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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
16/2020, de 06.08.2020
Data do Parecer: 
06-08-2020
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Educação
Relator: 
Eduardo André Folque da Costa Ferreira
Votantes / Tipo de Voto / Declaração: 
Eduardo André Folque da Costa Ferreira

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Eduardo André Folque da Costa Ferreira

Votou em conformidade



João Conde Correia dos Santos

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



João Conde Correia dos Santos

Votou em conformidade



João Eduardo Cura Mariano Esteves

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



João Eduardo Cura Mariano Esteves

Votou em conformidade



Maria de Fátima da Graça Carvalho

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Maria de Fátima da Graça Carvalho

Votou em conformidade



Maria Isabel Fernandes da Costa

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Maria Isabel Fernandes da Costa

Votou em conformidade



Lucília Maria das Neves Franco Morgadinho Gago

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Lucília Maria das Neves Franco Morgadinho Gago

Votou em conformidade

Descritores e Conclusões
Descritores: 
ENSINO PARTICULAR E COOPERATIVO
DIRETOR PEDAGÓGICO
INFRAÇÃO DISCIPLINAR
CONTINUIDADE FUNCIONAL
DOCENTE
ENTIDADE PRIVADA COM FUNÇÕES PÚBLICAS
ENSINO OFICIAL
AUTONOMIA PEDAGÓGICA
AVALIAÇÃO
Conclusões: 
1.ª — As funções de diretor pedagógico de estabelecimentos de ensino particulares (e cooperativos) de há muito que se encontram subordinadas ao cumprimento de deveres profissionais consignados por normas de direito público e sujeitos ao poder disciplinar do Governo, como se observa, pelo menos, desde o Regulamento Geral do Ensino Secundário de 14 de agosto de 1895 até ao atual Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro.
 
                     2.ª — Sujeição que em nada exime o diretor ou membro da direção pedagógica à responsabilidade disciplinar, nos termos da legislação laboral privada, perante a cooperativa, a instituição canónica, a sociedade comercial, a fundação ou a pessoa singular proprietária da escola, ou que, a outro título, detenha a exploração do estabelecimento de ensino e seja, nessa qualidade, a entidade patronal. 
 
                     3.ª — As funções dos diretores pedagógicos, sumariamente enunciadas nos artigos 40.º e 41.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, são, em muitos aspetos, de interesse público, pois são de interesse público, e não apenas de interesse geral, os próprios estabelecimentos de ensino particular e cooperativo que dirigem pedagogicamente (cf. artigo 2.º da Lei n.º 9/79, de 19 de março), os quais integram o sistema educativo nacional (cf. artigo 3.º, n.º 2) e fazem parte da rede escolar, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 108/88, de 31 de março. 
 
                     4.ª — A atividade educativa das escolas particulares e cooperativas, nomeadamente a avaliação interna e externa de alunos, a passagem de certificados e diplomas de graus de ensino ou habilitações e a prestação de ensino com qualidade científica e sustentação pedagógica, na observância da autonomia pedagógica e dos denominadores comuns a todo o sistema de ensino, leva a considerá-las entidades privadas com funções públicas e investidas, pontualmente, de poderes públicos.
 
                     5.ª — Tal qualificação é independente dos contratos administrativos de colaboração que as escolas particulares e cooperativas possam celebrar com o Estado, como também se mostra independente de qualquer ato de concessão ou de delegação de tarefas, pois decorre da lei, diretamente.
 
                     6.ª — As entidades privadas que exercem funções públicas não integram por esse motivo a Administração Pública, nem ficam diminuídas na capacidade jurídica civil e comercial de que gozam. Pelo contrário, a aplicação confinada de certas normas e princípios de direito público amplia a autonomia pedagógica para um nível que, de outro modo, não possuiriam.
 
                     7.ª — Admitir-se tal estatuto, em nada diminui a liberdade de ensino ou o direito à criação de escolas, ambos ancorados no artigo 43.º, n.º 1 e n.º 4 da Constituição, respetivamente; tão-pouco a autonomia pedagógica ou o reconhecimento do ensino particular e cooperativo como parte do sistema de ensino, de pleno direito, na linha programática do artigo 75.º, n.º 2.
 
                     8.ª — Se o exercício de funções públicas e, eventualmente, de poderes públicos obrigam a uma maior responsabilidade pública, tal significa que tão oficial é hoje o ensino particular e cooperativo como o ensino prestado nas escolas públicas, pois só uma estreita afinidade de critérios permite a livre transição de alunos e professores no mesmo sistema, não apenas entre escolas de diferentes sectores, como também entre escolas particulares e cooperativas que, destarte, ganham condições favoráveis de intercomunicabilidade.
 
                     9.ª — O diretor pedagógico (ou, se for esse o caso, os membros do órgão de direção pedagógica) adquire, em certa medida, o estatuto de oficial público, à semelhança de outras profissões em cujo exercício se descortina, de modo permanente ou incidental, a prática de atos investidos de fé pública, aptos a produzirem plenos efeitos na ordem jurídica interna e em ordens jurídicas de outros Estados.
 
                     10.ª — É o estatuto de diretor pedagógico ou de membro de órgão de direção pedagógica que legitima o exercício da ação disciplinar pelo Ministro da Educação e a aplicação das sanções previstas nos artigos 99.º-E e seguintes do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro; preceitos conservados transitoriamente em vigor pelo artigo 6.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro. Não, o posto de trabalho em determinada escola ou conjunto de escolas.
 
                     11.ª — As vicissitudes ocorridas nas relações jurídicas laborais do diretor pedagógico não se projetam de modo perentório na relação jurídica administrativa com o Ministro da Educação e com a Inspeção-Geral da Educação e Ciência, uma vez que a vinculação pelas normas disciplinares mencionadas assenta no cargo desempenhado de direção pedagógica que reveste a natureza de funções públicas.
 
                     12.ª — De resto, é a pessoa do diretor ou membro da direção pedagógica a ser visada no procedimento disciplinar; não a escola nem o proprietário, cuja responsabilidade disciplinar se encontra configurada por outras disposições legais do mesmo diploma.
 
                     13.ª — Pode, pois, ser iniciado ou prosseguir procedimento disciplinar relativo a ilícito cometido no exercício de funções em que seja visado diretor pedagógico ou membro de direção pedagógica, não obstante ter, entretanto, transitado para cargo idêntico em outra escola do ensino particular ou cooperativo, a fim de ali desempenhar funções de direção pedagógica.
 
                     14.ª — Como pode, outrossim, ser feita cumprir sanção disciplinar que já tivesse sido aplicada em conformidade com o disposto nos artigos 99.º-E e seguintes do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro.
 
                     15.ª — Algo que se aplica, ainda, à hipótese de o visado transitar para o desempenho de funções docentes, sempre no ensino básico e secundário ministrado em escolas particulares ou cooperativas, visto que no artigo 40.º, n.º 7, do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo determina-se a continuidade funcional entre docência e direção pedagógica para todos os efeitos legais, sem excluir os efeitos disciplinares.
 
                     16.ª — Mais se aplica subsidiariamente e com as devidas adaptações o disposto no artigo 176.º, n.º 4 e n.º 5, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, na redação que lhes foi atribuída pelo Decreto-Lei n.º 6/2019, de 14 de janeiro, visto que nada indicia ser estática a remissão efetuada no artigo 99.º-K do Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, para o revogado Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro.
 
                     17.ª — Por conseguinte, se um determinado diretor pedagógico transitar para funções alheias ao ensino particular e cooperativo, depois de ter praticado infração disciplinar de natureza pública, as condições de punibilidade não cessam em definitivo, antes se suspendendo, de acordo com os pressupostos e os requisitos temporais ali consignados.
 
                     18.ª — O procedimento disciplinar pode ser retomado ou feita cumprir sanção disciplinar já aplicada a quem retome o exercício funções de direção pedagógica ou assuma funções docentes em escola particular ou cooperativa, antes de decorridos 18 meses, sem prejuízo dos prazos de prescrição da infração disciplinar, do procedimento e da pena aplicada.
 
                     19.ª — Relativamente ao diretor pedagógico ou membro de direção pedagógica que seja desligado do serviço para efeito de aposentação, que se reforme ou que inicie atividade profissional totalmente diversa, a pena disciplinar de suspensão sempre se revelaria desprovida de efeito útil, visto que o legislador se absteve de fixar uma pena disciplinar de substituição em tais eventualidades.
 
                     20.ª — Pelo contrário, a pena disciplinar de multa e a pena disciplinar de proibição temporária ou definitiva de voltar a exercer funções de direção pedagógica no ensino particular e cooperativo sempre cumpririam o respetivo desiderato.
 
                     21.ª — Todavia, a nova redação outorgada ao artigo 176.º, n.º 5, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, ao determinar o efeito suspensivo imediato da execução das sanções disciplinares consignadas pelas alíneas b) a d), do n.º 1, do artigo 180.º, e já aplicadas, tem reflexos na punibilidade com multa do diretor pedagógico que se aposente, que se reforme ou que inicie uma atividade profissional diversa.
 
                     22.ª — Somente a pena disciplinar de proibição do exercício de funções pode ser-lhe aplicada, na eventualidade de, entretanto, ter sido desligado do serviço, ter passado à reforma, iniciado outra atividade profissional ou encontrar-se desempregado, pois tal sanção não faz parte do enunciado referido e sobre o qual opera o efeito suspensivo estatuído no artigo 176.º, n.º 5, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.
 
                     23.ª — Na eventualidade de extinção da relação funcional, é possível dar início a procedimento disciplinar por factos pretéritos, mas tal procedimento é suspenso de imediato, assim permanecendo até prescrever, no termo de dezoito meses, exceto se o trabalhador regressar a um cargo de direção pedagógica ou de educador ou professor.
 
Texto Integral
Texto Integral: 

              Senhor Ministro da Educação,
 
              Excelência,
 
 
 
 
Houve por bem Vossa Excelência, com a legitimidade que lhe assiste, decorrente do artigo 44.º, alínea a), e do artigo 46.º, n.º 2, do Estatuto do Ministério Público[1], pedir a este Conselho Consultivo, e com nota de urgência[2], que se pronuncie sobre um conjunto de questões de direito em matéria de exercício do poder disciplinar sobre diretores pedagógicos ou membros da direção pedagógica de estabelecimentos do ensino particular e cooperativo (não superior).
Pergunta-se, especificadamente o seguinte:

              «1. O poder disciplinar do Ministro da Educação sobre os diretores pedagógicos (ou membros de direção pedagógica colegial) dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo, estabelecido nos artigos 99.º-E a 99.º-I do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, na redação dada pela Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto, e mantidos em vigor pelo n.º 4 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro, mantêm-se ainda que estes cessem ou deixem de exercer funções de diretor pedagógico na escola, passando por exemplo a exercer funções de outra natureza, como as de docente?
 
              2. A resposta será a mesma se o trabalhador deixar de ser diretor pedagógico numa escola e passar a exercer essa ou outra função em uma escola distinta da mesma entidade proprietária?
             
              3. E nas situações que, a seguir se indicam, em que o diretor pedagógico cessa o vínculo laboral que o une à entidade proprietária da escola:
 
                               A. Passando a exercer funções de diretor pedagógico ou de outra natureza em uma escola de entidade proprietária diversa daquela em que as infrações foram praticadas.
 
                               B. Deixando de exercer imediata ou definitivamente funções em qualquer escola?
 
              4. No âmbito do regime sancionatório aplicável aos diretores pedagógicos, poderá aplicar-se o disposto nos números 4 e 5 do artigo 176.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, ex vi o artigo 99.º-K do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, na redação dada pela Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto?».
 
Tais questões, indica Vossa Excelência, vêm sendo controvertidas, pois, se alguns consideram que o exercício do poder disciplinar tem por limite o desempenho de funções pelo arguido como diretor pedagógico ou membro de órgão de direção pedagógica de uma certa escola, outros consideram ser dirimente a equivalência do ensino particular e cooperativo com o ensino público, de onde haveria de decorrer um tratamento análogo, de tal forma que a transição do agente para cargo idêntico, em outro estabelecimento de ensino particular e cooperativo, não impediria a instauração de procedimento disciplinar nem, sendo esse o caso, que se fizesse executar a sanção já aplicada. Com efeito, se a permanência no exercício das mesmas funções configura pressuposto e limite do exercício das competências disciplinares do Ministro da Educação, poderia o visado furtar-se ao procedimento de modo expedito, desvirtuando o próprio regime sancionatório e a sua razão de ser. Bastar-lhe-ia permutar a direção pedagógica pela de outra escola ou transitar para o serviço docente.
 
Por fim, a respeito da urgência assinalada, vem exposto o seguinte:
 
              «A resposta às questões ora suscitadas é de enorme relevância social, na medida em que está em causa o controlo da atividade daqueles que são os responsáveis pela orientação da ação educativa nos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo de nível não superior, designadamente pelo cumprimento dos planos e programas de estudos e pela aplicação das regras estabelecidas para a avaliação dos alunos.
 
              Essa relevância é, ainda, mais acrescida e, refira-se, especialmente oportuna, num ano escolar como o atualmente em curso, em que, para fazer face á pandemia da doença COVID-19, o Governo adotou, através do Decreto-Lei n.º 14-G/2020, de 13 de abril, alterado pelo Decreto-Lei n.º 20-H/2020, de 14 de maio, medidas excecionais e temporárias na área da educação que, flexibilizando algumas regras, apelam a um maior controlo dos agentes educativos de modo a acautelar eventuais comportamentos lesivos dos interesses dos alunos, designadamente em matéria de avaliação interna e acesso ao ensino superior».
 
Acompanharemos, de perto, a fundamentação e conclusões do Parecer n.º 23/2015, de 11 de setembro de 2015[3], em que este Conselho Consultivo se pronunciou a respeito de infrações disciplinares imputadas, não a membros da direção pedagógica dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo, mas a docentes.
 
Responsabilidade disciplinar que, todavia, perante as autoridades públicas, é restrita ao domínio da avaliação externa de alunos, pertencendo, em tudo mais, à relação jurídica de trabalho que os docentes mantêm com os proprietários das unidades de ensino: pessoas singulares ou coletivas, civis ou canónicas, de substrato fundacional ou com fins lucrativos.
 
Já o âmbito da sujeição ao poder disciplinar público por parte dos diretores ou membros de órgãos de direção pedagógica, como melhor veremos, é consideravelmente mais amplo, sem, no entanto, estar delimitada uma fronteira inequívoca.
 
A apreciação das questões trazidas a este corpo consultivo justifica revisitar a natureza jurídica do poder disciplinar e das sanções próprias, considerando que, correntemente, o seu âmbito é delimitado por uma relação hierárquica que não se descortina entre o Ministro da Educação, por um lado, e, por outro, os diretores pedagógicos ou membros de órgãos de direção pedagógica das escolas particulares e cooperativas do ensino básico e secundário.
 
Seguidamente, passaremos a identificar as funções de direção pedagógica, o interesse público que releva da sua atividade, o enquadramento estatutário que define os seus deveres e as consequências disciplinares do incumprimento dos mesmos.
 
Com isto, pretendemos captar o efeito das possíveis vicissitudes no desempenho de funções por parte de diretores pedagógicos ou membros de órgãos de direção pedagógica das escolas particulares e cooperativas do ensino básico e secundário a quem seja imputada infração disciplinar.
 
Trata-se, em especial, de apurar se o termo resolutivo das funções concretamente desempenhadas faz cessar as condições de punibilidade ou se, não obstante, pode ainda ser aplicada sanção disciplinar. Pelo menos, na eventualidade de o trabalhador transitar para a direção pedagógica de outra escola ou para o desempenho de funções docentes, permanecendo no ensino particular ou cooperativo.
 
«O problema do poder disciplinar é a sua identidade jurídica», afirmava, recentemente, uma autora italiana (SERENA STACCA[4]).
 
Isto, para dizer que o conhecimento «da íntima essência do fenómeno disciplinar revela-se necessário porque dele depende a solução de uma série de quesitos que vão do âmbito de aplicação à consistência das garantias dos sujeitos passivos do poder».
 
Cremos ser justamente o que suscitam as questões formuladas: de certo modo, a essência e o fundamento do poder disciplinar e da correspetiva sujeição.
 
Motivo que nos leva a ter de descortinar em que medida a autonomia privada do sujeito responsabilizado disciplinarmente pode conformar as condições de aplicabilidade das sanções disciplinares e, antes ainda, a legitimidade passiva, em procedimento administrativo disciplinar, como arguido.
 
Já em 1932, MARCELLO CAETANO interrogava-se pela subordinação ao poder disciplinar dos funcionários do Estado, depois de aposentados[5], como também pela relevância de infrações cometidas já no exercício de funções, embora anteriormente à investidura no cargo[6]. Isto, ao tratar de questões suscitadas em torno do início e termo da sujeição ao poder disciplinar.
 
Vistas as premissas essenciais da consulta requerida e delineada sumariamente a metodologia adotada, emite-se parecer.
 

 
§ 1.
 
§ 1.1. — O exercício de poderes disciplinares constitui um meio de garantia contra o incumprimento de deveres funcionais por parte de quem é sujeito passivo de relações jurídicas duradouras — públicas ou privadas — que se desenvolvem sob um enquadramento institucional: o serviço público, a empresa, a ordem profissional, a escola. Garantia que se produz, umas vezes por incentivos patrimoniais ou pessoais a conceder ao bom cumprimento de tais deveres, outras, pela previsão e aplicação de sanções pelo sujeito ativo, no conhecimento dos atos e omissões ilícitos, ao que acresce o efeito dissuasor que replica.  
De entre os meios sancionatórios mais comuns na ordem jurídica (criminal, contraordenacional e civil), o poder disciplinar corresponde, no essencial, a três funções específicas que contribuem para a autonomia dos regimes jurídicos disciplinares e para conceber uma natureza jurídica própria.
A primeira consiste em garantir unidade ou continuidade nas estruturas, sistemas ou organizações que compreendem relações jurídicas assimétricas. A posição proeminente de um dos sujeitos encontra a sua razão de ser na conservação de uma certa ordem indispensável a tais relações ou na sua reintegração, caso tenha sido perturbada.
Assim, na Administração Pública, a hierarquia, a superintendência ou a tutela administrativa saem reforçadas por via do poder disciplinar exercido pelo sujeito que detém proeminência funcional.
A ordenação das funções de cada qual e o bom sucesso na missão coletiva a que se propõe determinada instituição ganham na prevenção contra ruturas e desvios, obtida, a título principal, pela proporção de vantagens (prémios, distinções ou recompensas) ou pela imposição de perdas pessoais ou patrimoniais de carácter aflitivo (penas ou sanções[7]) e que exprimem reprovação pela ilicitude.
A segunda função é a que permite incorporar no exercício de tais poderes a aplicação de conceitos indeterminados, margens de valoração próprias, nomeadamente da função administrativa, como também, de modo frequente, valorações de ordem técnico-científica ou simplesmente da experiência. O procedimento disciplinar, eventualmente precedido por averiguações, por inquérito ou por sindicância, é um procedimento de proximidade, cujos intervenientes conhecem bem o contexto institucional e dispõem de condições para discernir a gravidade da infração e a culpa do agente a quem é pessoalmente imputada.
A terceira função característica corresponde à necessidade de agir de imediato e, nessa medida, o poder disciplinar faculta ao órgão que o exerce a definição do direito e a sua execução, sem necessidade de requerer a intervenção dos tribunais. Ao mesmo tempo, os procedimentos disciplinares, os inquéritos e averiguações que os precedem, furtam-se à exposição pública, preservando algum recato na organização.
Tratando-se de atividade administrativa, as medidas cautelares e a decisão sancionatória beneficiam de autotutela declarativa e executiva, fundadas no interesse público, sem prejuízo das garantias de defesa do arguido e dos meios impugnatórios graciosos e contenciosos que lhe assistem[8].
Se, porventura, a instauração do procedimento disciplinar e a aplicação de sanções fosse confiada diretamente aos tribunais perder-se-iam tais valias que caracterizam o poder disciplinar, mesmo no âmbito das relações jurídicas puramente privadas, como são, em geral, as relações emergentes do contrato individual de trabalho.
Há, por isso, quem sustente uma natureza jurídica própria do poder sancionatório da Administração Pública, frente ao jus puniendi do Estado, reservado aos tribunais. Aplicar sanções administrativas não constitui um enviesamento da função jurisdicional[9], pois é ainda administrar[10].
 
§ 1.2. — O poder disciplinar é expressão de autonomia das organizações e garantia da sua unidade. Ainda quando sirva estruturas hierárquicas e se concentre nos órgãos máximos de direção, a aplicação de normas disciplinares apresenta-se voltada para o interior do serviço, da empresa ou da associação.
Embora, a respeito, estritamente, da disciplina na função pública, valem inteiramente as considerações de ANA CELESTE CARVALHO[11]:

                   «O poder disciplinar integra o poder sancionatório administrativo, coexistindo a sanção disciplinar com a sanção administrativa geral.
                   A sanção disciplinar enquanto sanção administrativa em contexto disciplinar constitui expressão interna do poder administrativo sancionador, por oposição à sanção administrativa geral que também é expressão do poder administrativo, mas na sua face externa, por operar em relação aos administrados infratores.
                   O poder disciplinar exprime o exercício de um poder interno no contexto da estrutura administrativa e visa o sancionamento do incumprimento de deveres administrativos, como tal fixados por ato normativo».

A responsabilidade disciplinar surge como garantia institucional da confiança depositada por organizações complexas no comportamento individual dos seus membros, considerando a suscetibilidade de comprometerem os fins mais elevados, de prejudicarem o bom nome e reputação dos seus pares ou de subverterem a ordenação de posições interdependentes.
Todavia, a aplicação de sanções disciplinares é apenas uma das manifestações da organização administrativa, empresarial ou associativa. É precedida pela definição de uma certa ordem interna por meio de normas que garantam a coesão e funcionamento dos órgãos e serviços. A definição de deveres genéricos e específicos constitui o seu aspeto primário e essencial.
A aprovação pelos órgãos colegiais dos seus próprios regimentos manifesta muito claramente tal aceção. O regimento de certo órgão pode ser escrupulosamente observado, ao longo de múltiplas sessões, sem nunca haver lugar à aplicação de sanções. A observância dos deveres que recaem sobre os membros consiste na forma lídima de garantir a disciplina. As regras de organização e funcionamento, não raramente, constituem critérios de ordenação para o exercício dos direitos e para o cumprimento de deveres funcionais, de modo a evitar conflitos ou incertezas. Os regulamentos internos, os mapas de férias, a fixação de turnos e horários ilustram esse papel da disciplina.
Por outro lado, a definição de princípios deontológicos[12], de cartas de direitos e deveres dos utentes[13], de objetivos a perseguir em cada serviço ou unidade de produção ou de serviços traduzem essa mesma faceta primária da disciplina nas organizações públicas e privadas.
 
§ 1.3. — Apesar de a responsabilidade disciplinar depender sempre de um vínculo pessoal e de, quase sempre, ser acionada no âmbito privativo de uma instituição, não deixa de ser limitada externamente: pela lei, pelos princípios gerais de direito e pela intervenção sucessiva dos tribunais, competentes para reverem as sanções aplicadas e reintegrarem os direitos eventualmente lesados de quem tenha sido indevidamente punido.
A ação disciplinar e a sanção disciplinar obedecem a critérios de validade e de eficácia jurídica que partem do poder legislativo, como princípios ou normas gerais e abstratas, para, se for caso disso, chegarem ao poder judicial na aplicação individual e concreta que a autoridade disciplinar primeiro realizou.
Por conseguinte, qualquer poder disciplinar, num Estado de direito, é um poder limitado e sujeito à Constituição, à lei e demais princípios e normas, de direito interno ou de direito internacional que sejam diretamente aplicáveis.
A ordem constitucional contempla expressamente o poder disciplinar enquanto poder de aplicar sanções que não possuam natureza penal nem contraordenacional.
Sanções que devem ser demarcadas por entre o vasto conjunto dos atos que produzem licitamente consequências desfavoráveis, devendo distinguir-se, como tal, das medidas de polícia e da sua função de reintegração da legalidade, ainda que interpretadas muitas vezes como ações aflitivas ou repressivas (v.g. o encerramento de estabelecimentos de ensino por incumprimento de normas sanitárias ou por funcionarem clandestinamente, sem autorização).
Sanções que, por outro lado, não podem ser privativas da liberdade, como decorre do artigo 27.º, n.º 2, da Constituição, pois as penas de prisão e as medidas de segurança com internamento encontram-se reservadas aos tribunais.
Única exceção para o direito militar, ao admitir-se no artigo 27.º, n.º 3, que a privação da liberdade seja imposta por via disciplinar, desde que garantido o «recurso para o tribunal competente».
Por outro lado, a extensão dos direitos de audiência e defesa ao arguido em processo contraordenacional, «bem como em quaisquer processos sancionatórios» (cf. artigo 32.º, n.º 10) deixa entrever um amplo espaço para o exercício de poderes disciplinares e, porventura, para outros poderes sancionatórios[14].
Aliás, como observou o Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 33/2002, de 22 de janeiro de 2002[15], tal norma, aditada pela IV Revisão Constitucional, opera justamente o alargamento a outros poderes sancionatórios administrativos daquilo que no artigo 269.º, n.º 3, já se dispunha relativamente às garantias dos trabalhadores em funções públicas no processo disciplinar.
Ficou mais claro com o aditamento do n.º 10 ao artigo 32.º que o poder disciplinar e as garantias fundamentais do visado não têm por que se limitar às relações de emprego público, pois de outro modo, o preceito aditado seria, em boa parte, desprovido de sentido útil.
Compreende-se que o constituinte tenha aludido a outros quaisquer processos sancionatórios para levar a referida garantia às sanções disciplinares aplicadas fora do âmbito da função pública, como é o caso dos diretores pedagógicos, eventualmente entre sujeitos privados, e para abarcar ainda outros processos sancionatórios não criminais, não contraordenacionais nem disciplinares.
A Constituição não se fica por aqui, pois reservou à Assembleia da República a competência para aprovar e modificar o regime geral de punição das infrações disciplinares (cf. artigo 165.º, n.º 1, alínea d)) com o que, nesta matéria, condiciona o poder legislativo do Governo (cf. artigo 198.º, n.º 1, alínea b)) e das Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas (cf. artigo 227.º, n.º 1, alínea b)) à obtenção de autorizações legislativas e veda ao poder regulamentar criar regimes disciplinares excecionais ou especiais. E reservou à Assembleia da República, de modo absoluto, a competência para legislar sobre disciplina nas Forças Armadas (cf. artigo 164.º, alínea d)).
No artigo 157.º, n.º 1, consigna-se a imunidade disciplinar dos Deputados à Assembleia da República «pelos votos e opiniões que emitirem no exercício das suas funções».
Por seu turno, a Constituição instituiu garantias estritas à disciplina dos magistrados. Os juízes, sem quebra da sua independência, encontram-se sujeitos à ação disciplinar prevista no artigo 217.º, n.º 2 e n.º 3, da competência dos conselhos superiores e cujo processo é também reservado à lei, tal como os magistrados do Ministério Público só podem ser arguidos em processo disciplinar instaurado pelos órgãos que integram a Procuradoria-Geral da República (cf. artigo 219.º, n.º 5).
No artigo 271.º, n.º 1, determina-se a responsabilidade disciplinar dos funcionários e agentes do Estado e das demais entidades públicas, sem prejuízo da responsabilidade civil e criminal «pelas ações ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício de que resulte violação dos direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos, não dependendo a ação ou procedimento, em qualquer fase, de autorização hierárquica».
As especiais exigências da disciplina militar justificam ainda outra menção. Assim, no artigo 274.º, n.º 2, confia-se ao Conselho Nacional de Defesa Nacional uma função consultiva na definição da disciplina das Forças Armadas.
Por fim, no artigo 282.º, n.º 3, da Constituição, o ilícito disciplinar é considerado conjuntamente com o ilícito penal e com o ilícito contraordenacional no sentido de permitir a aplicação de norma mais favorável ao arguido, no lugar da que tiver sido declarada inconstitucional com força obrigatória geral, ao ponto de derrogar o efeito de caso julgado, se for caso disso.
 
§ 1.4. — Contrariamente ao que é comum nos demais poderes sancionatórios, nomeadamente o de aplicar sanções penais ou contraordenacionais, o poder disciplinar, já o dissemos, pressupõe sempre deveres próprios que decorrem de um vínculo jurídico pessoal a determinada instituição, seja de constituição voluntária, como é o caso do contrato individual de trabalho, seja um ónus decorrente da inscrição obrigatória, como sucede com as ordens profissionais[16], ou mesmo involuntariamente constituído, como ocorre com o internamento hospitalar[17].
É conferido a um órgão investido de especial supremacia, e, nas palavras do citado Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 33/2002, de 22 de janeiro de 2002[18], «só pode ser exercido relativamente a quem pertence à instituição ou corpo social».
A responsabilidade disciplinar acompanha esse vínculo institucional desde que se constitui até à sua extinção definitiva, ela própria, por vezes, prevista como sanção reservada às infrações de maior gravidade.
 Com efeito, as sanções disciplinares mais aflitivas, regra geral, são aquelas, precisamente, que impõem a rutura de tal vínculo, através da expulsão, da aposentação compulsiva, da demissão ou despedimento do infrator.
A rutura do vínculo pode, no entanto, ser voluntária com o que o agente fica subtraído à responsabilidade disciplinar, perdendo, contudo os direitos e outras vantagens associados ao seu estatuto. Isto, porém, não quer dizer que o poder disciplinar e a consequente sujeição ao seu exercício decorram necessariamente de um acordo, de um encontro de vontades[19].
Os estabelecimentos penitenciários[20] e outras unidades de internamento compulsivo[21] dispõem de normas disciplinares particularmente estritas, em que a rutura do vínculo significaria um prémio e não uma sanção. Esta encontra-se num acréscimo de restrições com o que isso representa de condições mais austeras de reclusão. Aliás, é de observar como no âmbito prisional se revela necessária a sujeição disciplinar em ordem à execução das penas criminais mais severas: as que determinam privação da liberdade.
Organizações com uma estrutura assente, a título principal, no dever de obediência, como é o caso das Forças Armadas[22], das forças segurança ou das corporações de bombeiros, adotam normas disciplinares especialmente rígidas e com sanções particularmente assoladoras que visam um fim de prevenção especial qualificado.
Só a aplicação de normas penais, ou melhor, a aplicação de penas criminais, é absolutamente reservada aos tribunais[23], ora por lhes competir a repressão das violações da legalidade democrática (cf. artigo 202.º, n.º 2, da Constituição), ora pela reserva da ação penal «orientada pelo princípio da legalidade» ao Ministério Público (cf. artigo 219.º, n.º 1).
Já a aplicação de sanções contraordenacionais compete a órgãos da Administração Pública[24], seguindo, no entanto, um procedimento ordenado com fortes semelhanças ao processo penal[25]. E, em caso de impugnação ou de recurso, o tribunal dispõe de plena jurisdição, sem estar condicionado pelos juízos de oportunidade do órgão administrativo nem pelas valorações que este tenha imprimido à decisão.
No caso das sanções ou penas disciplinares, pelo menos aquelas que são aplicadas por autoridades públicas, interpõe-se um ato administrativo[26] entre o arguido e o juiz. O contencioso de anulação, embora alargado à prática do ato devido, permite ao juiz um controlo restrito à legalidade, sem poder convolar o procedimento disciplinar num processo judicial. O tribunal encontra-se vinculado pela separação de poderes e pela reserva de administração, pelo que não pode substituir as valorações próprias da Administração Pública pelas suas nem tão-pouco julgar do mérito e oportunidade do ato disciplinar impugnado.
O poder disciplinar pressupõe uma relação jurídica assimétrica entre quem exerce e quem, voluntária ou involuntariamente, se encontra submetido ao poder punitivo, relação que não se limita à hierarquia administrativa.
É certo que, as mais das vezes, assenta numa relação jurídica de serviço, subordinada ao interesse público e conformada por normas de direito público, entre o órgão ou agente que dispõe do poder de direção e o subalterno que, salvo raras exceções, deve obediência às suas ordens e instruções legitimamente dimanadas.
Se, contudo, a relação de serviço e o poder de direção são tomados frequentemente como paradigma, a verdade é que, de modo algum, consomem o universo das relações disciplinares.
DIOGO FREITAS DO AMARAL[27] alude ao poder disciplinar exercido nos estabelecimentos penitenciários sobre os presos, pelas administrações hospitalares sobre doentes, utentes em ambulatório e até visitas, pelos órgãos de direção e pelos docentes sobre os alunos que frequentam escolas em regime de internato (v.g. Instituto dos Pupilos do Exército e Colégio Militar) ou as demais escolas públicas[28], exercido pelas bibliotecas e arquivos públicos relativamente aos leitores e consultadores, pelos museus com relação aos visitantes.
Em todos estes casos, explica o Autor[29], «a ideia essencial é a de que a Administração tem de manter uma certa disciplina, um certo funcionamento regrado, sem comportamentos ilícitos, dentro do próprio espaço físico em que estão instalados os serviços públicos; e esse poder exerce-se fundamentalmente ou sobre os funcionários da própria Administração, ou sobre os utentes dos serviços que a Administração mantém a funcionar, abertos ao público».
Uma coisa é certa. Muitos destes exemplos confirmam que o poder disciplinar não se circunscreve à relação hierárquica.
Por seu turno, nem sempre o superior hierárquico detém poder disciplinar sobre o subalterno (ou não o detém integralmente) além de ser relativamente frequente encontrar-se alguém sujeito a poderes disciplinares sem se encontrar sob dever de obediência a ordens ou instruções.
Não é necessário cogitar exemplos marginais ou completamente atípicos. Basta ter presente a aplicação de sanções disciplinares aos juízes, o poder disciplinar que condiciona o exercício de profissões liberais regulamentadas ou a tutela administrativa; esta, facultando, por vezes, o poder de destituir membros de um órgão ou até de o dissolver.
De resto, no artigo 176.º, n.º 2, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas[30] determina-se que «os titulares dos órgãos dirigentes dos serviços da administração direta e indireta do Estado são disciplinarmente responsáveis perante o membro do Governo que exerça a respetiva superintendência ou tutela». Como tal, os membros da direção de um instituto público ou de uma entidade pública empresarial encontram-se sujeitos ao poder disciplinar do membro do Governo a quem cabe a superintendência e tutela, sem que devam obediência às ordens ou instruções por si proferidas. Quer isto dizer que, mesmo no universo das relações jurídicas de emprego público, a hierarquia não serve de critério absoluto para delimitar a responsabilidade disciplinar.
O poder disciplinar tão-pouco se encontra sob reserva dos órgãos do Estado ou de outras pessoas coletivas públicas. A aplicação de sanções disciplinares tem lugar em relações jurídicas puramente privadas, como é bem de ver na relação jurídica individual de trabalho[31] ou na disciplina interna de confissões religiosas, de associações desportivas, culturais ou recreativas.   
 
 
§ 2.
 

§ 2.1. — O Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro, a fim de conferir nova orientação ao desenvolvimento do artigo 57.º da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.º 46/86, de 14 de outubro[32]), aprovou o novo Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, revogando o Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro (cf. artigo 7.º).
 
Entre o Estatuto e a Lei de Bases do Sistema Educativo, situam-se as Bases do Ensino Particular e Cooperativo, aprovadas pela Lei n.º 9/79, de 19 de março[33].
 
Por conseguinte, o Estatuto, aprovado por decreto-lei de desenvolvimento (cf. artigo 198.º, n.º 1, alínea c), da Constituição), encontra-se sob uma dupla vinculação material. Ambas as leis de bases constituem parâmetro de validade das suas normas, sem prejuízo da conformação diretamente exercida pelas normas e princípios constitucionais.
 
Encontramo-nos em zona deveras sensível, do ponto de vista constitucional, desde logo, porque, e tomando as palavras de JORGE MIRANDA[34], «os princípios estruturantes do Direito da Educação são princípios constitucionais».
 
Acresce tratar-se de princípios e normas que percorrem os direitos fundamentais — dos direitos, liberdades e garantias (cf. artigo 43.º) aos direitos culturais (cf. artigo 73.º e seguintes) — as incumbências sociais e culturais do Estado (cf. artigo 9.º, alínea f), e artigo 90.º) e a democracia participativa, cujo aprofundamento é condição e consequência do pluralismo de expressão no Estado de direito democrático (cf. artigo 2.º).
 
Por um lado, encontramo-nos sob a esfera de proteção da liberdade de ensino (cf. artigo 43.º, n.º 1) e do direito a criar escolas particulares e cooperativas (cf. n.º4). Esfera de proteção que, como foi assinalado no Parecer n.º 19/2019, de 8 de agosto de 2019[35], apresenta-se qualificada diante da livre iniciativa económica, em geral[36], cujo conteúdo e extensão se desenvolvem nos limites que a lei, a Constituição e o interesse geral lhe consentirem (cf. artigo 61.º, n.º 1).
 
Por outro, encontramo-nos sob o regime dos direitos económicos, sociais e culturais, em que o Estado, no respeito pelo pluralismo que se espera do ensino particular e cooperativo (cf. artigo 75.º, n.º 2) está incumbido de criar «uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população» (cf. artigo 75.º, n.º 1).
 
No preâmbulo do novo Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, dá-se conta do propósito de criar condições de maior autonomia às escolas particulares e cooperativas, em correspondência com a liberdade constitucional de aprender e ensinar e com o direito a criar escolas particulares e cooperativas, por comparação com o Estatuto que, então, se revogava:
 
                   «O referido Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, assentou num modelo de estrutura pedagógica muito dependente do sistema público de ensino. Corolário dessa realidade foi a consagração da figura do paralelismo pedagógico para os estabelecimentos que, por razões conjunturais, não dispunham de meios para organizarem o seu expediente interno e os seus serviços administrativos, designadamente em matéria de validação e certificação da avaliação final dos seus alunos, e que lhes impunha a necessidade de se socorrerem das escolas públicas com vista a esse fim.
 
                   Neste contexto, o Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo aprovado em anexo ao presente decreto-lei (Estatuto) pretende consagrar um modelo que, nessa matéria, rompe com o passado e abre caminho a uma nova realidade de uma autonomia semelhante à das escolas públicas com contrato de autonomia, que se pretende que seja progressivamente alargada à generalidade das escolas, cabendo ao Ministério da Educação e Ciência um papel cada vez mais focado na regulação e fiscalização do sistema educativo».

 

 Maior autonomia que, entre outros aspetos, se pretendeu alcançasse o domínio pedagógico e com este preciso sentido:
 
                   «A autonomia pedagógica atribui a cada escola a liberdade de se organizar internamente de acordo com o seu projeto educativo. Neste sentido, aponta ainda o Estatuto para uma verdadeira liberdade de contratação de docentes, independência no tratamento das questões disciplinares e do correlativo poder disciplinar sobre esses mesmos docentes, excecionando a matéria relativa à avaliação externa dos alunos».
 
 
§ 2.2. — O anterior Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro[37], previa um regime menor de autonomia — o designado paralelismo pedagógico —, reservando a plena autonomia pedagógica a estabelecimentos de ensino que preenchessem requisitos especialmente qualificados:
                   «Artigo 37.º
                  
                   1 — A autonomia pedagógica supõe as seguintes condições:
                   a) Instalações, equipamento e material didático adequados;
                   b) Direção pedagógica, constituída nos termos dos artigos 42.º e seguintes;
                   c) Cumprimento do presente decreto-lei no respeitante aos alunos e pessoal docente;
                   d) Existência de serviços administrativos organizados;
                   e) Funcionamento, em regime de paralelismo pedagógico, durante cinco anos escolares consecutivos.
                  
                   2 — O prazo definido na alínea e) do número anterior pode ser reduzido para três anos em casos devidamente justificados.
                  
                   3 — O paralelismo pedagógico supõe a existência das condições expressas nas alíneas a), b), c) e d) do n.º 1».
 
A menção a um ou outro regime era consignada na autorização de funcionamento de cada estabelecimento de ensino, sendo atribuída por tempo indeterminado, por períodos de um, três ou cinco anos (cf. artigo 36.º, n.º 4 e n.º 5).
 
As principais diferenças de regime eram descritas nos termos seguintes:
                  
                   «Artigo 35.º
                  
                   1 — A autonomia pedagógica consiste na não dependência de escolas públicas quanto a:
                   a) Orientação metodológica e adoção de instrumentos escolares;
                   b) Planos de estudo e conteúdos programáticos;
                   c) Avaliação de conhecimentos, incluindo a dispensa de exame e a sua realização;
                   d) Matrícula, emissão de diplomas e certificados de matrícula, de aproveitamento e de habilitações.
 
                   2 — O paralelismo pedagógico consiste na não dependência de escolas públicas quanto ao disposto nas alíneas a) e c) do número anterior».
 
Para obter o reconhecimento de autonomia pedagógica, um estabelecimento de ensino teria de ter funcionado, em regime de paralelismo pedagógico, pelo menos, durante cinco anos escolares consecutivos (cf. artigo 37.º, n.º 1, alínea e)).
 
No essencial, a maior ou menor autonomia pedagógica significava uma menor ou maior dependência da escola pública a que se encontrava adstrito cada estabelecimento de ensino particular ou cooperativo.
 
Os demais estabelecimentos de ensino autorizados — sem autonomia nem paralelismo pedagógico — encontravam-se fora do ensino oficial e, por isso, sob um regime de integral dependência do ensino público, designadamente ao nível da matrícula e avaliação dos alunos que os frequentavam.
 
Docentes e diretores pedagógicos respondiam disciplinarmente «perante a entidade proprietária da escola e o Ministério da Educação e Ciência pela violação dos seus deveres profissionais de natureza ou implicação pedagógica» (cf. artigo 74.º, n.º 1, e artigo 42.º, n.º 3).
 
Às normas sancionatórias foi atribuído o seguinte teor:
 
                   «Artigo 99.º
 
                   1 — Às entidades proprietárias de escolas particulares que violem o disposto neste decreto-lei podem ser aplicadas, pelo Ministério da Educação e Ciência, as seguintes sanções, de acordo com a natureza e a gravidade da violação:
 
                   a) Advertência;
 
                   b) Multa de valor entre dois e vinte salários mínimos nacionais;
 
                   c) Encerramento da escola por período até dois anos;
 
                   d) Encerramento definitivo.
 
                   2 — Aos diretores pedagógicos podem ser aplicadas, pelo Ministério da Educação e Ciência, as seguintes sanções:
 
                   a) Advertência;
 
                   b) Suspensão de funções por período de um mês a um ano;
 
                   c) Multa de valor entre um e dez salários mínimos nacionais;
 
                   d) Proibição definitiva do exercício de funções de direção.
 
                   3 — Às escolas clandestinas, além do encerramento, será aplicada, pelo Ministério da Educação e Ciência, multa entre quatro e quarenta salários mínimos nacionais.
 
                   4 — A cominação de sanções será objeto de regulamentação específica, a definir por portaria dos Ministros das Finanças e do Plano e da Educação e Ciência, ouvido o Conselho Consultivo do Ensino Particular e Cooperativo».
 
A concreta definição das infrações só viria a consumar-se com a Portaria n.º 207/98, de 28 de março, cuja desaplicação consequente por inconstitucionalidade da norma habilitante (o n.º 4 do artigo 99.º do Estatuto) viria resultar do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 398/2008, de 29 de julho de 2008[38], e da jurisprudência que o acompanhou de modo constante[39].
 
A Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto, já perto do termo da vigência do mencionado Estatuto, aditar-lhe-ia os artigos 99.-A e seguintes, transpondo, de certo modo, o conteúdo da portaria que estabelecia as infrações disciplinares de proprietários e diretores pedagógicos, estabelecendo correspondência com as sanções aplicáveis[40].
 
 
§ 2.3. — No atual Estatuto, abolida a categoria intermédia do paralelismo pedagógico, a autonomia pedagógica revela-se, fundamentalmente, no conjunto de direitos seguidamente enunciados:
 
«Artigo 37.º
(Autonomia pedagógica)
 
                   1 — A autonomia pedagógica consiste no direito reconhecido às escolas de tomar decisões próprias nos domínios da organização e funcionamento pedagógicos, designadamente da oferta formativa, da gestão de currículos, programas e atividades educativas, da avaliação, orientação e acompanhamento dos alunos, constituição de turmas, gestão dos espaços e tempos escolares e da gestão do pessoal docente.
 
                   2 — A autonomia pedagógica reconhecida às escolas particulares e cooperativas inclui, nos termos e com os limites previstos no presente Estatuto e nos contratos celebrados com o Estado, representado pelo Ministério da Educação […], a competência para decidir quanto a:
                   a) Aprovação de projeto educativo e regulamento interno próprios;
                   b) Organização interna, nomeadamente ao nível dos órgãos de direção e gestão pedagógica, sem prejuízo das regras imperativas previstas no presente Estatuto;
                   c) Organização e funcionamento pedagógico, quanto a projeto curricular, planos de estudo e conteúdos programáticos;
                   d) Avaliação de conhecimentos, no respeito pelas regras definidas a nível nacional quanto à avaliação externa e avaliação final de cursos, graus, níveis e modalidades de educação, ensino e formação;
                   e) Orientação metodológica e adoção de instrumentos escolares;
                   f) Matrícula, emissão de diplomas e certificados de matrícula, de aproveitamento e de habilitações;
                   g) Calendário escolar e organização dos tempos e horário escolar.
 
                   3 — No âmbito da respetiva autonomia, e sem prejuízo do cumprimento integral das cargas letivas totais definidas na lei para cada ano, ciclo, nível e modalidade de educação e formação, é permitido às escolas do ensino particular e cooperativo, em condições idênticas às escolas públicas com contrato de autonomia, a gestão flexível do currículo, nos termos a fixar em portaria do membro do Governo responsável pela área da educação.
 
                   4 — As escolas do ensino particular e cooperativo devem assegurar a informação prévia anual dos encarregados de educação sobre as opções tomadas nos termos do número anterior.
 
                   5 — Os regulamentos das escolas com cursos e planos próprios devem conter as regras a que obedece a inscrição ou admissão de alunos, a idade mínima para a frequência, as normas de assiduidade e os critérios de avaliação.
 
                   6 — O projeto educativo, o regulamento e as suas alterações devem ser enviados, para conhecimento, aos serviços competentes do Ministério da Educação […]».
 
De acordo com as disposições que vimos de transcrever, a autonomia pedagógica assenta nos instrumentos seguintes:
 
              — Direção administrativa e financeira, próprias da escola e separadas, orgânica e funcionalmente, da direção pedagógica;
              — Poderes regulamentares de organização e, eventualmente, com regras próprias acerca da inscrição ou admissão de alunos, da idade mínima para a frequência, normas de assiduidade e critérios de avaliação;
              — Determinação da oferta formativa;
              — Gestão flexível de currículos (projeto curricular, planos de estudo e conteúdos programáticos) em condições idênticas às escolas públicas com contrato de autonomia;
              — Definição de programas e atividades educativas;
              — Execução da avaliação de conhecimentos[41] «no respeito pelas regras definidas a nível nacional quanto à avaliação externa e avaliação final de cursos, graus, níveis e modalidades de educação, ensino e formação»;
              — Administração das matrículas, emissão de diplomas e certificados de matrícula[42], de aproveitamento e de habilitações;
              — Estabelecimento de orientações metodológicas e adoção de instrumentos escolares;
              — Atividades de acompanhamento dos alunos;
              — Constituição de turmas;
              — Gestão dos espaços e tempos escolares (calendário escolar, organização dos tempos e horário escolar);
              — Gestão do pessoal docente.
Algumas escolas particulares e cooperativas podem beneficiar do estatuto de pessoas coletivas de utilidade pública sem com isso perderem a sua liberdade:
«Artigo 33.º
(Reconhecimento de interesse público)
 
                   «As escolas particulares e cooperativas que se enquadrem nos objetivos do sistema educativo e formativo português e se encontrem em situação de regular funcionamento nos termos do presente Estatuto, bem como as sociedades, associações ou fundações que tenham como finalidade dominante a criação ou manutenção de estabelecimentos de ensino particular e cooperativo, podem gozar, nos termos da legislação aplicável, das prerrogativas das pessoas coletivas de utilidade pública, beneficiando dos direitos e deveres inerentes àquele reconhecimento, previstos na lei».
 
Nas escolas particulares e cooperativas, é ao proprietário, ou a quem atue por sua conta e disponha do alvará de autorização, que cumpre designar a direção pedagógica, cujas funções e competências retomaremos adiante.
 
Excetuando o cumprimento de deveres em matéria de avaliação externa, e sem prejuízo dos poderes de fiscalização a cargo do Estado (cf. artigo 7.º) o poder disciplinar sobre os docentes das escolas particulares e cooperativas passou a ser exercido pela entidade patronal:
 
 
«Artigo 51.º
(Remissão)
 
                   1 — Compete à entidade proprietária do estabelecimento de ensino o exercício do poder disciplinar sobre os docentes, nos termos da legislação disciplinar laboral aplicável.
 
                   2 — Sem prejuízo do disposto no número anterior, compete à [Inspeção-Geral de Educação e Ciência] o exercício do poder disciplinar no âmbito da avaliação externa dos alunos».
 
A respeito do poder disciplinar sobre os docentes, pronunciou-se este Conselho no já referido e citado Parecer n.º 23/2015, de 11 de setembro de 2015, concluindo que entre o n.º 1 e o n.º 2 do artigo 51.º (vindos de reproduzir) descortina-se uma relação de especialidade, de tal sorte que «a regra geral estabelecida no artigo 51.º, n.º 1, do EEPC de 2013, no sentido de que o estatuto disciplinar dos docentes do ensino particular e cooperativo é estabelecido por remissão para a “legislação laboral aplicável” não é objeto de qualquer compressão por uma norma especial apenas aplicável aos casos em que o poder disciplinar é exercido pela Inspeção-Geral de Educação e Ciência».
 
E, por conseguinte, mais se concluiu que «o regime disciplinar sancionatório aplicável pela Inspeção-Geral de Educação e Ciência a infrações praticadas por docentes de escolas do ensino particular e cooperativo no âmbito de atividade relativa “à avaliação externa dos alunos” é o estatuto disciplinar de origem do docente estabelecido na legislação laboral aplicável aos trabalhadores sujeitos a vínculos de direito privado».
 
A responsabilidade disciplinar dos diretores pedagógicos perante o Ministro da Educação é mais ampla do que a dos docentes e encontra-se, fundamentalmente, nos artigos 99.º-E e seguintes que a Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto, aditara ao anterior Estatuto e que o artigo 6.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro, excetuou da revogação global operada (cf. artigo 7.º) «até à aprovação de um novo regime sancionatório».
 
 
§ 2.4. — Há entre o ensino público, por um lado, e o ensino particular e cooperativo, por outro, um «denominador curricular comum», na expressão do artigo 25.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 55/2018, de 6 de julho[43]: as aprendizagens essenciais, enquanto «orientação curricular base, para efeitos de planificação, realização e avaliação do ensino e da aprendizagem, em cada ano de escolaridade ou de formação, componente de currículo, área disciplinar, disciplina ou UFCD[44]» (artigo 17.º, n.º 2).
 
Trata-se, com efeito, de um amplo denominador comum, pois o citado Decreto-Lei n.º 55/2018, de 6 de julho, define o «currículo dos ensinos básico e secundário, os princípios orientadores da sua conceção, operacionalização e avaliação das aprendizagens, de modo a garantir que todos os alunos adquiram os conhecimentos e desenvolvam as capacidades e atitudes que contribuem para alcançar as competências previstas no Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória» (artigo 1.º).
 
Aplica-se «às diversas ofertas educativas e formativas dos ensinos básico e secundário, no âmbito da escolaridade obrigatória, ministradas em estabelecimentos de ensino público, particular e cooperativo, incluindo escolas profissionais, públicas e privadas» (artigo 2.º, n.º 1) e até, embora com as necessárias adaptações, ao ensino à distância e ao ensino individual e doméstico (cf. artigo 2.º, n.º 2).
 
Por avaliação externa das aprendizagens, entenda-se o conjunto das provas e exames enunciados no artigo 23.º, n.º 2, alínea b), a saber:
              — Provas de aferição;
              — Provas finais do ensino básico;
              — Exames finais nacionais;
              — Provas de aptidão artística; e
              — Provas de aptidão profissional.
A intervenção dos órgãos de direção pedagógica dos estabelecimentos de ensino particular ou cooperativo tem de articular-se perfeitamente com as demais componentes do sistema, a começar pelas outras escolas dos sectores particular e cooperativo, na medida em que todas participam, de pleno direito, na avaliação externa, de acordo com as seguintes prescrições do Decreto-Lei n.º 55/2018, de 6 de julho:
«Artigo 26.º
(Intervenientes no processo de avaliação)
 
                   1 — Na avaliação das aprendizagens intervêm todos os elementos com competência no processo, designadamente professores, formadores, tutores e membros de júris, assumindo particular responsabilidade o professor titular de turma, no 1.º ciclo, e os professores que integram o conselho de turma, nos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e no ensino secundário.
 
                   2 — A escola deve assegurar a participação informada dos alunos e dos pais e encarregados de educação no processo de avaliação das aprendizagens, promovendo, de forma sistemática, a partilha de informações, o envolvimento e a responsabilização dos vários intervenientes, de acordo com as características da sua comunidade educativa.
 
                   3 — Com vista à organização do processo de avaliação externa, nomeadamente no que se refere à sua coordenação, planificação e execução, são constituídas equipas em cada região do território nacional, que integram o Júri Nacional de Exames.
Artigo 27.º
(Efeitos da avaliação)
 
                   1 — A avaliação formativa sustenta a definição de estratégias de ensino, gerando medidas pedagógicas adequadas às características dos alunos e às aprendizagens a desenvolver.
 
                   2 — Enquanto processo de apoio às aprendizagens, a avaliação formativa recorre a dispositivos de informação detalhada sobre os desempenhos dos alunos e apoia a sua orientação escolar e vocacional.
 
                   3 — Sem prejuízo do disposto no n.º 5, a avaliação sumativa realiza-se no final de cada período letivo e dá origem, no final do ano letivo, a uma tomada de decisão:
                   a) No ensino básico geral e nos cursos artísticos especializados do ensino básico, sobre a transição e a aprovação, respetivamente, para o ano e ciclo de escolaridade subsequente, sobre a conclusão do nível básico de educação ou a reorientação do percurso educativo dos alunos, bem como sobre a progressão nas disciplinas da componente de formação artística;
                   b) Nos cursos científico-humanísticos e nos cursos artísticos especializados do ensino secundário, sobre a aprovação em cada disciplina, a progressão nas disciplinas não terminais, a transição para o ano de escolaridade subsequente ou a reorientação do percurso educativo dos alunos, e a conclusão do nível secundário de educação.
 
                   4 — Nos cursos profissionais, a avaliação sumativa dá origem a uma tomada de decisão sobre a aprovação em cada disciplina, módulo ou UFCD, a progressão, ou a reorientação do percurso educativo dos alunos, e a conclusão do nível de educação e qualificação profissional correspondente, ocorrendo no final de cada módulo ou UFCD.
 
                   5 — Sempre que as escolas adotem uma organização do funcionamento de disciplinas diversa da anual, a avaliação sumativa processa-se nos termos previstos na regulamentação específica».
 
Por conseguinte, mostra-se indispensável uma escala comum das menções quantitativas da avaliação, tal como a que resulta do disposto no diploma que temos vindo a seguir:
 
«Artigo 28º
(Escala de avaliação)
 
                   1 — A informação resultante da avaliação sumativa materializa-se:
                   a) No 1.º ciclo do ensino básico, na atribuição de uma menção qualitativa acompanhada de uma apreciação descritiva em cada componente de currículo;
                   b) Nos 2.º e 3.º ciclos, numa escala numérica de 1 a 5 em cada disciplina;
                   c) No ensino secundário, numa escala numérica de 0 a 20 valores nas disciplinas, módulos, unidades de formação de curta duração e formação em contexto de trabalho.
 
                   2 — No 1º ciclo, atenta a sua natureza instrumental, a componente de Tecnologias de Informação e Comunicação não é objeto de avaliação sumativa.
 
                   3 — As opções de cada escola que resultem na criação de novas disciplinas estão sujeitas ao previsto no n.º 1.
 
                   4 — No ensino secundário, independentemente das opções adotadas pela escola, nos termos previstos no n.º 4 do artigo 15.º, a componente de Cidadania e Desenvolvimento não é objeto de avaliação sumativa, sendo a participação nos projetos desenvolvidos neste âmbito registada no certificado do aluno».
 
Porque nem só a avaliação externa releva no efetivo denominador comum, o artigo 34.º vem assinalar que «as referências constantes do presente diploma aos órgãos de direção, administração e gestão dos estabelecimentos do ensino público, bem como às estruturas de coordenação e supervisão pedagógica, consideram-se feitas para os órgãos e estruturas com competência equivalente em cada estabelecimento de ensino particular e cooperativo e escolas profissionais públicas e privadas».
 
Se a avaliação externa dos alunos é parte fundamental do denominador comum a todo o sistema do ensino básico e secundário, nem por isso a avaliação interna e muitos outros aspetos pedagógicos da vida escolar podem ser descurados pelo Ministério da Educação, cujos órgãos autorizam o funcionamento respetivo.
 
De resto, a avaliação interna produz efeitos jurídicos externos, por exemplo, nas condições de ingresso no ensino superior, a que aludiremos infra.
 
No artigo 22.º, n.º 4, pode ler-se o seguinte:
                    «As diferentes formas de recolha de informação sobre as aprendizagens, realizadas quer no âmbito da avaliação interna, da responsabilidade dos professores e dos órgãos de gestão pedagógica da escola, quer no âmbito da avaliação externa, com a intervenção de avaliadores externos ou da responsabilidade dos serviços ou organismos da área governativa da Educação, prosseguem, de acordo com as suas finalidades, os seguintes objetivos:
                   a) Informar e sustentar intervenções pedagógicas, reajustando estratégias que conduzam à melhoria da qualidade das aprendizagens, com vista à promoção do sucesso escolar;
                   b) Aferir a prossecução dos objetivos definidos no currículo;
                   c) Certificar aprendizagens».
A avaliação interna, que pode ser formativa ou sumativa, segundo as finalidades e os instrumentos (cf. artigo 23.º, n.º 1), tem por referência as Aprendizagens Essenciais[45], homologadas por despacho do Ministro da Educação (cf. artigo 17.º, n.º 3) e as demais decisões tomadas pela escola relativas à adequação e contextualização do currículo (cf. artigo 18.º, n.º 3).
A primeira, considerada «a principal modalidade de avaliação» (cf. artigo 24.º, n.º 5) permite «a definição de estratégias de diferenciação pedagógica, de superação de eventuais dificuldades dos alunos, de facilitação da sua integração escolar e de apoio à orientação escolar e vocacional, permitindo aos professores, aos alunos, aos pais e encarregados de educação e a outras pessoas ou entidades legalmente autorizadas obter informação sobre o desenvolvimento do ensino e da aprendizagem, com vista ao ajustamento de processos e estratégias» (artigo 24.º, n.º 2).
A segunda «traduz-se na formulação de um juízo global sobre as aprendizagens realizadas pelos alunos, tendo como objetivos a classificação e certificação» (artigo 24.º, n.º 3). Tal «juízo global conducente à classificação não prejudica o necessário reporte, assente em pontos de situação ou sínteses, sobre as aprendizagens realizadas pelos alunos, a qualidade das mesmas e os percursos para a sua melhoria» (n.º 4).
 
Em geral (cf. artigo 27.º, n.º 3) a avaliação realiza-se no final de cada período e dá origem, no termo do ano letivo, a uma tomada de decisão:
 
              — No ensino básico geral e nos cursos artísticos especializados do ensino básico, sobre a transição e a aprovação, respetivamente, para o ano e ciclo de escolaridade subsequente, sobre a conclusão do nível básico de educação ou a reorientação do percurso educativo dos alunos, bem como sobre a progressão nas disciplinas da componente de formação artística;
              — Nos cursos científico-humanísticos e nos cursos artísticos especializados do ensino secundário, sobre a aprovação em cada disciplina, a progressão nas disciplinas não terminais, a transição para o ano de escolaridade subsequente ou a reorientação do percurso educativo dos alunos, e a conclusão do nível secundário de educação.
 
§ 2.5. — Aliás, e como este corpo consultivo teve oportunidade de evidenciar no Parecer n.º 23/2015, de 11 de setembro de 2015[46], as escolas particulares, ou que pertençam a cooperativas, participam plenamente nos exames nacionais, através dos respetivos professores e dos órgãos de direção pedagógica que os coordenam. O Conselho Consultivo fê-lo, contudo, à luz do Despacho Normativo n.º 6-A/2015, de 5 de março de 2015, entretanto revogado.
 
Crê-se, porém, que nada de substancial se modificou neste conspecto. Assim, o Regulamento do Júri Nacional de Exames, aprovado pelo Despacho Normativo n.º 1-D/2016, do Secretário de Estado da Educação, de 2 de março de 2016[47], determina que as escolas particulares e cooperativas entrem no processo de distribuição das provas, integrando-se nos agrupamentos do Júri Nacional de Exames (cf. artigo 6.º, n.º 1, alínea b)), o qual, para distribuição do serviço de classificação de provas, «solicita aos diretores das escolas do ensino público, particular e cooperativo a indicação de professores classificadores, por cada disciplina com provas de avaliação externa, de acordo com os critérios definidos pelo JNE, em articulação com o IAVE, IP» (cf. n.º 4). Mais dispõe, no artigo 6.º, n.º 7, que «as funções desempenhadas pelos professores que integram as bolsas de classificadores, quer dos estabelecimentos do ensino público quer dos estabelecimentos do ensino particular e cooperativo, enquanto intervenientes no processo de avaliação externa de âmbito nacional, têm especial relevância para o interesse público, estando sujeitos a um conjunto de direitos e deveres consignados nos regulamentos das provas e dos exames do ensino básico e secundário».
 
O Regulamento das Provas de Avaliação Externa e das Provas de Equivalência à Frequência dos Ensinos Básico e Secundário é, nos termos do Despacho Normativo n.º 3-A/2020, do Secretário de Estado da Educação, de 5 de março de 2020[48], que o aprovou, «aplicável aos estabelecimentos de ensino público, particular e cooperativo» (cf. artigo 5.º, n.º 3), motivo por que «as referências (…) aos órgãos de direção, administração e gestão dos estabelecimentos do ensino público, bem como às estruturas de coordenação e supervisão pedagógica, consideram-se dirigidas aos órgãos e estruturas com competência equivalente dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo» (cf. n.º 4).
 
As provas e exames realizam-se numas e nas outras escolas (cf. artigo 3.º, n.º 1) sem que os alunos do ensino particular e cooperativo — uma vez que é considerado verdadeiramente oficial — tenham de ir prestá-los a uma escola pública.
 
Os direitos e deveres dos professores classificadores são enunciados por igual sem distinção alguma entre o ensino público e o ensino particular e cooperativo, de acordo com o n.º 4 e o n.º 5 do artigo 25.º, que passamos a reproduzir:
«Artigo 25.º
(Serviço de exames)
 
                   1 — O serviço de exames, que engloba as provas de aferição, as provas finais, os exames finais nacionais, os exames a nível de escola de línguas estrangeiras equivalentes a exames nacionais e as provas de equivalência à frequência, é de aceitação obrigatória, abrangendo os professores vigilantes e coadjuvantes, os gestores dos programas informáticos de apoio à avaliação externa, os elementos dos secretariados de exames, os técnicos de apoio à realização das provas e os professores classificadores, relatores e especialistas.
 
                   2 — Os inspetores da Inspeção-Geral da Educação e Ciência (IGEC) e das Inspeções Regionais de Educação das Regiões Autónomas têm acesso às salas de realização das provas e exames.
 
                   3 — O anonimato dos professores classificadores das provas, bem como dos professores relatores dos processos de reapreciação e dos professores especialistas dos processos de reclamação, é assegurado a todos e por todos os intervenientes.
 
                   4 — Constituem direitos dos professores classificadores:
 
                   a) Serem consideradas prioritárias as funções de classificação das provas e exames relativamente a quaisquer outras atividades na escola, com exceção das atividades letivas e das reuniões de avaliação dos alunos;
 
                   b) Ser autorizada a marcação de férias até ao início das atividades letivas do ano escolar seguinte, nos termos a definir pelo diretor de escola;
 
                   c) Serem abonados, pela escola em que prestam serviço, de acordo com a legislação em vigor, das ajudas de custo e das despesas de transporte correspondentes às deslocações necessárias para a concretização do processo de avaliação externa, designadamente levantamento e entrega das provas no agrupamento do JNE e realização da componente oral das provas e dos exames de línguas estrangeiras;
 
                   d) Serem dispensados das atividades não letivas durante os períodos fixados anualmente para a classificação das provas e exames.
 
                   5 — Constituem deveres dos professores classificadores:
 
                   a) Manter a segurança das provas e o total sigilo em relação a todo o processo de classificação das provas e exames;
 
                   b) Ser rigoroso e objetivo na apreciação das respostas dadas pelos alunos, respeitando, obrigatoriamente, as orientações contidas nos critérios de classificação, da responsabilidade do IAVE, I. P., no que diz respeito às provas de âmbito nacional, e da responsabilidade das escolas, no caso das provas elaboradas a nível de escola;
 
                   c) Manter, obrigatoriamente, contacto com os professores supervisores do processo de classificação, designados pelo IAVE, I. P., com o objetivo de harmonizar, ajustar e clarificar a aplicação dos critérios de classificação;
 
                   d) Cumprir os procedimentos estabelecidos pelo JNE para o processo de classificação das provas e exames;
 
                   e) Comunicar ao responsável de agrupamento do JNE:
 
                   i) Eventuais irregularidades ou suspeitas de fraude que surjam no decurso do processo de classificação das provas, apresentando relatório devidamente fundamentado;
 
                   ii) Os casos de exames a nível de escola que não se encontrem adequados aos documentos curriculares em vigor.
 
                   6 — A marcação de férias dos professores que integram as bolsas de classificadores não pode incluir os períodos de classificação e de aplicação da componente oral das fases de provas e exames para as quais poderão ser previamente convocados, de forma a assegurar o número necessário de docentes para estas funções, de acordo com Informação Conjunta IAVE, I. P./JNE publicitada anualmente.
 
                   7 — Com vista a garantir o princípio da imparcialidade, o diretor, subdiretor, adjuntos do diretor e outros intervenientes no processo de provas e exames, referidos no n.º 1, devem observar as disposições respeitantes aos casos de impedimento constantes dos artigos 69.º a 72.º do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro.
 
                   8 — Quando se verifique causa de impedimento deve ser comunicado o facto ao respetivo superior hierárquico e, no caso do diretor, ao Presidente do JNE, podendo apenas participar em procedimentos que não comprometam os requisitos de imparcialidade e de anonimato das provas.
 
                   9 — No cumprimento do presente Regulamento e das normas específicas a emitir pelo JNE, os estabelecimentos de ensino público e os estabelecimentos de ensino particular e cooperativo, devem assegurar, em ambas as fases de provas e exames, os recursos humanos necessários à concretização do processo de avaliação externa da aprendizagem, nomeadamente, professores vigilantes e coadjuvantes, elementos do secretariado de exames, técnicos responsáveis pelos programas informáticos e professores classificadores, sem os quais não poderão manter-se na rede de escolas que realizam provas e exames nacionais, referida no artigo 6.º do Regulamento do JNE, que constituiu o Anexo I ao Despacho Normativo n.º 1-D/2016, de 4 de março».
 
Por sua vez, o diretor pedagógico das escolas particulares e cooperativas institui e supervisiona um secretariado de exames próprio que organiza e acompanha o serviço de provas e exames desde a inscrição até ao registo das classificações nos termos oficiais (cf. artigo 26.º, n.º 1). Mais lhe compete designar o coordenador do referido secretariado de entre os professores do quadro (cf. n.º 2).
 
Cabe-lhe, ainda, assegurar a circulação e análise de informação dos relatórios de escola e dos relatórios individuais das provas de aferição (cf. artigo 28.º, n.º 5) e é da sua exclusiva competência decidir sobre a ocorrência de quaisquer situações irregulares durante a realização das provas e exames (cf. artigo 32.º, n.º 1), nomeadamente determinar a anulação em caso de fraude ou sua tentativa (cf. artigo 33.º, n.º 2).
 
Por fim, é aos diretores que cumpre organizar os procedimentos de reapreciação das classificações (cf. artigo 49.º, n.º 1).
 
 
§ 2.6. — O próprio Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo dedica uma secção do capítulo IV do título II à avaliação interna e externa de alunos, cujas prescrições se reproduzem:
 
«SECÇÃO VII
Avaliação
 
Artigo 62.º
(Critérios e processos próprios)
 
                   1 — As escolas do ensino particular e cooperativo podem adotar critérios e processos de avaliação próprios, designadamente, os relativos aos cursos com planos próprios, constam do respetivo regulamento interno.
 
                   2 — Os critérios e processos de avaliação próprios das escolas do ensino particular e cooperativo, que não constem obrigatoriamente do processo de pedido de autorização de funcionamento, nos termos do presente Estatuto, devem ser comunicados ao Ministério da Educação e Ciência, sempre que solicitados ou sempre que sofram alterações.
 
                   3 — Após cada período escolar, as escolas do ensino particular e cooperativo devem tornar públicas as classificações obtidas pelos alunos.
 
Artigo 63.º
(Avaliação externa)
 
                   Os alunos que frequentem os ensinos básico e secundário das escolas do ensino particular e cooperativo estão sujeitos ao regime de avaliação externa estabelecido para os alunos das escolas públicas».
 
Atentando ao artigo 62.º, importa salientar que a maior autonomia a que se abre a avaliação interna é uma autonomia delimitada e responsável. Por isso, os critérios e processos de avaliação próprios são publicados (n.º 1) e tornadas públicas as classificações atribuídas aos alunos no termo de cada período escolar (n.º 3). Critérios e processos próprios, mas que não infletem os critérios e processos gerais, porquanto incidem nas componentes com que as escolas particulares e cooperativas podem complementar o currículo, no que exprimem as suas opções pedagógicas com vasta autonomia.
 
A subordinação dos alunos ao regime de avaliação externa praticado pelas escolas públicas deve ser entendida, não como uma discriminação do ensino particular e cooperativo e da sua autonomia, mas antes como expressão de um domínio comum: o ensino oficial.
 
Não é despiciendo observar que a expressão plúrima da autonomia pedagógica nos múltiplos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo, não fora o elo de ligação por meio do ensino oficial, potenciaria uma completa desregulação no universo daquelas escolas e nas relações entre si.
 
Por outras palavras, o regime da avaliação externa é o mesmo, para cada ciclo de estudos e nível de ensino, quer se trate de escola pública com autonomia simples ou desenvolvida, quer se trate de escola particular ou cooperativa.
 
 
§ 3.
 
Nos termos do artigo 6.º, n.º 1, da Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo, o Estado, não apenas coordena, como também apoia o ensino nas escolas particulares e cooperativas, com ou sem fins lucrativos, «de modo a que as desigualdades sociais, económicas, e geográficas não possam constituir entrave à consecução dos objetivos nacionais de educação», designadamente por meio de contratos administrativos[49] «de forma a garantir progressivamente a igualdade de condições de frequência com o ensino público nos níveis gratuitos e a atenuar as desigualdades existentes nos níveis não gratuitos» (n.º 2, alínea d)). Contratos que preveem apoio pedagógico, científico e financeiro da parte do Estado e obrigações da parte do cocontratante particular ou cooperativo (cf. artigo 8.º, n.º 5).
 
O Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo considera, em desenvolvimento de tais bases, uma vasta série de relações de colaboração que justificam medidas de fomento às famílias e aos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo, uma vez que estes concorrem para o interesse público, por vezes, de modo diferenciado das escolas públicas.
 
Assim, no artigo 8.º, o Estado reafirma o reconhecimento do seu papel «de promoção e garantia da liberdade de escolha e da qualidade da educação e formação». Por outras palavras, a satisfação de necessidades coletivas que decorre da atividade que desenvolvem justifica o apoio financeiro a determinados estabelecimentos do ensino particular e cooperativo.
 
Justifica-se, como tal, conceder apoio às famílias, designadamente às menos favorecidas economicamente, bem como à educação pré-escolar, ao ensino artístico especializado, desportivo ou tecnológico e ao ensino de alunos com necessidades educativas especiais.
 
Para esse efeito, deve o Estado prestar apoio financeiro em cumprimento dos contratos de diversos tipos a celebrar com as entidades titulares de estabelecimentos de ensino particular e cooperativo:
 
              — Contratos simples de apoio à família, através dos quais é veiculado apoio financeiro que permita condições de frequência de escolas do ensino particular e cooperativo aos alunos do ensino básico e do ensino secundário não abrangidos por outros contratos (cf. artigo 12.º, n.º 1 e n.º 2;
              — Contratos de desenvolvimento de apoio à família, destinados a subvencionar o acesso à educação pré-escolar através da concessão de apoios financeiros «com base no princípio do financiamento anual por criança, tendo em consideração os custos correspondentes das escolas públicas de nível e grau equivalentes e a diferenciação do financiamento de acordo com a condição económica do agregado familiar» (cf. artigo 14.º, n.º 3, alínea b));
              — Contratos de associação que são celebrados com escolas particulares ou cooperativas, «com vista à criação de oferta pública de ensino, ficando estes estabelecimentos de ensino obrigados a aceitar a matrícula de todos os alunos até ao limite da sua lotação, seguindo as prioridades idênticas às estabelecidas para as escolas públicas» (cf. artigo 16.º, n.º 2), de modo a que as famílias tenham acesso a um específico projeto educativo, executado em condições não inferiores às que são proporcionadas pela escola pública (cf. artigo 16.º, n.º 1);
              — Contratos de patrocínio que «têm por fim estimular e apoiar o ensino em domínios não abrangidos, ou insuficientemente abrangidos, pela rede pública, a criação de cursos com planos próprios e a melhoria pedagógica» (cf. artigo 19.º, n.º 2) e, bem assim, «promover a articulação entre diferentes modalidades de ensino especializado, designadamente artístico, desportivo ou tecnológico e o ensino regular, nomeadamente ao nível da gestão curricular e do modelo de funcionamento, tendo em vista a respetiva otimização (cf. artigo 19.º, n.º 3);
              — Contratos de cooperação a celebrar com escolas particulares e cooperativas dedicadas «à escolarização de alunos com necessidades educativas especiais decorrentes de deficiências graves ou completas, as quais, comprovadamente, requerem respostas inexistentes nas escolas do ensino regular» (cf. artigo 22.º).
Com maior ou menor expressão, estes estabelecimentos assumem, em contrapartida, obrigações análogas às dos serviços públicos, nomeadamente de universalidade, igualdade, continuidade e adaptação às especificidades de algumas necessidades coletivas a satisfazer.
 
Todavia, as competências da direção pedagógica e a responsabilidade disciplinar dos diretores pedagógicos não dependem de tais relações de colaboração, configuradas por via contratual, sem embargo de um eventual juízo de censura agravado, ao nível disciplinar, quando se trate do incumprimento ilícito e culposo de obrigações de serviço público decorrentes de tais instrumentos negociais.
 
 
§ 4.
 
Considerando que, nos termos do artigo 2.º, da Lei n.º 9/79, de 19 de março, as escolas particulares e cooperativas desempenham uma atividade de interesse público, encontramos a sua autonomia demarcada por uma intervenção significativa da parte do Estado:
 
              — Na homologação da criação de cada estabelecimento de ensino particular ou cooperativo (cf. artigo 29.º), incluindo a denominação respetiva (cf. artigo 28.º);
              — Na autorização de funcionamento, depois de verificado o cumprimento dos requisitos atinentes ao projeto educativo próprio e regulamento interno; as instalações, equipamento e material didático adequados ao número de alunos, disciplinas, percursos e modalidades educativas e formativas a oferecer, de acordo com os requisitos mínimos de referência para as situações em causa; a direção pedagógica; o regime de alunos e pessoal docente; a adequação dos serviços administrativos ao elevado nível pedagógico e científico do estabelecimento (cf. artigo 27.º, artigo 30.º e seguintes);
              — Na autorização da transmissão entre vivos ou mortis causa dos estabelecimentos de ensino (cf. 35.º);
              — No reconhecimento de autonomia pedagógica (cf. artigo 37.º);
              — Na fiscalização do funcionamento dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo (cf. artigo 7.º);
              — Na aplicação do sistema de avaliação externa dos alunos (cf. artigo 63.º);
              — Na apreciação dos critérios e processos de avaliação próprios das escolas do ensino particular e cooperativo, que não constem obrigatoriamente do processo de pedido de autorização de funcionamento, mas que são obrigatoriamente comunicados ao Ministério da Educação (cf. artigo 62.º, n.º 2);
              — Na avaliação da qualidade pedagógica e científica do ensino (cf. artigo 6.º, alínea d));
              — Na fiscalização do cumprimento da lei e na aplicação das sanções previstas em caso de infração (cf. artigo 6.º, alínea j));
              — No exercício do poder disciplinar sobre os docentes no âmbito da avaliação externa dos alunos (cf. artigo 51.º, n.º 2);
              — Na adoção de medidas de polícia administrativa com relação às escolas particulares e cooperativas, designadamente se não dispuserem de autorização de funcionamento ou se o funcionamento se revelar praticado em condições de grave degradação institucional ou pedagógica (cf. artigo 72.º);
              — No exercício do poder disciplinar sobre os proprietários e outros titulares de direitos de exploração (cf. artigo 99.º-A, artigo 99.º-B, artigo 99.º-C, artigo 99.º-D, do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, na redação da Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto);
              — No exercício do poder disciplinar sobre os diretores pedagógicos ou membros de órgãos colegiais de direção pedagógica (cf. artigo 99.º-E, artigo 99.º-F, artigo 99.º-G, artigo 99.º-H, artigo 99.º-I, do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, na redação da Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto).
Sendo o ensino particular de interesse público, é igualmente de interesse público a direção pedagógica dos centros de ensino, não em todos os aspetos da sua atividade, naturalmente, mas naqueles que possam suscitar objeções com fundamento em normas de direito público e comprometer o superior interesse dos alunos.
 
Os deveres profissionais do diretor pedagógico e o seu cumprimento revelam uma profissão de interesse público e cuja prática, de algum modo, incorpora a consecução do interesse público.
 
É o exercício do poder disciplinar sobre as direções pedagógicas a concitar a consulta, pelo que passaremos, de imediato, a caracterizar tais órgãos (colegiais ou unipessoais).
 
 
§ 5.
 
§ 5.1. — Com maior ou menor autonomia, a organização, funcionamento e direção das escolas particulares sempre conheceu um mínimo de atenção da parte do legislador. Atenção que, quanto mais não seja, é devida à necessidade de identificar quem responda perante a administração escolar do Estado.
 
Ao retomar alguns antecedentes nas reformas regalistas de D. JOSÉ I e de SEBASTIÃO JOSÉ DE CARVALHO E MELO, o liberalismo iria confrontar no ensino particular uma posição dominante da Igreja e das ordens religiosas. O Estado, contudo, não dispõe de meios, em especial de professores para recrutar, sequer para os primeiros liceus, da iniciativa de PASSOS MANUEL, muito menos para assegurar os rudimentos da aprendizagem nas centenas ou milhares de aldeias e lugares dispersos. As marcas da clivagem, com excessos de todos os protagonistas, tanto se refletiram no desaproveitamento das capacidades que o ensino particular possuía como na parcimónia de escolas públicas:
 
                   «O processo de afirmação do poder regulador do Estado em matéria de Educação tem a sua expressão na consolidação de um sistema público de ensino, que vai sendo, simultaneamente, alvo de um progressivo alargamento da sua rede e da sua abrangência em termos de população envolvida, e de um reforço do seu papel enquanto referente normativo e regulador do sector não público.
 
                   O peso da Igreja Católica no território educativo é o principal alvo deste combate. Esse peso não se traduzia apenas no número de instituições escolares por ela tuteladas mas também na influência da sua acumulada experiência normativa nas mais diversas áreas, desde os métodos de ensino aos modelos de organização escolar.
 
                   O propósito de contenção do papel da Igreja, em marcha desde Pombal, conhece um momento de grande intensidade com a implantação da República, refreando com o avançar dos anos 1920. No entanto, o desígnio de controlo da iniciativa particular no campo educativo não desaparece durante o Estado Novo, período em que as boas relações entre Salazar e o Patriarcado poderiam ter levado a um claro fortalecimento das instituições escolares católicas[50]».
 
 
§ 5.2. — O Ministério da Instrução Pública deve a sua criação à Lei n.º 12, de 7 de julho 1913[51], para cuja orgânica passavam todas as escolas dependentes dos ministérios do Interior, do Fomento e das Colónias, existentes no território do continente e ilhas adjacentes. Nem uma palavra, contudo, acerca do ensino particular.
 
No entanto, o ensino particular seria atingido, e de modo severo, mas pela rejeição do ensino particular confessional e pela perseguição das ordens religiosas (cf. artigo 3.º, n.º 10, da Constituição de 1911[52]).   
 
A rede pública, porém, continuaria incipiente, até porque grande parte dos indivíduos capacitados para a docência tinham sido expulsos do país. É sintomático o artigo 6.º da referida Lei n.º 12, de 7 de julho de 1913, ao criar o Conselho Nacional dos Amigos da Educação, presidido pelo Ministro da Instrução Pública, com «a missão de promover a instituição de legados e a oferta de dádivas que se destinem ao desenvolvimento da instrução, e bem assim recolhê-los e dar-lhes aplicação». De fora, ficavam os estabelecimentos de ensino que beneficiassem de «administração autónoma pelas leis vigentes» (cf. §5.º).
 
No demais, para as remanescentes escolas privadas, entre outros diplomas vindos da monarquia constitucional, foi preservado o Regulamento Geral do Ensino Secundário de 14 de agosto de 1895, em que se dispunha o seguinte:
 
              «Art. 139.º Todo o indivíduo, corporação ou associação, pode, com autorização legal, estabelecer cursos, colégios ou escolas de ensino particular de instrução secundária»
 
A designação do diretor era particularmente criteriosa, atendendo ao preceito que se transcreve:
 
                   «Art. 147.º Para o exercício das funções de diretor de qualquer instituto particular de ensino secundário, deve o candidato requerer ao governo o respetivo diploma de habilitação, juntando ao requerimento os seguintes documentos:
                   1.º Certidão por onde prove ter vinte e um anos de idade completos;
                   2.º Certificado do registo criminal;
                   3.º Atestados de bom procedimento moral e civil passados pelo administrador do concelho ou pelo comissário de polícia, havendo-o, das localidades onde haja residido nos últimos três anos;
                   4.º Qualquer das seguintes habilitações:
                   a) Diploma de um curso de instrução superior;
                   b) Certidão de aprovação em um curso dos liceus, ou do colégio militar, segundo a legislação vigente à data do presente decreto; ou no curso complementar dos liceus criado pelo decreto de 22 de dezembro de 1894 e organizado por este regulamento; ou no curso complementar do colégio militar, se ali se adotar a presente organização do ensino secundário.
                   § Único. O governo, se o requerente junta à petição os documentos fixados pelo artigo antecedente, manda passar, sem dependência de exame, o diploma de habilitação para o exercício das funções de diretor de estabelecimento particular de ensino secundário».
Sem prejuízo das competências do antigo Ministério do Reino e dos deveres dos diretores para com os serviços inspetivos centrais, previa-se a supervisão de cada estabelecimento particular pelo reitor do liceu territorialmente competente, incumbido de levar a cabo visitas periódicas (cf. artigo 153.º).
 
E mais se dispunha, em matéria de responsabilidade disciplinar, o seguinte:
 
                   «Art. 154.º Ao indivíduo, corporação ou associação que haja estabelecido qualquer instituto de ensino secundário particular, e bem assim ao diretor do referido instituto, pertence imediata responsabilidade pelo cumprimento de todas as condições a que o mesmo estabelecimento e seu pessoal devem satisfazer, e por quaisquer faltas que se cometam nos referidos institutos contra as disposições legais, ainda quando se prove que estas faltas resultaram, por sua parte, da omissão voluntária de um dever, ou da inobservância dos preceitos preventivos das leis e regulamentos, independentemente da intenção maléfica.
                   § Único. O indivíduo, o diretor, e a associação ou corporação de que trata este artigo, representam todos e cada um, na relação com a autoridade pública, o estabelecimento a que o mesmo artigo se refere».
Previam-se infrações específicas no domínio pedagógico e respetivas penas, como se transcreve:
 
              «Art. 160.º É expressamente proibido que os diretores e professores particulares de instrução secundária obriguem os alunos à compra ou à lição de livros não adotados pelo governo, e promovam direta ou indiretamente a venda, aos mesmos alunos, de lições ou explicações impressas ou litografadas.
                   § 1.º Os diretores e professores de institutos particulares de ensino secundário serão punidos na primeira transgressão deste artigo com a pena de encerramento do respetivo instituto, ou com a de suspensão do exercício do magistério por um ano. Nas reincidências estas penas serão elevadas a três anos.
                   € 2.º Quando o diretor do instituto não for cumulativamente proprietário do mesmo instituto, a pena será sempre de suspensão de exercício.
                   Art. 161.º Os diretores e professores de instrução secundária que abusarem do seu ministério ensinando doutrinas ofensivas da moral, da religião, da constituição do estado, ou subversivas da ordem estabelecida, são punidos pela primeira vez com a suspensão de exercício do seu ministério por um ano.
                   Art. 162.º As penas contra os diretores e professores particulares de ensino secundário são:
                   1.º Repreensão particular;
                   2.º Admoestação pública;
                   3.º Suspensão de exercício do respetivo ministério por seis meses a um ano;
                   4.º Encerramento do instituto por um a três anos;
                   5.º Encerramento do instituto por tempo indeterminado.
                   §1.º A aplicação das penas gradua-se pela gravidade dos factos. As penas mencionadas nos n.ºs 3 e 4 elevam-se até quatro anos ou a tempo indeterminado, nos casos de reincidência. Todas as penalidades são sempre sem prejuízo da ação da justiça ordinária se estiverem também ao alcance dessa justiça os motivos que lhes deram causa.
                   § 2.º A primeira pena é imposta pelo reitor do liceu do distrito respetivo. A segunda, a terceira e a quarta são da competência do governo em decreto publicado na folha oficial pela direção geral da instrução pública».
Por fim, e de acordo com o artigo 163.º, o processo sancionatório era instruído pelo reitor do liceu nacional territorialmente competente e, antes de aplicadas as penas mais severas era ouvido o Conselho Superior de Instrução Pública.
 
As alterações mais significativas ao regime do ensino particular sobreviriam com a ditadura nacional.
 
 
§ 5.3. — Embora o Decreto n.º 20 613, de 11 de dezembro de 1931 (Estatuto do Ensino Particular) se propusesse tão-só coligir «em um só diploma as diferentes disposições legais publicadas acerca do ensino particular e ao mesmo tempo determinar condições de exercício de atividades educativas e docentes dos institutos de ensino particular, que não tinham sido previstas», viria a imprimir maior intensidade à subordinação pedagógica.
 
Demarcava-se ensino particular e ensino oficial, prestado este, exclusivamente nas escolas públicas, podendo, contudo, ser adquiridas externamente habilitações totais ou parciais do ensino primário (elementar e complementar), liceal, técnico-profissional (elementar e médio), do Conservatório Nacional ou do magistério primário (cf. artigo 18.º).
 
Perante o ensino oficial, os alunos do ensino particular recebiam tratamento análogo ao que era dispensado aos alunos do ensino doméstico (cf. artigo 20.º).
 
As funções de diretor só podiam ser desempenhadas por quem dispusesse de diploma de professor do ensino particular (cf. artigo 45.º), ocorrendo igual tratamento para efeitos disciplinares, pelo que se sujeitavam às penalidades de advertência, suspensão de três meses a dois anos, ou mesmo definitiva, a aplicar pelo Ministro da Instrução Pública, mediante processo disciplinar com audiência do acusado para sua defesa (cf. artigo 43.º).
 
Nos termos do Decreto-Lei n.º 23 447, de 5 de janeiro de 1934, a fiscalização de escolas particulares pelo Estado incidia em tudo o que fosse «ministrado a alunos em comum» ou tivesse por objeto «ministrar conhecimentos ou desenvolver aptidões com destino à aquisição de diplomas ou outros instrumentos oficiais comprovativos de habilitações» (cf. artigo 1.º). E, em tais casos (a generalidade, no contexto da escola, a bem dizer) a fiscalização incidia na idoneidade física, moral e profissional dos docentes e no desempenho da sua função segundo «as convenientes regras da higiene e da pedagogia» (cf. artigo 3.º).
 
O Estado incumbia a Inspeção-Geral do Ensino Particular de providenciar por inspeções, exames, vistorias ou outras diligências (cf. artigo 9.º, §1.º).
 
Os alunos do ensino particular eram considerados externos «em relação ao ensino oficial a cujas habilitações aspiram» (cf. artigo 18.º, §1.º), pelo que o seu ensino tinha de obedecer «aos programas adotados nos correspondentes estabelecimentos do Estado» (cf. artigo 20.º). Aliás, teriam de matricular-se oficialmente sem o que não poderiam ser admitidos «a exames ou provas para validação oficial de habilitações» (cf. artigo 24.º, §1.º).
 
A respeito da direção das escolas do ensino particular, dispunha-se o seguinte:
 
                   «Art. 53.º Para o exercício das funções de diretor de estabelecimento de ensino particular, salas de estudo ou pensionatos escolares é indispensável a posse do respetivo diploma, passado pela Inspeção Geral mediante habilitação que obedece às prescrições do artigo 49.º.
                   Art. 54.º O diploma de diretor de estabelecimento de ensino particular pode ainda ser passado mediante aprovação em Exame de Estado, cujas provas serão oportunamente reguladas.
                   Art. 55.º Quando um estabelecimento de ensino particular mudar de diretor, o seu proprietário deverá fazer a respetiva comunicação à Inspeção Geral do Ensino Particular, indicando o nome do novo diretor para efeitos do devido averbamento no alvará de abertura.
                   Art. 56.º Quando em um estabelecimento se ministrarem vários graus de ensino, bastará que o seu diretor possua um dos diplomas do grau superior».
De acordo com o artigo 74.º, os diretores encontravam-se obrigados a enviar à Inspeção Geral do Ensino Particular «um exemplar de todas as publicações, prospetos e anúncios referentes às organizações que dirigem dentro do prazo de oito dias, contados a partir da data da sua publicação».
 
A Lei n.º 2033, de 27 de junho de 1949[53], aprovaria as Bases do Ensino Particular, cabendo ao Decreto n.º 37 545, de 8 de setembro de 1949, a sua regulamentação.
 
Este diploma, designado Estatuto do Ensino Particular, que haveria de permanecer inalterado até à sua revogação pelo Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, distinguia, nos termos do artigo 6.º, n.º 2, os estabelecimentos em colégios (prestação de ensino e condições de estudo a alunos internos), externatos (prestação de ensino a alunos que não vivam no estabelecimento), salas de estudos (apenas prestação de condições de estudo) e pensionatos (quando alberguem mais de cinco alunos, quer do ensino particular quer do ensino oficial, e lhes proporcionem condições de estudo).
 
De acordo com o artigo 22.º, n.º 2, «o ensino particular é considerado função pública para o efeito das responsabilidades a exigir àqueles que o exercem» e, por força do artigo 31.º, n.º 7, o exercício das funções de diretor era disciplinado pelas normas que no ensino denominado oficial incidiam nos reitores e diretores.
 
Professores e diretores respondiam disciplinarmente perante o Ministro da Educação Nacional quando cometessem infrações, faltassem ao cumprimento dos deveres que lhes incumbiam, «desrespeitando as leis ou os princípios pedagógicos, ou não tendo, dentro ou fora da escola, procedimento moral irrepreensível» (cf. artigo 32.º, n.º 2), aplicando-se subsidiariamente o Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis (cf. n.º 7). A administração educativa mantinha um cadastro de professores e diretores do ensino particular, do qual constavam as penalidades sofridas, as informações prestadas por entidades oficiais e outras quaisquer indicações que merecessem interesse (cf. artigo 33.º, n.º 1).
 
Prosseguiria a matrícula obrigatória dos alunos nas escolas do Estado (cf. artigo 35.º e seguinte) sob o estatuto de alunos externos que vinha de trás, ali realizando exames[54], sendo que, como observa PAULO PULIDO ADRAGÃO[55], «a possibilidade de realizar exames nas próprias escolas particulares (independentemente da projetada oficialização), posteriormente aberta pelo Decreto-Lei n.º 41 192, de 18 de julho de 1957, não [tivesse representado] uma alteração substancial, uma vez que manteve o mesmo tipo de júris».
 
Ao longo deste período, considera RODRIGO QUEIRÓS E MELO[56] ter a autonomia do ensino particular ficado «restringida às atividades extracurriculares e regras de admissão na medida em que, quanto aos processos pedagógicos curriculares, tem de seguir o disposto para os estabelecimentos de ensino propriedade do Estado». Com efeito, previa-se no artigo 3.º «uma profunda intervenção da inspeção geral do ensino particular no funcionamento destes estabelecimentos de ensino de que se destaca: (i) assistência a aulas; (ii) velar pelo ‘irrepreensível comportamento moral e cívico [dos agentes de ensino] dentro e fora das aulas’; (iii) fiscalizar ‘o modo como são educados os alunos do sexo feminino, exigindo que a educação seja orientada no sentido da conservação e defesa das virtudes tradicionais da mulher portuguesa e da exaltação da dignidade moral dos lares’; e (iv) receber cópia de todas as circulares, anúncios e publicações que os estabelecimentos de ensino elaborem[57]». A este controlo acrescia, como faz notar o Autor[58], a imposição de uniformidade com os planos e programas do ensino oficial, com os compêndios e manuais e a distribuição da carga letiva entre disciplinas.
 
 
§ 6.
 
§ 6.1. — A direção pedagógica com poderes próprios e reservados constitui hoje uma garantia de autonomia pedagógica, em face da Administração Pública e em face do proprietário da escola.
 
Dispõe-se na Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo, nesta matéria, o que vai reproduzido:
 
«Artigo 10.º
                   1 — É condição de funcionamento das escolas particulares e cooperativas a existência de uma direção pedagógica, exercida por pessoa singular ou por órgão colegial, que inclua um representante da entidade a quem haja sido outorgada a licença para a constituição da escola.
 
                   2 - Ao diretor pedagógico ou, no caso da direção colegial, a um dos seus membros, pelo menos, são exigidos grau académico suficiente para lecionar cursos de categoria não inferior ao curso de nível mais elevado ministrado na escola e experiência pedagógica de, pelo menos, dois anos».
 
Por isso, de acordo com o atual Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, confirma-se ser obrigatório haver uma direção pedagógica diferenciada da direção exercida pelo proprietário ou por quem entenda designar, sendo que também a direção não pedagógica dispõe de funções próprias e sujeita-se, de igual modo, a responsabilidade disciplinar perante o Ministro da Educação:
 
«Artigo 38º
(Competências da entidade titular)
 
                   1 — Às entidades titulares de autorização de funcionamento de escolas do ensino particular e cooperativo compete:
                   a) Definir orientações gerais para a escola;
                   b) Assegurar os investimentos necessários ao normal funcionamento do estabelecimento;
                   c) Representar a escola em todos os assuntos de natureza administrativa e financeira;
                   d) Responder pela correta aplicação dos apoios financeiros recebidos;
                   e) Estabelecer a organização administrativa e as condições de funcionamento da escola;
                   f) Assegurar a contratação e a gestão do pessoal;
                   g) Prestar ao Ministério da Educação e Ciência as informações que este, nos termos da lei, solicitar;
                   h) Assegurar a divulgação pública do projeto educativo, das condições de ensino e os resultados académicos obtidos pela escola, nomeadamente nas provas e exames nacionais, e tornar públicas as demais informações necessárias a uma escolha informada a ser feita pelas famílias e pelos alunos;
                   i) Manter registos escolares dos alunos, em condições de autenticidade e segurança;
                   j) Cumprir as demais obrigações impostas por lei.
 
                   2 — As competências previstas no número anterior podem ser exercidas diretamente pelas entidades titulares, ou através de representante ou representantes por elas designados, nos termos dos respetivos estatutos.
 
                   3 — O incumprimento do disposto no presente artigo é punível nos termos do n.º 4 do artigo 6.º do decreto-lei que aprova o presente Estatuto».
 
Sendo estas as competências da direção exercida por quem dispõe da homologação e autorização de funcionamento, passemos à direção pedagógica:
 
«Artigo 40.º
(Natureza e função)
 
                   1 — Em cada escola de ensino particular ou cooperativo tem que existir uma direção pedagógica, designada pela entidade titular da autorização.
 
                   2 — A direção pedagógica pode ser singular ou colegial.
 
                   3 — A direção pedagógica é colegial sempre que, além da sede, a escola funcione também em secções, polos ou delegações.
 
                   4 — Para os efeitos previstos no n.º 1, considera-se a mesma escola aquela que, independentemente do número de edifícios e localidades onde funciona, se rege pelo mesmo projeto educativo e é detentora de uma única autorização de funcionamento.
 
                   5 — O exercício do cargo de diretor pedagógico ou de presidente da direção pedagógica é incompatível com o exercício do mesmo cargo numa outra escola.
 
                   6 — Ao diretor pedagógico ou ao presidente da direção pedagógica são exigidas qualificações académicas de nível superior e habilitações profissionais adequadas ou, em substituição destas últimas, experiência pedagógica de, pelo menos, três anos.
 
                   7 — O exercício de funções de direção pedagógica é equiparável, para todos os efeitos legais, à função docente.
 
Artigo 41.º
(Competências)
 
                   Compete à direção pedagógica a orientação da ação educativa da escola e, designadamente:
                   a) Representar a escola junto do Ministério da Educação em todos os assuntos de natureza pedagógica;
                   b) Planificar e superintender nas atividades curriculares e culturais;
                   c) Promover o cumprimento dos planos e programas de estudos;
                   d) Velar pela qualidade do ensino;
                   e) Zelar pela educação e disciplina dos alunos».
 
Às competências assinaladas acresce, por força do artigo 31.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 55/2018, de 6 de julho, a de passarem diplomas e certificados com identificação do nível de qualificação, de acordo com o Quadro Nacional de Qualificações[59] e do nível que lhe corresponde no Quadro Europeu (cf. n.º 1).
 
Às escolas do ensino particular e cooperativo assiste autonomia pedagógica análoga à das escolas públicas sob contrato de autonomia[60] (cf. artigo 37.º, n.º 3, do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo), cujo enquadramento se delineou através da Portaria n.º 59/2014, de 7 de março, em especial das disposições que passamos a transcrever:
 
«Artigo 3.º
(Âmbito da autonomia)
 
                   1 — Às escolas do ensino particular e cooperativo é conferida a faculdade de poderem gerir, de forma flexível nos termos dos números seguintes, a carga horária das diferentes disciplinas curriculares, desde que cumpram em cada ciclo de estudos e relativamente a cada disciplina ou área disciplinar obrigatória, os programas, metas curriculares e orientações curriculares.
 
                   2 — No âmbito da respetiva autonomia e tendo em conta as especificidades de cada turma são permitidas às escolas particulares e cooperativas:
                   a) Decidir, de acordo com os limites previstos no n.º 4, o tempo letivo a atribuir a cada disciplina ou área disciplinar;
                   b) Gerir livremente, ao longo do ano letivo e do ciclo de estudos, o tempo letivo atribuído a cada disciplina ou área disciplinar;
                   c) Oferecer, dentro do tempo curricular total anual, outras disciplinas ou áreas disciplinares complementares, em função do seu projeto educativo;
                   d) Gerir a distribuição das diferentes disciplinas em cada ano ao longo do ciclo de escolaridade, exceto nas disciplinas de Português e Matemática.
 
                   3 — Sem prejuízo da sua autonomia, as escolas particulares e cooperativas ficam obrigadas ao cumprimento de uma carga curricular total semanal igual ou superior ao total definido na matriz curricular nacional para cada ano, ciclo, nível e modalidade de educação e formação.
 
                   4 — As escolas particulares e cooperativas ficam impedidas de:
                   a) Atribuir a cada disciplina ou área disciplinar uma carga horária total inferior a 75% do tempo mínimo previsto na matriz curricular nacional;
                   b) Atribuir às disciplinas de português e matemática uma carga horária total inferior ao tempo mínimo previsto na matriz curricular nacional;
                   c) Atribuir a qualquer disciplina prevista na matriz curricular nacional uma carga horária total inferior a 45 minutos por semana.
 
                   5 — Para a realização dos cálculos da carga horária prevista nos números anteriores, considera-se o número de semanas de atividades letivas previsto no calendário escolar».
 
Bem se vê, pois, que as funções de direção pedagógica dispõem de significativa margem de autonomia, por conta, fundamentalmente, da autonomia que é reconhecida às próprias escolas do ensino particular e cooperativo.
 
 
§ 6.2. — Passemos, então, a observar as relações jurídicas que se estabelecem entre o diretor pedagógico, por um lado, com o proprietário, e por outro, com o Estado.
 
O proprietário apresenta-se como empregador do diretor pedagógico (ou membros da direção pedagógica) assistindo-lhe ampla liberdade na sua designação de entre cidadãos que reúnam «qualificações académicas de nível superior e habilitações profissionais adequadas ou, em substituição destas últimas, experiência pedagógica de, pelo menos, três anos» (cf. artigo 40.º, n.º 6, do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo).
 
A lei não especifica quais as habilitações profissionais que toma por adequadas, mas admite um mínimo de três anos de experiência pedagógica.
 
A experiência pedagógica, contudo, também não é especificada, mas tudo leva a crer que professores ou educadores se encontrem especialmente vocacionados para o efeito, até porque, de acordo com o artigo 40.º, n.º 7, «o exercício de funções de direção pedagógica é equiparável, para todos os efeitos legais, à função docente».
 
Não quer isto dizer que o inverso possa ser afirmado, ou seja, que o exercício de funções docentes seja plenamente equiparado ao desempenho de funções de direção pedagógica, mas o certo é que a lei aponta para uma ampla intercomunicabilidade.
 
A norma em questão não se limita a determinar que o tempo de serviço em funções de direção pedagógica conta como tempo efetivo de serviço docente para efeitos de carreira, de aposentação ou reforma. Não, a lei determina que a suscetibilidade de equiparação entre umas e outras funções ocorre para todos os efeitos legais.
 
Apesar de serem consideradas de interesse público[61], apesar de algumas, em especial, serem convocadas a satisfazer subsidariamente necessidades coletivas que o Estado não se encontra em condições de assegurar diretamente, e não obstante as obrigações típicas de serviço público que decorrem para os estabelecimentos dotados de apoio financeiro nos regimes contratuais que identificámos, as escolas particulares e cooperativas não constituem um serviço público na aceção estrita.
 
Tão-pouco são estes estabelecimentos considerados prestadores de serviços públicos essenciais para efeitos de aplicação da Lei n.º 23/96, de 26 de julho[62], cujo artigo 1.º, n.º 2, os deixa omissos.
 
Todavia, a Lei de Bases do Sistema Educativo, nos artigos 57.º e seguintes, incorpora alguns estabelecimentos do ensino particular e cooperativo na rede escolar, apesar de indiciar simplesmente um princípio de articulação:
 
«CAPÍTULO VIII
Ensino particular e cooperativo
 
 
Artigo 57.º
(Especificidade)
 
                   1 — É reconhecido pelo Estado o valor do ensino particular e cooperativo como uma expressão concreta da liberdade de aprender e ensinar e do direito da família a orientar a educação dos filhos.
 
                   2 — O ensino particular e cooperativo rege-se por legislação e estatuto próprios, que devem subordinar-se ao disposto na presente lei.
 
Artigo 58.º
(Articulação com a rede escolar)
 
                   1 — Os estabelecimentos do ensino particular e cooperativo que se enquadrem nos princípios gerais, finalidades, estruturas e objetivos do sistema educativo são considerados parte integrante da rede escolar.
 
                   2 — No alargamento ou no ajustamento da rede o Estado terá também em consideração as iniciativas e os estabelecimentos particulares e cooperativos, numa perspetiva de racionalização de meios, de aproveitamento de recursos e de garantia de qualidade.
 
Artigo 59.º
(Funcionamento de estabelecimentos e cursos)
 
                   1 — As instituições de ensino particular e cooperativo podem, no exercício da liberdade de ensinar e aprender, seguir os planos curriculares e conteúdos programáticos do ensino a cargo do Estado ou adotar planos e programas próprios, salvaguardadas as disposições constantes do n.º 1 do artigo anterior.
 
                   2 — Quando o ensino particular e cooperativo adotar planos e programas próprios, o seu reconhecimento oficial é concedido caso a caso, mediante avaliação positiva resultante da análise dos respetivos currículos e das condições pedagógicas da realização do ensino, segundo normas a estabelecer por decreto-lei.
 
                   3 — A autorização para a criação e funcionamento de instituições e cursos de ensino superior particular e cooperativo, bem como a aprovação dos respetivos planos de estudos e o reconhecimento oficial dos correspondentes diplomas, faz-se, caso a caso, por decreto-lei.
 
Artigo 60.º
(Pessoal docente)
 
                   1 — A docência nos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo integrados na rede escolar requer, para cada nível de educação e ensino, a qualificação académica e a formação profissional estabelecidas na presente lei.
 
                   2 — O Estado pode apoiar a formação contínua dos docentes em exercício nos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo que se integram na rede escolar.
 
Artigo 61.º
(Intervenção do Estado)
 
                   1 — O Estado fiscaliza e apoia pedagógica e tecnicamente o ensino particular e cooperativo.
 
                   2 — O Estado apoia financeiramente as iniciativas e os estabelecimentos de ensino particular e cooperativo quando, no desempenho efetivo de uma função de interesse público, se integrem no plano de desenvolvimento da educação, fiscalizando a aplicação das verbas concedidas».
 
O facto de integrarem a rede escolar não lhes subtrai a natureza particular ou cooperativa. De outro modo, sairia comprometido o direito a criar escolas particulares e cooperativas (cf. artigo 43.º, n.º 4, da Constituição) ao mesmo tempo que se poria em causa a garantia institucional de três diferentes sectores no ensino, como esteio de pluralismo cultural (cf. artigo 75.º, n.º 1).
 
Se o Estado deve assegurar a cobertura das necessidades educativas de toda a população através de uma rede de estabelecimentos públicos de ensino (cf. artigo 75.º, n.º 1), reconhece e fiscaliza as escolas particulares e cooperativas (cf. n.º 2) cujo papel concorre positivamente com o do Estado, alargando a oferta qualitativa e quantitativamente, e pode mesmo confortar a rede pública, tanto quanto o programa universal esteja sempre em aberto.
 
 
§ 7.
 
Os estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário ou os respetivos agrupamentos obedecem a uma organização própria diferente e que se reparte, nos termos do artigo 10.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 75/2008, de 22 de abril[63], por quatro órgãos:
 
              — O conselho geral, «órgão de direção estratégica responsável pela definição das linhas orientadoras da atividade da escola, assegurando a participação e representação da comunidade educativa» (cf. artigo 11.º, n.º 1);
              — O diretor, «órgão de administração e gestão do agrupamento de escolas ou escola não agrupada nas áreas pedagógica, cultural, administrativa, financeira e patrimonial» (cf. artigo 18.º);
              — O conselho pedagógico[64], «órgão de coordenação e supervisão pedagógica e orientação educativa do agrupamento de escolas ou escola não agrupada, nomeadamente nos domínios pedagógico-didático, da orientação e acompanhamento dos alunos e da formação inicial e contínua do pessoal docente (cf. artigo 31.º);
              — O conselho administrativo, «órgão deliberativo em matéria administrativo-financeira do agrupamento de escolas ou escola não agrupada, nos termos da legislação em vigor» (cf. artigo 36.º).
Como já se referiu incidentalmente, algumas escolas públicas ou seus agrupamentos dispõem de um regime de autonomia desenvolvida, assente em contrato interadministrativo (cf. artigo 9.º, n.º 3 e n.º 4, e artigo 57.º) que lhes permite, de acordo com o artigo 8.º, n.º 1, «tomar decisões nos domínios da organização pedagógica, da organização curricular, da gestão dos recursos humanos, da ação social escolar e da gestão estratégica, patrimonial, administrativa e financeira, no quadro das funções, competências e recursos que lhe estão atribuídos», sendo que a extensão da autonomia «depende da dimensão e da capacidade do agrupamento de escolas ou escola não agrupada e o seu exercício supõe a prestação de contas, designadamente através dos procedimentos de autoavaliação e de avaliação externa» (cf. n.º 2).
 
Tratando-se, independentemente do grau de autonomia, de unidades de um serviço público, incumbidas, por natureza, de assegurar os princípios da continuidade, da universalidade e da adaptação às necessidades coletivas, conferem-se poderes exorbitantes ao Ministro da Educação, conquanto exercidos a título excecional:
 
«Artigo 35º
(Dissolução dos órgãos)
 
                   1 — A todo o momento, por despacho fundamentado do membro do Governo responsável pela área da educação, na sequência de processo de avaliação externa ou de ação inspetiva que comprovem prejuízo manifesto para o serviço público ou manifesta degradação ou perturbação da gestão do agrupamento de escolas ou escola não agrupada, podem ser dissolvidos os respetivos órgãos de direção, administração e gestão.
 
                   2 — No caso previsto no número anterior, o despacho do membro do Governo responsável pela área da educação que determine a dissolução dos órgãos de direção, administração e gestão designa uma comissão administrativa encarregada da gestão do agrupamento de escolas ou escola não agrupada.
 
                   3 — A comissão administrativa referida no número anterior é ainda encarregada de organizar novo procedimento para a constituição do conselho geral, cessando o seu mandato com a eleição do diretor, a realizar no prazo máximo de 18 meses a contar da sua nomeação».
 
Os membros ou titulares unipessoais de tais órgãos, «no exercício das respetivas funções», respondem «perante a administração educativa, nos termos gerais de direito» (cf. artigo 51.º), o que significa, em primeira mão, responsabilidade disciplinar devolvida à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.
 
Já as escolas particulares e cooperativas do ensino básico e secundário, uma vez criadas como espaço da liberdade de aprender e de ensinar, gozam de autonomia na sua organização interna, salvo quanto aos domínios especificamente estatuídos, como é o caso da direção pedagógica.
 
O direito a criar escolas, sem prejuízo da fiscalização a exercer pela Administração Pública, compreende a liberdade de conformar a direção e coordenação dos seus serviços.
 
 
§ 8.
As infrações e as penas disciplinares aplicáveis aos diretores pedagógicos de escolas particulares e cooperativas encontram-se nas disposições subsistentes do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, na redação que a Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto, lhe atribuiu.
 
Uma vez que algumas preveem e sancionam infrações disciplinares imputadas a outros agentes, que não os diretores pedagógicos, iremos cingir-nos à transcrição dos preceitos a estes estritamente concernentes:
«Artigo 99.º-E
                   Aos diretores pedagógicos dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo que violem o disposto na presente lei e em demais legislação aplicável são aplicadas, pelo Ministro da Educação e Ciência, as seguintes sanções:
                   a) Advertência;
                   b) Multa de valor entre 1 e 10 salários mínimos nacionais;
                   c) Suspensão de funções por período de um mês a um ano;
                   d) Proibição definitiva do exercício de funções de direção.
Artigo 99.º-F
                   A pena de advertência é aplicada aos diretores pedagógicos em casos de incumprimento de determinações legais ou pedagógicas não suscetíveis de comprometerem o normal funcionamento da escola ou o aproveitamento dos alunos.
Artigo 99.º-G
 
                   A pena de multa de valor entre 1 e 10 salários mínimos nacionais é aplicada aos diretores pedagógicos em casos de incumprimento de determinações legais ou pedagógicas, nomeadamente quando:
                   a) Não promovam o cumprimento dos planos e programas de estudos;
                   b) Não respeitem as regras estabelecidas para os atos de matrícula, inscrição e avaliação dos alunos;
                   c) Não cumpram as regras estabelecidas para a feitura dos horários;
                   d) Não prestem as informações solicitadas, nos termos da lei, pelo Ministério da Educação e Ciência;
                   e) Não assegurem a guarda e conservação da documentação em uso na escola;
                   f) Não enviem ao Ministério da Educação e Ciência, nas datas estabelecidas, as relações de docentes e alunos, nomeadamente as relativas a matrículas e aproveitamento;
                   g) Na sua relação funcional com alunos, colegas e encarregados de educação, não usarem do necessário respeito e correção;
                   h) Pratiquem reiteradamente os atos descritos no artigo anterior.
 
Artigo 99.º-H
 
                   A pena de suspensão de funções por período de um mês a um ano é aplicada aos diretores pedagógicos em caso de negligência grave ou grave desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres profissionais, nomeadamente quando:
                   a) Prestarem ao Ministério da Educação e Ciência declarações falsas relativas a si próprios ou relativas ao corpo docente e discente;
                   b) No exercício das suas funções demonstrarem falta de isenção e imparcialidade, nomeadamente em matéria relativa à avaliação dos alunos;
                   c) Não cumprirem as obrigações que lhes cabem decorrentes dos contratos e apoios financeiros estabelecidos pelo Estado;
                   d) Não cumprirem as condições estabelecidas para a autonomia e o paralelismo pedagógico;
                   e) Incumprirem as suas obrigações de velar pela qualidade do ensino e de zelar pela educação e disciplina dos alunos;
                   f) Quando, reiteradamente, pratiquem infrações previstas no artigo 99.ºG da presente lei.
 
Artigo 99.º-I
 
                   A sanção de proibição definitiva do exercício da função de direção é aplicada aos diretores pedagógicos que incorrerem novamente nas situações previstas no artigo anterior e ainda:
                   a) Nos casos de comprovada incompetência profissional;
                   b) Nos casos de comprovada falta de idoneidade moral para o exercício das funções.
 
Artigo 99.º-J
 
                   A aplicação das sanções previstas na presente lei é precedida de processo disciplinar, a instaurar pelo serviço do ministério que tutele a educação que seja territorialmente competente na área onde se situa a escola e a instruir pela Inspeção-Geral da Educação.
 
Artigo 99.º-K
 
                   O Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro, deve aplicar-se, subsidiariamente e com as devidas adaptações, às situações não previstas expressamente na presente lei».
 
Temos, assim, que contrariamente ao que sucede em relação aos docentes do ensino particular e cooperativo, foram configuradas infrações e sanções a aplicar aos diretores pedagógicos[65] e estabelecido um nexo de correspetividade entre os ilícitos disciplinares e as sanções aplicáveis.
 
Pretende-se salvaguardar a imparcialidade na avaliação, a qualidade do ensino, o cumprimento da autonomia, o rigor financeiro, o bom funcionamento da escola, compreendendo a disciplina dos alunos, e, sobretudo, o interesse da comunidade educativa.
 
Confirma-se, pois, que a responsabilidade disciplinar em face do Ministro da Educação estende-se muito para lá da avaliação externa dos alunos, como, ao invés, se dispõe relativamente aos docentes.
 
As penas disciplinares menores são uma forma de repreensão sob a designação de advertência[66] (cf. artigo 99.º-F) e as multas, a fixar entre uma e dez retribuições mínimas mensais garantidas[67] (cf. 99.º-G).
 
Estatuíram-se duas penas bem mais gravosas, que afetam o exercício de funções pelos diretores pedagógicos: a suspensão de funções entre um mês e um ano (cf. artigo 99.º-H) e a demissão imediata, acrescida da proibição definitiva de retomar tais funções[68] (cf. artigo 99.º-I).
 
Esta última pressupõe um comportamento ilícito reincidente e, de modo cumulativo, a formulação de um juízo severo acerca da competência profissional do arguido (cf. alínea a)) ou da sua comprovada falta de idoneidade moral para ser diretor pedagógico (cf. alínea b)).
 
Encontram-se, pois, em estatuto semelhante, mas apenas semelhante, ao dos membros dos órgãos de direção das escolas públicas e seus agrupamentos. Apenas semelhante, na medida em que não se encontram vinculados por ordens ou instruções da Administração Pública e porque o regime disciplinar dos trabalhadores em funções públicas só se lhes aplica subsidiariamente.
 
 
§ 9.
 
§ 9.1. — No desempenho das incumbências de avaliação (interna e externa) dos alunos e na prestação de um ensino de qualidade, as escolas particulares e cooperativas do ensino básico e secundário devem ser consideradas entidades privadas com funções públicas, dispondo de alguns poderes públicos.
 
Assim, não obstante se cuidar apenas dos docentes e das funções desempenhadas na avaliação externa dos alunos, considerou este órgão consultivo, no Parecer n.º 23/2015, de 11 de setembro de 2015, encontrar-se uma manifestação de tal fenómeno no ensino particular e cooperativo. Acompanhemos o seguinte trecho:
 
                   «O EEPC de 2013 expressa um conjunto de opções programáticas que confluíram numa pluralidade de manifestações de exercícios de funções públicas por particulares, e, embora se tenha verificado uma deflação dos poderes sancionatórios do Estado sobre os docentes do EPC, o legislador entendeu que, apesar da ausência de um vínculo de emprego público, quanto à matéria de avaliação externa dos alunos do ensino não superior esses agentes deveriam ser sujeitos ao poder disciplinar direto do Estado, exercido através da IGEC».
 
As razões ali descortinadas valem para os diretores pedagógicos ou membros de órgãos de direção pedagógica, até por maioria de razão.
 
E podemos mesmo acrescentar alguns indicadores pertinentes que reforçam um tal juízo.
 
O ensino particular e cooperativo é de interesse público (cf. artigo 2.º da Lei n.º 9/79, de 19 de março) e não apenas de interesse geral. As escolas particulares e as escolas cooperativas «quando ministrem ensino coletivo que se enquadre nos objetivos do Sistema Nacional de Educação, gozam das prerrogativas das pessoas coletivas de utilidade pública» (cf. artigo 3.º, n.º 2) e fazem parte integrante da rede escolar, de acordo com o artigo 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 108/88, de 31 de março, motivo por que «o dimensionamento da rede escolar dependente do Ministério da Educação, no que respeita ao seu alargamento, reconversão ou ajustamento, terá obrigatoriamente em consideração as iniciativas dos estabelecimentos particulares e cooperativos, tendo em vista uma melhor racionalização dos meios disponíveis, um melhor aproveitamento de recursos e a defesa e garantia da qualidade do ensino ministrado» (cf. artigo 4.º).
 
A avaliação dos alunos é produzida autonomamente e as classificações e aprovações obtidas dispõem de eficácia plena na ordem jurídica (cf. artigo 37.º, n.º 2, alínea d), do Estatuto).
 
Os docentes podem transitar para o ensino público com garantia da carreira e do tempo de serviço (cf. artigo 11.º, n.º 2, da Lei n.º 9/79, de 19 de março).
 
A matrícula dos alunos efetuada nas escolas particulares e cooperativas é inteiramente válida e reconhecida sem reservas (cf. artigo 53.º, n.º 3, do Estatuto) além de lhes competir «a organização e conservação dos processos individuais (cf. artigo 56.º, n.º 1), «sendo obrigatoriamente remetidos pela escola de origem, ou depositária, ao novo estabelecimento de educação ou ensino a frequentar, no momento em que ocorra a transferência ou mudança de estabelecimento» (cf. n.º 2). Transferência que é livre entre escolas do ensino particular e cooperativo, entre escolas públicas e de ensino particular e cooperativo e entre estas e as escolas públicas (cf. 58.º). Os certificados de matrícula, de aproveitamento ou de habilitações, tal como os diplomas de conclusão de curso são passados sem qualquer intervenção das escolas públicas ou dos serviços centrais do Ministério da Educação (cf. artigo 66.º).
 
Os regulamentos disciplinares de alunos são aplicados pelos docentes e diretores pedagógicos próprios de cada escola (cf. artigo 65.º) e devem ser conformes com os princípios consignados pelo Estatuto do Aluno e Ética Escolar (cf. artigo 3.º, n.º 4, da Lei n.º 51/2012, de 5 de setembro).
 
 
§ 9.2. — Pelo contrário, entende PEDRO COSTA GONÇALVES[69] que as escolas particulares e cooperativas se encontram à margem de tal categoria. Ao conferirem títulos com valor de habilitação oficial, as escolas privadas estariam a exercer «“direitos próprios” e não “direitos delegados” ou “emprestados” pelo Estado, pelo que, em bom rigor, não exerceriam poderes públicos.
 
Do artigo 75.º, n.º 2, da Constituição, mais especificamente no segmento que dispõe o reconhecimento do ensino particular e cooperativo pelo Estado, retira consequentemente o carácter próprio das funções desempenhadas no sistema de avaliação[70]:
 
                   «O Estado, titular da “competência das competências” — em cujo exercício poderia ter feito exclusivamente seu o direito de conferir habilitações com valor oficial, que seria então uma “coisa do “Estado” —, optou por considerar a realização de avaliações académicas com validade geral e a outorga de graus e títulos com valor oficial tarefas que também podem ser exercidas por entidades privadas no sistema de ensino privado. Deixou claro o sentido dessa sua opção ao proclamar que reconhece o ensino privado, o que quer significar que reconhece o valor do ensino privado ou, talvez melhor, que reconhece os resultados do ensino privado enquanto subsistema integrado no sistema de ensino. Quer dizer, o artigo 75.º/2 esclarece que o Estado reconhece nas avaliações, nos graus e nos títulos conferidos por escolas privadas o valor que atribui aos mesmos atos das escolas públicas (paralelismo ou equiparação). O sentido da norma não é o de permitir a concessão ou delegação de direitos públicos, mas o de esclarecer que o Estado vê na concessão de títulos e graus com plena validade oficial um poder próprio das escolas privadas».
 
É certo que o mesmo Autor adverte[71] contra o risco de incluir sob esta qualificação «entidades particulares que não se dedicam ao exercício da função administrativa, como é o caso, em geral, das instituições particulares de solidariedade social e de outras entidades que desenvolvem a sua ação no âmbito da designada economia social, das entidades com reconhecimento oficial para a prestação de serviços privados de certificação (…), bem como das entidades particulares que se dedicam a atividades ou realizam projetos financiados por entidades públicas e por dinheiros públicos».
 
Em sentido convergente, JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE[72] acentua a natureza eminentemente técnica dos atos de avaliação praticados no ensino particular e cooperativo, não sem admitir, todavia, «uma regulação pública específica, mais intensa, para assegurar uma equivalência de resultados formativos relativamente aos níveis correspondentes do ensino público».
 
Já, em oposição, isto é, contra o carácter puramente privado das funções, sobressai a voz de PAULO OTERO[73] que chega a considerar estarmos em face de «uma espécie de Administração indireta do Estado por entidades privadas»:
 
                   «[D]os estabelecimentos particulares de ensino que, tendo sido objeto de intervenção administrativa permissiva do exercício da respetiva atividade e/ou dos seus cursos, praticam atos certificativos de avaliações ou classificações dos alunos que, apesar de serem atos jurídicos de Direito Privado, se encontram sujeitos ao regime material aplicável aos atos administrativos, uma vez que, traduzindo cada um desses atos certificativos uma aplicação dos respetivos atos permissivos do exercício da atividade em causa (…), acabam por possuir uma força jurídica em tudo idêntica a iguais títulos obtidos em estabelecimentos públicos de ensino: (i) são atos que, verificados os respetivos pressupostos legais, têm de ser reconhecidos por quaisquer autoridades, sabendo-se que nenhuma autoridade pública ou privada poderá negar o reconhecimento de efeitos a tais atos ou introduzir discriminações infundadas entre esses atos avaliativos e certificativos e aqueles que são concedidos por estabelecimentos públicos de ensino; (ii) sem prejuízo das situações subsumíveis no âmbito do crime de falsificação ou de qualquer outro ilícito penal, o conteúdo dos atos avaliativos e certificativos provenientes de estabelecimentos privados de ensino goza de uma presunção de legalidade e de veracidade em tudo idêntica àquela que emerge de iguais atos resultantes de estabelecimentos públicos de ensino; (iii) não obstante a admissibilidade de correções de atos materiais através da retificação, os atos avaliativos e certificativos provenientes de estabelecimentos privados de ensino encontram-se sujeitos ao mesmo regime material aplicável a iguais atos provenientes de estabelecimentos públicos de ensino, podendo dizer-se, em consequência, que a força jurídica de tais atos privados se encontra “moldada” nos termos emergentes do regime jurídico a que se encontram sujeitos os atos administrativos».
 
 
§ 9.3. — Pela nossa parte, estamos em crer que o reconhecimento de funções públicas à atividade das escolas particulares ou cooperativas e dos diretores pedagógicos em nada diminui a autonomia funcional ou a liberdade de ensino, inscrita no artigo 43.º, n.º 1, da Constituição.
 
As classificações atribuídas nas escolas particulares e cooperativas produzem exatamente os mesmos efeitos que as classificações atribuídas pelos estabelecimentos públicos de ensino, de modo especialmente relevante para a candidatura e ingresso no ensino superior, cujos cursos são limitados quantitativamente segundo o número de vagas fixado anualmente (cf. artigo 3.º do Regime de Acesso e Ingresso no Ensino Superior[74]), sendo que a classificação final do ensino secundário dispõe de peso não inferior a 50 % na nota de candidatura atribuída para seriação dos candidatos a cada curso em cada estabelecimento (cf. artigo 26.º, n.º 1, alínea a)).
 
Aliás, PEDRO COSTA GONÇALVES[75] não deixa de admitir que as escolas do ensino particular e cooperativo são chamadas a praticar «atos privados com efeitos públicos».
Diretores e professores do ensino particular e cooperativo desempenham um múnus público que decorre diretamente da lei.
 
A doutrina italiana, pela mão de SANTI ROMANO (1912) e de GUIDO ZANOBINI (1920) empenhou-se na análise de certas atividades profissionais às quais se reconhece um estatuto de ofício público, em sentido subjetivo. Só mais tarde, a categoria do exercício privado de funções públicas, em especial com investidura de poderes públicos, viria progressivamente a cobrir o exercício de funções administrativas a partir de contratos de direito público, nomeadamente de concessão ou de delegação de tarefas[76].
 
Cremos ser elucidativa a refutação deduzida por ROCCO GALLI/ DOMITILLA GALLI[77] a uma certa compreensão minimalista do fenómeno dos poderes públicos exercidos por sujeitos privados, arguindo que ele pode resultar diretamente da lei sem que tal condição os incorpore na Administração Pública nem os atos que pratiquem devam ser imputados ao Estado:
 
                   «Ao lado das hipóteses em que as normas reconhecem a legitimação funcional de modo direto e imediato a sujeitos privados, em consideração ao tipo de atividade desenvolvida (os notários, os advogados relativamente à autenticação de documentos, o pároco que preside à celebração do casamento concordatário e que passa o certificado matrimonial a fim de ser transcrito no registo civil), encontram-se outros casos em que a lei a atribui por razões de necessidade ou de urgência (peritos, administradores de insolvência, intérpretes e até cidadãos que procedem a detenções em flagrante delito), ou ainda porque são o efeito de uma escolha pontual organizativa, técnica ou económica reservada à Administração Pública com um ato de concessão administrativa que tem de encontrar fundamento numa norma (a concessão de serviço público ou de obra pública que habilitam o concessionário a aplicar sanções administrativas, a expropriar ou tomar posse administrativa de bens para fins de utilidade pública). Trata-se, indubitavelmente, de figuras, não só estrutural, como também funcionalmente heterogéneas (…) cuja reductio ad unum não pode fundar-se na cisão entre titularidade e legitimação para o exercício de funções públicas. Assim, por exemplo, na hipótese do reconhecimento presencial de assinatura, o ato do notário não é imputado à Administração Pública que tão-pouco é destinatária dos seus efeitos (o que vale para a generalidade das funções certificativas conferidas a privados)».
 
Em termos aproximados, SAINZ MORENO[78] dá-nos conta da tradição alemã na caracterização do Halbeamte — que deu lugar ao Erfüllungöffentlicher Aufgaben durch Private e à sua expressão mais técnica: Beleihung — e logo afirma com acutilância:
 
                   «No direito atual o “exercício privado de funções públicas” não é resultado de uma categoria histórica (alienação de ofícios públicos), mas a resposta à necessidade de romper com a distinção rígida entre funcionário e profissional liberal para abarcar os casos intermédios, relativamente aos quais o interesse público exige, por um lado, a incorporação de elementos profissionais com as suas próprias características (organização, competência, iniciativa), mas, por outro, exige também a subordinação a uma ordem geral e ao controlo da Administração. Daí que a sua utilização reapareça quando novas necessidades o exigem (por exemplo, ao aumentar a delinquência criam-se serviços de segurança privada).
 
E prossegue[79]:
 
                   «Duas notas caracterizam o “exercício privado de funções públicas”, entendido em sentido estrito: a) o exercício privado de uma atividade profissional; b) que implica no todo ou em parte o exercício de uma função pública».
 
A atividade profissional, explica o Autor, exclui os casos de participação política ou cívica e exclui, igualmente, os casos de colaboração pontual com os poderes públicos, prestando-lhes serviços ou substituindo-os em estado de necessidade. O que está em causa é o próprio exercício da profissão que, total ou parcialmente, a título principal ou acessório, «reveste ademais o carácter de exercício de uma função pública sem com isso perder os elementos essenciais do carácter privado da profissão[80]».
 
Por sua vez, «o carácter de “função pública” que se atribui à profissão tem um significado técnico. Não se trata, com efeito, de um simples reconhecimento do “interesse público” em que a profissão exista, a fim de que preste os seus serviços à comunidade, mas de algo mais: uma coisa é o legislador intervir no exercício de algumas profissões, submetendo-as a uma regulação por razões de interesse público, e outra distinta é a de essa intervenção converter as atividades reguladas em atividades públicas». E exemplifica: a fé pública emprestada pelo notário ou a competência do médico para atestar um óbito.
 
Seguidamente[81], reparte as profissões segundo a menor ou maior intensidade da intervenção pública que sobre elas recai: 1) profissões livres não sujeitas a regras especiais, mas apenas às regras gerais de direito; 2) profissões que, embora reguladas por normas legislativas ou regulamentares especiais, deixam subsistir uma atividade privada; 3) profissões reguladas no sentido de atribuir natureza pública ao seu conteúdo — total ou parcialmente — mas conservando, ainda assim, natureza privada; e 4) profissões que se desenvolvem no seio de uma organização administrativa e fazem parte da função pública stricto sensu.
 
É precisamente na terceira categoria que encontramos os ofícios ou munera públicos, na linha do que a doutrina germânica considera Staatlich gebundener Beruf.
 
E prossegue SAINZ MORENO, nestes termos[82]:
 
                   «A expressão “funções públicas” não é fácil de definir. Por vezes, utiliza-se como sinónimo de “tarefa estadual”, ou seja, de atividade dirigida a alcançar os fins que o Estado assumiu através da Constituição e das leis dimanadas no âmbito da mesma, mas outras vezes reserva-se a expressão para designar o modo ou a forma de realizar as tarefas estaduais: (…) dar fé com presunção de verdade, exercer a autoridade, impor correções ou sanções, (…) etc. Nestes casos a expressão utiliza-se para designar certas atividades que gozam de uma especial eficácia reconhecida pelo direito ou que são exercidas no uso de prerrogativas que, em princípio, só assistem aos poderes públicos».
 
Julgamos ser plena a correspondência com a atividade docente ou dos diretores pedagógicos em escolas particulares e cooperativas devidamente autorizadas. Não deixam, por isso, de ser profissionais privados, nem veem restringida a liberdade pelo ofício ou múnus que se encontra associado às funções que exercem. Acresce, sim, provavelmente a sua responsabilidade.
 
 
§ 9.4. — A classificação de uma prova de exame por um docente do ensino particular ou do ensino público produz exatamente os mesmos efeitos no sistema de ensino — que é um só — sem que possa materialmente distinguir-se o ato de um e do outro. E o mesmo vale, mutatis mutandis, para a emissão de certificados ou a aplicação de sanções aos alunos[83].
 
O reconhecimento do ensino particular e cooperativo a que se refere o n.º 2 do artigo 75.º, da Constituição, significa, precisamente que, sem quebra de uma ampla margem de conformação do legislador, o ensino praticado em tais escolas e os seus efeitos na qualificação dos alunos é plenamente recebido na ordem jurídica e, consequentemente nos espaços internacionais de integração e cooperação a que os estudantes acedem:
 
«Artigo 75.º
(Ensino público, particular e cooperativo)
                   1 — O Estado criará uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população.
 
                   2 — O Estado reconhece e fiscaliza o ensino particular e cooperativo, nos termos da lei».
 
Considerar as escolas particulares e cooperativas como entidades privadas que exercem algumas funções públicas e se encontram investidas de poderes públicos não requer nem tem como desiderato fazer delas concessionárias ou delegatárias de um serviço público.
 
Apenas para certos efeitos se aplicam à sua atividade normas de direito público, como assinala JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE[84]:
 
                   «Estas entidades, sobretudo as entidades privadas de criação privada, só estão sujeitas ao regime de direito público no âmbito do exercício de prerrogativas de direito público ou quando atuem segundo normas impositivas de deveres ou restrições especiais de natureza especificamente administrativa (não aplicáveis aos privados) — assim acontece com o regime da responsabilidade civil extracontratual ou com os deveres de informação administrativa —, tal como só devem estar sujeitas à fiscalização do Tribunal de Contas quando utilizem dinheiros públicos».
 
 
§ 9.5. — Com efeito, não vemos seja necessário um ato de delegação ou de atribuição de tarefas para que se reconheça o exercício de funções públicas, quando o reconhecimento decorre diretamente da lei, como sucede com médicos, advogados, notários, ministros de culto das confissões religiosas radicadas ou capitães de navios e aeronaves, ou ainda os diretores técnicos das farmácia de oficina. Ainda que, em alguns destes casos, respondam disciplinarmente perante as ordens profissionais respetivas, encontram-se sujeitos a deveres específicos, decorrentes do exercício de funções públicas, cujo incumprimento, fora os casos de imputação penal, é sancionado pela Administração Central do Estado, direta ou indireta[85].
 
O reconhecimento a que alude a norma constitucional transcrita é bem mais do que a garantia institucional de três sectores de propriedade e gestão das escolas do ensino básico e secundário.
 
Se a fiscalização das escolas particulares e cooperativas ocorre em paralelo com a direção ou tutela exercidas sobre as escolas públicas, o reconhecimento — assinala JORGE MIRANDA[86] — é mais do que a autorização de abertura e funcionamento a que se refere o artigo 43.º, n.º 4:
 
                   «Ele significa que, sem privilégios nem discriminações, observados os requisitos que a lei fixar — que não podem ser inferiores aos requisitos exigidos às escolas públicas — os cursos ministrados nas escolas não públicas têm o mesmo valor dos ministrados nas escolas públicas e os seus graus e diplomas produzem os mesmos efeitos. E, nessa medida, é oficial o ensino ministrado em ambas as categorias de escolas».
 
E, em outro local, escreve o insigne Autor[87]:
 
                   «Em tese, a liberdade docente deveria abranger a livre fixação dos conteúdos e dos métodos de ensino. No entanto, ela tem de se compaginar, por imperativos de coerência do sistema, com os planos de estudos e os programas das disciplinas fixados, em linhas gerais (não mais que isso), por lei. Apenas o ensino superior, indissociável da investigação científica, alcança a máxima expressão (é a chamada liberdade de cátedra)».
 
Para este sentido, de coerência do sistema, aponta o artigo 13.º, n.º 3, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos[88]:
 
                   «Os Estados Partes no presente Pacto comprometem-se a respeitar a liberdade dos pais ou, quando tal for o caso, dos tutores legais, de escolher para os seus filhos (ou pupilos) estabelecimentos de ensino diferentes dos dos poderes públicos, mas conformes às normas mínimas que podem ser prescritas ou aprovadas pelo Estado em matéria de educação, e de assegurar a educação religiosa e moral de seus filhos (ou pupilos) em conformidade com as suas próprias convicções».
 
Por seu turno, JOAQUIM GOMES CANOTILHO/ VITAL MOREIRA[89], em comentário ao artigo 75.º, n.º 2, observam como o reconhecimento previsto na citada disposição é o meio de providenciar, de par com os poderes de fiscalização, pela necessária coerência no sistema:
 
                   «O ensino particular e cooperativo é reconhecido pelo Estado, nos termos da lei, e não simplesmente consentido, embora a lei possa (e deva) sujeitar a criação de escolas ao cumprimento dos requisitos considerados necessários, através de um processo de licenciamento. O reconhecimento pode incluir (e incluirá normalmente) o reconhecimento oficial do ensino ministrado e do poder para conferir diplomas e graus equivalentes aos do ensino oficial».
  
Fiscalização e reconhecimento praticam-se numa dinâmica recíproca, de tal sorte que a avaliação dos alunos matriculados nas escolas particulares e cooperativas ocorra em paridade com a avaliação externa dos alunos que frequentam a escola pública, sem o que haveria dois sistemas de ensino; algo indesejado pelo programa constitucional e lesivo do direito dos pais e dos alunos a transitarem entre escolas públicas e escolas particulares e cooperativas sem terem de ser submetidos a provas de admissão ou de equivalência.
 
Mas não é só a avaliação que possui interesse público. O Estado encontra-se obrigado a providenciar pela qualidade pedagógica e científica do ensino particular e cooperativo de nível não superior (cf. artigo 5.º, alínea b), do atual Estatuto).
 
De resto, à Inspeção-Geral da Educação e Ciência, nos termos do Decreto Regulamentar n.º 15/2012, de 27 de janeiro, compete praticar ações de controlo, acompanhamento e avaliação da qualidade de todo o sistema educativo (cf. artigo 2.º, n.º 2, alínea c)), participar na avaliação das escolas (cf. alínea d)), assegurar a ação disciplinar (cf. alínea f)) e analisar as reclamações deduzidas nos livros de reclamações dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo (cf. alínea f)). 
 
Aquilo que tem de ficar à margem, quer da fiscalização quer do reconhecimento, é o espaço de autonomia de gestão e a margem de inspiração filosófica, confessional, estética ou ideológica, refletidos na aprendizagem e nas demais vertentes do processo formativo e educativo.
 
 
 
§ 10.
 
§ 10.1. — Eis-nos chegados ao ponto nuclear da consulta e que se prende com as vicissitudes que a situação jurídica do diretor pedagógico possa vir a conhecer, comprometendo o exercício do poder disciplinar e o fim eminentemente preventivo que o conforma.
 
Veremos, pois, se e quando cessam as condições de punibilidade do agente que põe termo às funções de diretor pedagógico no estabelecimento de ensino em que haja cometido ilícito disciplinar, mas que, no entanto, assume a direção pedagógica de outra escola particular ou cooperativa, por vezes, no mesmo grupo empresarial, ou que passe a exercer a docência, permanecendo como operador educativo do ensino particular ou cooperativo.
 
De imediato, sugerem-se dois aspetos relevantes a tomar em consideração.
 
Em primeiro lugar, o exercício do poder disciplinar por parte do Ministro da Educação, neste caso, tem como pressuposto o exercício pelo arguido de funções de direção pedagógica em escola particular e cooperativa. Determinar, em concreto, a escola que dirige é algo que releva para a responsabilidade disciplinar diante do empregador, mas não diante do Estado e dos seus órgãos com poderes disciplinares.
 
Em segundo lugar, determina-se no artigo 40.º, n.º 7, do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, que «o exercício de funções de direção pedagógica é equiparável, para todos os efeitos legais, à função docente». Se a equiparação entre as funções pode ser invocada para todos os efeitos, deve sê-lo para efeitos disciplinares que a lei não distinga nem diferencie.
 
O diretor pedagógico ou membro de órgão de direção pedagógica de escola particular ou cooperativa que, depois de ter praticado infração disciplinar, prevista e punida nos artigos 99.º-E e seguintes do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, assuma cargo análogo em outro estabelecimento de ensino ou se dedique à docência na mesma ou em outra escola, subsiste no âmbito dos poderes disciplinares cometidos à Inspeção-Geral da Educação e Ciência e ao Ministro da Educação. Continua a ser um agente educativo do ensino particular e cooperativo com funções e responsabilidades de ordem pública.
 
As modificações que se produzam na relação privada de emprego são irrelevantes para o efeito de lhe ser aplicada sanção disciplinar prevista nos artigos 99.º-E e seguintes do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, tanto quanto desempenhe funções iguais ou equipolentes em outra escola, pois o exercício da ação disciplinar, neste segmento, encontra o seu fundamento, não no contrato individual de trabalho que celebrou com determinada sociedade ou cooperativa, mas na condição estatutária de agente educativo investido de funções públicas.
 
E, com isto, somos regressados ao início da presente consulta: à essência do poder disciplinar.
 
 
§ 10.2. A aplicação de sanções disciplinares, ao contrário do que sucede com as sanções penais ou contraordenacionais, pressupõe uma relação jurídica administrativa especial entre a autoridade disciplinar e o sujeito que sofre a punição.
 
Se a generalidade das pessoas singulares e também as pessoas coletivas respondem penalmente pelos crimes praticados no território português (cf. artigos 11.º e 4.º do Código Penal[90], respetivamente), de acordo com os princípios da universalidade e da territorialidade, já o poder de aplicar sanções disciplinares circunscreve-se a um conjunto determinado de destinatários que conservam com a autoridade disciplinar uma relação jurídica especial, de confiança e, simultaneamente, de garantia.
 
O único critério que permite, verdadeiramente «distinguir as sanções disciplinares de outras sanções administrativas é o da existência de um círculo limitado de destinatários», como propõe avisadamente THIERRY TANQUEREL[91].
 
O Autor prossegue, concretizando[92]:
 
                   «No caso das sanções disciplinares, o facto de se sair do círculo das pessoas sujeitas a uma relação de direito especial ou a uma regulamentação específica implica o termo da sujeição — potencial ou efetiva — à ação disciplinar. Se alguém que pertence ao pessoal do Estado se demite, não pode ser acionado disciplinarmente. Todavia, em outros casos, tal ação pode ainda ter um sentido, mas unicamente para factos ocorridos enquanto o agente pertencia ao círculo de pessoas sujeitas ao direito disciplinar: uma pessoa que tiver praticado uma infração disciplinar enquanto exercia uma profissão regulamentada pode ver-lhe infligida a interdição de a praticar a longo prazo, ou até definitivamente, mesmo se, no momento em que a sanção é aplicada, tiver cessado o exercício da profissão em causa, pois mostra-se suscetível de ser retomada ulteriormente».
 
A responsabilidade disciplinar decorre de um estado, entendido, na senda de MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA[93] como «uma posição jurídica complexa, derivada imediata ou mediatamente dum único facto ou ato jurídico e que se desdobra em várias relações jurídicas entre dois sujeitos, ambos titulares de direitos e deveres recíprocos».
 
Depois de nomear exemplos de estados relevantes para o direito administrativo, como a residência e a cidadania, refere o que hoje designaríamos vínculo constitutivo de relação jurídica de emprego em funções públicas, acrescentando[94]:
 
                   «A mais importante característica do regime jurídico das situações estatutárias é a de que os direitos e deveres que as integram são, em cada momento, para cada um dos sujeitos, aqueles que a lei ou o regulamento autorizado definem».
 
E, por seu turno, ensina JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE[95]:
 
                   «São posições jurídicas complexas, no contexto das relações jurídicas dissimétricas ou polissimétricas, que formam um conjunto ordenado de direitos e deveres, derivados, direta ou indiretamente, de um único facto ou ato jurídico, como, por exemplo, os “status” de nacional (resultante do nascimento ou da naturalização), de munícipe (decorrente da residência), de funcionário ou de juiz (provocados pela nomeação), de militar (resultante da incorporação), de pensionista (efeito do ato de aposentação ou reforma), de preso (efeito de sentença), de advogado (decorrente da inscrição na Ordem profissional), de aluno ou internado (consequência da admissão administrativa num estabelecimento de ensino público ou num estabelecimento hospitalar).
 
                   São caracterizados precisamente por formarem um conjunto de posições jurídicas ordenado (com carácter “objetivo e regulamentar”), que resulta da sua definição genérica pela lei (por uma norma jurídica) e da sua aplicação em bloco a todos os que se encontrem em determinadas circunstâncias ou ingressem em determinado grupo ou categoria».
 
Ora, é o estado de diretor pedagógico que fundamenta a sujeição ao poder disciplinar do Ministro da Educação; não o concreto lugar desempenhado numa determinada escola.
 
Estado que perdura inalterado pelo trânsito para o exercício de funções docentes, em vista da norma que determina a continuidade «para todos os efeitos legais».
 
 
§ 11.
 
§ 11.1. — A interdependência entre o vínculo jurídico funcional a determinada instituição e a responsabilidade disciplinar é relevante, mas não absolutamente coincidente.
 
Sem prejuízo das múltiplas ocasiões em que teve de se debruçar sobre sanções disciplinares aplicadas a trabalhadores entretanto reformados ou aposentados, o Tribunal Constitucional nunca considerou que, por esse motivo, ocorresse violação de norma ou princípio constitucional que impusessem um termo resolutivo às condições de execução da pena disciplinar[96].
 
Assim, no Acórdão n.º 28/2007, de 17 de janeiro de 2007[97], o Tribunal Constitucional entendeu «que a norma constante do artigo 15.º, n.º 2, do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 24/84, de 16 de janeiro, na parte em que prevê que para funcionários e agentes aposentados a pena disciplinar de aposentação compulsiva seja substituída pela de perda do direito à pensão pelo período de três anos não é inconstitucional».
 
É certo, porém, que, como pode ler-se no Acórdão n.º 858/2014,de 3 de dezembro de 2014[98] a «possibilidade de substituição das penas profissionais por sanções de natureza pecuniária, que vigorava no domínio do Estatuto Disciplinar de 1984 (artigos 5.º, n.º 3, e 15.º), deixou de ter aplicação com a aprovação do Estatuto Disciplinar aprovado pela Lei n.º 58/2008, que prevê a extinção da pena com a cessação da relação jurídica de emprego público e desde que esta não volte a ser renovada (artigo 12.º) — o que também explica a cessação das penas em curso, à data da entrada em vigor da Lei, relativamente a trabalhadores aposentados (artigo 4.º, n.º 8, da Lei n.º 58/2008) —, regime que ainda se mantém com a atual Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, como resulta por argumento a contrario sensu do disposto no seu artigo 176.º, n.ºs 3 e 4».
 
Outros regimes disciplinares mantêm, ou renovaram até, a execução de sanções disciplinares a trabalhadores que vierem a reformar-se ou a aposentar-se. O novo Estatuto Disciplinar da Polícia de Segurança Pública[99] determina no artigo 31.º, n.º 3, que, em tais hipóteses, as penas disciplinares sejam substituídas por outras devidamente adaptadas, pois não teria sentido decretar a demissão ou a suspensão de um aposentado.
 
A execução da pena disciplinar não viola necessariamente a proibição do excesso. Na verdade, o cumprimento de sanções disciplinares por reformados e aposentados dispõe de uma razão de ser e que nos parece ponderosa. Se os fins do direito sancionatório disciplinar são eminentemente de prevenção especial, justifica-se que se conservem até ao termo definitivo da relação jurídica de emprego, sob pena de se criar um lapso temporal de imunidade, ou melhor dizendo, de impunidade disciplinar. O trabalhador não deve poder contar com a iminência do desligamento do serviço ou da passagem à reforma para deixar de cumprir os deveres que lhe competem.
 
 
§ 11.2. — O Decreto-Lei n.º 6/2019, de 14 de janeiro, alterou o artigo 176.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, de modo a assegurar a responsabilidade disciplinar do trabalhador em funções públicas, mesmo para além da cessação ou alteração da situação funcional, relativamente, claro está, a infrações praticadas no exercício das funções que lhe estavam cometidas.
 
Vem esta referência a propósito do disposto no artigo 99.º-K do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, de cujo teor resulta a aplicação aos diretores pedagógicos ou membros de órgãos colegiais de direção pedagógica do regime disciplinar dos trabalhadores em funções públicas, ainda que a título subsidiário e com as necessárias adaptações, em tudo quanto não conste das normas subsistentes do antigo Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo[100].  
 
Antes de analisarmos a atual redação dos preceitos modificados, passemos em revista as motivações do legislador, enunciadas no preâmbulo:
 
                   «Com a revogação, operada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, da norma constante do artigo 12.º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro, a Administração Pública ficou impossibilitada de aplicar sanção disciplinar a um trabalhador vinculado por um contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo, a partir do momento em que sobrevenha a extinção desse vínculo.
 
                   A situação assume relevância especial no âmbito da contratação para necessidades transitórias de trabalhadores, em que a um contrato que caduca se pode suceder um novo contrato sem que seja possível a aplicação da sanção disciplinar pela infração praticada na vigência do vínculo de emprego público anterior. É, pois, absolutamente necessária a previsão de que as sanções disciplinares resultantes de infrações praticadas antes da extinção do vínculo sejam executadas se e quando o trabalhador constituir um novo vínculo de emprego público».
 
O legislador deu-se conta, com efeito, de como o regime disciplinar podia ser vulnerado pelo termo resolutivo do contrato de trabalho em funções públicas, logo que o mesmo trabalhador seja readmitido, em especial para exercer as mesmas funções. E o que vale para o contrato de trabalho em funções públicas a termo tem inteira pertinência para os demais vínculos de emprego em funções públicas.
 
Refira-se, aliás, que, no artigo 11.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, determina-se um princípio de continuidade que adquire relevância neste plano:
«Artigo 11.º
(Continuidade do exercício de funções públicas)
 
                   O exercício de funções ao abrigo de qualquer modalidade de vínculo de emprego público, em qualquer dos órgãos ou serviços a que a presente lei é aplicável, releva como exercício de funções públicas na carreira, na categoria ou na posição remuneratória, conforme os casos, quando os trabalhadores, mantendo aquele exercício de funções, mudem definitivamente de órgão ou serviço».
 
O Decreto-Lei n.º 6/2019, de 14 de janeiro, em coerência com tal linha de continuidade, veio prorrogar o estado de trabalhador em funções públicas e a correspetiva sujeição ao poder disciplinar, na condição de vir a ser constituído novo vínculo de emprego público e retomadas as funções que exercera.
 
Melhor dizendo, a situação estatutária não é necessariamente afetada no âmbito disciplinar, podendo as infrações praticadas ou as sanções disciplinares eventualmente aplicadas retomarem a sua eficácia jurídica.
 
Detenhamo-nos, pois, no teor das disposições agrupadas no mencionado artigo da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, segundo a nova e atual redação[101]:
«Artigo 176.º
(Sujeição ao poder disciplinar)
 
                   1 — Todos os trabalhadores são disciplinarmente responsáveis perante os seus superiores hierárquicos.
 
                   2 — Os titulares dos órgãos dirigentes dos serviços da administração direta e indireta do Estado são disciplinarmente responsáveis perante o membro do Governo que exerça a respetiva superintendência ou tutela.
 
                   3 — Os trabalhadores ficam sujeitos ao poder disciplinar desde a constituição do vínculo de emprego público, em qualquer das suas modalidades.
 
                   4 — A cessação do vínculo de emprego público ou a alteração da situação jurídico-funcional do trabalhador não impedem a punição por infrações cometidas no exercício da função.
 
                   5 — Em caso de cessação do vínculo de emprego público, o procedimento disciplinar ou a execução de qualquer das sanções previstas nas alíneas b) a d) do n.º 1 do artigo 180.º suspende-se por um período máximo de 18 meses, podendo prosseguir caso o trabalhador constitua novo vínculo de emprego público para as mesmas funções a que o procedimento disciplinar diz respeito e desde que do seu início, ressalvado o tempo de suspensão, não decorram mais de 18 meses até à notificação ao trabalhador da decisão final».
 
O que releva, diz o n.º 4, são as infrações cometidas no exercício da função e o que põe termo à suspensão, diz-se no n.º 5, é o facto de serem, novamente desempenhadas as mesmas funções.
 
Mesmas funções que não exigem identidade do posto de trabalho, mas do cargo, enquanto «conjunto abstrato de funções que incumbe ao titular do lugar exercer» (JOÃO ALFAIA[102]).
 
O posto de trabalho é apenas «a concretização e localização de um certo cargo[103]».
 
 
§ 11.3. — O que, na verdade, está em causa é o fundamento do poder disciplinar e da sujeição correspetiva. Os exemplos de responsabilidade disciplinar encontrados à margem de relações jurídicas contratuais são reveladores de como não é o contrato, nem sequer a autonomia privada, a fundamentar a responsabilidade disciplinar.
 
A recente alteração à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas permite compreender que, na base da responsabilidade disciplinar, encontram-se as funções públicas que o trabalhador desempenha, seja a partir de um contrato seja a partir de um ato de nomeação.
 
Tendemos a acompanhar VASCO CAVALEIRO[104] quando afirma:
 
                   «No plano do fundamento do poder disciplinar a doutrina arregimenta-se em duas teses: a contratualista, assente na ideia de subordinação jurídica do trabalhador; e a tese institucionalista, perspetivando o poder disciplinar no seio da organização, como garante da satisfação e dos interesses económicos daquela(X). Não perfilhamos, todavia, a tese contratualista de que o poder disciplinar do empregador público seja, tão-somente, um correspetivo da constituição da relação laboral. Tanto mais que o poder disciplinar existe em várias organizações humanas de fins distintos, não sendo privativo da relação laboral(XX) e existindo no âmbito da execução contratual tem uma projeção imanente extracontratual expressa no reforço do poder hierárquico, na prevenção especial e geral na comunidade laboral e no bom funcionamento da organização em causa».
 
Ainda que se invocasse para fundamento da sujeição disciplinar uma fonte paracontratual — como no direito civil surgem tratadas, por vezes, a responsabilidade pré e pós-contratual[105] — seria tarefa vã a de procurar um acordo, um comportamento concludente que manifestasse a anuência ou a excluísse, nos numerosos exemplos que temos vindo a apontar.
 
ANTÓNIO PINTO MONTEIRO[106], ao analisar sanções de índole disciplinar e sua relação com o contrato, recusa terminantemente considerá-las cláusulas penais, ainda que implicitamente admitidas ou pressupostas pelas partes.
 
Tão-pouco constitui fundamento o dever de obediência hierárquica, como vimos, posto que a superintendência e a tutela administrativa são frequentemente garantidas por sanções de natureza disciplinar, aplicadas com respeito por garantias procedimentais e processuais em tudo análogas às dos trabalhadores subalternos.
 
De resto, as garantias do arguido em procedimento disciplinar, nomeadamente a presunção de inocência, dão um sinal inequívoco de contradição com os esquemas básicos da responsabilidade contratual, a começar pela presunção de culpa do devedor, tal como se manifesta no Código Civil:
 
«Artigo 799.º
(Presunção de culpa e apreciação desta)
 
                   1 — Incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua.
 
                   2 — A culpa é apreciada nos termos aplicáveis à responsabilidade civil».
 
Ora, já tivemos oportunidade de observar que a relação entre os diretores pedagógicos e o Estado, através do Ministro da Educação, nada tem de contratual. É o desempenho de funções de direção pedagógica, independentemente da validade do contrato de trabalho com os proprietários da escola, que fundamenta a responsabilidade pelo cumprimento dos deveres decorrentes dos artigos 99.º-E e seguintes do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, e, em parte no artigo 41.º do novo Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo.
 
Responsabilidade que, vimos também, é absolutamente independente de a escola ter celebrado com o Estado algum dos contratos administrativos regulados nos artigos 12.º e seguintes do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo.
 
Por conseguinte, na hipótese de o diretor pedagógico ter praticado infração disciplinar de relevância administrativa e de, precedendo a instauração do procedimento disciplinar, vir a assumir funções análogas, mas em outra escola (do mesmo ou de outro grupo empresarial) a sujeição ao poder disciplinar do Ministro da Educação perdura intocada.
 
Como perdura, bem assim, na eventualidade de ele vir a desempenhar funções docentes na mesma escola ou em outra qualquer escola do ensino particular e cooperativo, uma vez que, de acordo com o artigo 40.º, n.º 7, do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, «o exercício de funções de direção pedagógica é equiparável, para todos os efeitos legais, à função docente». Decorre de tal prescrição que o docente que assuma funções de direção pedagógica, tal como o diretor pedagógico que assuma funções docentes, conservam a mesma condição estatutária e respondem disciplinarmente pelas infrações cometidas segundo o estatuto que, a seu tempo, detinham.
 
A diferença encontra-se nas normas cuja infração pode fazer constituir a responsabilidade disciplinar. Se a suposta infração é praticada no exercício de funções docentes, aplicam-se sempre as disposições laborais próprias dos professores do ensino particular e cooperativo, mormente do Código do Trabalho, em conformidade com o Parecer n.º 23/2015, de 11 de setembro de 2015, prolatado por este corpo consultivo, segundo o qual, «o regime disciplinar sancionatório aplicável pela Inspeção-Geral da Educação e Ciência a infrações praticadas por docentes de escolas do ensino particular e cooperativo no âmbito de atividade relativa “à avaliação externa dos alunos” é o estatuto disciplinar de origem do docente estabelecido na legislação laboral aplicável aos trabalhadores sujeitos a vínculos de direito privado» (cf. 8.ª Conclusão).
 
Se, pelo contrário, a infração resulta do exercício de funções de direção pedagógica, aplica-se o disposto nos artigos 99.º-A e seguintes do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, e, subsidiariamente, a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, com as necessárias adaptações.
 
A continuidade e comunicabilidade funcional entre direção pedagógica e docência no ensino particular e cooperativo não significam, portanto, que a responsabilidade disciplinar obedeça ao mesmo regime. Pode ler-se nas conclusões de Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 2 de junho de 1999[107], haver «que atender à qualidade em que atua um docente que é simultaneamente Diretor Pedagógico para, em face de determinado ilícito disciplinar, se determinar a sanção que lhe é aplicável», motivo por que anulou o ato punitivo de um diretor pedagógico «que, atuando nessa qualidade, agride um aluno, mas [o sancionou] na qualidade de docente» por enfermar de violação de lei (erro na qualificação jurídica dos factos).
 
O que as referidas continuidade e comunicabilidade significam, isso sim, é uma identidade estatutária essencial que concita o exercício do mesmo poder disciplinar, embora segundo regimes jurídicos diversos.
 
Como tal, ao dispor-se que «o exercício de funções de direção pedagógica é equiparável, para todos os efeitos legais, à função docente» (cf. artigo 40.º, n.º 7, do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo), sem excluir efeitos desfavoráveis, como é o caso da sujeição ao poder disciplinar do Ministro da Educação, está a admitir-se que um docente não deixa de responder disciplinarmente pela infração que veio de praticar como diretor pedagógico que era, nem deixa igualmente de responder, segundo o regime previsto, o diretor de pedagógico visado por infração que lhe foi imputada no exercício das funções docentes que deixou de exercer.
 
 
§ 11.4. — As alterações que o legislador introduziu à redação do artigo 176.º, n.º 4 e n.º 5, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, não se mostram imprescindíveis para viabilizar esta continuidade. Em todo o caso, vêm ao encontro do entendimento que preconizamos.
 
Acrescente-se, porém, que o pressuposto enunciado no n.º 5 do artigo 176.º — constituição de novo vínculo de emprego público para as mesmas funções a que o procedimento disciplinar disser respeito antes de decorridos 18 meses — pode e deve ser invocado na hipótese de o diretor pedagógico ou membro de órgão colegial de direção pedagógica se encontrar a desempenhar funções sem continuidade institucional e a elas regresse.
 
Isto, porque, insiste-se, nas eventualidades configuradas pelo pedido de consulta, ocorre sempre uma continuidade objetiva nas funções desempenhadas, sejam funções de direção pedagógica em outra escola, sejam funções docentes no mesmo ou em outro estabelecimento de ensino particular ou cooperativo. No caso das funções docentes, por conta da presunção juris et de jure que o legislador fixou no artigo 40.º, n.º 7, do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo.
 
As alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 6/2019, de 14 de janeiro, tiveram, porém, alguns efeitos que podem passar despercebidos.
 
Comentando a redação anterior do artigo 176.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, escreviam PAULO VEIGA MOURA/ CÁTIA ARRIMAR[108]:
 
                   «Parece-nos dever entender-se que, após a cessação do vínculo funcional, a justiça disciplinar manter-se-á para todas as infrações que tenham sido praticadas até essa data.
 
                   Deste modo, em caso de alteração da situação jurídico-funcional (v.g., porque o trabalhador mudou de serviço, de posto de trabalho ou entrou em situação de licença sem vencimento) e mesmo de cessação da relação de emprego, as infrações disciplinares até esse momento praticadas poderão continuar a ser objeto de procedimento disciplinar por parte do serviço em que a violação dos deveres ocorreu. Contudo, se após a cessação da relação funcional ocorrer a violação de qualquer dever disciplinar (…), já a mesma não poderá ser objeto de perseguição disciplinar, mas, apenas e eventualmente, ser sancionada no foro criminal».
 
Se é certo que a nova redação do n.º 4 vem confirmar tal entendimento, já a nova redação do n.º 5 do artigo 176.º leva a que o procedimento disciplinar seja imediatamente suspenso com a cessação de funções do trabalhador para ser retomado apenas se ele regressar ao cargo que desempenhara e antes de decorridos dezoito meses.
 
Quer isto dizer que tal prescrição, de certo modo, vem coartar a ação disciplinar. Se o trabalhador em funções públicas tiver cessado a relação jurídica de emprego público, pode ser-lhe instaurado procedimento disciplinar por factos ilícitos anteriormente cometidos, mas nada mais pode ser praticado. O procedimento iniciado suspende-se, de imediato.
 
Bem assim, relativamente a infração disciplinar prevista nos artigos 99.º‑E e seguintes do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, praticada no exercício de funções, o antigo diretor pedagógico beneficia da suspensão do procedimento disciplinar, logo que deixe de exercer tais funções ou de desempenhar funções docentes no ensino particular e cooperativo.
 
Por seu turno, relativamente a sanções disciplinares já aplicadas, a nova redação do artigo 176.º, n.º 5, da Lei Geral do Trabalhador em Funções Públicas, pode comprometer a sua execução.
 
É que ali determina-se que cessação de funções também suspende a execução das sanções previstas nas alíneas b) a d) do n.º 1 do artigo 180.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas. As sanções disciplinares de multa, de suspensão, de despedimento disciplinar ou demissão permanecem suspensas ao longo de dezoito meses, prescrevendo se, no fim de tal prazo, o trabalhador não voltar a exercer funções de direção pedagógica ou como professor.
 
 
 
Das penas disciplinares de suspensão, de despedimento ou de demissão sempre se dirá que já não possuíram efeito útil, uma vez cessada a relação jurídica.
 
Contudo, à semelhança do que vimos ter fica consagrado em outros regimes disciplinares, o legislador poderia ter previsto sanções disciplinares de substituição.
 
Como tal, o diretor pedagógico entretanto aposentado ou tendo iniciado outra atividade laboral subordinada, em lugar da suspensão ou da demissão, poderia ser privado de uma parte da pensão ou da remuneração.
 
O certo é que o legislador o não previu e, por conseguinte, tais sanções disciplinares revelar-se-iam ineficazes.
 
Já no caso da multa, que no caso dos diretores pedagógicos surge prevista no sobrevigente artigo 99.º-G do antigo Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, a sua aplicação podia ser executada e deixa de o ser por força do artigo 176.º, n.º 5, na redação do Decreto-Lei n.º 6/2019, de 14 de janeiro, antes permanecendo suspensa.
 
Só relativamente à proibição temporária ou definitiva de voltar a exercer funções de direção pedagógica no ensino particular e cooperativo, não se descortinam objeções à sua execução.
 
Esta pena disciplinar, por um lado, conserva um efeito útil, uma vez cessadas funções, e, por outro, não se encontra na mira do artigo 176.º, n.º 5, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, motivos ambos por que não opera a suspensão ali prevista.
 
A pena de advertência, embora de escasso efeito útil posteriormente à cessação de funções, permaneceu de fora do efeito suspensivo, pois encontra-se na alínea a), do n.º 1, do artigo 180.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, ao passo que as sanções enunciadas correspondem às alíneas b) a d).
 
 
 
 
§ 12.
 
Em suma, e satisfazendo ao pedido de consulta formulado, através das questões de direito especificadas e já transcritas, apresentam-se as conclusões seguintes:
 
                     1.ª — As funções de diretor pedagógico de estabelecimentos de ensino particulares (e cooperativos) de há muito que se encontram subordinadas ao cumprimento de deveres profissionais consignados por normas de direito público e sujeitos ao poder disciplinar do Governo, como se observa, pelo menos, desde o Regulamento Geral do Ensino Secundário de 14 de agosto de 1895 até ao atual Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro.
 
                     2.ª — Sujeição que em nada exime o diretor ou membro da direção pedagógica à responsabilidade disciplinar, nos termos da legislação laboral privada, perante a cooperativa, a instituição canónica, a sociedade comercial, a fundação ou a pessoa singular proprietária da escola, ou que, a outro título, detenha a exploração do estabelecimento de ensino e seja, nessa qualidade, a entidade patronal. 
 
                     3.ª — As funções dos diretores pedagógicos, sumariamente enunciadas nos artigos 40.º e 41.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, são, em muitos aspetos, de interesse público, pois são de interesse público, e não apenas de interesse geral, os próprios estabelecimentos de ensino particular e cooperativo que dirigem pedagogicamente (cf. artigo 2.º da Lei n.º 9/79, de 19 de março), os quais integram o sistema educativo nacional (cf. artigo 3.º, n.º 2) e fazem parte da rede escolar, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 108/88, de 31 de março. 
 
                     4.ª — A atividade educativa das escolas particulares e cooperativas, nomeadamente a avaliação interna e externa de alunos, a passagem de certificados e diplomas de graus de ensino ou habilitações e a prestação de ensino com qualidade científica e sustentação pedagógica, na observância da autonomia pedagógica e dos denominadores comuns a todo o sistema de ensino, leva a considerá-las entidades privadas com funções públicas e investidas, pontualmente, de poderes públicos.
 
                     5.ª — Tal qualificação é independente dos contratos administrativos de colaboração que as escolas particulares e cooperativas possam celebrar com o Estado, como também se mostra independente de qualquer ato de concessão ou de delegação de tarefas, pois decorre da lei, diretamente.
 
                     6.ª — As entidades privadas que exercem funções públicas não integram por esse motivo a Administração Pública, nem ficam diminuídas na capacidade jurídica civil e comercial de que gozam. Pelo contrário, a aplicação confinada de certas normas e princípios de direito público amplia a autonomia pedagógica para um nível que, de outro modo, não possuiriam.
 
                     7.ª — Admitir-se tal estatuto, em nada diminui a liberdade de ensino ou o direito à criação de escolas, ambos ancorados no artigo 43.º, n.º 1 e n.º 4 da Constituição, respetivamente; tão-pouco a autonomia pedagógica ou o reconhecimento do ensino particular e cooperativo como parte do sistema de ensino, de pleno direito, na linha programática do artigo 75.º, n.º 2.
 
                     8.ª — Se o exercício de funções públicas e, eventualmente, de poderes públicos obrigam a uma maior responsabilidade pública, tal significa que tão oficial é hoje o ensino particular e cooperativo como o ensino prestado nas escolas públicas, pois só uma estreita afinidade de critérios permite a livre transição de alunos e professores no mesmo sistema, não apenas entre escolas de diferentes sectores, como também entre escolas particulares e cooperativas que, destarte, ganham condições favoráveis de intercomunicabilidade.
 
                     9.ª — O diretor pedagógico (ou, se for esse o caso, os membros do órgão de direção pedagógica) adquire, em certa medida, o estatuto de oficial público, à semelhança de outras profissões em cujo exercício se descortina, de modo permanente ou incidental, a prática de atos investidos de fé pública, aptos a produzirem plenos efeitos na ordem jurídica interna e em ordens jurídicas de outros Estados.
 
                     10.ª — É o estatuto de diretor pedagógico ou de membro de órgão de direção pedagógica que legitima o exercício da ação disciplinar pelo Ministro da Educação e a aplicação das sanções previstas nos artigos 99.º-E e seguintes do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro; preceitos conservados transitoriamente em vigor pelo artigo 6.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro. Não, o posto de trabalho em determinada escola ou conjunto de escolas.
 
                     11.ª — As vicissitudes ocorridas nas relações jurídicas laborais do diretor pedagógico não se projetam de modo perentório na relação jurídica administrativa com o Ministro da Educação e com a Inspeção-Geral da Educação e Ciência, uma vez que a vinculação pelas normas disciplinares mencionadas assenta no cargo desempenhado de direção pedagógica que reveste a natureza de funções públicas.
 
                     12.ª — De resto, é a pessoa do diretor ou membro da direção pedagógica a ser visada no procedimento disciplinar; não a escola nem o proprietário, cuja responsabilidade disciplinar se encontra configurada por outras disposições legais do mesmo diploma.
 
                     13.ª — Pode, pois, ser iniciado ou prosseguir procedimento disciplinar relativo a ilícito cometido no exercício de funções em que seja visado diretor pedagógico ou membro de direção pedagógica, não obstante ter, entretanto, transitado para cargo idêntico em outra escola do ensino particular ou cooperativo, a fim de ali desempenhar funções de direção pedagógica.
 
                     14.ª — Como pode, outrossim, ser feita cumprir sanção disciplinar que já tivesse sido aplicada em conformidade com o disposto nos artigos 99.º-E e seguintes do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro.
 
                     15.ª — Algo que se aplica, ainda, à hipótese de o visado transitar para o desempenho de funções docentes, sempre no ensino básico e secundário ministrado em escolas particulares ou cooperativas, visto que no artigo 40.º, n.º 7, do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo determina-se a continuidade funcional entre docência e direção pedagógica para todos os efeitos legais, sem excluir os efeitos disciplinares.
 
                     16.ª — Mais se aplica subsidiariamente e com as devidas adaptações o disposto no artigo 176.º, n.º 4 e n.º 5, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, na redação que lhes foi atribuída pelo Decreto-Lei n.º 6/2019, de 14 de janeiro, visto que nada indicia ser estática a remissão efetuada no artigo 99.º-K do Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, para o revogado Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro.
 
                     17.ª — Por conseguinte, se um determinado diretor pedagógico transitar para funções alheias ao ensino particular e cooperativo, depois de ter praticado infração disciplinar de natureza pública, as condições de punibilidade não cessam em definitivo, antes se suspendendo, de acordo com os pressupostos e os requisitos temporais ali consignados.
 
                     18.ª — O procedimento disciplinar pode ser retomado ou feita cumprir sanção disciplinar já aplicada a quem retome o exercício funções de direção pedagógica ou assuma funções docentes em escola particular ou cooperativa, antes de decorridos 18 meses, sem prejuízo dos prazos de prescrição da infração disciplinar, do procedimento e da pena aplicada.
 
                     19.ª — Relativamente ao diretor pedagógico ou membro de direção pedagógica que seja desligado do serviço para efeito de aposentação, que se reforme ou que inicie atividade profissional totalmente diversa, a pena disciplinar de suspensão sempre se revelaria desprovida de efeito útil, visto que o legislador se absteve de fixar uma pena disciplinar de substituição em tais eventualidades.
 
                     20.ª — Pelo contrário, a pena disciplinar de multa e a pena disciplinar de proibição temporária ou definitiva de voltar a exercer funções de direção pedagógica no ensino particular e cooperativo sempre cumpririam o respetivo desiderato.
 
                     21.ª — Todavia, a nova redação outorgada ao artigo 176.º, n.º 5, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, ao determinar o efeito suspensivo imediato da execução das sanções disciplinares consignadas pelas alíneas b) a d), do n.º 1, do artigo 180.º, e já aplicadas, tem reflexos na punibilidade com multa do diretor pedagógico que se aposente, que se reforme ou que inicie uma atividade profissional diversa.
 
                     22.ª — Somente a pena disciplinar de proibição do exercício de funções pode ser-lhe aplicada, na eventualidade de, entretanto, ter sido desligado do serviço, ter passado à reforma, iniciado outra atividade profissional ou encontrar-se desempregado, pois tal sanção não faz parte do enunciado referido e sobre o qual opera o efeito suspensivo estatuído no artigo 176.º, n.º 5, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.
 
                     23.ª — Na eventualidade de extinção da relação funcional, é possível dar início a procedimento disciplinar por factos pretéritos, mas tal procedimento é suspenso de imediato, assim permanecendo até prescrever, no termo de dezoito meses, exceto se o trabalhador regressar a um cargo de direção pedagógica ou de educador ou professor.
 
 
 
 
 
[1] Lei n.º 68/2019, de 27 de agosto, na redação da Lei n.º 2/2020, de 31 de março.

[2] Pedido veiculado através do Ofício n.º387/2020, de 19 de junho de 2020. O relator veio a ser designado, após redistribuição, por despacho de Sua Excelência a Conselheira Procuradora-Geral da República, de 23 de junho de 2020, a fim de apresentar projeto de parecer da 2.ª espécie (pareceres urgentes), nos termos do disposto no artigo 11.º, n.º 3, do Regimento do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n.º 1/99, de 17 de março (Diário da República, 2.ª Série, n.º 76, de 31 de março de 1999).

[3] Diário da República, 2.ª Série, n.º 245, de 16 de dezembro de 2015.

[4]  Il potere disciplinare: dalla protezione della comunità alla protezione dell’individuo, Studi di Diritto Pubblico (dir. ROBERTO BIN/ FULVIO CORTESE/ ALDO SANDULLI), Ed. Franco Angelico Milão, 2018, p. 15.

[5] Do Poder Disciplinar no Direito Administrativo Português, Imprensa da Universidade, Coimbra, 1932, p 144 e seguintes.

[6] Idem, p. 145 e seguintes.

[7] Sobre a distinção entre sanção administrativa e outras medidas desfavoráveis impostas por autoridades administrativas, v. ALEJANDRO NIETO, Derecho Administrativo Sancionador, 5.ª ed., Ed. Tecnos, Madrid, 2011, p. 156 e seguintes; AGUSTÍN GARCIA URETA, Temas de Derecho Administrativo, Tomo II, Ed. Marcial Pons, Madrid, 2019, p. 26 e seguintes. V. Deste Conselho, Parecer n.º 12-C/2016, de 15 de setembro de 2016 (Diário da República, n.º 6, Série II, de 9 de janeiro de 2017) e o Parecer n.º 19/2019, de 8 de agosto de 2019 (Diário da República, n.º 222, Série II, de 19 de novembro de 2019).

[8] O aperfeiçoamento das garantias em processo disciplinar vem sendo paulatinamente prosseguido pelos tribunais, em especial pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, cuja jurisprudência, elaborada sobre a aplicação do artigo 6.º (1) da Convenção Europeia para a proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (direito a um processo equitativo) tende a exigir tratamento análogo ao processo penal em casos de punições especialmente severas (v. MANUEL AFONSO VAZ/ CATARINA SANTOS BOTELHO, Algumas reflexões sobre o artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem: direito a um processo equitativo e a uma decisão num prazo razoável, in Revista Eletrónica de Direito Público, n.º 7 (2014), p. 230 e seguintes.

[9] V. ALEJANDRO NIETO, Derecho Administrativo Sancionador, 5.ª ed., Ed. Tecnos, Madrid, p. 124 e seguintes.

[10] V. MARCELLO CAETANO, obra citada, p. 39. 

[11] Os Procedimentos Disciplinares na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, in O Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas, Advogados e Magistrados Judiciais (PEDRO FERNÁNDEZ SÁNCHEZ/ LUÍS M. ALVES), Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados, Ed. Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 2020, p. 24 e seguinte.

[12] Sobre o papel das cartas éticas ou deontológicas no processo disciplinar, v. SERENA STACCA, obra citada, p. 90 e seguintes.

[13] Acerca das cartas de serviço ou dos utentes, v. GUIDO CLEMENTE DI SAN LUCA, L’atto amministrativo, fonte del diritto obiettivo, Ed. Jovene, Nápoles, 2003, p. 401 e seguintes.
 

[14] A respeito da citada norma constitucional, v. PEDRO FERNÁNDEZ SÁNCHEZ, Nota sobre o Enquadramento Constitucional do Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas, in O Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas, Advogados e Magistrados Judiciais, loc. cit., p. 9 e seguintes.

[15] Plenário, proc.º1141/98. A jurisprudência do Tribunal Constitucional citada teve como fonte a base de dados acedida através de www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos.

[16] V.g. Regulamento Disciplinar da Ordem dos Psicólogos Portugueses (Regulamento n.º 748/2016, de 22 de fevereiro, in Diário da República, 2.ª Série, n.º 151, de 8 de agosto de 2016, com alterações introduzidas pelo Regulamento n.º 198/2019, de 23 de novembro, in Diário da República, Série II, n.º 45, de 5 de março de 2019).

[17] V. Artigo 81.º do Estatuto Hospitalar, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48 357, de 27 de abril de 1968.

[18] Entendeu o Tribunal Constitucional, neste Acórdão, que a estrutura acusatória do processo penal não é constitucionalmente devida em processo disciplinar, tal como se apresentava no Regulamento de Disciplina Militar, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 142/77, de 9 de abril. A circunstância de, precisamente, a disciplina militar poder aplicar penas privativas da liberdade justificou os votos de vencido da Conselheira FERNANDA PALMA e do Conselheiro PAULO MOTA PINTO por considerarem impor-se a separação entre as funções do instrutor e de quem decide.

[19] Cf. PASCAL ANCEL/ JOËL MORET-BAILLY, Vers un droit commun disciplinnaire? Ed. Université Saint-Étienne, 2007, p. 31.

[20] V. Regulamento Geral dos Estabelecimentos Prisionais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 51/2011, de 11 de abril, alterado pela Lei n.º 94/2017, de 23 de agosto, e pelo Decreto-Lei n.º 70/2019, de 24 de maio.

[21] V. Regulamento Geral e Disciplinar dos Centros Educativos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 323-D/2000, de 20 de dezembro.

[22] V. Regulamento de Disciplina Militar, aprovado pela Lei Orgânica n.º 2/2009, de 22 de julho, conformado pelo Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 229/2012, de 2 de maio de 2012, in Diário da República, 1.ª Série, n.º 100, de 23 de maio de 2012; Estatuto Disciplinar da Polícia de Segurança Pública, aprovado pela Lei n.º 37/2019, de 30 de maio; Regulamento de Disciplina da Guarda Nacional Republica, aprovado pela Lei n.º 145/99, de 1 de setembro, alterado pela Lei n.º 66/2014, de 28 de agosto. 

[23] De resto, multiplicam-se nos artigos 27.º e seguintes as pertinentes menções: sentença judicial condenatória ou aplicação judicial de medida de segurança (cf. artigo 27.º, n.º 2), apreciação judicial da detenção (cf. artigo 28.º, n.º 1), decisão judicial que ordene ou mantenha medida de coação (cf. artigo 28.º, n.º 3), ser sentenciado criminalmente por facto punível (cf. artigo 29.º, n.º 1), garantia do juiz de instrução (cf. artigo 32.º, n.º 4), a estrutura acusatória do processo penal (cf. artigo 32.º, n.º 5) ou a garantia do juiz natural (cf. artigo 32.º, n.º 9).

[24] Cf. Artigo 33.º e artigos 48.º e seguintes do Regime Geral das Contraordenações (Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro (com a redação retificada e publicada in Diário da República, Série I, de 6 de janeiro de 1983). A primeira alteração resultou do Decreto-Lei n.º 356/89, de 17 de outubro, retificada conforme declaração publicada in Diário da República, Série I, de 31 de outubro de 1989. Veio a conhecer nova revisão com o Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de setembro, e duas alterações subsequentes: a primeira, por via do Decreto-Lei n.º 323/2001, de 17 de dezembro; a segunda, através da Lei n.º 109/2001, de 24 de dezembro.

[25] Cf. Artigo 40.º, n.º 1, e artigos 59.º e seguintes.

[26] V. DIOGO FREITAS DO AMARAL, O Poder Sancionatório da Administração Pública, in Estudos Comemorativos dos 10 Anos da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, vol. I, (DIOGO FREITAS DO AMARAL/ CARLOS FERREIRA DE ALMEIDA/ MARTA TAVARES DE ALMEIDA), Ed. Almedina, Coimbra, 2008, p. 217: «Importa ter presente que o ato que aplica uma sanção administrativa no exercício do poder sancionatório da Administração é tipicamente um ato administrativo; e é, por via de regra, um ato primário, de carácter impositivo, e de tipo punitivo».

[27] Obra citada, p. 219 e seguinte.

[28] Sobre o regime disciplinar dos discentes nas escolas públicas, v. CARLA AMADO GOMES, Rebeldes com Causas, in Três Estudos de Direito da Educação, Ed. Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 2002, p. 89 e seguintes.

[29] Idem, p. 220.

[30] Referimo-nos sob tal designação ao corpo normativo aprovado em anexo à Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, com alterações introduzidas sucessivamente pela Lei n.º 84-B/2015, de 7 de agosto, pela Lei n.º 18/2016, de 20 de junho, pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, pela Lei n.º 25/2017, de 30 de maio, pela Lei n.º 70/2017, de 14 de agosto, pela Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, pela Lei n.º 49/2018, de 14 de agosto, pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 6/2019, de 14 de janeiro, pelo Decreto-Lei n.º 29/2019, de 20 de fevereiro, pela Lei n.º 79/2019, de 2 de setembro, pela Lei n.º 82/2019, de 2 de setembro, e pela Lei n.º 2/2020, de 31 de março.

[31] V. Artigos 328.º e seguintes do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, alterado pela Lei n.º 105/2009, de 14 de setembro, pela Lei n.º 53/2011, de 14 de outubro, pela Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, pela Lei n.º 47/2012, de 29 de agosto, pela Lei n.º 69/2013, de 30 de agosto, pela Lei n.º 27/2014, de 8 de maio, pela Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto, pela Lei n.º 28/2015, de 14 de abril, pela Lei n.º 120/2015, de 1 de setembro, pela Lei n.º 8/2016, de 1 de abril, pela Lei n.º 28/2016, de 23 de agosto, pela Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto (cf. Declaração de Retificação n.º 28/2017, de 2 de outubro), pela Lei n.º 14/2018, de 19 de março, pela Lei n.º 90/2019, de 4 de setembro, e pela Lei n.º 93/2019, de 4 de setembro.

[32] Alterada pela Lei n.º 115/97, de 19 de setembro, pela Lei n.º 49/2005, de 30 de agosto, e pela Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto.

[33] Alterada pela Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto.

[34] Introdução ao Direito da Educação: direito português e direito brasileiro, in Revista Eletrónica de Direito Público, n.º 2, 2014, p. 5.

[35] Diário da República, n.º 222, 2.ª Série, de 19 de novembro de 2019.

[36] Neste sentido, acentuando o imperativo de obstar à mercantilização do ensino, v. JORGE MIRANDA, Introdução ao Direito à Educação…, loc. Cit., p. 19.

[37] Conheceu alterações introduzidas, sucessivamente, pelos seguintes atos legislativos: Decreto-Lei n.º 75/86, de 23 de abril, Decreto-Lei n.º 484/88, de 29 de dezembro, Lei n.º 30/2006, de 11 de julho, Decreto-Lei n.º 213/2006, de 27 de outubro, Decreto-Lei n.º 138-C/2010, de 28 de dezembro, e Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto.

[38] 3.ª Secção, Proc.º 410/07.

[39] V. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 410/2011, de 27 de setembro de 2011 (3.ª Secção, Proc.º 833/10); Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 503/2011, de 15 de novembro de 2011 (1.ª Secção, Proc.º 281/11).

[40] Dispensamo-nos de maiores desenvolvimentos sobre tais vicissitudes, remetendo-nos para o Parecer n.º 19/2019, votado por este Conselho Consultivo em 8 de agosto de 2019 (loc. cit.) em que se encontram-se descritos o contexto e as motivações do aditamento que a Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto, introduziu ao Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo. Todavia, as alterações não se cingiram a verter em ato legislativo o conteúdo da Portaria n.º 207/98, de 28 de março, visto que serviram igualmente para articular o Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo com o Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, que transpusera para o ordenamento jurídico interno a Diretiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro, relativa aos serviços no mercado interno, definindo o regime sancionatório e contraordenacional a aplicar às entidades proprietárias dos estabelecimentos de ensino e aos diretores pedagógicos.

[41] De acordo com o artigo 63.º, «os alunos que frequentem os ensinos básico e secundário das escolas do ensino particular e cooperativo estão sujeitos ao regime de avaliação externa estabelecido para os alunos das escolas públicas».

[42] Cf. Artigo 66.º;

[43] Define o Currículo dos Ensinos Básico e Secundário. A sua redação ficou assente nos termos da Declaração de Retificação n.º 29-A/2018, de 4 de setembro.

[44] Unidade de Formação de Curta Duração, segundo a definição de documentos curriculares proposta no artigo 3.º, alínea d).

[45]  «O conjunto comum de conhecimentos a adquirir, identificados como os conteúdos de conhecimento disciplinar estruturado, indispensáveis, articulados conceptualmente, relevantes e significativos, bem como de capacidades e atitudes a desenvolver obrigatoriamente por todos os alunos em cada área disciplinar ou disciplina, tendo, em regra, por referência o ano de escolaridade ou de formação», segundo a definição do artigo 3.º, alínea b).

[46] Loc. cit.

[47] Diário da República, 2.ª Série, n.º 45, de 4 de março de 2016. Alterado pelo Despacho Normativo n.º 3-A/2019, do Secretário de Estado da Educação, de 26 de fevereiro de 2019 (Diário da República, 2.ª Série, n.º 40, de 26 de fevereiro de 2019) e pelo Despacho Normativo n.º 3-A/2020, do Secretário de Estado Adjunto e da Educação, de 5 de março de 2030 (Diário da República, 2.ª Série, n.º 46, de 6 de março de 2020).

[48] Loc. Cit.
 

[49] V. Neste sentido o Parecer n.º 11/2016, deste corpo consultivo, votado em 25 de maio de 2016 (in Diário da República, 2.ª Série, de 1 de junho de 2016).

[50] ANA TERESA SANTA-CLARA, O Ensino Particular na Rede Escolar do Estado Novo, in Interações, n.º 28, 2014, p. 96.

[51] Diário do Governo, n.º 156, de 7 de julho de 1913.

[52] V. PAULO PULIDO ADRAGÃO, A Liberdade de Aprender e a Liberdade das Escolas Particulares, Universidade Católica Editora, Lisboa, 1995, p. 191 e seguinte.

[53] As bases revogadas pelo Decreto-Lei n.º 603/76, de 23 de julho, seriam repristinadas pelo Decreto-Lei n.º 60/77, de 22 de fevereiro.

[54] V. Artigos 462.º e 463.º do Estatuto do Ensino Liceal, aprovado pelo Decreto n.º 36 508, de 17 de setembro de 1947.

[55] Obra citada, p. 109.

[56] O Novo Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, in Revista Eletrónica de Direito Público, n.º 2 (2015), p. 71.

[57] Idem, p. 81.

[58] Ibidem.

[59] Nos termos do artigo 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 396/2007, de 31 de dezembro, na redação do Decreto-Lei n.º 14/2017, de 14 de janeiro, «o Quadro Nacional de Qualificações define a estrutura de níveis de qualificação, incluindo requisitos de acesso e a habilitação escolar a que corresponde, tendo em conta o quadro europeu de qualificações, com vista a permitir a comparação dos níveis de qualificação dos diferentes sistemas dos Estados membros».

[60] Os contratos de autonomia, importando mais competências e maiores responsabilidades para as escolas públicas e seus agrupamentos, encontram-se regulados nos artigos 56.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 75/2008, de 22 de abril (regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário), alterado pelo Decreto-Lei n.º 224/2009, de 11 de setembro, e pelo Decreto-Lei n.º 137/2012, de 2 de julho.

[61] Cf. Artigo 2.º, da Lei n.º 9/79, de 19 de março.

[62] Na redação da Lei n.º 12/2008, de 26 de fevereiro, da Lei n.º 24/2008, de 2 de junho, da Lei n.º 6/2011, de 10 de março, da Lei n.º 44/2011, de 22 de junho, e da Lei n.º 51/2019, de 29 de julho.

[63] Regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário. Alterado pelo Decreto-Lei n.º 224/2009, de 11 de setembro, pelo Decreto-Lei n.º 137/2012, de 2 de julho.

[64] O Decreto-Lei nº 211-B/86,de 31 de julho, aprovou o Regulamento de Funcionamento dos Conselhos Pedagógicos e Órgãos de Apoio nas Escolas Preparatórias e Secundárias.

[65] Motivo por que este corpo consultivo concluiu pela aplicação das normas disciplinares de direito privado, no Parecer n.º 23/2015, de 11 de setembro de 2015.

[66] Acerca da advertência genericamente feita à escola, nos termos do artigo 99.º-A e sua natureza não admonitória, v. Parecer n.º 19/2019, de 8 de agosto de 2019 (loc. cit.).

[67] Entre € 635,00 e € 6 350,00, uma vez que o primeiro valor representa, de acordo com o Decreto-Lei n.º 167/2019, de 21 de novembro, a retribuição mínima mensal garantida.

[68] Pese embora não sejamos perguntados pela conformidade desta norma com o artigo 30.º, n.º 4, da Constituição, sempre se dirá que o Tribunal Constitucional, recentemente, julgou inconstitucional norma contida no artigo 98.º, alínea b), do Decreto-Lei n.º 30/2017, de 22 de março, correspondente ao Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana, segundo a qual cessa definitivamente o vínculo à Guarda do militar que tenha sido condenado na pena acessória de proibição do exercício de função (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 256/2020, de 29 de abril, 2.ª Secção, proc.º 999/19).

[69] Entidades Privadas com Poderes Públicos, Coleção Teses, Ed. Almedina, Coimbra, 2005, p. 514. Refira-se que o entendimento do Autor, quando da dissertação publicada, decorre do quadro normativo então em vigor e, por isso, sem o Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro, nem o Decreto-Lei n.º 55/2018, de 6 de julho.

[70] Idem, p. 514 e seguinte.

[71] Manual de Direito Administrativo, vol. 1, Ed. Almedina, Coimbra, 2019, p. 826 e seguinte.

[72] O Papel do Ensino Privado na Atual Constituição Portuguesa, Temas de Direito da Educação (ANTÓNIO PEDRO BARBAS HOMEM), Ed. Almedina, Coimbra, 2006, p. 21.

[73] Legalidade e Administração Pública: O Sentido da Vinculação Administrativa à Juridicidade, Ed. Almedina, Coimbra, 2003, p. 829, em especial, nota 309.

[74] Decreto-Lei n.º 296-A/98, de 25 de setembro, alterado pelo Decreto-Lei nº 99/99, de 30 de março, pelo Decreto-Lei nº 26/2003, de 7 de fevereiro, pelo Decreto-Lei nº 76/2004, de 27 de março, pelo Decreto-Lei nº 158/2004, de 30 de junho, pelo Decreto-Lei nº 147-A/2006, de 31 de julho, pelo Decreto-Lei nº 40/2007, de 20 de fevereiro, pelo Decreto-Lei nº 90/2008, de 30 de maio (cf. Declaração de Retificação n.º 32-C/2008, de 16 de junho), pelo Decreto-Lei nº 11/2020, de 2 de abril, e derrogado transitoriamente pelo Decreto-Lei nº 33/2020, de 1 de julho.

[75] Entidades Privadas com Poderes Públicos, cit., p. 514.

[76] V. FERNANDO SAINZ MORENO, Ejercicio privado de funciones publicas, in Revista de Administración Pública, n.º 100-102 (1983), p. 1699 e seguintes, em especial, p. 1775 e seguintes.

[77] Corso di diritto amministrativo, vol. I, 3.ª ed., CEDAM, Milão, 2000, p. 197. Ainda na doutrina transalpina, v. GIULIO NAPOLITANO, L’esercizio privato di attività amministrative, in La disciplina generale dell’azione amministrativa (VINCENZO CERULLI IRELLI), Ed. Jovene, Nápoles, 2006, p. 89 e seguintes; STELIO VALENTINI, Figure, rapporti, modelli organizzatorie: lineamenti di teoria dell’organizzazione, in Trattato di diritto amministrativo (GIUSEPPE SANTANIELLO), Vol. IV, Ed. CEDAM, Pádua, 1996, p. 56 e seguintes. Para o caso específico do ensino particular, referindo-se a exercício de funções públicas por equiparação, v. FRANCESCO CARINGELLA, Manuale di Diritto Amministrativo, 13.ª ed., Ed. Dike Giuridica, Roma, 2020, p. 500.

[78] Loc. cit., p. 1776.

[79] Idem, p. 1780.

[80] Ibidem.

[81] P. 1781.

[82] Ibidem.

[83] Reconhecendo a jurisdição administrativa competente para conhecer da legalidade de ato punitivo de alunos praticado em escola particular, v. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, 1.ª Secção, de 9 de novembro de 2012 (proc.º 00738/08.4BECBR). Em sentido divergente, porém, e considerando o ensino particular «uma atividade privada concorrente com ensino público», v. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, 2.ª Secção, de 6 de maio de 2010 (proc.º 3777/08.1TBMTS.P1.S1)

[84] Lições de Direito Administrativo, 5.ª ed., Imprensa da Universidade de Coimbra,2017, p. 126 e seguinte.

[85] Assim, por exemplo, o diretor técnico de farmácia de oficina, além de responder perante a Ordem dos Farmacêuticos, encontra-se adstrito a deveres de ordem pública no exercício da profissão perante o INFARMED — Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos da Saúde, IP (cf. artigo 21.º, n.º 1, alíneas e) a g), do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, alterado pelo Decreto-Lei n.º 171/2012, de 1 de agosto, pela Lei n.º 16/2013, de 8 de fevereiro, pelo Decreto-Lei n.º 128/2013, de 5 de setembro, pelo Decreto-Lei n.º 109/2014, de 10 de julho, pela Lei n.º 51/2014, de 25 de agosto, e pelo Decreto-Lei n.º 75/2016, de 8 de novembro). Deveres cuja violação, contudo, foi configurada, não como ilícito disciplinar, mas como infração contraordenacional (cf. artigos 47.º e seguintes).

[86] Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª ed., Wolters Kluwer Portugal/Coimbra Editora, 2010, p. 1422.

[87] Introdução ao Direito da Educação…, loc. Cit., p. 20.

[88] Adotado e aberto à assinatura, ratificação e adesão pela resolução 2200-A (XXI) da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 16 de dezembro de 1966, veio a ser aprovado para ratificação através da Lei n.º 29/78, de 12 de junho, (retificada nos termos de Aviso publicado in Diário da República n.º 153, de 6 de Julho de 1978). O instrumento de ratificação pela República Portuguesa foi depositado junto do Secretário-Geral das Nações Unidas em 15 de junho de 1978. Sublinhado nosso na transcrição.

[89] Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4.ª ed., Coimbra Editora, 2007, p. 906.

[90] Referimo-nos ao Código Penal republicado com o Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, na sua atual redação, decorrente das alterações introduzidas pela Lei n.º 102/2019, de 6 de setembro.

[91] Caractéristiques et limites du droit disciplinaire, in THIERRY TANQUEREL/ FRANÇOIS BELLANGER, Le droit disciplinaire, Pratique du droit administratif, Schulthess, Éditions Romandes, Genebra, 2018, p. 18.

[92] Idem, p. 19.

[93] Direito Administrativo, vol. I, 2.º ed., 2.ª Reimpressão, Livraria Almedina, Coimbra, 1984, p. 366.

[94] Ibidem.

[95] Obra citada, p. 79.

[96] V, Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 288/2020, de 28 de maio de 2020 (2.ª Secção, Proc.º725/2019) e a anterior jurisprudência ali citada.

[97] 2.ª Secção, Proc.º893/05.

[98] 3.ª Secção, proc.º443/14.

[99] Aprovado pela Lei n.º 37/2019, de 30 de maio. Norma semelhante encontra-se no artigo 34.º do Regulamento Disciplinar da Guarda Nacional Republicana, aprovado pela Lei n.º 145/99, de 1 de setembro, amplamente revisto pela Lei n.º 66/2014, de 26 de agosto.

[100] Não obstante a remissão apontar para o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro, cremos que tal remissão deve considerar-se dinâmica, até porque nos termos do artigo 42.º, n.º 3, da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, todas as referências ao citado Estatuto Disciplinar, revogado pelo mesmo artigo 42.º, n.º 1, alínea e), entendem-se transpostas para a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.

[101] Aplicável, nos termos do artigo 7.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 6/2019, de 14 de janeiro, apenas aos procedimentos disciplinares instaurados a partir de 1 de fevereiro de 2019. Assinalam-se as disposições modificadas (itálico).

[102] Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo Público, vol. I, Livraria Almedina, Coimbra, 1985, p. 44.

[103] Idem, p. 45. «Assim, pode manter-se o mesmo cargo e mudar de posto de trabalho», escreve o Autor (p. 46).

[104] O Poder Disciplinar e as Garantias de Defesa do Trabalhador em Funções Públicas, Ed. Almedina, Coimbra, 2018, p. 25.

(X) Numa análise aturada do fundamento do poder disciplinar e das posições doutrinárias existentes, veja-se MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO, Do Fundamento do Poder Disciplinar Laboral, Ed. Almedina, Coimbra, 1993, p. 307 a 347 e p. 349 a 406.

(XX) Nesse sentido, veja-se BERNARDO DA GAMA LOBO XAVIER, Manual de Direito do Trabalho, 2.ª ed. Revista e atualizada, Ed. Verbo, Lisboa, 2014, p. 460.

[105] V., por todos, ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Tratado de Direito Civil, VII (Direito das Obrigações — Contratos; Negócios Unilaterais), Ed. Almedina, Coimbra, 2014, p. 629 e seguintes.

[106] Cláusula Penal e Indemnização, Coleção Teses, Ed. Almedina, Coimbra, 1990, p. 150 e seguintes.

[107] 1.ª Subsecção, Proc.º28 234.

[108] Comentários à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, 1.º volume (Artigos 1.º a 240.º), Coimbra Editora, 2014, p. 503.
 
Anotações
Legislação: 
CRP76 ART32, ART43, ART75; DL 553/80 DE 1980/11/24 ART99-K; L 33/2012 DE 2012/08/23; DL 152/2013 DE 2013/11/04; L 9/79 DE 1979/03/19; L 46/86 DE 1986/10/14; DL 55/2018 DE 2018/07/06; P 59/2014 DE 2014/03/07; LGTFP2014 ART176 ART180; DL 6/2019 DE 2019/01/14; RGES DE 1895/08/14; L 12 DE 1913/07/07; D 20613 DE 1931/12/11; DL 23447 DE 1934/01/05; L 2033 DE 1949/06/27; D 37545 DE 1949/09/08.
Jurisprudência: 
AC TRIB CONST 33/2002 DE 2002/01/22; AC TRIB CONST 28/2007 DE 2007/01/17; AC TRIB CONST 858/2014 DE 2014/12/03; AC TC 410/2011 DE 2011/09/27; ACTC 503/2011 DE 2011/11/15; AC STA DE 1999/06/02; AC STA DE 2010/05/06; AC TCAN DE 2012/11/09;

 
Referências Complementares: 
DIR ADM/ DIR TRAB/ DIR CONST
 
Divulgação
Link Directiva: 
https://dre.pt/application/conteudo/147102797
Número: 
212
Data: 
30-10-2020
Página: 
163
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