representação parlamentar, de acordo com o método D'Hondt;
b) Um designado pelo Governo;
c) O presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável, como membro por inerência;
d) Um representante das organizações não-governamentais de ambiente com experiência e intervenção na área climática, com estatuto de utilidade pública, designado pela Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente;
e) Um cidadão com idade igual ou inferior a 30 anos, residente em Portugal, designado pelo Conselho Nacional de Juventude;
f) Um designado pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas;
g) Um designado pelo Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos;
h) Um designado pela Associação Nacional dos Municípios Portugueses;
i) Um designado pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira;
j) Um designado pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores;
k) Um designado por cada uma das cinco comissões de coordenação e desenvolvimento regional;
l) Um designado pelo Conselho Económico e Social.
2 - A designação dos membros do CAC deve assegurar uma representação paritária, não podendo integrar menos de oito elementos de cada sexo.
3 - O CAC pode requerer ou convidar outras entidades, personalidades ou peritos a participarem nas suas reuniões, sempre que tal se afigure relevante.»
«Artigo 7.º
Mandato
1 - O mandato dos membros do CAC tem a duração de cinco anos.
2 - O mandato é renovável por uma vez consecutiva, não podendo um membro voltar a ser designado antes de decorridos quatro anos desde o termo do seu último mandato.
3 - Até 60 dias antes do final do mandato deve proceder-se à designação dos novos membros, sendo a composição completa dos membros do CAC publicada na 2.ª série do Diário da República.
4 - Os membros do CAC tomam posse perante o Presidente da Assembleia da República, no prazo máximo de 30 dias após o final do mandato dos seus antecessores ou da publicação da respetiva designação.
5 - O mandato dos membros do CAC cessa:
a) Na data do respetivo termo, sem prejuízo da manutenção em funções até tomada de posse dos novos membros;
b) Por morte ou incapacidade permanente;
c) Por renúncia.
6 - A cessação antecipada do mandato de algum membro do CAC determina a respetiva substituição, através de processo idêntico ao adotado para a designação do membro a substituir.»
3. O confronto do regime do previsto no artigo 12.º, n.º 4, da Lei n.º 98/2021, de 31 de dezembro com o disposto no artigo 6.º da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto revela que o legislador deste último diploma optou por um modelo mais extenso e diversificado no que tange à composição do Conselho para a Ação Climática.
Assim, no artigo 12.º, n.º 4, da Lei n.º 98/2021, de 31 de dezembro, prevê-se que o Conselho para a Ação Climática tem na composição, como presidente, o coordenador da estrutura de apoio técnico, sendo designado pela Assembleia da República; integrando obrigatoriamente o presidente do Conselho Nacional de Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, um representante das ONGA e, pelo menos, um cidadão jovem residente em Portugal.
Já o artigo 6.º da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto alarga a composição do Conselho para a Ação Climática para 17 membros de reconhecido mérito, com conhecimento e experiência nos diferentes domínios afetados pelas alterações climáticas, sendo o presidente e vice-presidente designados pela Assembleia da República, a indicar pelos partidos com representação parlamentar; um representante designado pelo Governo; o presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável, como membro por inerência; um representante das organizações não-governamentais de ambiente com experiência e intervenção na área climática, com estatuto de utilidade pública, designado pela Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente; um cidadão com idade igual ou inferior a 30 anos, residente em Portugal, designado pelo Conselho Nacional de Juventude; um representante designado pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas; um representante designado pelo Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos; um representante designado pela Associação Nacional dos Municípios Portugueses; um representante designado pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira; um representante designado pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores; um representante designado por cada uma das cinco comissões de coordenação e desenvolvimento regional; um representante designado pelo Conselho Económico e Social; por fim, podem convidar-se outras entidades, personalidades ou peritos a participarem nas suas reuniões, sempre que tal se afigure relevante.
De forma inovatória, o artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto vem prever que a designação dos membros do Conselho para a Ação Climática deve assegurar uma representação paritária, não podendo integrar menos de oito elementos de cada sexo.
III.
A representação paritária na composição do Conselho para a Ação Climática
- O tema da representação paritária ou representação equilibrada de género[12], prevista na Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, não é uma novidade no ordenamento jurídico português, uma vez que se encontra prevista em alguns setores da atividade pública e privada com reflexo em vários diplomas nacionais.
1.1. A recensão destes regimes já foi feita por este Conselho Consultivo no Parecer n.º 16/2024, de 23 de maio. Aí se esclareceu:
«Para melhor contextualização, releva ter em conta que os regimes jurídicos relativos à representação equilibrada de ambos os sexos nos órgãos de entes públicos e privados – de que são exemplos os referidos na Lei n.º 23/2024, de 15 de fevereiro e na Lei n.º 62/2017, de 1 de agostox – surgem, desde logo, ao abrigo da “norma-tarefa”x1 prevista no artigo 9.º, alínea h), da Constituição da República Portuguesa, que prevê, como tarefas fundamentais do Estado, a promoção da igualdade entre homens e mulheres e que encontra como uma das principais medidas da sua promoção a criação de “quotas de género”x2. No entanto, tal tarefa “que não se trata de favorecer unilateralmente um dos sexosx3” deve ser ponderada com a prossecução de outros valoresx4, nomeadamente, com a liberdade associativa (artigo 46.º da Constituição da República Portuguesa)x5.
É ainda, neste âmbito, que melhor se compreendem também a Lei Orgânica n.º 3/2006, de 21 de agosto, que aprova a Lei da Paridade nos Órgãos Colegiais Representativos do Poder Políticox6 e a Lei n.º 26/2019, de 28 de março, que aprova o regime da representação equilibrada entre homens e mulheres no pessoal dirigente e nos órgãos da Administração Pública.
2. A este propósito, no contexto internacional, é de destacar a Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW), adotada em 1979 pela Assembleia Geral das Nações Unidas e ratificada por Portugal em 1980x7 e a Recomendação do Comité de Ministros do Conselho da Europa, de 12 de março de 2003, sobre participação equilibrada de mulheres e homens na tomada de decisão política e pública [REC (2003) 3 (Conselho da Europa, 2003)]x8.
Já no contexto da União Europeia, destaca-se o disposto no artigo 8.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE) que prevê que «[n]a realização de todas as suas ações, a União terá por objetivo eliminar as desigualdades e promover a igualdade entre homens e mulheres» e ainda o disposto no artigo 23.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, ao determinar que «[d]eve ser garantida a igualdade entre homens e mulheres em todos os domínios, incluindo em matéria de emprego, trabalho e remuneração» e que «[o] princípio da igualdade não obsta a que se mantenham ou adotem medidas que prevejam regalias específicas a favor do sexo sub-representado». Este princípio de ação positiva eÌ igualmente reconhecido no artigo 157.º, n.º 4, do TFUE. É, aliás, neste contexto que surgiu a Proposta de Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aÌ€ melhoria do equilíbrio entre homens e mulheres no cargo de administrador não-executivo das empresas cotadas em bolsa e a outras medidas conexasx9 (…)[13]. É ainda de destacar que esta proposta previa que as imposições de privilegiar o sexo sub-representado deveriam assentar numa base de anaÌlise comparativa das qualificações de cada candidato, em função de criteÌrios preÌ-estabelecidos, claros, neutros e inequívocos. Assim, de modo a conciliar a igualdade formal de tratamento e a ação positiva, devem estar verificados vários critérios, como tem sido exigido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, a fim de introduzir uma igualdade de facto, a saber: (i) as medidas devem dizer respeito a um setor em que as mulheres se encontrem sub-representadas; (ii) soÌ pode ser dada prioridade aÌ€s mulheres com qualificações equivalentes às dos candidatos masculinos; (iii) não pode ser atribuída uma prioridade automática e incondicional aos candidatos igualmente qualificados, devendo prever-se uma «cláusula de salvaguarda» que contemple a possibilidade de se conceder derrogações em casos justificados, que tenham em conta a situação concreta, nomeadamente a situação pessoal de cada candidatox10.
3. No âmbito da organização administrativa nacional são também de destacar alguns diplomas com a inclusão de normas específicas sobre a promoção da paridade de género, como acontece com o previsto pela Lei n.º 67/2013, de 28 de agosto, que aprova a Lei-quadro das entidades administrativas independentes com funções de regulação da atividade económica dos setores privado, público e cooperativox11, que determina no n.º 8 do artigo 17.º que “[o] provimento do presidente do conselho de administração deve garantir a alternância de género e o provimento dos vogais deve assegurar a representação mínima de 33/prct. de cada género» e pelo Decreto-Lei n.º 133/2013, de 3 de outubro, que aprovou o regime do Setor Público Empresarialx12, que, no n.º 6, do artigo 31.º, prevê que «[c]ada um dos órgãos de administração e de fiscalização das empresas públicas deve ter por objetivo a presença plural de homens e mulheres na sua composição» e cujo artigo 50.º, n.º 2, determina que: «[a]s empresas públicas adotam planos de igualdade tendentes a alcançar uma efetiva igualdade de tratamento e de oportunidades entre homens e mulheres, a eliminar discriminações e a permitir a conciliação entre a vida pessoal, familiar e profissional».
Ainda no contexto público, mas agora da perspetiva da atividade administrativa e, em particular, no âmbito da administração dos fundos europeus, previa o Decreto-Lei n.º 159/2014, de 27 de outubro, que estabelece as regras gerais de aplicação dos programas operacionais e dos programas de desenvolvimento rural financiados pelos fundos europeus estruturais e de investimento, para o período de programação 2014-2020x13, no n.º 3, do artigo 17.º, a propósito das candidaturas a fundos europeus estruturais e de investimento que «[a] maior representatividade de mulheres nos órgãos de direção, de administração e de gestão e a maior igualdade salarial entre mulheres e homens que desempenham as mesmas ou idênticas funções, na entidade candidata, são ponderadas para efeitos de desempate entre candidaturas aos fundos da política de coesão, quando aplicável».
4. No âmbito privado, destaca-se o Decreto-Lei n.º 157/2014, de 24 de outubrox14 que, no artigo 30.º, n.º 6, determina para os órgãos de administração e fiscalização das instituições de crédito e das sociedades financeiras que «[a] política interna de seleção e avaliação dos membros dos órgãos de administração e fiscalização deve promover a diversidade de qualificações e competências necessárias para o exercício da função, fixando objetivos para a representação de homens e mulheres e concebendo uma política destinada a aumentar o número de pessoas do género sub-representado com vista a atingir os referidos objetivos».
No artigo 115.º-B, n.º 2, alínea b), prevê que «[s]ão competências do comité de nomeações relativamente aos órgãos de administração e fiscalização: b) Fixar um objetivo para a representação de homens e mulheres naqueles órgãos e conceber uma política destinada a aumentar o número de pessoas do género sub-representado com vista a atingir os referidos objetivos» e no número 5 do mesmo artigo determina que «[o] objetivo e a política para a representação do género sub-representado referidos na alínea b) do n.º 2 do artigo 435.º do Regulamento (UE) n.º 575/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, bem como a respetiva aplicação, são publicados nos termos da alínea c) do n.º 2 desse mesmo artigo».
5. No contexto desportivo, é de ter em conta o disposto nos artigos 20.º, n.ºs 1 e 5 e 48.º da Lei n.º 39/2023, de 4 de agosto, que estabelece o regime jurídico das sociedades desportivas e revoga o Decreto-Lei n.º 10/2013, de 25 de janeiro.
5.1. O artigo 20.º, sob a epígrafe «Regime de paridade de sexo», prevê que:
«1 - A proporção de pessoas de cada sexo designadas para cada órgão de administração e de fiscalização de sociedade desportiva não pode ser inferior a 33,3 /prct..
2 - Os limiares referidos no número anterior devem ser cumpridos relativamente à totalidade dos membros, executivos e não executivos, que integrem os órgãos de administração.
3 - Os limiares definidos no n.º 1 não se aplicam aos mandatos em curso, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
4 - A renovação e a substituição no mandato obedecem aos limiares definidos no n.º 1.
5 - Ao incumprimento dos limiares mínimos a que se refere o presente artigo aplica-se o regime sancionatório previsto no artigo 6.º da Lei n.º 62/2017, de 1 de agosto, que aprova o regime da representação equilibrada entre mulheres e homens nos órgãos de administração e de fiscalização das entidades do setor público empresarial e das empresas cotadas em bolsa.
6 - O presente artigo não se aplica às sociedades desportivas cotadas em bolsa já abrangidas pela Lei n.º 62/2017, de 1 de agosto.»
5.2. Por fim, o artigo 48.º, sob a epígrafe «Norma transitória», determina que:
«A proporção de pessoas de cada sexo a designar para cada órgão de administração e de fiscalização de cada sociedade desportiva não pode ser inferior a 20 /prct., a partir da primeira assembleia geral eletiva após a entrada em vigor da presente lei, e a 33,3 /prct., a partir da primeira assembleia geral eletiva após 1 de janeiro de 2025.»
6. A nível institucional assume relevância a Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género que, nos termos do Decreto-Regulamentar n.º 1/2012, de 6 de janeiro, que estabeleceu a sua orgânica, se prevê que tem por missão garantir a execução das políticas públicas no âmbito da cidadania e da promoção e defesa da igualdade de género (artigo 2.º, n.º 1).
Este serviço central da administração directa do Estado, de acordo com o disposto no artigo 8.º da Lei n.° 62/2017, de 1 de agosto, é responsável pelo acompanhamento do regime da representação equilibrada entre mulheres e homens nos órgãos de administração e de fiscalização das entidades do setor público empresarial e das empresas cotadas em bolsa.»
1.2. Importa ainda ter em conta o regime sancionatório previsto pela Lei n.º 62/2017, de 1 de agosto. Assim, o artigo 6.º da Lei n.° 62/2017, de 1 de agosto, sob a epígrafe «Incumprimento», determina o seguinte:
«1 - O incumprimento dos limiares mínimos determina:
a) A nulidade do ato de designação para os órgãos de administração e de fiscalização das entidades do setor público empresarial, devendo os membros do Governo responsáveis pela área das finanças e pelo respetivo setor de atividade, quando aplicável, apresentar novas propostas que cumpram o limiar definido no n.º 1 do artigo 4.º, no prazo de 90 dias;
b) A declaração, pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, do incumprimento e do caráter provisório do ato de designação, no caso de empresas cotadas em bolsa, as quais dispõem do prazo de 90 dias para procederem à respetiva regularização.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, deve ser convocada assembleia geral eletiva para sanar o incumprimento, devendo os proponentes das listas para os órgãos de administração em causa apresentar uma declaração de cumprimento dos limiares de representação equilibrada.
3 - A manutenção do incumprimento no termo do prazo indicado no n.º 1 determina a aplicação de uma repreensão registada ao infrator e a publicitação integral da mesma num registo público, disponibilizado para o efeito nos sítios na Internet da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género, da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego e da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, a regulamentar por portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, da economia e da igualdade de género.
4 - Em caso de manutenção do incumprimento por empresa cotada em bolsa, por período superior a 360 dias a contar da data da repreensão, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários aplica uma sanção pecuniária compulsória, em montante não superior ao total de um mês de remunerações do respetivo órgão de administração ou de fiscalização, por cada semestre de incumprimento.
5 - A aplicação da sanção pecuniária compulsória prevista no número anterior é precedida da audiência prévia da empresa visada, nos termos a fixar em regulamento da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.
6 - As receitas provenientes da aplicação da sanção pecuniária compulsória são distribuídas da seguinte forma: a) 40 /prct. para a Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género; b) 40 /prct. para a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários; c) 20 /prct. para a receita geral do Estado.
7 - O disposto na alínea a) do n.º 1 não prejudica a adoção dos procedimentos legais para o preenchimento, a título provisório, do cargo a que a nulidade respeita, desde que observados os limiares previstos no artigo 4.º».
Por fim, deve ainda ter-se em conta que este regime veio a ser regulamentado pela Portaria n.º 174/2019, de 6 de junho, que rege os termos da repreensão registada prevista na Lei n.º 62/2017, de 1 de agosto e pelo Despacho Normativo n.º 18/2019, de 21 de junho, que determina os procedimentos para a realização das comunicações a que estão obrigadas as entidades do setor público empresarial e as empresas cotadas em bolsa, os termos da articulação de competências entre a Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego, e a produção de um guião para efeito de elaboração dos planos para a igualdade anuais, nos termos previstos nos artigos 10.º e 11.º da Lei n.º 62/2017, de 1 de agosto.
2. Como já referido, a representação paritária na composição do Conselho para a Ação Climática está prevista no artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, cabendo, pelas razões que se apresentarão mais adiante, ao Presidente da Assembleia da República assegurar o seu cumprimento, em sede de instituição deste órgão consultivo.
2.1. Apesar de estar em causa uma norma imperfeita[14], uma vez que não está prevista uma sanção jurídica para o incumprimento desta medida de ação positiva – ao contrário do que se verifica noutros diplomas que preveem medidas próximas, nomeadamente, no regime da representação equilibrada entre mulheres e homens nos órgãos de administração e de fiscalização das entidades do setor público empresarial e das empresas cotadas em bolsa[15] –, deve ser assegurado o cumprimento da legalidade, desde logo, por tal resultar de um poder funcional do Presidente da Assembleia da República, radicado no artigo 162.º, alínea a) da Constituição da República Portuguesa, que impõe lhe o dever de vigiar pelo cumprimento da Constituição e da lei.
Como se afirmou no Parecer n.º 23/2024, de 5 de setembro de 2024:
«§41. — O Presidente da Assembleia da Repúblicax15 é um órgão constitucional que, embora integre o complexo de órgãos parlamentares, desempenha funções próprias no sistema de governo, dentro e fora do Parlamento.
O papel do Deputado eleito Presidente da Assembleia da República não se reduz ao de um simples primus inter paresx16.
Tão-pouco se limitam as suas competências ao estrito quadro parlamentar, pois cumprem-lhe relevantes competências próprias que exerce com independência relativamente à Assembleia da República, designadamente a de assegurar a continuidade do órgão Presidente da República, durante os impedimentos temporários do seu titular, bem como durante a vacatura do cargo até tomar posse um novo Presidente eleito (artigo 132.º, n.º 1, da CRP).
De igual modo, integra, por inerência, o Conselho de Estado [artigo 142.º, alínea a), da CRP], independentemente dos cinco cidadãos eleitos pela Assembleia da República, nos termos do artigo 142.º, alínea h), da Constituição.»
Mais adiante, esclarece o Parecer em citação que:
«§45. — O Presidente da Assembleia da República encontra-se na primeira linha da observância da Constituição e da lei pelo Parlamento, cumprindo-lhe exercer com esse escopo todas as competências que a Constituição, o Regimento e a lei lhe confiram.
O desempenho das suas múltiplas competências subordina-se à Constituição, à lei e ao Regimento e não se encontra adstrito às deliberações de nenhum outro órgão da Assembleia da República se não aquelas que forem tomadas pelo Plenário, designadamente em recurso dos seus atos.»
2.2. Destarte, importa responder à primeira questão elencada na Consulta, que relembre-se, questionava:
«1. Na ausência de qualquer mecanismo que assegure a efetivação do requisito da paridade de representação de cada sexo no universo dos membros do CAC (como o critério da intercalação previsto na Lei da Paridade), pode o Presidente da Assembleia da República dar posse ao CAC sem que se mostre cumprido o n.º 2 do artigo 6.º da Lei n.º 43/2023, de 14 de Agosto, bastando a mera advertência, junto das entidades designadoras, de que a indicação dos membros do CAC deveria assegurar uma representação paritária?».
Antes de mais, importa ter presente que o Senhor Presidente da Assembleia da República é o único que está em condições de garantir a paridade de género, não apenas por tal ratio de género apenas ser conhecido em sede de cômputo global dos membros designados para o Conselho para a Ação Climática (como previsto no artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto), mas ainda, por, nos termos do artigo 6.º, n.º 1, do diploma em referência, as entidades aí elencadas apenas poderem indicar os seus respetivos representantes, sem qualquer controlo sobre os representantes designados pelas restantes entidades. Logo, só no momento em que se conheçam a maioria destes representantes é que pode aquilatar-se do cumprimento da regra da paridade imposta pelo regime, sendo o Presidente da Assembleia da República o mais bem posicionado para fazer esse controlo de legalidade e de constitucionalidade.
Para além dos deveres resultantes de princípios gerais da atividade pública, como o da legalidade[16] e prossecução do interesse público[17]-[18], resulta um poder funcional geral, radicado no artigo 162.º, alínea a), da Constituição da República Portuguesa, que lhe impõe o dever de vigiar pelo cumprimento da Constituição e da lei. Pelo que, em síntese, deve ser encontrada uma solução em conformidade com as medidas de ação positiva previstas pelo legislador.
3. Tendo em vista o cumprimento do disposto no artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, o «Despacho n.º 62/XVI – Instituição do Conselho para a Ação Climática» do Senhor Presidente da Assembleia da República adianta a solução de a representação paritária na composição do Conselho para a Ação Climática ter lugar por via da nomeação de dois representantes por cada entidade com exceção da representação do presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável[19], como membro por inerência[20], sendo depois selecionado, de entre os dois candidatos de diferentes géneros, o mais qualificado e, no caso de perfil idêntico, privilegiar-se-ia o sexo sub-representado.
Esta solução, tal como resulta da razão da presente Consulta, pressupõe que não foi possível chegar a uma solução de consenso, mediada pelo Senhor Presidente da Assembleia da República, no que tange às entidades disponíveis para voluntariamente e em face de uma situação de impasse, indicarem novo representante de modo a que, no cômputo global, fosse possível a designação de oito elementos de cada sexo, no universo dos dezassete membros que devem integrar o Conselho para a Ação Climática.
3.1. Em face da situação de paralisia decisória – não admissível –, como visto supra (III.2.2), emerge o problema da necessidade da garantia de efetiva representação paritária na composição do Conselho para a Ação Climática, ou seja, uma representação – com exceção do membro por inerência – de absoluta paridade: oito elementos do género feminino e oito elementos do género masculino. Assim, impõe-se procurar um critério prático que dê resposta, não apenas ao quadro legal, mas que permita ainda uma resposta célere[21], tendo em conta que, nos termos do artigo 17.º da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, se determina que «A presente lei produz efeitos com a entrada em vigor do Orçamento do Estado subsequente à sua publicação», portanto, em 1 de janeiro de 2025.
Antes de se avançar, importa deixar referido que a solução prevista no diploma em análise se revela muito menos flexível do que a prevista em vários diplomas em que se estabelecem percentagens de 33/prct. ou 40/prct. de «quotas de género»[22]. Hipóteses que, apesar, de não serem tão exigentes ao nível da representação igualitária, não deixam de apresentar uma margem de flexibilidade maior, permitindo cumprimento das mesmas de modo mais facilitado.
3.2. Impõe-se agora responder à segunda questão da Consulta que, relembre-se, questionava:
«(...) é possível ultrapassar a inexistência de qualquer mecanismo legal de cumprimento ou de operacionalização do limite mínimo fixado no n.º 2 do artigo 6.º da Lei n.º 43/2023, de 14 de Agosto, designadamente por via da analogia ou por via da interpretação extensiva, ou qualquer outro, nomeadamente através da solução apresentada no presente despacho: apreendida a razão de ser da lei (ratio legis), que é a de garantir que a composição do CAC assegure a igualdade de género, cada entidade designadora (com exceção dos membros designados por inerência) deve indicar não um, mas dois representantes, um de cada sexo. Por conseguinte, com o objetivo fixado de assegurar a paridade, perante dois candidatos de dois sexos com idênticas qualificações, deverá ser dada prioridade ao sexo sub-representado, assim se assegurando a conformidade dos objetivos com a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia, em matéria de ação positiva.»
Apontando diretamente a solução para o problema subjacente à segunda questão da Consulta, crê-se que o critério mais adequado para a determinação de que entidades devem indicar representantes do género feminino ou masculino seja o aleatório, ou seja, por via do sorteio das entidades que devem apresentar um representante do género que lhe «calhar na sorte». Assim, perante uma situação real de impasse e à falta de outros critérios que evitem a subjetividade, que a lei não oferece e que o Senhor Presidente da Assembleia da República não assumiu, importa procurar uma solução objetiva, imparcial e transparente[23]. Aliás, se a lei pretendesse ter atribuído essa função de escolha ao Senhor Presidente da Assembleia da República deveria tê-lo feito expressamente. Logo, caso uma determinada entidade pretendesse designar um representante de um sexo e lhe tenha calhado em sorte o dever de designar alguém do outro sexo, não está em causa uma hipótese de ilegalidade, mas de azar. A lei apenas impõe a igualdade de género (oito representantes do género feminino e oito representantes do género do masculino), não determinando que (qual ou quais) entidade deve indicar um determinado de género – interessa uma igualdade de resultados: igualdade de género na representação do Conselho para a Ação Climática.
O critério do sorteio é mobilizado em “situações de impasse”[24], desde logo, porque não se deve admitir que parte da efetivação da Lei de Bases do Clima fique em falta em razão de uma norma inoperativa na instituição de um órgão (operatividade imposta por razões de prossecução constitucional do interesse público[25], devendo ser cumprida a vontade legislativa), como acontece na situação que nos ocupa, uma vez que, em face dos elementos de género adiantados pelos diferentes entes responsáveis pela designação de representantes do Conselho para a Ação Climática se apurou uma maioria masculina, ficando por determinar que entidades devem indicar elementos de que sexo – aqui, em face o regime previsto no artigo 6.º, n.º 1, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, dada a diversidade de entes envolvidos aí previstos e tendo presente que o legislador não positivou nenhum critério que permita assegurar efetivamente a representação paritária, qualquer outro critério tenderá a resvalar para o subjetivismo.
Repare-se que, contrariamente, à solução proposta no «Despacho n.º 62/XVI – Instituição do Conselho para a Ação Climática», em que se criaria uma situação de «competição»[26] de géneros e, em caso de igualdade mérito (portanto, sujeito a uma exigência de avaliação fundamentada), seria dado privilégio ao sexo sub-representado, o que sempre revelaria uma margem subjetividade (desde logo, por ser feita a posteriori – depois de conhecidos os perfis), dando oportunidade para eventual “taticismo”, e criando uma das situações não queridas pelas medidas de ação positiva (positive actions) que é o da perceção da perda de oportunidades de um dos sexos (dispreferred individuals[27]). Tenha-se em conta que, na situação que nos ocupa, não se pretende escolher o melhor “candidato”, não se está perante um concurso (ao contrário do que se verifica na jurisprudência europeia)[28] mas, antes, perante uma situação em que se assume a elevada especialidade dos elementos a designar em assuntos relativos ao clima – o que a lei exige é que tais especialistas sejam em igual número no que tange ao género. O critério que se propõe permite que as entidades referidas no artigo 6.º, n.º 1, mantenham a prerrogativa de indicar o respetivo representante para integrar a composição do Conselho para a Ação Climática, para além de permitir manter o número de membros do Conselho para a Ação Climática em 17, tal como previsto no artigo 6.º, n.º 1, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, assim como impede tentativas de desvio do cumprimento da paridade.
3.3. Assim, perante a norma positivada no referido artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, que determina: «A designação dos membros do CAC deve assegurar uma representação paritária, não podendo integrar menos de oito elementos de cada sexo», uma solução objetiva, imparcial e transparente consegue-se, em face de uma situação de impasse, por via do sorteio. Devem ser previstas 8 «quotas» para cada sexo, seja por via informática, seja por via manual, e deve, posteriormente, ter lugar uma operação de sorteio de cada uma dessas «quotas», por exemplo, seguindo a ordem dos representantes previstos nas várias alíneas do artigo 6.º, n.º 1, com exceção do membro por inerência. De modo a garantir a transparência e perante uma situação de igualdade formal, entre homens e mulheres, o sorteio deve ser realizado na presença (física ou virtual) das entidades envolvidas, com recurso a um sistema que garanta a total aleatoriedade do resultado, de modo a cumprir a lei, assim se garantindo a medida de ação positiva[29].
O procedimento de sorteio pode seguir a sequência do surgimento das entidades elencadas no artigo 6.º, n.º 1, alíneas a) a l), da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, com exceção do membro integrante por inerência: (i) Assembleia da República, (ii) Governo; (iii) Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente; (iv) Conselho Nacional de Juventude; (v) Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas; (vi) Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos; (vii) Associação Nacional dos Municípios Portugueses; (viii) Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira; (ix) Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores; (x) cinco comissões de coordenação e desenvolvimento regional; (xi) Conselho Económico e Social.
No que tange às Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional pode seguir-se a ordem de surgimento prevista no Decreto-Lei n.º 32/2024, de 10 de maio, que aprova o regime de organização e funcionamento do XXIV Governo Constitucional e no Decreto-Lei n.º 36/2023, de 26 de maio, que procede à conversão das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional em institutos públicos.
Dispõe, assim, o artigo 15.º, n.º 7, do Decreto-Lei n.º 32/2024, de 10 de maio, que aprova o regime de organização e funcionamento do XXIV Governo Constitucional:
«7 — O Ministro Adjunto e da Coesão Territorial exerce, ainda, os poderes de superintendência e tutela sobre as seguintes entidades, sem prejuízo da coordenação com os ministros competentes nas matérias setoriais por aquelas prosseguidas no respetivo âmbito territorial:
a) A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, I. P.;
b) A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, I. P.;
c) A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo, I. P.;
d) A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo, I. P.;
e) A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve, I. P..»
Por sua vez, o Decreto-Lei n.º 36/2023, de 26 de maio, que procede à conversão das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional em institutos públicos, vem prever:
«Artigo 2.º
Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, I. P.
As CCDR são constituídas em institutos públicos de regime especial integrados na administração indireta do Estado, com personalidade jurídica própria, dotados de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, passando a designar-se por:
a) Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, I. P. (CCDR Norte, I. P.);
b) Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, I. P. (CCDR Centro, I. P.);
c) Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo, I. P. (CCDR Lisboa e Vale do Tejo, I. P.);
d) Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo, I. P. (CCDR Alentejo, I. P.);
e) Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve, I. P. (CCDR Algarve, I. P.).»
3.4. A mobilização do critério do sorteio para a seleção de pessoas para o exercício de determinadas funções públicas (desde logo, independentes, como acontece na situação que nos ocupa)[30] pode recortar-se em várias hipóteses previstas no ordenamento jurídico nacional.
Dessarte, o Decreto-Lei n.º 387-A/87, de 29 de dezembro, relativo à seleção de jurados em processo penal, prevê um processo de seleção por sorteio nos artigos 8.º e ss. Apesar de se tratar de um processo de seleção mais exigente do que aquele que nos ocupa, dado estarmos já no exercício da função de administração da justiça e não da função administrativa, e em que a álea é muito maior (o que justifica um processo composto, de pré-seleção e de seleção, e a presença de outros atores) do que acontece com a instituição do Conselho para a Ação Climática, em que o sorteio é apenas para determinar o sexo dos representantes, mantendo as entidades competentes a prerrogativa de designação.
Na mesma linha de convocação do sorteio público, é de considerar que se pode recortar dos artigos 46.º e ss do Estatuto dos Magistrados Judiciais[31], mais um exemplo em que se admite o critério do sorteio. Assim, no âmbito dos concursos curriculares de acesso aos Tribunais da Relação e dos concursos curriculares de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, realiza-se, respetivamente, um sorteio público dos diversos concorrentes pelos membros do júri, em regra, a efetuar nas instalações do Conselho Superior da Magistratura.
Paralelamente, no que se refere aos magistrados do Ministério Público, no âmbito do concurso curricular de acesso à categoria de Procurador-Geral-Adjunto, deve ser determinado, por despacho do Presidente do Júri, proceder ao sorteio de atribuição de candidaturas a cada vogal do júri do procedimento. O sorteio decorrerá na Procuradoria-Geral da República, em sessão presencial dos membros do júri e pode ser acompanhada pelos candidatos, por videoconferência (artigo 4.º, n.º 3, do Regulamento n.º 575-A/2024, de 21 de maio - Regulamento de Movimento dos Magistrados do Ministério Publico). Ainda no contexto da magistratura do Ministério Público, na composição da secção disciplinar do Conselho Superior do Ministério Público são escolhidos por sorteio os dois membros designados pelo membro do Governo responsável pela área da justiça, de entre personalidades de reconhecido mérito para os períodos rotativos de 18 meses [artigo 34.º, n.º 6, alínea c), do Estatuto dos Magistrados do Ministério Público].
3.5. Em face de tudo o referido, o critério aleatório de resolução da situação de impasse verificada na operacionalização do disposto no artigo 6.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto deve encontrar enquadramento jurídico por via da integração de lacunas, nos termos do artigo 10.º, n.º 3, do Código Civil, que determina que, na «falta de caso análogo, a situação é resolvida segundo a norma que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema».
3.5.1. Assim, tal como tratado no Parecer n.º 51/1997, de 12 de fevereiro de 1998:
«9 - Para pôr cobro a esta solução de injustiça poderá o intérprete substituir-se ao legislador?
Dir-se-á que se trata de uma situação lacunar.
Efectivamentex17, uma lacuna é uma incompletude insatisfatória no seio de um todo. Aplicado ao Direito, o conceito de lacuna significa que se trata de uma incompletude insatisfatória no seio do todo jurídicox18. Incompletude insatisfatória porque representa uma falta ou falha em algo que tende para a completude. Pode, assim, dizer-se, com a doutrina alemã, que uma lacuna é uma incompletude contrária a um plano e, tratando-se de uma lacuna jurídica, que ela consiste numa imperfeição contrária ao plano do Direito vigente, determinada segundo critérios extraídos da ordem jurídica global.
Para Engisch, as lacunas são deficiências do Direito positivo, apreensíveis como faltas ou falhas de conteúdo de regulamentação jurídica para determinadas situações de facto em que é de esperar essa regulamentação e em que tais falhas postulam e admitem a sua remoção através duma decisão judicial jurídico-integradorax19. Na maior parte dos casos em que se fala de uma lacuna da lei não está incompleta uma norma jurídica particular, mas uma determinada regulação em conjunto, uma vez que esta não contém nenhuma regra para uma certa questão jurídica, a qual, segundo a intenção reguladora subjacente (o plano jurídico), carece de tratamento normativo. A estas lacunas, que Zittelmann denomina de lacunas impróprias ou inautênticas, chama Larenz lacunas de regulaçãox20.
A maior parte das lacunas de regulação têm como referente a camada (ou o nível) das rationes legis, ou seja, da teleologia imanente às normas de Direito positivo. Se bem que o problema das lacunas seja tradicionalmente apresentado como um problema dirigido ao seu preenchimento, é óbvio que surge como questão prioritária a da determinação ou descoberta das lacunas. Questão de solução nem sempre simples; com efeito, a inexistência de norma explícita não configurará lacuna de regulamentação se a actividade interpretativa permitir, com recurso aos critérios hermenêuticos previstos no artigo 9º do Código Civil, fixar por forma satisfatória, o sentido e alcance da regulação legal para os casos sob ponderação. Por outro lado, casos há em que a inexistência de regulamentação pode corresponder a um plano do legislador ou da lei, e então a mesma não representa uma deficiência que o intérprete esteja autorizado a superar. Como diz Engisch, uma tal inexistência planeada de certa regulamentação (propriamente uma regulamentação negativa) surge quando uma conduta, cuja punibilidade nós talvez aguardemos, consciente e deliberadamente não é declarada como punível pelo Direito positivo.
Se esta impunidade nos cai mal, podemos falar na verdade de uma lacuna político-jurídica, de uma lacuna crítica, de uma lacuna imprópria, quer dizer, de uma lacuna do ponto de vista de um futuro Direito mais perfeito (de lege ferenda); não, porém, de uma lacuna autêntica e própria, quer dizer, duma lacuna no Direito vigente (de lege lata). Ora, uma lacuna de lege ferenda apenas pode motivar o poder legislativo a uma reforma do Direito, mas não o intérprete a um preenchimento da dita lacuna. A colmatação das lacunas pelo intérprete pressupõe uma lacuna de lege latax21. Há, assim, que distinguir entre lacunas da lei e falhas de política legislativa. A faceta de valoração que deve servir como base para a distinção é diferente em cada situação. Num caso é a intenção reguladora e a teleologia imanente à própria lei; no outro são pautas de uma crítica, no plano da política legislativa, dirigida à leix22.
10- Nos termos do nº 1 do artigo 10º do Código Civil, o julgador deverá aplicar, por analogia, aos casos omissos as normas que directamente contemplem casos análogos - e só na hipótese de não encontrar no sistema uma norma aplicável a casos análogos é que deverá proceder de acordo com o nº 3 do mesmo artigo.»
De acordo com o Parecer n.º 98/2006, de 18 de janeiro de 2007: «Na falta de um caso análogo haverá que proceder nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, ou seja “a situação é resolvida segundo a norma que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do sistema” em que deverá tirar partido dos princípios estruturantes do sistema jurídico».
E à luz da lição de J. BAPTISTA MACHADO[32], o que o legislador pretende com esta norma «é que o julgador capte o problema jurídico no seu recorte específico, isolando “preventivamente” das particularidades do caso concreto, para que ganhe altura e ascenda a um horizonte visual capaz de lhe permitir não só ver o problema na sua especificidade, mas também, mediante a inserção no espírito do sistema da norma elaborada ad hoc, inserir igualmente nesse espírito a solução do caso, através de um adequado entendimento daquela norma com resposta àquele problema».
3.5.2. Destarte, perante uma lacuna e à falta de casos análogos[33], o artigo 10.º, n.º 3, do Código Civil legitima o intérprete à criação de norma ad hoc, para um caso concreto, sem que daí resulte um carácter vinculante para casos futuros[34]; portanto, será por recurso a princípios e valores gerais que se há-de encontrar uma solução, assim se garantindo a plenitude do ordenamento jurídico.
Assim acontece com a situação que nos ocupa, uma vez que o instituto do sorteio surge em vários regimes (ainda que não em casos análogos; portanto, uma lacuna «rebelde à analogia»[35]), podendo, em certa medida, afirmar-se que o sorteio representa um modo relativamente comum, axiologicamente protegido pela ordem jurídica, de resolver situações de impasse, revelando uma certa sistematicidade de resposta, convocada pela ideia de unidade do Direito e do sistema jurídico e permitindo que estas sejam ultrapassadas de um modo objetivo e eficaz, assim se cumprindo a prossecução do interesse público e, no fim de contas, a prossecução da justiça.
3.6. O critério do sorteio e seu procedimento material de operacionalização deveriam vir a constar de resolução da Assembleia da República, nos termos do artigo 166.º, n.ºs 5 e 6, da Constituição da República Portuguesa.
Como já referido, a Lei n.º 98/2021, de 31 de dezembro prevê no artigo 12.º a criação do Conselho para a Ação Climática, estipulando o número 4 que a «composição, a organização, o funcionamento e o estatuto do CAC e da estrutura de apoio técnico são definidos em resolução da Assembleia da República». Apesar de o legislador ter optado por diploma próprio, isto é, pela adoção da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, para a definição da composição, organização e funcionamento do Conselho para a Ação Climática, a situação de impasse, que deu origem à Consulta, demonstra que o legislador não previu todo o regime necessário para assegurar a instituição deste Conselho, revelando que o último diploma não é completo, desde logo, não apresenta uma regra que permita garantir a efetividade de representação igualitária. Não tendo, por isso, esgotado o âmbito legislativo ou a regulamentação nesta matéria. Assim, e desde logo, por a Lei n.º 98/2021, de 31 de dezembro, se apresentar como uma «lei de bases»[36], autoqualificada[37]-[38], deve ser tida em consideração a habilitação legal, prevista no n.º 4, do artigo 12.º, da Lei de Bases do Clima, devendo a previsão de um procedimento de designação que assegure a igualdade paritária, através do critério do sorteio, por via da sua definição em resolução da Assembleia da República[39].
A previsão em resolução da Assembleia da República trará maior segurança jurídica, desde logo, tendo em conta as regras do mandato, previstas no artigo 7.º da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, que determinam:
«1 - O mandato dos membros do CAC tem a duração de cinco anos.
2 - O mandato é renovável por uma vez consecutiva, não podendo um membro voltar a ser designado antes de decorridos quatro anos desde o termo do seu último mandato.
3 - Até 60 dias antes do final do mandato deve proceder-se à designação dos novos membros, sendo a composição completa dos membros do CAC publicada na 2.ª série do Diário da República.
4 - Os membros do CAC tomam posse perante o Presidente da Assembleia da República, no prazo máximo de 30 dias após o final do mandato dos seus antecessores ou da publicação da respetiva designação.
5 - O mandato dos membros do CAC cessa:
a) Na data do respetivo termo, sem prejuízo da manutenção em funções até tomada de posse dos novos membros;
b) Por morte ou incapacidade permanente;
c) Por renúncia.
6 - A cessação antecipada do mandato de algum membro do CAC determina a respetiva substituição, através de processo idêntico ao adotado para a designação do membro a substituir.»
Assim, pelas várias razões inerentes às vicissitudes do mandato, acima enunciadas na lei, em diferentes momentos, poderá ou será necessária a designação de novos representantes, podendo ou devendo voltar a ter lugar um procedimento material de sorteio dos membros em razão do género, pelo que, também por esta razão, se impõe um critério estável e positivado. Estabilidade imposta pela dimensão de segurança jurídica, enquanto princípio inerente ao princípio do Estado de direito democrático, previsto no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, assim se assegurando a «ideia de proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na actuação do Estado, o que implica um mínimo de certeza e de segurança»[40]. A ideia de estabilidade deve ainda impor que o sorteio tenha lugar no início do mandado, valendo para todo o período de cinco anos, previsto no número 1 do artigo 7.º da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto.
IV.
Conclusões
Considerando o que foi exposto, formulam-se as seguintes conclusões:
1.ª As mudanças climáticas têm assumido cada vez maior relevância no mundo atual, razão pela qual se tem procurado desenvolver mecanismos de mitigação, de modo a reduzirem-se os “stresses climáticos” nos humanos e nos sistemas naturais. É neste contexto que o legislador nacional aprovou a Lei n.º 98/2021, de 31 de dezembro, que define as bases da política do clima, prevendo um vasto conjunto de objetivos de política do clima.
2.ª A referida Lei veio prever, no artigo 12.º, a criação do Conselho para a Ação Climática, enquanto órgão de consulta, especializado, composto por personalidades de reconhecido mérito, com conhecimento e experiência nos diferentes domínios afetados pelas alterações climáticas, incluindo gestão de risco e políticas públicas, e atuando com estrita isenção e objetividade, em obediência a critérios técnicos devidamente explicitados, não podendo ser sujeito a direção, superintendência ou tutela governamental.
3.ª Posteriormente, a Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, que estabelece a composição, organização e funcionamento do Conselho para a Ação Climática, previsto no n.º 4, do artigo 12.º, da Lei de Bases do Clima, determina, no artigo 6.º, n.º 1, que este Conselho é composto por 17 membros de reconhecido mérito, com conhecimento e experiência nos diferentes domínios afetados pelas alterações climáticas.
4.ª Esta Lei prevê também, no artigo 6.º, n.º 2, que a designação dos membros deste Conselho deve assegurar uma representação paritária, não podendo integrar menos de oito elementos de cada sexo. Apesar desta previsão, tal como resulta da Consulta, não foi possível assegurar, na prática, a paridade ali exigida, em virtude de as várias entidades envolvidas terem indicado representantes maioritariamente do sexo masculino.
5.ª Independentemente de o referido artigo, sobre a representação paritária, revelar uma norma imperfeita, uma vez que não apresenta uma sanção jurídica pelo seu incumprimento, dada a necessidade de instituir o Conselho para a Ação Climática, o Presidente da Assembleia da República deve assegurar o cumprimento da legalidade, não apenas por ser o único que está em condições de garantir a paridade de género em sede de cômputo global dos membros integrantes deste Conselho, tal como imposto pelo artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, mas, ainda, por tal resultar de um poder funcional geral, radicado no artigo 162.º, alínea a), da Constituição da República Portuguesa, que lhe impõe o dever de vigiar pelo cumprimento da Constituição e da lei.
6.ª Solicitada a análise do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, em razão da situação de impasse em que a Assembleia da República se encontra no cumprimento prático do disposto no artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, uma proposta que, para além de permitir a prossecução do interesse público que a constituição do órgão em crise representa, pode permitir celeridade, imparcialidade e transparência, resume-se na mobilização de um critério aleatório, por meio de sorteio, do género, feminino ou masculino, dos representantes que as entidades, previstas no artigo 6.º, n.º 1, devem designar.
7.ª Para ultrapassar a referida situação real de impasse e à falta de outros critérios que evitem a subjetividade, que a lei não oferece, o critério do sorteio apresenta-se como o mais objetivo e prático. Devem, assim, ser previstas 8 «quotas» para cada sexo (em cumprimento do disposto no artigo 6.º, n.º 2), seja por via informática, seja por via manual (e.g. tômbola), desenvolvendo-se uma operação de sorteio de cada uma dessas «quotas», por exemplo, seguindo a ordem dos representantes prevista nas várias alíneas do artigo 6.º, n.º 1, com exceção do membro por inerência.
8.ª Adicionalmente, uma vez que, nos termos da alínea k), do n.º 1, do artigo 6.º, do referido diploma, deve ser designado um representante por cada uma das cinco comissões de coordenação e desenvolvimento regional, pode seguir-se a ordem de sequência, em relação a cada uma destas comissões, prevista no artigo 15.º, n.º 7, do Decreto-Lei n.º 32/2024, de 10 de maio, que aprova o regime de organização e funcionamento do XXIV Governo Constitucional e no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 36/2023, de 26 de maio, que procede à conversão das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional em institutos públicos.
9.ª Por apelo à unidade do sistema jurídico, na medida em que o instituto do sorteio se revela presente em vários regimes nacionais, enquanto modo de ultrapassar situações de impasse, sendo mobilizado, nomeadamente, em sede de designação de pessoas para o exercício de determinadas tarefas públicas, o referido critério aleatório de resolução da situação de impasse criada na aplicação prática do disposto no artigo 6.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto, encontra respaldo jurídico por via da integração de lacunas nos termos do disposto no artigo 10.º, n.º 3, do Código Civil, resolvendo-se a situação segundo «a norma que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema».
10.ª Tendo por base a habilitação legal, prevista no n.º 4, do artigo 12.º, da Lei de Bases do Clima, o referido critério e procedimento de designação que assegure a igualdade paritária deveriam encontrar a sua definição em resolução da Assembleia da República. Apesar de a Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto se dedicar à constituição do Conselho para a Ação Climática, entende-se que este diploma não esgota o âmbito legislativo previsto no referido artigo 14.º, n.º 2, da Lei de Bases do Clima.
[1] Capeado por ofício dirigido à Procuradoria-Geral da República, datado de 4 de novembro de 2024.
[2] O Parecer foi distribuído ao Relator em 7 de novembro de 2024.
[3] Aprovado pela Lei n.º 68/2019, de 27 de agosto e, entretanto, alterado pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março.
[4] Neste exacto sentido, cf. Antonio D’Aloia, “Climate change a n d law: a constitutional perspective”, in Human health a n d ecological integrity: ethics, law a n d human rights, Laura Westra, Colin L. Soskolne, Donald W. Spady (Ed.), London, Routledge, 2017, pp. 201-212 (apud Emanuel, 2007, p. 84). Alguma doutrina refere que a mudança climática se apresenta como «um vagabundo, que vai para todo o lado quando quer, que é omnipresente e omnipotente», cf. Shelby D. Green, “Adaption to climate change at the subnational level”, in Climate change law: an introduction, Karl S. Coplan, Shelby D. Green, Katrina Fischer Kuh, Smita Narula, Karl R. Rábago, Radina Valova (Ed.), Cheltenham, UK, EE, Edward Elgar, 2023, pp. 74 e ss.
[5] Neste sentido e para outros desenvolvimentos, cf. Karl S. Coplan, “Climate law primer: mitigation approaches”, in Climate change law: an introduction, Karl S. Coplan, Shelby D. Green, Katrina Fischer Kuh, Smita Narula, Karl R. Rábago, Radina Valova (Ed.), Cheltenham, UK, EE, Edward Elgar, 2023, pp. 23 e ss.
[6] No sentido de que as mundanças climáticas são um problema intergeracional, cf. Antonio D’Aloia, “Climate change a n d law: a constitutional perspective”, in Human health a n d ecological integrity: ethics, law a n d human rights, Laura Westra, Colin L. Soskolne, Donald W. Spady (Ed.), London, Routledge, 2017, p. 208.
[7] Sobre a relevância destas leis no contexto estadunidense, cf. Katrina Fischer Kuh, “Litigating government (in)action on climate change”, in Climate change law: an introduction, Karl S. Coplan, Shelby D. Green, Katrina Fischer Kuh, Smita Narula, Karl R. Rábago, Radina Valova (Ed.), Cheltenham, UK, EE, Edward Elgar, 2023, pp. 110 e ss. Aliás, não deve surpreender que muitas das medidas de mitigação climática possam, atualmente, encontrar um forte apoio no financiamento providenciado pelo Plano de Recuperação e Resiliência. Insistindo neste aspecto, cf. Carlos Abreu Amorim, “Lei de Bases do Clima e novos desafios locais”, Revista de Direito Local, n.º 39 (julho-setembro 2023), p. 8.
[8] Que naturalmente devem ser enquadradas nos diplomas europeus desenvolvidos com estes objetivos de proteção do clima. Assim como devem ser harmonizadas, nomeadamente, com a Lei de Bases do Ambiente, aprovada pelo Lei n.º 19/2014, de 14 de abril. Sobre o tema, cf. Carla Amado Gomes, Hong Cheng Leong, Introdução ao direito do ambiente, 6.ª ed., Lisboa, AAFDL, 2023, pp. 156 e ss; Carlos Abreu Amorim, “Lei de Bases do Clima e novos desafios locais”, Revista de Direito Local, n.º 39 (julho-setembro 2023), pp. 7 e ss.
[9] Apressando-se logo no número 2 do mesmo artigo a esclarecer que «O disposto no número anterior não constitui uma declaração de estado de emergência ao abrigo do artigo 19.º da Constituição da República Portuguesa, sem prejuízo de este vir a ser declarado por motivos relacionados com o clima». Sobre os estados de emergência e de necessidade administrativa, cf. AA. VV. Direito administrativo de necessidade e de excepção, Carla Amado Gomes, Ricardo Pedro (Coord.) Lisboa, AAFDL, 2020.
[10] Cf. Carla Amado Gomes, Hong Cheng Leong, Introdução ao direito do ambiente, 6.ª ed., Lisboa, AAFDL, 2023, p. 160.
[11] Cf. Marco Caldeira, “A Lei de Bases do Clima primeira análise e implicações jus-administrativas”, Revista de Direito Administrativo, n.º 14 (maio-agosto 2022), p. 105.
[12] No plano da doutrina nacional e estrangeira, entre muitos, cf. Sofia Alves, “Igualdade de tratamento entre homens e mulheres: discriminação positiva - sistema de quotas - a decisão Kalanke de 17 de Outubro de 1995”, Revista Jurídica - Nova série n.20 (Nov.1996), pp. 179-187; Vital Moreira, “A IV revisão constitucional e igualdade de homens e mulheres no exercício de direitos cívicos e políticos notas sobre o artigo 109.º da CRP”, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, v. 74 (1998), pp. 407 e ss; Anne Peters, Women, quotas a n d constitutions a comparative study of affirmative action for women under American, German, EC a n d international law, Kluwer Law International, The Hague-London-Boston, 1999; Vera Lúcia Carapeto Raposo, O poder de Eva - o princípio da igualdade no âmbito dos direitos políticos - problemas suscitados pela discriminação positiva, Coimbra, Almedina, 2004; J.J. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1.º volume, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, pp. 281-282; Vera Lúcia Raposo, “Quotas de género os prós e os contras de uma solução polémica”, in Direitos humanos das mulheres, Anabela Miranda Rodrigues, et al. (Coord.), Coimbra, Coimbra Editora, 2005, pp. 111-126; Macarena Castro Conte, “Desarrollo legal y situación de la mujer en el deporte”, Revista Jurídica de Deporte y Entretenimiento, n.º 26, 2009, pp. 95-112; Sofia Leite Borges, “Designação obrigatória de administradores e diversidade do género: algumas reflexões sobre a proposta de diretiva relativa a melhoria do equilíbrio entre homens e mulheres no cargo de administrador não executivo das empresas cotadas em bolsa e a outras medidas conexas, in A designação de administradores, Paulo Câmara, et al. (Coord.), Coimbra, Almedina, 2015, pp. 170 e ss; AA. VV., Constitutions a n d gender, Helen Irving (Ed.), Cheltenham, Edward Elgar, 2019; Luis Nogueiro Arias, “Género y gestión deportiva estado actual en las diferentes subdimensiones de la organización deportiva”, Revista Española de Derecho Deportivo, n.º 47, (julio-diciembre 2020), pp. 35-48; Catarina Serra, “Diversidade de género nos conselhos de administração das sociedades: uma primeira abordagem”, in Direito das Sociedades em Revista, a.13 v.26 (Out. 2021), pp. 49 e ss; Maria Elisabete Ramos, “All aboard: mulheres e homens no governo das sociedades cotadas”, Direito das Sociedades em Revista, a.16, v.31 (março 2024), pp. 108-140.
x A promoção da representação equilibrada de ambos os sexos nos órgãos das empresas já se poderia recortar de iniciativas anteriores, com destaque para a Resolução do Conselho de Ministros n.º 49/2007, de 28 de março, que aprova os princípios de bom governo das empresas do sector empresarial do Estado; a Resolução do Conselho de Ministros n.º 82/2007, de 22 de junho, que aprova o III Plano Nacional para a Igualdade - Cidadania e género (2007-2010); a Resolução do Conselho de Ministros n.º 70/2008, de 22 de abril, que aprova as orientações estratégicas do Estado destinadas à globalidade do sector empresarial do Estado; a Resolução do Conselho de Ministros n.º 19/2012, de 8 de março, que determina a adoção de medidas de promoção da igualdade de género em cargos de administração e de fiscalização das empresas; a Resolução do Conselho de Ministros n.º 103/2013, de 31 de dezembro, que aprova o V Plano Nacional para a Igualdade, Género, Cidadania e Não-discriminação 2014-2017; a Resolução do Conselho de Ministros n.º 11-A/2015, de 6 de março, que promove um maior equilíbrio na representação de mulheres e homens nos órgãos de decisão das empresas e institui mecanismos de promoção da igualdade salarial.
x1 Expressão colhida em J.J. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1.º volume, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, p. 281.
x2 Idem, ibidem.
x3 Idem, ibidem.
x4 Idem, ibidem.
x5 Insistindo nesta dimensão, entre muitos, v. Miguel Nogueira de Brito, «O Novo Regime das Federações Desportivas», in Direito & Desporto, Ano VII, n.º 19 (2010), p. 12; JoseÌ Manuel Meirim, “Contributo para uma reforma do regime jurídico das federações desportivas e do estatuto de utilidade pública desportiva”, in Estudos em Homenagem ao Conselheiro Presidente Manuel da Costa Andrade, 2.v., Almedina, Coimbra, 2023, pp. 781 e ss, e doutrina aí citada.
x6 Alterada pela Declaração de Retificação n.º 71/2006, de 4 de outubro; pela Lei Orgânica n.º 1/2017, de 2 de maio, que procede à sexta alteração à Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto (lei que regula a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais); pela Lei Orgânica n.º 1/2019, de 29 de março, que procede à segunda alteração à lei da paridade nos órgãos do poder político, aprovada pela Lei Orgânica n.º 3/2006, de 21 de agosto
x7 Ratificada e aprovada pela Lei n.º 23/80, de 26 de julho.
x8 Disponível em: chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://rm.coe.int/CoERMPublicCommonSearchServices/DisplayDCTMContent?documentId=0900001680591601 Acesso em 8 de abril de 2024.
x9 Sobre esta proposta de Directiva, entre nós, v. Sofia Leite Borges, “Designação obrigatória de administradores e diversidade do género: algumas reflexões sobre a proposta de diretiva relativa a melhoria do equilíbrio entre homens e mulheres no cargo de administrador não executivo das empresas cotadas em bolsa e a outras medidas conexas, in A designação de administradores, Paulo Câmara, et al. (Coord.), Coimbra, Almedina, 2015, pp. 170 e ss
[13] Cf. Diretiva (UE) 2022/2381 do Parlamento Europeu e do Conselho de 23 de novembro de 2022 relativa à melhoria do equilíbrio de género nos cargos dirigentes de empresas cotadas e a outras medidas conexas.
x10 V. processo C-450/93, Kalanke (Coletânea 1995, p. I-3051); processo C-409/95, Marschall (Coletânea 1997, p. I-6363); processo C-158/97, Badeck (Coletânea 2000, p. I-1875); processo C-407/98, Abrahamsson (Coletânea 2000, p. I-5539).
x11 Alterada pela Lei n.º 12/2017, de 2 de maio, que procede à primeira alteração à lei-quadro das entidades reguladoras e à Lei n.º 67/2013, de 28 de agosto, que a aprova; pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, que aprova o Orçamento do Estado para 2019; pela Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, que aprova o Orçamento do Estado para 2021.
x12 Alterado pela Lei n.º 75-A/2014, de 30 de setembro, que procede à segunda alteração à Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro (Orçamento do Estado para 2014), à quinta alteração à Lei n.º 108/91, de 17 de agosto, e ao Decreto-Lei n.º 413/98, de 31 de dezembro, à quarta alteração à Lei n.º 28/2012, de 31 de julho, e à primeira alteração aos Decretos-Leis n.ºs 133/2013, de 3 de outubro, 26-A/2014, de 17 de fevereiro, e 165-A/2013, de 23 de dezembro, alterando ainda o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, o Código dos Impostos Especiais de Consumo, o Estatuto dos Benefícios Fiscais e o Regime Geral das Infrações Tributárias; pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, que aprova orçamento do Estado para 2017.
x13 Alterado pelo Decreto-Lei n.º 215/2015, de 6 de outubro, que procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 159/2014, de 27 de outubro, que estabelece as regras gerais de aplicação dos programas operacionais e dos programas de desenvolvimento rural financiados pelos fundos europeus estruturais e de investimento, para o período de programação 2014-2020; pelo Decreto-Lei n.º 88/2018, de 6 de novembro, que revê as condições de elegibilidade dos pagamentos em numerário em candidaturas aos fundos europeus estruturais e de investimento; pelo Decreto-Lei n.º 127/2019, de 29 de agosto, que altera o modelo de governação e as regras gerais de aplicação dos fundos europeus estruturais e de investimento; pelo Decreto-Lei n.º 10-L/2020, de 26 de março, que altera as regras gerais de aplicação dos fundos europeus estruturais e de investimento, de forma a permitir a antecipação dos pedidos de pagamento; pelo Decreto-Lei n.º 109/2023, de 24 de novembro, que prorroga diversos prazos de regimes jurídicos temporários.
x14 Que no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 46/2014, de 28 de julho, transpõe a Diretiva n.º 2013/36/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, e procede à alteração ao Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, ao Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de novembro, às Leis n.ºs 25/2008, de 5 de junho, e 28/2009, de 19 de junho, e aos Decretos-Leis n.ºs 260/94, de 22 de outubro, 72/95, de 15 de abril, 171/95, de 18 de julho, 211/98, de 16 de julho, 357-B/2007 e 357-C/2007, de 31 de outubro, 317/2009, de 30 de outubro, e 40/2014, de 18 de março.
[14] Sobre as leges imperfectae, cf. J. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 14.ª Reimpressão, Coimbra Editora, 2004, p. 86 («normas que têm por destinatárias certos órgãos superiores do Estado, quando a sua violação não é susceptível de qualquer sanção jurídica»).
[15] Cf. supra III.1.1.
x15 Sobre o Presidente da Assembleia da República, v. JORGE MIRANDA, Direito Parlamentar, Editora Almedina, Coimbra, 2022, p. 170 e seguintes.
x16 A respeito de uma dupla função dos presidentes, enquanto membros do órgão colegial e detentores de competências próprias v. DIOGO FREITAS DO AMARAL, A função presidencial nas pessoas coletivas públicas, in Estudos de Direito Público em honra do Professor Marcello Caetano, Editora Ática, Lisboa, 1973, p. 9 e seguintes.
[16] Legalidade que, a título de exemplo, deve ser cumprida sempre que o Presidente representa a Assembleia da República, dirige e coordena os seus trabalhos e exerce autoridade sobre todos os funcionários e agentes e sobre as forças de segurança postas ao serviço da Assembleia (artigo 12.º do Regimento da Assembleia da República, aprovado pelo Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto, com as alterações introduzidas pelo Regimento da Assembleia da República n.º 1/2023, de 9 de agosto e retificado pela Declaração de Retificação n.º 20/2023, de 19 de setembro) ou quando o Presidente representa a Assembleia da República tendo a responsabilidade de «Admitir ou não admitir os projetos e propostas de lei ou de resolução, os projetos de deliberação, os projetos de voto e os requerimentos, verificada a sua regularidade regimental, sem prejuízo do direito de recurso para o Plenário» [artigo 16.º, n.º 1, alínea c), do Regimento da Assembleia da República].
[17] Tal como se concluiu no Parecer n.º 23/2024, de 5 de setembro de 2024: «9.ª — De resto, a função dos presidentes dos órgãos colegiais assegurarem o cumprimento da lei nas deliberações tomadas é expressão de um princípio geral de direito público, comum ao direito parlamentar, não obstante só conhecer formulação expressa no n.º 2 e no n.º 4 do artigo 21.º do Código do Procedimento Administrativo».
[18] Dispondo para tal de um Gabinete, nos termos do artigo 8.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Serviços da Assembleia da República, e contando com o apoio da Secretaria da Assembleia da República, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 21.º e ss do diploma imediatamente referido acima.
[19] Conselho este que foi criado pelo Decreto-Lei n.º 221/97, de 20 de agosto, cuja última alteração resulta do Decreto-Lei n.º 32/2024, de 10 de maio.
[20] Ou seja, «investidura obrigatória num cargo por disposição legal, em virtude do exercício de outro cargo» (Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, Vol. II, 9.ª edição, 2.ª reimpressão, Livraria Almedina, Coimbra, 1983, p. 654). Como defendido por este Conselho Consultivo, está em causa «a atribuição a uma pessoa da titularidade ou do exercício de um determinado cargo em virtude da titularidade que essa mesma pessoa ocupa noutro […]. Alguém que, em virtude de ocupar um determinado cargo passa “ipso facto”, a fazer parte doutro. Cada um desses lugares poderia ser ocupado por pessoas diferentes. Mas é a lei que diz que o titular do cargo “A” é também, por inerência, o titular do cargo “B”. Trata-se duma inerência “ope legis”, pois uma pessoa é investida obrigatoriamente num determinado cargo, por força duma disposição legal, em virtude do exercício doutro cargo»; entre muitos, recentemente, cf. pareceres n.ºs 28/2024, de 24 de outubro de 2024 (inédito); 17/2024, de 6 de junho (inédito).
[21] A referida celeridade, ínsita ao pedido de parecer com carácter de urgência solicitado a este órgão consultivo, surge, brevemente, contextualizada ao nível temporal, numa Lei de Base do Clima datada de 2021, cuja definição da composição atual do Conselho para a Ação Climática viu a luz do dia em agosto de 2023.
[22] Cf. supra III.1.
[23] De notar que a transparência e imparcialidade exigem, consoante o procedimento de sorteio seja manual ou virtual, a respetiva presença das entidades envolvidas no ambiente de sorteio em causa.
[24] O modo de sorteio como forma de resolver situações de impasse em sede de opção pública pode encontrar-se no nosso ordenamento jurídico, desde logo, em sede de contratação pública, cf. Pedro Fernández Sánchez, Direito da contratação pública, Lisboa, AAFDL, 2024, pp. 492 e ss; Ricardo Pedro, “Critérios de adjudicação no Código dos Contratos Públicos: primeiras linhas, but (remember) the devil is in the detail...”, in Comentários à revisão do Código dos Contratos Públicos, I, Carla Amado Gomes, Ricardo Pedro, Marco Caldeira, Tiago Serrão (Coord.), Lisboa, AAFDL, 2023, pp. 209 e ss; Licínio Lopes Martins, “O dever de adjudicar e o empate entre propostas no Código dos contratos públicos”, Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 103, 2014, pp. 3-9; João Amaral e Almeida, “A adjudicação em caso de empate entre propostas”, Revista de Contratos Públicos, n.º 7, 2013, pp. 5-19; Na jurisprudência, cf. acórdãos do Tribunal Administrativo Central Norte, de 3 de novembro de 2017, processo 00132/14.8BECBR-A e do Supremo Tribunal Administrativo, de 4 de outubro de 2018, processo n.º 0132/14.8BECRB-A 0413/18. O uso do critério do sorteio pode encontrar-se também no processo relativo à concessão de farmácias, cf. Decreto-Lei n.º 241/2009, de 16 de setembro, que estabelece o regime de instalação, abertura e funcionamento de farmácia de dispensa de medicamentos ao público nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde e as condições da respectiva concessão por concurso público e revoga o Decreto-Lei n.º 235/2006, de 6 de Dezembro e no Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, que prevê o regime jurídico das farmácias de oficina.
[25] Com interesse, cf. João Amaral e Almeida, “A adjudicação em caso de empate entre propostas”, Revista de Contratos Públicos, n.º 7, 2013, p. 16.
[26] Não está em causa um regime de quotas que depende da aptidão dos candidatos.
[27] Vera Lúcia Carapeto Raposo, O poder de Eva - o princípio da igualdade no âmbito dos direitos políticos - problemas suscitados pela discriminação positiva, Coimbra, Almedina, 2004, p. 327.
[28] Em que, em regra, estão em causa situações em que pode ser concedida a um candidato que pertence ao sexo sub-representado a prioridade relativamente a um concorrente de sexo oposto, desde que os candidatos possuam méritos equivalentes ou sensivelmente equivalentes, quando as candidaturas são objeto de uma apreciação objetiva que tem em conta situações particulares de ordem pessoal de todos os candidatos – o que pressupõe que está em causa uma lógica de «competição» entre candidatos, o que não se verifica na situação que nos ocupa. Cf., ainda o disposto no artigo 6.º, n.º 1, da Diretiva (UE) 2022/2381, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de novembro de 2022 relativa à melhoria do equilíbrio de género nos cargos dirigentes de empresas cotadas e a outras medidas conexas, que determina: «1. Os Estados-Membros asseguram que as empresas cotadas que não alcancem os objetivos referidos no artigo 5.º alíneas a) ou b), consoante o caso, adaptam o processo de seleção de candidatos a uma nomeação ou eleição para os cargos dirigentes. Esses candidatos devem ser selecionados com base numa avaliação comparativa das qualificações de cada candidato. Para esse efeito, critérios claros, inequívocos e formulados de forma neutra devem ser aplicados de forma não discriminatória e ao longo de todo o processo de seleção, incluindo durante a preparação dos anúncios de abertura de vagas, a fase de pré-seleção, a fase de elaboração da lista restrita ou a criação de reservas de seleção de candidatos. Esses critérios devem ser estabelecidos antes do processo de seleção.» e no artigo 6.º, n.º 3, que prevê: «3. Os Estados-Membros asseguram que, a pedido de um candidato que tenha sido tomado em consideração na seleção para nomeação ou eleição para um cargo dirigente, as empresas cotadas são obrigadas a informar esse candidato do seguinte: a) Os critérios de qualificação em que se baseou a seleção; b) A avaliação comparativa objetiva dos candidatos ao abrigo desses critérios; e c) Quando pertinente, as considerações específicas que, a título excecional, fizeram pender a balança a favor do candidato que não é do sexo sub-representado.»
[29] Como, por exemplo, se encontrava previsto no, revogado, Decreto-Lei n.º 241/2009, de 16 de setembro, que estabelece o regime de instalação, abertura e funcionamento de farmácia de dispensa de medicamentos ao público nos hospitais do Serviço Nacional de Saúde e as condições da respectiva concessão por concurso público e revoga o Decreto-Lei n.º 235/2006, de 6 de dezembro.
[30] Cf. artigo 2.º da Lei n.º 43/2023, de 14 de agosto.
[31] Aprovado pela Lei n.º 21/85, de 30 de julho, cuja última alteração foi produzida pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março.
x17 Acompanha-se de muito perto, ipsis verbis, o Parecer nº 73/91, publicado no Diário da República, II Série, de 14 de Maio de 1992.
x18 KARL ENGISCH, Introdução ao Pensamento Jurídico, 6ª edição, tradução de J. BAPTISTA MACHADO, Fundação Calouste Gulbenkian, pág. 276.
x19 KARL ENGISCH, loc. cit., págs. 279 e ss.
x20 Para J. BAPTISTA MACHADO, a generalidade das lacunas de regulação situam-se na categoria das lacunas teleológicas. Trata-se de lacunas de segundo nível, a determinar em face da ratio legis da norma ou da teleologia imanente a um complexo normativo. Nesta categoria de lacunas é comum fazer-se a distinção entre lacunas patentes e lacunas ocultas ou latentes - cfr. loc. cit., pág. 196.
x21 KARL ENGISCH, ob. cit., págs. 281 e 282.
x22 Cfr. KARL LARENZ, Metodologia da Ciência do Direito, tradução, 2ª edição, Fundação Calouste Gulbenkian, págs. 452 e ss.
[32] Cf. Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 14.ª Reimpressão, Coimbra Editora, 2004, p. 204
[33] Repare-se que também a Lei n.º 62/2017, de 1 de agosto, que aprova o regime da representação equilibrada entre mulheres e homens nos órgãos de administração e de fiscalização das entidades do setor público empresarial e das empresas cotadas em bolsa, se «abstém de regular o processo de identificação dos/as candidato/as com o perfil adequado». Insiste, assim, a doutrina, que «Não se garante que os critérios de seleção sejam prévios, claros, inequívocos, formulados de forma neutra e aplicados de forma não discriminatória em todo o processo de recrutamento» (Maria Elisabete Ramos, “All aboard: mulheres e homens no governo das sociedades cotadas”, Direito das Sociedades em Revista, a.16, v.31 (março 2024), pp. 124-125).
[34] Cf. J. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 14.ª Reimpressão, Coimbra Editora, 2004, pp. 202 e 203; Pedro Romano Martinez, Introdução ao estudo do direito, Lisboa, AAFDL, 2022, pp. 310 e ss; Miguel Nogueira de Brito, Introdução ao estudo do direito, Lisboa, AAFDL, 2022, pp. 313 e ss.
[35] Expressão de Pedro Romano Martinez, Introdução ao estudo do direito, Lisboa, AAFDL, 2022, p. 310.
[36] Neste sentido, cf. Carla Amado Gomes, Hong Cheng Leong, Introdução ao direito do ambiente, 6.ª ed., Lisboa, AAFDL, 2023, p. 161. De acordo com Jorge Miranda, não definindo a Constituição o que sejam bases gerais, «parece seguro que nelas se há de incluir aquilo que em cada ato constitua as opções político-legislativas fundamentais» (Manual de Direito Constitucional, Volume III, Tomo V, Coimbra Editora, 2014, pp. 379 e ss).
[37] A propósito da relevância da autoqualificação das leis de bases, cf. acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 83/2022, de 26 de janeiro e 230/2020, de 22 de abril. A questão coloca-se por a Lei de Bases do Clima ter sido aprovada ao abrigo do artigo 161.º, alínea c), da Constituição da República Portuguesa.
[38] Sobre as leis de bases, cf. J.J. Gomes Canotilho, Direito constitucional e teoria da Constituição, 4,ª ed., Coimbra, Almedina, p. 742; Jorge Miranda, Atos legislativos, Lisboa, Almedina, 2019, pp. 217 e ss.
[39] Sobre a figura da resolução da Assembleia da República, cf. J.J. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, II, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, p. 344; Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, II, Lisboa, Coimbra Editora, 2006, pp. 546 e ss.
[40] Cf. acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 556/2003, de 12 de Novembro de 2003 e 12/2012, de 12 de janeiro de 2012. Cf. também Pareceres n.ºs 37/2012, de 6 de dezembro de 2012 e 39/2012, de 21 de março de 2012.
DL 43/2023 DE 2023-08-14
DL 133/2013 DE 2013-10-03
DL 159/2014 DE 2014-10-27
DL 157/2014 DE 2014-10-24
LEI 39/2023 DE 2023-08-04
LEI 62/2017 DE 2917-08-01
PORT 174/2019 DE 2019-06-06
CCIV 1966 ART 10
RECOMENDAÇÃO DO CONSELHO DA EUROPA DE 2003/03/12 SOBRE PARTICIPAÇÃO DE MULHERES E HOMENS NA TOMADA DE DECISÃO POLÍTICA.
REGULAMENTO UE Nº 575/2013, DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO DE 2013-06-26
DIRECTIVA EU 2022/2381 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO DE 20222-11-23
DIR ADM. / DIR AMB