24/2024, de 05.09.2024

Número do Parecer
24/2024, de 05.09.2024
Data do Parecer
05-09-2024
Número de sessões
1
Tipo de Parecer
Parecer
Votação
Unanimidade
Iniciativa
Governo
Entidade
Ministério do Ambiente
Relator
José Joaquim Arrepia Ferreira
Votantes / Tipo de Voto / Declaração

Carlos Adérito da Silva Teixeira

Votou em conformidade


José Joaquim Arrepia Ferreira

Votou em conformidade


Carlos Alberto Correia de Oliveira

Votou em conformidade


Ricardo Lopes Dinis Pedro

Votou em conformidade


Helena Isabel Ribeiro Carmelo Dias Bolieiro

Votou em conformidade


Maria de Fátima Cortes Pereira Belchior de Sousa

Votou em conformidade


Maria Carolina Durão Pereira

Votou em conformidade


Eduardo André Folque da Costa Ferreira

Votou em conformidade


João Conde Correia dos Santos

Votou em conformidade

Descritores
SISTEMA ENERGÉTICO NACIONAL
SISTEMA ELÉTRICO DE SERVIÇO PÚBLICO
SISTEMA ELÉTRICO INDEPENDENTE
ENTIDADE REGULADORA DOS SERVIÇOS ENERGÉTICOS
CENTROS ELETROPRODUTORES HÍDRICOS
CENTROS ELETROPRODUTORES DE ENERGIAS RENOVÁVEIS
REDE NACIONAL DE TRANSPORTE DE ENERGIA ELÉTRICA
EDP
PREÇO
CONSUMIDOR
MUNICÍPIO
RENDA MUNICIPAL
TARIFAS REGULADAS
 CEDÊNCIAS AOS MUNICÍPIOS
 MERCADO DE PRODUÇÃO DE ELETRICIDADE
PRODUÇÃO DE ENERGIA EM REGIME ESPECIAL
LIVRE CONCORRÊNCIA
ENERGIAS RENOVÁVEIS
CONTRATO DE AQUISIÇÃO DE ENERGIA
AVALIAÇÃO DO IMPACTO AMBIENTAL
INTERPRETAÇÃO ATUALISTA DA LEI
REVOGAÇÃO TÁCITA
Conclusões
CONCLUSÕES
 
Atento o aduzido, este Conselho Consultivo formula as seguintes conclusões:
 
1.ª - O regime do exercício das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica instituído pela Lei n.º 2002, de 26 de dezembro de 1946, desenvolvido e atualizado pelo Decreto-Lei n.º 43.335, de 19 de novembro de 1960, pressupunha um financiamento privado do setor elétrico e assentava na outorga de concessões do Estado a cidadãos portugueses ou a empresas nacionais com maioria de capital português, em que o Estado podia participar (cf. mormente Bases n.ºs IV e XVII da Lei n.º 2002 e artigos 19.º e 20.º do Decreto-Lei n.º 43.335), prevendo ainda regras próprias e especiais para o pequeno produtor (Bases XXX e XXXII da Lei n.º 2002 e artigos 140.º a 145.º do Decreto-Lei n.º 43.335);
 
2.ª – Determinou-se em tais diplomas legais o pagamento de uma renda ao Estado pelas concessões e de um adicional às Câmaras Municipais dos concelhos onde estivessem situadas as obras dos aproveitamentos que incindiria sobre as concessões de produção e de grande distribuição [Base XV, alínea d), itens 1.º, a 3.º, da Lei n.º 2002 e artigos 68.º e 70.º, corpo, do Decreto-Lei n.º 43.335], prevendo este último diploma ainda que, relativamente aos aproveitamentos hidroelétricos que entrassem em exploração, depois de 19 de novembro de 1960, os respetivos concessionários pagariam às câmaras municipais interessadas, na proporção fixada no corpo do artigo, durante o período gratuito (da renda ao Estado), e a título de indemnização pela quebra de rendimentos, uma importância anual igual a 1,5 por mil do valor da energia produzida, calculado nos termos do artigo 68.º e seus parágrafos (artigo 70.º, § 2.º);
 
3.ª - A nacionalização das sociedades concessionárias da exploração das diversas atividades inseridas no sector de energia elétrica, pelo Decreto-Lei n.º 205-G/75, de 16 de abril, pondo termo à anterior estrutura organizativa do setor elétrico nacional, determinou a transferência para o Estado Português dos respetivos patrimónios e do complexo de direitos e obrigações de que eram titulares (artigo 3.º), tendo-lhes, assim, sucedido empresas nacionalizadas, dotadas de personalidade jurídica própria que se mantiveram até à criação da empresa pública «Electricidade de Portugal – E.P.» (EDP), à qual foi atribuída, em exclusivo e por tempo indeterminado, a exploração do serviço público de produção, distribuição e transporte de energia elétrica (artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 502/76, de 30 de junho);
 
4.ª - A «EDP, EP» recebeu os patrimónios e assumiu, nos mesmos termos e com o mesmo conteúdo, as posições jurídicas e contratuais tituladas pelas sociedades nacionalizadas, designadamente as concessões que lhes haviam sido outorgadas, tal como dimana dos artigos 3.º, n.º 2, 5.º e 8.º do Decreto-Lei n.º 502/76;
 
5.ª - Assim, efetivou-se a constituição do monopólio do Estado no sector elétrico, na medida em que se vedou o acesso da iniciativa privada às atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica para consumo público [artigos 85.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, redação originária, e 4.º, alínea a), da Lei n.º 46/77, de 8 de julho];
 
6.ª - A «EDP, EP», por ter, nos termos referidos, total controlo sobre a cadeia do setor elétrico para uso público, desde o processo produtivo aos processos de pós-produção (transporte) e distribuição ao consumidor final, exercia, como empresa verticalmente integrada, toda a referida atividade do setor elétrico para consumo público, e em exclusivo, passando, por isso, em Portugal Continental, o setor elétrico a identificar-se com a «EDP, EP»;
 
7.ª – É, pois, num período caracterizado pela interdição, em todo o território continental, ao sector privado das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica para uso público e pela exploração, em exclusivo e por tempo indeterminado, desses serviços públicos, através da empresa pública «EDP, EP», sua única titular, e em que continuavam parcialmente vigentes a Lei n.º 2002 e o Decreto-Lei n.º 43.335, que surgiu o Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro;
 
8.ª – Este diploma legal, dando continuidade ao determinado na Base XV, alínea d), item 3.º, da Lei n.º 2002 e artigo 70.º, corpo, do Decreto-Lei n.º 43.335, veio estabelecer, no artigo 1.º, o pagamento pela «EDP, EP», de uma renda anual aos municípios, cuja circunscrição fosse afetada por zonas de influência de centros produtores hidroelétricos e termoelétricos, em exploração e em construção, calculada nos termos dos artigos 2.º a 4.º, declarando a caducidade das «rendas a pagar pela EDP ao Estado e os respetivos adicionais destinados às câmaras municipais, previstos na alínea d) da base XV da Lei 2002, de 26 de dezembro de 1944, e nos artigos 68.º e 70.º do Decreto-Lei n.º 43.335, de 19 de novembro de 1960»;
 
9.ª - Aliás, quando foi publicado o Decreto-Lei n.º 424/83, já a Constituição da República Portuguesa consagrava incumbir prioritariamente ao Estado designadamente adotar uma política nacional de energia, com preservação dos recursos naturais e do equilíbrio ecológico (artigo 81.º), e o ambiente merecia dignidade constitucional considerando terem todos direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado, sendo-lhes, por isso, conferido o direito de promover, nos termos da lei, a prevenção ou a cessação dos fatores de degradação do ambiente, bem como, em caso de lesão direta, o direito à correspondente indemnização (artigo 66.º, n.ºs 1 e 3, na redação conferida pela Lei Constitucional n.º 1/82, de 3 de setembro);
 
10.ª - Decorre do preceituado no Decreto-Lei n.º 424/83, e do teor do seu preâmbulo, que o valor da renda prevista no artigo 1.º, e calculado nos termos dos artigos 2.º e 3.º, não era influenciado pelos concretos efeitos nem pelas medidas a adotar (ou adotadas) em cada centro produtivo de energia hídrico (ou termoelétrico) quanto aos meios utilizáveis (ou utilizados) para atenuar o impacte sobre o ambiente, não dependendo, pois do êxito ou inêxito das concretas medidas de atenuação aplicadas;

 
11.ª - Efetivamente, o encargo, ope legis, de natureza compensatória (e não tributária), consignado no artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 424/83, depende da existência, localização e funcionamento de um centro electroprodutor na área territorial de um município ou de vários, por necessariamente criarem impacte negativo para as populações dos municípios da instalação, e também para os próprios municípios, afetando-os, a quem urge compensar, reforçando, assim, quanto a estes últimos, a sua capacidade financeira (cf. preâmbulo e artigos 1.º a 3.º), não ficando, pois, afetado pela existência de outro tipo de créditos a favor dos municípios, designadamente os ancorados em políticas ambientais ou fiscais;

 
12.ª - Na senda de privatização da titularidade ou do direito de exploração de meios de produção, que a Lei-Quadro das Privatizações (Lei n.º 11/90, de 5 de abril) previu, foi publicado o Decreto-Lei n.º 7/91, de 8 de janeiro, que alterou a natureza jurídica da empresa pública «Electricidade de Portugal (EDP), E. P.», convertendo-a de pessoa coletiva de direito público em pessoa coletiva de direito privado, com o estatuto de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, que lhe sucedeu automática e globalmente, continuando a personalidade jurídica daquela, conservando a universalidade dos direitos e obrigações, que constituíam o seu património no momento da transformação (artigo 2.º, n.º 1);
 
13.ª - E foi igualmente publicado o Decreto-Lei n.º 99/91, de 2 de março, que, consagrando já o princípio da «liberdade de acesso às actividades de produção, transporte e distribuição de energia eléctrica, a exercer mediante licença» (cf. artigo 7.º), veio estabelecer o regime jurídico do exercício das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica para consumo público, instituindo o Sistema Elétrico de Abastecimento Público (SEP), constituído pela Rede Nacional de Transporte de energia elétrica (RNT), explorada em regime de concessão de serviço público, a montante, pelos produtores e, a jusante, pelos distribuidores, vinculados ao sistema através de um regime contratual (artigos 1.º, 4.º e 5.º);
 
14.ª – A «EDP, SA» continuou a exploração dos empreendimentos elétricos de acordo com o regime que havia sido definido para as sociedades nacionalizadas, o mesmo acontecendo também com as empresas para as quais viriam a ser transmitidas, «sem alteração das garantias», todas as posições ou relações jurídicas tituladas por aquela, em resultado da reformulação do seu universo empresarial, nos termos determinados pelo Decreto-Lei n.º 131/94, de 19 de maio (cf. artigo 5.º);
 
16.ª - A reabertura do serviço de produção e distribuição de energia elétrica para consumo público à iniciativa privada, encetada pelos Decretos-Leis n.ºs 449/88, de 10 de dezembro, e 99/91, de 2 de março, foi reforçada pelo conjunto de diplomas constituído pelos Decretos-Leis n.ºs 182/95 a 188/95, todos, de 27 de junho, que procedeu a divisão do Sistema Elétrico Nacional (SEN) em Sistema Elétrico de Serviço Público e Sistema Elétrico Independente (artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 182/95) e estabeleceu que as atividades de produção vinculada de energia elétrica e de produção não vinculada estavam sujeitas a licença (artigos 13.º, n.º 1, e 46.º do Decreto-Lei n.º 182/95);
 
17.ª- Entrementes, no espaço da atividade de produção de energia elétrica desenvolvida por pessoas singulares ou coletivas, de direito público ou privado, independentemente da forma jurídica, que assumiam, em regime de livre acesso, como dimana do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, o Decreto-Lei n.º 339-C/2001, de 29 de dezembro, que procedeu a alteração designadamente do Anexo II à diploma legal, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 168/99, de 18 de maio, aditou a esse anexo um novo item (n.º 33);
 
18.ª - Nesse item, estabelece-se a obrigação de pagamento pelas empresas detentoras de licenças de exploração de parques eólicos de uma renda municipal correspondente a 2,5% do pagamento mensal feito pela entidade recetora da eletricidade produzida;
 
19.ª - Todavia, ainda de acordo com o referido item n.º 33, alínea b), nos casos em que as empresas detentoras das licenças de exploração tivessem celebrado quaisquer acordos ou contratos com as autarquias locais em cuja área estivessem implantadas, no que concerne a compensação pela respetiva exploração, a imposição ope legis dessa renda (no valor de 2,5% sobre o pagamento mensal feito pela entidade recetora da energia elétrica produzida, em cada instalação eólica), podia ceder, como legalmente previsto, ao acordado ou contratualizado;
 
20.ª - A reforma instituída em 1995 vigorou até ao quadro legal erigido pelo Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, que, concretizando o plano normativo da orientação estratégica da Resolução do Conselho de Ministros n.º 169/2005, de 24 de outubro, e procedendo a transposição para a ordem jurídica interna dos princípios da Diretiva n.º 2003/54/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, constituiu as bases gerais da organização e funcionamento do Sistema Elétrico Nacional, procedendo a uma alteração de paradigma que já vinha emergindo, e estabeleceu a regulamentação atinente ao exercício das atividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de eletricidade e à organização dos mercados de eletricidade (artigo 1.º), consagrando, em qualquer das suas versões, atentas as alterações de que foi objeto, a livre concorrência na produção de energia elétrica e o livre acesso à atividade de produção de energia elétrica, sujeito à obtenção de licença (artigos 4.º, n.ºs 3 e 4, e 15.º) e, destarte, em rutura com o regime de monopólio da EDP vigente aquando da aprovação, publicação e entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 424/83;
 
21.ª - Considerou igualmente que a produção de energia elétrica é em regime ordinário ou em regime especial (cf. artigo 16.º), sendo a produção em regime ordinário constituída pela atividade de produção de energia que não se encontrava abrangida por um regime jurídico especial (artigos 16.º a 18.º), limitando-se a remeter para legislação complementar o regime jurídico da produção elétrica em regime especial (artigo 18.º, n.º 2);
 
22.ª- Daí que, integravam o conceito de produção em regime ordinário as grandes hídricas e as centrais termoelétricas que produzissem energia elétrica através da queima de fontes de energia primária de origem fóssil (como o carvão, gás natural e petróleo); 
 
23.ª – Todavia, o Decreto-Lei n.º 29/2006 não contém qualquer manifestação expressa sobre a matéria versada no Decreto-Lei n.º 424/83, pois no regime trazido à luz, quanto ao exercício das atividades de produção de energia elétrica, nada se regrou ou dispôs sobre as rendas aos municípios pelos centros electroprodutores de energia elétrica (em regime ordinário ou em regime especial); e o mesmo veio a acontecer com o Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto, que o desenvolveu;
 
 24.ª - Com a reforma consubstanciada pelos Decretos-Leis n.º 215-A/2012 e 215-B/2012, de 8 de outubro de 2012, que procederam respetivamente à alteração dos Decretos-Leis n.ºs 29/2006 e 172/2006, de 23 de agosto, assegurando a transposição da Diretiva n.º 2009/72/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho, consolidou-se que a produção de energia elétrica se exercia em regime livre, estando apenas sujeita à obtenção prévia de licença (artigo 15.º), continuando a distinguir, no que concerne à produção, duas classificações: produção em regime ordinário e a produção em regime especial (artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 29/2006);
 
25.ª - O legislador no Decreto-Lei n.º 49/2019, de 15 de abril, que determinou a cessação de vigência de Decretos-Leis publicados entre os anos de 1981 e 1985, em razão de caducidade, revogação tácita anterior ou revogação expressa efetuada pelo próprio Decreto-Lei n.º 49/2019, não elencou, entre esses diplomas, o Decreto-Lei n.º 424/83, não considerando, pois, a extinção deste por caducidade ou revogação (tácita ou expressa), inexistindo diploma legal que contenha normativo em que se tenha procedido a alteração do Decreto-Lei n.º 424/83 ou que tenham procedido a sua revogação expressa (total ou parcial);
 
26.ª - Não obstante a intensa produção legislativa no âmbito do setor elétrico, concretizada, designadamente nos Decretos-Leis n.ºs 99/91 e 100/91, 182/95 a 188/95, 29/2006 e 172/2006, nas suas sucessivas versões, e nos diplomas legais que os alteraram, nada se refere ou dispõe sobre as rendas aos municípios pela construção e funcionamento dos centros produtores (hidroelétricos e termoelétricos) previstas no Decreto-Lei n.º 424/83;
 
27.ª - No entanto, tendo sido instituído, com a Lei n.º 11/87, de 7 de abril, o regime da avaliação de impacte ambiental como instrumento preventivo essencial no domínio do ambiente, no âmbito do qual, se veio a determinar, através da decisão de impacte ambiental, medidas de natureza mitigatória e compensatória [cf. designadamente artigos 31.º, alínea c), da Lei n.º 11/87, 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 186/90, de 6 de junho, na versão originária, e artigo 3.º, n.º 3, alínea b), na versão introduzida pelo Decreto-Lei n.º 278/97, de 8 de outubro, artigo 2.º, n.ºs 1, alínea c), e 2, 5.º item, do Decreto Regulamentar n.º 38/90, de 27 de novembro, 2.º, alíneas e), i), l) e n), 4.º, alínea d), 17.º, n.º s 1 e 2, 27.º, alínea b), e 29.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 69/2000 e 18.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 151-B/2013, de 3 de outubro];
 
28.ª - Instrumento que veio abranger designadamente alguns projetos de produção industrial de energia elétrica como os hídricos e os eólicos [cf. mormente artigo 7.º, n.º 1, e Anexo III, item n.º 3, alíneas a) e j), do Decreto-Lei n.º 186/90; anexo ao Decreto Regulamentar n.º 38/90, na redação dada pelo Decreto Regulamentar n.º 42/97, de 10 de outubro; Anexos I, itens n.ºs 15 e 19, II, itens n.ºs 3, alíneas a), h) e i), do Decreto-Lei n.º 69/2000; e artigo 1.º, n.ºs 3 a 5, do Decreto-Lei n.º 151-B/2013, com referência, por força das alíneas a) e b) do antedito n.º 3, aos Anexos I a III];
 
29.ª- Também no que concerne à análise de incidências ambientais se veio a prever a aplicação de medidas designadamente compensatórias [cf. artigo 10.º, n.º 6, alínea e), do Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de abril, republicado pelo Decreto-Lei n.º 49/2005, ex vi, sucessivamente, artigos 33.º-R, n.º 3, e 10.º-A, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 172/2006 (respetivamente, nas redações conferidas pelos Decretos-Leis n.º 215-B/2012 e 76/2019, de 3 de junho) e, atualmente, 44.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro];
 
30.ª - A declaração de impacte ambiental constitui um ato administrativo com eficácia externa, inserido num procedimento administrativo, que define a posição da Administração e dos particulares interessados quanto à matéria de inserção ambiental do projeto, contenciosamente impugnável [ver artigos 20.º e 35.º-A do Decreto-Lei n.º 69/2000 (este último aditado pelo Decreto-Lei n.º 197/2005 e 2.º, alínea g), 3.º, n.º 8, 22.º e 37.º do Decreto-Lei n.º 151-B/2013];
 
31.ª - E no caso de DIA favorável condicionada, a fixação das condições a adotar ao longo das várias fases de desenvolvimento do projeto, podem não incluir designadamente medidas de compensação dos impactes ambientais ou, podendo inclui-lo, as medidas compensatórias não serem junto dos municípios (ou das populações locais), ou sendo-o não revestirem para os municípios natureza pecuniária (cf. as normas referenciadas da Lei n.º 11/87 e dos Decretos-Leis  n.º  69/2000 e 151-B/2013);
 
32.ª - O facto de um dos índices necessários para as fórmulas, constantes dos artigos 2.° e 3.° do Decreto-Lei n.º 424/83, ter deixado de ser publicado pela ERSE, não é suficiente para considerar verificada a caducidade deste diploma legal ou de qualquer seu preceito, por apenas poder afligir o meio de quantificação do valor da renda e não o direito consignado no artigo 1.º do mesmo Decreto-Lei;

 
33.ª – Acresce, considerando o aduzido, que a liberalização do setor da energia elétrica não aflige ou afasta a existência do pagamento de rendas pelos centros electroprodutores hídricos aos municípios, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 424/83, as quais fazem sentido num mercado liberalizado como o ilustra a expressa previsão do pagamento das rendas aos municípios pelas centrais electroprodutoras eólicas, no aditamento ao Anexo II do Decreto-Lei n.º 189/88, introduzido pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 339-C/2001, de 29 de dezembro, e sequentemente mantido;
 

34. ª - Com tais sucessivos regimes gerais do setor energético, que foram constituindo as normas definidoras do sistema global do setor elétrico nacional, que constituem «lei geral», relativamente ao Decreto-Lei n.º 424/83, não foram publicadas quaisquer normas legais que viessem regrar sobre o conjunto da matéria versada neste diploma de 1983 e, assim, afastar a sua aplicação, inexistindo pois, uma conduta concludente do legislador da lei nova em revogar a lei anterior sobre rendas, tanto mais que não se verifica, nesta matéria, uma nova e contrária manifestação de vontade do legislador, incompatível com a subsistência da lei antiga, o que afasta a verificação dos requisitos consignados no artigo 7.º, n.ºs 2 e 3, do Código Civil;  
 

35.ª - Como a intenção do legislador com o Decreto-Lei n.º 424/83 foi, como decorre do próprio diploma, a de abranger a totalidade dos centros produtores hidroelétricos e termoelétricos para consumo público, que haviam sido nacionalizados e de que a «EDP,EP» era, na altura, fruto do sistema legal vigente, a única titular, coloca-se, face às alterações posteriores, o problema de interpretação atualista do Decreto-Lei n.º 424/83, pois, nos termos do artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil a interpretação da lei não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada;

 

36.ª - Na verdade, o problema de interpretação atualista da lei surge em situações como quando se verifica uma mudança das circunstâncias de facto para as quais a norma foi criada, quando se verifica uma mudança do uso de linguagem, suscetível de atribuir novos sentidos à expressão verbal empregue pela norma ou, finalmente, quando se opera um alteração dos critérios valorativos resultantes da alteração global do desenvolvimento axiológico-jurídico;
 
37.ª - Ademais, deve atender-se à função e finalidade ou escopo da norma e, assim, interpreta-la no sentido de maior conformidade com a sua função ou escopo, não podendo, pois, ser considerados aqueles sentidos que não tenham na letra da lei alguma correspondência, ainda que mínima ou remota, tendo em consideração a necessária elasticidade do sistema (cf. artigo 9.º, n.º 2, do Código Civil);
 
38.ª – Destarte, o regime de rendas, contemplado no Decreto-Lei n.º 424/83, não se deve cingir aos centros electroprodutores atribuídos à EDP fora da livre concorrência (em situação de monopólio), antes deve abranger os titulares dos centros produtores hidroelétricos atribuídos em regime de concorrência e, assim, os demais centros produtores hidroelétricos atribuídos à EDP e os atribuídos a outras entidades, dado comungarem da ratio legis que àquele diploma inere;
 
39.ª - Entendimento este que não acarreta qualquer afronta aos princípios constitucionais da livre concorrência [artigos 81.º, alínea f), e 99.º, alínea a), da Constituição], da iniciativa privada (artigo 61.º, n.º 1), ou da igualdade (artigo 13.º) antes, pelo contrário, necessariamente os considera como decorre do aduzido, constituindo igualmente vias justificadoras da interpretação atualista, a fim de assegurar que realidades idênticas ou similares sejam tratadas de maneira igual evitando-se «antinomias ou incongruências» no sistema;

 

40.ª - Não foi, assim, afastada a vigência do Decreto-Lei n.º 424/83 até à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro;
 
41ª. – Este último diploma, que estabelece a organização e o funcionamento do Sistema Elétrico Nacional e que entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação (artigos 1.º e 307.º), determina, no artigo 18.º, n.º 1, que o início do procedimento para obtenção de licença de produção de eletricidade depende da prévia atribuição de reserva de capacidade de injeção na Rede Elétrica de Serviço Público;
 
42.ª - Os regimes de cedências e compensações aos municípios pelos titulares de centros electroprodutores de eletricidade de fonte renovável ou de instalação de armazenamento, contemplados no artigo 49.º, respeitam aos centros electroprodutores de eletricidade de fonte renovável ou de instalação de armazenamento, que tenham potência de ligação atribuída superior a 1 MVA (cf. n.ºs 1 e 2);
 
43.ª - No entanto, do disposto no artigo 276.º, n.º 9, inserido no capítulo referente às disposições finais e transitórias, resulta que o artigo 49.º só é aplicável aos titulares de centro electroprodutor de eletricidade de fonte renovável ou de instalação de armazenamento, que tenham obtido título de reserva de capacidade de injeção na RESP, após o dia 15 de janeiro de 2022;
 
44.ª- Salvaguarda-se, deste modo, o regime legal de rendas aos municípios pelos titulares de centros electroprodutores, como o contemplado no Decreto-Lei n.º 424/83; e
 
45.ª – Aplica-se, porém, o novo regime de cedências e compensações consagrado no referido artigo 49.º se a obtenção da reserva de capacidade de injeção na RESP pelos centros electroprodutores ocorrer após o dia 15 de janeiro de 2022, pelo que o regime de rendas municipais previsto no Decreto-Lei n.º 424/83, não foi revogado pela (mera) entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 15/2022, a 15 de janeiro de 2022.
 
Texto Integral
Parecer n.º 24/2024
JA
 
Senhora Ministra do Ambiente e da Energia
Excelência:
 
 
 
Dignou-se o antecessor de Vossa Excelência solicitar à Procuradoria-Geral da República a emissão de parecer do Conselho Consultivo, ao abrigo do artigo 44.º, alínea a), do Estatuto do Ministério Público[1], «sobre a questão da vigência do Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro» e, assim, para se, «tendo em consideração os argumentos apresentados e a evolução do regime jurídico entretanto aplicável, nomeadamente, a total reconfiguração do Sistema Energético Nacional, se deverá considerar que existiu uma revogação tácita (parcial ou total) do Decreto-Lei n.°424/83, de 6 de dezembro, ou se, pelo contrário, se deverá considerar que este diploma legal ainda se encontra a produzir efeitos».
Acompanhou o pedido de parecer uma nota explicativa, e três anexos: dois pareceres da ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos), sendo um datado de 26 de julho de 2017 (Anexo I)[2] e o outro datado de 19 de agosto de 2022 (Anexo II); e um parecer jurídico do Doutor MIGUEL CATELA, apresentado pela Associação de Municípios do Baixo Sabor[3], que sustenta a não revogação do Decreto-Lei n.º 424/83 (Anexo III).
Na referida Nota Explicativa do pedido de parecer, faz-se o enquadramento do pedido de parecer, indicando-se o entendimento da ERSE e a posição sufragada no parecer jurídico apresentado pela Associação de Municípios do Baixo Sabor, com súmula da respetiva fundamentação, e, finalmente, alude-se à concreta situação fática subjacente - a situação do Aproveitamento Hidroelétrico do Baixo Sabor.

No enquadramento do pedido de parecer começa por referir-se que[4]:
              «1. O Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro, consagrou o pagamento de rendas anuais aos municípios cuja circunscrição fosse afetada pela zona de influência de centros electroprodutores instalados pela EDP (à data, EDP - Eletricidade de Portugal. E.P.), empresa de capitais exclusivamente públicos.
              2. Com a aprovação do Despacho n.º 24567-A/2001, da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, doravante abreviadamente designada por «ERSE», foi modificada a estrutura de tarifas para o fornecimento de energia elétrica, deixando aquela entidade de proceder à fixação da taxa de potência da tarifa de Muito Alta Tensão (MAT), o que passou a inviabilizar a aplicação das fórmulas de cálculo das rendas.
               3. Nesse seguimento, o cálculo da renda anual aplicável aos centros electroprodutores da EDP deixou de poder ser realizado nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro, pese embora a EDP e os municípios tenham continuado a proceder à sua determinação através da indexação do último valor da renda calculado com o último valor publicado da tarifa à inflação tarifária.
              4. Acontece que, em 2006, foi aprovado o Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, o qual veio estabelecer os princípios gerais relativos à organização e funcionamento do sistema elétrico nacional, bem como ao exercício das atividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de eletricidade e à organização dos mercados de eletricidade, transpondo para a ordem jurídica interna os princípios da Diretiva n.º 2003/54/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Junho, que estabeleciam regras comuns para o mercado interno da eletricidade, e revogou a Diretiva n.º 96/92/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de Dezembro.
              5. Com a sua aprovação e consequente entrada em vigor, deu-se início a um novo quadro organizativo do sector elétrico.
              6. Em concreto, as atividades de produção e comercialização passaram a ser exercidas em regime de livre concorrência, e as atividades de transporte e distribuição passaram a ser exercidas mediante a atribuição de concessões de serviço público.
               7. Deste novo regime organizativo do setor elétrico, resultaria, implicitamente, a inaplicabilidade do regime do Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro, em relação a novos centros electroprodutores atribuídos em regime de concorrência apôs a entrada em vigor do novo diploma».
 

De seguida, aludindo-se ao entendimento da ERSE manifestado em 2017, no referido documento, expende-se:

             «8. Em 2017, a ERSE veio partilhar o seu entendimento de que, por efeitos do regime de extinção gradual das tarifas reguladas de venda a clientes finais, a tarifa MAT aplicável pelo comercializador de último recurso deixou de ser publicada pela ERSE desde 2014.
              9. Para corroborar o seu entendimento, esta Entidade acrescentou que, no seguimento da evolução legislativa ao longo dos anos, tinham sido criados vários outros mecanismos de compensação aos municípios, nomeadamente, os seguintes:
              a. O Decreto-Lei n.º 339-C/2001, de 29 de dezembro, que veio prever a atribuição de uma renda de 2,5% sobre o pagamento mensal feito pela entidade recetora da energia elétrica produzida em cada instalação eólica[5];
              b. No âmbito do procedimento de avaliação de impacte ambiental (AIA), hoje regulado pelo Decreto-Lei n.º 151-B/2013, de 31 de outubro, que prevê o regime jurídico da AIA, prevê-se a possibilidade de que a emissão de uma Declaração de Impacte Ambiental (DIA) favorável seja condicionada ao cumprimento de um conjunto de medidas de mitigação, minimização e compensação dos impactes ambientais do centro electroprodutor, nomeadamente junto dos municípios; e ainda
              c. O regime do IMI que sofreu alterações que tiveram impacto nos centros electroprodutores.».
 
Após a transcrita alusão a esse documento da ERSE, continua a nota explicativa na sua ponderação, aludindo ao indicado parecer da ERSE de 2022:
              «10. Mais recentemente, também se deverá tomar em consideração o regime de cedências de potência ao município ou municípios onde se localiza o centro eletroprodutor, previsto no artigo 49.° do Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro, que ao momento estabelece a organização e o funcionamento do Sistema Elétrico Nacional.
              11. Chama-se igualmente à atenção para a previsão de remuneração dos municípios, via Fundo Ambiental, pela instalação de centros electroprodutores de fontes de energia renováveis e de instalações de armazenamento que obtenham título de controlo prévio de operações urbanísticas ou que tenham sido isentas de controlo prévio nos termos do artigo 4.°-A, prevista no artigo 4.°-B, ambos do Decreto-Lei n.º 30-A/2022, de 18 de abril, aditados pelo Decreto-Lei n.º 72/2022, de 19 de outubro.
              12. Ainda neste contexto, a ERSE recorda que, a 27 de fevereiro de 2012, foi celebrado um protocolo entre a ANMP e a EDP para compensação dos municípios, prevendo-se a atribuição aos indicados no Anexo ao protocolo, do montante global anual de cinco milhões de euros, nos anos de 2011 e 2012.
              13. Ante o exposto, a ERSE considera que o Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro, não se encontra adaptado à nova realidade de mercado que surgiu em 2006, pelo que a sua aplicação deve ser interpretada como "datada" no tempo, tendo deixado de se aplicar após a aprovação do novo regime jurídico aplicado ao Sistema Elétrico Nacional.
              14. De facto, quando o Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro, foi aprovado existia o monopólio da EDP - que, entretanto, terminou com a abertura do mercado da eletricidade à concorrência - e não existia necessidade de AIA, por exemplo. Entretanto, toda a estrutura do Sistema Elétrico Nacional foi alterada, em especial na vertente de abertura â concorrência e de tarifas, existindo incentivos específicos, direcionados aos municípios onde se instalem centrais electroprodutoras, como referido nos pontos 9 a 11 da presente nota.
              15. Fazendo apelo a esta interpretação, então sempre se concluirá que o Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro, não é aplicável aos centros electroprodutores após a reconfiguração do mercado energético.». 
Afigura-se-nos conveniente consignarmos neste momento que já no referido parecer de 2017, a ERSE considerava que:

               «O regime legal de 1983 encontra-se desajustado face aos múltiplos desenvolvimentos sofridos no setor elétrico desde então, pelo que a sua atualização é positiva. Todavia, na atualização ou desenho de novos mecanismos importa ter em consideração mecanismos de compensação que foram criados, em especial para projetos mais recentes, e as consequências no mercado e no preço de eletricidade suportado pelos consumidores». 

No entanto, no dito parecer de 2022, narra-se que:
               «[A]lguns centros electroprodutores atualmente detidos pela EDP - Gestão da Produção de Energia, S.A, (EDP Produção) e que beneficiavam de Contratos de Aquisição de Energia (CAE) transitaram para o regime de Contratos de Custos para a manutenção do equilíbrio contratual (CMEC), ao abrigo do Decreto-Lei n,° 240/2004, de 27 de dezembro. Nos termos dos artigos 9.° e 10.º do mencionado diploma, os acordos de cessação dos CAE, aprovados pelo membro do Governo com competência na área da Energia, deviam prever, inter alia, a concretização de direitos e de deveres das partes, montantes de compensações, condições de ajustamentos anuais e finais, termos e condições de pagamento das compensações e sujeição a arbitragem e litígios, Na verdade, os documentos de Metodologia e Parâmetros de cálculo do Ajustamento Final do Montante dos CMEC" referem-se à renda a pagar por estes centros electroprodutores ao abrigo do Decreto-Lei n.° 424/83, de 6 de dezembro. A ERSE não tem notícia de que tais rendas não estejam a ser consideradas nos pagamentos aos municípios.»

 A nota explicativa, após considerar o entendimento da ERSE, alude ao parecer apresentado pela Associação de Municípios do Baixo Sabor, datado de 4 de julho de 2023, consignando que:

              «16. Neste contexto, a Associação de Municípios do Baixo Sabor fez chegar a este Gabinete um Parecer Jurídico assinado pelo Doutor Miguel Catela, nos termos do qual se pode ler que "[s]endo o tema essencial da consulta saber se o decreto-lei n.º 424/83, de 6 de dezembro, tenha sido revogado, a nossa principal conclusão é que não foi, e, por isso, não resta outra posição que não seja o reconhecimento de que está em vigor”.
              17. Para tal conclusão, o referido Autor assenta, entre outras, nas seguintes premissas:
               a. “porque, em primeiro lugar, não ocorreu qualquer revogação expressa do decreto-lei n.º 424/83, de 6 de dezembro, isto é, não foi produzida em diploma formalmente legislativo qualquer declaração expressa no sentido de que deveria ser eliminado;”
              b. “e também porque, apesar de ter, entretanto, ocorrido uma vasta produção legislativa sobre o setor elétrico,  nela não se encontram normas que tenham visado substituir, ou sequer eliminar, o disposto no decreto-lei n.º 424/83, de 6 de dezembro;”
              c. “além disso, as normas definidoras de um sistema global são lei geral perante o Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro, pelo que nunca teriam a possibilidade de revogar tal diploma, exceto se outra fosse a vontade inequívoca do legislador, o que não foi, nem é, manifestamente o caso;”
              d. “logo, não se verificaram os pressupostos para a aplicação das regras da primeira modalidade da revogação tácita, segundo as quais uma contradição substancial entre lei nova e lei antiga provoca a revogação tácita da segunda;”
              e. “ e menos será aplicável a segunda modalidade da revogação tácita, dado que não foi publicada qualquer lei que haja disposto sobre a totalidade do conteúdo do decreto-lei n.º 424/83, de 6 de dezembro, aliás, nem sobre o conjunto, nem sobre parte dele;”»[6] .

Na nota explicativa, finalmente, alude-se ao Aproveitamento Hidroeléctrico do Baixo Sabor, considerando-se que:

               «18. A título de enquadramento fáctico, deve referir-se que em causa está o Aproveitamento Hidroeléctrico do Baixo Sabor, inaugurado em 2016, originariamente da propriedade da EDP, vendido em 2019 a um consórcio francês composto pela Engie e Movhera.
              19. Nesse contexto, refira-se que a DIA deste projeto, emitida em 15 de junho de 2004, na sua Condicionante n.º 8, determinou a constituição de um fundo financeiro, por parte da entidade proponente do projeto, destinado a iniciativas de desenvolvimento sustentável com base na valorização ambiental dos recursos naturais e patrimoniais da região, numa ótica de criação de riqueza e fomento de dinâmicas cívicas e de bem-estar social deste aproveitamento. Esse fundo deve ser dotado anualmente com uma verba calculada na base de 3% do valor líquido anual médio de produção do Aproveitamento Hidroeléctrico do Baixo Sabor.
              20. Essa verba, inicialmente gerida pelo Fundo Baixo Sabor, criado no âmbito do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, pelo Despacho n.° 14136/2010, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.° 176, de 9 de setembro de 2010, é hoje gerido pela Associação de Municípios do Baixo Sabor de Fins Específicos (“AMBS”), após o Despacho n.º 15524/2016, publicado no Diário da Republica, 2.ª série, n.º 246, de 26 de dezembro de 2016».

A apreciação da questão que nos é colocada - sobre se o Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro, foi tacitamente revogado ou se o mesmo se deve considerar ainda em vigor - ancora no tratamento distinto que tem merecido, independentemente de a essa questão subjazer, no caso, a situação do indicado Aproveitamento Hidroelétrico.

Para apreciação da questão (abstrata) colocada, impõe-se, ao que se nos afigura, a efetuação, em traços gerais, do enquadramento legislativo do setor energético nacional, e, assim, fazer um breve percurso histórico, tendo em conta as suas sucessivas vicissitudes. Para se proferir resposta à questão colocada, importa, igualmente, atender às demais compensações existentes a favor dos municípios e apurar o âmbito do regime contemplado no Decreto-Lei n.º 424/83, pois só, então, tendo em consideração as regras da interpretação jurídica, estaremos em condições de aferir se foi mantido em vigor ou se foi tacitamente revogado e, neste último caso, se total ou parcialmente.

Cumpre, assim, satisfazer o pedido, procedendo à emissão do parecer solicitado a este Corpo Consultivo.
 
I
Enquadramento legislativo do setor energético
 
1 - Com a promulgação da Lei n.º 2002, de 26 de dezembro de 1944[7], conhecida por «Lei da Eletrificação Nacional»[8], versando a eletrificação do País, foram estabelecidos os princípios da produção, consagrando-se a centralização da produção[9].
Na Parte I (Bases I a XIII), regula-se em duas secções autónomas (Bases II a VIII e Bases IX a XIII) - a denominada «rêde eléctrica nacional»,[10] que, de acordo com a Base I, abrange o conjunto de instalações de serviço público destinadas à produção, transporte e distribuição de energia elétrica.
Fixou-se como prioridade a produção, principalmente, de origem hidráulica e, assim, a preferência pela hidroeletricidade[11] (Bases II a VIII), regrou-se acerca do transporte e da grande distribuição de energia elétrica (Bases IX a XIII). E se, na parte III (Bases XIX a XXV), se versava a pequena distribuição, que era confiada, em princípio, à ação de federações de municípios[12], na Parte IV (Bases XXVI a XXIX) estabelecia-se sobre as tarifas e condições de venda.
A Parte II (Bases XIV a XVIII), atinente às regras da concessão, dispunha, na Base XIV, que as instalações referidas na Parte I (destinadas à produção, transporte e distribuição de energia elétrica) «são consideradas de utilidade pública e objecto de concessão por parte do Estado», bem como se previam quatro categorias de concessões, dadas por decisão do Conselho de Ministros: centrais produtoras hidráulicas, térmicas, linhas de transporte e de grande distribuição.
Na Base XV, definiam-se as condições gerais das concessões: a duração, nunca superior a 75 anos [alínea a)]; a reversão gratuita dos bens para o Estado no termo da concessão [alínea b)];a isenção, em princípio, de contribuição industrial [alínea c)][13]; a gratuitidade da exploração nos primeiros 10 anos de exploração e pagamento posterior pelas concessões de rendas (ao Estado) sob a forma de percentagem sobre os preços de venda de KWh produzido, e comprado ou admitido nas linhas [alínea d), itens 1.º, a 2.º] [14], bem como o pagamento de adicionais às Câmaras [alínea d), 3.º item].
Com efeito, segundo o item 3.º da alínea d) da Base XV:
              «3.º Sôbre a importância da renda relativa à produção incidirá o adicional de 20 por cento destinado às câmaras municipais dos concelhos onde estejam situadas as obras de aproveitamento, a repartir entre elas, na proporção, tanto quanto possível, do valor das expropriações ou compras de imobiliários efectuados nas respectivas áreas»[15].
E sobre o pequeno produtor de energia elétrica regravam as Bases XXX a XXXII (inseridas na Parte V, com a epígrafe «Das instalações particulares – Disposições gerais»).
 
1.1 – A Lei n.º 2002 constituía, de acordo com o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 43.335, de 19 de novembro de 1960, «um corpo completo de doutrina» «dentro da qual havia de enquadrar-se toda a execução da política nacional de electrificação, que ia começar», com «a imediata vantagem de permitir lançar as soluções que se impunham com mais premente urgência», embora as suas disposições repetissem «conceitos já conhecidos, dispersos por variada legislação».
Os princípios gerais vertidos na Lei n.º 2002 vieram a ser desenvolvidos e regulados cerca de 16 anos após, pelo referido Decreto-Lei n.º 43.335, com inovações, devido a «desactualização de uma ou outra das disposições daquela lei» - atento o tempo decorrido e a inerente «mudança de perspectivas da electricidade portuguesa ao longo deste período» - ou a «inadaptação de algumas das suas expressões às circunstâncias impostas» pelas realidades existentes aquando da regulamentação.
Este Decreto-Lei de 1960 veio, assim, regular a execução da Lei n.º 2002, com exceção da sua parte III – entretanto já desenvolvida pela Lei n.º 2075, de 21 de maio de 1955 -, e, nessa medida dispor sobre as concessões a outorgar pelo Estado nos domínios da produção, transporte e grande distribuição de energia da rede elétrica nacional (artigos 35.º e 36.º), procedendo ao desenvolvimento dos princípios gerais fixados[16].
Estabelecer também as condições gerais de venda de energia elétrica em alta tensão, prescrevendo, no âmbito da secção denominada «Do regime fiscal», quanto às percentagens a pagar ao Estado, pelas concessões, a título de renda (artigo 68.º), considerando, porém, que as concessões de produção hidroelétrica exploradas por câmaras municipais ou federações de municípios ficavam isentas do pagamento dessa renda, desde que os seus perímetros hidráulicos estivessem inteiramente compreendidos dentro das áreas dos respetivos concelhos (§ 1.º do artigo 68.º)[17]. E no artigo 70.º veio-se regrar o pagamento de adicional (sobre o valor dessa renda) destinado às Câmara Municipais, ao expressamente determinar que:
              «Sobre a importância da renda relativa à produção incidirá o adicional de 20 por cento destinado às câmaras municipais dos concelhos onde estejam situadas as obras dos aproveitamentos, a repartir entre elas, tanto quanto possível na proporção do valor das expropriações ou compras de imobiliários efectuadas nas respectivas áreas.
               § 1.º Quando numa mesma concessão estiverem abrangidos aproveitamentos cujos períodos gratuitos terminem em épocas diferentes, determinar-se-á o adicional a repartir pelas câmaras municipais dos concelhos interessados, como se a cada aproveitamento correspondesse uma concessão distinta.
              § 2.º Pelos aproveitamentos hidroeléctricos que entrem em exploração depois da publicação deste diploma, os respectivos concessionários pagarão às câmaras municipais interessadas, na proporção fixada no corpo do artigo, durante o período gratuito e a título de indemnização pela quebra de rendimentos, uma importância anual igual a 1,5 por mil do valor da energia produzida, calculado nos termos do artigo 68.º e seus parágrafos.».
E o capítulo III (artigos 140.º a 145.º) contemplava normas próprias e específicas sobre as instalações de serviço particular.
 
1.2 - O projeto da eletrificação do país surgiu, pois, com a Lei n.º 2002, como um empreendimento da responsabilidade do Estado, embora dando esta Lei corpo a intervencionismo do Estado no setor elétrico, que o Decreto-Lei n.º 43.335 desenvolveu (como dimana mormente das Bases IV, V a VIII e XIV da Lei n.º 2002 e artigos 20.º, 90.º, 93.º, 94.º e 99.º do Decreto-Lei n.º 43.335), consubstanciando um regime legal em que o exercício das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica se estribava na outorga de concessões do Estado a cidadãos portugueses ou a empresas nacionais com maioria de capital português, em que o Estado podia participar (cf. mormente Bases n.ºs IV e XVII da Lei n.º 2002 e artigos 19.º e 20.º do Decreto-Lei n.º 43.335).
Foi, portanto, com recurso a capital privado, «assente na outorga de concessões do Estado a cidadãos portugueses (ou a empresas nacionais com maioria de capital português), que o sistema elétrico surgiu, em Portugal, tendo-se desenvolvido essencialmente através de sistemas hidroelétricos múltiplos, construídos entre 1944 e 1961, complementados por unidades termoelétricas de pequena dimensão»[18].
Estamos, na verdade, perante um sistema elétrico que era explorado, na produção, bem como na distribuição, transporte e comercialização, mediante concessões outorgadas pelo Estado a cidadãos nacionais ou a entidades privadas (com capitais maioritariamente nacionais), através de decreto que integrava o respetivo caderno de encargos, que tinha de incluir determinadas cláusulas, mormente sobre o prazo e regime de reversão[19] (cf. Bases XIV, XV e XVII da Lei n.º 2002 e artigos 5.º, 13.º, 14.º 19.º do Decreto-Lei n.º 43.335).
 
2 - A estrutura organizativa do sector elétrico nacional, estabelecida pela Lei n.º 2002, de 26 de dezembro de 1944, e desenvolvida pelo Decreto-Lei n.º 43335, de 19 de novembro de 1960, manteve-se vigente até à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 205-G/75, de 16 de abril, com eficácia a contar desde 15 de abril de 1975.
Este Decreto-Lei, considerando, designadamente, a situação do setor da eletricidade e «de forma a garantir a integração vertical aconselhada por razões técnicas e económicas»[20] (cf. preâmbulo), operou a nacionalização das principais empresas concessionárias no âmbito do setor elétrico (catorze sociedades exploradoras do serviço público de produção, transporte e distribuição de energia elétrica, entre as quais a «ED - Eléctrica Duriense, Lda» e a empresa de capitais mistos «CPE - Companhia Portuguesa de Electricidade, S. A. R. L.» (artigo 1.º, n.º 1)[21], pondo, assim, termo à estrutura organizativa do setor elétrico nacional, aprovada em 1944 e desenvolvida em 1960 no que respeita  ao exercício das atividades de produção de eletricidade, bem como do seu transporte e distribuição.
E de acordo com o artigo 3.º:
              «1. A universalidade dos bens, direitos e obrigações que integram o activo e o passivo das sociedades a que se refere o artigo 1.º, ou que se encontrem afectos à sua exploração, são transferidos para o Estado, integrados no património autónomo das respectivas empresas ou a ela igualmente afectos.
               2. O disposto no número anterior constitui título comprovativo da transferência, para todos os efeitos legais, incluindo os de registo, sendo, em caso de dúvida, título bastante a simples declaração feita pelas respectivas empresas e confirmada pela Direcção-Geral da Fazenda Pública de que os bens se incluem entre os referidos no n.º 1»[22].

Destarte, a nacionalização de sociedades concessionárias da exploração das diversas atividades inseridas no setor de energia elétrica, pelo Decreto-Lei n.º 205-G/75, de 16 de Abril, determinou a transferência para o Estado dos respetivos patrimónios e do complexo de direitos e obrigações que integravam o ativo e o passivo das sociedades nacionalizadas, e, assim, a universalidade de bens privados de que eram titulares, em que se inclui, designadamente o direito de utilização privativa de domínio público, mediante o pagamento de taxa, tendo-lhes sucedido empresas nacionalizadas, dotadas de personalidade jurídica própria[23]. Efetivamente, o artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei nº 205-G/75, de 16 de abril, «visou garantir a continuidade do património e direitos existentes na esfera das empresas nacionalizadas, pese embora a mudança da titularidade das ações ou quotas para o Estado»[24].
Outrossim, determinou, no artigo 12.º, a criação de uma entidade jurídica resultante da reestruturação daquelas empresas, na medida em que se previa que seriam transferidos para a entidade económico-jurídica que resultasse «da reestruturação das empresas nacionalizadas as instalações e serviços de produção e distribuição de energia eléctrica actualmente explorados por autarquias locais, directamente ou por intermédio de serviços municipalizados ou por federações de municípios» (n.º 2) e «as instalações e serviços de produção e distribuição de energia eléctrica explorados por sociedades e outras entidades não indicadas no artigo 1.º» (n.º 3).
 
2.1 - Na sequência da antedita reestruturação, e após terem sido aprovadas as bases gerais das empresas públicas pelo Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de abril, e a Constituição da República Portuguesa (através do Decreto de Aprovação da Constituição, de 10 de abril de 1976) [25], foi criada, pelo Decreto-Lei n.º 502/76, de 30 de junho, a empresa pública «Electricidade de Portugal, E. P.», abreviadamente «EDP» (artigo 1.º), tendo por objeto principal «o estabelecimento e a exploração do serviço público de produção, transporte e distribuição de energia eléctrica no território do continente, para promover e satisfazer as exigências de desenvolvimento social e económico de toda a população» (artigo 2.º, n.º 1), em regime de exclusivo e por tempo indeterminado (artigo 2.º, n.º 3), prevendo-se a possibilidade de a sua atividade ser estendida aos arquipélagos dos Açores e da Madeira (n.º 2 do artigo 2.º).
A EDP surgiu, assim, como a “única entidade jurídica”, resultante da reestruturação das empresas nacionalizadas. Pessoa coletiva de direito público que passou, nos termos do artigo 8.º, a assumir todos os direitos e obrigações derivados de atos ou contratos, praticados ou celebrados pelas empresas nacionalizadas e por autarquias locais, serviços municipalizados, federações de municípios ou outras entidades que explorassem os serviços e instalações transferidos ao abrigo dos artigos 7.º e 17.º, relativamente a arrendamentos, aquisição de equipamentos, execução de obras, aluguer de maquinismo, financiamentos, prestação de serviços ou quaisquer outros que interessem à continuidade das respetivas explorações[26].
E o artigo 4.º dos seus Estatutos, publicados em anexo ao Decreto-Lei n.º 502/76, atribuía-lhe, pois, «[a] exploração do sistema produtor, da rede de transporte e interligação e das redes de distribuição de energia eléctrica que integram, em cada momento, a rede eléctrica nacional», bem como «[a] exploração dos aproveitamentos hidráulicos de fins múltiplos e de centrais térmicas clássicas ou nucleares destinadas também a fins diferentes dos da produção de energia eléctrica, nos casos aprovados pelo Governo»[27].
Ou seja, foi atribuído à entidade pública «EDP» a exploração, em regime de exclusividade, do serviço de produção, transporte, distribuição e comercialização de energia elétrica no território de Portugal Continental.
A EDP recebeu, assim, nos termos do artigo 5.º do Decreto-Lei nº 502/76, os patrimónios e assumiu, nos mesmos termos e com o mesmo conteúdo, as posições jurídicas e contratuais tituladas pelas sociedades nacionalizadas, mormente as concessões que lhes haviam sido outorgadas, tal como dimana do artigo 3.º, n.º 2, daquele diploma legal[28].

Aliás, segundo o n.º 3 do artigo 3.º, mantinham-se em benefício da EDP as regalias reconhecidas por lei às sociedades concessionárias do serviço público de produção, transporte e distribuição de energia elétrica, nomeadamente as atribuídas pelos Decretos-Leis n.ºs 43.335, de 19 de novembro de 1960, 46.031, de 14 de novembro de 1964, e 46.917, de 23 de março de 1966 e, assim, designadamente isenções fiscais (cf. artigos 67.º do Decreto-Lei n.º 43.335, 6.º do Decreto-Lei n.º 46.917 e 14.º, ponto 16.º e § único do Decreto-Lei n.º 45.103, de 1 de Julho de 1963).
Ademais, a EDP, no âmbito tributário, enquanto não fosse definido um novo regime, ficava sujeita ao regime aplicável às empresas de produção, transporte e distribuição de energia elétrica à data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 502/76 (artigo 10.º, n.º 1, do mesmo diploma legal).

 
2.1.1 - A atribuição à EDP, em exclusivo e por tempo indeterminados da exploração do serviço público de produção, transporte e distribuição de energia elétrica em todo o território continental não impedia, porém, a produção e distribuição de energia elétrica para uso próprio por entidades que, à data da entrada em vigor do mesmo Decreto-Lei, dispusessem da necessária licença ou às quais, ouvida a EDP, a Direcção-Geral dos Serviços Elétricos a viesse a conceder (n.º 3 e 4 do artigo 2.º do referido Decreto-Lei). Previu, assim, a figura de pequeno produtor, que a Lei n.º 2002, de 26 de dezembro de 1944, reconhecera «tratar-se de uma realidade a ter em conta pela ordem jurídica» (cf. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio).
Deste modo, o conjunto do sistema electroprodutor explorado pela EDP passou a ser constituído pelo conjunto dos aproveitamentos hidroelétricos e termoelétricos até então pertencentes às empresas entrementes nacionalizadas. Se anteriormente o sistema produtor da Companhia Portuguesa de Eletricidade (CPE) era preponderante no quadro do sector elétrico nacional, com a junção das centrais electroprodutoras das demais empresas nacionalizadas torna-o «quase absoluto», pois ficaram apenas de fora da integração na EDP, os sistemas electroprodutores para uso particular (289 centrais térmicas e hidráulicas)[29].
Com a concentração na empresa pública EDP de toda a cadeia do setor elétrico em Portugal continental para uso público, desde a produção à venda da energia aos clientes finais[30], efetivou-se a constituição do monopólio do Estado no sector elétrico, que viria a ser confirmado pela Lei n.º 46/77, de 8 de julho (Lei de Delimitação de Sectores), ao regulamentar o n.º 2 do artigo 85.º da Constituição[31]. Quadro legal que vedava o acesso da iniciativa privada às atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica para consumo público [artigo 4.º, alínea a), da Lei n.º 46/77] [32], passando, destarte, em Portugal continental, o setor elétrico, a identificar-se com a EDP[33].
Tudo isto claramente nos diz que a EDP, por ter, nos termos referidos, total controle sobre a cadeia do setor elétrico, desde o processo produtivo aos processos de pós-produção (transporte) e distribuição ao consumidor final, exercia, como empresa verticalmente integrada, toda a referida atividade do setor elétrico, realidade que igualmente se verificava no quadro do sistema elétrico da generalidade dos países do continente europeu[34].
 
2.2 – É, pois, num período caracterizado pela interdição ao sector privado das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica para uso público em todo o território continental e pela exploração desses serviços públicos em exclusivo e por tempo indeterminado, através da empresa pública – Eletricidade de Portugal, EDP, que surgiu o Decreto-Lei n.º 344-B/82, de 1 de setembro[35], vindo estabelecer os princípios gerais da distribuição de energia elétrica em baixa tensão[36], prevendo que a concessionária das redes de distribuição em baixa tensão estava sujeita ao dever de pagamento de uma renda ao município concedente, como contrapartida da atribuição da respetiva concessão pela afetação à exploração pela EDP dos patrimónios próprios dos municípios concedentes (artigo 6.º); e foi publicado, a 6 de dezembro de 1983, o Decreto-Lei n.º 424/83, que entrou em vigor a 1 de janeiro de 1984.
Este diploma veio, como se expende no seu preâmbulo, consagrar o pagamento de uma renda anual aos municípios cuja circunscrição fosse afetada por zonas de influência de centros produtores de energia elétrica[37] (centros produtores hidroelétricos e termoelétricos, em exploração e em construção), determinando no artigo 7.º que, com a sua entrada em vigor, caducavam «as rendas a pagar pela EDP ao Estado e os respetivos adicionais destinados às câmaras municipais, previstos na alínea d) da base XV da Lei 2002, de 26 de dezembro de 1944, e nos artigos 68.º e 70.º do Decreto-Lei n.º 43.335, de 19 de novembro de 1960».
Cessação de vigência que surge, como resultado das alterações legislativas ocorridas no âmbito do setor energético em 1975 e 1976, em que se pôs termo à estrutura organizativa do setor elétrico nacional, aprovada pela Lei n.º 2002 e desenvolvida pelo Decreto-Lei n.º 43.335, pois conforme se refere no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 424/83, o enquadramento legal existente[38] «conduziu a um impasse de aplicação».
Deste modo, o regime das rendas ao Estado relativas à produção e dos adicionais aos municípios fixados nos referidos preceitos da Lei n.º 2002 e do Decreto-Lei n.º 43335 foi substituído pelo regime que o Decreto-Lei n.º 424/83 estabeleceu, que deu continuidade ao encargo pecuniário, a favor dos municípios atingidos pela zona de influência de centros electroprodutores, denominando-o de renda anual.
 
 3 – Como se considera no referido parecer deste corpo consultivo n.º 126/2005, o fim do monopólio do Estado no sector elétrico, anunciou-se ainda na década de 80 do século XX, associado ao processo de adesão à Comunidade Económica Europeia, refletindo-se, inicialmente, apenas no setor da pequena produção de energia elétrica[39], na aceitação do autoprodutor.

Na verdade, no concernente à pequena produção de energia elétrica, o Decreto-Lei n.º 20/81, de 28 de janeiro[40], e a Lei n.º 21/82, de 28 de julho, vieram regrar, respetivamente, quanto ao autoprodutor de energia elétrica[41] e sobre a produção e distribuição independente de energia elétrica[42]; diplomas que foram revogados pelo artigo 27.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio.
Com este último Decreto-Lei n.º 189/88, pretendeu-se, de acordo com o seu preâmbulo, não só alterar algumas das normas até então em vigor, mas também reunir num só diploma todo o quadro legal referente à atividade em causa, garantindo a sua coerência interna e tornando-o mais transparente para os agentes económicos envolvidos. Acrescentou-se, nesse exórdio, não ser intenção do Governo prejudicar experiências válidas dos pequenos produtores de energia elétrica, pelo que, de modo cauteloso, «se salvaguardaram as situações eventualmente criadas ao abrigo daquela legislação» (cf. n.º 3 do artigo 27.º) [43] e, assim, a validade das autorizações anteriormente emitidas.
Este diploma de 1988, como se viria a expender no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 99/91, de 2 de maio:
              «[D]eu-se um passo significativo na inversão do regime de monopólio do Estado, entretanto já iniciada com a publicação do Decreto-Lei n.º 20/81, de 28 de Janeiro, e da Lei n.º 21/82, de 28 de Julho, no tocante à pequena produção de energia eléctrica, e dos Decretos-Leis n.ºs 344-B/82 e 297/86, respectivamente de 1 e 19 de Setembro, no que concerne à distribuição de energia eléctrica em baixa tensão. Com efeito, o Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de Maio, publicado no uso de autorização legislativa concedida pela Lei n.º 34/88, de 2 de Abril, veio já permitir o livre acesso das pessoas singulares ou colectivas à actividade de produção de energia eléctrica».

Efetivamente, o Decreto-Lei n.º 189/88, na sua redação originária[44], veio, de acordo com o artigo 1.º, reger a atividade de produção de energia elétrica por pessoas singulares ou por pessoas coletivas de direito público ou privado, sujeita ao cumprimento das normas técnicas e de segurança previstas no diploma em apreço, ou por ele admitidas, e desde que o estabelecimento industrial de produção de energia, no seu conjunto, não ultrapassasse a potência aparente instalada de 10000 kVA, e que fossem utilizados recursos renováveis, combustíveis nacionais ou resíduos industriais, agrícolas ou urbanos, ou se tratasse de instalações de cogeração sem limite de potência [n.º 1, alíneas a) e b)]. E expressamente estabelecia no n.º 1 do artigo 27.º que:

              «1 - O regime jurídico contido neste diploma constitui regime especial para o sector de produção de energia eléctrica, dentro dos limites contidos no artigo 1.º».

Desta forma, o legislador considerava (e instituía) que se estava perante um regime especial atinente à produção elétrica, apresentando-nos o pequeno produtor como produtor em regime especial, o qual, se também fosse consumidor, poderia optar entre comercializar e consumir (artigo 10.º, n.º 11) a energia produzida em rede própria ou ligar-se à rede (artigo 26.º). E no artigo 20.º, regulando a produção de energia eléctrica por produtores independentes, previa a celebração de um contrato de fornecimento de energia entre o produtor independente e a entidade que explora a rede pública[45].
Daí que, sendo pelo legislador considerado existir um regime especial, o tutelado pelo Decreto-Lei n.º 189/88, está-se necessariamente a admitir e a dizer-nos que também existia um regime comum, geral ou ordinário que abrangia a produção de energia elétrica que não constituía regime especial, e que respeitava à produção de energia elétrica para consumo público que havia sido objeto de nacionalização e de atribuição à EDP para exploração e, assim, à atividade produtiva hidroelétrica (e termoelétrica) a que o Decreto-Lei n.º 424/83 alude.  
 
3.1 – O Decreto-Lei n.º 189/88, que «foi, durante mais de 20 anos, o diploma central da produção de energia elétrica a partir de» fontes de energia renovável», abrangia parte significativa da produção de energia elétrica em regime especial[46].
Proporcionava, pois, a criação da figura do pequeno produtor (ou produtor independente) de energia elétrica, associada à utilização de recursos renováveis, tendo, face às alterações subsequentes de que foi objeto, passado a regular o exercício da atividade de produção de energia elétrica a partir de recursos renováveis ou resíduos industriais, agrícolas ou urbanos, como a energia das ondas, solar fotovoltaica ou eólica (regime especial que foi sucessivamente alterado pelos Decretos-Leis n.º 313/95, de 24 de novembro, 168/99, de 18 de maio, n.º 339-C/2001, de 29 de dezembro, n.º 33-A/2005, de 16 de fevereiro, e 35/2013, de 28 de fevereiro)[47].
Acresce que, apesar de, nas suas redações iniciais, o Decreto-Lei n.º 189/88 não se restringir ao tipo de fontes renováveis, com as alterações introduzidas ao artigo 1.º (pelos Decretos-Leis n.ºs 313/95[48] e 168/99), passou no n.º 1 a dispor que regulava a atividade de produção de energia elétrica que se integrasse, nos termos do Decreto-Lei n.º 182/95, de 27 de julho, no Sistema Elétrico Independente, mediante utilização de recursos renováveis ou resíduos industriais, agrícolas ou urbanos[49].
 
3.2 – O Decreto-Lei n.º 189/88, no artigo 6.º, previa expressamente que a administração central ou as autarquias locais podiam consentir a utilização de bens do domínio público para a produção de energia elétrica, sem necessidade de recorrer à concessão, titulando esse consentimento através de licença (n.º 1) e que pela utilização desses bens seria devida uma renda, fixada no momento da outorga da licença de utilização (n.º 2)[50].
Assim, determinava-se expressamente que a utilização de bens do domínio público pelos pequenos electroprodutores dependia de autorização, tinha por base um título jurídico (licença), mediante uma renda. Renda que era, pois, devida pela utilização de bens do domínio público para a produção de energia elétrica mediante licença.
Outrossim, prescrevia que as obras a realizar pelas entidades produtoras de energia hidroelétrica careciam de autorização (artigo 7.º, n.º1)[51].
 
3.3 - O regime especial da atividade independente de produção elétrica, a partir de recursos renováveis, ou de resíduos industriais, agrícolas ou urbanos, de cogeração, ou, no caso de aproveitamentos hidroelétricos, desde que a potência instalada não seja superior, no seu conjunto, a 10 MW (Megawatt), consagrado no Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, foi sucessivamente alterado pelos Decretos-Leis n.º 313/95, de 24 de novembro, n.º 168/99, de 18 de maio, n.º 339-C/2001, de 29 de dezembro, e n.º 33-A/2005, de 16 de fevereiro.
Com efeito, o Decreto-Lei n.º 168/99 alterou mormente o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 189/88, igualmente lhe aditou dois Anexos: o Anexo I (Regulamento para Autorização das instalações de Produção de Energia Elétrica Integrados no SEI conforme previsto na nova redação dos n.ºs 1 e 2 do artigo 7.º) e o Anexo II [que respeitava ao tarifário de venda de energia elétrica pelo centro produtor (renovável) à rede pública].
E o Decreto-Lei n.º 339-C/2001, de 29 de dezembro, que procedeu a alteração designadamente do referido Anexo II, aditou a este um novo item (n.º 33), em que se estabelece, no âmbito do sistema elétrico independente, a obrigação de pagamento pelas empresas detentoras de licenças de exploração de parques eólicos de uma renda municipal correspondente a 2,5% do pagamento mensal feito pela entidade recetora da eletricidade produzida (entidade que gere a rede recetora, com a qual o produtor celebra o contrato de compra e venda de energia).
Como se realça no respetivo preâmbulo, a estipulação do pagamento de uma renda devida pelas empresas detentoras de centrais eólicas aos municípios onde as mesmas se encontram implantadas constituía uma situação que não se encontrava salvaguardada na legislação aplicável, refletindo, de acordo com o referido item n.º 33 «uma repartição dos benefícios globais que lhe são inerentes a nível nacional e local».
 
4 – Entanto a Lei de Delimitação dos Setores contemplada na Lei n.º 46/77, foi alterada pelo Decreto-Lei n.º 449/88, de 10 de dezembro, designadamente no artigo 4.º, passando a permitir, como expressamente se consigna no preâmbulo:

               «[O] acesso da iniciativa privada às indústrias de refinação de petróleo, petroquímica de base e siderúrgica e ainda a diversas actividades como o serviço de produção e distribuição de gás e energia eléctrica para consumo público, os serviços de telecomunicações complementares à rede básica, os transportes aéreos regulares interiores, os transportes ferroviários não explorados em regime de serviço público e os transportes colectivos urbanos de passageiros».

Nessa altura, já estava em vigor, desde 1 de janeiro de 1986, o Tratado de adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia[52] enquanto a Constituição da República Portuguesa viria a ser alterada por revisão que a Lei constitucional n.º 1/89, de 8 de julho, corporizou. Revisão constitucional que eliminou da Constituição o princípio da irreversibilidade das nacionalizações, consagrado no artigo 83.º, n,º 1, na redação originária[53].
Por sua vez, o artigo 85.º, n.º 1, da Constituição, resultante igualmente da mesma revisão, veio preceituar que a privatização da titularidade ou do direito de exploração de meios de produção e de outros bens nacionalizados, depois de 25 de abril de 1974 poderia efetuar-se nos termos de lei-quadro aprovada por maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções.
Sequentemente, como a Lei-Quadro das Privatizações (Lei n.º 11/90, de 5 de abril) previu que as empresas públicas podiam ser transformadas em sociedades anónimas, mediante diploma legal, sem colocar limites ao capital privatizado (artigos 4.º, n.ºs 1 e 2) [54], veio a «EDP, E. P.», através do Decreto-Lei n.º 7/91, de 8 de janeiro de 1991, a ser transformada em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos. Diploma este que igualmente procedeu a aprovação dos seus estatutos, prevendo que se procedesse, por meio de cisões simples, à constituição de novas sociedades anónimas, de que a «EDP, S. A.», seria a única detentora do capital (artigo 8.º).
 
4.1 – Entrementes, não obstante a indicada permissão, sem restrições, do acesso de entidades privadas ao exercício das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica para consumo público, importava, nesta senda, definir o respetivo regime jurídico e regulamentar o exercício das atividades específicas deste sector, o que veio a acontecer, a 2 de março de 1991, com os Decretos-Leis n.ºs 99/91 e 100/91[55], respetivamente.
Assim, o Decreto-Lei n.º 99/91, consagrando já o princípio da «liberdade de acesso» (cf. preâmbulo), veio estabelecer o regime jurídico do exercício das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica para consumo público, instituindo o Sistema Elétrico de Abastecimento Público (SEP), constituído pela Rede Nacional de Transporte de energia elétrica (RNT), explorada em regime de concessão de serviço público[56], a montante, pelos produtores e, a jusante, pelos distribuidores, vinculados ao sistema através de um regime contratual (artigos 1.º, 4.º e 5.º), cabendo à entidade concessionária da RNT a gestão global do SEP considerando-se tal concessão atribuída à EDP até que a matéria fosse regulamentada por diploma próprio.
O modelo então criado abrangia, além do SEP, o Sistema Elétrico Independente (SEI), o qual compreendia o exercício de atividades fora do SEP, para uso próprio ou de terceiros, em claro regime de concorrência, e mediante licenças não vinculadas[57] (cf. preâmbulo e artigos 7.º a 9.º).
E determinou-se, por isso, no artigo 28.º, n.º 1, que, com a sua entrada em vigor, ficava revogada a Lei n.º 2002, bem como as normas então vigentes do Decreto-Lei n.º 43.335 que o contrariassem, continuando porém estas a aplicar-se com as necessárias adaptações, quanto ao exercício das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica, até que fosse regulamentado o exercício das atividades objeto do próprio Decreto-Lei n.º 99/2001 (cf. artigo 25.º[58]), o que aconteceu com o Decreto-Lei n.º 100/91, no que concerne à atividade de produção de energia elétrica em centrais de potência aparente instalada superior a 10 MVA. E, no n.º 2, procedeu-se a revogação expressa do artigo 19.º do acima citado Decreto-Lei n.º 43.335.
Verifica-se, portanto, que não obstante as alterações verificadas relativamente à estrutura organizativa do sector elétrico nacional e à instituição do regime de rendas contemplado no Decreto-Lei n.º 424/83 com afetação do inerente âmbito aplicativo das regras instituídas pela Lei n.º 2002 e desenvolvidas pelo Decreto-Lei n.º 43.335, estes diplomas de 1946 e 1960 foram-se mantendo em vigor, sendo este Decreto-Lei objeto de sucessivas e parciais revogações[59].
 
5 - Se o Decreto-Lei n.º 7/91, de 8 de janeiro, previra que se procedesse, por meio de cisões simples, à constituição de novas sociedades anónimas, de que a «EDP, S. A.», seria a única detentora do capital (artigo 8.º), com o Decreto-Lei n.º 131/94, de 19 de maio, veio a determinar-se «a desintegração vertical da EDP, dando origem a empresas exclusivamente vocacionadas a uma das atividades da cadeia de valor da eletricidade» e, assim, exclusivamente para cada uma das atividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de energia elétrica, permitindo a constituição de novas sociedades, quer por cisões simples da EDP, quer por destaque de partes do património de sociedades, entretanto, resultantes de cisão da EDP (artigos 1.º e 2.º).
A EDP e as empresas resultantes da cisão - para as quais, nos termos do artigo 5.º do Decreto-Lei nº 131/94, vieram a ser «transmitidas, sem alteração das garantias», as relações ou posições jurídicas tituladas por aquela sociedade, «não conferindo essa transmissão o direito de alterar a respectiva relação jurídica» - continuaram a exploração dos centros electroprodutores segundo o regime anterior à cisão e, assim, de acordo com o regime que havia sido definido para as sociedades nacionalizadas antecedentes da EDP concessionárias desses centros[60].
Na verdade, como se determinava no artigo 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 7/91, a EDP (sociedade anónima) sucedia automática e globalmente à Eletricidade de Portugal, E.P., e continuava a personalidade jurídica desta, conservando a universalidade dos direitos e obrigações que constituíam o seu património no momento da transformação.

Por sua vez, o processo de reprivatização do capital social da EDP (Eletricidade de Portugal, S. A.), viria a começar com o Decreto-Lei nº 78-A/97, de 7 de abril, que corporizou a primeira das oito fases do processo[61], tendo, a 26 de outubro de 2011, o Governo Português aprovado, através do Decreto-Lei n.º 106-A/2011, a oitava fase do processo de privatização do capital social da «EDP, Energias de Portugal, S. A.»[62]. Processo reprivativo que de, forma faseada, evoluiu no sentido da crescente abertura aos capitais privados a partir de uma lógica inicial de manutenção de uma participação maioritária de capitais públicos[63].

 
5.1 – Entretanto, em 1995, através dos Decretos-Leis n.ºs 182/95[64] a 188/95, de 27 de julho, procedeu-se à reforma do modelo organizativo do Sistema Elétrico Nacional, tendo o primeiro diploma definido o sistema de bases da organização do Sistema Elétrico Nacional (SEN) e os princípios que enquadram o exercício das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica. E nos termos do artigo 6.º do mesmo Decreto-Lei, foi criada pelo Decreto-Lei n.º 187/95[65], a Entidade Reguladora do Sector Elétrico (ERSE), tendo como atribuições, segundo o artigo 2.º, n.º 1, a regulação do Sistema Elétrico de Serviço Público (SEP) e o relacionamento comercial entre este e o Sistema Elétrico Não Vinculado (SENV). Entidade, atualmente, denominada Entidade Reguladora do Setor Energético (ERSE), cabendo-lhe a regulação dos sectores do gás natural e da eletricidade ao nível nacional (cf. artigo 1.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 97/2002 de 12 de abril) [66].
 
5.1.1 – Esta reforma do Sistema Elétrico Nacional caracteriza-se, no essencial, pela constituição de dois sectores de atividade – o público (SEP) e o independente (SEI) – mantendo-se apenas em regime de serviço público e de exclusivo, através de concessão, a atividade de transporte de energia elétrica, ficando as restantes atividades, designadamente a de produção e de distribuição, apenas sujeitas a licença (vinculada ou não vinculada)[67].
Com efeito, no modelo organizativo instituído com o Decreto-Lei n.º 182/95[68] foi mantida a coexistência de dois subsistemas dentro do Sistema Elétrico Nacional, procedendo à sua reformulação – o SEP, que visava a prestação do serviço público, e o SEI, que incluía o Sistema Elétrico não Vinculado (SENV), sendo este último sistema organizado segundo uma lógica de mercado [artigos 3.º, n.º 1, alínea a), 7.º, 43.º, n.ºs 1 e 2, e 44.º].
O SEI abrangia ainda a produção de energia elétrica cujo exercício estava previsto em legislação específica: produção em aproveitamentos hidroelétricos até 10 MVA (Megavolt-ampère) de potência aparente instalada, a produção de energia elétrica a partir de energias renováveis, com exceção da energia hidráulica, e a produção de energia elétrica em instalações de cogeração [artigo 3.º, n.º 1, alíneas, b) a d), e 1.º, n.º 2].
De acordo, com o artigo 1.º, n.º 2, eram excluídos do âmbito do Decreto-Lei n.º 182/95 o exercício das atividades de produção de energia elétrica estabelecido em legislação específica e, assim: em aproveitamentos hidroelétricos até 10 MVA de potência aparente instalada [alínea a)]; a partir de energias renováveis, com exceção da energia hidráulica [alínea b)], e em instalações de cogeração [alínea c)]; cingindo-se a sua aplicação ao continente, por o diploma não se aplicar às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira (n.º3).
Assim, o SEI, que se caraterizava por não ter responsabilidade de serviço público, englobava as situações particulares de produção de energia elétrica para as quais existe legislação específica: mini-hídricas com potência aparente instalada até 10 MVA, outras energias renováveis e cogeração.
O exercício da atividade de produção de eletricidade, de acordo com este novo regime jurídico do exercício da atividade de produção de energia elétrica, assenta, pois, num novo quadro de acesso à atividade, dentro dos dois principais sistemas previstos pela reestruturação operada, o Sistema Elétrico de Serviço Público (SEP), organizado em termos de prestação de um serviço público, e o subsistema SENV (Sistema Elétrico não Vinculado), organizado segundo uma lógica de mercado (cf. artigos 7.º e 43.º do Decreto-Lei n.º 182/95 e proémio do Decreto-Lei n.º 183/95[69]).
Este diploma, que respeitava, especificamente, à atividade de produção de energia elétrica, no âmbito do SEP e do SENV, sujeita à titularidade de licença a emitir para cada um dos centros electroprodutores [cf. artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 183/95 e 8.º, alínea b) do Decreto-Lei n.º 182/95][70].
De acordo com este Decreto-Lei (artigo 9.º), o SEP era constituído pela associação responsável pela função de planeamento do sistema electroprodutor, pelos titulares de licenças vinculadas de produção, pela entidade concessionária da RNT e pelos titulares de licenças vinculadas de distribuição.
Aliás, segundo o artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 182/95 consideravam-se integrados no SEP: a CPPE - Companhia Portuguesa de Produção de Eletricidade, S. A., e todos os centros electroprodutores que lhe pertencessem à data de entrada em vigor do mesmo diploma, bem como as entidades a que já tivessem sido atribuídas licenças vinculadas de produção de energia elétrica e os respetivos centros electroprodutores.

Foi através desse conjunto de sete diplomas legais, publicados em 1995 – os Decretos-Leis n.ºs 182/95 a 188/95[71] – que se procedeu a importantes alterações na atividade de produção, transporte e distribuição de energia elétrica, antecipando, segundo o parecer deste corpo consultivo n.º 4/2013[72], as orientações veiculadas pela Diretiva n.º 96/92/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de dezembro de 1996[73], dando corpo ao plano comunitário cujo objetivo essencial ia no caminho da criação de um mercado concorrencial da eletricidade[74].
O Decreto-Lei n.º 182/95, no artigo 66.º, salvaguardou os direitos das entidades que à data da entrada em vigor do mesmo diploma exercessem a atividade de produção de energia elétrica mediante título válido para o efeito; direitos que se manteriam até ao termo do prazo de duração estabelecido nos respetivos títulos. Ou seja, o legislador não obstante ter introduzido um novo sistema de exploração da produção de energia elétrica e a sujeitar a mera licença (vinculada ou não vinculada), salvaguardou o regime e a utilização dos títulos obtidos ao abrigo de legislação anterior. Tal-qualmente fizera no artigo 28.º do Decreto-Lei n.º 99/91 (ao determinar no n.º 1 que se manteriam os direitos e obrigações derivados das normas revogadas relativas ao exercício das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica em vigor àquela data); ou determinara, como vimos, no artigo 27.º do Decreto-Lei n.º189/88, de 27 de maio.
Verifica-se, assim, que não obstante os diferentes modelos de exploração por que foi optando, em resultado de novas conceções adotadas, o legislador teve o cuidado de não perturbar as situações constituídas, tendo, em sede de direito transitório, salvaguardado a continuidade dos títulos e as formas de exploração em curso[75].

 
6 - Com o Decreto-Lei n.º 185/2003, de 20 de agosto, foram estabelecidas as regras gerais que permitiam a criação de um mercado livre e concorrencial de energia elétrica, tratando-se, segundo o preâmbulo do mesmo Decreto-Lei, «de regras, de carácter transitório, que serão integradas numa lei de bases que procederá a uma reforma profunda da organização, da sistematização e do funcionamento de um sector elétrico, cuja finalidade teleológica consiste em contribuir para o desenvolvimento social e económico, através de um mercado eficiente, livre e concorrencial»; lei de bases que, face ao teor do mesmo preâmbulo, seria publicada até ao final de 2003[76].
Nesse diploma estabeleceu-se que entre os agentes do sistema elétrico nacional que realizam as suas atividades em regime de mercado se incluem os produtores em regime ordinário [artigo 4.º, alínea a)], determinando-se também que o mesmo não prejudicava os direitos dos municípios decorrentes da legislação então vigente (artigo 19.º).
E a tendência liberalizadora e concorrencial do setor da energia elétrica realçou-se em 2003 e 2004, com a publicação ainda dos Decretos-Leis n.ºs 198/2003, de 2 de setembro, 153/2004, de 30 de junho, e 240/2004, de 27 de dezembro[77], em que se procedeu a alterações legislativas que «assumiram um carácter meramente transitório, faltando-lhes a sua integração num quadro legislativo devidamente sistematizado e coerente» (cf. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro).
Se com o Decreto-Lei n.º 198/2003 se veio instituir e definir as condições de transferência da propriedade e posse dos terrenos da entidade concessionária da RNT afetos aos centros electroprodutores que abasteciam o Sistema Elétrico de Serviço Público (SEP), previamente à extinção dos contratos de aquisição de energia (CAE) celebrados entre a entidade concessionária da Rede Nacional de Transporte de Energia Elétrica (RNT) e os produtores vinculados e, bem assim, as condições de reafectação dos respetivos bens do domínio hídrico (artigo 1.º, n.º 1), com o Decreto-Lei n.º 153/2004 procedeu-se ao estabelecimento da forma de titulação da propriedade e da posse, a favor da REN - Rede Elétrica Nacional, S. A., dos terrenos correspondentes ao sítio dos centros electroprodutores, hidro e termoelétricos, definidos nas plantas anexas ao referido Decreto-Lei n.º 198/2003. 
Com o Decreto-Lei n.º 240/2004, emitido ao abrigo da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 52/2004, de 29 de outubro, procedeu-se, em execução do disposto no artigo 13.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 185/2003, à definição das condições da cessação antecipada dos contratos de aquisição de energia (CAE) celebrados ao abrigo do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 182/95 entre a entidade concessionária da Rede Nacional de Transporte de Energia Elétrica (RNT) e as entidades titulares de licenças vinculadas de produção de energia elétrica que abastecem o Sistema Elétrico de Serviço Público (SEP) – produtores - e à criação de medidas compensatórias relativamente à posição de cada naqueles contratos[78].

 
6.1 – Ciente da transitoriedade das medidas legislativas tomadas, o legislador, no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 184/2003, de 20 de agosto, após considerar ser então amplamente reconhecido que, com o aprofundamento do processo de liberalização, as bases e princípios dos Decretos-Leis n.ºs 182/95 a 185/95 (alterados, nomeadamente, pelo Decreto-Lei n.º 56/97) deviam continuar a evoluir no sentido de adequar a estrutura do sistema elétrico nacional (SEN) e a sua forma de funcionamento a um regime de mercado genericamente aberto à concorrência, expendeu-se:
              «Neste sentido, será elaborada uma nova lei de bases do sector eléctrico que, por um lado, procederá à revisão de matérias relativas ao sector eléctrico nacional, como seja a das rendas pagas aos municípios pelos centros electroprodutores, e, por outro, dará corpo à Directiva do Mercado Interno de Electricidade na União Europeia e albergará os princípios estabelecidos no Protocolo de Colaboração entre as Administrações Espanhola e Portuguesa para a Criação do Mercado Ibérico de Electricidade (MIBEL), recentemente celebrado».
E, outrossim, no proémio do Decreto-Lei n.º 185/2003, também de 20 de agosto, o legislador anuncia-nos a «adopção de uma lei de bases, até ao fim de 2003, que proceda a uma profunda revisão da legislação do sector eléctrico, designadamente no que respeita à revisão das rendas pagas aos municípios pelos centros electroprodutores, e cujo processo o Governo já desencadeou».
 

6.2 - As alterações legislativas ocorridas em 2003 e em 2004 caraterizam-se, pois, por revestir um carácter meramente transitório, dado não existir um quadro legislativo devidamente sistematizado e coerente.
A Resolução do Conselho de Ministros n.º 169/2005, de 24 de outubro[79], que aprovou a estratégia nacional para a energia, estabelece, conforme se salienta no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, «como uma das linhas de orientação a liberalização e a promoção da concorrência nos mercados energéticos, através da alteração dos respetivos enquadramentos estruturais». E especificamente no que concerne à produção de energia elétrica sustenta que a «liberalização da produção de eletricidade pressupõe a agilização dos mecanismos de instalação de novos centros electroprodutores e, no quadro do mercado ibérico, a harmonização dos princípios de compensação aos produtores vinculados que passem a operar em regime de mercado livre».
 
7 – O Decreto-Lei n.º 29/2006, concretizando o plano normativo da orientação estratégica da Resolução do Conselho de Ministros n.º 169/2005, de 24 de outubro, veio reorganizar o sistema elétrico nacional, estabelecendo os princípios gerais relativos à organização e funcionamento do sistema elétrico nacional, bem como ao exercício das atividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de eletricidade e à organização dos mercados de eletricidade, efetuando a transposição para a ordem jurídica interna dos princípios da referida Diretiva n.º 2003/54/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, que viera instituir regras comuns para o mercado interno da eletricidade, procedendo à revogação da Diretiva n.º 96/92/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho (cf. artigo 1.º, n.º 2, do referido Decreto-Lei).
Na verdade, a Diretiva de 2003 realizara o aprofundamento do percurso trilhado pela referida anterior Diretiva de 1996, a que sucedeu, no propósito de consolidar o modelo concorrencial, sem prejuízo do cumprimento dos requisitos de serviço público[80], fixando as regras comuns para o mercado interno da eletricidade[81].
O quadro legal que o Decreto-Lei n.º 29/2006 instituiu foi desenvolvido e regulamentado no Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto[82], que não abrangeu a produção de eletricidade em regime especial [artigo 1,º, n.º 2, alínea a)]. Aliás, o Decreto-Lei n.º 29/2006 e o Decreto-Lei n.º 172/2006 concentraram-se, no que tange à produção de energia elétrica, na produção em regime ordinário[83].
 
7.1 - O Quadro legal, que o Decreto-Lei n.º 29/2006 instituiu, dá corpo, de acordo com o seu exórdio, a «um sistema elétrico integrado, em que as atividades de produção e comercialização são exercidas em regime de livre concorrência, mediante a atribuição de licenças, e as atividades de transporte e distribuição são exercidas mediante a atribuição de concessões de serviço público», mantendo-se, em qualquer dos casos, as obrigações de serviço público (cf. artigo 4.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 29/2006 e 4.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 172/2006).
Considerando que a produção de energia elétrica constituía uma das atividades do sistema elétrico nacional (SEN), sendo os produtores de eletricidade um dos intervenientes do SEN [artigos 13.º, alínea a), e 14.º, alínea a), do Decreto-Lei n.º 29/2006], veio determinar, em obediência a princípios estabelecidos na Diretiva Comunitária n.º 2003/54/CE, que a atividade de produção de energia elétrica e a da sua comercialização se desenvolveriam em regime de livre concorrência, mediante a atribuição de licença junto das entidades administrativas competentes (artigos 4.º, n.º 4, 15.º e 42.º). Cabendo, assim, aos privados a respetiva iniciativa, abandonou-se deste modo «o planeamento centralizado dos centros electroprodutores»[84]. Por sua vez, as atividades de transporte e de distribuição, também integrantes do SEN, seriam reguladas, respetivamente pela REN e pela EDP Distribuição (artigos 69.º, n.º 1, e 70.º, n.º 1), correspondendo a cada uma destas atividades uma única concessão exercida em regime de serviço público e em exclusividade (artigos 5.º, n.º 5, 21.º e 31.º) e sendo a atividade de comercialização de eletricidade separada juridicamente das restantes atividades (artigo 43.º).
Sobre a produção de energia elétrica regiam os artigos 15.º a 20.º (secção I), estabelecendo-se no artigo 16.º que a produção de energia elétrica é em regime ordinário ou em regime especial. A produção em regime ordinário constitui a atividade de produção de energia que não está abrangida por um regime jurídico especial (artigos 16.º a 18.º), não introduzindo alterações ao Decreto-Lei n.º 189/88, limitando-se a remeter para legislação complementar o regime jurídico da produção elétrica em regime especial (artigo 18.º, n.º 2) continuando, assim, até 2012, o referido diploma de 1988 a regular (embora parcialmente) esse regime.  
E de acordo com o artigo 20.º, n.º 1, os produtores em regime especial continuam a ter garantida a compra da eletricidade gerada pela rede pelo «comercializador de último recurso»[85] nas condições estabelecidas na legislação específica aplicável, tendo, pois, o direito de vender toda a energia produzida ao comercializador de último recurso ou, quando fosse o caso, diretamente, aos consumidores (artigos 19.º, n.º 1, do DL 189/88, e 20.º do DL 29/2006).
Desenvolvendo-se a atividade de produção de eletricidade segundo um regime ordinário ou segundo um regime especial em que o acesso à atividade é livre  e a iniciativa cabe aos interessados, verifica-se, segundo o preâmbulo do diploma, «o abandono da lógica do planeamento centralizado dos centros electroprodutores; neste contexto, o Estado mantém um papel supletivo, cabendo-lhe suprir eventuais falhas de mercado, designadamente abrindo concurso público para assegurar a produção de electricidade em caso de insuficiência ou incapacidade da iniciativa privada»[86].
Face à consagração deste quadro normativo surgiu, naturalmente, a revogação expressa do Decreto-Lei n.º 182/95 mantendo-se, contudo, em vigor diversos regulamentos emitidos ao abrigo deste diploma, até à aprovação da nova legislação complementar (cf. artigo 79.º do Decreto-Lei n.º 29/2006).
Com o disposto nos Decretos-Leis n.ºs 29/2006 e 172/2006, a energia elétrica converteu-se num «bem de mercado», acabando-se, com a «histórica ligação da eletricidade aos conceitos e à racionalidade do monopólio e dos direitos exclusivos»[87]. A liberalização abrangeu «apenas as tarefas situadas a montante e a jusante da transmissão (transporte e distribuição)» [88], e, assim, cingiu-se às atividades de produção e de comercialização, sendo a atividade de produção de eletricidade em regime ordinário exercida em regime de concorrência, ficando fora do quadro concorrencial as atividades de transporte e de distribuição, confiadas a entidades concessionárias, em regime de exclusivo[89] (cf. artigos 4.º, n.ºs 4 e 5, do Decreto-Lei n.º 29/2006 e 4.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 172/2006).
 
7.2 - Das alterações de que o Decreto-Lei n.º 29/2006 foi objeto[90], é de realçar, em primeiro lugar, as introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 78/2011, de 20 de junho, que procedeu à transposição da Diretiva n.º 2009/72/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho[91], relativa ao mercado interno da eletricidade[92]. E, em segundo lugar, decorridas mais duas alterações[93], a grande alteração implantada pelo Decreto-Lei n.º 215-A/2012, de 8 de outubro, em que se procedeu a «revisão global» do Decreto-Lei n.º 29/2006, «enquanto diploma estruturante da organização e funcionamento do Sistema Elétrico Nacional (SEN)»[94], que foi complementada com o Decreto-Lei n.º 215-B/2012, também de 8 de outubro, que procedeu à alteração ao Decreto-Lei n.º 172/2006[95], ambas, de modo a assegurar de forma completa, integral e harmonizada, a (plena) transposição da Diretiva n.º 2009/72/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho, atualizando aqueles diplomas «em consideração das vicissitudes entretanto ocorridas no panorama energético nacional»[96].
 
7.2.1 - Com a reforma consubstanciada pelos Decretos-Leis n.ºs 215-A/2012, e 215-B/2012, consolidou-se que a produção de energia elétrica se exercia em regime livre, estando apenas sujeita à obtenção prévia de licença (ou, nos casos previstos em legislação complementar, à realização de comunicação prévia, junto das entidades administrativas competentes)[97], continuando a distinguir-se, no que concerne à produção, a produção em regime ordinário e a produção em regime especial (artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 29/2006). A primeira abrangia toda a produção que não estivesse coberta por um regime jurídico especial (n.º 1 do artigo 17.º), incluindo no regime ordinário os centros electroprodutores indicados no n.º 2 do mesmo artigo 17.º)[98]. Por sua vez, a produção em regime especial compreendia a produção de eletricidade através de centrais de cogeração ou de recursos endógenos, quer fossem renováveis ou não, a microprodução, a miniprodução e a produção sem injeção de potência na rede, bem como a produção de eletricidade através de recursos endógenos, renováveis e não renováveis, não sujeita a regime jurídico especial, sendo o regime jurídico de produção em regime especial estabelecido na lei (artigo 18.º).
Daí que integravam o conceito de produção em regime ordinário as grandes hídricas e as centrais termoelétricas que produzissem energia elétrica através da queima de fontes de energia primária de origem fóssil (como o carvão, gás natural e petróleo)[99].
Alteraram-se, assim, os conceitos de produção em regime ordinário e produção em regime especial, deixando esta última de se distinguir da primeira apenas pela sujeição a regimes especiais no âmbito de políticas de incentivo, pois a produção em regime especial passou, então, também a contemplar a produção de eletricidade em regime remuneratório de mercado (cf. proémio do mesmo diploma e do Decreto-Lei n.º 215-B/2012), e o exercício dessa atividade produtiva passou a ser livre, estando apenas «[...] sujeito à obtenção de licença ou, nos casos previstos em legislação complementar, à realização de comunicação prévia junto das entidades administrativas competentes» (artigo 15.º do Decreto-Lei n.º  29/2006, de 15 de fevereiro, na redação conferida pelo artigo 2.º do Decreto–Lei n.º 215-A/2012).
Procedeu-se com o Decreto-Lei n.º 215-B/2012 à consolidação do regime jurídico aplicável à produção de eletricidade em regime especial e, em particular, através de fontes de energias renováveis, até então dispersa por vários diplomas legais[100], e à completação da transposição da Diretiva n.º 2009/28/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril, relativa à promoção da utilização e energia proveniente de fontes renováveis.
Na versão introduzida em 2012, o Decreto-Lei n.º 172/2006, excluía do seu âmbito a produção de eletricidade em cogeração, a microprodução e miniprodução e a produção de eletricidade a partir da energia das ondas na zona-piloto e a produção de eletricidade a partir de energia nuclear [artigo 1.º, n.º 2, alíneas a) e b)], e com a redação dada ao artigo 1.º, n.º 2, pelo Decreto-Lei n.º 76/2019, de 3 de junho, que procedeu à alteração do regime jurídico aplicável ao exercício das atividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de eletricidade e à organização dos mercados de eletricidade, deixou de ser excluída do âmbito do diploma a microprodução e a miniprodução, passando, todavia, a não incluir no âmbito do diploma a produção de eletricidade quando associada a autoconsumo.
7.2.2 – Na verdade, o Decreto-Lei n.º 76/2019, veio proceder a alterações ao Decreto-Lei n.º 172/2006, designadamente aditando a este diploma o artigo 4.º-A, tendo por epígrafe «Regime remuneratório», estabelecendo que o exercício da atividade de produção de eletricidade estava sujeito aos regimes de remuneração geral (em que os produtores vendem a eletricidade produzida a um preço de mercado) e de remuneração garantida, que se carateriza por os produtores venderem a eletricidade produzida a um preço garantido num determinado período, podendo o preço ser fixo ou indexado a um referencial, com ou sem fixação de limiares mínimos e/ou máximos (n.º 1).
De acordo com o antedito preceito, enquanto a produção de eletricidade em regime ordinário se carateriza por estar sujeita a remuneração geral (n.º 2), já a produção de eletricidade em regime especial está sujeita a remuneração geral ou a remuneração garantida (n.º 3), estabelecendo o n.º 4 as situações em que a atribuição de remuneração garantida pode ser efetuada. Finalmente o n.º 10 do preceito regra que o disposto no referido n.º 4 não prejudica a aplicação da remuneração garantida já estabelecida ou a estabelecer em regimes específicos[101].
E aditou o artigo 5.º-A, segundo o qual passou a constituir condição prévia e necessária ao início do procedimento para atribuição de licença de produção o título de reserva de capacidade de receção de energia na Rede Elétrica de Serviço Público (RESP), evitando-se, dessarte, como se realça no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 76/2019, «que, tanto os requerentes quanto a administração, desenvolvam a sua atividade em procedimentos que não podem lograr a finalidade a que se destinam por inexistência de capacidade de receção».

 
7.3 – Mostra-se, pois, que com os Decretos-Leis n.ºs 29/2006 e 172/2006, nas suas várias versões, fruto das alterações legislativas, se reformula o Sistema Elétrico Nacional, na senda de diretivas e regulamentos europeus, visando a liberalização do setor energético na União Europeia.
 Efetivamente, esses diplomas legais, nas suas sucessivas versões, que constituíram as bases gerais da organização e funcionamento do Sistema Elétrico Nacional, consagraram os princípios gerais e a regulamentação atinente ao exercício das atividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de eletricidade e à organização dos mercados de eletricidade, até à sua revogação pelo Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro, nada referindo ou dispondo sobre as rendas (anteriores ou posteriores) aos municípios pela construção e funcionamento dos centros produtores (hidroelétricos e termoelétricos).
Aliás, no que concerne às cedências aos municípios, incluindo rendas a estes, não obstante as várias alterações que os Decretos-Leis n.ºs 29/2006 e 172/2006 mereceram, apenas os artigos 44.º e 69.º do Decreto-Lei n.º 172/2006 se lhe referem mas tão só no que respeita às rendas aos municípios pela exploração das redes de distribuição e a cargo do respetivo concessionário.

 

II
Da regulação atual do setor energético (a partir do Decreto-Lei n.º 15/2022)

 
1 – Atualmente, os principais diplomas que regulam o setor elétrico são, a nível europeu, a Diretiva (UE) 2019/944 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de junho de 2019[102]/[103] e, a nível nacional, o Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro[104].
Este Diploma legal nacional veio estabelecer a organização e o funcionamento do Sistema Elétrico Nacional, transpondo a referida Diretiva (UE) 2019/944 do Parlamento Europeu e do Conselho, atinente a regras comuns para o mercado interno da eletricidade, que procedera à alteração da Diretiva 2012/27/UE, bem como, ainda que parcialmente, da Diretiva (UE) 2018/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018[105], relativa à promoção da utilização de energia de fontes renováveis.
O paradigma do sistema elétrico nacional tem, de acordo com o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 15/2022, «necessariamente, de evoluir de um sistema assente em produção centralizada, para um modelo descentralizado que enquadre no seu seio a produção local, as soluções de autoconsumo, a gestão ativa de redes inteligentes e que assegure a participação ativa dos consumidores nos mercados», pelo que este procedeu à adaptação do regime jurídico do Sistema Elétrico Nacional (SEN) às necessidades e desafios colocados por instrumentos estratégicos, norteadores da política energética do País para os anos seguintes.
O mencionado diploma, que substitui o Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, e o Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto, na redação então vigente, criou novas regras de organização e funcionamento do Sistema Elétrico Nacional, abrangendo várias matérias concernentes a atividades do sistema elétrico nacional, que se encontravam dispersas por diplomas avulsos, como é o caso do consumo fraudulento de energia elétrica (Decreto-Lei n.º 328/90, de 22 de outubro), do sobreequipamento (Decreto-Lei n.º 94/2014, de 24 de junho), da recuperação e transmissibilidade do défice tarifário e dos ajustamentos tarifários (Decreto-Lei n.º 237-B/2006, de 18 de dezembro), do reconhecimento de ajustamentos tarifários anuais aplicáveis ao sector elétrico (Decreto-Lei n.º 165/2008, de 21 de agosto), da tarifa social (Decretos-Leis n.ºs 138-A/2010, de 28 de dezembro, e 172/2014, de 14 de novembro, ambos na sua redação então vigente), da extinção das tarifas reguladas de venda de eletricidade a clientes finais (Decretos-Leis n.ºs 104/2010, de 29 de setembro, e Decreto-Lei n.º 75/2012, de 26 de março, ambos, na sua redação então vigente), da atividade de operador logístico de mudança de comercializador de eletricidade e gás (Decreto-Lei n.º 38/2017, de 31 de março),e do autoconsumo (Decreto-Lei n.º 162/2019, de 25 de outubro), determinando, de forma expressa, a respetiva revogação (ver artigo 305.º do Decreto-Lei n.º 15/2022).
Este Decreto-Lei, não introduz grandes alterações ao conteúdo dos diplomas a que sucede, optando por concentrá-los num único diploma legal. Todavia, não obstante a abrangência do diploma, de forma explícita afastou do seu âmbito de aplicação a produção de eletricidade em cogeração[106], a produção de eletricidade a partir da energia das ondas na zona piloto[107], a organização, acesso e exercício das atividades relativas à mobilidade elétrica[108] e a produção de eletricidade a partir de energia nuclear (artigo 2.º, n.º 2).
 
1.1 – Quanto à produção de energia elétrica, ressalta do regime legal a que o Decreto-Lei n.º 15/2022 dá corpo, o afastamento do novo quadro legislativo da distinção entre produção em regime ordinário e produção em regime especial, cujos regimes, como referem CATARINA BRITO FERREIRA e JOANA ALVES ABREU, se vinham aproximando nas últimas revisões do Decreto-Lei n.º 172/2006[109].
Se o regime que lhe antecede exigia para o exercício das atividades de produção de eletricidade a obtenção de licença ou a comunicação prévia (cf. artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 29/2006), o novo regime exige, para o exercício dessas atividades, a obtenção de licença de produção e de exploração, ou o registo prévio e certificado de exploração ou a comunicação prévia (artigo 11.º, n.ºs 1 a 4, do Decreto-Lei n.º 15/2022).
Acresce que, de acordo com o artigo 18.º deste último diploma legal, o início do procedimento para obtenção de licença de produção de eletricidade depende da prévia atribuição de reserva de capacidade de injeção na RESP (n.º 1). Atribuição que consta de um título emitido (n.º 2), o qual confere ao seu titular o direito à utilização do ponto de injeção na RESP com a capacidade que lhe for atribuída, de forma firme ou com restrições, enquanto vigorar a licença de exploração que lhe corresponde (n.º 5) e caduca nas situações previstas no n.º 6 do mesmo preceito, entre as quais a extinção da licença de produção ou da licença de exploração [alínea e) do n.º 6 e artigos 37.º, n.ºs 1 e 2, 38.º, n.º 1 e 39.º, n.º 1]. Caducidade do título de reserva de capacidade de injeção na RESP que habilita a nova atribuição da respetiva capacidade (n.º 7 do artigo 18.º).
As atividades do sistema elétrico nacional (SEN), em que se inclui a atividade de produção de eletricidade, obedecem, de acordo com o Decreto-Lei n.º 15/2022, ao princípio da livre concorrência, abrangendo, assim, as atividades em regime de exclusividade, na medida em que as respetivas concessões e licenças são atribuídas através de procedimentos concorrenciais [cf. artigos 4.º, n.º 3, 2.º, n.º 1, e 6.º, n.º 1, alínea a)].
É que, no âmbito do «serviço público essencial» de fornecimento de energia elétrica[110], ou a atividade é operada em concorrência como a de produção de energia elétrica (e, assim, sujeita a supervisão da entidade reguladora) ou em regime de exclusividade (e, por isso, sujeita a regulação económica) dependente de prévios procedimentos concorrenciais (artigo 4.º, n.º 3).
 

2 – O legislador consigna, desde logo, no exórdio do Decreto-Lei n.º 15/2022, que os «objetivos sufragados pelo País em matéria de metas de energias renováveis não devem desconsiderar os impactos nos territórios e nas populações», pelo que, no regime instituído:
              «[S]e estabelece um mecanismo previsível, transparente e não discriminatório de cedências pelos produtores que visa concorrer para a satisfação das necessidades energéticas das autarquias e populações locais, disciplinando-se uma prática que tem sido aleatória, desregulada e raras vezes articulada com o propósito primordial dos respetivos projetos» (cf. o mesmo preâmbulo).
Ante tais considerações parece que o legislador teve por desiderato fundamental com a instituição do regime jurídico de cedências regular de forma clarificadora, uma prática que com frequência os municípios tomavam.
Aliás, como realça INÊS VIEIRA, era «usual a celebração de protocolos entre os municípios e os titulares de centros electroprodutores de fonte renovável, no âmbito dos quais os segundos se obrigam, perante os primeiros, ou ao pagamento de determinados montantes - que aqui chamamos de "renda" - ou à execução gratuita de operações urbanísticas díspares (frequentemente reconduzidas a equipamentos públicos)»[111]. E ocorreram igualmente protocolos entre associações de municípios e titulares de Centros Electroprodutores [112].
A realização de cedências pela implantação de instalações electroprodutores no seu território ou o pagamento de compensações, e a prestação exigida (em espécie ou pecuniária) mostrava-se díspar e, assim, apresentava-se, em geral, «como verdadeiramente heterogénea», sobressaindo, pois, dessa realidade que, por um lado, nem todos os municípios vinham exigindo a realização de cedências ou o pagamento de compensações por parte dos titulares de centro electroprodutor para efeitos de implantação das referidas instalações na sua circunscrição territorial e, por outro, os municípios que o faziam tendiam a exigir aos titulares dos centros electroprodutores a realização de prestações de natureza muito diversificada (tanto de natureza pecuniária como de natureza não pecuniária)[113].

O Decreto-Lei n.º 15/2022 veio também legalmente regrar quanto a cedências aos municípios pelo titular de centro electroprodutor de eletricidade de fonte renovável ou de instalação de armazenamento, no artigo 49.º ao dispor:

«Cedências
               1 - O titular de centro eletroprodutor de eletricidade de fonte renovável ou de instalação de armazenamento, com potência de ligação atribuída superior a 50 MVA, cede, por uma única vez e gratuitamente, ao município ou municípios onde se localiza o centro eletroprodutor, UPAC com potência instalada equivalente a 0,3 % da potência de ligação do centro eletroprodutor ou da instalação de armazenamento para instalação em edifícios municipais ou equipamentos de utilização coletiva ou, por indicação do município, às populações que se localizam na proximidade do centro eletroprodutor ou da instalação de armazenamento ou, em alternativa e com capacidade equivalente, postos de carregamento de veículos elétricos localizados em espaço público e destinados a utilização pública.
               2 - Os titulares de centros eletroprodutores de eletricidade de fonte renovável ou de instalação de armazenamento, com potência de ligação atribuída igual ou inferior a 50 MVA e superior a 1 MVA, efetuam a compensação prevista no número seguinte.
               3 - O titular do centro eletroprodutor ou da instalação de armazenamento procede à instalação da UPAC nos locais indicados e disponibilizados para o efeito pelos municípios beneficiários após obtenção por estes dos respetivos títulos de controlo prévio e, caso se verifique que as instalações referidas no n.º 1 já dispõem de UPAC instaladas, o município pode optar pela substituição da cedência referida no n.º 1 por uma compensação, única e em numerário, no valor de (euro) 1500,00 por MVA de potência de ligação atribuída.
              4 - Nos casos referidos no número anterior, a compensação em numerário destina-se a ser aplicada na promoção da eficiência energética dos edifícios municipais ou equipamentos de utilização coletiva ou, ainda, dos edifícios habitacionais das populações, através da adoção das seguintes ações:
              a) Substituição de janelas não eficientes por janelas eficientes, de classe energética igual ou superior a «A+»;
               b) Aplicação ou substituição de isolamento térmico em coberturas, paredes ou pavimentos, recorrendo a materiais de base natural ou que incorporem materiais reciclados, bem como a substituição de portas de entrada;
               c) Sistemas de aquecimento e/ou arrefecimento ambiente e/ou de águas quentes sanitárias que recorram a energia renovável, de classe energética «A+» ou superior, designadamente:
              i) Bombas de calor;
              ii) Sistemas solares térmicos;
              iii) Caldeiras e recuperadores a biomassa com elevada eficiência;
              d) Sistemas de armazenamento;
              e) Intervenções que visem a eficiência hídrica por via de:
              i) Substituição de dispositivos de uso de água por outros mais eficientes;
              ii) Instalação de soluções que permitam a monitorização e controlo inteligente de consumos de água;
              iii) Instalação de sistemas de aproveitamento de águas pluviais;
              f) Intervenções para incorporação de soluções de arquitetura bioclimática, que envolvam a instalação ou adaptação de elementos fixos dos edifícios como sombreamentos, estufas e coberturas ou fachadas verdes, privilegiando soluções de base natural.
              5 - As cedências referidas nos números anteriores são objeto de protocolo a celebrar entre o titular de centro eletroprodutor ou de instalação de armazenamento e o município ou municípios onde se localiza o centro eletroprodutor ou instalação de armazenamento, no período que medeia entre a emissão da licença de produção e a emissão da licença de exploração, constituindo o protocolo, devidamente assinado, requisito para a emissão desta última.
               6 - Nos casos em que se verifique recusa de assinatura do protocolo por parte do município, o titular de centro eletroprodutor de eletricidade de fonte renovável ou de instalação de armazenamento pode substituir a cedência pela compensação prevista no n.º 2.
              7 - Quando exista mais do que um município abrangido, a respetiva cedência ou compensação é proporcional à área abrangida por cada município.
               8 - Não estão abrangidas pelo disposto nos números anteriores as alterações ao título de controlo prévio para reequipamento ou sobre-equipamento, nem a emissão de título de controlo prévio para hibridização.
               9 - Não podem ser solicitadas aos titulares de centro eletroprodutor ou instalação de armazenamento autónomo quaisquer outras contrapartidas ou cedências aos municípios para além das estabelecidas no presente decreto-lei.».
 

2.1 - Atento o teor do transcrito preceito, as cedências são formalizadas mediante protocolo (n.º 5) e podem ser em espécie (consistindo em, por uma única vez e gratuitamente, UPAC (Unidade de Produção para Autoconsumo) ou equipamentos de utilização coletiva ou, em alternativa, postos de carregamento de veículos elétricos localizados em espaço público e destinados a utilização pública) ou em numerário (compensações em numerário) (n.ºs 1, 3, 4 e 6).
Dimana também do disposto no preceito, a existência de uma alteração evidente no padrão de atribuições (ou rendas, nos termos vertidos no Decreto-Lei n.º 424/83 e no item 28 do Anexo II ao Decreto-Lei n.º 189/88 na redação vigente a 13 de janeiro de 2022) aos municípios pelos titulares dos centros electroprodutores de fonte renovável relativamente ao regime consignado no referido Decreto-Lei de 1983 (bem como relativamente ao referido item do indicado Anexo II) no que concerne à natureza da cedência: enquanto a renda revestia naturalmente natureza patrimonial e se vencia anualmente as cedências previstas no artigo 49.º do Decreto-Lei n.º 15/2022 são preferencialmente em espécie.
              
2.2 – Do antedito preceito, conectado com o artigo 276.º, n,º 9, do mesmo Decreto-Lei, resulta que o consagrado naquele é aplicável aos titulares de centro electroprodutor de fonte renovável ou de instalação de armazenamento com uma potência de ligação atribuída superior a 1 MVA, que obtenham o Título de Reserva de Capacidade de Rede (TRC), a partir de 15 de janeiro de 2022, estabelecendo dois regimes de cedências, como resulta respetivamente dos n.ºs 1 e 2 do artigo 49.º: se as respetivas instalações dispuserem de uma potência de ligação atribuída superior a 50 MVA (a) ou inferior ou igual a 50 MVA, mas superior a 1 MVA (b)[114].
Estabelece o antedito n.º 1 que os titulares de centro electroprodutor de eletricidade de fonte renovável (ou de instalação de armazenamento), com potência de ligação atribuída superior a 50 MVA, estão constituídos, por força de lei imperativa, na obrigação legal de, por uma única vez, e gratuitamente, ceder, com uma potência equivalente a 0,3% da potência atribuída, ao município ou municípios em cuja área pretendem estabelecer esse centro:
a- Uma unidade de produção para autoconsumo a instalar em edifícios municipais ou equipamentos de utilização coletiva ou, por indicação do município, às populações que se localizam na proximidade do centro eletroprodutor (ou da instalação de armazenamento); ou,  em alternativa,
b- Postos de carregamento de veículos elétricos localizados em espaço público e destinados a utilização pública, com potência equivalente.
Com estes tipos de cedência em espécie, o legislador visa a descarbonização nos edifícios públicos e no setor residencial mediante a promoção do aumento da eficiência energética nos edifícios, bem como a descarbonização da mobilidade, mediante a promoção da mobilidade elétrica, em harmonia com os princípios da política energética nacional[115], consagrados no n.º 2 do artigo 39.º da Lei de Bases do Clima (aprovada pela Lei n.º 98/2021 de 31 de dezembro)[116].
E no n.º 3 estabelece-se que, no caso de as instalações referidas no n.º 1 do mesmo preceito, já disporem de UPAC instaladas, o município tem a faculdade de optar pela substituição da cedência em espécie (prevista no referido n.º1) por uma compensação, única e em numerário, no valor de 1500,00€ por MVA (megavoltampere) de potência de ligação atribuída, estabelecendo o n.º 4 como os municípios devem necessariamente aplicar os montantes recebidos a título dessa compensação em numerário na promoção da eficiência energética e do conforto térmico dos edifícios municipais ou equipamentos de utilização coletiva ou, ainda, dos edifícios habitacionais das populações mediante as ações que, de forma exaustiva, indica[117].
Com essa promoção da eficiência energética, tendo em consideração o disposto no n.º 2 do artigo 39.º da Lei de Bases do Clima, pretende-se, igualmente, desenvolver a descarbonização dos edifícios públicos e residenciais e ainda a melhoria do conforto térmico[118] e, assim, ter em devida consideração a proteção ambiental[119].
Os titulares de centros electroprodutores de eletricidade de fonte renovável ou de instalação de armazenamento, com potência de ligação atribuída igual ou inferior a 50 MVA e superior a 1 MVA, efetuam, de acordo com o n.º 2 do mesmo artigo 49.º, a compensação prevista no referido n.º 3, afastando-se, assim, a alternatividade prevista no n.º 1 - cedência de UPAC ou de postos de carregamento[120].
Verifica-se, pois, que o instituto de cedências consagrado no Decreto-Lei n.º 15/2022 constitui um instrumento de promoção de políticas de descarbonização nos edifícios públicos, no setor residencial e no setor da mobilidade[121].
Na verdade, no artigo 49.º do Decreto-Lei n.º 15/2022, veio-se prever «uma nova figura de cedências aos municípios (…) (que funcionam na mesma linha das chamadas "contrapartidas regionais" que eram exigidas em alguns procedimentos concorrenciais das últimas décadas para atribuição de capacidade de injeção)»[122].
 
2.3 - No n.º 9 do artigo 49.º determina-se que não podem os municípios solicitar aos titulares de centro electroprodutor (ou de instalação de armazenamento) quaisquer outras contrapartidas ou cedências para além das estabelecidas no Decreto-Lei n.º 15/2022. Parece, assim, que, em princípio, as únicas contrapartidas ou cedências a que os municípios terão direito a receber de titular de centro electroprodutor são as diretamente contempladas no artigo 49.º do Decreto-Lei n.º 15/2022.
E mostra-se igualmente que, com o descrito regime os titulares de centro electroprodutor (ou de instalação de armazenamento) têm, assim, a segurança de os municípios não lhes poderem exigir quaisquer contrapartidas ou cedências para além das previstas no artigo 49.º e que estão obrigados a satisfazer por força do referido diploma[123].
 
III
A relação entre as políticas públicas da área da energia e as questões ambientais
 

1 –  As políticas públicas da área da energia vêm sendo concebidas de forma alinhada com questões ambientais, as quais, por sua vez, «dependem em boa parte da concretização de medidas de política energética. As inter-relações entre o sector energético, o meio ambiente e a economia vêm de longe e tendem a aprofundar-se.»[124], cabendo a todos e a cada um de nós, Estado ou cidadão, respeitar e defender o ambiente, como «um bem colectivo, insusceptível de apropriação»[125]. Dada a sua relevância, a proteção ambiental reveste, de forma clara, dignidade constitucional.
Ao Estado, incumbe prioritariamente, no âmbito económico e social, adotar uma política nacional de energia, com preservação dos recursos naturais e do equilíbrio ecológico, promovendo, neste domínio, a cooperação internacional [cf. artigo 81.º, alínea m), da Constituição, na versão introduzida pela Lei n.º 1/2004, de 24 de julho, que corresponde à alínea n) introduzida na revisão constitucional de 1982].
 
1.1 – A Constituição da República Portuguesa de 1976, no artigo 66.º[126], consagrou o direito ao ambiente como um «direito constitucional fundamental», inserido no catálogo dos direitos e deveres económicos, sociais e culturais, procedendo «acertadamente, a articulação entre o ambiente e qualidade de vida: o ambiente é um valor em si na medida em que também o é para a manutenção da existência e alargamento da felicidade dos seres humanos (teleologia antropocêntrica)» [127]/[128].
Tal preceito, não obstante as alterações ocorridas, foi mantido incólume no n.º 1, consagrando que todos têm direito a um ambiente de vida humana, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender, resultando do n.º 2 alínea a), igualmente em qualquer das sucessivas redações, que incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e com o envolvimento e a participação dos cidadãos, designadamente prevenir e controlar a poluição[129] e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão, para se assegurar, assim, nas palavras do legislador constitucional de 1997 «o direito ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável», decorrendo, destarte, que o aproveitamento dos recursos naturais tem de ser racional, salvaguardando a sua capacidade de renovação e a estabilidade ecológica, com respeito pelo princípio da solidariedade entre gerações [cf. alínea d) do n.º 2 do artigo 66.º, na redação introduzida pela Lei Constitucional n.º 1/97].
Constituindo a defesa do ambiente (ou a proteção ambiental) um dever que incumbe a todos (artigo 66.º, n.º1, in fine, da Constituição) e uma tarefa fundamental do Estado [cf. artigo 9.º, alínea e), nas redações introduzidas pelas Leis Constitucionais n.ºs 1/82 e 1/89), é suscetível de justificar restrições a outros direitos constitucionalmente protegidos como é o caso da liberdade de iniciativa económica, consagrado no artigo 61.º, do direito de propriedade (artigo 62.º) ou ainda dos direitos dos consumidores (artigo 60.º) [130].
 
1.1.1- A Constituição da República Portuguesa (de 1976) confere desde a redação original o direito de indemnização por violação do direito ao ambiente, atualmente no artigo 52.º, n.º 3, alínea a), constando até 7 de agosto de 1989 no artigo 66.º, n.º3 (cf. artigo 208.º da Lei Constitucional n.º 1/89, de 8 de julho)[131].
Com efeito, até à versão introduzida pela Lei Constitucional n.º 1/89, constava expressamente no n.º 3 do artigo 66.º da Constituição, tendo, na renovação da redação introduzida pela Lei Constitucional n.º 1/82, de 30 de setembro, passado a distinguir a lesão de bens naturais e a «lesão direta» na esfera pessoal (na lógica da assimilação entre direito ao ambiente e direitos de personalidade), para efeitos de indemnização[132]. Fórmula constitucional de 1982 que, nas palavras de CARLA AMADO GOMES, «claramente destrinçava entre lesão individual (“lesão direta”, individualmente ressarcível) e lesão de bens naturais (dano ecológico, não individualmente ressarcível)»[133].
O artigo 66.º, n.º 3, na redação introduzida pela Lei Constitucional n.º 1/82, ao conceder a todos o direito de promover, nos termos da lei, a prevenção ou a cessação dos fatores de degradação do ambiente, bem como, em caso de lesão direta por força da degradação do ambiente, o direito do cidadão lesado à correspondente indemnização, distinguia, pela primeira vez, no ordenamento jurídico português, «os dois regimes que, do mesmo facto lesivo – degradação do ambiente -, podem ser aplicáveis, por força da criação de dois tipos de danos: um de direito público, resultante da lesão de um bem público; outro de direito privado, resultante da lesão de um bem pessoal ou patrimonial privado»[134].
As hipóteses de dano pessoal e patrimonial sempre estariam cobertas pelas normas do Código Civil, nos artigos 483.º e seguintes, pois as disposições deste Código são «inquestionavelmente aplicáveis em sede de danos pessoais e patrimoniais (“ambientais”)» [135].
Desde as alterações constitucionais introduzidas pela Lei Constitucional n.º 1/82 e até à entrada em vigor do regime jurídico da responsabilidade por danos ao ambiente, que o Decreto-Lei n.º 147/2008, de 29 de julho[136], aprovou, o dano ecológico causado à natureza, ao património natural e aos fundamentos naturais da vida, já tinha cobertura legal, embora apenas reflexa, pois «[o] seu ressarcimento dependia da existência e da verificação dos pressupostos da responsabilidade civil no âmbito e na sequência de um dano causado às pessoas ou às coisas, nos termos do artigo 483.º do Código Civil»[137], em que «a reparação (ou indemnização, em sentido amplo) pode revestir duas modalidades: a reparação in natura e a indemnização em dinheiro»[138] (cf. artigos 562.º e 566.º, n.º 1l), sendo a categoria de dano moral ambiental assimilável ao dano moral tradicional, a que alude o artigo 496.º do Código Civil[139].
 
1.1.2 - Em cumprimento do disposto nos artigos 9.º e 66.º da Constituição, foi publicada a Lei n.º 11/87, de 7 de abril (Lei de Bases do Ambiente)[140], que veio consignar, no artigo 4.º, alínea h), que a existência de um ambiente propício à saúde e bem-estar das pessoas e ao desenvolvimento social e cultural das comunidades, bem como à melhoria da qualidade de vida, pressupõe a adoção de medidas que visem, designadamente:
              «[A] definição de uma política energética baseada no aproveitamento racional e sustentado de todos os recursos naturais renováveis, na diversificação e descentralização das fontes de produção e na racionalização do consumo».
Considerava, como instrumento da política de ambiente e do ordenamento do território, a avaliação (prévia) de impacte provocado por obras, pela construção de infraestruturas, introdução de novas atividades tecnológicas e de produtos suscetíveis de afetarem o ambiente e a paisagem [artigo 27.º, n.º 1, alínea g)], instituindo o regime da avaliação de impacte ambiental como instrumento preventivo essencial no domínio do ambiente[141]. E previu no artigo 30.º que os estudos de impacte ambiental seriam necessários no que concerne aos planos, projetos, trabalhos e ações que pudessem afetar o ambiente, o território e a qualidade de vida dos cidadãos, quer fossem da responsabilidade e iniciativa de um organismo da administração central, regional ou local, quer de instituições públicas ou privadas (n.º1) cuja aprovação seria necessária para o licenciamento (n.º 3). E de acordo com essa lei geral, o estudo compreenderia mormente as medidas para suprimir e reduzir as normas aprovadas e, se possível, compensar as eventuais incidências sobre a qualidade do ambiente [artigo 31.º, alínea c)].
Abrangia, assim, a necessidade de estudos de impacto ambiental no que concerne obras de construção de determinadas infraestruturas como por exemplo, barragens para produção de energia elétrica, dado o impacto deste tipo de estruturas no meio ambiente.
Definia, ambiente como «o conjunto dos sistemas físicos, químicos, biológicos e suas relações e dos factores económicos, sociais e culturais com efeito directo ou indirecto, mediato ou imediato, sobre os seres vivos e a qualidade de vida do homem» [artigo 5.º, n.º 2, alínea a)], tratando-se de «um conceito amplíssimo»[142]. E considerava componentes ambientais humanos a paisagem, o património natural e construído e a poluição (artigo 17.º, n.º 3), enquanto eram componentes ambientais naturais o ar, a luz, a água, o solo vivo e o subsolo, a flora e a fauna (artigo 6.º).
Igualmente veio estabelecer no artigo 40.º, que os cidadãos diretamente ameaçados ou lesados no seu direito a um ambiente de vida humana sadio e ecologicamente equilibrado podem pedir, nos termos gerais de direito, a cessação das causas de violação e a respetiva indemnização (n.º 4), sendo reconhecido às autarquias e aos cidadãos, que fossem afetados pelo exercício de atividades suscetíveis de prejudicarem a utilização dos recursos do ambiente, o direito às compensações por parte das entidades responsáveis pelos prejuízos causados (n.º 5). E no artigo seguinte, prevendo a responsabilidade objetiva, consignava que o quantitativo indemnizatório a fixar por danos causados no ambiente seria estabelecido em legislação complementar, enquanto no artigo 43.º determinava, para os que exercessem atividades que envolvessem alto grau de risco para o ambiente e como tal viessem a ser classificados, a obrigatoriedade de segurar a sua responsabilidade civil.
Já no artigo 48.º expressamente se previa a obrigatoriedade de remoção das causas da infração e da reconstituição da situação anterior  e, de acordo com o n.º 3, em caso de não ser possível a reposição da situação anterior à infração, os agentes infratores ficassem obrigados ao pagamento de uma indemnização especial a definir por legislação e à realização das obras necessárias à minimização das consequências provocadas (cf. artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 38/90, de 27 de novembro[143]).
 
1.1.2.1 - O Decreto-Lei n.º 186/90, de 6 de junho, veio dar concretização aos objetivos que presidem à Lei de Bases do Ambiente (cf. artigo 30.º, n.º 2, da Lei n.º 11/87) e transpôs para a ordem jurídica nacional a referida Diretiva n.º 85/337/CEE, do Conselho, de 27 de Junho de 1985[144].
 Assim, determinou que estavam sujeitos a uma avaliação de impacte ambiental os planos e projetos que, pela sua localização, dimensão ou características, fossem suscetíveis de provocar incidências significativas no ambiente (artigo 2.º, n.º 1), bem como designadamente os atinentes à indústria da energia e, assim, as instalações (industriais) destinadas à produção de energia elétrica, designadamente hidroelétrica [cf. artigo 7.º, n.º 1, e Anexo III, item n.º 3, alíneas a) e j), do Decreto-Lei n.º 186/90[145] e Anexo ao Decreto Regulamentar n.º 38/90, na redação dada pelo Decreto Regulamentar n.º 42/97, de 10 de outubro, item n.º 3, alínea j) - «Instalações destinadas à produção de energia hidroeléctrica cuja potência seja superior a 20 MW» ][146].
Considerava que o Estudo de Impacte Ambiental devia conter a indicação de medidas mitigadoras sobre as incidências negativas do projeto no ambiente e, assim, as medidas previstas para evitar, reduzir e, se possível, remediar os efeitos negativos significativos do projeto [cf. artigo 2.º, n.ºs 1, alínea c), e 2, 5.º item, do Decreto Regulamentar n.º 38/90, de 27 de novembro, e artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 186/90, quer na versão originária na versão introduzida pelo Decreto-Lei n.º 278/97, respetivamente, n.º 3, com referência ao anexo II), e alínea b)][147].
E consignava que a AIA atendia aos efeitos diretos e indiretos dos projetos sobre os fatores que indicava: o homem, a fauna e a flora; o solo, a água, o ar, o clima e a paisagem; a interação dos fatores referidos nas alíneas anteriores; e os bens materiais e o património cultural (artigo 2.º, n.º 1).
 
1.1.2.2 – Com o Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de maio[148], que aprovou o regime jurídico da avaliação de impacte ambiental, procedendo a concretização dos objetivos que presidiam à Lei de Bases do Ambiente, a revogação do Decreto-Lei n.º 186/90 (artigo 46.º, n.º 1) e a transposição para a ordem jurídica interna da referida Diretiva n.º 85/337/CEE, com as alterações introduzidas pela Diretiva n.º 97/11/CE, do Conselho (artigo 1.º, n.º 1), dispunha, no n.º 2 deste preceito, que estavam sujeitos a avaliação do impacte ambiental os projetos incluídos nos anexos I e II, em especial, no que para ora releva, atinentes às barragens e outras instalações concebidas para retenção ou armazenagem permanente de água em que um novo volume ou um volume adicional de água retida ou armazenada seja superior a 10 milhões de m3; às instalações industriais destinadas à produção de energia elétrica; às instalações destinadas ao transporte de energia elétrica por cabos aéreos; às instalações para a produção de energia hidroelétrica; e ao aproveitamento da energia eólica para produção de eletricidade[149] [cf. Anexos I, itens n.ºs 15 e 19, II, itens n.ºs 3, alíneas a), h) e i)].
E de acordo com o artigo 17.º, a decisão sobre o procedimento de AIA constava da DIA, a qual podia ser favorável, condicionalmente favorável ou desfavorável, devendo, neste caso, fundamentar as razões daquela conclusão (n.º 1); a DIA condicionalmente favorável especificava as condições em que o projeto podia ser licenciado ou autorizado e continha obrigatoriamente as medidas de minimização dos impactes ambientais negativos que o proponente devia adotar na execução do projeto, omitindo-se a possibilidade de a DIA decretar também, ou em alternativa, medidas de compensação (n.º 2).
Todavia, daí não resulta que as não contivesse, se necessárias ou adequadas, uma vez que o Estudo de Impacte Ambiental e a Avaliação de Impacte Ambiental deviam indicar as proposta de medidas que evitassem, minimizassem ou compensassem os efeitos nocivos ambientais do projeto [artigos 2.º, alíneas e) e i), e 4.º, alínea d)].
Acresce que, após a emissão da DIA favorável ou condicionalmente favorável, no âmbito da pós-avaliação do projeto, dirigida e orientada pela Autoridade de AIA, se visava mormente determinar a eficácia das medidas previstas para evitar, minimizar ou compensar os impactes negativos e potenciar os efeitos positivos, e, se necessário, a adoção de novas medidas [artigos 2.º, alínea l), 27.º e 28.º, n.º 5], bem como, no âmbito da monitorização, se procedia, se necessário, a adoção de novas medidas (mormente de natureza compensatória) ou de ajustamentos (artigos 2.º, alínea n), e 29.º, n.º 3)[150].
 
1.1.2.2.1 – Entretanto a Portaria n.º 295/2002 de 19 de março[151], surgida no quadro da atividade de produção de energia elétrica por pessoas singulares ou coletivas de direito público ou privado que o Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, veiculou, veio expressamente estabelecer, no que concerne ao procedimento de obtenção das licenças necessárias para produção de energia hidroelétrica por pequenas centrais hidroelétricas (PCH)[152], que os procedimentos de Licença de utilização da água para produção de energia hidroelétrica estavam sujeitos a avaliação de impacte ambiental (AIA), nos termos do Decreto-Lei n.º 69/2000, ou, no caso de não sujeição a AIA  a declaração de incidências ambientais (artigos 9.º e 10.º e 11.º a 15.º).
E no caso de a Declaração de impacte ambiental ser favorável ou condicionalmente favorável, teria de haver pronúncia sobre as condições sob as quais se poderá instalar a PCH (artigo 10.º), o mesmo acontecendo quanto à Declaração de incidências ambientais (artigo 15.º).
Acautelava-se, assim, o facto de haver situações não abrangidas pelo regime de AIA, contemplado no Decreto-Lei n.º 69/2000, suscetíveis de merecer medidas de proteção ambiental.
 
1.1.3 - A Lei de Bases de 1987 veio a ser substituída pela Lei n.º 19/2014, de 14 de abril, procedendo a definição das bases políticas do ambiente.
Nesse desiderato, indicou e densificou, no artigo 17.º, alguns dos instrumentos económicos e financeiros para a política de ambiente, entre os quais, os «instrumentos de apoio financeiro no domínio do ambiente, nomeadamente os fundos públicos ambientais, com o objetivo de apoiar a gestão das prioridades da política de ambiente, através da afetação de recursos a projetos e dos investimentos necessários e adequados» (alínea a)]; os «instrumentos de compensação ambiental, que visam a satisfação das condições ou requisitos legais de que esteja dependente o início do exercício de uma atividade, através da realização de projetos ou de ações que produzam um benefício ambiental equivalente ao dano ambiental causado» [alínea b)]; os «instrumentos que garantam a adequada remuneração dos serviços proporcionados pelo ambiente e pelas entidades públicas encarregadas da prossecução da política de ambiente, os quais podem implicar a aplicação de taxas, preços ou tarifas com vista a promover a utilização racional e eficiente dos recursos ambientais» [alínea c)]; os «instrumentos contratuais, que visam permitir a participação das autarquias locais, do sector privado, das organizações representativas da sociedade civil e de outras entidades públicas na realização de ações e no financiamento da política de ambiente, sempre que essa participação se revele adequada à prossecução dos objetivos», de política do ambiente, previstos no artigo 2.º[153] [alínea d)]; bem como a «fiscalidade ambiental, que visa desonerar as boas práticas ambientais e, em compensação, incidir sobre as atividades mais poluentes, numa ótica de fiscalidade globalmente neutra e equitativa, podendo contribuir para direcionar comportamentos» [alínea e)][154].
A Lei n.º 19/2014 consagra no artigo 3.º que a atuação pública em matéria de ambiente está subordinada a vários princípios como o do desenvolvimento sustentável - o qual obriga à satisfação das necessidades do presente sem comprometer as das gerações futuras, para o que concorrem «a produção e o consumo sustentáveis de energia, a salvaguarda da biodiversidade, do equilíbrio biológico, do clima e da estabilidade geológica, harmonizando a vida humana e o ambiente» [alínea a)] -, da responsabilidade intra e intergeracional, da prevenção e da precaução, do poluidor-pagador, do utilizador-pagador e da recuperação [alíneas b) a g)][155].
Em relação à definição das atividades obrigatoriamente sujeitas a avaliação ambiental, estabelece no artigo 18.º, n.º 1, que «[o]s programas, planos e projetos, públicos ou privados, que possam afetar o ambiente, o território ou a qualidade de vida dos cidadãos, estão sujeitos a avaliação ambiental prévia à sua aprovação, com vista a assegurar a sustentabilidade das opções de desenvolvimento». Avaliação ambiental que assevera que o processo de tomada de decisão integra a ponderação dos impactes relevantes em termos biofísicos, económicos, sociais, culturais e políticos, tendo em conta, entre outros, o estado do ambiente, a avaliação entre alternativas, o cenário de referência, e os impactes cumulativos com outros desenvolvimentos programados ou implementados, bem como os contributos recebidos através de consulta e participação pública, contemplando ainda uma análise do ciclo de vida no caso de projetos suscetíveis de causarem impactes ambientais adversos significativo (n.º2).
Na verdade, a avaliação de impacto ambiental (AIA) constitui um instrumento preventivo que tem por finalidade a «recolha de informação para que o poder público emita uma declaração informada acerca de potenciais impactos ambientais, analisados de forma integrada, com imposições de necessárias medidas de minimização e compensação»[156].
Assim, a avaliação de impacte ambiental, que respeita às várias fases de implementação do projeto (como a construção, exploração e desativação) toma em consideração os impactes ou efeitos resultantes dos programas, planos e projetos e, assim, da construção do empreendimento (e do seu funcionamento) nas referidas vertentes biofísicas, económicas, sociais, culturais e políticas, abrangendo um conjunto de medidas que, em suma, visam evitar, minimizar ou compensar esses efeitos.
E no que concerne às medidas de carácter socioeconómico considera-se que inclui as medidas propostas cujo objetivo visa a valorização social e económica da área geográfica afetada pelo projeto, tais como a utilização de mão-de-obra local ou a indemnização dos proprietários afetados pela implementação de estruturas; e abrange também as medidas destinadas a salvaguardar as condições de vida das populações locais bem como dos seus bens pessoais, em que se inclui, por exemplo, a execução dos trabalhos causadores de maiores impactos na agricultura local fora da época das colheitas ou a construção de centros interpretativos do património natural e arqueológico da região[157].
 
1.1.3.1 – Foi aprovado, entretanto, pelo Decreto-Lei n.º 151-B/2013[158], de 31 de outubro, o novo Regime Jurídico da Avaliação de Impacto Ambiental (RJAIA). Este diploma, que foi objeto de várias alterações[159] e se encontra vigente, previu a possibilidade de que a emissão de uma Declaração de Impacte Ambiental (DIA) favorável relativamente aos projetos públicos e privados suscetíveis de produzirem efeitos significativos no ambiente seja condicionada ao cumprimento de um conjunto de medidas de mitigação, minimização e compensação dos impactes ambientais do centro electroprodutor (artigo 18.º, n.º 4)[160]/[161].

Com efeito, estão sujeitos a AIA, no que para ora releva, o mesmo tipo de projetos que os previstos no Decreto-Lei n.º 69/2000, atento o disposto no artigo 1.º, n.ºs 3 a 5, do Decreto-Lei n.º 151-B/2013, com referência [por força das alíneas a) e b) do antedito n.º 3] aos Anexos I a III[162]/[163].
De entre os objetivos da Avaliação de impacte ambiental (AIA), contemplados no artigo 5.º do mesmo Regime Jurídico, encontra-se a definição de medidas destinadas a evitar, minimizar ou compensar os impactes ambientais significativos (diretos e indiretos, atinentes a um projeto e das alternativas apresentadas), designadamente sobre a população e a saúde humana, o solo, a água e as alterações climáticas, auxiliando a adoção de decisões ambientalmente sustentáveis [cf. alínea b) do referido preceito]. Ou seja, inserem-se nos objetivos específicos da AIA, entre outros, a identificação e previsão dos efeitos ambientais dos projetos e, por isso, também a proposição de medidas preventivas que evitem, minimizem ou compensem tais efeitos (impactes negativos)[164].
Aliás, o Estudo de impacte ambiental deve conter, além do mais, a descrição do estado do local e dos fatores ambientais suscetíveis de serem consideravelmente afetados pelo projeto, nomeadamente a população, a fauna, a flora, o solo, a água, a atmosfera, a paisagem, os fatores climáticos e os bens materiais, incluindo o património arquitetónico e arqueológico, a paisagem, bem como a inter-relação entre os fatores mencionados] (cf. Anexo V, item 4 do Decreto-Lei n.º 151-B/2013[165]).
Na verdade, a Declaração de impacte ambiental constitui uma decisão expressa ou tácita, sobre a viabilidade ambiental de um projeto, em fase de estudo prévio ou anteprojeto ou projeto de execução [artigo 2.º, alínea g)][166], cujo conteúdo se encontra previsto no artigo 18.º do mesmo Regime Jurídico. De acordo com este preceito a DIA pode ser favorável, favorável condicionada ou desfavorável (n.º 1) com fundamento na avaliação ponderada dos impactes ambientais, positivos e negativos, associados às várias fases de desenvolvimento do projeto, tendo por referência os objetivos da AIA estabelecidos no artigo 5.º.
Assim, o procedimento de AIA termina «necessariamente de uma de três formas: ou viabilizando o projeto, tal qual o proponente o apresentou; ou viabilizando o projeto, mas exigindo que este respeite determinadas condicionantes; ou pura e simplesmente inviabilizando o projeto»[167].
Se a DIA for desfavorável não há lugar ao cumprimento de quaisquer medidas, pois o procedimento extingue-se (artigo 18.º, n.º 2).
Já a emissão de uma DIA favorável condicionada, nos termos do n.º 4 do referido artigo, fixa as condições a adotar ao longo das várias fases de desenvolvimento do projeto, que podem incluir, conforme aplicável, as condicionantes à realização do projeto, os elementos a apresentar, as medidas de minimização e de compensação dos impactes ambientais negativos, bem como de potenciação dos impactes positivos, ou os programas de monitorização a adotar. Pode, pois, desde logo, acarretar, para além do constante do projeto, o cumprimento de um conjunto de medidas de mitigação, minimização e compensação dos impactes ambientais do centro electroprodutor, nomeadamente junto dos municípios, surgindo estas últimas (medidas de compensação) quando as medidas destinadas a evitar e minimizar os efeitos nocivos sejam insuficientes, podendo ser em espécie ou revestir natureza pecuniária[168].
Ou seja, no caso de DIA favorável condicionada, a fixação das condições a adotar ao longo das várias fases de desenvolvimento do projeto, podem não incluir medidas de mitigação, minimização ou de compensação dos impactes ambientais ou, podendo incluí-lo, necessariamente não serem junto dos municípios (ou das populações locais), ou sendo-o as medidas compensatórias não revestirem para os municípios natureza pecuniária.
As medidas de minimização e de compensação ou programas de monitorização de uma DIA, ou de decisão sobre a conformidade ambiental do projeto de execução, podem ser alteradas sempre que haja motivo fundamentado ou circunstâncias que o justifiquem, por iniciativa do proponente ou da Autoridade de AIA (artigo 25.º, n.ºs 1 e 2). E, em sede de pós-avaliação [cf. artigo 2.º, alínea n)], pode a autoridade de AIA, em casos excecionais e devidamente fundamentados, estabelecer a adoção de medidas adicionais para minimizar ou compensar impactes negativos significativos não previstos ocorridos durante a construção, exploração ou desativação do projeto, e verificados em sede de pós-avaliação, (ver n.º 6 do artigo 26.º, na redação originária, e  n.º 9 do mesmo artigo na redação vigente).

 
1.1.4 – Verifica-se, pois, que a Declaração de Impacte Ambiental se carateriza por constituir uma decisão no exercício de poderes jurídico-administrativos[169] visando produzir efeitos jurídicos externos numa situação individual e concreta e, assim, um ato administrativo[170]com eficácia externa, que define a posição da Administração e dos particulares interessados quanto à matéria de inserção ambiental do projeto; e, assim, um ato administrativo final parcial, contenciosamente impugnável, ainda que formalmente não vinculativo, mas materialmente vinculativo [ver artigos 22.º e 37.º do Decreto-Lei n.º 151-B/2013, e 20.º e 35.º-A do Decreto-Lei n.º 69/2000[171](este último aditado pelo Decreto-Lei n.º 197/2005)][172].
Ou seja, é um ato administrativo, inserido num procedimento administrativo (como expressamente dimana do artigo 3.º, n.º 8, do Decreto-Lei n.º 151-B/2013, de 31 de outubro, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 152-B/2017, de 11 de dezembro) e, assim, no âmbito da função administrativa, enquanto conjunto de atos de execução direta ou indireta de normas legais, que se destina a produzir efeitos jurídicos no campo de relações com um objeto especificado entre a Administração pública e particulares individualizados ou individualizáveis, e, por isso, sujeito à lei[173] e, assim, igualmente em concordância com os princípios gerais da atividade administrativo e do direito ao caso aplicáveis.
Sendo, pois, a DIA um ato administrativo, por natureza, subordinado à lei, e, por isso, insuscetível de a alterar ou revogar, limitando-se a ser o veículo da sua aplicação concreta, dando-lhe efetivo cumprimento.
 
1.2 - Nas alterações introduzidas ao Decreto-Lei n.º 172/2006, pelo Decreto-Lei n.º 215-B/2012, referentes ao aditamento dos artigos 33.º-R (respeitante a avaliação de incidências ambientais), 33.º-S, 33.º-T e 33.º-U (atinentes, sequencialmente, ao seu procedimento, à decisão do procedimento e consequências), veio regular-se especificamente, no que concerne ao pedido de licença para produção de energia elétrica em regime especial, a avaliação de incidências ambientais, respetivo procedimento, decisão e consequências no âmbito do setor da energia,.
Prevê-se que a emissão de licenças de produção de centros electroprodutores que utilizem fontes de energia renováveis, que não se encontrem abrangidos pelo Regime Jurídico de AIA, e cuja localização esteja prevista em áreas da Reserva Ecológica Nacional, Sítios da Rede Natura 2000 ou da Rede Nacional de Áreas Protegidas, é precedida de um procedimento de avaliação de incidências ambientais, com base num estudo de incidências ambientais apresentado pelo interessado tendo em consideração as políticas energéticas e ambientais vigentes (artigo 33.º-R, n.º 1). Estudo este que deve enunciar os impactes locais dos projetos e das respetivas instalações acessórias através da identificação das principais condicionantes existentes e dos descritores ambientais suscetíveis de serem afetados, bem como prever medidas de monitorização e medidas de minimização e recuperação das áreas afetadas, a implementar em fase de obra (n.º 2 do mesmo artigo).
 
1.2.1 - Nas alterações implantadas pelo Decreto-Lei n.º 76/2019, de 3 de junho, ao Decreto-Lei n.º 172/2006, que procedeu a revogação dos referidos artigos 33.º-R a 33.º-U, foram aditados, entre outros, no que concerne aos pedidos de licença para produção de energia, a avaliação de incidências ambientais, os artigos 10.º-A, 10.º-B e 10.º-C, respetivamente com a epígrafe «Avaliação de incidências ambientais», «Procedimento de avaliação de incidências ambientais» e «Decisão do procedimento de avaliação de incidências ambientais», podendo a decisão do procedimento de avaliação de incidências ambientais, que cabia à CCDR (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional), ser desfavorável, favorável ou condicionalmente favorável (artigo 10.º-C, n.º 1), equivalendo a falta de emissão da decisão nos prazos fixados a decisão favorável (n.º 2 do mesmo artigo).
 Face a estas alterações, como dimana do artigo 10.º-A, n.º 1, o procedimento de avaliação de incidências ambientais passou a preceder a emissão de licença de produção de centros electroprodutores apenas nos casos que não se encontrassem abrangidos pelo Regime Jurídico da Avaliação de Impacte Ambiental e cuja localização estivesse prevista em áreas da Rede Natura 2000, devendo o estudo de incidências ambientais, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito) obrigatoriamente abranger as vertentes definidas nas alíneas a) a e) do n.º 6 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de abril[174] (e, assim, designadamente, quando adequado, a proposta de medidas que evitem, minimizem ou compensem os efeitos negativos identificados).

 
1.2.1 – O Decreto-Lei n.º 15/2022, na linha do Decreto-Lei n.º 172/2006, expressamente consigna que no exercício das atividades objeto do diploma, os intervenientes no SEN devem adotar as providências adequadas à minimização dos impactes ambientais, observando as disposições legais aplicáveis (artigo 5.º, n.º 1), e que o Governo deve promover políticas de utilização racional de energia e incentivar a utilização dos recursos renováveis, a eficiência energética e a descarbonização da economia e a promoção da qualidade do ambiente, mostrando, assim, consonância com o estatuído constitucionalmente [artigos 66.º e 81.º, alínea m)].

No âmbito do exercício das atividades de produção e armazenamento de eletricidade, no que concerne a articulação com regimes específicos, dimana no artigo 41.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/2002 que o disposto neste diploma legal não prejudica o disposto em regimes jurídicos setoriais («demais regimes legais e regulamentares aplicáveis»), salvo as especificidades previstas nos artigos 42.º a 50.º (mormente quanto a apreciação prévia e decisão de sujeição a avaliação de impacte ambiental, a procedimento de avaliação de impacte ambiental no âmbito de alteração da licença de produção, a análise de incidências ambientais, respetivo procedimento e decisão, bem como quanto a cedências e compensações – respetivamente artigos 42.º a 46.º e 49.º).
Ou seja, parece ter em vista regimes jurídicos de natureza ambiental que determinem a necessidade de análise de incidências ambientais, como é o caso do Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de abril, no seu artigo 10.º[175].
 
1.3 – Entrementes, com o Decreto-Lei n.º 42-A/2016, de 12 de agosto, foi criado o Fundo Ambiental, estabelecendo as regras para a respetiva atribuição, gestão, acompanhamento e execução[176], extinguindo o Fundo Português de Carbono, o Fundo de Intervenção Ambiental, o Fundo de Proteção dos Recursos Hídricos e o Fundo para a Conservação da Natureza e da Biodiversidade, respetivamente fundados pelo Decreto-Lei n.º 71/2006, de 24 de março, pelo artigo 69.º da Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto, pelo Decreto-Lei n.º 172/2009, de 3 de agosto, e pelo Decreto-Lei n.º 171/2009, de 3 de agosto.
Fundo que, nos termos do n.º 1 do artigo 3.º visa apoiar políticas ambientais e de ação climática para a prossecução das finalidades inerentes ao desenvolvimento sustentável, contribuindo para o cumprimento dos objetivos e compromissos nacionais e internacionais, entre os quais, os relativos às energias de fontes renováveis e à eficiência energética, às alterações climáticas, aos recursos hídricos, aos resíduos, à conservação da natureza e biodiversidade, ao bem-estar dos animais de companhia, à floresta e gestão florestal, ao ordenamento e gestão da paisagem, financiando entidades, atividades ou projetos que se enquadrem nas áreas de atuação que indica nas alíneas a) a v) do mesmo n.º 1, designadamente as de mitigação das alterações climáticas, através de ações que contribuam para a redução de gases com efeito de estufa (GEE) e, desta forma, para o cumprimento das metas, designadamente no domínio das energias renováveis e da eficiência energética [alínea a)], de uso eficiente da água e proteção dos recursos hídricos [alínea e)], de eficiência energética, energias de fontes renováveis, autoconsumo e comunidades de energia renovável, combate à pobreza energética e transição justa [alínea p)], do combate à pobreza energética [alínea q)], e da promoção do equilíbrio e sustentabilidade sistémica do setor energético e da política energética nacional [alínea r)].
 
1.4 - Foram-se, pois, consagrando meios compensatórios pela instalação e funcionamento dos centros produtivos de energia elétrica, dados os reflexos destes no meio ambiente, pela ocupação de espaço público ou afetação de bens do domínio público com o transporte e distribuição de energia, como as medidas de minimização (medidas que permitem eliminar parcialmente o impacto ambiental negativo através de alterações ao projeto que se pretende executar).
Com efeito, pode acontecer ocorrerem situações em que não  é possível eliminar o impacto imediato e diretamente causado, a menos que não seja permitida a atividade que se pretende realizar. E para os impactos ambientais que não sejam passíveis de prevenção total ou de minimização por não ser possível eliminá-los (por serem irreversíveis e inevitáveis, no todo ou em parte), devem ser impostas pela administração medidas compensatórias. Medidas estas que não implicam uma alteração ao projeto que se pretende fazer, obrigando, antes, à efetuação de ações que melhorem a qualidade do ambiente e que se caraterizem por provocar um impacto favorável equivalente ao impacto ambiental negativo que não foi possível eliminar, criando-se, assim, para o empreendedor «a obrigação de realização de um benefício ambiental que neutralize a respetiva perda», pois, na verdade, os empreendimentos do setor elétrico caraterizam-se por constituirem exemplos típicos de geração de impactes «nas suas atividades de produção, transporte ou distribuição»[177].
Por outras palavras, as medidas de compensação têm como objetivo «contrabalançar os impactos que subsistam para além da aplicação de todas as medidas de prevenção e minimização susceptíveis de evitar, reduzir ou eliminar os impactes negativos de um projecto, directos, indirectos e cumulativos»[178] e ,assim apenas  quando as medidas  de prevenção e minimização adotadas se mostrarem insuficientes.
 Deste modo, as medidas de compensação como forma de compensação ambiental constituem uma espécie de reparação pela afetação ou degradação ambiental em que os custos sociais e/ou ambientais verificados se incorporam nos custos totais do proponente empreendedor. São, assim, um instrumento da política pública de ambiente que a lei de bases da política de ambiente necessariamente acolhe (Lei n.º 19/2014, de 14 da abril) [179].
Em virtude de os danos ambientais se caraterizarem amiudadamente como sendo de elevado custo de reparação ou até de irreversibilidade, a prevenção surge, no âmbito da política do ambiente, com destaque no elenco das tarefas de proteção do ambiente como o vem consagrando a Constituição da República Portuguesa desde o início da sua vigência no artigo 66.º, n.º 2, alínea a) [bem como sucessivamente os artigos 3.º, alínea a), e 4.º, alínea f), da Lei de Bases do Ambiente (Lei n.º 11/87), e 3.º, alínea c), da Lei de bases da política de ambiente (Lei 19/2014)], constituindo, assim, um pilar nuclear dessa política. Por essa razão, as medidas compensatórias ex ante constituem meios ou instrumentos imprescindíveis para colmatar impactes ecológicos negativos em sede de AIA de projetos no âmbito do setor elétrico, designadamente da construção e funcionamento de centros electroprodutores ou até do aumento de potência[180].
 
III
Dos regimes de cedências aos Municípios pelos electroprodutores e outras compensações
 
1 - Após a implantação das regras contempladas na Lei n.º 2002, de 26 de dezembro de 1944 e renovadas (e atualizadas) pelo Decreto-Lei n.º 43335, de 1960, consagrou-se, no seguimento de alterações legislativas iniciadas em 1975 e 1976, o pagamento de rendas aos municípios no âmbito da distribuição de eletricidade, a cargo da concessionária das redes[181], e da produção ordinária e especial de energia elétrica, no que concerne, respetivamente, aos centros hidroelétricos – e termoelétricos - e aos centros eólicos por parte dos respetivos titulares.
Procedamos, pois, no caminho da resposta à questão colocada, a apreciação de cada um dos últimos dois regimes, começando pelo consagrado no Decreto-Lei n.º 424/83.
 
1.1 – O Decreto-Lei n.º 424/83, no artigo 1.º, com a epígrafe «Renda devida aos municípios», estabelece o pagamento de uma renda pela EDP, enquanto titular dos centros hidroelétricos (e termoelétricos) aos municípios [182]cuja circunscrição territorial seja atingida pela zona de influência daqueles centros (n.º 1), em função de diversos parâmetros, entre os quais os preços de potência e de energia da tarifa de venda a clientes finais em muito alta tensão (MAT) em vigor.
A institucionalização desse direito de crédito ope legis, denominado de «renda anual» a favor dos municípios, cujo pagamento, nos termos literais do Decreto-Lei n.º 424/83, surge como incumbindo à empresa pública EDP, por ser, conforme referido, nessa altura, e desde 1976, a (única) titular dos centros produtores hidroelétricos e termoelétricos para consumo público.
Era, então, a quem ficara a caber, em monopólio, a exploração do serviço público de produção de energia elétrica para uso público, pois havia sucedido às empresas concessionárias que tinham tal tipo de obrigação positiva de natureza pecuniária, que o regime revogado pelo artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 424/83 estipulava.
Zona de influência dos aproveitamentos hidroelétricos, que corresponde, nos termos do n.º 2 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 424/83, à área do círculo de raio igual a 2,5 km, com centro no edifício da central, acrescida da superfície inundada exterior a esse círculo.
Por sua, vez, os artigos 2.º a 4.º regram, respetivamente, sobre a fórmula de cálculo da renda de centros electroprodutores em exploração (artigo 2.º) e, em construção (artigo 3.º), bem como sobre a repartição da renda no caso de a zona de influência de centros electroprodutores atingir mais de uma circunscrição municipal (artigo 4.º, n.ºs 1 e 2) e no caso de uma circunscrição municipal ser atingida pela zona de influência de mais de um centro electroprodutor (n.º 4 do artigo 4.º)[183].
O cálculo da renda anual a cobrar pelos municípios aos centros electroprodutores hidroelétricos (e termoelétricos) em exploração assentava, atento o artigo 2.º, em diversos parâmetros, entre os quais os preços de potência e de energia da tarifa de venda a clientes finais em muito alta tensão (MAT) em vigor, já que a fórmula de cálculo atende, entre outros, a elementos como a potência instalada, a produtividade média ou a capacidade útil de armazenamento. E no caso de a zona de influência de um centro electroprodutor atingir mais de uma circunscrição municipal, a renda a atribuir a cada município é proporcional à área abrangida, sendo calculada pela aplicação de uma fórmula que atende vários fatores, entre os quais a área do município compreendida na zona de influência do centro electroprodutor e a zona de influência do mesmo centro electroprodutor (artigo 4.º, n.º 1).
Na verdade, na determinação do valor da renda a favor do credor município ou municípios, tem-se em consideração, a natureza do centro electroprodutor (se é hidroelétrico ou termoelétrico) em exploração, a potência instalada, a produtividade média ou a capacidade útil de armazenamento, decorrendo a incumbência do pagamento dessa renda da mera existência de um centro electroprodutor, e a sua localização no território desses municípios[184].
Assim, atento o teor do artigo 2.º e 3.º do Decreto-Lei n.º 424/83[185], as variações do montante da renda resultam de determinadas caraterísticas próprias das centrais electroprodutoras abrangidas e da atividade por si desenvolvida e não assentam em qualquer concreta quantificação dos efeitos negativos.
 
1.1.1 - Visou-se com a introdução do regime do Decreto-Lei n.º 424/83, por um lado, «institucionalizar as formas de compensação a dar às populações sobre a influência de centrais produtoras de energia eléctrica», mitigando, assim, os efeitos negativos (nocivos) dessas centrais, «isto a par da informação sobre a justeza das soluções adoptadas quanto à sua localização, tipo, dimensão e meios utilizados para atenuar o impacte sobre o ambiente»; e, por outro lado, proceder ao «reforço da capacidade de actuação dos municípios por aumento da sua capacidade financeira», constituindo este reforço, de acordo com o texto preambular do mesmo Decreto-Lei, política dominante do Governo[186].

A referida renda, como acima indicamos, tem também raízes na prestação prevista no artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 43.335, que se encontrava inserido na secção VIII, com epígrafe «Do regime fiscal», do Capítulo II com o título «Das concessões do Estado».
Atentas as caraterísticas da prestação pecuniária prevista no Decreto-Lei n.º 424/83, não constitui a mesma um tributo [impostos, taxas e demais contribuições financeiras (ou contribuições especiais) a favor de entidades públicas[187]], já que o imposto se traduz numa prestação pecuniária, coativamente imposta ao cidadão, de modo unilateral com vista a realização de fins públicos, mas sem o caracter de sanção[188]; a taxa «constitui uma prestação pecuniária e coativa, exigida por uma entidade pública, em contrapartida de prestação administrativa efetivamente provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo, assumindo uma natureza sinalagmática»[189]; e as contribuições financeiras/contribuições especiais destinam-se a financiar um conjunto de intervenções mais complexas do Estado na organização atual coletiva e do bem comum[190], pelo que se está perante uma contribuição «se o facto gerador do tributo consubstancia uma prestação administrativa presumivelmente provocada ou aproveitada por um grupo em que o sujeito passivo se integra»[191].

Face, pois, ao consignado no preâmbulo e ao estabelecido no Decreto-Lei n.º 424/83, a renda que o mesmo prevê carateriza-se por revestir natureza ambivalente, sócio-ambiental, não se circunscrevendo ao âmbito ambiental, assumindo um cariz compensatório pecuniário pelos impactes negativos necessariamente desencadeados, resultantes dessas centrais produtoras de energia elétrica (construção, existência e funcionamento), independentemente, no entanto, dos concretos efeitos negativos provocados.
É como que uma compensação preventiva por um dano presumido, bastando a existência desses tipos de centros electroprodutores para se verificar a obrigatoriedade do pagamento dessa renda ao município ou municípios da sua localização, dado o impacto (negativo) que acarreta às populações e território da circunscrição dos municípios atingidos.
Assim, a referida renda carateriza-se por ser uma prestação pecuniária fundada na lei, de natureza compensatória, a favor dos municípios, de pagamento anual decorrente da existência, localização e funcionamento de um centro electroprodutor hídrico na área da circunscrição territorial de um ou de vários municípios.

 
1.2 – O Decreto-Lei n.º 339-C/2001, de 29 de dezembro, ao proceder a revisão do regime aplicável à atividade produtiva por centrais renováveis de energia elétrica por pessoas singulares ou coletivas (de direito privado ou público), aditou um novo item (n.º 33), ao anexo II ao Decreto-Lei n.º 189/88, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 168/99, prevendo o pagamento de uma compensação aos municípios pela implantação de centrais eólicas ou parques eólicos nas suas circunscrições ao determinar:

               «33 - Para centrais eólicas, tendo presente a conveniência de reflectir uma repartição dos benefícios globais que lhe são inerentes a nível nacional e local, é devida aos municípios, pelas empresas detentoras das licenças de exploração de parques eólicos, uma renda de 2,5% sobre o pagamento mensal feito pela entidade receptora da energia eléctrica produzida, em cada instalação, nos seguintes termos:
               a) Quando as instalações licenciadas estejam instaladas em mais de um município a renda é repartida proporcionalmente à potência instalada em cada município;
               b) Nos casos em que as empresas detentoras das licenças de exploração tenham celebrado quaisquer acordos ou contratos com as autarquias locais em cuja área estão implantadas, a título de compensação pela respectiva exploração, aplicar-se-á o seguinte:
               i) Manutenção da situação actual contratualizada, se esse pagamento for previsionalmente igual ou superior à renda definida na alínea a) durante o período de vigência da licença de exploração da central;
               ii) Prevalência do disposto neste diploma, em caso de opção da autarquia, caso tal pagamento for previsionalmente inferior à renda definida na alínea a) durante o período de vigência da licença de exploração da central.»
Compensação essa que se traduz na circunstância de os electroprodutores pagarem uma renda de 2,5% sobre o volume mensal de vendas à rede aos Municípios em cuja circunscrição se encontrem inseridas as suas instalações, «tendo presente a conveniência de reflectir uma repartição dos benefícios globais que lhe são inerentes a nível nacional e local» (item n.º 33, corpo). Reconhece-se também, através da experiência com a aplicação da legislação, a necessidade da valorização local da disponibilidade desses recursos, associado à necessidade de salvaguardar os interesses do mais favorável ordenamento e gestão do território, com destaque para as zonas sensíveis do ponto de vista ambiental, já que essa implantação acarreta «ónus ambientais ao nível da perda da biodiversidade e/ou perda de receita turística»[192]. Por isso:
              «Desde cedo que os Municípios reclamaram uma compensação em virtude da implantação dos parques nas suas circunscrições, a qual alegadamente provocaria ónus ambientais ao nível da perda de biodiversidade e/ou, da perda de receita»[193].
Verifica-se, pois, que os titulares das centrais eólicas, com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 339-C/2001 (com a alteração introduzida ao Anexo II do Decreto-Lei nº 189/88), passaram a ter a obrigação legal de pagar uma renda aos municípios em cujos territórios aquelas se localizavam.
Todavia, como resulta da alínea b) do transcrito item n.º 33, no caso de as empresas detentoras das licenças de exploração terem celebrado acordos ou contratos com as autarquias locais em cuja área estejam implantadas a título de compensação pela respetiva exploração, a referida imposição legal é afastada mantendo-se a situação contratualizada se o pagamento acordado for, durante o período de vigência da licença de exploração da central, previsionalmente igual ou superior à renda definida na alínea a); e no caso de o pagamento acordado ser inferior já prevalece a referida imposição legal de pagamento da renda se essa for a opção da autarquia.
O pagamento de rendas aos municípios pelos produtores de eletricidade deixou, pois, de ser apenas dos centros produtores hídricos ou termoelétricos passando a abranger também os produtores independentes de energia elétrica em instalações eólicas[194].
 
1.2.1 – Tal diploma de 1988, com as alterações sofridas, veio a ser revogado pelo artigo 15.º, n.º 2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 215-B/2012, de 8 de outubro, tendo, no entanto, nos termos previstos nos n.ºs 4, 5 e 7 do mesmo artigo 15.º, sido mantido em vigor o referido Anexo II[195], pelo que continuou, assim, desse diploma, a aplicar-se o regime remuneratório aí contemplado a centrais renováveis incluindo centrais eólicas, e foi expressamente determinada a manutenção em vigor da obrigação de pagamento da renda nos moldes até então em vigor (n.º 7), contemplada no então item n.º 27 do Anexo II (resultante da redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 33-A/2005, de 16 de fevereiro[196])[197].
 
1.2.2 – Uma vez que o pagamento da renda aos municípios, previsto no referido anexo II (do Decreto-Lei n.º 189/88), na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 339-C/2001, foi sucessivamente mantido (e alterado, pela última vez, pelo Decreto-Lei n.º 35/2013, que procedeu a alteração do regime remuneratório aplicável aos centros electroprodutores submetidos ao anexo II do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, dando-lhe nova redação), indica-nos que a obrigatoriedade de pagamento se mantém enquanto se mantiver o regime de remuneração garantida que esse anexo prevê e disciplina[198].
O mencionado anexo II «visa precisamente estabelecer o regime remuneratório garantido de que beneficiam as centrais eólicas, nas condições previstas no diploma»; e, atentas estas condições, é «portanto, o próprio legislador, numa lógica de coerência sistemática, que estabelece uma ligação estreita entre o pagamento da renda aos municípios e o acesso ao regime de remuneração garantida»[199].
O referido Anexo II com as sucessivas versões e o Decreto-Lei n.º 35/2013 não só estabelecem o regime remuneratório garantido, atinente a produtores de energia elétrica de regime especial, em que se incluem os centros electroprodutores eólicos, como, no que respeita a estes centros, prevê o pagamento de renda de 2,5% sobre o pagamento mensal feito pela entidade recetora da energia elétrica produzida, em cada instalação a favor dos municípios.
Finalmente, o regime implantado pelo Decreto-Lei n.º 15/2022, não veio proceder à alteração do referido Anexo II na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 35/2013, mantendo-se em vigor no que concerne aos titulares das centrais eólicas enquanto permanecerem abrangidas pelo regime de remuneração garantida previsto no indicado anexo ou de outros regimes bonificados de apoio à remuneração de que são exemplo os regimes de remuneração alternativa que o Decreto-Lei n.º 35/2013 previa, pois nos termos do artigo 278.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/2022, os centros electroprodutores que beneficiem de regimes de remuneração garantida ou de outros regimes bonificados de apoio à remuneração, atribuídos, mantidos ou prorrogados por diplomas legais anteriores mantêm os regimes remuneratórios nas condições de atribuição até ao decurso dos respetivos prazos, nos termos em que foram estabelecidos.
 
2 – Além das cedências aos municípios previstas no Decreto-Lei n.º 15/2022, foram ainda sequentemente previstas outras medidas compensatórias.
 
2.1 - O Decreto-Lei n.º 30-A/2022, de 18 de abril[200], que veio estabelecer as medidas excecionais para assegurar a simplificação dos procedimentos de produção de energia a partir de fontes renováveis, destinadas a vigorar, nos termos do artigo 11.º, por um período de dois anos, a contar de 19 de abril de 2022, data da sua entrada em vigor, e passou, com o Decreto-Lei n.º 22/2024, de 19 de março[201], a vigorar até o final de 2024[202], prevê no artigo 4.º- B, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 72/2022, de 19 de outubro, uma compensação adicional aos municípios.
Com efeito, instituiu-se que pela instalação de centros electroprodutores de fontes de energia renováveis (como a solar, eólica, hídrica, biomassa e geotérmica) e de instalações de armazenamento que obtenha título de controlo prévio de operações urbanísticas ou que tenha sido isenta de controlo prévio nos termos do artigo 4.º-A do mesmo diploma, é devida aos municípios uma compensação no valor de € 13.500,00 por MVA de potência de ligação atribuída, a suportar pelo Fundo Ambiental.
São, pois, elegíveis os municípios que, a partir de 20 de outubro de 2022, emitiram título de controlo prévio de operações urbanísticas e/ou que tenham isentado de título de controlo prévio a instalação de Centros electroprodutores de fontes de energia renováveis para injeção total de energia na rede elétrica de serviço público, de Unidades de produção para autoconsumo, sujeitas a licença de produção e exploração, instaladas no solo em áreas não artificializadas e que estejam sujeitas a controlo prévio de operações urbanísticas; e instalações de armazenamento de eletricidade (artigos 4.º-B, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 30-A/2022, 6.º do Decreto-Lei n.º 72/2022 e item 3 do Regulamento para a atribuição dessa Compensação aos Municípios[203], aprovado pelo Despacho n.º 6195/2023, de 5 de junho de 2023[204]).
Tal compensação tem, de acordo com o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 72/2022, como principal objetivo, contribuir para o desenvolvimento local dos municípios nos quais os projetos de produção de energia de fontes renováveis e de armazenamento de eletricidade se localizam, sendo a mesma suportada pelo Fundo Ambiental[205] (artigo 4.º-B, n.º 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 30-A/2022).
No caso de centros electroprodutores de fontes de energia renováveis e de instalações de armazenamento que abranjam mais de um concelho, a compensação é atribuída na proporção do território ocupado pelas infraestruturas que compõem a central, em cada concelho, exceto no caso de centros electroprodutores de fonte eólica em que a compensação é atribuída na proporção do número de torres eólicas instaladas em cada concelho (cf. item n.º 4.5 do referido regulamento)[206].
E carateriza-se por ser «única», enquanto o período do pagamento teve início a partir de 5 de junho de 2023 com decurso até ao dia 31 de dezembro de 2023, ou até se esgotar a dotação, conforme o que se verificar primeiro [itens 4.2 e 5.1 do referido Regulamento e alínea a) do n.º 2 do referido artigo 4.º-B][207].
Compensação esta que, assim, acresce à prevista no artigo 49.º do Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro[208]. E acresce-lhe por revestir «caráter suplementar»[209] (ou excecional, porque temporária) e ainda por a sua satisfação não incumbir ao titular do Centro Electroprodutor, não afetando, pois, a aplicação do mecanismo das cedências e compensações que o artigo 49.º do Decreto-Lei n.º 15/2022 institui nem outros existentes.
 
2.2 - Com o Decreto-Lei n.º 18/2024, de 2 de fevereiro, criou-se um mecanismo de compensação aos municípios pelos projetos elétricos estratégicos de grande impacto, geradores de significativas externalidades locais negativas, sendo considerados projetos elétricos estratégicos de grande impacto, para além dos indicados no artigo 7.º do referido Decreto-Lei, as interligações transfronteiriças e os projetos assim qualificados em plano de desenvolvimento e investimento da rede, previsto no artigo 125.º do Decreto-Lei n.º 15/2022 (artigo 1.º, n.º 2).
Este diploma de 2024 estabelece, pois, um mecanismo de compensação aos municípios nos casos em que os seus territórios sejam atravessados, ou neles se instalem, infraestruturas da rede elétrica de serviço público (RESP) da responsabilidade dos operadores das redes elétricas que integram o Sistema Elétrico Nacional (SEN), qualificadas como essenciais à realização de projetos elétricos estratégicos de grande impacto, que sejam geradoras de significativas externalidades locais negativas[210] (cf. artigos 1.º, n.º 1, e 2.º, n.º 1).
E o artigo 6.º do mesmo diploma, com a epígrafe «Cumulatividade», preceitua, no n.º 1, que a antedita compensação «é cumulável e não prejudica o direito dos municípios a quaisquer outras compensações legalmente previstas, designadamente no artigo 49.º do Decreto-Lei 15/2022, de 14 de janeiro, na sua redação atual, e no artigo 4.º-B do Decreto-Lei 30-A/2022, de 18 de abril, na sua redação atual».
Aliás, o legislador no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 18/2024, mostra claramente que os impactos (negativos), nos territórios e nas populações, subjazem à compensação prevista no antedito diploma, ao aduzir que «os objetivos da República Portuguesa em matéria de metas de energias renováveis não devem desconsiderar os impactos nos territórios e nas populações (…), razão pela qual, no que respeita à instalação de novos centros eletroprodutores e instalações de armazenamento, os municípios são titulares do direito a cedências e a compensações, nos termos do disposto no artigo 49.º do Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro, na sua redação atual, e no artigo 4.º-B do Decreto-Lei n.º 30-A/2022, de 18 de abril, na sua redação atual».
Pelo que, de acordo com o entendimento do legislador visou-se com o Decreto-Lei n.º 18/2024 «estabelecer [no] um quadro adicional de contrapartidas aos municípios que sejam fortemente impactados por externalidades locais negativas decorrentes do desenvolvimento da rede elétrica necessária em projetos estratégicos de grande impacto, através do (…) mecanismo de compensações»[211] (cf. artigos 1.º e 2.º).
 
3 – Concomitantemente com esses meios compensatórios, existem tributos (taxas ou impostos) que revertem ou podem reverter, no todo ou em parte, para as autarquias locais, como é o caso do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI).

Com efeito, a Lei n.º 73/2013, de 3 de setembro[212], que estabelece o regime financeiro das autarquias locais e das entidades intermunicipais, considera no artigo 14.º quais são as receitas dos municípios, designadamente, o produto da cobrança do imposto municipal sobre imóveis (IMI), sem prejuízo do produto dessa receita que cabe às freguesias (a receita do IMI sobre prédios rústicos e uma participação no valor de 1 /prct. da receita do IMI sobre prédios urbanos) [alínea a)]; o produto da cobrança do imposto municipal sobre as transmissões onerosas e imóveis (IMT) [alínea b)]; o produto da cobrança de derramas lançadas nos termos do artigo 18.º [alínea c)]; o produto da cobrança de contribuições, designadamente em matéria de proteção civil, nos termos da lei [alínea e)]; o produto da cobrança de taxas e preços resultantes da concessão de licenças e da prestação de serviços pelo município, de acordo com o disposto nos artigos 20.º e 21.º [alínea f)]; e outras receitas estabelecidas por lei ou regulamento a favor dos municípios [alínea o)].
O artigo 14.º da Lei n.º 73/2013 corresponde a normativos de anteriores Leis de Finanças Locais (artigo 10.º da Lei 2/2007, de 15 de janeiro, artigo 16.º da Lei n.º 42/98, de 6 de agosto, artigo 4.º da Lei n.º 1/87, de 6 de janeiro, artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 98/84, de 29 de março (emitido no uso da autorização legislativa conferida pela Lei n.º 19/83, de 6 de setembro[213], e artigo 3.º da Lei n.º 1/79, de 2 de janeiro).
Aliás, a Lei de Finanças Locais n.º 1/79, de 2 de janeiro, estabelecia no artigo 3.º que, além da participação em receitas fiscais, constituíam receitas dos municípios mormente o produto da cobrança de taxas municipais, do lançamento de derramas e da cobrança de mais-valias destinadas por lei aos municípios, bem como outras quaisquer receitas estabelecidas por lei em favor dos municípios [alíneas a), g), h) e i)]. E, no artigo 5.º, que as receitas fiscais a arrecadar pelos municípios abrangiam designadamente o produto de cobrança de determinados impostos (da Contribuição predial rústica e urbana e do imposto sobre veículos, para serviço de incêndios e de turismo) e uma participação no produto global de vários impostos (como dos impostos profissional, complementar, sobre aplicação de capitais, sobre sucessões e doações e sisa e da contribuição industrial [cf. alíneas a) e alínea b].

 
3.1 – O Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) constitui um tributo, com a natureza jurídica de imposto, que incide sobre o património imobiliário, ou seja sobre a riqueza imobiliária. Imposto que foi introduzido no ordenamento jurídico através do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro, que aprovou o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI)[214], substituindo a Contribuição Autárquica introduzida pelo Código de contribuição autárquica (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-C/88, de 30 de novembro). Por sua vez, a contribuição Autárquica substituíra a contribuição predial[215].
O IMI, em termos gerais, carateriza-se por ser um imposto de base real, que incide sobre o valor patrimonial tributário dos prédios rústicos e urbanos sitos no território português, sendo receita dos municípios onde se localizam, e constitui uma compensação financeira dos proprietários dos prédios pelos serviços que os municípios prestam no exercício da sua atividade pública através de obras e outras prestações de que são beneficiários tais proprietários[216].
E o artigo 2.º do Código do IMI (CIMI) define fiscalmente prédio de modo igual ao constante do regime antecedente vertido no artigo 2.º, n.º 1, do Código de Contribuição Autárquica. E é também similar à definição de prédio constante do artigo 4.º do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 45104, de 1 de julho de 1963.
 
3.2 - Consagra a Constituição da República Portuguesa o princípio da legalidade fiscal ao determinar no artigo 103.º, n.º2, da Constituição[217] que os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes [cf. ainda artigo 8.º Lei Geral Tributária (LGT)][218], sendo a proposta de Orçamento de Estado, de acordo com o artigo 106.º, n.º 3, alínea g), da Constituição, acompanhada de relatórios sobre mormente os benefícios fiscais e a estimativa da receita cessante.
Ora, os impostos assentam essencialmente na capacidade contributiva, revelada, nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património (artigo 4.º, n.º 1, da LGT).
E o princípio da capacidade contributiva contém «a medida de comparabilidade entre o objeto de tributação, por um lado, e a medida de comparabilidade entre os sujeitos passivos, por outro lado», pelo que se aplica «ao universo de sujeitos que manifestam essa capacidade e não apenas a alguns, sob pena de se criarem privilegiados e discriminados»[219].
Assim, o pagamento do tributo, por qualquer sujeito passivo (contribuinte), exige a verificação da tipicidade tributária, com respeito pelo princípio da capacidade contributiva, a menos que se encontre em situação de não sujeição tributária ou exista benefício fiscal que o abranja.
O princípio da capacidade contributiva concretiza, na verdade, como princípio de justiça fiscal, o princípio da igualdade[220] consagrado no artigo 13.º da Constituição[221]. Por outras palavras, este princípio constitucional reflete-se no princípio da igualdade tributária (ou fiscal), sendo, pois, este uma sua «expressão específica» (ou «projeção no plano fiscal»)[222]. Efetivamente, segundo o Tribunal Constitucional[223]:
              «O princípio constitucional da igualdade tributária, como expressão específica do princípio geral estruturante da igualdade (artigo 13.º da Constituição), encontra concretização “na generalidade e na uniformidade dos impostos. Generalidade quer dizer que todos os cidadãos estão adstritos ao pagamento de impostos (…); por seu turno, uniformidade quer dizer que a repartição dos impostos pelos cidadãos obedece ao mesmo critério idêntico para todos” (TEIXEIRA RIBEIRO, Lições de Finanças Públicas, 5.ª edição, pág. 261). E tal critério, como sublinha CASALTA NABAIS, encontra-se no princípio da capacidade contributiva: “Este implica assim igual imposto para os que dispõem de igual capacidade contributiva (igualdade horizontal) e diferente imposto (em termos qualitativos ou quantitativos)».

 
3.3. – O princípio da igualdade, aliás, é considerado um dos princípios estruturantes do «sistema constitucional global» e, assim, do Estado de Direito democrático e social[224], «diz respeito a todas as funções do Estado e exige criação e aplicação igual da lei, da norma jurídica»[225].
 O âmbito de proteção do conteúdo jurídico-constitucional do princípio da igualdade abrange na ordem constitucional portuguesa, segundo J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA[226]:

               «[A]s seguintes dimensões: a) proibição do arbítrio, sendo inadmissíveis, quer diferenciações de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objetivos, constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais; b) proibição de discriminação, não sendo legítimas quaisquer diferenciações de tratamento entre cidadãos baseadas em categorias meramente subjetivas ou em razão dessas categorias; c) obrigação de diferenciação, como forma de compensar a desigualdade de oportunidades (…)».
Na verdade, «a ideia mais difundida (…) como fundamento de tratamento das semelhanças ou das diferenças traduz-se na proibição do arbítrio, ou seja, na ausência de justificação razoável»[227].
Por isso, este princípio traz consigo «a proibição de sistemas legais internamente incongruentes, porque integrantes de soluções normativas entre si desarmónicas ou incoerentes», impedindo, por isso, que as normas «estabeleçam regimes desrazoáveis, e, assim, disciplinas jurídicas que diferenciem pessoas e situações que mereçam tratamento igual ou, inversamente, que igualizem pessoas e situações que mereçam tratamento diferente»[228].
Na verdade, quanto à proibição de discriminações, não «significa uma exigência de igualdade absoluta em todas as situações, nem proíbe diferenciações de tratamento», pois «[a]s diferenciações de tratamento podem ser legítimas quando (a) se baseiem numa distinção objectiva  de situações; (b) não se fundamentem em qualquer dos motivos indicados no n.º 2; (c) tenham um fim legítimo segundo o ordenamento constitucional positivo; (d) se revelem necessárias, adequadas e proporcionadas à satisfação do seu objectivo»[229].
 
3.4 - Deste modo, atento o princípio de igualdade (fiscal), o imposto surge igual para as pessoas (físicas ou coletivas) que dispõem de igual capacidade contributiva pelo que devem pagar o mesmo imposto  (igualdade horizontal) e diferente para as que têm diferente capacidade contributiva, pelo que devem pagar diferentes (qualitativa e/ou quantitativamente) impostos (igualdade vertical)[230].
 
IV
Da não revogação expressa do Decreto-Lei n.º 424/83
 
1 – O Decreto-Lei n.º 424/83 não foi objeto de qualquer alteração legislativa, diferentemente do que sucedeu com os regimes de pagamento da renda aos municípios, previstos no referido anexo II (do Decreto-Lei n.º 189/88) através da redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 339-C/2001, e no Decreto-Lei n.º 344-B/82 (artigo 6.º, nº 2).
Mais: não obstante as alterações legislativas efetuadas no que concerne ao setor elétrico nacional, na sequência da abertura do sector elétrico à iniciativa privada (através do Decreto-Lei n.º 449/88, de 10 de dezembro) e do Decreto-Lei n.º 99/91, de 2 de março, e durante o período em imperavam os primeiros passos na liberalização do mercado energético, que o Decreto-Lei n.º 182/95, de 27 de julho, e os diplomas que o modificaram (Decretos-Leis n.ºs 56/97, de 14 de março, 24/99, de 28 de janeiro, 198/2000, de 24 de agosto, 69/2002, de 25 de março, e 85/2002, de 6 de abril) [231] corporizavam, não se procedeu, de modo expresso, a revogação do Decreto-Lei n.° 424/83[232].
O mesmo sucedeu com os diplomas legais cujas linhas de orientação eram assumidamente a liberalização e a promoção da concorrência nos mercados energéticos, designadamente no que respeita à produção de energia elétrica, como dimana dos Decretos-Leis n.ºs 29/2006, de 15 de fevereiro, 172/2006, de 23 de agosto – e dos diplomas legais que os modificaram -, 35/2013, de 28 de fevereiro, e 15/2022, de 14 de janeiro, atualmente vigente, com as alterações entrementes introduzidas.

O Decreto-Lei n.º 29/2006 procedeu, no artigo 79.º à revogação de vários diplomas legais e, por sua vez, dos diplomas legais que o alteraram, apenas os Decretos-Leis n.ºs 78/2011 (artigo 6.º), 75/2012 (artigo 9.º), 112/2012, (artigo 4.º), 215-A/2012 (artigo 5.º) 178/2015 (artigo 3.º) e o Decreto-Lei n.º 15/2022 (artigo 305.º) continham normas atinentes a revogação expressa, nada referindo acerca do Decreto-Lei n.º 424/83.
O que também aconteceu com os Decretos-Leis n.ºs 172/2006 (artigo 79.º) incluindo os diplomas que o alteraram, em especial os Decretos-Leis n.ºs 215-B/2012 e 76/2019.
 Outrossim, similar ocorreu com o Decreto-Lei n.º 35/2013 (artigo 20.º), a Lei 24-D/2022, de 30 de dezembro (artigo 281.º), e com o Decreto-Lei n.º 11/2023 (artigo 32.º)
Por sua vez, o Decreto-Lei n.º 49/2019, de 15 de abril, que veio determinar a cessação de vigência de decretos-leis publicados entre os anos de 1981 e 1985, procedendo a «declaração solene de não vigência de muitos atos normativos arcaicos mas nunca antes expressamente eliminados do acervo legislativo» «considera revogados diversos decretos-leis, publicados entre os anos de 1981 e 1985, determinando expressamente que os mesmos não se encontram em vigor, em razão de caducidade, revogação tácita anterior ou revogação efetuada» pelo mesmo diploma (artigo 1.º), não enumera o Decreto-Lei n.º 424/83.
 Este diploma legal, publicado entre os anos de 1981 e 1985, não foi, na verdade, expressamente revogado, total ou parcialmente, nem declarado extinto pela verificação de caducidade.
Não existindo normativo que constitua meio de eliminação que constitua revogação expressa e, por isso, clara e categórica, do Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro nem declaração solene da sua caducidade e estando-se ainda perante a ausência de declaração de cessação de vigência «em razão de (…) revogação tácita anterior» há, pois que indagar acerca da sua eventual cessação de vigência (por caducidade ou revogação tácita) ou, pelo menos, da sua delimitação subjetiva, atendendo ao facto de o diploma ter sido naturalmente concebido para operar numa realidade em que a «EDP, EP» tinha o monopólio da produção de energia para consumo público.

 
V
Da resposta à questão colocada

 
Há, pois, ora, que dar resposta à questão colocada e para o efeito, antes mais, atender às regras da interpretação jurídica das normas (cf. artigo 9.º do Código Civil), quer no que respeita aos preceitos do referido Decreto-Lei n.º 424/83 (em especial, o artigo 1.º, n.º 1) quer no de apurar se houve revogação tácita (total ou parcial), o que tem de se inferir a partir de uma conduta concludente do legislador, determinada, necessariamente, por via interpretativa[233].

Na resposta, considerar-se-á, em primeiro lugar, a legislação produzida até ao Decreto-Lei n.º 15/2022 e, de seguida, as normas decorrentes da entrada em vigor do regime de cedências previsto neste Decreto-Lei de 2022.
 
1 O Decreto-Lei n.º 424/83, ao estabelecer o pagamento de uma renda anual aos municípios, cuja circunscrição fosse atingida por zonas de influência de centros produtores hidroelétricos ou termoelétricos em exploração ou em construção, pela «EDP», determinou a caducidade das rendas a pagar pela EDP ao Estado e os respetivos adicionais destinados às câmaras municipais, previstos na alínea d) da base XV da Lei n.º 2002, e nos artigos 68.º e 70.º do Decreto-Lei n.º 43.335, passando, assim, a constar daquele diploma autónomo a matéria das rendas aos municípios.
Em virtude do estabelecido pelos Decretos-Leis n.ºs 205-G/75, de 16 de abril, e 502/76, de 30 de junho, a «EDP, EP» passou, na verdade, a ser por força imperativa da lei, a única titular do estabelecimento e da exploração do serviço público de produção de energia elétrica (para consumo público), e, assim, de todas as anteriores concessões atinentes à exploração desse serviço público, por tempo indeterminado, sucedendo nos direitos e obrigações às anteriores empresas nacionalizadas titulares dessas concessões (cf. artigos 2.º, n.ºs 1, 3 e 4, e 8.º do Decreto-Lei n.º 502/76).
Constituindo, então, a única titular dos centros de produção hidroelétrica para consumo público, o setor elétrico passou, em Portugal Continental, fruto de tais alterações de 1975 e 1976, «a identificar-se com a EDP»[234]. O que acontecia ainda em 1983. Ou seja, então, apenas a «EDP, EP» era quem, em exclusivo, explorava os centros de produção hidroelétrica para consumo público, pois se em 1975, com o Decreto-Lei n.º 205-G/75, a atividade de produção elétrica para uso público ficou exclusivamente reservada ao Estado Português, a partir de 1976, a EDP ficou a ser «o incumbente por excelência do setor elétrico em Portugal (num regime de monopólio legal)»[235].
Por isso, o legislador ao referir no Decreto-Lei n.º 424/83 que o pagamento das rendas aos Municípios era pela «EDP», identificava esta pessoa coletiva, então, de natureza pública, por aglomerar em si, e em exclusivo, a titularidade desses «centros de produção» (e da grande distribuição). Era o mesmo que dizer que caberia à titular desses centros produtivos elétricos (ou até, à titular de cada um de tais centros) o dever de pagamento. Surgiam então como sinónimos; é o que resulta da realidade legal aquando da publicação e entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 424/83.  
Pretendia, assim, o legislador que esses centros electroprodutores e, assim, a titular dos direitos da sua exploração, que era a «EDP, EP» em regime de monopólio, pagasse uma renda (compensação) aos municípios abrangidos pela área de influência desse tipo de empreendimentos, visando beneficiar aquelas edilidades e as suas populações, atenta a construção, existência e funcionamento desses centros.
 
1.1 - Com a reabertura à iniciativa privada do setor elétrico, como serviço público, visando promover e satisfazer as exigências de desenvolvimento social e económico de toda a população, passou a EDP a não ser a única titular de centros produtores hidroelétricos, pois surgiram (ou foram surgindo) novos centros electroprodutores atribuídos à EDP ou a outros titulares em regime de concorrência, para além dos que haviam sido atribuídos àquela empresa em regime de monopólio (fora do regime de concorrência).
Desde já adiantamos que a razão de ser do pagamento dessa renda não deixou de existir. Antes se manteve por ser inerente à construção, existência e funcionamento desses centros, dada a influência negativa que a plena ocupação de território dos municípios necessariamente comporta. Se a razão de ser era transversal aos centros electroprodutores hídricos para consumo público no período em que a EDP tinha o monopólio da produção continuou a sê-lo relativamente aos centros electroprodutores hídricos surgidos posteriormente quando já vigorava o livre acesso à produção e, assim, a denominada «liberdade de empresa» e em regime de livre concorrência.
A mudança, quer do regime jurídico (de monopólio ou de concorrência) quer da entidade titular dos centros electroprodutores hídricos, não altera as razões justificativas daquelas rendas. 
 
1.1.1 - Efetivamente, as alterações vertidas na Constituição (através da Lei Constitucional n.º 1/89, de 8 de julho, na nova redação ao artigo 85.º, n.º 1, e na eliminação do princípio da irreversibilidade das nacionalizações, consagrado na redação originária do artigo 83.º, n.º 1) e na Lei (com a alteração da redação da Lei n.º 46/77, introduzida pelo Decreto-Lei n.º 449/88, de 10 de dezembro, em especial no que respeita ao artigo 4.º; com a aprovação da Lei-Quadro das Privatizações - Lei n.o 11/90, de 5 de abril - e dos sucessivos regimes jurídicos do exercício das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica - Decretos-Leis n.ºs 99/91, 182/95 e 29/2016 - e respetiva regulamentação ou desenvolvimento - Decretos-Lei n.ºs 100/91, 183/95 e 172/2006 -) mudaram a configuração do setor energético. E nos fundamentos e base dessas alterações, esteve a entrada na Comunidade Europeia e as Diretivas emanadas do Parlamento Europeu e do Conselho (em especial, as n.ºs 96/92/CE, 2003/54/CE e 2009/28/CE).
É, pois, ponto assente que as mudanças no setor elétrico, em especial no que concerne à produção para consumo público, caminharam, de forma inexorável, rumo à reprivatização, à iniciativa privada e à livre concorrência[236].
 
1.1.2 - A liberdade de concorrência consubstancia uma das principais dimensões da liberdade de empresa, na medida em que esta pressupõe a existência de liberdade de competição económica. Competição económica que, no caso de produção de energia elétrica, não se cinge ao acesso à produção, abrangendo também, e necessariamente, a sequente disputa operacional no âmbito do exercício da atividade produtiva de energia elétrica, pois a atividade de produção de eletricidade é exercida em regime de concorrência (cf. artigos 1.º, n.º 1, e 4.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 172/2006, na redação originária, 1.º, n.º 1, e 3.º, n.º 2, e 4.º, n.º 2, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 215-B/2012, e 1.º, n.º 1, e 3.º, n.º 2, na versão do Decreto-Lei n.º 76/2019; e 2.º, n.º 1, e 4.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 15/2022).
O princípio da concorrência salutar que dimana dos artigos 81.º, alínea f), e 99.º, alíneas a) e c), ambos, da Constituição[237] tem necessariamente de estar presente na atividade económica[238], sendo proibidas as atuações que a visem limitar ou condicionar[239], o que exige uma paridade de tratamento, e, por isso, o princípio da igualdade, contemplado no artigo 13.º da mesma Lei Fundamental, igualmente releva como fundamento, não devendo, pois, as empresas (públicas, privadas ou mistas) ser «desfavorecidas na luta concorrencial e na correspondente maximização da eficiência produtiva»[240].
 
1.2 - As sucessivas alterações do regime legal, no sentido da implementação e aprimoramento da iniciativa privada e da livre concorrência no setor da produção da energia elétrica, conduziram a que o regime consagrado no Decreto-Lei n.º 424/83, atenta a letra da lei, tendesse a ficar especado como «normatividade datada» e, por isso, desatualizada.
Todavia, não podemos deixar de atender a que há leis que subsistem para além das mutações económico-sociais como até das políticas, pois:
              «A um regime sucede outro; a Constituição é substituída por uma Constituição nova; o ambiente ideológico muda; e quantas leis continuam a vigorar. É até frequente estabelecer-se um certo fosso entre o novo circunstancialismo e muitas leis que continuam de pé, não obstante se não harmonizarem inteiramente com esse circunstancialismo. Tais leis só deixam de ter valor por inconstitucionalidade se forem concretamente contrárias às disposições da nova Constituição ou aos princípios nela consignados»[241].
E quando se verifica uma mudança das circunstâncias de facto para as quais a norma foi criada, quando ocorre uma mudança do uso de linguagem, suscetível de atribuir novos sentidos à expressão verbal utilizada na norma ou quando se opera um alteração dos critérios valorativos resultantes da alteração global do desenvolvimento axiológico-jurídico, a interpretação atualista dessa surge como caminho a atender[242]. O que exige que se atenda à coerência do sistema jurídico, pois «uma lei só tem sentido quando integrada num ordenamento vivo e, muito em especial, enquanto harmonicamente integrada na “unidade do sistema jurídico”»[243].
Ademais, a mudança de condições que torna a lei desatualizada não constitui, por si, causa da sua extinção (cessação por caducidade), mas, sem dúvida, motivo para que o Estado intervenha com a necessária prudência, em ordem a substituir a lei velha por uma lei nova.
 A caducidade da lei, na verdade, traduz-se na cessação automática da lei, não bastando, porém, para essa cessação o mero desaparecimento das circunstâncias ou dos motivos que motivaram a sua criação (occasio legis), nem a contraditoriedade com as novas exigências sociais, pois não constitui consequência de qualquer destas situações. Para que ocorra a extinção da norma legal por caducidade é necessário que a própria lei tenha em si um limite à sua vigência, deixando automaticamente de vigorar quando esse limite se verifica. Pressupõe, pois, que se esteja perante uma lei ad tempus: «[s]ó pode dar-se quando esteja, por assim dizer, ínsita na lei desde a origem, como seu limite»[244] ou pelo desaparecimento, em termos definitivos, da realidade que a lei se destina a regular e, assim, dos pressupostos (de facto ou de direito) de  aplicação da lei, desde que acarrete a impossibilidade definitiva da sua aplicação[245].
 
1.2.1.1 – Alude-se à inviabilização da aplicação das fórmulas de cálculo das rendas constantes no artigo 2.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 424/83.
Segundo este preceito, os valores dos índices «a» e «b» que integram as fórmulas de cálculo da renda de centros electroprodutores em exploração são definidos com base no tarifário, em vigor em 30 de Junho do ano a que respeite a renda.
Tem sido considerado que com a aprovação do Despacho n.º 24567-A/2001, da ERSE, se inviabilizou a aplicação das fórmulas de cálculo das rendas por, no seguimento da reorganização do setor elétrico nacional contemplado nos Decretos-Leis n.ºs 182/95 a 188/95, todos, de 27 de julho, as fórmulas previstas no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 424/83 para o cálculo da renda deixaram de poder ser aplicadas, por ter sido «modificada a estrutura de tarifas para o fornecimento de energia elétrica, deixando aquela entidade de proceder à fixação da taxa de potência da tarifa de Muito Alta Tensão (MAT)»[246]; e ainda que com a extinção gradual das tarifas reguladas de venda a clientes finais, a tarifa MAT aplicável pelo comercializador de último recurso deixou de ser publicada pela ERSE desde 2014, não tendo o legislador procedido a correção da ausência do índice em falta.
E, embora, o cálculo dessas rendas anuais tenha deixado de poder ser realizado nos termos expressamente previstos no Decreto-Lei n.º 424/83, verifica-se que, segundo resulta do referido Protocolo (Considerando D), se continuou «a proceder à sua determinação através da indexação do último valor da renda calculado com o último valor publicado da tarifa, à inflação tarifária».
Todavia, o desaparecimento dos pressupostos de aplicação das mencionadas fórmulas - por via da alteração da estrutura tarifária - afetou a possibilidade de aplicação daquele dispositivo e concomitantemente a necessidade de clarificação e enquadramento legal dos direitos dos municípios consagrados no Decreto-Lei n° 424/83.
Ademais, ainda segundo este Protocolo de fevereiro de 2012 (cláusula 3.ª) o pagamento anual aí previsto a favor dos municípios elencados é «[e]m  complemento ao pagamento dos montantes das rendas anuais resultantes do disposto no Decreto-Lei n.º424/83», pelo que, parece evidenciar-se, claramente, que, então  se procedia ao pagamento dessas rendas (e, assim,  muito depois de ter entrado em vigor o Decreto-Lei n.º 29/2006).
Em 2022, a ERSE indicava não ter notícia de que as rendas a pagar pelos centros electroprodutores ao abrigo do Decreto-Lei n.° 424/83, de 6 de dezembro, não estivessem a ser consideradas nos pagamentos aos municípios (cf. referido parecer da ERSE que constitui o Anexo II à nota informativa).
A falta de publicação pela ERSE do indicado índice necessário, para se proceder nos precisos termos das fórmulas indicadas nos artigos 2.º e 3.º do Decreto-Lei n.º 424/83 para quantificação da renda devida, constitui nessa medida, obstáculo à efetivação atempada do direito consagrado no artigo 1.º do mesmo diploma.
Obstáculo esse que, afetando transitoriamente a aplicação da norma, não é adequado ou suscetível de causar a extinção do direito que o artigo 1.º, n.º 1, do antedito Decreto-Lei contempla, pois, desde logo, como vimos, continua a justificar-se que este vigore e na sua plenitude, tendo em consideração as regras de interpretação jurídica, o que afasta a sua caducidade.
Aliás, atento o disposto no artigo 7.º, n.º 1, do Código Civil, a lei, quando se não destine a ter vigência temporária nem tenha havido desaparecimento, em termos definitivos, da realidade que a lei se destina a regular, só deixa de vigorar se for revogada por outra lei. Por conseguinte, uma portaria, um regulamento ou um despacho (ato administrativo) não revogam uma lei. E a sua não publicação ou prolação igualmente não constitui causa de caducidade de lei. Poderia, sim essa não publicação ou prolação ser condição de caducidade da lei, o que só aconteceria se isso resultasse da própria lei e na medida em que o determinasse[247].
Aliás, é comum estabelecer-se numa lei que o regime que consigna será revisto em determinado prazo; e passado esse prazo sem que ocorra a revisão «não cessa a vigência de tal lei por caducidade: ela continua em vigor até à sua substituição»[248].
 
1.2.2 – Não constitui o Decreto-Lei n.º 424/83 o único diploma legal em que se veio prever o pagamento de rendas aos municípios por centros electroprodutores, atento o concernente aos centros produtores eólicos que o Decreto-Lei n.º 339-C/2001, de 29 de dezembro, trouxe à luz no artigo 3.º ao aditar ao Anexo II ao Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, num novo item (n.º 33).
Não obstante a proximidade existente entre a previsão consignada no Decreto-Lei n.º 424/83 e o pagamento de rendas aos municípios pelas empresas detentoras das licenças de exploração de parques eólicos, surgido no referido Anexo II, certo é que este pagamento brota no âmbito de regime especial de produção elétrica (cf. artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio) e, assim, no espaço da atividade de produção de energia elétrica desenvolvida por pessoas singulares ou coletivas, de direito público ou privado, independentemente da forma jurídica que assumiam, em regime de livre acesso, como dimana do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 189/88. Regime este que foi merecendo a atenção expressa do legislador, pois procedeu à emissão de diplomas acerca da matéria vertida no Anexo II do referido Decreto-Lei.
Já o regime do Decreto-Lei n.º 424/83 nasce na linha do resultante da Lei de Eletrificação do país e do Decreto-Lei que a desenvolvia, na medida em que separavam a rede elétrica nacional, em que se incluía a produção de energia elétrica para uso público [cf. Base I (a Base XXIX) da Lei n.º 2002 e artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 43.335], da produção de energia elétrica para uso particular (Bases XXX a XXXII da Lei n.º 2002 e capítulo III do Decreto-Lei n.º 43.335). Tem origem, pois, nesse regime, apesar de ter vindo à luz no quadro da produção de energia elétrica para consumo público em regime de «monopólio», o que se reflete, inexoravelmente, no seu teor gramatical ou redação (texto da lei).
 Ou seja, a existência de rendas aos municípios (câmaras municipais) pelos centros electroprodutores (hidroelétricos e termoelétricos) provinha de período muito anterior à existência das nacionalizações e à constituição da EDP.
 
1.2.3 - O preâmbulo do Decreto-Lei n.º 424/83, ao considerar que o pagamento de rendas que institui consubstancia o reforço da capacidade de atuação dos municípios por aumento da sua capacidade financeira - necessariamente afetada em resultado da perda de território submerso pela água das albufeiras e, assim, a estas sacrificado -, acolhia já, embora noutro prisma, o entendimento que o item do referido Anexo II ao Decreto-Lei n.º 189/88, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 339-C/2001, viria a consagrar ao determinar que o pagamento de rendas aos municípios pelos titulares dos centros eólicos e divisão proporcional do produto desse pagamento pelos municípios abrangidos por cada centro produtor constitui «uma repartição dos benefícios globais que lhe são inerentes a nível nacional e local».
E, como igualmente se veicula no mesmo diploma de 1983, também constitui a institucionalização de uma forma de compensação a dar às populações pela influência de centrais produtoras de energia elétrica. E isto, de acordo com o antedito preâmbulo, a par de uma larga informação sobre a justeza das soluções adotadas quanto à sua localização, tipo, dimensão e meios utilizados para atenuar o impacte sobre o ambiente.
Basta, pois, a existência do centro electroprodutor hídrico e a sua localização e funcionamento para haver lugar ao pagamento da renda aos municípios cuja circunscrição seja atingida por zonas de influência desses centros produtores, nos termos do n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 424/83. E isto independentemente dos efeitos nocivos e das concretas medidas tomadas para atenuar (e, assim, minimizar ou mitigar) o impacte sobre o ambiente.
Aliás, as variações do montante da renda, em qualquer dos casos, não dependem da quantificação de cada um dos eventuais efeitos nocivos das centrais de produção elétrica, mas tão só resultam de caraterísticas das centrais e da sua atividade, não se vislumbrando a existência de qualquer concreta relação direta entre esses efeitos e o efetivo valor da renda, atenta a fórmula de cálculo (cf. artigos 2.º e 3.º do Decreto-Lei n.º 424/83), o que já acontecia no regime anterior ao implantado por este diploma.
 
1.2.4 – Não obstante as manifestações de intenção do «legislador», vertidas nos preâmbulos[249] dos Decretos-Leis n.ºs 184/2003 e 185/2003, ambos de 20 de agosto, de adoção de uma lei de bases até ao fim de 2003, em que se procederia a revisão das rendas pagas aos municípios pelos centros electroprodutores, inculca a intenção de, designadamente, se tomar posição clara acerca de tal matéria no sentido da sua revisão, tendo, porém, sido apenas a 15 de fevereiro de 2006, com o Decreto-Lei n.º 29/2006[250], que se vieram estabelecer os princípios gerais da organização e funcionamento do sistema elétrico nacional.
Com este diploma legal, ocorre, no que concerne ao quadro organizativo do setor elétrico, uma alteração de paradigma que já vinha emergindo, na medida em que se consagrou que, quer a atividade de produção quer a de comercialização, «são exercidas em regime de livre concorrência, e as atividades de transporte e distribuição são exercidas mediante a atribuição de concessões de serviço público» (cf. preâmbulo e artigo 4.º, n.ºs 3 a 5) e, destarte, em contraposição com o regime vigente aquando da aprovação, publicação e entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 424/83.
 Contudo, não contempla qualquer manifestação expressa sobre a matéria versada no antedito diploma de 1983, pois no regime trazido à luz no Decreto-Lei n.º 29/2006, quanto ao exercício das atividades de produção de energia elétrica, nada se regrou ou dispôs sobre as rendas aos municípios pelos centros electroprodutores de energia elétrica (em regime ordinário ou em regime especial). O mesmo aconteceu com o Decreto-Lei n.º 172/2006, que o desenvolveu, tendo, no entanto, este último diploma estipulado, nos artigos 44.º e 69.º, apenas quanto às rendas aos municípios pelos concessionários das redes municipais de distribuição em baixa tensão, vindo a merecer regulação do Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro. 
E apesar de o Decreto-Lei n.º 215-B/2012, que alterou o Decreto-Lei n.º 172/2006, ter procedido, no artigo 15.º, n.ºs 2, alínea a), e 7, relativamente ao regime das rendas a pagar pelo centro electroprodutor eólico, previstas no n.º 27 do anexo II ao Decreto-Lei n.º 189/88 (alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 168/99, de 18 de maio, 312/2001, de 10 de dezembro, 339-C/2001, de 29 de dezembro, 33-A/2005, de 16 de fevereiro, e 225/2007, de 31 de maio), a revogação daquele Decreto-Lei de 1988, manteve expressamente em vigor tal item do Anexo[251]. Ou seja, pronunciou-se expressamente no sentido da manutenção da renda prevista no referido item n.º 27.
 
1.2.5 - Aquando do surgimento do Decreto-Lei n.º 424/83, já a Constituição da República Portuguesa previa, no artigo 66.º, a proteção do ambiente e o direito à indemnização pela afetação ambiental, e do próprio preâmbulo do Decreto-Lei n.º 424/83, expressamente dimana, a atenção ao direito à informação, designadamente dos meios utilizados para atenuar o impacto (nocivo) sobre o ambiente atenta à sua localização, tipo e dimensão do centro electroprodutor (hidroelétrico ou termoelétrico).
Ou seja, decorre do preceituado no Decreto-Lei n.º 424/83, e do teor do seu preâmbulo, que o valor dessa renda não era influenciada pelas soluções a adotar (ou adotadas) em cada centro produtivo de energia hídrico (ou termoelétrico) quanto aos meios utilizáveis (ou utilizados) para atenuar o impacte sobre o ambiente, não dependendo, pois do êxito ou inêxito das concretas medidas de atenuação aplicadas.

Ainda era a EDP empresa pública quando, em cumprimento daquele preceito constitucional, surgiu a 7 de abril de 1987, a Lei n.º 11/87, que expressamente veio prever a tomada preventiva de medidas (de mitigação e compensação), visando designadamente garantir o mínimo impacte ambiental, com o instrumento «avaliação de impacto ambiental» [cf. artigos  4.º, alínea f), 27.º, n.º 1, alínea g), e 31.º, alínea c)]; e, no artigo 48.º, estabelecer a obrigatoriedade de remoção das causas da ofensa ao ambiente, da reconstituição da situação anterior a essa ofensa, bem como, face à imposição dessa reposição, a obrigação de pagamento de uma compensação e a realização de obras de minimização.
Em concretização aos objetivos dessa Lei de Bases do Ambiente, e ainda antes da publicação do regime jurídico do exercício das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica que estabelecia o acesso de entidades privadas ao exercício das atividades de produção, o Decreto-Lei n.º 186/90, de 6 de junho, veio disciplinar a avaliação de impacte ambiental de planos e projetos como os das instalações industriais destinadas à produção de energia elétrica [cf. artigos 4.º, 27.º, n.º 1, alínea g), 30.º, n.ºs 1 e 2, e 31.º da Lei n.º 11/87, 7.º, n.º 1, e Anexo III, item n.º 3, alíneas a), b) e j), do Decreto-Lei n.º 186/90; e ainda o artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 38/90, de 27 de novembro].

 
1.2.6 - A razão de ser da previsão da renda prevista no Decreto-Lei n.º 424/83 mantém-se quer o centro electroprodutor hídrico tenha surgido fora ou no âmbito do regime de concorrência, pois a natureza e amplitude dos efeitos nocivos dos centros de produção hidroelétrica ancoram na própria natureza desse tipo de empreendimentos e nos efeitos da sua construção, existência e funcionamento na circunscrição territorial afetada. A eventual influência nesta vertente de o seu surgimento ser no âmbito do regime concorrencial ou fora desse regime, mostra-se-nos, material e juridicamente, inidóneo a merecer relevância jurídica.

Na verdade, a ocupação de território dos municípios pela água das barragens para a produção de energia elétrica e, assim, de espaço útil, impede aí qualquer outra atividade, constituindo uma privação de bens para os municípios e para as suas populações, bem como causa de limitações que o Decreto-Lei n.º 502/71, de 18 de novembro[252], consagrou (cf. artigos 1.º, n.ºs 1 e 2, e 4.º)  e o Decreto-Lei n.º  107/2009, de 15 de maio[253], direta ou indiretamente, estabelece (mormente nos artigos 3.º, alínea c), 5.º, n.º 1, alínea a),20.º e 21).
Não poderá haver nesse concreto espaço qualquer outra atividade, designadamente de cariz económico, por força dessa «redução» da área do município. Impacto que surge como claramente visível e manifesto, muito superior ao dos empreendimentos eólicos.
Os empreendimentos hídrico-elétricos ao acarretarem o aumento da área submersa, interferem, assim, negativamente em atividades económicas, em especial, na agricultura, agroindústria, no turismo[254], com repercussões ao nível de emprego e afetação na estrutura, bem-estar das populações locais, deslocamento de comunidades humanas, bem como nas receitas das autarquias, com concomitantes efeitos económico-sociais, para além da submersão de eventuais ocorrências patrimoniais (e até culturais) [255]. Efeitos que se produzem e mantêm até, pelo menos, ao fim da desativação do empreendimento.
Assim, a exigência legal do pagamento de rendas aos municípios pelos centros de produção hidroelétricos assenta na mera construção, instalação e funcionamento desses centros electroprodutores (hidroelétricos) por necessariamente criarem impacte negativo para as populações dos municípios da instalação, e também para os próprios municípios, afetando-os, a quem urge compensar, reforçando, assim, quanto a estes últimos, a sua capacidade financeira.
Parece-nos, pois, evidenciar-se, que os efeitos nocivos dos empreendimentos hidroelétricos vão para além do âmbito ambiental.     

 

2 – No seguimento da resposta à questão solicitada, antes de vermos se se verifica a modalidade de revogação tácita (total ou parcial), cabe desde já consignar que há quem entenda que o Decreto-Lei n.º 424/83 foi tacitamente revogado, pelo menos de modo parcial, como decorre da nota explicativa que funda o pedido de parecer e dos respetivos anexos.
O entendimento de revogação tácita parcial do Decreto-Lei n.º 424/83 é sufragado por INÊS VIEIRA[256] ao considerar que a obrigação de pagamento da renda municipal anual, constante do Decreto-Lei 424/83, se mantém em vigor apenas quanto aos centros electroprodutores hidroelétricos atribuídos à EDP «fora do regime de concorrência», por força da derrogação tácita parcial que o Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, promoveu, na medida em que sujeitou a atividade de produção de eletricidade a um regime de livre exercício, não parecendo possível fazer recair apenas sobre uma empresa (EDP) – entretanto privatizada – o dever de pagar uma renda pelo exercício de uma atividade, a produção de eletricidade, que outros operadores também levam a efeito sem tal encargo ope legis.
 

2.1 - A revogação tácita na modalidade contemplada no artigo 7.º, n.º 2, do Código Civil, exige a existência de incompatibilidade entre o teor das disposições da nova lei e as da lei anterior, o que ocorre quando há oposição ou antinomia entre elas, de modo que seja impossível aplicá-las conjuntamente às relações sociais que regulam, pois não podem subsistir duas leis simultaneamente opostas versando a mesma factualidade, sem que uma delas seja nociva ou inútil, pelo que se a conciliação for possível inexiste revogação, a menos que a nova lei reproduza as mesmas disposições, ou regule inteiramente as relações sociais a que eram aplicáveis[257].
E no caso de a lei precedente ser lei especial face à lei nova, exige o n.º 3 do artigo 7.º do Código Civil para que se verifique a revogação a existência de intenção inequívoca do legislador nesse sentido.
A lei geral revoga a especial não só quando o legislador expressamente o declare (revogação expressa), o que não é o caso, mas também quando se reconheça de forma manifesta que ele teve essa intenção, «regulamentando os mesmos casos que foram previstos na lei anterior, ou estabelecendo novos princípios de direito, absolutamente incompatíveis com aqueles em que se baseava a anterior legislação especial»[258].
As normas especiais (ou de direito especial) caraterizam-se por consagrar uma disciplina nova, face à norma do direito comum ou diferente para círculos mais restritos de pessoas, coisas ou relações, tendo, assim, uma diversidade de funções como as de complemento ou integração.

Assim, o regime de rendas aos municípios contemplado no Decreto-Lei n.º 424/83 surge como especial relativamente às bases do setor elétrico sucessivamente regulado na Lei n.º 2002 (e no Decreto-Lei n.º 43.335), bem como nos Decretos-Leis n.ºs 99/91 (e n.º 100/91), 182/95 (e n.º 183/95), 29/2006 (e n.º 172/2006), pois mostra-se-nos que a matéria das rendas aos municípios cuja circunscrição seja atingida pela zona de influência de centros produtores hidroelétricos (e termoelétricos) constitui, quanto às sucessivas leis que estabelecem os princípios gerais relativos à organização e funcionamento do sistema elétrico nacional e que regulam o exercício das atividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de eletricidade, um complemento específico.

 
2.1.1 - Considerando os descritos antecedentes do Decreto-Lei n.º 424/83, mostra-se-nos que o regime de pagamento de rendas pelos titulares de centros de produção hídrica de energia não era incompatível com os sucessivos regimes posteriormente brotados, maxime com o Decreto-Lei n.º 29/2006 (e 172/2026).
É verdade, e reiteramo-lo, que com a aprovação do Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, entrou em vigor um novo quadro organizativo do setor elétrico, em que «as atividades de produção e comercialização são exercidas em regime de livre concorrência, e as atividades de transporte e distribuição são exercidas mediante a atribuição de concessões de serviço público»[259], mas, segundo se nos afigura, este novo quadro não conduz à inaplicabilidade do regime do Decreto-Lei n.º 424/83, relativamente aos centros electroprodutores atribuídos em regime de concorrência, após a entrada em vigor do referido Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, por  a razão de ser da  compensação prevista naquele diploma de 1983 ancorar  na mera construção, existência e localização de um centro hídrico de produção de  energia elétrica (e , por isso, independentemente de ter surgido em regime de monopólio ou de livre concorrência).
E não se encontra no determinado pelo Decreto-Lei n.º 29/2006 e nos diplomas sequentemente surgidos que o desenvolveram, regularam e atualizaram normativo que acautele a totalidade dos interesses e valores que o Decreto-Lei n.º 424/83 tutela.
Com efeito, no âmbito da matéria regulada pelo Decreto-Lei n.º 29/2006 acerca dos centros electroprodutores não ancora qualquer relacionação conducente à cessação da obrigação de pagar a renda aos municípios contemplada no referido Decreto-Lei de 1983.
Mas mesmo que tenha havido, ao longo dos anos, durante algum período de tempo, vontade legislativa de alterar (ou até de revogar) o Decreto-Lei n.º 424/83, como o parecem indicar, no primeiro sentido, os preâmbulos dos Decretos-Leis n.ºs 184/2003 e 185/2003, certo é que, porventura fruto de alterações governamentais, essa vontade não perpassou para o corpo dos Decretos-Leis n.ºs 29/2006 e 172/2006, em qualquer das suas versões ou de outros diplomas legais que os completassem, atualizassem ou regulassem.
Ademais, mesmo a vontade expressa da Associação Nacional de Municípios Portugueses, aquando dos trabalhos preparatórios da Lei do Orçamento para 2012, ao propor, no âmbito da pronúncia efetuada, a pretendida autorização legislativa, visando a emissão de Decreto-Lei que procedesse a revogação expressa do Decreto-Lei n.º 424/83 e a aprovação de novo diploma legal que regulasse essa matéria, não mereceu impacto positivo visível na vontade legislativa, na medida em que nada do proposto mereceu acolhimento na lei ou, sequer, referência, evidenciando-se, sim uma clara ausência de manifestação de vontade.
Com o regime organizativo do setor elétrico, que o Decreto-Lei n.º 29/2006 contemplou, não resulta, assim, ainda que implicitamente, a inaplicabilidade do regime do Decreto-Lei n.º 424/83, no que concerne aos novos centros electroprodutores, atribuídos em regime de concorrência, após a entrada em vigor daquele diploma de 2006.
Na verdade, o exercício das atividades de produção e comercialização passaram a ser exercidas em regime de livre concorrência. O que abrangeria tanto os centros eletroprodutores novos como os anteriores.
Assim, o regime resultante do Decreto-Lei n.º 29/2006 (tal-qualmente antes o resultante dos Decretos-Leis n.ºs 99/91 e 182/95) com as suas alterações e desenvolvimentos não é contraditório por incompatibilidade com a exigência legal do pagamento de rendas, versada no Decreto-Lei n.º 424/83, quando a revogação tácita, nos termos do n.º 2 do artigo 7.º do Código Civil, ancora na verificação de contraditoriedade ou incompatibilidade da lei nova com a lei precedente e apenas na estrita medida dessa incompatibilidade ou contrariedade.
 
2.2 - Calcorreando os Decretos-Leis n.ºs 29/2006 (e 172/2006), bem como os antecedentes 99/91 (e 100/99) e 182/95 a 188/95, em qualquer das suas versões, verifica-se que não só não é indicado o referido Decreto-Lei n.º 424/83 como não regram sobre a totalidade da matéria versada ou do conteúdo deste diploma, sendo, em si omissos quanto à matéria das cedências/compensações aos municípios, incluindo as rendas a estes, por titular de centro electroprodutor, não havendo incompatibilidade entre este Decreto-Lei de 1983 e as referidas sucessivas leis gerais, pois não afrontam nem conflituam com as demais regras previstas que estabelecem outras compensações aos municípios.
Aliás, o problema da revogação da lei especial pela lei geral é tão só de interpretação da lei posterior, resumindo-se em apreciar se esta quer ou não revogar a lei especial anterior e nessa interpretação deve atender-se ao texto da lei, sua conexão, evolução das soluções sobre o instituto ao longo do tempo e sobretudo orientar-se pelo fim da disposição questionada e o resultado de uma e outra interpretação.

Tais sucessivos regimes gerais do setor energético não revelam uma conduta concludente do legislador da lei nova em revogar lei anterior sobre rendas: Falta, ao que se nos afigura, a existência de «uma nova e contrária manifestação de vontade do legislador, incompatível com a subsistência da lei antiga»[260]. E, inexistindo contraditoriedade por incompatibilidade entre a lei geral posterior e a lei especial anterior, não se encontram razões para considerar verificada a intenção objetiva inequívoca. Mostra-se-nos que, aquando da publicação da Lei n.º 15/2022, o Decreto-Lei n.º 424/83, se encontrava em vigor.

Ademais, considerando que o regime, consagrado no Decreto-Lei n.º 424/83, tem raízes em regime implantado em 1944 (Lei n.º 2002), pelo que a sua revogação deveria ser clara, de modo a significar, perentoriamente, uma rutura com passado.
 
3 – Considerando todo o exposto, vejamos se se impõe que o regime das rendas contemplado no Decreto-Lei n.º 424/83 seja interpretado numa perspetiva atualista.
 
3.1 - Dimana do preceituado no artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil que, na interpretação da lei, deve atender-se à unidade do sistema jurídico, às circunstâncias em que a lei é elaborada (occasio legis) e às condições específicas do tempo em que é aplicada, tendo este último elemento «decididamente uma conotação actualista»[261].
A conotação atualista assume, na verdade, particular relevância, por ser deveras profícua para a fixação da ratio legis, porquanto «o que se pretende é transpor para a realidade presente o juízo de valor que presidiu à valoração da norma, adaptando o seu sentido à evolução – social e jurídica – entretanto operada, por forma a extrair da norma um novo sentido e ajustá-la assim à evolução histórica ocorrida»[262], já que «uma lei só tem sentido quando integrada num ordenamento vivo e, muito em especial, enquanto harmonicamente integrada na “unidade do sistema jurídico”»[263].
Na verdade, o problema da interpretação atualista da lei surge em situações como «quando se verifica uma mudança do uso de linguagem, susceptível de atribuir novos sentidos à expressão verbal empregue pela norma; quando se verifica uma mudança das circunstâncias de facto para as quais a norma foi criada; finalmente, quando se opera um alteração dos critérios valorativos resultantes da alteração global do desenvolvimento axiológico-jurídico»[264].
Consubstancia, pois, por «”equiparação” de casos imprevistos aos casos consignados na lei», «um alargamento do âmbito de aplicação das normas legais», tendo, assim, um efeito semelhante ao da interpretação extensiva, estando-se, por isso, perante, como é considerado, um «atualismo corretivo» [265].

Deve sempre atender-se à função e finalidade ou escopo da norma e, assim, interpreta-la no sentido de maior conformidade com a sua função ou escopo, não podendo, pois, ser considerados aqueles sentidos que não tenham na letra da lei alguma correspondência, ainda que mínima ou remota. O limite constitui, assim, o até onde chegue a tolerância da literalidade do texto, ainda que remota, e a necessária elasticidade do sistema[266].

 
3.2 – A intenção do legislador com o Decreto-Lei n.º 424/83 foi, como decorre do próprio diploma, a de abranger os centros produtores hidroelétricos e termoelétricos para consumo público, que haviam sido nacionalizados de que a «EDP,EP» era, na altura, fruto do sistema legal vigente, a única titular.
Aliás, afigura-se-nos que, tendo em conta a abertura do setor à iniciativa privada e à livre concorrência, se se considerar que o regime das rendas do Decreto-Lei n.º 424/83 abrange, após a reprivatização, a abertura à livre iniciativa e à concorrência, apenas a totalidade dos centros produtores hidroelétricos atribuídos à EDP (ou a quem lhe sucedeu), em regime de concorrência ou fora do regime de concorrência, o indicado diploma sobre rendas padecerá, nesta interpretação, de inconstitucionalidade superveniente, por afronta aos princípios da igualdade, da livre iniciativa e da concorrência consagrados nos artigos 13.º, 61.º e 81.º, alínea f), da Constituição, na medida em que as outras empresas que exerçam, necessariamente em concorrência de mercado, a mesma atividade não estão sujeitas a tal prestação pecuniária ope legis[267].
Face às vicissitudes ocorridas no setor da eletricidade, o regime de rendas tem de ser interpretado numa perspetiva atualista.
Nessa interpretação há que considerar, mormente a abrangência subjetiva da renda aos municípios aquando da instituição do encargo – todos os centros produtores hídricos (e termoelétricos) de energia elétrica para consumo público; os efeitos (nocivos) que inerem à existência e funcionamento dos centros hídricos de produção de eletricidade não dependem do regime de atribuição aos seus titulares; e o exercício da atividade de produção de energia elétrica funcionar em regime de livre concorrência e de mercado.  
Acresce que, não obstante as diferenças do regime do Decreto-Lei n.º 424/83, relativamente ao regime «das rendas aos municípios pelas eólicas», atentas as suas especificidades, a liberalização do setor da energia elétrica não conflitua com a existência do pagamento de rendas pelos centros electroprodutores hídricos aos municípios ao abrigo do Decreto-Lei n.º 424/83, indicando-nos que as mesmas fazem sentido e também se justificam num mercado liberalizado como o ilustra a expressa previsão do pagamento das rendas aos municípios pelas centrais electroprodutoras eólicas, no aditamento ao Anexo II do Decreto-Lei n.º 189/88, introduzido pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 339-C/2001, de 29 de dezembro, e sequentemente mantido.
Nesta medida, afigura-se-nos, na presente situação, ser indispensável alargar o âmbito de aplicação da norma, vertida no texto, com fundamento também na sua imanente teleologia, a casos que por esse texto não estariam formalmente abrangidos, mas que a ratio legis contempla e a lógica sustenta, mostrando-se, assim, abrangida pela «capacidade de expansão lógica e teleológica da lei»[268].
Deste modo, numa perspetiva atualista, o regime de rendas contemplado no Decreto-Lei n.º 424/83 não se deve cingir aos centros electroprodutores atribuídos à EDP fora da livre concorrência (em situação de monopólio), antes deve abranger os titulares dos centros produtores hidroelétricos atribuídos em regime de concorrência e, assim, os demais centros produtores hidroelétricos atribuídos à EDP e os atribuídos a outras entidades, dado comungarem da ratio legis que àquele diploma inere.
Entendimento este que não acarreta qualquer afronta aos princípios constitucionais da concorrência livre [artigos 81.º. alínea f), e 99.º, alínea a)], da iniciativa privada (artigo 61.º, n.º 1), ou da igualdade (artigo 13.º) antes, pelo contrário, necessariamente os considera como decorre do aduzido, constituindo igualmente vias justificadoras da interpretação atualista visando assegurar que realidades idênticas ou similares sejam tratadas de maneira igual evitando-se «antinomias ou incongruências»[269] no sistema.
 
4 – Estando o Decreto-Lei n.º 424/83 em vigor aquando da publicação do Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro, cabe, pois, apurar se este último diploma, que entrou em vigor, nos termos do artigo 307.º, no dia seguinte, procedeu à sua revogação, atento o regime de cedências e compensações implantado pelo seu artigo 49.º.
A aplicação dos regimes de cedências e compensações que o artigo 49.º consagra pressupõe que o centro electroprodutor de eletricidade de fonte renovável ou de instalação de armazenamento (i) tenha potência de ligação atribuída superior a 50 MVA (artigo 49.º, n.º1) ou tenha potência de ligação atribuída igual ou inferior a 50 MVA e superior a 1 MVA (b) (artigo 49.º, n.º 2) e que (ii) tenha obtido o título de reserva de capacidade de injeção na RESP após 15 de janeiro de 2022 (artigos 276.º, n.º 9, e 307.º). Ou seja, exige a lei como condições para a aplicação do antedito novo regime que a potência de ligação atribuída seja superior a 1MVA e que a obtenção do título de reserva de capacidade de injeção na RESP ocorra após a sua entrada em vigor.

Ora, o legislador, no artigo 276.º, n.º 9, do Decreto-Lei n.º 15/2022, inserido no capítulo referente às disposições finais e transitórias, veio de modo cauteloso afastar clara e perentoriamente eventuais dúvidas sobre a aplicabilidade temporal do artigo 49.º, ao estabelecer que o disposto no artigo 49.º é aplicável aos titulares de centro electroprodutor de eletricidade de fonte renovável ou de instalação de armazenamento, que tenham obtido título de reserva de capacidade de injeção na RESP após a entrada em vigor do regime contemplado no Decreto-Lei n.º 15/2022 (ou seja, após o dia 15 de janeiro de 2022, atento o estabelecido no artigo 307.º do mesmo diploma).

Salvaguardam-se, assim, claramente, regimes legais anteriores de compensações aos municípios pelos titulares de centros electroprodutores, como o contemplado no Decreto-Lei n.º 424/83.
Aliás, não obstante os diferentes modelos de exploração da energia elétrica por que tem vindo a optar, em resultado de novas conceções adotadas, teve o cuidado de não perturbar as situações constituídas, tendo, em sede de direito transitório, salvaguardado a continuidade dos títulos e as formas de exploração em curso[270] (o que aconteceu nos artigos 27.º do Decreto-Lei n.º189/88, de 27 de maio, 28.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 99/91, de 2 de março, e 66.º do Decreto-Lei n.º 182/95, de 27 de julho. 
Destarte, e no que se refere às rendas municipais devidas pelos titulares dos centros electroprodutores hídricos ao abrigo do Decreto-Lei n.º 424/83, afigura-se-nos ser de considerar que a obrigação de pagamento da renda municipal anual se mantém em vigor para esses centros, caso aquela obrigação legal se mantenha em 15 de janeiro de 2022 e enquanto se mantiver.
Mas já se aplica o novo regime de cedências e compensações consagrado no referido artigo 49.º se a obtenção da reserva de capacidade de injeção na RESP pelos centros electroprodutores ocorrer após o dia 15 de janeiro de 2022[271].
Deste modo, o regime de rendas municipais previsto no Decreto-Lei n.º 424/83, não foi alterado nem revogado pela (mera) entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 15/2022, a 15 de janeiro de 2022.

 

VI
CONCLUSÕES
 
Atento o aduzido, este Conselho Consultivo formula as seguintes conclusões:
 
1.ª - O regime do exercício das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica instituído pela Lei n.º 2002, de 26 de dezembro de 1946, desenvolvido e atualizado pelo Decreto-Lei n.º 43.335, de 19 de novembro de 1960, pressupunha um financiamento privado do setor elétrico e assentava na outorga de concessões do Estado a cidadãos portugueses ou a empresas nacionais com maioria de capital português, em que o Estado podia participar (cf. mormente Bases n.ºs IV e XVII da Lei n.º 2002 e artigos 19.º e 20.º do Decreto-Lei n.º 43.335), prevendo ainda regras próprias e especiais para o pequeno produtor (Bases XXX e XXXII da Lei n.º 2002 e artigos 140.º a 145.º do Decreto-Lei n.º 43.335);
 
2.ª – Determinou-se em tais diplomas legais o pagamento de uma renda ao Estado pelas concessões e de um adicional às Câmaras Municipais dos concelhos onde estivessem situadas as obras dos aproveitamentos que incindiria sobre as concessões de produção e de grande distribuição [Base XV, alínea d), itens 1.º, a 3.º, da Lei n.º 2002 e artigos 68.º e 70.º, corpo, do Decreto-Lei n.º 43.335], prevendo este último diploma ainda que, relativamente aos aproveitamentos hidroelétricos que entrassem em exploração, depois de 19 de novembro de 1960, os respetivos concessionários pagariam às câmaras municipais interessadas, na proporção fixada no corpo do artigo, durante o período gratuito (da renda ao Estado), e a título de indemnização pela quebra de rendimentos, uma importância anual igual a 1,5 por mil do valor da energia produzida, calculado nos termos do artigo 68.º e seus parágrafos (artigo 70.º, § 2.º);
 
3.ª - A nacionalização das sociedades concessionárias da exploração das diversas atividades inseridas no sector de energia elétrica, pelo Decreto-Lei n.º 205-G/75, de 16 de abril, pondo termo à anterior estrutura organizativa do setor elétrico nacional, determinou a transferência para o Estado Português dos respetivos patrimónios e do complexo de direitos e obrigações de que eram titulares (artigo 3.º), tendo-lhes, assim, sucedido empresas nacionalizadas, dotadas de personalidade jurídica própria que se mantiveram até à criação da empresa pública «Electricidade de Portugal – E.P.» (EDP), à qual foi atribuída, em exclusivo e por tempo indeterminado, a exploração do serviço público de produção, distribuição e transporte de energia elétrica (artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 502/76, de 30 de junho);
 
4.ª - A «EDP, EP» recebeu os patrimónios e assumiu, nos mesmos termos e com o mesmo conteúdo, as posições jurídicas e contratuais tituladas pelas sociedades nacionalizadas, designadamente as concessões que lhes haviam sido outorgadas, tal como dimana dos artigos 3.º, n.º 2, 5.º e 8.º do Decreto-Lei n.º 502/76;
 
5.ª - Assim, efetivou-se a constituição do monopólio do Estado no sector elétrico, na medida em que se vedou o acesso da iniciativa privada às atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica para consumo público [artigos 85.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, redação originária, e 4.º, alínea a), da Lei n.º 46/77, de 8 de julho];
 
6.ª - A «EDP, EP», por ter, nos termos referidos, total controlo sobre a cadeia do setor elétrico para uso público, desde o processo produtivo aos processos de pós-produção (transporte) e distribuição ao consumidor final, exercia, como empresa verticalmente integrada, toda a referida atividade do setor elétrico para consumo público, e em exclusivo, passando, por isso, em Portugal Continental, o setor elétrico a identificar-se com a «EDP, EP»;
 
7.ª – É, pois, num período caracterizado pela interdição, em todo o território continental, ao sector privado das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica para uso público e pela exploração, em exclusivo e por tempo indeterminado, desses serviços públicos, através da empresa pública «EDP, EP», sua única titular, e em que continuavam parcialmente vigentes a Lei n.º 2002 e o Decreto-Lei n.º 43.335, que surgiu o Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro;
 
8.ª – Este diploma legal, dando continuidade ao determinado na Base XV, alínea d), item 3.º, da Lei n.º 2002 e artigo 70.º, corpo, do Decreto-Lei n.º 43.335, veio estabelecer, no artigo 1.º, o pagamento pela «EDP, EP», de uma renda anual aos municípios, cuja circunscrição fosse afetada por zonas de influência de centros produtores hidroelétricos e termoelétricos, em exploração e em construção, calculada nos termos dos artigos 2.º a 4.º, declarando a caducidade das «rendas a pagar pela EDP ao Estado e os respetivos adicionais destinados às câmaras municipais, previstos na alínea d) da base XV da Lei 2002, de 26 de dezembro de 1944, e nos artigos 68.º e 70.º do Decreto-Lei n.º 43.335, de 19 de novembro de 1960»;
 
9.ª - Aliás, quando foi publicado o Decreto-Lei n.º 424/83, já a Constituição da República Portuguesa consagrava incumbir prioritariamente ao Estado designadamente adotar uma política nacional de energia, com preservação dos recursos naturais e do equilíbrio ecológico (artigo 81.º), e o ambiente merecia dignidade constitucional considerando terem todos direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado, sendo-lhes, por isso, conferido o direito de promover, nos termos da lei, a prevenção ou a cessação dos fatores de degradação do ambiente, bem como, em caso de lesão direta, o direito à correspondente indemnização (artigo 66.º, n.ºs 1 e 3, na redação conferida pela Lei Constitucional n.º 1/82, de 3 de setembro);
 
10.ª - Decorre do preceituado no Decreto-Lei n.º 424/83, e do teor do seu preâmbulo, que o valor da renda prevista no artigo 1.º, e calculado nos termos dos artigos 2.º e 3.º, não era influenciado pelos concretos efeitos nem pelas medidas a adotar (ou adotadas) em cada centro produtivo de energia hídrico (ou termoelétrico) quanto aos meios utilizáveis (ou utilizados) para atenuar o impacte sobre o ambiente, não dependendo, pois do êxito ou inêxito das concretas medidas de atenuação aplicadas;

 
11.ª - Efetivamente, o encargo, ope legis, de natureza compensatória (e não tributária), consignado no artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 424/83, depende da existência, localização e funcionamento de um centro electroprodutor na área territorial de um município ou de vários, por necessariamente criarem impacte negativo para as populações dos municípios da instalação, e também para os próprios municípios, afetando-os, a quem urge compensar, reforçando, assim, quanto a estes últimos, a sua capacidade financeira (cf. preâmbulo e artigos 1.º a 3.º), não ficando, pois, afetado pela existência de outro tipo de créditos a favor dos municípios, designadamente os ancorados em políticas ambientais ou fiscais;

 
12.ª - Na senda de privatização da titularidade ou do direito de exploração de meios de produção, que a Lei-Quadro das Privatizações (Lei n.º 11/90, de 5 de abril) previu, foi publicado o Decreto-Lei n.º 7/91, de 8 de janeiro, que alterou a natureza jurídica da empresa pública «Electricidade de Portugal (EDP), E. P.», convertendo-a de pessoa coletiva de direito público em pessoa coletiva de direito privado, com o estatuto de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, que lhe sucedeu automática e globalmente, continuando a personalidade jurídica daquela, conservando a universalidade dos direitos e obrigações, que constituíam o seu património no momento da transformação (artigo 2.º, n.º 1);
 
13.ª - E foi igualmente publicado o Decreto-Lei n.º 99/91, de 2 de março, que, consagrando já o princípio da «liberdade de acesso às actividades de produção, transporte e distribuição de energia eléctrica, a exercer mediante licença» (cf. artigo 7.º), veio estabelecer o regime jurídico do exercício das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica para consumo público, instituindo o Sistema Elétrico de Abastecimento Público (SEP), constituído pela Rede Nacional de Transporte de energia elétrica (RNT), explorada em regime de concessão de serviço público, a montante, pelos produtores e, a jusante, pelos distribuidores, vinculados ao sistema através de um regime contratual (artigos 1.º, 4.º e 5.º);
 
14.ª – A «EDP, SA» continuou a exploração dos empreendimentos elétricos de acordo com o regime que havia sido definido para as sociedades nacionalizadas, o mesmo acontecendo também com as empresas para as quais viriam a ser transmitidas, «sem alteração das garantias», todas as posições ou relações jurídicas tituladas por aquela, em resultado da reformulação do seu universo empresarial, nos termos determinados pelo Decreto-Lei n.º 131/94, de 19 de maio (cf. artigo 5.º);
 
16.ª - A reabertura do serviço de produção e distribuição de energia elétrica para consumo público à iniciativa privada, encetada pelos Decretos-Leis n.ºs 449/88, de 10 de dezembro, e 99/91, de 2 de março, foi reforçada pelo conjunto de diplomas constituído pelos Decretos-Leis n.ºs 182/95 a 188/95, todos, de 27 de junho, que procedeu a divisão do Sistema Elétrico Nacional (SEN) em Sistema Elétrico de Serviço Público e Sistema Elétrico Independente (artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 182/95) e estabeleceu que as atividades de produção vinculada de energia elétrica e de produção não vinculada estavam sujeitas a licença (artigos 13.º, n.º 1, e 46.º do Decreto-Lei n.º 182/95);
 
17.ª- Entrementes, no espaço da atividade de produção de energia elétrica desenvolvida por pessoas singulares ou coletivas, de direito público ou privado, independentemente da forma jurídica, que assumiam, em regime de livre acesso, como dimana do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, o Decreto-Lei n.º 339-C/2001, de 29 de dezembro, que procedeu a alteração designadamente do Anexo II à diploma legal, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 168/99, de 18 de maio, aditou a esse anexo um novo item (n.º 33);
 
18.ª - Nesse item, estabelece-se a obrigação de pagamento pelas empresas detentoras de licenças de exploração de parques eólicos de uma renda municipal correspondente a 2,5% do pagamento mensal feito pela entidade recetora da eletricidade produzida;
 
19.ª - Todavia, ainda de acordo com o referido item n.º 33, alínea b), nos casos em que as empresas detentoras das licenças de exploração tivessem celebrado quaisquer acordos ou contratos com as autarquias locais em cuja área estivessem implantadas, no que concerne a compensação pela respetiva exploração, a imposição ope legis dessa renda (no valor de 2,5% sobre o pagamento mensal feito pela entidade recetora da energia elétrica produzida, em cada instalação eólica), podia ceder, como legalmente previsto, ao acordado ou contratualizado;
 
20.ª - A reforma instituída em 1995 vigorou até ao quadro legal erigido pelo Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, que, concretizando o plano normativo da orientação estratégica da Resolução do Conselho de Ministros n.º 169/2005, de 24 de outubro, e procedendo a transposição para a ordem jurídica interna dos princípios da Diretiva n.º 2003/54/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, constituiu as bases gerais da organização e funcionamento do Sistema Elétrico Nacional, procedendo a uma alteração de paradigma que já vinha emergindo, e estabeleceu a regulamentação atinente ao exercício das atividades de produção, transporte, distribuição e comercialização de eletricidade e à organização dos mercados de eletricidade (artigo 1.º), consagrando, em qualquer das suas versões, atentas as alterações de que foi objeto, a livre concorrência na produção de energia elétrica e o livre acesso à atividade de produção de energia elétrica, sujeito à obtenção de licença (artigos 4.º, n.ºs 3 e 4, e 15.º) e, destarte, em rutura com o regime de monopólio da EDP vigente aquando da aprovação, publicação e entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 424/83;
 
21.ª - Considerou igualmente que a produção de energia elétrica é em regime ordinário ou em regime especial (cf. artigo 16.º), sendo a produção em regime ordinário constituída pela atividade de produção de energia que não se encontrava abrangida por um regime jurídico especial (artigos 16.º a 18.º), limitando-se a remeter para legislação complementar o regime jurídico da produção elétrica em regime especial (artigo 18.º, n.º 2);
 
22.ª- Daí que, integravam o conceito de produção em regime ordinário as grandes hídricas e as centrais termoelétricas que produzissem energia elétrica através da queima de fontes de energia primária de origem fóssil (como o carvão, gás natural e petróleo); 
 
23.ª – Todavia, o Decreto-Lei n.º 29/2006 não contém qualquer manifestação expressa sobre a matéria versada no Decreto-Lei n.º 424/83, pois no regime trazido à luz, quanto ao exercício das atividades de produção de energia elétrica, nada se regrou ou dispôs sobre as rendas aos municípios pelos centros electroprodutores de energia elétrica (em regime ordinário ou em regime especial); e o mesmo veio a acontecer com o Decreto-Lei n.º 172/2006, de 23 de agosto, que o desenvolveu;
 
 24.ª - Com a reforma consubstanciada pelos Decretos-Leis n.º 215-A/2012 e 215-B/2012, de 8 de outubro de 2012, que procederam respetivamente à alteração dos Decretos-Leis n.ºs 29/2006 e 172/2006, de 23 de agosto, assegurando a transposição da Diretiva n.º 2009/72/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho, consolidou-se que a produção de energia elétrica se exercia em regime livre, estando apenas sujeita à obtenção prévia de licença (artigo 15.º), continuando a distinguir, no que concerne à produção, duas classificações: produção em regime ordinário e a produção em regime especial (artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 29/2006);
 
25.ª - O legislador no Decreto-Lei n.º 49/2019, de 15 de abril, que determinou a cessação de vigência de Decretos-Leis publicados entre os anos de 1981 e 1985, em razão de caducidade, revogação tácita anterior ou revogação expressa efetuada pelo próprio Decreto-Lei n.º 49/2019, não elencou, entre esses diplomas, o Decreto-Lei n.º 424/83, não considerando, pois, a extinção deste por caducidade ou revogação (tácita ou expressa), inexistindo diploma legal que contenha normativo em que se tenha procedido a alteração do Decreto-Lei n.º 424/83 ou que tenham procedido a sua revogação expressa (total ou parcial);
 
26.ª - Não obstante a intensa produção legislativa no âmbito do setor elétrico, concretizada, designadamente nos Decretos-Leis n.ºs 99/91 e 100/91, 182/95 a 188/95, 29/2006 e 172/2006, nas suas sucessivas versões, e nos diplomas legais que os alteraram, nada se refere ou dispõe sobre as rendas aos municípios pela construção e funcionamento dos centros produtores (hidroelétricos e termoelétricos) previstas no Decreto-Lei n.º 424/83;
 
27.ª - No entanto, tendo sido instituído, com a Lei n.º 11/87, de 7 de abril, o regime da avaliação de impacte ambiental como instrumento preventivo essencial no domínio do ambiente, no âmbito do qual, se veio a determinar, através da decisão de impacte ambiental, medidas de natureza mitigatória e compensatória [cf. designadamente artigos 31.º, alínea c), da Lei n.º 11/87, 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 186/90, de 6 de junho, na versão originária, e artigo 3.º, n.º 3, alínea b), na versão introduzida pelo Decreto-Lei n.º 278/97, de 8 de outubro, artigo 2.º, n.ºs 1, alínea c), e 2, 5.º item, do Decreto Regulamentar n.º 38/90, de 27 de novembro, 2.º, alíneas e), i), l) e n), 4.º, alínea d), 17.º, n.º s 1 e 2, 27.º, alínea b), e 29.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 69/2000 e 18.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 151-B/2013, de 3 de outubro];
 
28.ª - Instrumento que veio abranger designadamente alguns projetos de produção industrial de energia elétrica como os hídricos e os eólicos [cf. mormente artigo 7.º, n.º 1, e Anexo III, item n.º 3, alíneas a) e j), do Decreto-Lei n.º 186/90; anexo ao Decreto Regulamentar n.º 38/90, na redação dada pelo Decreto Regulamentar n.º 42/97, de 10 de outubro; Anexos I, itens n.ºs 15 e 19, II, itens n.ºs 3, alíneas a), h) e i), do Decreto-Lei n.º 69/2000; e artigo 1.º, n.ºs 3 a 5, do Decreto-Lei n.º 151-B/2013, com referência, por força das alíneas a) e b) do antedito n.º 3, aos Anexos I a III];
 
29.ª- Também no que concerne à análise de incidências ambientais se veio a prever a aplicação de medidas designadamente compensatórias [cf. artigo 10.º, n.º 6, alínea e), do Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de abril, republicado pelo Decreto-Lei n.º 49/2005, ex vi, sucessivamente, artigos 33.º-R, n.º 3, e 10.º-A, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 172/2006 (respetivamente, nas redações conferidas pelos Decretos-Leis n.º 215-B/2012 e 76/2019, de 3 de junho) e, atualmente, 44.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro];
 
30.ª - A declaração de impacte ambiental constitui um ato administrativo com eficácia externa, inserido num procedimento administrativo, que define a posição da Administração e dos particulares interessados quanto à matéria de inserção ambiental do projeto, contenciosamente impugnável [ver artigos 20.º e 35.º-A do Decreto-Lei n.º 69/2000 (este último aditado pelo Decreto-Lei n.º 197/2005 e 2.º, alínea g), 3.º, n.º 8, 22.º e 37.º do Decreto-Lei n.º 151-B/2013];
 
31.ª - E no caso de DIA favorável condicionada, a fixação das condições a adotar ao longo das várias fases de desenvolvimento do projeto, podem não incluir designadamente medidas de compensação dos impactes ambientais ou, podendo inclui-lo, as medidas compensatórias não serem junto dos municípios (ou das populações locais), ou sendo-o não revestirem para os municípios natureza pecuniária (cf. as normas referenciadas da Lei n.º 11/87 e dos Decretos-Leis  n.º  69/2000 e 151-B/2013);
 
32.ª - O facto de um dos índices necessários para as fórmulas, constantes dos artigos 2.° e 3.° do Decreto-Lei n.º 424/83, ter deixado de ser publicado pela ERSE, não é suficiente para considerar verificada a caducidade deste diploma legal ou de qualquer seu preceito, por apenas poder afligir o meio de quantificação do valor da renda e não o direito consignado no artigo 1.º do mesmo Decreto-Lei;

 
33.ª – Acresce, considerando o aduzido, que a liberalização do setor da energia elétrica não aflige ou afasta a existência do pagamento de rendas pelos centros electroprodutores hídricos aos municípios, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 424/83, as quais fazem sentido num mercado liberalizado como o ilustra a expressa previsão do pagamento das rendas aos municípios pelas centrais electroprodutoras eólicas, no aditamento ao Anexo II do Decreto-Lei n.º 189/88, introduzido pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 339-C/2001, de 29 de dezembro, e sequentemente mantido;
 

34. ª - Com tais sucessivos regimes gerais do setor energético, que foram constituindo as normas definidoras do sistema global do setor elétrico nacional, que constituem «lei geral», relativamente ao Decreto-Lei n.º 424/83, não foram publicadas quaisquer normas legais que viessem regrar sobre o conjunto da matéria versada neste diploma de 1983 e, assim, afastar a sua aplicação, inexistindo pois, uma conduta concludente do legislador da lei nova em revogar a lei anterior sobre rendas, tanto mais que não se verifica, nesta matéria, uma nova e contrária manifestação de vontade do legislador, incompatível com a subsistência da lei antiga, o que afasta a verificação dos requisitos consignados no artigo 7.º, n.ºs 2 e 3, do Código Civil;  
 

35.ª - Como a intenção do legislador com o Decreto-Lei n.º 424/83 foi, como decorre do próprio diploma, a de abranger a totalidade dos centros produtores hidroelétricos e termoelétricos para consumo público, que haviam sido nacionalizados e de que a «EDP,EP» era, na altura, fruto do sistema legal vigente, a única titular, coloca-se, face às alterações posteriores, o problema de interpretação atualista do Decreto-Lei n.º 424/83, pois, nos termos do artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil a interpretação da lei não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada;

 

36.ª - Na verdade, o problema de interpretação atualista da lei surge em situações como quando se verifica uma mudança das circunstâncias de facto para as quais a norma foi criada, quando se verifica uma mudança do uso de linguagem, suscetível de atribuir novos sentidos à expressão verbal empregue pela norma ou, finalmente, quando se opera um alteração dos critérios valorativos resultantes da alteração global do desenvolvimento axiológico-jurídico;
 
37.ª - Ademais, deve atender-se à função e finalidade ou escopo da norma e, assim, interpreta-la no sentido de maior conformidade com a sua função ou escopo, não podendo, pois, ser considerados aqueles sentidos que não tenham na letra da lei alguma correspondência, ainda que mínima ou remota, tendo em consideração a necessária elasticidade do sistema (cf. artigo 9.º, n.º 2, do Código Civil);
 
38.ª – Destarte, o regime de rendas, contemplado no Decreto-Lei n.º 424/83, não se deve cingir aos centros electroprodutores atribuídos à EDP fora da livre concorrência (em situação de monopólio), antes deve abranger os titulares dos centros produtores hidroelétricos atribuídos em regime de concorrência e, assim, os demais centros produtores hidroelétricos atribuídos à EDP e os atribuídos a outras entidades, dado comungarem da ratio legis que àquele diploma inere;
 
39.ª - Entendimento este que não acarreta qualquer afronta aos princípios constitucionais da livre concorrência [artigos 81.º, alínea f), e 99.º, alínea a), da Constituição], da iniciativa privada (artigo 61.º, n.º 1), ou da igualdade (artigo 13.º) antes, pelo contrário, necessariamente os considera como decorre do aduzido, constituindo igualmente vias justificadoras da interpretação atualista, a fim de assegurar que realidades idênticas ou similares sejam tratadas de maneira igual evitando-se «antinomias ou incongruências» no sistema;

 

40.ª - Não foi, assim, afastada a vigência do Decreto-Lei n.º 424/83 até à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro;
 
41ª. – Este último diploma, que estabelece a organização e o funcionamento do Sistema Elétrico Nacional e que entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação (artigos 1.º e 307.º), determina, no artigo 18.º, n.º 1, que o início do procedimento para obtenção de licença de produção de eletricidade depende da prévia atribuição de reserva de capacidade de injeção na Rede Elétrica de Serviço Público;
 
42.ª - Os regimes de cedências e compensações aos municípios pelos titulares de centros electroprodutores de eletricidade de fonte renovável ou de instalação de armazenamento, contemplados no artigo 49.º, respeitam aos centros electroprodutores de eletricidade de fonte renovável ou de instalação de armazenamento, que tenham potência de ligação atribuída superior a 1 MVA (cf. n.ºs 1 e 2);
 
43.ª - No entanto, do disposto no artigo 276.º, n.º 9, inserido no capítulo referente às disposições finais e transitórias, resulta que o artigo 49.º só é aplicável aos titulares de centro electroprodutor de eletricidade de fonte renovável ou de instalação de armazenamento, que tenham obtido título de reserva de capacidade de injeção na RESP, após o dia 15 de janeiro de 2022;
 
44.ª- Salvaguarda-se, deste modo, o regime legal de rendas aos municípios pelos titulares de centros electroprodutores, como o contemplado no Decreto-Lei n.º 424/83; e
 
45.ª – Aplica-se, porém, o novo regime de cedências e compensações consagrado no referido artigo 49.º se a obtenção da reserva de capacidade de injeção na RESP pelos centros electroprodutores ocorrer após o dia 15 de janeiro de 2022, pelo que o regime de rendas municipais previsto no Decreto-Lei n.º 424/83, não foi revogado pela (mera) entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 15/2022, a 15 de janeiro de 2022.
 
[1] Aprovado pela Lei 68/2019, de 27 de agosto, e alterado pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março.

[2] Aliás, encontra-se no sítio «https://www.erse.pt/media/2bgnfske/2017-07-26_rendas-dos-centros-electroprodutores.pdf» (acedido, pela última vez, a 18 de abril de 2024) um parecer da ERSE sobre centros electroprodutores, datado de 20 de julho de 2017, cujo conteúdo é idêntico (parcialmente igual) ao referido anexo I e, em que se conclui:
      «O regime legal de 1983 encontra-se desajustado face aos múltiplos desenvolvimentos sofridos no setor elétrico desde então, pelo que a sua atualização é positiva. Todavia, na atualização ou desenho de novos mecanismos importa ter em consideração mecanismos de compensação que foram criados, em especial para projetos mais recentes, e as consequências no mercado e no preço de eletricidade suportado pelos consumidores». 

[3] Evidencia-se que subjaz ao pedido de parecer caso concreto atinente ao Aproveitamento Hidroelétrico do Baixo Sabor.

[4] Desde já consignamos que, nas transcrições efetuadas ao longo deste parecer, as notas de rodapé constantes dos originais transcritos foram suprimidas.

[5] Aliás, relacionado com o previsto no Decreto-Lei n.º 339-C/2001, expende-se ainda, no mesmo documento da ERSE junto, que, segundo informação disponibilizada pela EDP Serviço Universal, enquanto comprador único da energia produzida em regime especial com remuneração garantida:
     «[E]m 2016 para um volume de energia produzida, por produtores eólicos, de 12,1 TWh, foram efetuados pagamentos na ordem de 1130 milhões de euros, o que corresponde a uma renda paga aos municípios de cerca de 28,3 milhões de euros. Esta renda a pagar aos municípios é uma percentagem da remuneração aplicável a centrais eólicas e como tal é suportada pelos consumidores de energia elétrica. Qualquer alteração no valor ou abrangência desta renda tem impacto na rendibilidade dos produtores com remuneração garantida. Por outro, uma possível alteração no enquadramento jurídico português efetuada que reduzisse o valor a pagar pelos produtores não teria impacto para os consumidores de energia elétrica, uma vez que seria acomodada dentro da remuneração garantida em vigor.»
 
 

 

[6] Convém consignar que no parecer apresentado pela Associação de Municípios do Baixo Sabor, para obter opinião jurídica sobre se o Decreto-Lei n° 424/83, de 6 de dezembro, se mantinha em vigor, apesar da evolução legislativa e regulamentar entrementes verificada no setor elétrico, não se alude ao regime resultante do Decreto-Lei n.º 15/2022.     
 

[7] Lei que foi alterada pelo Decreto-Lei n.º 39.480, de 24 de dezembro de 1953.

[8] Não obstante a estreia da energia elétrica em Portugal ter ocorrido em 1878, na parada da cidadela de Cascais, aquando dos festejos do aniversário, em 1878, do príncipe real D. Carlos, a produção elétrica ter começado por assentar em pequenas centrais e açudes para consumo local e as primeiras redes de distribuição terem sido instaladas nos finais do século XIX, existiam no início da década de 40 do século passado cerca de 400 distribuidores (cf. FILIPE MATIAS SANTOS, «Evolução histórica e organização do setor elétrico», em Estudos de Direito da Energia coordenação de FRANCISCO PAES MARQUES e JOÃO MARQUES MENDES, Almedina, Coimbra, 2023, páginas 37 a 54, in páginas 37 e 38).

[9] Sobre a evolução legislativa do setor da energia elétrica e referenciação do respetivo quadro legislativo mais relevante ver designadamente os pareceres do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n.ºs 4/2016, de 29 de junho de 2017, publicado in Diário da República, II série, n.º 44, de 2 de março de 2018, 39/2012, de 21 de março de 2012, publicado in Diário da República, II série, n.º 84, de 7 de maio de 2013, 35/2009, de 15 de abril de 2010 (a aguardar edição), 53/2008, de 12 de fevereiro de 2009, publicado no Diário da República, II série, n.º 124, de 30 de junho de 2009, 126/2005, de 11 de maio de 2006, publicado no Diário da República, II série, n.º 51, de 13 de março de 2007, e 66/2005, de 30 de junho de 2005, publicado no Diário da República, II série, n.º 167, de 31 de agosto de 2005.
Estes pareceres, como os demais pareceres do Conselho Consultivo referidos no presente parecer, encontram-se acessíveis, no sítio «https://www.ministeriopublico.pt/pareceres-pgr» (com exceção dos pareceres «inéditos»/«a aguardar edição»).

[10] Foi o Decreto n.º 12.559, de 20 de outubro de 1926 – Lei dos Aproveitamentos Hidráulicos –, que aprovou as bases aplicáveis à produção, transporte e distribuição da energia elétrica, que fixou, pela primeira vez, na legislação portuguesa, a definição de Rede Elétrica Nacional, considerando-a como o conjunto de linhas de transporte de energia no País que fosse objeto de comércio em espécie (Base I), estabelecendo igualmente que as linhas que a integravam eram, para efeitos de construção e exploração, de utilidade pública e de interesse nacional, e que seriam objeto de concessão (Base II), para além de criar um Fundo Especial de Eletrificação com o objetivo de apoiar o seu desenvolvimento (Base VI). Fundo que, segundo esta Base, seria constituído designadamente pelas rendas que as empresas exploradoras de concessões de aproveitamentos hidroelétricos pagavam ao Estado (item 2.º, 1.ª parte), pelos impostos pagos ao Estado pelas empresas que exploravam oficinas de produção de energia e redes de distribuição (item 4.º) e «[p]elo produto de um imposto adicional a lançar sobre os combustíveis importados, com exclusão dos destinados à navegação» (item 5.º).

[11] Enquanto as centrais termoelétricas desempenhariam funções de reserva e apoio (Base II).
Não podemos ignorar que entre 1927 e 1944 havia um claro predomínio da produção de energia elétrica de origem termoelétrica em detrimento da de origem hidroelétrica, pois a energia de origem termoelétrica, no total da energia produzida em Portugal, era de valores relativos próximos dos dois terços, não obstante a subida da produção de origem hídrica (cf. JOÃO JOSÉ MONTEIRO FIGUEIRA, O Estado na Electrificação Portuguesa: Da Lei de Electrificação do País à EDP (1945-1976), Universidade de Coimbra, Coimbra, 2012, páginas 29 e 33, acessível in:
«https://estudogeral.uc.pt/bitstream/10316/23208/1/Tese%20Final_Jo%C3%A3o%20Figueira.pdf», (acedido pela última vez a 29 de abril de 2024).
Na verdade, a Lei n.º 2002 «constitui uma inversão de (quase) tudo aquilo que o sector eléctrico tinha sido até então, ou melhor, é uma resposta ao que este sector se tinha tornado e que não servia quase nenhum dos interesses do País: centros produtores de pequena dimensão, maioritariamente térmicos, de uso individual na maior parte dos casos, com recurso a combustíveis – leia-se “carvão” – estrangeiros, de baixa produtividade, produzindo uma energia cara, sistemas não interligados entre si, incapazes de responder a um aumento do consumo, com reduzidos índices de utilização, e sem escala técnica ou económica; a Lei 2002 vem “opor-se” a tudo isso» (cf. JOÃO JOSÉ MONTEIRO FIGUEIRA, obra citada, página 114).

[12] A Lei n.º 2075, de 21 de maio de 1955, viria a promulgar as bases de execução de obras de pequena distribuição de energia elétrica, dando, nas palavras do legislador no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 43.335, de 19 de novembro de 1960, um «notável impulso ao auxílio financeiro à pequena distribuição».

[13] Isenção de contribuição industrial para todas as concessões do Estado, de produção, de transporte e de grande distribuição, dando, porém, abertura a uma exceção em desfavor das centrais térmicas que não utilizassem exclusivamente combustíveis nacionais.

[14] Aliás, já com o Decreto n.º 16.767, de 23 de abril de 1929, que visou regular a concessão ou aproveitamento de águas públicas, e em que se pretendeu, de acordo com o seu exórdio, que o Estado exercesse uma ação coordenadora e de continuidade nas diferentes concessões que tinha outorgado, atendendo aos benefícios que das realizações desses empreendimentos deviam resultar para a economia geral da Nação, dispunha-se no artigo 6.º que:
      «As concessões de aproveitamento hidroeléctrico serão gratuitas quando outorgadas a câmaras municipais nos termos da legislação em vigor. Quando outorgadas a outras entidades, as concessões serão gratuitas nos primeiros dez anos, a contar da data fixada para o começo da exploração ou do princípio desta, se se antecipar àquela. Pelo restante período da concessão pagará o concessionário anualmente uma importância que se determinará em função da totalidade da energia emitida pela central, conforme as indicações dos seus contadores totalizadores, devidamente aferidos e selados.
      § - A taxa por unidade de energia será fixada no decreto de concessão, podendo ser variável por período sucessivos de 10 anos.
      § 2 – Além do imposto mencionado não pode recair sobre a concessão nenhuma imposição a título de contribuição industrial (…).»

[15] Previa-se, ainda, a disciplina, pela lei então em vigor, das condições de caducidade e resgate [alínea e)].

[16] Igualmente contemplou a isenção de contribuição industrial para todas as concessões do Estado, de produção, de transporte e de grande distribuição, bem como a exceção em desfavor das centrais térmicas que não utilizassem exclusivamente combustíveis nacionais no artigo 67.º e § único, consolidando o regime que vinha da Lei n.º 2002. Regras que também foram corporizadas no artigo 14.º do Código Industrial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 45.103, de 1 de julho de 1963 (artigo 14.º, item 16.º e § único, respetivamente). O Decreto-Lei n.º 46.917, de 23 de março, no artigo 6.º procedeu a alteração do § único do referido artigo 67.º considerando que as centrais incluídas na rede elétrica primária não estavam incluídas na referida exceção.

[17] E os parágrafos 2.º (em relação às concessões de produção cujos cadernos de encargos estabelecessem preços diferentes para várias modalidades de energia ou que fornecessem energia reservada nos termos do artigo 94.º a preços especiais) e 4.º (relativamente às concessões de produção respeitantes a centrais da rede primária) determinava diferente modo de cálculo diferenciado no que concerne à renda a pagar ao Estado. Acresce que no parágrafo 3.º estabelecia-se que sobre a energia fornecida a preços especiais e destinada aos usos agrícolas, ferroviários, eletrometalúrgicos ou eletroquímicos (cf. § 1.º do artigo 94.º), bem como sobre a energia excedente (cf. § 1.º do artigo 97.º), apenas incidiria a renda correspondente à produção.

[18] Cf. FILIPE MATIAS SANTOS, Temas de Energia – Reflexões de Direito de Energia, Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, 2021, Lisboa, página 88, acessível no endereço:
«https://www.erse.pt/media/fdkdsj2o/temas-de-energia-reflex%C3%B5es-de-direito-de-energia.pdf », acedido, pela última vez, a 24 de abril de 2024.

[19] Cf. parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n.º 126/2005.

[20] «A integração vertical consiste na execução de várias funções da cadeia de valor por parte de uma só empresa. (…). Esta integração pode acontecer de montante para jusante nas diferentes operações» - ANDREIA GONÇALVES MARICATO, A estratégia de integração vertical como meio de obtenção de vantagens competitivas – Estudo de caso: Orivárzea, SA, 2015, Lisboa, Universidade de Lisboa/ISEG, página 14, acessível em:
«https://www.iseg.ulisboa.pt/aquila/getFile.do?fileId=640306&method=getFile» (acedido a 1 de maio de 2024).

[21] Preceito que veio estabelecer:
      «1 - São declaradas nacionalizadas, com eficácia a contar de 15 de Abril de 1975, as sociedades exploradoras do serviço público de produção, transporte e distribuição de energia eléctrica a seguir indicadas: AES - Aliança Eléctrica do Sul, S. A. R. L.; CEAL - Companhia Eléctrica do Alentejo e Algarve, S. A. R. L.; CEB - Companhia Eléctrica das Beiras, S. A. R. L.; CHENOP - Companhia Hidroeléctrica do Norte de Portugal, S. A. R. L.; CRGE - Companhias Reunidas Gás e Electricidade, S. A. R. L.; CPE - Companhia Portuguesa de Electricidade, S. A. R. L.; ED - Eléctrica Duriense, Lda.; EHEC - Empresa Hidroeléctrica do Coura, S. A. R. L.; EHESE - Empresa Hidroeléctrica da Serra da Estrela, S. A. R. L.; EIE - Empresa Insular de Electricidade (Ponta Delgada), S. A. R. L.; HEAA - Hidroeléctrica do Alto Alentejo, S. A. R. L.; HEP - Hidroeléctrica Portuguesa, S. A. R. L.; SEOL - Sociedade Eléctrica do Oeste, Lda.; e UEP - União Eléctrica Portuguesa, S. A. R. L.»

[22] Acresce que nos termos do n.º 1 do artigo 4.º do mesmo diploma:
     «As empresas nacionalizadas assumirão em relação a todos os actos e contratos celebrados pelas sociedades referidas no artigo 1.º a posição jurídica e contratual que estas detiverem à data do início da eficácia da nacionalização».

[23] Cf. parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n.º 126/2005.

[24] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 11 de julho de 2019, processo n.º 2465/11.6TVLSB.L1-7 (acessível - como demais acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça e das Relações de Guimarães, Porto, Coimbra, Lisboa e Évora, bem como do Supremo Tribunal Administrativo e dos Tribunais Centrais Administrativos, Sul e Norte – in «www.dgsi.pt»).

[25] Constituição da República Portuguesa, que entrou em vigor a 25 de abril de 1976 (artigo 312.º, n.º 3), enquanto o Decreto-Lei n.º 260/76 entrou em vigor, em Portugal Continental, cinco dias após a sua publicação, por força do disposto no artigo 1.º, parágrafo 1.º, do Decreto-Lei n.º 22.470, de 11 de abril de 1933.

[26] Segundo o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 502/76, as transferências previstas nos n.ºs 2 e 3 do artigo 12.º do Decreto-Lei 205-G/75 seriam efetuadas mediante despacho, publicado no Diário da República, dos Ministros da Administração Interna, no caso do n.º 2, e da Indústria e Tecnologia, no caso do n.º 3 (n.º1), constituindo «título comprovativo da transferência para todos os efeitos legais, incluindo os de registo, sendo, em caso de dúvida, título bastante a simples declaração, feita pela EDP e confirmada pela Direcção-Geral do Património, de que os bens se encontravam afetos aos serviços e instalações transferidos» (n.º 3); e publicado o despacho de transferência, a EDP entrará imediatamente na posse e administração dos serviços e instalações transferidos (n.º 2 do mesmo preceito).
E de acordo com o artigo 17.º, a EDP passou a assegurar a exploração dos serviços e instalações afetos a concessões outorgadas por autarquias locais e que atingissem o seu termo antes de operada a transmissão para a empresa daqueles serviços e instalações.

[27] Aliás, com a constituição da referida empresa pública visou-se «garantir a concentração, por forma participada, das competências para a definição das políticas e objectivos gerais da empresa e para a tomada das grandes decisões e assegurar a autonomia e descentralização operacionais, quer no plano funcional, quer no plano regional, com a necessária e explícita delegação de poderes» (artigo 8.º dos Estatutos da EDP).

[28] Cf. Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n.º 126/2005.

[29] Cf. JOÃO JOSÉ MONTEIRO FIGUEIRA, O Estado na Electrificação Portuguesa: Da Lei de Electrificação do País à EDP (1945-1976), Universidade de Coimbra, Coimbra, 2012, página 452 (acessível em:
«https://estudogeral.uc.pt/bitstream/10316/23208/1/Tese%20Final_Jo%C3%A3o%20Figueira.pdf» e acedido, pela última vez, a 29.04.2024).

[30] Tal como, na Madeira, a Empresa de Eletricidade da Madeira (Ver Decretos-Leis n.°s 12/74, de 17 de janeiro, e 31/79, de 24 de fevereiro, bem como o Decreto Legislativo Regional n.° 14/94/M, de 3 de junho); e, nos Açores, a EDA (Eletricidade dos Açores), nos termos do Decreto Regional n.° 16/80/A, de 21 de agosto.

[31] Artigo 85.º, que sob a epígrafe «Iniciativa Privada», dispunha no n.º 2 que:
    «2. A lei definirá os sectores básicos nos quais é vedada a actividade às empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza.».

[32] Cf. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 99/91, de 2 de março.

[33]Cf. FILIPE MATIAS SANTOS, idem, página 38.

[34] FILIPE MATIAS SANTOS, idem, página 39.
Aliás, o Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, viria no artigo 3.º, alínea q), a definir «Empresa verticalmente integrada» como «uma empresa ou um grupo de empresas cujas relações mútuas estão definidas no n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento (CEE) n.º 4064/89, do Conselho, de 21 de Dezembro, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, e que exerce, pelo menos, uma das actividades de transporte ou distribuição e, pelo menos, uma das actividades de produção ou de comercialização de electricidade»; e na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 78/2011, como uma empresa de eletricidade ou um grupo de empresas de eletricidade em que a mesma pessoa ou as mesmas pessoas têm direito, direta ou indiretamente, a exercer controlo e em que a empresa ou grupo de empresas exerce, pelo menos, uma das atividades de transporte ou distribuição e, pelo menos, uma das atividades de produção ou comercialização de eletricidade» [artigo 3.º alínea r)]. E com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 215-A/2012, foi mantida a definição introduzida em 2011, passando a constituir a alínea t).

[35] Que veio a ser alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 297/86, de 19 de setembro, 341/90, de 30 de outubro, e 17/92, de 5 de fevereiro.

[36] No seguimento da Resolução do Conselho de Ministros n.º 112/82, de 20 de maio, que havia definido os princípios fundamentais para uma resolução global dos problemas referentes à distribuição de energia elétrica em baixa tensão, pois pelo artigo 12.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 205-G/75, de 16 de abril, e pelos artigos 2.º e 7.º do Decreto-Lei n.º 502/76, de 30 de junho, havia sido criado um regime de exclusividade na distribuição de energia elétrica a favor da EDP e imposta a integração, sem definição de contrapartidas, do património das autarquias afeto à distribuição na propriedade da EDP.

[37] Zona de influência de um centro produtor hidroelétrico que é determinada pela área do círculo de raio igual a 2,5 km, com centro no edifício da central, acrescida da superfície inundada exterior a esse círculo enquanto a zona de influência de um centro produtor termoelétrico é determinada pela área de um círculo de raio «R», com centro no edifício da central, em que R tem os valores que concretamente indica (artigo 1.º, n.º 2).

[38] Cf. artigos 3.º, n. 1, e 12.º do Decreto-Lei n.º 205-G/75, 5.º e 8.º do Decreto-Lei n.º 502/76 e 26.º a 29.º dos Estatutos da EDP publicados em anexo a este último Decreto-Lei.

[39] A atividade de produção de energia elétrica envolve a transformação de fontes de energia primária em eletricidade e a sua condução à rede de transporte, podendo ser obtida quer de centros electroprodutores de fontes de energia renováveis (energia eólica, solar, geotérmica, das ondas, das marés, hídricas, biomassa, gás de aterro, gás proveniente de estações de tratamento de águas residuais e biogás), quer de fontes não renováveis (carvão, petróleo e gás natural) – cf., a propósito ROBERTA TOURINHO DANTAS FRASER, Medidas Compensatórias e a Tutela da Biodiversidade: Enquadramento Jurídico, Aplicabilidade e Desafios de Operacionalização no Âmbito do Setor Elétrico, Coimbra, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 2015, página 98, acessível in:
«https://estudogeral.uc.pt/bitstream/10316/29892/1/Medidas%20compensat%C3%B3rias%20e%20a%20tutela%20da%20biodiversidade.pdf» (acedida pela última vez, a 20 de maio de 2024).

[40] Cf. MARTA MARQUES CASTRO, A Liberalização do Mercado Energético e o Papel das Entidades Reguladoras, Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 2014, página 38, acessível in: «https://run.unl.pt/bitstream/10362/17409/1/Castro_2014.pdf» (acedido a 10 de março de 2024). 

[41] Criado pela Base XXX da Lei n.º 2002, respeitando a quem produz energia acessoriamente a uma outra atividade, industrial ou agrícola, podendo ligar-se à rede nacional e vender os excedentes.

[42] Que respeita ao pequeno produtor de energia a título principal.

[43] Com efeito, segundo o artigo 27.º, n.º3:
     «Sem prejuízo do disposto no número anterior, são válidas para todos os efeitos as autorizações administrativas já concedidas, reconhecendo-se ainda ao autoprodutor ou produtor independente o direito de, reunindo as condições previstas no presente diploma, requerer a conversão de títulos.»

[44] O Decreto-Lei n.º 189/88 foi alterado pelos Decretos-Leis n.ºs  313/95, de 24 de novembro, 56/97, de 14 de março, 168/99, de 18 de maio (que o republicou, introduzindo os anexos I e II), 312/2001, de 10 de dezembro, 339-C/2001, de 29 de dezembro, 33-A/2005, de 16 de fevereiro, 225/2007, de 31 de maio, e 35/2013, de 28 de fevereiro. Foi revogado pelo artigo 15.º, n.º 2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 215-B/2012, de 8 de outubro, com exceção do anexo II, atinente à remuneração pelo fornecimento da eletricidade entregue à rede, nos termos dos n.ºs 5 a 7 do mesmo artigo.

[45] Veio, assim, a Portaria n.º 416/90, de 6 de Junho, a publicar o contrato tipo de compra de energia elétrica pela EDP a produtores independentes.

[46] Cf. CATARINA BRITO FERREIRA e JOANA ALVES ABREU, idem, página 263.

[47] Cf. respetivo preâmbulo e INÊS VIEIRA, «As cedências municipais impostas pelo Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro, aos titulares de centro electroprodutor de fonte renovável», em Estudos de Direito da Energia, coordenação de FRANCISCO PAES MARQUES e de JOÃO MARQUES MENDES, Almedina, Coimbra, 2023, páginas 351 a 373, página 356.

[48] Que tinha por finalidade, de acordo com o seu preâmbulo, estabelecer, no âmbito do Sistema Elétrico Independente (SEI), «o regime jurídico do exercício da actividade de produção de energia eléctrica em aproveitamentos hidroeléctricos até 10MVA de potência aparente instalada, bem como o da produção de energia eléctrica a partir de energias renováveis, com excepção da hidráulica. A definição deste regime passa pela alteração do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, suprimindo-se os limites de potência instalada estabelecidos no seu artigo 1.º, com excepção dos aproveitamentos hidroeléctricos, que continuarão limitados a 10 MVA de potência aparente instalada». E entre as alterações inclui-se também a de a co-geração ser retirada do regime do produtor em regime especial (cf. o artigo 1º, n.º 1).

[49] De anotar que, na primeira alteração, se inseria para além da utilização de recursos renováveis, ou resíduos industriais, agrícolas ou urbanos, os combustíveis nacionais, o que a alteração de 1999 não manteve, dada a crescente preocupação quer com a proteção do ambiente quer com o cumprimento dos objetivos assumidos ao nível supranacional para redução de emissões de gases com efeito de estufa (Cf. CATARINA BRITO FERREIRA e JOANA ALVES ABREU, idem, página 265.

[50] Se a localização da área de implantação da central produtora eólica em bens do domínio privado da Administração, é possível, nos termos do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º189/88, a cedência destes, a título temporário (arrendamento) ou definitivo (compra e venda).
Sempre que a área de implantação se situasse em terrenos de propriedade privada, o produtor podia requerer a expropriação por utilidade pública, nos termos do Código das Expropriações (artigos 3.º, n.º 1, e 4.º), passando o bem imóvel a integrar o património da Administração central ou da autarquia local em cuja circunscrição se sediasse o empreendimento, mas ficando afeto ao fim de produção de energia elétrica por um período de 35 anos, a troco de um pagamento periódico atualizável (renda) pelo produtor ao titular público do imóvel, e fixado no momento da cedência pela entidade pública que tenha suportado a justa indemnização (artigo 4.º, n.º 2). Todavia, nos termos do artigo 4.º, n.º 4, caso o encargo a justa indemnização tivesse sido suportada pelo produtor, seria este facto tomado em consideração na fixação dessa renda atualizável.

[51] Aliás, o Decreto-Lei n.º 189/88, ao regular a produção de energia elétrica por produtores independentes, introduziu uma modificação substancial nas regras da utilização de água, pelo que a Portaria n.º 445/88, de 8 de julho, veio, tendo em conta o dispostos nos artigos 2.º, 7.º e 27.º, n.º 11, do Decreto-Lei n.º 189/88, regular os procedimentos administrativos inerentes ao processo de autorização de utilização de água para aproveitamentos hidroelétricos. Portaria que veio a ser alterada pela Portaria n.º 958/99, de 28 de outubro.

[52] Tratado que, a 12 de junho de 1985, fora concluído e assinado, vindo a ser aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 22/85, de 10 de julho de 1985, publicada, como o teor do tratado, no Diário da República, I Série, n.º 215, 1.º suplemento, de 18 de setembro de 1985. Tratado que foi também publicado no Jornal Oficial das Comunidades Europeias (JO), n.º L 302, de 15 de novembro de 1985.

[53] Artigo 83.º, que sob a epígrafe «Nacionalizações efectuadas depois de 25 de Abril de 1974», dispunha:
      «1. Todas as nacionalizações efectuadas depois de 25 de Abril de 1974 são conquistas irreversíveis das classes trabalhadoras.
      2. As pequenas e médias empresas indirectamente nacionalizadas, fora dos sectores básicos da economia, poderão, a título excepcional, ser integradas no sector privado, desde que os trabalhadores não optem pelo regime de autogestão ou de cooperativa». 

[54] Lei-quadro que no artigo 28.º revogou a Lei n.º 84/88, de 20 de julho, que previra que as empresas públicas, ainda que nacionalizadas, podiam, mediante decreto-lei, ser transformadas em sociedades anónimas de capitais públicos ou de maioria de capitais públicos (artigo 1.º) e que nessa transformação devia ser imperativamente salvaguardado (mormente) que a transformação não implicasse a reprivatização do capital nacionalizado, salvo nos casos previstos no artigo 83.º, n.º 2, da Constituição, devendo os títulos representativos do capital assumido pelo Estado à data da respetiva nacionalização ser sempre detidos pela parte pública [artigo 2.º, n.º 1, alínea a)].

[55] Corrigido pela Declaração de Retificação 135/91, de 29 de junho, e veio a ser revogado, no que concerne a Portugal continental, pelo artigo 26.º do decreto-Lei n.º 183/95, de 27 de julho.

[56] A concessão de serviços públicos, que, sendo uma modalidade de concessão, constitui, de acordo com PEDRO GONÇALVES (A concessão de serviços públicos - uma aplicação da técnica concessória, Coimbra, Almedina, 1999, páginas 102 e seguintes) um ato constitutivo de uma relação jurídica administrativa pelo qual a pessoa titular de determinado serviço público atribui a outra pessoa o direito de esta, no seu próprio nome, organizar, explorar e gerir esse serviço público. E, segundo MARCELLO CAETANO, o serviço público corresponde à «organização de pessoas e bens instituída pelo Estado ou por outra pessoa coletiva de Direito Público para o desempenho das suas atribuições mediante emprego de meios de autoridade» (“Subsídios para o estudo da teoria da Concessão de Serviços Públicos”, in Estudos de Direito Administrativo, Edições Ática, 4.ª edição, Lisboa, 1974, páginas 94 a 96.

[57] Aliás, na Diretiva n.º 90/547/CEE de 29 de outubro de 1990, publicada no JO nº «L 313», de 13 de novembro de 1990, relativa ao trânsito de eletricidade nas grandes redes, considerou-se que «a política energética não deverá ser executada apenas na perspetiva de uma redução dos custos e da prática da concorrência», devendo ainda «ter em conta a necessidade de assegurar (…) a compatibilidade dos métodos de produção da energia com o ambiente».

[58] Este preceito remeteu para legislação própria a regulamentação das atividades de produção, transporte e distribuição de energia elétrica para consumo público.

[59] Efetivamente, o Decreto-Lei n.º 43.335 após a revogação instituída pelo artigo 28.º do Decreto-Lei n.º 99/91, foi objeto de revogações parciais, como resulta dos artigos 68.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 182/95, 37.º, alínea f), da Lei n.º 30/2006, de 11 de julho, e 13.º, alínea e), da Lei n.º 20/2023, de 17 de maio.

[60] Cf. parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República  n.º 126/2005.

[61] Enquanto a segunda a sétima fase foram regradas respetivamente pelos Decretos-Leis n.ºs: 315/97, de 19 de novembro; 94-C/98, de17 de abril; 141/2000, de 15 de julho, 218 A/2004, de 25 de outubro; 209-A/2005, de 2 de dezembro; e 382/2007, de 15 de novembro.

[62]  A EDP, entrementes mudara da designação de «EDP, Eletricidade de Portugal, SA» para «EDP, Energias de Portugal, SA».

[63] Cf. Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n.º 126/2005.

[64] O Decreto-Lei n.º 182/95 veio a ser alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 56/97, de 14 de março, e 198/2000, de 24 de agosto, tendo este último diploma legal procedido a  reestruturação do Sistema Elétrico Nacional (SEN) no sentido da tendência europeia veiculada pela Diretiva 96/92/CE, permitindo, assim, consolidar a posição da concessionária da Rede Nacional de Transporte de Eletricidade (RNT) como entidade independente dos restantes operadores.
Por sua vez, o Decreto-Lei n.º 56/97 procedeu a transposição parcial da Diretiva n.º 96/92/CE do Parlamento Europeu e do Conselho e a alteração de vários Decretos-Leis designadamente os n.ºs 182/95 a 186/95, que republicou.

[65] Decreto-Lei n.º 187/95, de 27 de julho, que estabeleceu as disposições relativas à sua organização e funcionamento, tendo sido alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 157/96, de 31 de agosto, e 44/97 de 20 de fevereiro, que publicou em anexo os Estatutos da Entidade Reguladora do Setor Elétrico, que foram revogados pelo artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 97/2002, de 12 de abril.

[66] Diploma, que transforma a Entidade Reguladora do Sector Elétrico em Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos e aprova os respetivos Estatutos. Foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 200/2002, de 25 de setembro; e os Estatutos foram alterados por este último diploma legal bem como pelo Decreto-Lei n.º 212/2012, de 25 de setembro, 84/2013, de 25 de junho, 57-A/2018, de 13 de julho, e 76/2019, de 3 de junho.    

[67] Cf. parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n.º 126/2005.

[68] Este diploma, em anexo, indica as entidades produtoras de energia elétrica integradas quer no SEP quer no SENV e respetivos centros electroprodutores afetos.
De acordo com esse Anexo integram o SEP a «CPPE – Companhia Portuguesa de Produção de Electricidade, S.A.», a «Tejo Energia – Produção e Distribuição de Energia Eléctrica S.A.», e a «Turbogás – Produtora Energética, S.A.». E o SENV, as seguintes empresas: «HDN- Energia do Norte, S.A.», «Hidrocenel – Energia do Centro, S.A.», «Hidrotejo, Hidroeléctrica do Tejo, S.A.», todas do Grupo «EDP».
Ver também o Plano Estratégico de Gestão dos Resíduos Industriais (PESGRI 99), aprovado pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 516/99, de 2 de dezembro, item 9.3.2 do Anexo ao mesmo diploma legal, onde, para além de se indicar a relação das empresas electroprodutoras, se expende igualmente que: «No âmbito das empresas de produção pertencentes ao SEI, autorizadas ao abrigo de legislação especial, existem ainda mais de uma centena de pequenos produtores: em aproveitamentos hidroeléctricos (até 10 MVA de potência aparente instalada), a partir de outras energias renováveis e em instalações de co-geração». Cf. ainda o Decreto-Lei n.º 85/2002, de 6 de abril e respetivo Anexo (onde consta a relação das Entidades produtoras de energia elétrica e aproveitamentos hidroelétricos de potência instalada superior a 10 MW integrados no SENV».
 Aliás, em 2002, a empresa «CPPE» estava integrada na «EDP Produção», detinha, 82% da capacidade de produção no âmbito do SEP; a EDP, por sua vez, participava também nos capitais das sociedades «Tejo Energia» e «Turbogás», «conforme informação constante do Relatório e Contas da EDP referente ao ano de 2002» (cf. o já indicado parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n.º 126/2005).

[69] O Decreto-Lei n.º 183/95 revoga no artigo 54.º, n.º 1, o Decreto-Lei n.º 100/91, de 2 de março.

[70] Ainda de acordo com o mesmo exórdio, mantendo-se inalterável o tipo de autorização administrativa para o exercício da atividade, titulada através da atribuição de uma licença, que naquele sistema (SEP) reveste a categoria de licença vinculada, tendo os contratos de vinculação de centros electroprodutores um prazo de vigência não inferior a 15 anos, exceto em casos devidamente justificados e o máximo de 75 anos (artigos 15.º, n.º 3, e 60.º do Decreto-Lei n.º 182/95), prevendo-se no n.º 4 do mesmo artigo 15.º a remuneração dos produtores vinculados da energia elétrica entregue ao Sistema Elétrico de Serviço Público.
Previa no artigo 20.º, n.º 1, que o prazo de duração da licença se fixava de acordo com o disposto no artigo 60.°do Decreto-Lei n.º 182/95, de 27 de julho, coincidindo com o prazo de duração do contrato de concessão de utilização do domínio hídrico, se a este houvesse lugar.

 [71] Cabe assinalar que o Decreto-Lei n.º 184/95 estabeleceu o Regime Jurídico do Exercício da Atividade de Distribuição de Energia Elétrica no âmbito do SEP e do SENV, enquanto o Decreto-Lei n.º 185/95 firmou o Regime Jurídico do Exercício da Atividade de Transporte de Energia Elétrica no Sistema Elétrico Nacional (SEN) e aprovou as Bases de Concessão de Exploração da Rede Nacional de Transporte de Energia Elétrica (RNT). Já o Decreto-Lei n.º 186/95 veio fixar as disposições relativas à atividade de produção e consumo combinados de energia elétrica e de energia térmica, mediante o processo de cogeração, sem limite máximo de potência elétrica instalada, a que lhe sucedeu o Decreto-Lei n.º 538/99, de 13 de dezembro (que veio a ser revogado pelo Decreto-Lei n.º 23/2010, de 25 de março.
E o Decreto-Lei n.º 188/95 deu corpo às disposições relativas à constituição, organização e funcionamento da Entidade de Planeamento do Sistema Electroprodutor.

[72] De 16 de maio de 2013, publicado no Diário da República, II Série, n.º 136, de 17 de julho de 2013.

[73] Esta Diretiva, publicada no JO n.º L 27, de 30 de janeiro de 1997, veio impor a separação jurídica entre as empresas responsáveis pela rede de transporte e as empresas que desenvolvessem atividades de produção e de distribuição de eletricidade

[74] Aliás, de acordo com os considerandos preambulares desta Diretiva, só a criação de um mercado interno do setor elétrico permitiria «racionalizar a produção, o transporte e a distribuição da eletricidade, reforçando simultaneamente a segurança de abastecimento e a competitividade da economia europeia e a proteção do ambiente» (Considerando 4).
Esta Diretiva viera estabelecer as regras comuns para o mercado interno da eletricidade e, assim, os requisitos fundamentais para a abertura à concorrência, visando a criação de sistemas transparentes para os novos centros produtores, a separação contabilística das atividades de produção, transporte e distribuição (e a separação de gestão no que concerne aos operadores das redes de transporte relativamente às atividades de produção e distribuição), «a fim de evitar discriminações, subsidiações cruzadas e distorções da concorrência»; e prevendo também a possibilidade de os Estados-Membros poderem «impor às empresas do sector da electricidade, no interesse económico geral, obrigações de serviço público relativas à segurança, incluindo do abastecimento, regularidade, qualidade e preço dos fornecimentos, e à protecção do ambiente», privilegiando «a produção de electricidade a partir de fontes renováveis» (cf., entre outros, os considerandos 13 e 28, e artigos 1.º, 13.º, n.º2, e 14.º, n.º 3).
Aliás, o estabelecimento do mercado interno de eletricidade fora iniciado com a publicação das diretivas comunitárias 90/377/CEE, do Conselho, de 29 de junho de 1990 (publicada no JO nº L 185 de 17 de julho de 1990 páginas 16 a 24), atinente ao processo comunitário visando assegurar a transparência dos preços no consumidor final industrial de gás e eletricidade, e 90/547/CEE, do Conselho, de 29 de outubro (publicada no JO n.º L 313, de 13 de novembro de 1990, páginas 30 a 33), relativa ao trânsito de eletricidade nas grandes redes.

[75] Cf. parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República  n.º 126/2005.

[76] Igualmente, visando adequar a estrutura do sistema elétrico nacional (SEN) e a sua forma de funcionamento a um regime de mercado genericamente aberto à concorrência, o Decreto-Lei n.º 184/2003, também de 20 de agosto, veio definir as condições de exercício, em regime de mercado, das atividades de comercialização e de importação e exportação de energia elétrica.

[77] Retificado e republicado pela Declaração de Retificação n.º 1-A/2005, de 17 de janeiro, veio a ser alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 199/2007, de 18 de maio, 264/2007, de 27 de julho, e 32/2013, de 26 de fevereiro.




[78] Aliás, estabelece no seu artigo 2.º, n.º 2, que a cessação antecipada dos CAE determina a atribuição a um dos seus titulares - produtor ou entidade concessionária da Rede Nacional de Transporte de Energia Elétrica (RNT) - do direito ao recebimento de compensações pela cessação antecipada de tais contratos, estabelecendo-se ainda a metodologia de determinação do montante dessas compensações, bem como as formas e o momento do seu pagamento e os efeitos de eventuais faltas de pagamento, viabilizando, assim, a liberalização e o aumento da concorrência no sector elétrico (cf. preâmbulo). Para mais desenvolvimento, ver parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n.º 39/2012, de 21 de março de 2012, publicado no Diário da República, II Série, n.º 87, de 7 de maio de 2013.
 

[79] O Conselho de Ministros, na Resolução n.º 169/2005, de 24 de outubro, havia decidido «promover a revisão do quadro legislativo e regulamentar, com vista à liberalização do mercado da energia», tendo como «orientação estratégica para o setor energético o alargamento do âmbito da atividade das empresas que nele operam, de modo a que haja mais de um operador integrado relevante nos setores da eletricidade e do gás natural, em ambiente de concorrência» (cf. a referida Resolução) e que se procedesse, para o efeito, à transposição das Diretivas do mercado interno de eletricidade e do gás natural publicadas em 2003 – respetivamente as Diretivas n.ºs 2003/54/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho (publicada no JO, n.º L 176, de 15 de julho de 2003) e 2003/55/CE, publicada na mesma data, vindo esta a ser transposta para o direito nacional através do Decreto-Lei n.º 30/2006, de 15 de fevereiro.
Havia, segundo essa Resolução que «reduzir o custo da energia e aumentar a qualidade de serviço, através do aumento da concorrência nos segmentos da produção e comercialização do setor elétrico, da regulação e da antecipação do calendário de liberalização do setor do gás natural».
Resolução que revogou a Resolução do Conselho de Ministros n.º 63/2003, de 28 de abril, e foi revogada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 29/2010, de 15 de abril que aprovou a Estratégia Nacional para a Energia 2020. 

[80] Cf. considerandos preambulares  n.ºs 19, 24, e 26  e artigos 3.º e 28.º da citada Diretiva 2003/54/CE. Esta Diretiva veio a ser alterada pelas Diretivas n.ºs 2004/85/CE, do Conselho, de 28 de junho de 2004, e 2008/3/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de janeiro de 2008 embora tão só no concernente à aplicação de certas disposições à Estónia (publicadas no JO n.º 236, de 7 de julho de 2004, e JO, n.º 17, de 22 de janeiro de 2008, respetivamente).

[81] Com a Diretiva n.º 2003/54/CE passou a exigir-se pelo legislador europeu, pelo menos, a separação jurídica, de organização e de tomada de decisões dos operadores das redes de transporte e de distribuição (artigos 10.º, n.º 1, e 15.º, n.º 1), ampliando, assim, o âmbito da desagregação/separação («unbundling») empresarial, pois «tradicionalmente, as atividades nos mercados energéticos foram desenvolvidas por empresas verticalmente integradas»; e mantendo a preocupação no que concerne às obrigações de serviço público como relativamente «à segurança, à regularidade, à qualidade e ao preço do fornecimento, e à proteção do ambiente, incluindo a eficiência energética», como resulta do artigo 3.º, n.º 2 (cf. MARTA MARQUES CASTRO, obra citada, páginas 28, nota 50, e 29).
Efetivamente, segundo o Considerando 8, 2.º item, da Diretiva, para que «a independência dos operadores da rede de distribuição e dos operadores da rede de transporte possa ser garantida, especialmente, no que diz respeito aos interesses da produção e do fornecimento», haverá «pois, que criar estruturas independentes de gestão entre os operadores da rede de distribuição, os operadores da rede de transporte e as empresas de produção/fornecimento».

[82] Diploma que, nesse desenvolvimento, completou a transposição da Diretiva n.º 2003/54/CE (artigo 1.º, n.º 3), tendo entrado em vigor a 24 de agosto de 2006 (artigo 80.º).

[83]  Cf. DUARTE ABECASIS e LOURENÇO VILHENA DE FREITAS, in «A inconstitucionalidade e ilegalidade da aplicação da Portaria n.º 243/2013, de 2 de agosto, aos centros electroprodutores em regime especial sujeitos a regimes de remuneração garantida anteriores ao decreto-lei n.º 215-B/2012, de 8 de outubro», revista eletrónica de direito público, «e-Publica», volume I, n.º 1, janeiro de 2014, páginas 338 a 348, a página 340, acessível in «https://e-publica.pt» (acedido, pela última vez, a 14 de maio de 2024).

[84]  Cf. MARTA MARQUES CASTRO, obra citada, página 45.

[85] O «comercializador de último recurso», como se expende no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 29/2006, «assume o papel de garante do fornecimento de electricidade aos consumidores, nomeadamente aos mais frágeis, em condições de qualidade e continuidade de serviço. Trata-se de uma entidade que actuará enquanto o mercado liberalizado não estiver a funcionar com plena eficácia e eficiência, em condições de assegurar a todos os consumidores o fornecimento de electricidade segundo as suas necessidades. Neste sentido, as funções do comercializador de último recurso são atribuídas provisoriamente aos distribuidores de electricidade pelo prazo de duração da sua concessão» [cf. artigo 3.º, alínea j)].

[86] Cf. parecer do Conselho Consultivo  da Procuradoria-Geral  da República n.º 126/2005.

[87] Cf. PEDRO GONÇALVES, As concessões no setor elétrico”, Temas de Direito da Energia, Cadernos O Direito, n.º 3, 2008, coordenação de JORGE MIRANDA e CARLA AMADO GOMES, páginas 185-214.

[88] PEDRO GONÇALVES, Regulação, Eletricidade e Telecomunicações, Coimbra, Coimbra Editora, 2008, página 79.

[89] Cf. PEDRO GONÇALVES, obra citada, página 80, e Parecer do Conselho Consultivo, n.º 39/2012, de 21 de março de 2013.

[90] Diploma que foi alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 104/2010, de 29 de setembro, 78/2011, de 20 de junho (com republicação), 75/2012, de 26 de março, 112/2012, de 23 de maio, e 215-A/2012, de 8 de outubro (igualmente com republicação), com Declaração de Retificação n.º 74/2012, de 7 de dezembro, Decreto-Lei n.º 178/2015, de 27 de agosto, Decreto-Lei n.º 79/2020, de 1 de outubro. E veio a ser revogado pelo Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro [artigo 305.º, alínea b)].

[91] Publicada no JO, n.º 211, de 14 de agosto de 2009.

[92] Entrementes, o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (resultante das versões consolidadas do Tratado da União Europeia e do Tratado que institui a Comunidade Europeia, com as alterações introduzidas pelo Tratado de Lisboa, assinado a 13 de dezembro de 2007), publicado no JO n.º C 306 de 17 de dezembro de 2007 e in JO n.º C 83, de 30 de março de 2010, estabelece no artigo 194.º, n.º 1, que, tendo em conta a exigência de preservação e melhoria do ambiente, são objetivos da política da União Europeia assegurar o funcionamento do mercado da energia (a); assegurar a segurança do aprovisionamento energético da União (b); promover a eficiência energética e as economias de energia, bem como o desenvolvimento de energias novas e renováveis (c); e promover a interconexão das redes de energia (d).

[93] E, como se preambula no Decreto-Lei n.º 215-A/2012, «o Decreto-Lei 75/2012, de 26 de março, veio estabelecer o regime de extinção das tarifas reguladas de venda de eletricidade a clientes finais com consumos em baixa tensão normal (BTN). E, na sequência da diminuição da posição acionista do Estado na sociedade proprietária das sociedades concessionárias das redes de transporte de eletricidade e gás natural, bem como das infraestruturas de armazenamento e terminal de gás natural liquefeito, foi publicado o Decreto-Lei 112/2012, de 23 de maio, que alterou os limites de participação no capital social das referidas sociedades concessionárias».

[94] De anotar que a Lei n.º 64-A/2011, de 30 de dezembro, que aprovou as Grandes Opções do Plano para 2012/2015, incluía o mercado de energia e a política energética (Opção n.º 5.1.8), determinando-se, entre os objetivos dessa opção, a promoção da competitividade, da transparência dos preços do bom financiamento e da efetiva liberalização dos mercados da eletricidade (e do gás natural), o reforço da diversificação das fontes primárias de energia e a garantia do cumprimento dos objetivos de redução das emissões de gases com efeito de estufa.

[95] Este diploma foi objeto de alterações introduzidas pelos Decretos-Leis n.ºs 237-B/2006, de 18 de dezembro, 199/2007, de 18 de maio, 264/2007, de 24 de julho, 23/2009, de 20 de janeiro, 104/2010, de 29 de setembro, e 215-B/2012, de 8 de outubro, que o republicou (corrigido pela Declaração de Retificação n.º 73/2012, de 7 de dezembro), pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, pelos Decretos-Leis n.ºs 38/2017, de 31 de março, e 152-B/2017, de 11 de dezembro, pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, e pelo Decreto-Lei n.º 76/2019, de 3 de junho, que igualmente o republicou; e foi revogado pelo artigo 305.º, alínea d), do Decreto-Lei n.º 15/2022.

[96] Cf. exórdios dos Decretos-Leis n.ºs 215-A/2012 e 215-B/2012.

[97]  Artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 29/2006, na redação conferida pelo Decreto-lei n.º 215-A/2012.

[98] E que eram os centros electroprodutores que ainda dispusessem de contratos de aquisição de energia (CAE) «celebrados ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 183/95, de 27 de julho, alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 56/97, de 14 de março, 198/2000, de 24 de agosto, 153/2004, de 30 de junho, 172/2006, de 23 de agosto, e 226-A/2007, 31 de maio» [alínea a)]; os centros electroprodutores que beneficiassem da compensação pecuniária correspondente aos custos para a manutenção do equilíbrio contratual (CMEC), prevista no Decreto-Lei n.º 240/2004, de 27 de dezembro, alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 199/2007, de 18 de maio, e 264/2007, de 24 de julho» [alínea b)]; e aqueles centros electroprodutores que beneficiassem «de incentivos à garantia de potência pelos mesmos disponibilizada ao SEN, nos termos previstos em legislação complementar» [alínea c)]. E estabelecia-se no n.º 3 que o regime jurídico de produção em regime ordinário, que incluísse os procedimentos para a atribuição das licenças, era estabelecido em legislação complementar.

[99] Cf. MANUEL CASSIANO NEVES, obra citada, página 17.

[100] Cf. parecer n.º 15/2017, de 14 de setembro de 2017, deste Conselho Consultivo, publicado in Diário da República,  II Série, n.º 5, de 8 de janeiro de 2018.

[101] E aditou igualmente o artigo 27.º-D, que, sob a epígrafe «Regime remuneratório», estabelecia no n.º 1 que:
      «1 - A produção de eletricidade a partir de fontes de energia renovável, baseada em uma só tecnologia de produção, com capacidade máxima instalada até 1 MW e destinada à venda total de energia à rede é remunerada, por opção do produtor, pela remuneração geral ou pela remuneração garantida obtida com base num modelo de licitação, no qual os concorrentes oferecem descontos à tarifa de referência, sendo esta fixada segundo o maior desconto oferecido.».
 

[102] Publicada in JO n.º L 158/125, de 14 de junho de 2019.

[103] E sem prejuízo da Diretiva (UE) n.º 2023/1791 do Parlamento Europeu e do Conselho de 13 de setembro de 2023 relativa à eficiência energética e que altera o Regulamento (UE) 2023/955 (reformulação), publicada no JO n.º L 231, de 20 de setembro de 2023.

[104] Diploma que foi corrigido pela Retificação n.º 11-A/2022, de 14 de março, e alterado pela Lei n.º 24-D/2022, de 30 de dezembro, e pelos Decretos-Leis n.ºs 11/2023, de 10 de fevereiro, e 104/2023, de 17 de novembro (este último corrigido pela Retificação n.º 33/2023, de 22 de dezembro).

[105] Publicada in JO n.º L 328/82, de 21 de dezembro de 2018.

[106] Regulada pelo Decreto-Lei n.º 23/2010, de 25 de março, que estabelece o regime jurídico e remuneratório aplicável à energia elétrica e mecânica e de calor útil produzidos em cogeração, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2004/8/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de fevereiro.
Decreto-Lei que foi alterado pelos seguintes diplomas: Lei n.º 18/2010, de 23 de agosto, Decreto-Lei n.º 68-A/2015, de 30 de abril, Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, e Decreto-Lei n.º 64/2020, de 23 de setembro.

[107] Regulada pelos Decretos-Leis n.ºs 5/2008, de 8 de janeiro, e 238/2008, de 15 de dezembro, ambos, alterados pelo Decreto-Lei n.º 15/2012, de 23 de janeiro.

[108] Regulados pelo Decreto-Lei n.º 39/2010, de 26 de abril, que foi alterado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, pelos Decretos-Leis n.ºs 170/2012, de 1 de agosto, e 90/2014, de 11 de junho, e pelas Leis n.ºs 82-D/2014, de 31 de dezembro, e 19/2024, de 5 de fevereiro.

[109] Idem, página 277.

[110] O fornecimento de energia elétrica constitui, segundo a Lei dos Serviços Públicos Essenciais, aprovada pela Lei n.º 23/96, de 26 de julho, um serviço público essencial, atento o carácter fundamental que assume na vida quotidiana, sendo imprescindível garantir a existência de um serviço universal que assegure o fornecimento em condições de qualidade e continuidade e proteja o utente em matéria de tarifas e preços [artigo 1.º, n.º 2, alínea b); cf., a propósito, FERNANDO DIAS SIMÕES e MARIANA PINHEIRO ALMEIDA, Lei dos Serviços Públicos Essenciais, Anotada e Comentada, Coimbra, Almedina, 2012, página 25]. A referida Lei veio a ser alterada pelas Leis n.ºs: 12/2008, de 26 de fevereiro, 24/2008, de 2 de junho, 6/2011, de 10 de março, 44/2011, de 22 de junho, 10/2013, de 28 de janeiro, e 51/2019, de 29 de julho.
.A doutrina, face às caraterísticas legais exigíveis, vem considerando que o serviço público essencial constitui «o serviço de natureza económica submetido a obrigações de serviço público em virtude do interesse geral que representa a sua acessibilidade universal» (cf. ANTÓNIO CARLOS DOS SANTOS, MARIA EDUARDA GONÇALVES e MARIA MANUEL LEITÃO MARQUES, Direito Económico, Coimbra, Almedina, 6ª edição, 2011, página 325).
 

[111] «As cedências municipais impostas pelo Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro, aos titulares de centro electroprodutor de fonte renovável», em Estudos de Direito da Energia, coordenação de FRANCISCO PAES MARQUES e de JOÃO MARQUES MENDES, Almedina, Coimbra, 2023, páginas 351 a 373, página 353.

[112]  De que é exemplo paradigmático o Protocolo celebrado entre a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e o operador de energia «EDP, Energias de Portugal S.A.», a 27 de fevereiro de 2012, visando apoiar financeiramente os municípios, de forma a compensá-los pela instalação de centros electroprodutores nas suas circunscrições territoriais, «em complemento ao pagamento dos montantes das rendas anuais resultantes do disposto no Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro (cláusula 3.ª, n.º 1); estabelecendo, assim, «medidas complementares às rendas anuais resultantes do disposto no Decreto-Lei n.º 424/83» (cláusula 1.ª), prevendo o montante anual de 5 milhões de euros para pagamento aos municípios abrangidos, a título das medidas complementares definidas no protocolo (cláusula 3.ª, n.º 2), a distribuir pelos municípios abrangidos (cláusula 5.ª, n.º 1); e determinando que «[n]o caso de aprovação de diploma legal que reveja o regime estabelecido no decreto-lei n.º 424/83, de 6 de Dezembro, a ANMP assegura que os Municípios abrangidos não poderão, em qualquer caso, beneficiar cumulativamente, para o mesmo período, de parte ou da totalidade das medidas complementares e do novo regime de rendas» (cláusula 10.ª, n.º 3).
Consagra, ao que parece, o entendimento de que o protocolo não contempla os centros electroprodutores atribuídos em regime de concorrência após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 29/2006, pois no Considerando «E», expende-se que «com a aprovação do Decreto-Lei n.º 29/2006, de 15 de fevereiro, foi aprovado um novo quadro organizativo do sector eléctrico em que «as actividades de produção e comercialização são exercidas em regime de livre concorrência e as actividades de transporte e distribuição são exercidas mediante a atribuição de concessões de serviço público» do qual resulta a inaplicabilidade do regime do Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro, em relação a novos centros electroprodutores atribuídos em regime de concorrência após a entrada em vigor do primeiro diploma.». Nem abrange ainda os casos em que os «centros electroprodutores em regime ordinário cuja construção tenha sido autorizada com sujeição à criação de fundos financeiros em benefício dos municípios ou à realização de outras contribuições para fins de compensação de impactes socioeconómicos causados, de recuperação ambiental ou de desenvolvimento regional» (cláusula 2.ª, n.º 2).
Protocolo acessível in:
 «https://www.anmp.pt/wp-content/uploads/2019/11/AtaMesa4Fev2016.pdf» (acedido pela última vez a 20 de maio de 2024).

[113] INÊS VIEIRA, idem, páginas 362 a 363. Cf. ainda RUI RIBEIRO LIMA e INÊS VIEIRA «Comentário ao novo regime de cedências Municipais e a articulação com o RJUE, in O Novo Regime do Setor Elétrico – Comentários ao Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro, coordenação de MIGUEL NOGUEIRA DE BRITO, et alia, Instituto Miguel Galvão Teles, 2024, páginas 40 e 41, acessível in:
«https://www.mlgts.pt/xms/files/site_2018/guias/2024/O_novo_regime_juridico_do_setor_eletrico_-_Comentarios_ao_Decreto-Lei_n.o_15-2022_de_14_de_janeiro.pdf». (acedido pela última vez a 23 de agosto de 2024).
 

[114] Já os titulares de centro electroprodutor de fonte renovável ou de instalação de armazenamento com uma potência de ligação atribuída inferior a 1MVA, não estão abrangidos pelo preceituado no artigo 49.º, n.º 1 a 7, o mesmo acontecendo com as situações indicadas no n.º 8 do mesmo artigo 49.º.

[115] Cf. INÊS VIEIRA, obra citada, página 364.

[116] Preceito que, sob a epígrafe «Política energética», determina no n.º 2:
      «2 - A política energética nacional subordina -se aos seguintes princípios:
      a) Descarbonização da produção de eletricidade, apostando nos recursos endógenos renováveis;
      b) Descarbonização no setor residencial e nos edifícios públicos, privilegiando a reabilitação urbana, a renovação profunda do parque imobiliário, o aumento da eficiência energética nos edifícios e a melhoria do conforto térmico, considerando para o efeito a neutralidade dos materiais, a adequação das soluções construtivas às alterações climáticas e todo o ciclo de vida do edificado;
      c) Reforço significativo da eficiência energética em todos os setores da economia, apostando na incorporação de fontes de energia renováveis endógenas nos consumos finais de energia;
      d) Eletrificação do consumo de energia, eliminando até 2040 o papel do gás de origem fóssil no sistema energético nacional;
      e) Progressiva descentralização e democratização da produção de energia;
      f) Descarbonização da mobilidade, privilegiando o sistema de mobilidade em transporte coletivo, os modos ativos de transporte, a mobilidade elétrica e outras tecnologias de zero emissões, a par da redução da intensidade carbónica dos transportes marítimos e aéreos;
      g) Promoção da transição energética nos diferentes setores da atividade económica e, em particular, na indústria;
      h) Melhoria dos índices de qualidade do ar;
      i) Valorização do princípio de neutralidade climática nas compras públicas e nos cadernos de encargos;
      j) Combate à pobreza energética, com vista à sua erradicação».

[117] E no caso de o centro electroprodutor ou a instalação de armazenamento se localizar em mais do que um município abrangido, a respetiva cedência ou compensação é proporcional à área abrangida por cada município (n.º 7).

[118] Cf. neste sentido INÊS VIEIRA, idem, página 366; e RUI RIBEIRO LIMA e INÊS VIEIRA, obra citada, página 43.

[119] O TFUE (Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia), versão consolidada, no que concerne à energia, estabelece no artigo 194.º, n.º1, que, tendo em conta a exigência de preservação e melhoria do ambiente, os principais objetivos da política energética da União Europeia são: (a) a melhoria da proteção ambiental; (b) a garantia da segurança do aprovisionamento energético; (c) promoção da eficiência energética, incluindo o desenvolvimento das energias renováveis; e (d) promoção da interconexão das redes de energia (publicado no JO n.º C 202/134, de 7 de junho de 2016).
Aliás, a energia desde o Tratado de Lisboa integra o elenco das competências partilhadas [cf. alínea i) do n.º 1 do artigo 4.º do TFUE].

[120] As cedências previstas nos n.ºs 1 a 3 são formalizadas mediante protocolo (n.º 5), sendo que, no caso de o município ou municípios se recusarem a assinar o protocolo, estabelece o n.º 6 que o titular do centro electroprodutor de eletricidade de fonte renovável (ou de instalação do armazenamento) tem a possibilidade de substituir a cedência (em espécie) pela compensação em numerário (n.ºs 2 e 3).

[121] Cf. RUI RIBEIRO LIMA e INÊS VIEIRA, obra citada, página 43.

[122] TELMO COUTINHO RODRIGUES, «A hibridização de centros electroprodutores no novo regime do Sistema Elétrico Nacional (Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro)», in Estudos de Direito da Energia, Coordenação de FRANCISCO PAES MARQUES e de JOÃO MARQUES MENDES, 2023, Coimbra, Almedina, páginas 81 a 125, in página 112, que acrescenta que conforme n.º 8 do mesmo preceito, tal não é aplicável à hibridização.

[123] Cf. INÊS VIEIRA, idem, página 368; e RUI RIBEIRO LIMA e INÊS VIEIRA, obra citada, página 43.

[124] FILIPE MATIAS SANTOS, «O binómio energia-ambiente – políticas públicas de energia à entrada dos novos anos 20», in Revista Eletrónica de Direito Público e-pública, volume 7, n.º 2, setembro de 2020, páginas 55 a 72, a página 57, acessível in «https://e-publica.pt» (acedido a 14 de maio de 2024).

[125] BRANCA MARTINS DA CRUZ, «Que perspectivas para a responsabilidade civil por dano ecológico? A proposta de Directiva comunitária relativa à responsabilidade ambiental», n.ºs 1 e 2, dezembro de 2001, Lusíada, Revista de Ciência e Cultura, Coimbra Editora, páginas 359 a 374, a página 374.

[126] Preceito que foi alterado pelas Leis Constitucionais nºs 1/82, de 30 de setembro, 1/89, de 8 de julho, e 1/97, de 20 de setembro.

[127] JOSÉ JOAQUIM GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Obra citada, página 845 (anotação ao artigo 66.º).

[128] Aliás, o dano ambiental, durante muito tempo, foi entendido apenas como o que era causado às pessoas, nos seus bens jurídicos da personalidade ou nos seus bens patrimoniais em «consequência de uma alteração adversa no ambiente»; ou seja, «o dano ambiental era concebido sob uma perspetiva antropocêntrica e marcadamente privatística» (cf. ROBERTA TOURINHO DANTAS FRASER, obra citada, páginas 11 e 12; e JOSÉ DE SOUSA CUNHAL SENDIM, «Responsabilidade Civil por Danos Ecológicos», Cadernos CEDOUA, Coimbra, Almedina, 2002, páginas 9 a 58, a página 12). 

[129] Poluição que deve ser entendida, de acordo com JOSÉ JOAQUIM GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, obra citada, página 852 (anotação XVI) «em sentido amplo, pois inclui a poluição das “águas”, das “terras”, e dos “ares”, poluição hídrica, poluição sonora, poluição atmosférica, poluição terrestre) (cfr. Lei de Bases do Ambiente, art.º 21.º)».

[130] Cf. designadamente, JOSÉ JOAQUIM GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, obra citada, páginas 846 e 847, bem como página 786 (em anotação XIII ao artigo 60.º).

[131]Na redação originária do n.º 3 do artigo 66.º da Constituição previa-se que:
     «3. O cidadão ameaçado ou lesado no direito previsto no n.º 1 pode pedir, nos termos da lei, a cessação das causas de violação e a respectiva indemnização».
Com a Lei Constitucional n.º 1/82 passou a dispor:
       «3. É conferido a todos o direito de promover, nos termos da lei, a prevenção ou a cessação dos factores de degradação do ambiente, bem como, em caso de lesão directa, o direito à correspondente indemnização.».
Com a Lei Constitucional n.º 1/89, o referido n.º 3 deixou de constar do preceito, tendo o artigo 52.º da Constituição, sob a epígrafe «Direito de petição e direito de acção popular» (correspondente ao anterior artigo 49.º), passado a consagrar no n.º 3:
     «3 - É conferido a todos, pessoalmente ou através de associações de defesa dos interesses em causa, o direito de acção popular nos casos e termos previstos na lei, nomeadamente o direito de promover a prevenção, a cessação ou a perseguição judicial das infracções contra a saúde pública, a degradação do ambiente e da qualidade de vida ou a degradação do património cultural, bem como de requerer para o lesado ou lesados a correspondente indemnização.».
    E com a Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de setembro, o artigo 52.º, n.º 3, alínea a), passou a estabelecer:
      «3. É conferido a todos, pessoalmente ou através de associações de defesa dos interesses em causa, o direito de acção popular nos casos e termos previstos na lei, incluindo o direito de requerer para o lesado ou lesados a correspondente indemnização, nomeadamente para:
a) Promover a prevenção, a cessação ou a perseguição judicial das infracções contra a saúde pública, os direitos dos consumidores, a qualidade de vida e a preservação do ambiente e do património cultural;
      (…)».
Situação que a revisão instituída pela Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de julho, manteve.

[132] Cf. CARLA AMADO GOMES, «Constituição e Ambiente: Errância e simbolismo», in Veredas do Direito, Belo Horizonte, Brasil, volume 9, n.º 17, Janeiro/Junho de 2012, páginas 9 a 29, a páginas 12 e 13, acessível in: «https://core.ac.uk/download/pdf/287204357.pdf» (acedido a 11 de junho de 2024).

[133] CARLA AMADO GOMES, «Constituição e Ambiente….», página 13; e da mesma Autora, Risco e modificação do acto administrativo concretizador de deveres de protecção do ambiente, Coimbra, Coimbra Editora 2007, páginas 100 e 101.
Aliás, tradicionalmente, a doutrina vem distinguindo entre dano ambiental e dano ecológico. Acerca da distinção, ver designadamente J. S. CUNHAL SENDIM, Responsabilidade civil por danos ecológicos. Da reparação do dano através de restauração natural, Coimbra, Coimbra Editora, 1998, áginas 65 e seguintes e 130 e seguintes; JOSÉ JOAQUIM GOMES CANOTILHO, Responsabilidade Civil por Danos Ecológicos: Da Reparação do Dano através da Restauração Natural, Coimbra, Coimbra Editora, 1998, páginas 400 e seguintes; CARLA AMADO GOMES. «A responsabilidade civil por dano ecológico. Reflexões preliminares sobre o novo regime instituído pelo DL 147/2008, de 29 de Julho», in O que há de novo no Direito do Ambiente?, Actas das Jornadas de Direito do  Ambiente, organização de CARLA AMADO GOMES e TIAGO ANTUNES, Lisboa, AAFDL, 2009, páginas 240 e seguintes.

[134] Cf.  HELOÍSA OLIVEIRA, A reparação do dano ambiental, Lisboa, AAFDL Editora, 2022, páginas 93 e 94.

[135] Cf. CARLA AMADO GOMES, «A responsabilidade civil por dano ecológico. Reflexões preliminares sobre o novo regime instituído pelo Decreto-Lei n.º 147/2008, de 29 de Julho», Revista O Direito, ano 141.º, 2009, volume I, páginas 127-161, a página 137, nota 35, igualmente acessível in «https://huespedes.cica.es/gimadus/20/03_carla_amado_gomes.html» (acedido, pela última vez, a 4 de junho de 2024); CARLA AMADO GOMES, «De que falamos quando falamos de dano ambiental? Direito, mentiras e crítica» in ACTAS DO COLÓQUIO A responsabilidade civil por dano ambiental, organização de CARLA AMADO GOMES e TIAGO ANTUNES, Lisboa, Instituto de Ciências Jurídico-Políticas, 2010, páginas 153 a 171, a página 155, acessível no endereço: «https://www.icjp.pt/sites/default/files/media/icjp_ebook_responsabilidadecivilpordanoambiental_isbn2.pdf» (acedido a 4 de junho de 2024).
 Como refere JOSÉ EDUARDO FIGUEIREDO DIAS, «[u]m sector relevante da doutrina tem defendido, pelo menos antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 147/2008, que “a via mais adequada para protecção da natureza é a que decorre da lógica da protecção jurídica individual”, no sentido de integrar a preservação do ambiente no âmbito da protecção jurídica subjectiva, mediante o recurso aos direitos fundamentais» («Aspectos contenciosos da efectivação da responsabilidade ambiental – A questão da legitimidade , em especial»,  in ACTAS DO COLÓQUIO A responsabilidade civil por dano ambiental, organização de CARLA AMADO GOMES e TIAGO ANTUNES, Lisboa, Instituto de Ciências Jurídico-Políticas, 2010, páginas 274 a 307 , a página 279, acessível no endereço:
«https://www.icjp.pt/sites/default/files/media/icjp_ebook_responsabilidadecivilpordanoambiental_isbn2.pdf» (acedido a 4 de junho de 2024).

[136] Alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 245/2009, de 22 de setembro, 29-A/2011, de 1 de março, 60/2012, de 14 de março, e 13/2016, de 9 de março.
Diploma que, visando desenvolver o regime jurídico estabelecido pelos artigos 41.º e 48.º da (então) Lei de Bases do Ambiente, aprovada pela Lei n.º  11/87, de 7 de abril, e alterada pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, veio estabelecer o regime jurídico da responsabilidade por danos ambientais (RJRDA) e transpor para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2004/35/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, introduzindo, ainda um alargamento do conceito de dano ecológico, no sentido de incluir não só o dano efetivo, mas também o dano iminente [cf. artigos 2.º, n.º 1, 11.º, n.º 1, alíneas b), d) e e)].

[137] ELIANA SILVA PEREIRA, «O regime de prevenção e reparação do dano ecológico: o balanço possível de dez anos de vigência: a perspetiva da ZERO», in O Regime de prevenção e Reparação do Dano Ecológico, coordenação de CARLA AMADO GOMES e RUI TAVARES LANCEIRO, Lisboa, Instituto de Ciências Jurídico-Políticas, 2019, páginas 49 a 70, a página 54, acessível no endereço:
«https://www.icjp.pt/sites/default/files/publicacoes/files/ebook_danoecologico_22jul2019_0.pdf» (acedido pela última vez a 20 de maio de 2024).
Ainda segundo esta Autora, «[o] dano ambiental é o dano cometido a direitos ou interesses alheios por via da lesão de uma componente ambiental, enquanto o dano ecológico consiste no próprio dano causado ao ambiente em si.» (ibidem, página 53).

[138] Cf. HELOÍSA OLIVEIRA, «A restauração natural no novo regime jurídico de responsabilidade civil por danos ambientais» in ACTAS DO COLÓQUIO A responsabilidade civil por dano ambiental, organização de CARLA AMADO GOMES e TIAGO ANTUNES, Lisboa, Instituto de Ciências Jurídico-Políticas, 2010, páginas 252 a 273, a página 253, acessível no endereço:
«https://www.icjp.pt/sites/default/files/media/icjp_ebook_responsabilidadecivilpordanoambiental_isbn2.pdf» (acedido a 4 de junho de 2024).
Para esta Autora (A reparação do dano ambiental, páginas 348 e 360 a 362), o conceito de dano ambiental permite equacionar as duas formas de reparação, ambas in natura: a restauração ecológica («recuperação do elemento natural concretamente afetado ou das funcionalidades no local concretamente afetado»)  e a compensação funcional ecológica (medidas que «visam  criar, expandir ou de alguma forma aumentar a capacidade funcional de outros exemplares de elementos naturais, noutros locais, correspondendo, portanto, a uma substituição, por equivalente funcional, que pode ser total ou parcial»; e para o casos de  impossibilidade de reparação in natura, a compensação pecuniária.

[139] Cf. CARLA AMADO GOMES, «De que falamos quando falamos de dano ambiental? …, página 167; e HELOÍSA OLIVEIRA, A reparação do dano ambiental…, páginas 356 e 357.

[140] Alterada pelo Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de novembro, e pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, tendo sido revogada pelo artigo 24.º da Lei n.º 19/2014, de 14 de abril.

[141] Na Comunidade Europeia, a Avaliação de Impacte Ambiental foi instituída com a formulação da Diretiva 85/337/CEE, de 27 de Junho, publicada no Jornal Oficial (JO) n.º L 175, de 5 de julho de 1985, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no Ambiente (alterada pela Diretiva n.º 97/11/CE do Conselho de 3 de março de 1997 , publicada no JO n.º L 073 de 14 de março de 1997).

[142] Cf. HELOÍSA OLIVEIRA, A reparação do dano ambiental…, página 146.

[143] Que, sob a epígrafe «Indemnizações» dispunha:
     1 - Para efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 48.º da Lei 11/87, de 7 de Abril, o montante de indemnização é calculado com base na estimativa do custo das acções e estudos alternativos à situação antes existente e necessários à minimização dos impactes provocados.
      2 - Na total impossibilidade de fixar o montante da indemnização por recurso à caracterização de alternativas à situação antes existente, são os danos ao ambiente indemnizados como danos não patrimoniais de montante a fixar equitativamente pelo tribunal.»

[144] Aliás, o Decreto-Lei n.º 186/90 viria a ser alterado pelo Decreto-Lei n.º 278/97, de 8 de outubro, e foi regulamentado pelo Decreto Regulamentar n.º 38/90, de 27 de novembro, que, por sua vez, foi alterado pelo Decreto Regulamentar n.º 42/97, de 10 de outubro.

[145] Quer na redação originária quer na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 278/97, de 8 de outubro. E cf. ainda a Diretiva n.º 85/337/CEE artigo 4.º, n.º 2, e Anexo II, ponto 3, alíneas a), b) e j), redação originária; e artigo 4.º, n.º 2, e Anexo II, ponto 3, alíneas a), b), h), e i), na versão conferida pela Diretiva n.º 97/11/CE.

[146] Na redação originária do Decreto Regulamentar n.º 38/90 previa-se no dito anexo (atinente a atividades do anexo III, considerando o disposto no n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 186/90, de 6 de Junho) as infraestruturas «barragens», desde que com altura superior a 15 m contados da base até ao coroamento, ou com volume de armazenamento superior a 100000 m3, ou área da albufeira superior a 5 hectares, ou desenvolvimento do coroamento superior a 500 m, ou, ainda, cuja importância e dimensão da obra fossem suscetíveis de ter condições especiais de fundações ou pudessem pôr em risco populações a jusante (item 4.1). Item que na redação conferida a esse anexo pelo Decreto Regulamentar n.º 42/97, passou a ser o item 10, alínea f), abrangendo igualmente «outras instalações destinadas a reter a água ou a armazená-la a longo prazo» desde que com tais caraterísticas.

[147] E, de acordo com o artigo 9.º, as decisões finais tomadas sobre os projetos apreciados nos termos do presente diploma, bem como os respetivos processos, deviam ser objeto de divulgação pública.

[148] Que viria a ser alterado pelo Decreto-Lei n.º 197/2005, de 8 de novembro (com Declaração de Retificação n.º 2/2006, de 6 de janeiro).

[149] Desde que respeitasse a projetos com 20 ou mais aerogeradores ou se localizados a uma distância inferior a 2 km de outros parques similares; ou com 10 ou mais aerogeradores quando o empreendimento se localizar numa área sensível, mantendo-se igual a distância para outros parques similares. E de acordo com a alínea b) do artigo 2.º do mesmo diploma eram consideradas “áreas sensíveis” todas as áreas protegidas classificadas ao abrigo da legislação então vigente, os sítios de Rede Natura 2000, as Zonas Especiais de Conservação, as Zonas de Proteção Especial e as Áreas de proteção de monumentos nacionais e dos imóveis de interesse público.

[150] E no artigo 40º previa-se a obrigatoriedade de execução de medidas compensação quando, na sequência de uma infração, não fosse possível ao infrator, ou considerado adequado pela autoridade de AIA, a reposição das condições anteriores à infração em causa.

[151] Veio determinar no artigo 3.º, n.º 1, que, para essa produção são necessárias a licença de construção de infraestruturas hidráulicas, a licença de estabelecimento das instalações elétricas, a licença de utilização da água para produção de energia hidroelétrica e a licença de exploração.

[152] «Aproveitamento hidroeléctrico com potência instalada até 10 MW» [artigo 2.º, alínea f)]

[153] Artigo 2.º que estabelece:
      «1 - A política de ambiente visa a efetivação dos direitos ambientais através da promoção do desenvolvimento sustentável, suportada na gestão adequada do ambiente, em particular dos ecossistemas e dos recursos naturais, contribuindo para o desenvolvimento de uma sociedade de baixo carbono e uma «economia verde», racional e eficiente na utilização dos recursos naturais, que assegure o bem-estar e a melhoria progressiva da qualidade de vida dos cidadãos.
      2 - Compete ao Estado a realização da política de ambiente, tanto através da ação direta dos seus órgãos e agentes nos diversos níveis de decisão local, regional, nacional, europeia e internacional, como através da mobilização e da coordenação de todos os cidadãos e forças sociais, num processo participado e assente no pleno exercício da cidadania ambiental.»

[154] E, ainda, as «prestações e as garantias financeiras decorrentes da aplicação do princípio da responsabilidade ambiental, que visam assegurar uma cobertura eficaz às obrigações financeiras dos responsáveis de danos ambientais e respetiva reparação» [alínea f)].Por exemplo, se não é possível não destruir o habitat de uma certa espécie, o proponente deve melhorar as condições ambientais de um local adequado na proximidade para o qual a espécie possa migrar.

[155]Este último princípio constitui fundamento da obrigação compensatória por equivalência quando impossível a restauração in natura determinada após a constatação da lesão (compensação ex post) ou quando decorre de um dano certo e previsível (compensação ex ante) (cf. LUCAS MANOEL ALVES RIBEIRO, Compensação ambiental ex ante - O conjunto normativo, a natureza jurídica e a realidade da compensação ambiental do SNUC no Brasil e um comparativo com a compensação ex ante no sistema legal português, Coimbra, Universidade de Coimbra, 2016, páginas 101 e 102, acessível in «https://estudogeral.uc.pt/handle/10316/40918» (acedido pela última vez, a 2 de julho de 2024).

[156] HELOÍSA OLIVEIRA, A reparação do dano ambiental …, página116.

[157] Cf. SUSANA MARIA DA SILVA AMARAL Análise comparativa da avaliação de impacto ambiental de parques eólicos em Portugal, 2009, Universidade de Lisboa, Faculdade de Ciências, página 12, acessível em:
 «https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/1419/1/20479_ulfc080629_tm.pdf» (acedido a 20 de agosto de 2024).

[158] Diploma que revogou o Decreto-Lei n.º  69/2000, de 3 de maio (artigo 51.º) e transpôs a Diretiva n.º 2011/92/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro, publicada no JO n.º L 26/1, de 28 de janeiro de 2012, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente.

[159] Foi alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 47/2014, de 24 de março, e 179/2015, de 27 de agosto, pela Lei n.º 37/2017, de 2 de junho, e pelos Decretos-Leis n.ºs 152-B/2017, de 11 de dezembro, 102-D/2020, de 10 de dezembro, 11/2023, de 10 de fevereiro (com Retificações n.ºs 7-A/2023, de 28 de fevereiro, e 12-A/2023, de 10 de abril) e 87/2023, de 10 de outubro.

[160] Preceito que sob a epígrafe «Conteúdo» (da Declaração de Impacte Ambiental), estabelece no n.º 4 que:
       «4 - Quando a DIA é favorável condicionada, esta fixa as condições a adotar ao longo das várias fases de desenvolvimento do projeto, que podem incluir, conforme aplicável, as condicionantes à realização do projeto, os elementos a apresentar, as medidas de minimização e de compensação dos impactes ambientais negativos, bem como de potenciação dos impactes positivos, ou os programas de monitorização a adotar».

[161] O RJAIA prevê ainda que, em circunstâncias excecionais e devidamente fundamentadas, um projeto que se encontra sujeito a AIA pode obter dispensa, total ou parcial (artigo 4.º); dispensa (isenção) de AIA que, também com esse caráter de excecionalidade, já se encontrava prevista em anteriores regimes legais (artigos 2.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 186/90, e 3.º do Decreto-Lei n.º 69/2000).

[162] Em especial, no Anexo I, itens n.ºs 2, 15 e 19 e no Anexo II, item n.º 3 [indústria de energia] alíneas a) [Instalações industriais destinadas à produção de energia elétrica, de vapor e de água quente (não incluídos no anexo I)], h) [«Instalações para a produção de energia hidroelétrica», «AIA obrigatória: Potência instalada ≥ 20 MW» (caso geral) e «AIA obrigatória: Todas exceto potência instalada ≤ 1 MW e desde que não impliquem alteração do regime fluvial do curso de água nem implantação de novas infraestruturas hidráulicas» (áreas sensíveis)] e i) [aproveitamento da energia eólica para produção de eletricidade].

[163] De anotar que, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 30-A/2022, de 18 de abril, a entidade licenciadora, no caso de projetos de instalação de centros electroprodutores de fontes de energia renováveis, instalações de armazenamento, de UPAC, as respetivas linhas de ligação à rede elétrica de serviço público (RESP), bem como os projetos de produção de hidrogénio por eletrólise a partir da água, não localizados em áreas sensíveis e abaixo dos limiares estabelecidos no anexo II ao Decreto-Lei n.º 151-B/2013, para efeitos de apreciação prévia e decisão de sujeição a avaliação de impacte ambiental (AIA), quando justificadamente considere que há indícios de que o projeto é suscetível de provocar impactes significativos no ambiente, pode solicitar o parecer prévio à autoridade de AIA, nos termos do n.º 3 do artigo 3.º do mesmo Decreto-Lei de 2013.

[164] Aliás, nos termos do artigo 2.º, alínea k), «Impacte ambiental», é o «conjunto das alterações favoráveis e desfavoráveis produzidas no ambiente, sobre determinados fatores, num determinado período de tempo e numa determinada área, resultantes da realização de um projeto, comparadas com a situação que ocorreria, nesse período de tempo e nessa área, se esse projeto não viesse a ter lugar»].

[165] Item que tem a mesma redação que o item 3 do Anexo III ao Decreto-Lei n.º 69/2000 e uma redação similar  ao item III do Anexo II do Decreto-Lei n.º 186/90.

[166] Por sua vez, a «avaliação de impacte ambiental» (AIA), constitui um «instrumento de carácter preventivo da política de ambiente, sustentado», designadamente na «elaboração de um estudo de impacte ambiental» [artigo 2.º, alínea d)]; e o «estudo de impacte ambiental» (EIA) é o «documento elaborado pelo proponente no âmbito do procedimento de AIA, que contém uma descrição sumária do projeto, a identificação e avaliação dos impactes prováveis, positivos e negativos, que a realização do projeto pode ter no ambiente, a evolução previsível da situação de facto sem a realização do projeto, as medidas de gestão ambiental destinadas a evitar, minimizar ou compensar os impactes negativos esperados e um resumo não técnico destas informações» [artigo 2.º, alínea j)].

[167]  TIAGO ANTUNES, «A decisão do procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental», in Revisitando a Avaliação de Impacto Ambiental, Coordenação de CARLA AMADO GOMES e TIAGO ANTUNES, Lisboa, ICJP, 2014, páginas 207 a 286, a página 261, acessível in «https://www.icjp.pt/sites/default/files/publicacoes/files/ebook_aia.pdf» (acedido pela última vez a 16 de maio de 2024).

[168] E entre as modalidades de compensação de natureza pecuniária encontramos o pagamento para fundos e/ou instituições ambientais como forma de compensação dos impactes dos projetos na biodiversidade, de que é exemplo a medida constante da DIA referente ao  projeto «Avaliação Comparada dos Aproveitamentos Hidroelétricos do Alto Côa e Baixo Sabor», emitida a 15 de junho de 2004 – e, assim ainda no âmbito do Decreto-Lei n.º 69/2000 -. Efetivamente,  no n.º 8 e no n.º VI do Anexo à DIA,  estabelece-se que a proponente (EDP – Gestão da Produção de Energia, S. A.) deve contribuir para a constituição de um fundo financeiro (Fundo Hidroelétrico do Baixo Sabor) que «garantirá a existência de iniciativas de desenvolvimento sustentável com base na valorização ambiental dos recursos naturais e patrimoniais da região, numa ótica de criação de riqueza e de fomento de dinâmicas cívicas e de bem-estar social» (cf. Diário da República nº 233, II Série, de 2 de outubro de 2004 - Despacho Conjunto nº 592/2004; e igualmente acessível in:
 «https://siaia.apambiente.pt/AIADOC/AIA1080/DIA1080.pdf»).

[169] E a decisão de impacte ambiental compete à autoridade de AIA (artigo 19.º, n.º 1), sendo autoridades de AIA a Agência Portuguesa do Ambiente, I. P. (APA, I. P.) e as CCDR nos casos que não cabem à APA (artigo 8.º, n.ºs 1 e 2). Porém, atentas as competências da Autoridade de AIA (artigo 8.º, n.º 3), no caso em que esta seja o proponente, remete a proposta de DIA, para decisão ao membro do Governo responsável pela área do ambiente [artigo 8.º, n.º3, alínea k)].

[170] Ver artigos 148.º do Código do Procedimento Administrativo [aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, e alterado pela Lei n.º 72/2020, de 16 de novembro, e pelo Decreto-Lei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro (corrigido pelas Retificações n.ºs 7-A/2023, de 28 de fevereiro, e 12-A/2023, de 10 de abril)] e artigo 2.º, alínea g), do Decreto-Lei n.º 151-B/2013. Cf. igualmente artigo 120.º do anterior Código do Procedimento Administrativo (CPA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de novembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 6/96, de 31 de janeiro, e revogado pelo referido Decreto-Lei n.º 4/2015.

[171] Cf., entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 5 de abril de 2005, processo n.º 01456/03, do Tribunal Central Administrativo Norte, de 12 de junho de 2008, processo n.º 00898/07.1BECBR, e de 24 de setembro de 2009, processo n.º 00898/07.1BECBR-A; e, doutrinariamente, mormente PEDRO PORTUGAL GASPAR, “A avaliação de impacto ambiental” em Revisa Jurídica do Urbanismo e Ambiente, n.º 14, Dezembro de 2000, Coimbra, páginas 93 a 143, a páginas 128 e 129.

[172]No entanto, no âmbito do Decreto-Lei n.º 186/90, o Supremo Tribunal Administrativo considerava que o despacho que homologava o “parecer” da comissão da avaliação de impacto ambiental, emitido nos termos dos artigos 4.° e seguintes do referido diploma não constituía ato impugnável (contenciosamente recorrível) por não ter «sentido vinculativo para a resolução final a tomar pela Entidade competente», sendo um ato meramente dotado de uma função preliminar e instrumental preordenada à produção do ato final e, assim, um ato interno, que se esgota nesta vocação finalística de preposição do ato final, sem envolver de "per si", a definição autoritária de uma situação jurídica, não provocando, por isso, efeitos lesivos na esfera jurídica dos particulares (acórdão de 18 de abril de 2002, processo n.º  046058; cf., no mesmo sentido, mormente o acórdão do mesmo alto Tribunal de 8 de julho de 1997, processo n.º 041389). Em sentido contrário [ou seja, de que no âmbito do DL 186/90, o «parecer da AIA» (a DIA) constituía um ato administrativo final parcial contenciosamente recorrível/impugnável], LUÍS FILIPE COLAÇO ANTUNES, O Procedimento Administrativo de Avaliação de Impacto Ambiental, Para uma Tutela Preventiva do Ambiente, Almedina Coimbra, 1998, páginas 703 e seguintes.

[173] Sob pena de padecer de ilegalidade (vício de violação de lei), como no-lo mostra o artigo 163.º, n.º 1, do CPA de 2015, se outro vício mais grave não ocorrer (cf. artigo 162.º do mesmo Código).

[174] Diploma que revê a transposição para a ordem jurídica interna da Diretiva n.º 79/409/CEE, do Conselho, de 2 de abril (relativa à conservação das aves selvagens), e da Diretiva n.º 92/43/CEE, do Conselho, de 21 de maio (relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens). Foi corrigido pela retificação n.º 10-AH/99, de 31 de maio e alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 49/2005, de 24 de fevereiro, e 156-A/2013, de 8 de novembro.

[175] Cf. DIANA ETTNER, Articulação com regimes específicos: Avaliação de Impacto Ambiental e Análise de Incidências Ambientais, in O Novo Regime do Setor Elétrico – Comentários ao Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro, coordenação de MIGUEL NOGUEIRA DE BRITO, et alia, Instituto Miguel Galvão Teles, 2024, página 37, acessível in:
«https://www.mlgts.pt/xms/files/site_2018/guias/2024/O_novo_regime_juridico_do_setor_eletrico_-_Comentarios_ao_Decreto-Lei_n.o_15-2022_de_14_de_janeiro.pdf» (acedido, pela última vez, a 22 de agosto de 2024).

[176] Diploma este que foi alterado pelos Decretos-Leis n.ºs: 84/2019, de 28 de junho, 102-D/2020, de 15 de dezembro, e 114/2021, de 15 de agosto (que o republica).

[177] ROBERTA TOURINHO DANTAS FRASER, Medidas Compensatórias e a Tutela da Biodiversidade: Enquadramento Jurídico, Aplicabilidade e Desafios de Operacionalização no Âmbito do Setor Elétrico, Coimbra, Universidade de Coimbra, julho 2015, páginas 8 e 9.

[178] Cf. «Orientações relativas à natureza de aplicação de medidas de compensação no contexto da aplicação do Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de abril, do Instituto de Conservação da Natureza e da Biodivesidade, IP», acessível in «https://www.icnf.pt/api/file/doc/3401bfd118136d67» (acedido pela última vez a 20 de maio de 2024).

[179] Lei de Bases do Ambiente aprovada pela Lei n.º 19/2014, de 14 de abril.

[180] No Direito Internacional, a origem de medidas compensatórias ao ambiente (compensação ecológica ex ante) é atribuída à Convenção de Ramsar ou Convenção sobre zonas húmidas (Convention on Wetlands of International Importance, especially as Waterfowl Habitat), assinada no Irão em 2 de fevereiro de 1971, ao determinar no artigo 4.º, n.º 2, que «[c]aso uma Parte Contratante, devido ao seu interesse nacional urgente, anule ou restrinja os limites da zona húmida incluída na Lista, deverá, na medida do possível, compensar qualquer perda de recursos da zona húmida e em especial criar novas reservas naturais para as aves aquáticas e para a protecção, dentro da mesma região ou noutra, de uma porção apropriada do habitat anterior».
Constitui o primeiro dos Tratados globais sobre conservação da natureza e  entrou em vigor em 1975. Portugal assinou-a em 1980 e foi aprovada para ratificação pelo Decreto n.º101/80, de 9 de outubro, tendo depositado o respetivo instrumento de ratificação em 24 de novembro de 1980, conforme Aviso publicado no Diário da República, 1.ª série, n.º 33, de 9 de fevereiro de 1981).
E a nível de Direito da União Europeia, a compensação ecológica foi inicialmente prevista nas Diretivas n.ºs 79/409/CEE, do Conselho, de 2 de abril (publicada no JO n.º «L 103», de 25 de abril de 1979), relativa à Conservação das Aves Selvagens (artigo 4.º), a qual foi objeto de várias alterações, a última das quais através da Diretiva n.º 2006/105/CE do Conselho, de 20 de novembro de 2006, publicada no JO n.º «L 363» de 20 de dezembro de 2006; e 92/43/CEE, do Conselho, de 21 de maio (publicada no JO n.º «L 206», de 22 de julho de 1992) relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens (artigo 6.º, n.º 4).

[181] Cf. Decreto-Lei n.º 344-B/82, de 1 de setembro, quanto à distribuição de energia elétrica em baixa tensão, em que foi reconhecido, aos municípios concedentes da distribuição em baixa tensão de energia elétrica em Portugal continental, o direito a auferirem uma renda por parte da concessionária (artigo 6.º, n.º 2, redação originária e versão conferida pelo Decreto-Lei n.º 17/92, de 5 de fevereiro) e que era fixada por Portaria (cf. Portaria n.º 1076/82, de 17 de novembro que veio a ser alterada pela Portaria n.º 966/83, de 9 de novembro, e revogada pela Portaria n.º 90-B/92, de 10 de fevereiro, A que sucedeu a Portaria n.º 437/2001, de 28 de abril, corrigida pela Declaração de Retificação n.º 10-C/2001, de 30 de abril; renda que «revestia essencialmente uma natureza remuneratória como contrapartida pela fruição de bens municipais afetos à exploração do serviço» (FILIPE MATIAS SANTOS, Temas de Energia – Reflexões de Direito de Energia…, 2021, página 136. Natureza remuneratória que foi mantida pelo regime que o Decreto-Lei n.º 29/2006 «implantou» [cf. artigos 31.º, n.ºs 1, 3 e 5, e 71.º), o Decreto-Lei n.º 172/2006, complementou e regulou (artigos 2.º, alínea eee), redação originária, 42.º, 43.º, 44.º 69.º e Anexo IV)  e pelo Decreto-Lei n.º 230/2008, de 27 de novembro,, que, estabelecendo a renda devida aos municípios pela exploração da concessão de distribuição de eletricidade em baixa tensão ,veio concretizar o artigo 44.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 172/2006 e revogar a Portaria n.º 437/2001, de 28 de abril]. 

[182] Renda anual que, nos termos do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 424/83, deve ser paga de uma só vez, por depósito a efetuar na sede da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência à ordem dos respetivos municípios até ao dia 31 do mês de março do ano seguinte àquele a que diz respeito, estipulando-se, assim, o prazo e a forma de pagamento.

[183] E, de acordo com o n.º 3 do mesmo artigo 4.º, o valor dos coeficientes de ponderação, no caso de centros termoelétricos a fuelóleo, a carvão ou nuclear, pode ser revisto por portaria conjunto dos Ministros da Indústria e Energia e da Administração Interna, ouvida a EDP.

[184] Todavia, face ao despacho n.º 24567-A/2001, de 3 de dezembro (publicado no Diário da República, n.º 279/2001, 2.º suplemento, 2.ª série, de 3 de dezembro de 2001) da ERSE, a estrutura de tarifas para o fornecimento de energia elétrica foi modificada, o que, designadamente, segundo a «EDP» e a Associação Nacional de Municípios Portugueses, veio inviabilizar a aplicação das fórmulas estabelecidas atinentes ao cálculo das rendas; e, não obstante essa inviabilização, os municípios e o operador continuaram a proceder à sua determinação através da indexação, do último valor da renda calculado com o último valor publicado da tarifa extinta, à inflação tarifária (cf. Protocolo celebrado entre a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e o operador de energia «EDP, Energias de Portugal S.A.», a 27 de fevereiro de 2012, Considerando D. Protocolo acessível in:
 «https://www.anmp.pt/wp-content/uploads/2019/11/AtaMesa4Fev2016.pdf» (acedido pela última vez a 20 de maio de 2024).
Cf. ainda «Relatório Final do Grupo de Trabalho – Despacho n.º 866/2021 - Transmissão dos títulos de utilização de recursos hídricos, relativos aos aproveitamentos hidroelétricos de Miranda, Bemposta, Picote, Baixo Sabor e Foz Tua», maio de 2021, páginas 33 e 34, disponível in:
«https://apambiente.pt/sites/default/files/_Agua/DRH/Licenciamento/UtilizacaoRH/RelatorioFinal_GT_Barragens_Mai2021.pdf» (acedido pela última vez a 3 de maio de 2024).

[185]Preceitos que estabelecem:
«Artigo 2.º
(Cálculo da renda de centros electroprodutores em exploração)
1 - A renda relativa a centros produtores hidroeléctricos em exploração é calculada pela aplicação da seguinte fórmula:
R(índice h) = K x 0,25 P(índice h) [12a + (1000(W(índice h) + C(índice h))/P(índice h)) x b]
sendo:
R(índice h) - a renda relativa ao centro hidroeléctrico h, em contos;
K - parâmetro adimensional = 0,005;
P(índice h) - potência instalada em exploração no centro h, em MW;
W(índice h) - produtividade média do centro h, em GWh/ano;
C(índice h) - capacidade útil de armazenamento do centro hidroeléctrico h, em GWh;
a - taxa de potência da tarifa de MAT, em escudos/kW/mês;
b - média do termo energia da tarifa de MAT, em escudos/kWh.
2 - A renda relativa a centros produtores termoeléctricos em exploração é calculada pela aplicação da seguinte fórmula:
R(índice t) = K x P(índice t) (12a + u(índice t) x b)
sendo:
R(índice t) - a renda relativa ao centro termoeléctrico t, em contos;
K - parâmetro adimensional = 0,005;
P(índice t) - potência instalada em exploração na central t, em MW;
u(índice t) - utilização de referência da central t, em horas:
u(índice t) = 6000 horas para centrais nucleares ou a carvão;
u(índice t) = 3000 horas para centrais a fuelóleo;
u(índice t) = 600 horas para centrais de turbinas a gás;
a - taxa de potência da tarifa de MAT, em escudos/kW/mês;
b - média do termo energia da tarifa de MAT, em escudos/kWh.
3 - Os valores de a e b referidos nos números anteriores serão definidos com base no tarifário, em vigor em 30 de Junho do ano a que respeite a renda.
4 - O valor de K previsto nos n.ºs 1 e 2 poderá ser revisto por portaria conjunta dos Ministros da Indústria e Energia e da Administração Interna, ouvida a EDP.
5 - Os valores dos restantes coeficientes são sancionados por despacho do Secretário de Estado da Energia.
Artigo 3.º
(Cálculo da renda de centros electroprodutores em construção)
1 - A renda relativa a centros electroprodutores em construção é calculada pela aplicação da fórmula indicada nos n.os 1 ou 2 do artigo anterior, conforme se trate, respectivamente, de centros produtores hidroeléctricos ou de centros produtores termoeléctricos, afectada do seguinte coeficiente:
NC/N
sendo:
N - a duração normal da construção do centro electroprodutor, em anos:
N = 8 para centrais nucleares;
N = 6 para centrais hidroeléctricas;
N = 6 para centrais a carvão ou a fuelóleo;
N = 3 para centros termoeléctricos de turbinas a gás;
NC - o número de anos completos e ininterruptos de trabalhos de construção no sítio.
2 - Sempre que no coeficiente indicado no número anterior NC seja maior que N, será tomado o valor 1 para o coeficiente».

[186] Cf. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 424/83.

[187] Cf. artigos 3.º, n.º 2,  da Lei Geral Tributária  e 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição.

[188] Cf. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2 de maio de 1991, processo n.º     026126.

[189] Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 344/2019 (processo nº 673/17), de 4 de junho de 2019, acessível como os demais acórdão do mesmo Tribunal, no sítio:
«https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/».

[190] Cf. SÉRGIO VASQUES, As Taxas de Regulação Económica em Portugal, Almedina, Coimbra, 2008, página 38.

[191] Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 539/2015 (processo n.º 27/15), de 21 de outubro de 2015.

[192] Cf. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 339-C/2001 e CARLA AMADO GOMES, RAQUEL FRANCO e DIOGO CALADO, «Energias renováveis em Portugal: evolução e perspectivas"», na Revista Eletrónica de Direito Público, e-Publica, Vol. I, n.º l, Janeiro 2014, páginas 365 a 398, a página 386, disponível nos sítios «https://e-publica.pt» e
«https://catalogobib.parlamento.pt:82/images/winlibimg.aspx?skey=&doc=132581&img=18481&res=150» (acedido, pela última vez, a 2 de julho de 2024). Ver, no mesmo sentido, INÊS VIEIRA, idem, página 353, que acrescenta:
      «Neste contexto, é hoje usual a celebração de protocolos entre os municípios e os titulares de centros eletroprodutores de fonte renovável, no âmbito dos quais os segundos se obrigam, perante os primeiros, ou ao pagamento de determinados montantes - que aqui chamamos de "renda" - ou à execução gratuita de operações urbanísticas díspares (frequentemente reconduzidas a equipamentos públicos)».

[193] Cf. INÊS VIEIRA, obra citada, páginas 352 a 353; cf. no mesmo sentido, no que concerne as rendas previstas no Decreto-Lei n.º 424/82, RUI RIBEIRO LIMA e INÊS VIEIRA, obra citada, página 40, em que expendem que os municípios:
      «Desde cedo (…) exigem aos titulares de centro eletroprodutor de fonte renovável a realização de cedências ou o pagamento de compensações em virtude da implantação de centro eletroprodutor nas suas circunscrições».
Exigências que se consubstanciam, de acordo com os mesmos autores (na mesma obra, páginas 40 e 41), em compensações monetárias (a título de renda, mensal ou anual, ou únicas) ou em compensações não pecuniárias, sendo o enquadramento legal dessas pretensões, até ao início da vigência do Decreto-Lei n.º 15/2022, as rendas previstas no Decreto-Lei n.º 424/83 e no Anexo II do Decreto-Lei n.º 189/88, que eram as únicas legalmente previstas.

[194] Esta obrigação dos produtores independentes de energia elétrica em instalações eólicas para CARLA AMADO GOMES, «levanta (…) algumas dúvidas de compatibilização, quer com o princípio da proporcionalidade na vertente da indispensabilidade (por ligação ao direito de iniciativa económica), quer com a proibição de discriminação (tarifária, é certo), decorrente da Directiva 77/2001, dos produtores de electricidade a partir de fontes de energia renovável em face dos restantes. É verdade que os parques eólicos podem causar alguns prejuízos aos Municípios (v.g., quando se situem em zonas sensíveis e afectem o turismo; ou se provocam incómodos, nomeadamente algum ruído, a residentes nas imediações); mas não é menos certo que os parques geram investimento, na construção e na manutenção, o que traz benefícios…Parece-nos que o legislador poderia ter previsto o pagamento de uma taxa aos Municípios, mas deveria ter-se abstido de fixar a percentagem e ter avançado alguns critérios de determinação diferenciada do percentual aplicável» («O regime jurídico da produção de electricidade a partir de fontes de energia renováveis: aspectos gerais», Lisboa, maio de 2019, páginas 1 a 62, a página 53, acessível no sítio:
«https://www.fd.ulisboa.pt/wp-content/uploads/2014/12/Gomes-Carla-Amado-O-regime-juridico-da-producao-de-electricidade-a-partir-de-fontes-de-energia-renovaveis-aspectos-gerais1.pdf», acedido pela última vez a 24 de junho de 2024).

[195] Artigo 15.º que, com a epígrafe «Norma revogatória», a propósito, dispunha:
      «(…)
      2 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, são revogados:
       a) O Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, republicado pelo Decreto-Lei n.º 168/99, de 18 de maio, e alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 312/2001, de 10 de dezembro, 339-C/2001, de 29 de dezembro, 33-A/2005, de 16 de fevereiro, e 225/2007, de 31 de maio;
      (…)
     4 - O artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 33-A/2005, de 16 de fevereiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 225/2007, de 31 de maio, e as condições remuneratórias da eletricidade referidas no anexo ii do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, na redação aplicável à data de entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 33-A/2005, de 16 de fevereiro, mantêm-se em vigor relativamente aos centros eletroprodutores a que as referidas condições remuneratórias são aplicáveis, nos termos do n.º 1 do referido artigo 4.º
      5 - Sem prejuízo do disposto no n.º 3 relativamente aos procedimentos concursais lançados e com exceção dos centros eletroprodutores incluídos no âmbito do número anterior, mantêm-se em vigor o artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 33-A/2005, de 16 de fevereiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 225/2007, de 31 de maio, e o anexo ii ao Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, republicado pelo Decreto-Lei n.º 168/99, de 18 de maio, e alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 312/2001, de 10 de dezembro, 339-C/2001, de 29 de dezembro, 33-A/2005, de 16 de fevereiro, e 225/2007, de 31 de maio, relativamente aos centros eletroprodutores cujos titulares ou promotores:
      a) Tenham obtido a respetiva licença de exploração até à data da entrada em vigor do presente decreto-lei;
      b) Tenham obtido a respetiva autorização de instalação ou licença de estabelecimento até à data da entrada em vigor do presente diploma e venham obter a respetiva licença de exploração no prazo de 12 meses a contar da data da entrada em vigor do presente decreto-lei ou, se ocorrer mais tarde, no prazo de 24 meses ou, no caso das pequenas centrais hídricas, de 36 meses, a contar da data de emissão da referida autorização de instalação ou licença de estabelecimento; ou
     c) Tenham, previamente à data de entrada em vigor do presente decreto-lei, beneficiado da atribuição de um ponto de receção e venham a obter a respetiva autorização de instalação ou licença de estabelecimento no prazo de seis meses a contar da data da entrada em vigor do presente diploma, bem como a licença de exploração nos prazos previstos na alínea anterior.
      6 - Ficam expressamente excluídos do disposto no número anterior e abrangidos pela revogação prevista no n.º 2 os titulares de informações prévias favoráveis emitidas pela DGEG em data anterior à entrada em vigor do presente decreto-lei que, até essa data, não sejam titulares de ponto de receção.
      7 - Mantém-se em vigor o n.º 27 do anexo ii do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, republicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 168/99, de 18 de maio, alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 312/2001, de 10 de dezembro, 339-C/2001, de 29 de dezembro, 33-A/2005, de 16 de fevereiro, e 225/2007, de 31 de maio.
(…)».

[196] Com efeito, o item n.º 33 do Anexo II que, com o Decreto-Lei n.º 33-A/2005, de 16 de fevereiro -  que procedera a atualização dos valores constantes da fórmula de remuneração de eletricidade produzida a partir de recursos renováveis e estabeleceu a aplicabilidade da remuneração garantida durante um prazo considerado suficiente para a recuperação dos investimentos realizados e para a obtenção de um retorno económico mínimo (cf. Preâmbulo do mesmo Diploma e do Decreto-Lei n.º 35/2013, de 28 de fevereiro -, passou a constituir o n.º 27 do mesmo Anexo II, revogando o item 33, e, por força do Decreto-Lei n.º 35/2013, passou, com nova redação, a constituir o item n.º 28 do referido anexo.
Aliás, o regime remuneratório dos Centros electroprodutores eólicos com regime anterior ao Decreto-Lei n.º 215-B/2012, de 8 de outubro (submetidos ao anexo II do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio) veio a ser alterado pelo Decreto-Lei n.º 35/2013, de 28 de fevereiro, que republicou esse anexo.

[197]No que respeita à renda municipal exigida às centrais eólicas, o Decreto-Lei n.º 172/2006 e a Portaria n.º 243/2013, de 2 de agosto, não estabeleceram obrigação equivalente à que resultava do Decreto-Lei 189/88, prevista no anexo II do Decreto-Lei n.º 189/88, apesar de a norma revogatória do Decreto-Lei n.º 215-B/2012 ter expressamente determinado a manutenção em vigor da obrigação de pagamento da renda nos moldes até então vigentes, ao estabelecer no n.º 7 do artigo 15.º que se mantinha apenas em vigor o item n.º 27 desse anexo (cf. CATARINA BRITO FERREIRA e JOANA ALVES ABREU, idem, página 271, nota 18).  

[198] Cf., neste sentido, INÊS VIEIRA, idem, página 359.

[199] INÊS VIEIRA, idem, página 359.

[200] Corrigido pela Declaração de Retificação n.º 14-A/2022, de 26 de abril, e alterado pelos Decretos-Leis n.ºs  72/2022, de 19 de outubro,  11/2023, de 10 de fevereiro, e 22/2024, de 19 de março.

[201] Diploma que surgiu por a aprovação da alteração legislativa que o mesmo contempla ser « urgente, inadiável e indispensável, desde logo para a concretização das políticas públicas de transição energética territorialmente justa e ecologicamente responsável, cruciais à transformação da economia nacional», pelo que da sua «não aprovação do presente decreto-lei sempre resultaria num grave prejuízo para o interesse público, fazendo cessar um conjunto de medidas que se têm revelado fundamentais para o cumprimento das metas ambientais internacionalmente assumidas por Portugal», pois a continuidade da execução das medidas constantes no Decreto-Lei 30-A/2022, de 18 de abril, na sua redação em vigor, no contexto mostra-se necessária para garantir que existam «instrumentos que adequadamente contribuem para acelerar uma transição energética territorialmente justa e ecologicamente responsável» (cf. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 22/2024).

[202] Com efeito, o artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 30-A/2022, na redação dada pelo artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 22/2024, de 19 de março, passou a dispor:
«O presente decreto-lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e vigora até 31 de dezembro de 2024».

[203] Regulamento que veio estabelecer as condições para a sua operacionalização da atribuição dessa Compensação aos Municípios.

[204] Publicado in Diário da República, II série, Parte C, n.º 108/2023, de 5 de junho, páginas 80 a 82.

[205] Cf., preâmbulo do Despacho n.º6195/2023 no que tal se expende que tal compensação «tem como principal objetivo contribuir para o desenvolvimento local dos municípios nos quais os projetos de produção de energia de fontes renováveis e de armazenamento de eletricidade se localizam».

[206] E a não instalação do centro electroprodutor e/ou instalação de armazenamento por motivo imputável ao beneficiário constitui -o na obrigação de devolução do apoio concedido (cf. item n.º 6.2, do indicado Regulamento para a atribuição dessa Compensação aos Municípios).

[207] Em 2023, os encargos previstos com a presente medida não podiam exceder treze milhões de euros, sendo realizado em 2024 o pagamento a beneficiários elegíveis cuja compensação não teve dotação disponível em 2023 (cf. itens n.ºs 4.4 e 5.5 do indicado Regulamento para a atribuição dessa Compensação aos Municípios).

[208] Compensações que, nos termos do artigo 6.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 18/2024 de 2 de fevereiro, passaram a ser devidas aos municípios mesmo depois de decorrido o prazo de vigência do Decreto-Lei 30-A/2022, de 18 de abril, na sua redação então vigente (ou seja, antes da alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 22/2024.

[209]Cf. INÊS VIEIRA, idem, página 368.

[210] Compensação que é atribuída através de protocolo a celebrar entre o município e o operador da RESP, nos termos do qual o município se compromete a permitir a instalação ou atravessamento do seu território com vista à concretização de projeto elétrico estratégico de grande impacto, podendo ser atribuída, por acordo das partes, através de transferência financeira ou em espécie (artigo 4.º, n.ºs 3 e 4) e sendo suportada pelo operador da RESP (artigo 5.º, n.ºs 1 e 2).

[211] Interpolado nosso.
 Cabe ainda anotar que, como o legislador claramente o diz no proémio do mesmo diploma:
     «[T]ais compensações, ao serem elegíveis para as tarifas, enquanto custos de interesse económico geral nos termos do disposto nas alíneas c) e e) do n.º 2 do artigo 208.º do Decreto-Lei 15/2022, de 14 de janeiro, na sua redação atual, permitem o financiamento do presente mecanismo de compensação, o qual importa regulamentar, nos termos de portaria a aprovar».

[212] Retificada pela  Declaração de Retificação n.º 46-B/2013, de 1 de novembro, e alterada pelas Leis n.ºs 82-D/2014, de 31 de dezembro, 69/2015, de 16 de julho, 132/2015, de 4 de setembro, 7-A/2016, de 30 de março (com Declaração de Retificação n.º 10/2016, de 25 de maio), 42/2016, de 28 de dezembro,   114/2017, de 29 de dezembro, 51/2018, de 16 de agosto (com Retitificação n.º 35-A/2018,  de 12 de outubro), 71/2018, de 31 de dezembro, 2/2020, de 31 de março,  66/2020, de 04 de novembro, 29/2023, de 4 de julho, e 82/2023, de 29 de dezembro.

[213] Com efeito, o artigo 10.º da Lei n.º 2/2007, de 15 de janeiro, preceituava de modo similar ao artigo 14.º da Lei n.º 73/2013 considerando, assim, serem receitas do município mormente o produto da cobrança dos impostos municipais a cuja receita têm direito, designadamente o imposto municipal sobre imóveis (IMI), e outras receitas estabelecidas por lei ou regulamento a favor dos município [cf. alíneas a) e m)]. Por sua vez, o artigo 16.º da Lei n.º 42/98, de 6 de agosto, que determinava serem receitas do município designadamente o produto da cobrança dos impostos a que os municípios tenham direito, designadamente a contribuição autárquica, imposto municipal sobre veículos e o imposto municipal de sisa [alínea a)] e outras receitas estabelecidas por lei a favor dos municípios [alínea o)].
O artigo 4.º da Lei n.º 1/87, de 6 de janeiro, determinava que constituiam receitas do município mormente o produto da cobrança de Contribuição predial rústica e urbana [alínea a), item 1], o produto da cobrança de taxas por licenças concedidas pelo município [alínea g)] e outras receitas estabelecidas por lei a favor dos municípios [alínea q)].
O Decreto-Lei n.º 98/84, de 29 de março determinava no artigo 3.º que constituíam receitas do município, designadamente a totalidade do produto de cobrança da Contribuição Predial Rústica e Urbana e outras receitas estabelecidas por lei a favor dos municípios [n.º1, alíneas a), ponto 1, e p)].

[214] Corrigido pela Declaração de Retificação n.º 4/2004, de 9 de janeiro, e alterado por várias Leis e Decretos-leis, tem a última sido introduzida pela Lei n.º 82/2023, de 29 de dezembro.

[215] Cf. o Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 45104, de 1 de julho de 1963.

[216] Cf. «Relatório Final do Grupo de Trabalho – Despacho n.º 866/2021 - Transmissão dos títulos de utilização de recursos hídricos, relativos aos aproveitamentos hidroelétricos de Miranda, Bemposta, Picote, Baixo Sabor e Foz Tua», maio de 2021, página 53, disponível in:
«https://apambiente.pt/sites/default/files/_Agua/DRH/Licenciamento/UtilizacaoRH/RelatorioFinal_GT_Barragens_Mai2021.pdf» (acedido pela última vez a 3 de maio de 2024).

[217] Que corresponde ao artigo 106.º, n.º 2, da redação originária da Constituição.

[218] Lei que foi aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro, alterado por vários diplomas legais, sendo a última introduzida pela Lei n.º 82/2023, de 29 de dezembro.

[219] Cf. ANA PAULA DOURADO, Direito Fiscal, Coimbra, Almedina, 2.ª Edição, 2018, página 191.

[220] E a tributação do património deve contribuir para a igualdade entre os cidadãos, nos termos do artigo 104.º, n.º 3, da Constituição.

[221] Preceito que, sob a epígrafe «Princípio da igualdade», estabelece:
      «1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
      2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.»

[222] Cf. DOMINGOS PEREIRA DE SOUSA, Direito Fiscal e Processo Tributário, Coimbra, Coimbra Editora, 2013, páginas 91 a 92; e  PEDRO SOARES MARTINEZ, Direito Fiscal, 10.ª edição, Coimbra, Almedina 1998, página 105.

[223] Acórdão do Tribunal do Constitucional n.º 590/2015, processo n.º 542/2014, de 11 de novembro de 2015. Cf. também, entre outros, os acórdãos do mesmo Alto Tribunal n.ºs 84/2003, processo n.º 531/1999 , de 12 de fevereiro de 2003; e nº 695/2014, processo n.º 1265/2013, de 15 de outubro de 2014.

[224] Cf. J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa, volume I, Coimbra, Coimbra Editora, 4.ª edição, 2007, páginas 336-337 (em anotação I ao artigo 13.º); e acórdão do Tribunal Constitucional n.º 437/06 (processo n.º 349/05), de 12 de julho de 2006.

[225] JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, Volume I, 2.ª edição, Universidade Católica Editora, 2017, página 164 (anotação III ao artigo 13.º).

[226] Obra citada, página 339 (em anotação IV ao artigo 13.º).

[227] Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República n.º 4/1990, de 22 de março de 1990.

[228] Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 546/2011 (processo n.º 17/2011), de 16 de novembro de 2011; cf. ainda Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 232/2003 (processo n.º 306/2003), de 13 de maio de 2003.

[229] J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, obra citada, página 340 (em anotação VI ao artigo 13.º).

[230] Cf. designadamente, os acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 348/97, processo n.º 63/1996, de 29 de abril de 1997, e 57/95, processo n.º 45/1988, de 16 de fevereiro de 1995

[231] Alterações, nesse período, igualmente veiculadas, desde logo, pelos Decretos-Leis n.ºs 183/95 a 188/95, e, sequentemente, pelos Decretos-Leis n.º 184/2003 (ao definir as condições de exercício, em regime de mercado, das atividades de comercialização e de importação e exportação de energia elétrica) e 185/2003 (ao estabelecer as regras gerais que permitem a criação de um mercado livre e concorrencial de energia elétrica).

[232]   Cf. a propósito, os artigos 28.º do Decreto-Lei n.º 99/91,  68.º  do Decreto-Lei n.º 182/95, 54.º do Decreto-Lei n.º 183/95, 42.º do Decreto-Lei n.º 187/95,  7.º do Decreto-Lei 56/97, artigo único do Decreto-Lei n.º 24/99,  e 7.º do  Decreto-Lei n.º 198/2000.
Aliás, nos demais diplomas referidos na nota anterior e nos demais que procederam a alteração ao Decreto-Lei n.º 182/95 não conta qualquer norma revogatória expressa de qualquer normativo ou diploma legal.

[233] Cf. JOSÉ JOAQUIM GOMES CANOTILHO, «A lei do Orçamento na teoria da lei», em Estudos em Homenagem ao Prof. Teixeira Ribeiro, BFDC, II, Imprenta, Coimbra, Universidade de Coimbra, 1979, página 558.

[234]Cf. FILIPE MATIAS SANTOS, «Evolução histórica e organização do setor elétrico», em Estudos de Direito da Energia, coordenação de FRANCISCO PAES MARQUES e JOÃO MARQUES MENDES, Almedina, Coimbra, 2023, in páginas 37 a 54, a página 38.

[235] Cf. MANUEL CASSIANO NEVES, A Produção de Eletricidade em Portugal em Regime Ordinário: Evolução e Perspetivas, Instituto de Ciências Jurídico-Políticas, Centro de Investigação de Direito Público, 2017, pagina 5, acessível in:
 «https://icjp.pt/sites/default/files/papers/producao_de_electricidade_em_portugal.pdf» (acedido , pela última vez, a 2 de julho de 2024).

[236] O sistema de monopólio legal da EDP esvaiu-se na verdade, em 1991, na medida em que se determinou no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 99/91, que, fora do âmbito da concessão de serviço público da Rede Nacional de Transporte de Energia Elétrica, o estabelecimento do livre acesso «às actividades de produção, transporte e distribuição de energia eléctrica, a exercer mediante licença a atribuir».

[237] Princípio que está igualmente consagrado no Direito da União Europeia (cf. artigos 101.º a 113.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia).

[238] Cf. igualmente artigos 81.º e 82.º do Tratado que institui a CE, versão consolidada, publicada in JO, n.º C 325, de 24 de dezembro de 2002, páginas 33 a 184. 

[239] Cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 3 de abril de 2014, processo n.º 627/09.5TVLSB.L1.S1.

[240] Cf. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 496/2010, processo n.º 964/09, de 15 de dezembro de 2010.

[241] Cf. INOCÊNCIO GALVÃO TELLES, Introdução ao Estudo do Direito, Coimbra, Coimbra Editora, 2001, volume I, 11.ª edição (reimpressão), página 107.

[242] Cf. ANTÓNIO PINTO MONTEIRO, Cláusulas Limitativas e de Exclusão da Responsabilidade Civil, Coimbra, Universidade de Coimbra, página 26, mesma nota 31.

[243] Cf. JOÃO BAPTISTA MACHADO, obra citada, páginas 190 e 191.

[244] INOCÊNCIO GALVÃO TELLES, obra citada, páginas 106, 107 e 114.

[245] Cf. mormente JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito - Introdução e Teoria Geral, Coimbra, Almedina, 2005, 13.ª edição, página 310; CASTRO MENDES, Introdução ao Estudo do Direito (Edição revista pelo Prof. MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA), Lisboa, edição Pedro Ferreira, 1994, páginas 103 e 104; e JOÃO BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, Coimbra, 17.ª reimpressão, 2008,, páginas 190 e 191.

[246] Cf. mormente o Protocolo celebrado entre a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e o operador de energia «EDP, Energias de Portugal S.A.», a 27 de fevereiro de 2012, Considerando «C». Protocolo acessível in:
 «https://www.anmp.pt/wp-content/uploads/2019/11/AtaMesa4Fev2016.pdf» (acedido pela última vez a 20 de maio de 2024).
 

[247] Em todo o caso, essa conduta (omissiva) poderá eventualmente ser causa de responsabilidade civil extracontratual, nos termos do regime de responsabilidade civil do Estado e de Pessoas Coletivas Públicas (Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro, alterada pela Lei n.º 31/2008, de 17 de julho).

[248] Cf. JOÃO BAPTISTA MACHADO, obra citada, página 165.

[249] O preâmbulo é um texto de carácter não normativo, não podendo extrair-se do seu teor uma dimensão que, por natureza, dele está ausente. As notas preambulares têm como função explicar sinteticamente as principais soluções legais, apontando, amiúde, apenas as novidades que o diploma introduz na ordem jurídica. Limitam-se tão só a enunciar as novidades introduzidas na ordem jurídica, pelo que se deve primar pelo rigor acerca do vertido no articulado normativo. Se por qualquer razão, por exemplo, o menor rigor do preâmbulo, constar qualquer referência que não tem suporte direto no articulado legal, daí não pode concluir-se que o teor daquele se deve ter como constando – de forma direta ou indireta – neste (cf. DAVID DUARTE, ALEXANDRE SOUSA PINHEIRO, MIGUEL LOPES ROMÃO E TIAGO DUARTE, Legística – Perspectivas sobre a Concepção e Redacção de Actos Normativos, Coimbra, Almedina, 2002, página 208.

[250] A aprovação e publicação dos Decretos-Leis n.ºs 184/2003 e 185/2003 ocorreram durante a governação do XV Governo Constitucional, enquanto o Decreto-Lei n.º 29/2006 foi aprovado e publicado durante a governação do XVII Governo Constitucional.

[251] De anotar que após, cerca de seis anos da vigência dos Decretos-Leis n.ºs 29/2006 e 172/2006, aquando da análise da Proposta de Lei n.º 103/ XII (Orçamento de Estado para 2013), a ANMP apresentou parecer e propostas, juntando, no que concerne a assuntos a acrescentar à proposta de lei, o articulado de um preceito, sob a epígrafe «Autorização legislativa no âmbito dos centros electroprodutores», em que se determinava que ficava o Governo autorizado a legislar sobre a renda anual a pagar pelas entidades que, em cada momento, realizassem a respetiva exploração industrial, aos municípios cuja circunscrição geográfica se encontre abrangida pelas áreas de influência dos centros electroprodutores em regime ordinário, fixando o sentido e extensão da autorização, constando o (ante)projeto de diploma (decreto-lei)  do Anexo III. Anteprojeto de Decreto-Lei que, conforme se expende no preâmbulo proposto, visava o estabelecimento de «uma nova metodologia de fixação das rendas devidas aos municípios pelas entidades que, em cada momento, realizem a exploração industrial de centros electroprodutores em regime ordinário».
Fundamenta a invocada necessidade imperiosa de promover a adaptação atualizante do regime legal instituído pelo Decreto-Lei n.º 424/83 «[n]as alterações legislativas verificadas nos últimos anos, quer quanto à estrutura organizativa e regime jurídico do SEN, quer ao nível das tarifas eléctricas a aplicar, quer resultantes da entrada no mercado de eletricidade de novos operadores de produção».
De acordo com esse anteprojeto, os municípios cuja circunscrição geográfica se encontrasse abrangida pelas áreas de influência dos centros electroprodutores em regime ordinário tinham direito ao recebimento de uma renda anual a pagar pelas entidades que, em cada momento, realizassem a respetiva exploração industrial, nos termos previstos no presente diploma (artigo 1.º, n.º1). E no artigo 7.º, n.º 2, previa-se que com a sua entrada em vigor fosse revogado o Decreto-Lei n.º 424/83, de 6 de dezembro. 
Acessível em:

«https://app.parlamento.pt/webutils/docs/doc.pdf?path=sUxatyfESBeHWSrSF0q77Mi1dqGMCW5AfCldW91JeDRRnahHt%2FW42lHOPpYwJ15vnMx9sQQhHEvKf3zimW5xs03wRIqbCxkxwmePpvk9DrkLqv6eUBgZP80rSEhpaxEhC6zz7HDT0bsM5nAzkEDkbH6BxTpQ8wHNF%2FBgIFYqEDzJDLN8Rgc6tlY%2Bp%2Bq79POnCxIIxiJJ2TYrktwqIrI80Ye3nP%2FUES2ZDu%2BpAdJjQkQ84h7KHU2RImtRzNb9JY8Zcurk%2Fnz9lXF87lOR6P7ZILYg2uSIoW6hmrt9T%2FppZCmABkN6eiFbyWYqQyWdLgPk&fich=ANMP.pdf&Inline=true». (Acedido, pela última vez, a 18 de abril de 2024).
 Tal proposta não veio a ser acolhida pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro de 2012 (Lei do Orçamento de Estado para 2013), nem mereceu repercussão positiva ou similar nas alterações subsequentes aos Decretos-Leis n.º 29/2006 e 172/2006.

[252] Alterado pela Lei n.º 30/2006, de 11 de julho.

[253] Diploma que aprova o regime de proteção das albufeiras de águas públicas de serviço público e das lagoas ou lagos de águas públicas e foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 26/2010, de 30 de maio.

[254] Na verdade, o turismo cultural e de natureza de um rio em estado natural, nas várias dimensões - como as de observação da fauna e da flora, de caminhada (pedestrianismo), de desportos de águas brancas e de visita a locais a arqueológicos ou históricos –, mostra-se necessariamente afetado, podendo, no entanto, dar lugar ao denominado «turismo de albufeira».
É de anotar que tais complexos também trazem benefícios económicos e sociais, como o fornecimento de energia e água potável e a minimização dos problemas da escassez de água.

[255] E de modo necessário afetam a fauna e a flora e, em geral, os ecossistemas e a biodiversidade (tanto mais que os sistemas lóticos são substituídos por sistemas lênticos, com consequente alteração do regime de caudais), a qualidade dos parâmetros físico-químicos da água, devido ao seu represamento e às consequentes mudanças da temperatura e sedimentação de material sólido.

[256]Obra citada, páginas 351 a 373, a páginas 353, 354-355 e 372.

[257] Cf. GUILHERME ALVES MOREIRA, Instituições do Direito Civil Português, volume primeiro, Parte Geral, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1907, páginas 20 e 21, acessível in:
«https://www.fd.unl.pt/Anexos/Investigacao/1228.pdf« (acedido pela última vez a 8 de maio de 2024).
Cf. igualmente LUIZ DA CUNHA GONÇALVES, Tratado de Direito Civil em Comentário ao Código Civil Português, volume 1.º, Coimbra Editora, Coimbra (1929), páginas 156 e 157-

[258] GUILHERME ALVES MOREIRA, Obra citada, página 21.
 

[259] Cf. referido «Relatório Final do Grupo de Trabalho – Despacho n.º 866/2021, páginas 33  e indicado Protocolo de 27 de fevereiro de 2012, Considerando «E».
 

[260] INOCÊNCIO GALVÃO TELLES, obra citada, página 107.

[261] Cf. JOÃO BAPTISTA MACHADO, obra citada, páginas 190 e 191.

[262] Cf. ANTÓNIO PINTO MONTEIRO, Cláusulas Limitativas e de Exclusão da Responsabilidade Civil, Coimbra, Boletim da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, 1985, página 25, nota 31.

[263] Cf. JOÃO BAPTISTA MACHADO, obra citada, páginas 190 e 191.

[264] Cf. ANTÓNIO PINTO MONTEIRO, obra citada, página 26, mesma nota 31.

[265] Cf. ANTÓNIO PINTO MONTEIRO, obra citada, página 61.

[266] Cf. MANUEL A. DOMINGUES DE ANDRADE, Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leis, Coimbra, Arménio Amado – Editor, Sucessor, 3.ª edição, 1978, página 64.

[267] Cf. neste sentido, INÊS VIEIRA, obra citada, páginas 355 e 372

[268] KARL LARENZ, Metodologia da Ciência do Direito, 3ª.edição, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian,2009, página 243.

[269] Cf. CASTANHEIRA NEVES, Metodologia Jurídica, 1993Stydia Iyridica, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, Coimbra Editora página 108.

[270] Cf. parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República  n.º 126/2005.

[271] O título de reserva de capacidade de injeção na RESP confere ao seu titular o direito à utilização do ponto de injeção na RESP com a capacidade que lhe for atribuída, de forma firme ou com restrições, enquanto vigorar a licença de exploração que lhe corresponde (artigo 18.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 15/2022).
 
Legislação
CRP76 ART76 ART85; DL 424/83 DE 1983/12/06; DESPACHO 24567-A/201; DL 29/2006 DE 2006/02/15; DL 339-C/2001 DE 2001/12/29; DL 15/2022 DE 2022/01/15; L 202 DE 1946/12/26; DL 43335 DE 1960/11/19; DL 205-G/75 DE 1975/04/16; L 11/90 DE 1990/04/05; DL 7/91 DE 1991/03/02; DL 99/91 DE 1991/03/02; DL 131/94 DE 1994/05/19; DL 449/88 DE 1988/12/10; DL 182/95 DE 1995/06/27; DL 168/99 DE 1999/05/18; DL 29/2006 DE 2006/02/15; RCM 169/2005 DE 2005/10/24; DL 172/2006 DE 2006/08/23; DL 215-A/2012 DE 2012/10/08; DL 215-B/2012 DE 2012/10/08; DL 49/2019 DE 2019/04/15; L 11/1987 DE 1987/04/07; DRGU 38//90 DE 1990/11/27; DL 140/99 DE 1999/04/24; DL 15/2022 DE 2022/01/15; DL 69/2000 DE 2000/05/03; DL 189/88 DE 1988/05/27; CCIVIL 1966 ART7 ART9 ART483; L 2002 DE 1944/12/26; DL 39480 DE 1953/12/24; DL 39480 DE 1953/12/24; L 12559 DE 1926/10/20; L 73/2013 DE 2013/09/03; DL 30-A/2022 DE 2022/04/18; DL 35/2013 DE 2013/02/28; DL 33-A/2005 DE 2005/02/16; DL 344-B/82 DE 1982/09/01; DL 42-A/2016 DE 2016/08/12; DL 76/2019 DE 2019/06/03; CPA2015 ART148; DL 151-B/2013 DE 2013/10/31, PORT 295/2002 DE 2002/03/19; L 19/2014 DE 2014/04/14; DRGU 42/97 DE 1997/10/10; DL 186/90 DE 1990/06/06; DL 147/2008 DE 2008/07/29; DL 60/2012 DE 2012/03/14; DL 20/81 DE 1981/01/28; L 21/82 DE 1982/07/28.   
 
Jurisprudência
AC STA DE 2002/04/18; AC STA DE 1997/07/08; AC STA DE 2005/04/05; AC TCAN DE 2008/06/12;
 
Referências Complementares
DIR ADM / DIR COMUNITÁRIO
DIRETIVA 2003/54/CE;
DIRETIVA 2012/27/UE
DIRETIVA 2008/2011/UE
DIRETIVA 2019/944/UE 
 
CAPTCHA
Resolva este simples problema de matemática e introduza o resultado. Por exemplo para 1+3, digite 4.