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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
29/2018, de 28.03.2019
Data do Parecer: 
28-03-2019
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Justiça
Relator: 
João Conde Correia dos Santos
Votantes / Tipo de Voto / Declaração: 
João Conde Correia dos Santos

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



João Conde Correia dos Santos

Votou em conformidade



Maria da Conceição Silva Fernandes Santos Pires Esteves

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Maria da Conceição Silva Fernandes Santos Pires Esteves

Votou em conformidade



Maria de Fátima da Graça Carvalho

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Maria de Fátima da Graça Carvalho

Votou em conformidade



Eduardo André Folque da Costa Ferreira

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Eduardo André Folque da Costa Ferreira

Votou em conformidade



João Eduardo Cura Mariano Esteves

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



João Eduardo Cura Mariano Esteves

Votou em conformidade



Maria Isabel Fernandes da Costa

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Maria Isabel Fernandes da Costa

Votou em conformidade



Eucária Maria Martins Vieira

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



Eucária Maria Martins Vieira

Votou em conformidade



João Alberto de Figueiredo Monteiro

Votou todas as conclusões sem reservas nem declarações



João Alberto de Figueiredo Monteiro

Votou em conformidade

Descritores e Conclusões
Descritores: 
ASSESSOR JURÍDICO
GABINETE DE APOIO A MAGISTRADO
TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO
TRIBUNAL DA RELAÇÃO
TRIBUNAL DE COMARCA
COMISSÃO DE SERVIÇO
ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA
INTERPRETAÇÃO DA LEI
REVOGAÇÃO TÁCITA
NOMEAÇÃO
CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA
PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA
Conclusões: 

1.ª A figura jurídica do assessor foi introduzida no Supremo Tribunal de Justiça pelo artigo 36.º da Lei n.º 38/87, de 23 de dezembro (Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais) e, depois, reforçada e estendida aos Tribunais da Relação e aos Tribunais de primeira instância pela Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro;

2.ª A Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário), prevê que o Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais da Relação disponham de assessores nos termos definidos na lei (art. 34.º), isto é, atualmente, nos termos da referida Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro;

3.ª A mesma Lei prevê que nas comarcas de 1.ª instância funcionará um Gabinete de apoio ao presidente e aos magistrados judiciais e do Ministério Público, na dependência orgânica do Conselho Superior da Magistratura e da Procuradoria-Geral da República, respetivamente, e destinado a prestar assessoria e consultadoria técnica aos magistrados, nos termos a definir por Decreto-Lei (art. 35.º);

4.ª A composição, a direção, o regime jurídico e o estatuto remuneratório dos membros destes Gabinetes de apoio foram depois regulamentados pelo Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março (artigos 28.º, 29.º, 30.º e 31.º, respetivamente);

5.ª A revogação das normas jurídicas pode resultar de declaração expressa, da incompatibilidade entre as novas disposições e as regras precedentes ou da circunstância de a nova lei regular toda a matéria da lei anterior (art. 7.º, n.º 2, do Código Civil);

6.ª A Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, ao prever que o Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais da Relação dispõem de assessores nos termos definidos na lei (art. 34.º) e que nas comarcas de 1.ª instância funcionará um Gabinete de apoio ao presidente e aos magistrados judiciais e do Ministério Público, destinado a prestar assessoria e consultadoria técnica aos magistrados é, na parte que se refere aos assessores nos tribunais de 1.ª instância, incompatível com a Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro;

7.ª Os preceitos da Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro, que sejam incompatíveis com o artigo 35.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário, maxime aqueles que se referem aos assessores nos tribunais de 1.ª instância, ficaram assim tacitamente revogados; e

8.ª Funcionando os Gabinetes de Apoio nas comarcas na dependência do Conselho Superior da Magistratura e da Procuradoria-Geral da República, respetivamente, não faz parte das atribuições do Ministro da Justiça nomear ou prorrogar a comissão de serviço dos assessores para os tribunais judiciais de primeira instância (art. 1.º, n.º 2 e 8.º, n.º 3, da Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro).

Texto Integral
Texto Integral: 

Senhora Ministra da Justiça

Excelência:
 

I

Submeteu Sua Excelência a Ministra da Justiça, nos termos da alínea a), do artigo 37.º, do Estatuto do Ministério Público, pedido de parecer a este Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República[1], invocando o seguinte:

«Sua Excelência o Senhor Vice-Procurador-Geral da República solicitou a prorrogação da comissão de serviço da assessora (…), que, desde há vários anos, vem exercendo essa função junto do Ministério Público do Juízo Central de Família e Menores de Lisboa.

Subjaz, no entanto, à solicitada prorrogação da comissão de serviço uma questão jurídica controvertida, qual seja a de saber:

- Se a Lei n.º 2/98, de 2 de janeiro e respetiva regulamentação se encontra, no que respeita aos tribunais de primeira instância, tacitamente revogada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de maio, e consequentemente se,

- No contexto da nova organização judiciária deixou de ser possível ao Ministro da Justiça nomear ou prorrogar a comissão de serviço dos assessores para os tribunais judiciais, ao abrigo do disposto no art. 8.º da Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro.

Considerando tratar-se de matéria suscetível de dissonância interpretativa, solicitei ao Excelentíssimo Senhor Auditor Jurídico junto deste Ministério a emissão de parecer. No parecer, prontamente emitido, o Senhor Auditor Jurídico considera que no contexto da nova organização judiciária, a lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de maio, revogou tacitamente, no que respeita aos tribunais de primeira instância, a Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro. No entanto, ponderando a posição reiteradamente assumida pelos diferentes graus da hierarquia do Ministério Público acerca da matéria em apreço, e considerando a sensibilidade da questão, concluiu sugerindo que seja solicitado parecer ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República.

Concordando, em absoluto, com a sugestão, permito-me, ao abrigo do estatuído na alínea a) do artigo 37.º do Estatuto do Ministério Público, solicitar a Vossa Excelência se digne submeter as questões supra enunciadas à apreciação do Conselho Consultivo».

Importa, assim, emitir o parecer solicitado:

II

Da figura jurídica do Assessor

1. A figura jurídica do assessor foi (invocando a praxis dos tribunais administrativos[2] e do tribunal constitucional[3]) introduzida no Supremo Tribunal de Justiça pelo artigo 36.º da Lei n.º 38/87, de 23 de dezembro (Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais)[4] e depois regulamentado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 214/88, de 17 de junho[5].

Dez anos volvidos, com a Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro, o legislador reforçou e estendeu este regime aos Tribunais da Relação e aos Tribunais de primeira instância. Na ótica do legislador, apesar da diversidade das funções que exercem, também eles deviam beneficiar desta ajuda preciosa, poupando-lhes o tempo imprescindível para o nobre exercício da tarefa de julgar.

Como então se dizia «o crescente volume de serviço nos tribunais, em paralelo com a complexidade das questões que lhes são submetidas, aconselha a que os magistrados sejam coadjuvados por licenciados em direito, sob a sua direta dependência, a exemplo do que sucede noutros países, com o que cumulativamente, se tornará possível infletir no elevado aumento anual dos seus quadros»[6].

Desta forma, procurava-se, sobretudo, contribuir para a deflação processual.

Como então defendeu a Deputada Odete Santos, na reunião plenária de 22 de outubro de 1997, «O Grupo Parlamentar do PCP dá o seu apoio relativamente a esta proposta de lei, uma vez que ela é de todo o interesse para aligeirar os magistrados de algumas tarefas que podem perfeitamente ser feitas por estes assessores, com ganhos para a justiça, que poderá assim ser mais célere e melhor administrada em nome do povo».[7]

Na mesma linha, dizia Guilherme Silva: «Também parece à bancada do PSD que é óbvia esta medida, tendo em conta o estado atual da nossa justiça, nomeadamente na acumulação de serviços que grande parte dos nossos tribunais registam nas várias instâncias. A assessoria pode ser um elemento importante para atenuar a sobrecarga de trabalho que os magistrados têm, sejam eles judiciais, sejam os do Ministério Público»[8].

A necessidade consensual de libertar os magistrados, permitindo que eles se concentrassem no essencial, não era, todavia, absoluta, não podendo ser conseguida a todo o custo. Nas palavras de Matos Fernandes, ao tempo, Secretário Ajunto do Ministro da Justiça, «É preciso que a assessoria seja mesmo e só assessoria e que as funções específicas de um magistrado não se interpenetrem com alguma promiscuidade, que poderia ser, do nosso ponto de vista, perigosa»[9].

Por isso mesmo, ao contrário do regime anterior que se limitava a dizer que os assessores «coadjuvarão os juízes na recolha de elementos necessários ao exame e decisão dos processos»[10], o novo regime legal fixou detalhadamente as competências, o estatuto, os direitos e deveres dos assessores. Convocando, novamente, a fórmula do Secretário Ajunto do Ministro da justiça, «esta proposta de lei revela alguma preocupação nessa matéria, designadamente quando aponta para a preparação de determinadas peças do processo e quando exige que haja uma delegação expressa por parte dos magistrados e pontual, caso a caso, processo a processo»[11].

Assim, em termos de competência, a referida Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro, especificou que «compete, designadamente, aos assessores:

a) Proferir despachos de mero expediente;

b) Preparar a agenda dos serviços a efetuar;

c) Elaborar projetos de peças processuais;

d) Proceder à pesquisa da legislação, jurisprudência e doutrina necessárias à preparação das decisões e das promoções nos processos;

e) Sumariar as decisões e as promoções, a legislação, a jurisprudência e a doutrina de maior interesse científico e integrá-la em ficheiros ou em base de dados;

f) Colaborar na organização e atualização da biblioteca do tribunal» (art. 2.º, n.º 1).

Para além disso, revelando a mesma preocupação com a delimitação de competências, o mesmo regime legal acrescentava, depois, que a competência para proferir despachos de mero expediente, para preparar a agenda dos serviços a efetuar e para elaborar projetos de peças processuais dependia de delegação do respetivo magistrado, sendo que no último caso essa delegação deveria ser específica (art. 2.º, n.º 2).

A mesma lei, delimitando ainda mais o estatuto daqueles, acrescentava também que os «assessores dependem, hierárquica e funcionalmente, do magistrado que coadjuvam» (art. 10.º, n.º 1) e que, no caso de coadjuvarem mais do que um magistrado, eles dependem «do magistrado que for designado pela entidade competente para a sua colocação» (art. 10.º, n.º 2).

Devido às funções que exerciam, os assessores estavam, igualmente, sujeitos aos deveres e incompatibilidades dos magistrados, sendo-lhes, subsidiariamente, aplicável, o regime da função pública (art. 13.º).

Apesar de todo este cuidado na definição do estatuto jurídico-profissional dos assessores, não estava em causa a criação de uma nova carreira. «Não se trata de profissionalizar os assessores, com o que se previne o risco de uma longa permanência nos tribunais e de um empolamento dos quadros da função pública»[12]. Por isso mesmo, os assessores eram providos em comissão de serviço, por três anos, podendo tal comissão ser prorrogada por duas vezes, por períodos de um ano (art. 8.º, n.º 1 e 3).

Na sequência deste regime legal, a Portaria n.º 184/99, de 20 de março, veio, depois, fixar, efetivamente, o número de assessores dos magistrados judiciais e do Ministério Público nos Tribunais da Relação e em Tribunais Judiciais de 1.ª Instância.

A Lei n.º 74/2002, de 26 de março (que adapta os serviços de apoio do Supremo Tribunal de Justiça ao regime de autonomia administrativa consagrado pelo Decreto-Lei n.º 177/2000, de 9 de agosto) criou o Gabinete de apoio dos juízes conselheiros e dos magistrados do Ministério Público (art. 13.º[13]), composto por assessores e secretários, em número a fixar por portaria (art. 13.º, n.º 1). Tais assessores podem ser magistrados judiciais ou do Ministério Público (nos termos do disposto na Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro) ou então mestres ou licenciados em Direito de reconhecida competência, nomeados em comissão de serviço, com as garantias, os deveres e a remuneração aplicáveis aos adjuntos do Gabinete do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (art. 13.º, n.º 1).

A Lei n.º 52/2008, de 28 de agosto (que aprova a Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais), aplicável a título experimental, às comarcas piloto Alentejo Litoral, Baixo-Vouga e Grande Lisboa Noroeste, previa a existência de assessores no Supremo Tribunal de Justiça e nos tribunais da Relação e de gabinetes de apoio nos tribunais de comarca (art. 14.º[14]) para os magistrados judiciais nos termos do artigo 83.º[15] e para os magistrados do Ministério Público nos termos do artigo 84.º[16]. Solução legal diversificada que parece corresponder às diferentes necessidades e funções dos tribunais de recurso e da primeira instância. Nos primeiros, essencialmente pensados para a resolução de questões jurídicas, justifica-se, apenas, a existência de assessores jurídicos (altamente qualificados: juízes); nos segundos, pela complexidade das questões que aí são tratadas, justifica-se a existência de gabinetes de composição mais heterogénea.    

Os referidos gabinetes de apoio aos magistrados da primeira instância destinavam-se, assim, a assegurar a assessoria e a consultadoria técnica aos magistrados judiciais ou do Ministério Público de cada comarca, nos termos a definir por Decreto-Lei e seriam constituídos por especialistas com formação científica e experiência profissional adequada, em número a fixar por portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, da Administração Pública e da justiça. O recrutamento do pessoal seria, respetivamente, efetuado pelo Conselho Superior da Magistratura e pela Procuradoria-Geral da República, através de comissão de serviço.

A Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário), prevê, igualmente, que «o Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais da Relação dispõem de assessores que coadjuvam os magistrados judiciais e os magistrados do Ministério Público, nos termos definidos na lei» (art. 34.º) e que nas comarcas de 1.ª instância funcionará um Gabinete de apoio ao presidente e aos magistrados judiciais e do Ministério Público (art. 35.º[17]).

Neste cenário político, os artigos 28.º (composição), 29.º (direção), 30.º (regime jurídico), 31.º (estatuto remuneratório) e 32.º (estágios profissionais) do Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março (Regulamenta a Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto e estabelece o regime aplicável à organização e funcionamento dos tribunais judiciais) vieram complementar aquele regime legal.

Assim, especifica-se que os gabinetes são compostos por especialistas com formação académica de nível não inferior a licenciatura e experiência profissional adequada nas seguintes áreas: a) Ciências jurídicas; b) Economia; c) Gestão; d) Contabilidade e finanças; e) Outras consideradas relevantes por deliberação do Conselho Superior da Magistratura e da Procuradoria-Geral da República. Ao contrário do anterior regime, a composição do Gabinete inclui, assim, outras áreas científicas (art. 28.º, n.º 1).

Os gabinetes de apoio aos magistrados judiciais e aos magistrados do Ministério Público são dirigidos pelo presidente do tribunal e pelo magistrado do Ministério Público coordenador, respetivamente (art. 29.º), deste modo respeitando as especificidades e necessidades das duas magistraturas e, mais uma vez, parecem ter na base razões económicas, por forma a libertar os magistrados de tarefas burocráticas[18].

Para além disso, esclarece-se que a composição destes gabinetes é definida pelo Conselho Superior da Magistratura e pela Procuradoria-Geral da República, ouvidos o presidente do tribunal e o magistrado do Ministério Público coordenador, respetivamente (art. 28.º, n.º 2); que os seus membros são recrutados por procedimento concursal nos termos da legislação aplicável aos cargos de direção intermédia da Administração Pública, com as especificidades previstas neste regime (art. 28.º, n.º 3), sendo da competência do Conselho Superior da Magistratura e da Procuradoria-Geral da República a abertura do procedimento concursal, a fixação do perfil exigido e dos critérios de admissão, bem como a seleção e classificação dos especialistas que integram os respetivos gabinetes de apoio (art. 28.º, n.º 4[19]).

Os especialistas dos gabinetes de apoio aos magistrados judiciais são designados pelo Conselho Superior da Magistratura e pela Procuradoria-Geral da República, respetivamente, exercem as suas funções em regime de comissão de serviço (art. 30.º, n.º 1 e 2[20]), auferem a remuneração correspondente a um nível remuneratório da quarta posição remuneratória da carreira geral de técnico superior, sendo o seu encargo suportado, conforme os casos, pelo Conselho Superior da Magistratura ou pela Procuradoria-Geral da República (art. 31.º[21]).

Atentas as funções que desempenham, os especialistas destes gabinetes estão sujeitos ao respeito pelo segredo de justiça e pelo dever de reserva, quanto a todos os factos de que tomem conhecimento pelo exercício das suas funções, nos mesmos termos dos magistrados judiciais e dos magistrados do Ministério Público (art. 31.º).

      

1.1. A Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, revogou expressamente: a) os artigos 1.º a 159.º da Lei n.º 52/2008, de 28 de agosto, na parte em que aprova a Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais; b) a Lei n.º 3/99, de 13 de janeiro; c) o Decreto-Lei n.º 28/2009, de 28 de janeiro; d) o Decreto-Lei n.º 25/2009, de 26 de janeiro; e) o Decreto-Lei n.º 186-A/99, de 31 de maio (art. 187.º).

Assim, não tendo sido expressamente revogada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, coloca-se o problema de saber se a Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro, ainda está ou não, totalmente ou em parte, em vigor.

          

III

Cessação da vigência das normas jurídicas (art. 7.º do Código Civil)

As normas jurídicas, à semelhança de qualquer outra construção humana, «integram (como os demais fundamentos e critérios do sistema jurídico) a esfera do prático histórico, razão porque se pode dizer ser o tempo – scilicet: as exigências de sentido que a axiologicamente o entretecem e os problemas específicos que materialmente o densificam – um seu “elemento essencial”»[22]. Na verdade, «as normas jurídicas não podem ser eternas, posto que tenham por carácter a estabilidade e devam ter duração indefinida. As leis vivem só enquanto permanece o estado económico-social para que foram feitas. A força da lei, porém, faz que ela não possa cessar, em regra, senão por virtude de outra lei»[23]. O legislador, expressando, legitimamente, a volonté générale, tem sempre o poder soberano de modificar a lei.

1. Debatendo este velho problema jurídico, ainda durante o Código Civil de Seabra (1866), que não tinha nenhuma norma semelhante ao atual artigo 7.º, M. A. Coelho da Rocha afirmava (nas suas Instituições de Direito Civil Português datadas de finais do século XIX), forma límpida e cristalina, que as leis «podem ser abrogadas: 1.º ou expressamente por outra lei; 2.º ou tacitamente, se uma lei posterior estabelece disposição incompatível com a anterior; ou quando a razão ou motivo da lei cessou manifestamente: v.g. as providências para a guerra, se esta acabou»[24].

Na mesma linha de raciocínio, igualmente nas suas Instituições de Direito Civil Português, Guilherme Alves Moreira defendia que «as leis perdem a sua força obrigatória pela revogação», que pode ser tácita ou expressa. A primeira hipótese «é a que resulta do próprio teor da nova lei, em virtude de incompatibilidade entre as suas disposições e as da lei anterior», designadamente quando «haja oposição ou antinomia entre elas, de modo que seja impossível aplica-las conjuntamente às relações sociais que regulam. Quando a conciliação seja possível, não se dará a revogação das leis anteriores, salvo nos casos em que a nova lei reproduza as mesmas disposições, ou regule inteiramente as relações sociais a que eram aplicáveis»[25].

Destes princípios gerais, o autor retirava, depois, as seguintes ilações: «a lei especial derroga a geral no caso ou casos sobre que provê, porque os motivos particulares em que se baseia a lei especial excluem sempre os gerais em que se fundam as disposições da lei anterior (…) o mesmo se não dá com o princípio de que a lei geral posterior não revoga a especial anterior, porque, se os motivos da lei geral podem coexistir com os da especial, também podem excluí-los, por estarem em contradição». Ou seja «a lei geral revoga a especial não só quando o legislador expressamente o declare, mas ainda quando se reconheça que ele teve essa intenção, regulamentando os mesmos casos que foram previstos na lei anterior, ou estabelecendo novos princípios de direito, absolutamente incompatíveis com aqueles em que se baseava a anterior legislação especial»[26].

Também José Tavares[27] defendia que a revogação tácita «resulta necessariamente da incompatibilidade existente entre as disposições de uma lei nova e as de outras leis anteriores», que «a incompatibilidade de duas ou mais disposições legais dá-se quando elas são por tal modo antinómicas, opostas ou contrárias que se torna impossível executá-las simultaneamente» e que estando em causa o «confronto ou concurso duma lei geral e duma lei especial (…) em princípio, não há revogação, porque não há incompatibilidade entre elas, pois que, sendo diversos os seus objetos, do domínio da primeira está excluído o da segunda. Daí o princípio – a lei geral não revoga a especial – Legi speciali per generalem non derogantur»[28].

Finalmente, Luiz da Cunha Gonçalves, a quem se deve, porventura, o tratamento mais exaustivo da questão, afirmava que a «a revogação pode ser expressa ou tácita. É expressa quando uma nova Lei, contenha, ou não, novas normas jurídicas, faz clara referência à legislação anterior ou às disposições das leis anteriores que cessam de vigorar, quer de um modo genérico (…) quer concretamente». A revogação tácita é, por seu turno, «a que resulta da incompatibilidade entre a lei antiga e a lei nova. Esta incompatibilidade é uma consequência normal da lei nova, já porque não podem subsistir conjuntamente duas leis opostas sobre os mesmos factos, sem que uma delas seja nociva ou inútil, já porque o legislador não se daria ao trabalho de fazer mais uma lei, se as anteriores fossem totalmente profícuas e satisfatórias»[29].

Em consequência, continua o mesmo autor, «quando o legislador manifestou sucessivamente duas vontades diversas sobre a mesma matéria, deve prevalecer a vontade mais recente. E além disto, é preciso que a antinomia entre as duas leis seja incontestável e inconciliável, e não apenas aparente, de sorte que seja impossível, sem ofensa da lógica e sem resultados práticos disparatados, aplicar ambas às mesmas relações sociais ou ao mesmo facto jurídico. Uma nova lei que se concilia com as disposições da anterior, não é revogatória desta; pois, pode ser, apenas, complementar ou interpretativa, o que será revelado pelo seu texto ou na exposição de motivos.

Todavia, se a lei nova regula de modo completo e definitivo os mesmos factos que eram objeto da lei anterior, e embora não reproduza algumas das disposições desta, nem contenha preceitos verdadeiramente incompatíveis, deverá ser havida como abrogatória ou derrogatória porque “não seria prudente alterar a economia e a unidade desta lei nova, misturando com ela as disposições, talvez heterogéneas, da lei antiga, que veio substituir”; e deve presumir-se que o legislador quis liquidar o passado, estabelecendo um sistema completo e autónomo de princípios e ideia novas cuja aplicação pode conduzir a consequências diversas e até opostas às que derivam da lei anterior»[30].

2. Toda esta doutrina foi sufragada pelo novo Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47344, de 25 de novembro de 1966, onde se refere, expressamente, que: «a revogação pode resultar de declaração expressa, da incompatibilidade entre as novas disposições e as regras precedentes ou da circunstância de a nova lei regular toda a matéria da lei anterior» (art. 7.º, n.º 2) e que «a lei geral não revoga a lei especial, exceto se outra for a intenção inequívoca do legislador» (art. 7.º, n.º 3). Malgrado o carácter inovador deste Código, o legislador limitou-se, aqui, como não podia deixar de ser, a consagrar na letra da lei os ensinamentos de décadas e décadas de doutrina uniforme.

Não admira, por isso, que, já no contexto desta nova lei, a doutrina e a jurisprudência continuem a acentuar as diferenças entre a revogação expressa e a revogação tácita e os casos em que esta ocorre, deste modo densificando o conceito de incompatibilidade legislativa.

Assim, segundo Miguel Teixeira de Sousa a revogação tácita «é a revogação por incompatibilidade de regimes sucessivos – resolve os conflitos de leis através de regras (também designadas por “regras de preferência”) que definem os seguintes critérios: a prevalência da fonte posterior sobre a fonte anterior (lex posterioi derogat legi priori) (cf. art. 7.º, n.º 1, CC), a prevalência da fonte de hierarquia superior sobre a fonte de hierarquia inferior (lex superior derogat legi inferior) e, por fim, a prevalência da fonte especial sobre a fonte geral (lex specialis derogat legi generali) (cf. art. 7.º, n.º 3, CC)[31]».

Por isso mesmo, em resumo, «a lei posterior só pode revogar a lei anterior quando ambas forem leis gerais (lei geral revoga lei geral) ou especiais (lei especial revoga lei especial) ou quando a lei anterior for geral e a lei posterior for especial. Em contrapartida, uma lei geral posterior não revoga a lei especial anterior, exceto se outra for a intenção inequívoca do legislador (art. 7.º, n.º 3, CC). Compreende-se que assim seja, porque, apesar da nova lei geral, pode continuar a justificar-se a vigência da anterior lei especial»[32].

Inocêncio Galvão Teles afirma que «a revogação pode resultar também da mera instituição de uma regulação contraditória com a constante de lei anterior. Neste (…) caso a lei nova, que se mostra incompatível com a antiga, prevalece sobre ela e revoga-a. A revogação diz-se então tácita porque não há uma expressa vontade revogatória: o legislador não declarar querer revogar certa lei; manifesta indireta ou tacitamente essa vontade de através de uma disciplina jurídica que necessariamente se substituiu à precedente, porque é com ela inconciliável. Não podem subsistir duas leis contraditórias, e dá-se preferência à que exprime a vontade mais recente do legislador»[33].

José de Oliveira Ascensão refere, por seu turno, que «na maioria dos casos o legislador não procede à revogação expressa. Verificar dentro da mole imensa de leis existentes quais as que são atingidas por uma nova lei é trabalho muito grande, e que com frequência revela dificuldades com que se não contava. O legislador então poupa-se: quando muito revoga expressamente os preceitos que pretendia diretamente substituir, e quanto aos restantes deixa ao intérprete o ónus da verificação da sua incompatibilidade com os novos textos»[34].

Em sentido algo contrário, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9 de junho de 1992, afirma-se, porventura com demasiado otimismo, que «o legislador sabe o que faz e não comete lapsos, tendo o intérprete que partir do princípio de que se não alterou o respetivo preceito foi porque não quis e tendo agido deliberadamente. No fundo, do que verdadeiramente se trata e de um problema de interpretação da lei nova, devendo ter-se presente que a revogação tácita tem como limite o princípio da contraditoriedade. Queremos com isto significar que, salvo nos casos de revogação total ou por substituição, a lei anterior apenas se pode ter como revogada na medida da sua incompatibilidade com a lei posterior. Onde essa incompatibilidade não existe terá de aceitar-se a coexistência, lado a lado, dos dois diplomas, embora, naturalmente, com domínios de aplicação diversos»[35].

Em suma, «a revogação pode ser expressa ou tácita. Será expressa quando a lei posterior explicitamente enunciar a revogação da lei anterior. Será tácita quando a lei posterior introduzir um regime inconciliável (total ou parcialmente) com aquele que constava da lei anterior ou quando, independentemente disso, a lei nova passar a ordenar inteiramente toda a matéria que aquela anterior disciplinava. A revogação tácita baseia-se numa ilação que se retirará por via interpretativa»[36].

2.1. Ultrapassada essa questão preliminar, procurando reduzir as margens de arbítrio e, assim, aumentar a indispensável segurança jurídica, a doutrina ensina depois que «há incompatibilidade entre as novas disposições e as precedentes quando, podendo aplicar-se às mesmas situações de facto (por se aplicarem à mesma categoria de pessoas – identidade pessoal – e ao mesmo tipo de matérias – identidade material –, estando simultaneamente em vigor – identidade temporal), consagram orientações de conduta contraditórias»[37]. O concurso de lei pode ser real ou aparente, havendo revogação tácita apenas na primeira hipótese, id est, quando o aplicador se vê na contingência prática de optar pela aplicação de uma ou de outra lei.

IV

       A lei n.º 2/98, de 2 de janeiro foi tacitamente revogada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de maio?

Se, do ponto de vista meramente abstrato, não subsistem dúvidas dogmáticas quanto à existência da revogação tácita e aos casos em que ela ocorre, o mesmo já não se poderá dizer, em concreto: saber se duas normas jurídicas são ou não, total ou parcialmente, incompatíveis é um problema interpretativo, nem sempre fácil de resolver, que depende, sobretudo, da exaustiva comparação de ambos os regimes legais e do, respetivo, elemento histórico.

Na verdade, trata-se de um problema (muitas vezes difícil) de interpretação do direito, que se deve resolver com base no texto da norma, na sua coerência lógica, na evolução histórica e nos trabalhos legislativos e também com base na finalidade das disposições em causa e no valor do resultado obtido[38]. Como, entre nós, disse Adriano Vaz Serra, «o problema é, pura e simplesmente, de interpretação da lei geral posterior, resumindo-se em apreciar se esta quer ou não revogar a lei especial anterior. Como problema de interpretação que é, deve ser resolvido mediante os critérios gerais de interpretação das leis, nada permitindo exigir que a lei geral posterior revogue expressamente a lei especial anterior, para que esta se considera revogada»[39].

Importa, por isso, respondendo, finalmente, à questão concreta colocado por V.Ex.ª, verificar «se a lei n.º 2/98, de 2 de janeiro e respetiva regulamentação se encontra, no que respeita aos tribunais de primeira instância, tacitamente revogada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de maio»; id est importa verificar se as referidas leis são ou não são entre si, concretamente, no todo ou em parte, incompatíveis.

1. A Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (Lei de organização do sistema judiciário) teve na sua génese a Proposta de Lei n.º 114/XII (2.ª). Na respetiva exposição de motivos, com interesse para o presente parecer, podemos ler que: «as sucessivas intervenções legislativas que, até à data, vêm sendo efetuadas na organização judiciária deram lugar a uma profusão de diplomas legais espartilhantes dessa organização, que não permitem visionar e identificar o sistema de justiça como um todo único, onde facilmente se apreendam as categorias e competências dos tribunais existentes, a sua interdependência hierárquica e funcional, o seu modelo de organização e funcionamento, a função das profissões judiciárias e o papel dos órgãos de gestão e disciplina judiciária que neles devem interagir»[40]. Por isso mesmo, era intenção confessada do legislador propiciar «aos profissionais forenses, mas também ao cidadão comum, uma peça legislativa única contendo os normativos necessários para uma apreensão abrangente, sistemática e agregadora de todo o sistema de justiça»[41].

A Lei de organização do sistema judiciário pretendia, assim, «abrir caminho para uma total alteração de paradigma no nosso sistema de justiça, reestruturando a organização e funcionamento dos tribunais judiciais e repensando, inclusive, a organização e funcionamento de outras jurisdições»[42].

A partir do desenvolvimento da legislação orgânica e regulamentar preexistente, a proposta procurava, portanto, romper com a nossa tradição, apresentando-se como «um primeiro passo para a consolidação de todo o quadro legislativo de referência do sistema judiciário»[43].

Mesmo assim, malgrado o seu carácter inovador, esta lei não assumia pretensões de completude ou de total autossuficiência, posto que seria «complementada, no imediato, com um projeto de Decreto-Lei que estabelece o regime de organização e funcionamento dos tribunais judiciais e, numa segunda com a revisão dos estatutos profissionais»[44]. O próprio legislador logo ali confessou que (como não podia deixar de ser, atenta a natureza particular de muitas questões) a Lei de Organização do Sistema Judiciário não seria, afinal, exaustiva.

Cumprindo este plano inicial, isso mesmo resulta, depois, de variadíssimos artigos, que remetem para a lei ordinária o desenvolvimento desta nova organização (v.g. os artigos 7.º, 8.º, 19.º ou, naquilo que nos interessa, os artigos 34.º e 35.º). Apesar de se assumir como uma Lei centralizadora ou aglutinadora, de modo a – insistimos – permitir «visionar e identificar o sistema de justiça como um todo único», a Lei de Organização do Sistema Judiciário optou, muitas vezes (de forma expressa ou implícita), pela técnica da remissão, relegando para outros diplomas a verdadeira exaustão de todo o quadro legal ali delineado.

           

1.1. O mesmo acontece com o Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março, que a regulamenta (estabelece o regime aplicável à organização e funcionamento dos tribunais judiciais) assim formando com ela uma verdadeira unidade funcional: também aqui o legislador utilizou a técnica da remissão (que, agora, podemos qualificar como de segundo grau) para outros diplomas legais. É o caso paradigmático dos artigos 23.º, 31.º, 67.º, 69.º, 72.º, 76.º, 78.º, 83.º, 85.º, 89.º, 91.º, 94.º e 98.º.

Em vez de, cumprindo, integralmente, o seu anunciado desígnio codificador inicial, aglutinar todo o regime de organização do sistema judiciário num único diploma legal capaz de, verdadeiramente, permitir a identificação do «sistema de justiça como um todo», o legislador continuou, afinal, a espartilhar, a organização judiciária por uma profusão de diplomas legais, nem sempre, como é o caso concreto, fáceis de articular.

1. 2. Em termos abstratos e globais, não podemos, portanto, dizer que a unidade normativa criada pelo legislador e, efetivamente, implementada em 2014 esgota toda a matéria das leis anteriores (art. 7.º, n.º 2, parte final, do CC), convivendo, em muitos casos, não obstante aquilo que, então, foi, solenemente, anunciado pelo legislador, com velhas soluções dispersas ou extravagantes (maxime com os velhos estatutos profissionais). Em matéria de estatutos profissionais (como também acontece aqui), é, aliás, frequente a remessa para outras disposições legais, que só constituiriam um corpo coerente quando fossem revistos (o que, em alguns casos, maxime o subjacente à presente consulta, ainda não aconteceu).

2. Uma vez que a lei nova não regula toda a matéria das leis anteriores (art. 7.º, n.º 2, parte final do CC), permitindo concluir liminarmente que o legislador nacional pensou num novo regime global, assim afastando o regime anterior, importa agora discutir se, pelo menos no domínio restrito da assessoria, a nova lei regula toda a matéria da lei pregressa, assim, afastando a sua aplicabilidade.

Segundo o artigo 34.º da Lei Orgânica do Sistema Judiciário, «o Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais da Relação dispõem de assessores que coadjuvam os magistrados judiciais e os magistrados do Ministério Público, nos termos definidos na lei», isto é, nos termos referidos na Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro. Neste limitado segmento da norma, por própria vontade do legislador, não há, pois, nenhuma sobreposição, ressalvando a lei nova a vigência lei antiga, para cuja regulamentação neste momento remete expressis verbis. Enquanto não for substituído por um estatuto devidamente atualizado, o provimento de assessores nesses tribunais continuará a fazer-se nos termos deste velho regime legal. A eventual revogação tácita (a existir efetivamente) será apenas parcial. De forma alguma podemos dizer que a nova lei regulou toda esta matéria, substituindo, assim, o antigo conceito jurídico de assessor por um novo paradigma legal. Pelo menos ao nível dos tribunais de recurso, aquela noção manteve-se integralmente.

3. O nosso problema reduz-se, neste termos, a saber se existe incompactidade, concreta, entre as novas disposições, que criam os Gabinetes de apoio aos magistrados judiciais e do Ministério Público nas comarcas (art. 35.º da Lei n.º 62/2008, de 26 de agosto) e as antigas normas que instituíam a assessoria a ambas as magistraturas em certos tribunais de primeira instância (Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro). Os membros dos gabinetes podem desempenhar as mesmas funções dos antigos assessores, tornando a sua subsistência inútil ou existem diferentes campos de aplicação, permitindo a utilização paralela de ambos os regimes?

Procurando responder a esta delicada questão, diga-se, desde logo, que a Lei de Organização do Sistema Judiciário não definiu as funções dos membros dos gabinetes de apoio dos magistrados nas comarcas, deixando apenas claro que eles prestam assessoria e consultadoria técnica (art. 35.º da Lei n.º 62/2008, de 26 de agosto), nos termos a definir por Decreto-Lei. De todo o modo, uma vez que as competências dos assessores do Supremo Tribunal de Justiça e dos Tribunais da Relações estão devidamente consagradas na Lei[45], afigura-se-nos que as mesmas devem valer também para a primeira instância. Não há nenhuma justificação para que a noção de assessoria (onde se incluem obviamente as competências), prevista no artigo 34.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário, seja diferente da noção de acessória consagrada no artigo 35.º da mesma lei. Ao mesmo vocábulo deve, em boa técnica legislativa, corresponder o mesmo conceito legal: que razões poderiam, aliás, justificar a imputação de dois sentidos diferentes ao mesmo lexema?

Não fará, de resto, sentido que, no âmbito do mesmo diploma, a figura do assessor mude ao longo do processo, assumindo funções diferentes consoante a fase processual em que aquele se encontre. Tanto mais que as razões políticas subjacentes a esta rigorosa delimitação de competências (evitar a interpenetração de funções e a perigosa promiscuidade daí resultante[46]) ainda se mantêm atuais: os assessores devem ser sempre e apenas assessores. Eles podem, em alguns casos, desempenhar funções «quase» jurisdicionais [art. 2.º, n.º 1, al.ªs a) e c), da Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro], que dependem de delegação e, como é óbvio, pressupõem um estatuto funcional exigente e claramente delimitado.

A boa interpretação jurídica da nova lei permite-nos, portanto, concluir que os conceitos de assessor jurídico, consagrados nos artigos 34.º e 35.º são simétricos. Apesar da aparente falta de definição do segundo caso, ele deverá corresponder exatamente ao primeiro. Já a figura do consultor técnico, que aqui não importa decantar, deverá em nosso entender corresponder ao sentido que lhe é dado pelas leis processuais[47]: estão em causa especialistas nas mais diversas áreas do saber, capazes de auxiliar os magistrados em questões técnicas, para as quais estes não têm preparação suficiente.

Ao nível das comarcas, a lei de organização do sistema judiciário, unificou, assim, num único gabinete os assessores jurídicos e os consultores técnicos. Todos eles constituem, agora, o corpo de apoio aos magistrados, por forma a dar a melhor resposta às diversas questões técnicas (consultadoria) e jurídicas (assessoria) com que estes quotidianamente se deparam. Pelo contrário, ao nível dos tribunais superiores, atentas as suas competências (normalmente complexas questões de direito), justifica-se, apenas, a existências de assessores jurídicos, de elevadíssima competência técnica[48]. A consultadoria é aqui dispensável.

Esta integração dos assessores nos Gabinetes de Apoio aos magistrados não é sequer uma inovação da nova organização judiciária: a Lei .º 74/2002, de 26 de março, já tinha feito o mesmo ao nível do Supremo Tribunal de Justiça[49]. Também aí os assessores foram integrados numa estrutura orgânica composta por assessores e secretários, que bem pode ter servido de exemplo para esta nova realidade jurídica. O mesmo acontece ainda no Supremo Tribunal Administrativo e no Tribunal Constitucional[50].

Acresce que o facto de o legislador ter ido agora muito mais longe, prevendo uma estrutura de largo espectro (natural num mundo em constante progresso e que, logo, reclama novas soluções) não impede a integração nesses novos gabinetes de apoio de funções anteriormente reguladas noutros diplomas. Desde que as respetivas funções ou competências estejam bem delimitadas, nada impede que num gabinete de apoio convivam saberes muito heterogéneos. Solução legal que (muito embora o legislador não tenha, como vimos, logrado todos os seus propósitos iniciais) se insere naquela ideia mestra de rotura com o passado.

Sendo assim, estando em ambos os casos em causa a mesma figura jurídica (assessoria), não há espaço para a completa sobrevivência do anterior regime. Naquilo em que for incompatível, a nova lei revoga a anterior. Deste modo, ao integrar a assessoria nos Gabinetes de Apoio, o artigo 35.º da Lei n.º 62/2008, de 26 de agosto, impede a existência daqueles serviços fora daqueles gabinetes. Ao nível das comarcas os especialistas dos gabinetes de apoio substituem os antigos assessores. A elaboração de despachos de mero expediente, de projetos de peças processuais, a pesquisa de legislação jurisprudência ou doutrina devem agora ser realizados pelos especialistas em ciências jurídicas que integram os gabinetes de apoio.

Neste domínio, as legislações são, pois, insistimos, incompatíveis, pelo que ou se aplica uma ou se aplica outra, devendo, quando isso sucede, o intérprete optar, nos termos do artigo 7.º, n.º 2, do Código Civil pela mais recente, ou seja, neste caso, pelo regime consagrado na Lei de Organização do Sistema Judiciário.

4. E não se diga que a lei geral não revoga a lei especial (art. 7.º, n.º 3, do CC) e que, por isso mesmo, a Lei de Organização do Sistema Judiciário não pode ter revogado a Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro, enquanto diploma especial, regulamentador desta matéria. Com efeito, apesar desse princípio geral, a lei exceciona depois os casos em que (como acontece no problema objeto desta consulta) outra seja a intenção inequívoca do legislador (art. 7.º, n.º 3, parte final do Código Civil). Ao manter os assessores no Supremo Tribunal de Justiça e nas Relações, nos termos da Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro e ao invés prever para as comarcas gabinetes de apoio com funções de assessoria e consultadoria, o legislador revelou, claramente, que apenas queria manter aquela lei em vigor (enquanto não aprova novo estatuto) para os primeiros. Solução que, insistimos, embora esse propósito não tenha sido totalmente concretizado, se insere naquela ideia de, rompendo com o passado, criar uma organização judiciária inovadora.

5. Invocar que não há coincidência de regimes e logo incompatibilidade, porquanto a figura jurídica dos assessores terá características (materiais, formais e orgânicas) exclusivas e incomunicáveis aos especialistas que compõem os Gabinetes de Apoio não é motivo suficiente para concluir pela compatibilidade de regimes.

Este raciocínio parte da comparação da figura dos especialistas em ciências jurídicas, previsto no Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março, com a figura dos assessores regulada na Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro, esquecendo que esta foi revogada pela Lei de Organização do Sistema Judiciários e não pelo regime que, na sua sequência, bem ou mal, depois desenvolveu os princípios nela plasmados.

      

     6. Uma vez que a competência para definir a composição e a nomeação dos membros dos gabinetes de apoio destinados a prestar assessoria aos magistrados que passou a ser exclusivamente atribuída ao Conselho Superior da Magistratura e à Procuradoria-Geral da República, respetivamente (artigo 35.º da Lei n.º 62/2008, de 26 de agosto e, depois, artigo 28.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março), não faz parte das atribuições do Ministro da Justiça nomear ou prorrogar a comissão de serviço dos assessores para os tribunais judiciais de primeira instância, ao abrigo do disposto no art. 8.º da Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro. Nesse segmento, a norma está revogada, não podendo ser convocada e aplicada.

V

Conclusões

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1.ª A figura jurídica do assessor foi introduzida no Supremo Tribunal de Justiça pelo artigo 36.º da Lei n.º 38/87, de 23 de dezembro (Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais) e, depois, reforçada e estendida aos Tribunais da Relação e aos Tribunais de primeira instância pela Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro;

2.ª A Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário), prevê que o Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais da Relação disponham de assessores nos termos definidos na lei (art. 34.º), isto é, atualmente, nos termos da referida Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro;

3.ª A mesma Lei prevê que nas comarcas de 1.ª instância funcionará um Gabinete de apoio ao presidente e aos magistrados judiciais e do Ministério Público, na dependência orgânica do Conselho Superior da Magistratura e da Procuradoria-Geral da República, respetivamente, e destinado a prestar assessoria e consultadoria técnica aos magistrados, nos termos a definir por Decreto-Lei (art. 35.º);

4.ª A composição, a direção, o regime jurídico e o estatuto remuneratório dos membros destes Gabinetes de apoio foram depois regulamentados pelo Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março (artigos 28.º, 29.º, 30.º e 31.º, respetivamente);

5.ª A revogação das normas jurídicas pode resultar de declaração expressa, da incompatibilidade entre as novas disposições e as regras precedentes ou da circunstância de a nova lei regular toda a matéria da lei anterior (art. 7.º, n.º 2, do Código Civil);

6.ª A Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, ao prever que o Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais da Relação dispõem de assessores nos termos definidos na lei (art. 34.º) e que nas comarcas de 1.ª instância funcionará um Gabinete de apoio ao presidente e aos magistrados judiciais e do Ministério Público, destinado a prestar assessoria e consultadoria técnica aos magistrados é, na parte que se refere aos assessores nos tribunais de 1.ª instância, incompatível com a Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro;

7.ª Os preceitos da Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro, que sejam incompatíveis com o artigo 35.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário, maxime aqueles que se referem aos assessores nos tribunais de 1.ª instância, ficaram assim tacitamente revogados; e

8.ª Funcionando os Gabinetes de Apoio nas comarcas na dependência do Conselho Superior da Magistratura e da Procuradoria-Geral da República, respetivamente, não faz parte das atribuições do Ministro da Justiça nomear ou prorrogar a comissão de serviço dos assessores para os tribunais judiciais de primeira instância (art. 1.º, n.º 2 e 8.º, n.º 3, da Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro).

ESTE PARECER FOI VOTADO NA SESSÃO DO CONSELHO CONSULTIVO DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA, DE 28 DE MARÇO DE 2019.

João Alberto de Figueiredo Monteiro – João Conde Correia dos Santos (Relator) – Maria da Conceição Silva Fernandes Santos Pires Esteves – Maria de Fátima da Graça Carvalho – Eduardo André Folque da Costa Ferreira – João Eduardo Cura Mariano Esteves – Maria Isabel Fernandes da Costa – Eucária Maria Martins Vieira.

 

[1] Ofício n.º 2262, de 27 de setembro de 2018, distribuído por despacho proferido em 4 de outubro de 2018.

[2] O artigo 75.º do Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de Abril, que estabeleceu uma nova orgânica para os tribunais administrativos e fiscais, dispunha sob a epígrafe, «secretarias e serviços de apoio», que «os tribunais administrativos e fiscais dispõem de secretarias e de serviços de apoio, nos termos a estabelecer em diploma complementar». Desenvolvendo este regime, o Decreto-Lei n.º 374/84, de 29 de novembro, veio criar esses serviços, de forma, como se diz no próprio preâmbulo, «a racionalizar e aliviar, nos aspetos possíveis, o trabalho dos juízes, de modo a permitir-lhes um melhor rendimento». O artigo 56.º, n.º 4, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro), na sua versão inicial, dispunha, igualmente, que «os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal dispõem de assessores que coadjuvam os magistrados judiciais». O Decreto-Lei n.º 166/2009, de 31 de julho, aditou ao referido Estatuto o artigo 56.º-A, que regula o gabinete de apoio aos magistrados da jurisdição administrativa e fiscal e remete para portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, da Administração Pública e da justiça, a efetiva criação do gabinete de apoio em cada tribunal da jurisdição administrativa e fiscal e a fixação do respetivo número de especialistas com formação científica e experiência profissional adequada.

[3]A Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei Orgânica do Tribunal Constitucional) previa, no artigo 45.º, a existência de uma secretaria e serviços de apoio, cuja organização, composição e funcionamento seriam regulados por Decreto-Lei. Desenvolvendo este regime legal, o Decreto-Lei n.º 149-A/83, de 5 de abril criou um núcleo de apoio técnico jurídico (então considerado inovador), competindo-lhe nomeadamente dar parecer sobre os problemas que na área da sua especialidade lhe fossem colocadas pelos juízes do Tribunal (art. 12.º, n.º 2). Em 1999, desenvolvendo este regime embrionário, o Decreto-Lei n.º 545/99, de 14 de dezembro, atribuiu ao núcleo de apoio documental e informação jurídica a realização de pesquisas ou estudos de natureza jurídica de harmonia com o que fosse determinado pelo Presidente do Tribunal [art. 14.º, alª h)] e previa a existência de gabinetes (do presidente, do vice presidente, dos juízes e do Ministério Público), com assessores licenciados em direito. O Decreto-Lei n.º 197/2015, de 16 de setembro, veio introduzir pequenas alterações a este regime legal. Para o efeito, começa por referir no preâmbulo (apesar do que já existia) que: «a criação de um corpo de assessores jurídicos, à semelhança do que sucede em Tribunais Constitucionais de outros países, era há muito justificada. Assim o presente decreto-lei prevê a possibilidade de recrutamento de académicos e juristas de mérito, em comissão de serviço, para assessorar o Tribunal na área de estudos e investigação jurídica. O enquadramento destes assessores no Núcleo de Apoio Documental e Informação Jurídica permite dotar este núcleo dos recursos humanos necessários ao pleno cumprimento da sua competência para realizar pesquisas ou estudos de natureza jurídica, de harmonia com o que for determinado pelo Presidente do Tribunal». Depois, executando esses propósitos, esclarece que a fim de realizar pesquisas ou estudos de natureza jurídica, de harmonia com o que for determinado pelo Presidente do Tribunal, o núcleo de apoio documental e informação jurídica pode integrar até três assessores que sejam doutores ou mestres em direito ou personalidades de reconhecido mérito e experiência na área da investigação jurídica (art. 15.º A, n.º 1).

[4] Era a seguinte a formulação legal:

«Artigo 36.º

Assessores

As secções dispõem de assessores, que coadjuvarão os juízes na recolha de elementos necessários ao exame e decisão dos processos».

[5] Cujo artigo 3.º dizia:

«Artigo 3.º

(Assessores do Supremo Tribunal de Justiça)

1. O Supremo Tribunal de Justiça dispõe de assessores que coadjuvam o Presidente e os juízes na recolha de elementos necessários ao exame e decisão dos processos.

2. Os assessores são nomeados pelo Conselho Superior da Magistratura, sob proposta do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, em comissão de serviço de três anos, não renovável, de entre magistrados judiciais de 1.ª instância com classificação não inferior a Bom com distinção e antiguidade não superior a 15 anos.

3. O número de assessores é fixado por portaria do Ministro da Justiça sob proposta do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça».

[6] Exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 109/VII, Diário da Assembleia da República, II Série A, n.º 47, de 31 de maio de 1997, p. 946.

[7] Diário da Assembleia da República I série, n.º 6, de 23 de outubro de 1997, p. 50.

[8] Diário da Assembleia da República I série, n.º 6, de 23 de outubro de 1997, p. 49.

[9] Diário da Assembleia da República I série, n.º 6, de 23 de outubro de 1997, p. 49.

[10] Artigo 36.º da Lei n.º 38/87, de 23 de dezembro.

[11] Diário da Assembleia da República I série, n.º 6, de 23 de outubro de 1997, p. 49.

[12] Exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 109/VII, Diário da Assembleia da República, II Série A, n.º 47, de 31 de maio de 1997, p. 946.

[13] Cuja redação completa é a seguinte:

«Artigo 13.º

Gabinete de Apoio dos Juízes Conselheiros e dos Magistrados do Ministério Público

         1 - O Gabinete de Apoio dos Juízes Conselheiros e dos Magistrados do Ministério Público compõe-se de assessores e secretários, em número a fixar na portaria a que se refere o n.º 3 do artigo 16.º do presente diploma.

2 - Os membros dos gabinetes de apoio dos juízes conselheiros e dos magistrados do Ministério Público são livremente nomeados e exonerados pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, após prévia audição dos juízes conselheiros da respetiva secção e do procurador-geral-adjunto, coordenador do Ministério Público no Supremo Tribunal de Justiça, conforme o caso, sem prejuízo do disposto no n.º 4.

         3 - Os membros dos gabinetes referidos no número anterior consideram-se, para todos os efeitos, em exercício de funções a partir da data do despacho que os tiver nomeado, com dispensa de fiscalização prévia do Tribunal de Contas e independentemente de publicação no Diário da República.

         4 - Quando os assessores sejam magistrados judiciais ou do Ministério Público, aplica-se-lhes o disposto na Lei n.º 2/98, de 8 de Janeiro, que estende aos magistrados do Ministério Público junto do Supremo Tribunal de Justiça a coadjuvação por assessores e institui a assessoria a ambas as magistraturas nos tribunais da Relação e em certos tribunais de 1.ª instância.

         5 - Os assessores dos gabinetes de apoio dos juízes conselheiros e dos magistrados do Ministério Público, que não sejam magistrados, são obrigatoriamente mestres ou licenciados em Direito de reconhecida competência, competindo-lhes coadjuvar os respetivos juízes e magistrados do Ministério Público no exercício das suas funções, desempenhando as tarefas que lhes sejam determinadas.

         6 - Os assessores dos gabinetes referidos no número anterior que exerçam funções docentes ou de investigação científica no ensino superior podem continuar no exercício dessas funções, sem prejuízo de, quando as mesmas forem exercidas em estabelecimento de ensino público, poderem requerer a suspensão dos prazos dos respetivos contratos ou dos prazos para apresentação de relatórios ou prestação de provas a que estejam adstritos, salvo quando optarem, nos termos e com os limites estabelecidos na lei, pela acumulação de remunerações.

         7 - Os assessores referidos no n.º 5 são nomeados em comissão de serviço e têm as garantias, deveres e remuneração aplicáveis aos adjuntos do Gabinete do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, com exceção do abono referido no artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 262/88, de 23 de Julho.

8 - Quando os providos sejam funcionários ou agentes da administração central, regional ou local ou de institutos públicos, exercerão os seus cargos em comissão de serviço ou em regime de requisição, conforme os casos, com a faculdade de optar pelas remunerações correspondentes aos cargos de origem.

         9 - Quando os providos sejam trabalhadores de empresas públicas ou privadas, exercerão as suas funções em regime de requisição, nos termos da lei geral em vigor para o respetivo setor.

         10 - Os provimentos referidos no presente artigo não conferem, só por si, vínculo à função pública.

11 - O desempenho de funções nos gabinetes de apoio é incompatível com o exercício da advocacia.

               12 - O administrador afetará ao Gabinete o pessoal administrativo de apoio considerado necessário ao seu funcionamento».

[14] Cuja redação era a seguinte:

«Artigo 14.º

Assessores e gabinetes de apoio

1 - O Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais da Relação dispõem de assessores que coadjuvam os magistrados judiciais e os magistrados do Ministério Público, nos termos definidos na lei.

2 - Nos tribunais de comarca existem gabinetes de apoio aos magistrados, nos termos do disposto nos artigos 83.º e 84.º».

[15] A redação do artigo era a seguinte:

«Artigo 83.º

Gabinete de apoio aos magistrados judiciais

         1 - É criado, na dependência orgânica do Conselho Superior da Magistratura, um gabinete de apoio aos magistrados judiciais.

         2 - Cada comarca é dotada de um gabinete de apoio, tendo por coordenador o presidente do respetivo tribunal de comarca.

         3 - O gabinete de apoio destina-se a assegurar assessoria e consultadoria técnica aos magistrados de cada comarca e ao presidente do tribunal, nos termos a definir por decreto-lei.

         4 - Cada gabinete de apoio é constituído por especialistas com formação científica e experiência profissional adequada, em número a fixar por portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, da Administração Pública e da justiça.

         5 - O recrutamento do pessoal a que se refere o número anterior é efetuado pelo Conselho Superior da Magistratura, através de comissão de serviço.

         6 - Os níveis remuneratórios do pessoal previsto no presente artigo são fixados por decreto regulamentar, sendo os respetivos encargos suportados pelo Conselho Superior da Magistratura».

[16] A redação do artigo era a seguinte:

«Artigo 84.º

Gabinete de apoio aos magistrados do Ministério Público

         1 - É criado, na dependência orgânica da Procuradoria-Geral da República, um gabinete de apoio aos magistrados do Ministério Público.

         2 - O gabinete de apoio destina-se a assegurar assessoria e consultadoria técnica aos magistrados do Ministério Público, nos termos a definir por decreto-lei.

         3 - Os serviços do gabinete de apoio em cada comarca são dirigidos pelo respetivo magistrado do Ministério Público coordenador.

         4 - Cada gabinete de apoio é constituído por especialistas com formação técnico-científica e experiência profissional adequada, em número a fixar por portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, da Administração Pública e da justiça.

         5 - O recrutamento do pessoal a que se refere o número anterior é efetuado pela Procuradoria-Geral da República, através de comissão de serviço.

6 - Os níveis remuneratórios do pessoal previsto no presente artigo são fixados por decreto regulamentar, sendo os respetivos encargos suportados pela Procuradoria-Geral da República».

[17] É a seguinte a redação do referido artigo:

«Artigo 35.º

Gabinete de apoio ao presidente da comarca e aos magistrados judiciais e do Ministério Público

         Cada comarca, ou conjunto de comarcas, pode ser dotada de gabinetes de apoio destinados a prestar assessoria e consultadoria técnica aos presidentes dos tribunais e aos magistrados judiciais e do Ministério Público, na dependência orgânica do Conselho Superior da Magistratura e da Procuradoria-Geral da República, respetivamente, nos termos a definir por decreto-lei».

[18] Como se diz no preâmbulo: «Mostra-se, também assim, prevista a existência de gabinetes de apoio aos magistrados judiciais e magistrados do Ministério Público, compostos por especialistas com formação académica em diversas áreas para que aqueles possam dedicar-se exclusivamente à sua tarefa essencial»

[19] É a seguinte a redação completa do referido artigo:

«Artigo 28.º

Composição

         1 - Os gabinetes de apoio aos magistrados judiciais e magistrados do Ministério Público são compostos por especialistas com formação académica de nível não inferior a licenciatura e experiência profissional adequada nas seguintes áreas:

      a) Ciências jurídicas;

      b) Economia;

      c) Gestão;

      d) Contabilidade e finanças;

         e) Outras consideradas relevantes por deliberação do Conselho Superior da Magistratura e da Procuradoria-Geral da República.

         2 - A composição de cada gabinete, no âmbito da comarca, é definida pelo Conselho Superior da Magistratura e pela Procuradoria-Geral da República, ouvidos o presidente do tribunal e o magistrado do Ministério Público coordenador, respetivamente.

         3 - Os membros dos gabinetes de apoio são recrutados por procedimento concursal nos termos da legislação aplicável aos cargos de direção intermédia da Administração Pública, com as especificidades previstas no presente artigo.

         4 - É da competência do Conselho Superior da Magistratura e da Procuradoria-Geral da República a abertura do procedimento concursal, a fixação do perfil exigido e dos critérios de admissão, bem como a seleção e classificação dos especialistas que integram os respetivos gabinetes de apoio».

[20]  É a seguinte a redação do artigo:

«Artigo 30.º

Regime jurídico

         1 - Os especialistas dos gabinetes de apoio aos magistrados judiciais são designados pelo Conselho Superior da Magistratura e exercem as suas funções em regime de comissão de serviço, nos termos do disposto na Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, com as especialidades constantes do presente decreto-lei.

         2 - Os especialistas dos gabinetes de apoio aos magistrados do Ministério Público são designados pela Procuradoria-Geral da República e exercem as suas funções em regime de comissão de serviço, nos termos do disposto na Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, com as especialidades constantes do presente decreto-lei.

         3 - Os especialistas dos gabinetes estão sujeitos ao respeito pelo segredo de justiça e pelo dever de reserva, quanto a todos os factos de que tomem conhecimento pelo exercício das suas funções, nos mesmos termos dos magistrados judiciais e dos magistrados do Ministério Público.

         4 - Os especialistas referidos nos números anteriores gozam férias, preferencialmente, no período das férias judiciais.

         5 - A cessação das comissões de serviço referidas nos n.os 1 e 2 não confere o direito a qualquer indemnização».

[21] 

«Artigo 31.º

Estatuto remuneratório

Os especialistas dos gabinetes de apoio auferem a remuneração correspondente a um nível remuneratório da quarta posição remuneratória da carreira geral de técnico superior, sendo o seu encargo suportado pelo Conselho Superior da Magistratura e pela Procuradoria-Geral da República».

[22] Fernando José Bronze, Lições de Introdução do Direito, Coimbra Editora, Coimbra (2010), p. 729.

[23] Luiz da Cunha Gonçalves, Tratado de Direito Civil em Comentário ao Código Civil Português, Coimbra Editora, Coimbra (1929), Volume 1.º, p. 155.

[24] Imprensa da Universidade de Coimbra, Coimbra (1886), tomo I, p. 4.

[25] Imprensa da Universidade de Coimbra, Coimbra (1907), volume 1.º, p. 20/1.

[26] Idem, p. 21.

[27] Os princípios fundamentais do direito civil, Coimbra Editora, Coimbra, 1922, p. 167.

[28] Os Princípios Fundamentais…, p. 166/7.

[29] Tratado de Direito Civil…, p. 156 e 157, respetivamente.

[30] Tratado de Direito Civil…, p. 158. No mesmo sentido, muito mais tarde, Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela, Noções Fundamentais de Direito Civil, Coimbra Editora, Coimbra (1965), I, p. 115.

[31] Introdução ao Direito, Almedina, Coimbra (2012), p. 177.

[32] Introdução…, p. 178; em geral sobre este problema, para além dos demais autores citados, cfr. ainda: Mário Reis Marques, Introdução ao Direito, Almedina, Coimbra (2007), I, p. 416/7; A. Santos Justo, Introdução ao Estudo do Direito, Coimbra Editora, Coimbra (2012), p. 203; João Batista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, Coimbra (2016), p. 165/6; António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, Almedina, Coimbra (2017), I, p. 827.

[33]Introdução ao Estudo do Direito, Coimbra Editora, Coimbra (1999), I, p. 109/10.

[34] O Direito: Introdução e Teoria Geral, Almedina, Coimbra (2005), p. 313.

[35] Proferido no processo n.º 082458.

[36] José Alberto González, Código Civil Anotado, Rei dos Livros, Lisboa (2011) volume 1, p. 26.

[37] Manuel Fontaine de Campos, In Luis Carvalho Fernandes/José Brandão Proença (organizadores), Comentário ao Código Civil: Parte Geral, Universidade Católica Editora (2014), p. 40.

[38] Ludwig Enneccerus, Derecho Civil (parte general), tradução da 38.ª Edição Alemã (revista por Hans Carl Nipperdey), Bosch, Barcelona (1953), p. 226.

[39] Anotação, RLJ, 99 (1966-7), p. 334; no mesmo sentido, Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela, Noções …, p. 116 e Manuel Fontaine de Campos, Comentário …, p. 40.

[40] Diário da Assembleia da República II série A, número 41, de 30 de novembro de 2012, p. 39.

[41] Idem.

[42] Idem. Nesta medida, a deputada Teresa Leal Coelho classificou a proposta «uma revolução do sistema judiciário para melhor servir as pessoas»; na mesma linha, Teresa Anjinho afirmou que «se até agora era possível circunscrever a evolução da organização judiciária em Portugal em três períodos (…) perante esta iniciativa, diria que podemos afirmar que estamos hoje a iniciar um quarto período da nossa história da organização judiciária» (Diário da Assembleia da República I série, número 33, de 21 de dezembro de 2012, p. 13 e 21 respetivamente). Já noutro quadrante político, o deputado Luís Pato Ameixa falava, ao invés, de megalomania da proposta que «mais uma vez pretende dar conta de uma grande reforma, mas que não tem qualquer alteração de fundo em relação ao quadro jurídico atualmente existente, a não ser a alteração do modelo territorial existente e o encerramento de tribunais, principalmente no interior do país» (Idem, p. 17).

[43] Diário da Assembleia da República II série A, número 41, de 30 de novembro de 2012, p. 39.

[44] Idem.

[45] No artigo 2.º da Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro), cuja redação é, recordamos, a seguinte:

      «1 - Compete, designadamente, aos assessores:

      a) Proferir despachos de mero expediente;

      b) Preparar a agenda dos serviços a efetuar;

      c) Elaborar projetos de peças processuais;

                        d) Proceder à pesquisa da legislação, jurisprudência e doutrina necessárias à preparação das decisões e das promoções nos processos;

                        e) Sumariar as decisões e as promoções, a legislação, a jurisprudência e a doutrina de maior interesse científico e integrá-las em ficheiros ou em base de dados;

      f) Colaborar na organização e atualização da biblioteca do tribunal.

                        2 - Dependem de delegação do respetivo magistrado os atos a que se referem as alíneas a) a c) do número anterior, devendo a delegação ser específica no que respeita aos da alínea c)».

[46] Para estas razões, supra II, 1.

[47] V.g. nos artigos 50.º, 426.º, 480.º, n.º 3, 492.º, n.º 2, 494.º, n.º 1, 540.º, 543.º, n.º 1, alª a), 601.º ou 604.º, n.º 7, do Código de Processo Civil ou nos artigos 155.º, 156.º, n.º 1, 157.º, n.º 1, 271.º, n.º 7, 283.º, n.º 3, alª e), 294.º, 297.º, n.º 4, 315.º, n.º 3, 316.º, n.º 3, 317.º, n.º 1, 318.º, n.º 1, 319.º, n.º 1, 331.º, n.ºs 1 e 2, 350.º, n.ºs 1 e 2 e 362.º, n.º 1, alª d), do Código de Processo Penal.

[48] Por isso mesmo, são, nos termos do artigo 4.º da Lei n.º 2/98, de 8 de janeiro, «nomeados, respetivamente, pelo Conselho Superior da Magistratura e pelo Conselho Superior do Ministério Público, em comissão de serviço, por três anos, não renovável, de entre juízes de 1.ª instância e procuradores ou delegados do procurador da República com classificação não inferior a Bom com distinção e antiguidade não inferior a 5 e não superior a 15 anos».

[49] Supra II.1.

[50] Supra notas 2 e 3.

Anotações
Legislação: 
L 2/98 DE 1998/01/02; L 62/2013 DE 2013/08/26 ART35; DL 49/2014 DE 2014/05/27 ART28 L 74/2002 DE 2002/03/26; DL 129/1984 DE 1984/04/27; L 13/2002 DE 2002/02/19; DL 166/2009 DE 2009/07/31; L 29/82 DE 1982/11/15; DL 197/2015 DE 201509/16; CPC ART50 ART604; CPP ART155 ART326; CC66 ART7
 
Referências Complementares: 
DIR ADM / DIR CIV / TEORIA GERAL
 
Divulgação
Número: 
96
Data: 
20-05-2019
Página: 
15593
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