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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
6/1994, de 10.11.1994
Data do Parecer: 
10-11-1994
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Maioria
Iniciativa: 
PGR
Entidade: 
Procurador(a)-Geral da República
Relator: 
SOUTO DE MOURA
Descritores e Conclusões
Descritores: 
ESTRANGEIROS
APÁTRIDA
REFUGIADO
ASILO POLÍTICO
EXPULSÃO DE ESTRANGEIROS
TÍTULO DE RESIDÊNCIA
DIREITO DE ASILO
PROCESSO DE ASILO
PEDIDO DE ASILO
RESIDENTE
RESIDÊNCIA
RESIDÊNCIA HABITUAL
PRINCÍPIO DA RECIPROCIDADE
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
CIDADANIA PORTUGUESA
CIDADÃO NACIONAL
ACESSO AO DIREITO
ACESSO AOS TRIBUNAIS
PROTECÇÃO JURÍDICA
PATRIMÓNIO JUDICIÁRIO
APOIO JUDICIÁRIO
CONSULTA JURÍDICA
NOMEAÇÃO DE PATRONO
DIREITO DE PETIÇÃO
APOIO SOCIAL
REQUERIMENTO
INDEFERIMENTO
RECURSO CONTENCIOSO
DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS
* CONT REF/COMP
Conclusões: 
1. Das disposições conjugadas dos nºs 2 e 3 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, e artigo 1º do Decreto-Lei nº 391/88, de 26 de Outubro, resulta que os estrangeiros e apátridas só beneficiarão de protecção jurídica, nos seguintes casos se forem considerados residentes habituais nos termos da lei, se no caso de serem não residentes existir uma reciprocidade de tratamento pelo país de que são nacionais, se beneficiarem de estatuto de refugiado, ou lhes for deferido o pedido de asilo;
2. Segundo aquelas normas não beneficiam de protecção jurídica os estrangeiros ou apátridas que não se encontrem em qualquer daquelas situa-ções, como é o caso dos requerentes de asilo que permaneçam regularmente em Portugal, aguardando o deferimento daquele pedido, sem poderem ser considerados residentes habituais;
3. O artigo 15º da C.R.P. estabelece uma regra de equiparação entre portugueses e estrangeiros quanto ao exercício de direitos e cumprimentos de deveres, revelando-se o acesso ao direito como garantia fundamental consagrada no artigo 20º da C.R.P. de que devem beneficiar todos os indivíduos, e não abrangida pelas excepções previstas no nº 2 daquele artigo 15º;
4. O nº 2 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87 e o nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 391/88 violam o disposto nos artigos 15º e 20º da Constituição da República Portuguesa, na parte em que recusam protecção jurídica a estrangeiros ou apátridas que permaneçam de forma continuada e regularmente em Portugal, aguardando a decisão definitiva do pedido de asilo que formularam;
5. Por força das disposições combinadas do nº 3 do artigo 10º do Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho, e nº 1 do artigo 139º, do Código de Processo Civil, não têm que ser traduzidas na língua do destinatário as notificações a fazer, no âmbito do processo administrativo, aos candidatos à condição de refugiado.
Texto Integral
Texto Integral: 
SENHOR CONSELHEIRO PROCURADOR-GERAL
DA REPÚBLICA,
EXCELÊNCIA:

I

O Conselho Português para os Refugiados, a Delegação Portuguesa da Amnistia Internacional, a Obra Católica Portuguesa para as Migrações, e o S.O.S. Racismo, levaram ao conhecimento de Vossa Excelência uma situação criada, segundo aquelas entidades, pela posição assumida por parte dos Magistrados do Ministério Público junto do Supremo Tribunal Administrativo, por se manifestarem contra a satisfação do pedido de apoio judiciário e nomeação de patrono, formulado por candidatos ao estatuto de refugiado, os quais tinham visto recusado o seu pedido de asilo, e pretendiam interpor recurso do despacho de Suas Excelências os Ministros da Administração Interna e da Justiça. Mais pretendiam aquelas organizações que Vossa Excelência interviesse, para que, se assim se entendesse, fossem enviadas instruções aos Agentes do Ministério Público em questão, para alterarem as respectivas posições.
Prestada a informação pertinente por parte dum senhor Procurador-Geral Adjunto, junto da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, Vossa Excelência ordenou a submissão ao Conselho Consultivo, das questões formuladas.
Cumpre pois emitir parecer.

II

Interessará então, antes do mais, fazer uma referência ainda que resumida ao teor, quer da exposição, quer da informação atrás referidas.
1. No que toca à exposição inicialmente formulada (1), começa aí por se atribuir ao Ministério Público (Mº. Pº.) junto do Supremo Tribunal Administrativo (S.T.A.) a fundamentação da posição de recusa que assumiu, em dois tipos de argumentos:
Por um lado, a disciplina do artigo 1º, nº 1, do Decreto-Lei nº 391/88, de 26 de Outubro, considera que a «residência habitual: de estrangeiros ou apátridas a que se refere o nº 2 do artigo 7º, do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, implica a sua permanência regular e continuada em Portugal, por período de não menos dum ano, sem prejuízo doutro regime resultar de tratado ou convenção internacional;
E por outro, o disposto no artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, consagra um princípio de reciprocidade, por força do qual, a não concessão de apoio judiciário resultaria, de que «tal assistência jurídica não seria concedida a um português que necessitasse da mesma, caso se encontrasse no País de origem do candidato:.
Depois de se manifestarem dúvidas sobre a conformidade da posição assumida, com a Constituição da República Portuguesa (C.R.P.), e com o direito internacional convencional que vincula o Estado Português, são tecidos naquela exposição, quatro comentários básicos.
A saber:
1º.«Os candidatos são notificados para se pronunciarem sobre as questões suscitadas em parecer emitido pelos Exmºs Magistrados do Ministério Público:. Mas, porque quase todos são oriundos do Zaire e não compreendem a língua portuguesa, deveria ser-lhes facultado um texto traduzido, à luz do disposto no artigo 6º, nº 3, al. a) da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
2º.Em tudo semelhantes aos recursos ora interpostos para o S.T.A., nos últimos treze anos muitos outros houve, também da autoria de indivíduos oriundos de Países de África, sem que o princípio da reciprocidade alguma vez tivesse sido invocado.
De qualquer modo, a negação do direito ao apoio judiciário e nomeação de patrono não se deveria fundar na mera presunção da falta de reciprocidade.
3º.Não será correcto invocar o já referido artigo 1º, nº 1 do Decreto-Lei nº 391/88, de 26 de Outubro, que contém uma definição de conceito de «residência habitual:. Na verdade, a cerca de 95% dos candidatos ao estatuto de refugiado, durante o 2º semestre de 1992, e em 1993, não foi conce-dida Autorização de Residência Provisória, mas «possuíam, nessa altura, uma Declaração emitida pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (S.E.F.), que confirmava a sua candidatura ao Asilo e que impedia a sua expulsão do País, o que significa, que se encontravam numa situação de perfeita re-gularidade e legalidade:. Ademais,
«todos eles se encon-tram no País há mais dum ano, facto que permite enquadrar a sua situação na letra e no espírito do artigo acima referido:.
4º.A falta da concessão de Autorização de Residência não poderá ser invocada para se negar a protecção jurídica solicitada, por a tanto se oporem:
O artigo 20º, nºs 1 e 2, e o artigo 268º, nº 4 da C.R.P.;
O artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem;
O artigo 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem;
O artigo 14º do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos.
2. Por via da informação fornecida pelo Exmº Procurador- Geral Adjunto junto da 1ª Secção do S.T.A. (2), verifica-se que, na ver-dade, inúmeros cidadãos zairenses irregularmente entrados no País pediram a nomeação prévia de patrono, para impugnarem contenciosamente a decisão que lhes indeferiu o pedido de asilo, formulado à data nos termos da Lei nº 38/80, de 1 de Agosto.
Que três dos Magistrados em exercício naquela 1ª Secção entenderam dever opor-se ao pedido, invocando como razões, fundamentalmente o seguinte:
A presença dos requerentes no País é legal e regular, desde a apresentação do pedido de asilo, dispondo duma autorização de residência provisória, emitida de acordo com o nº 1 do artigo 16º da Lei nº 38/80, de 1 de Agosto de 1980;
No entanto, os requerentes não dispõem de «residência habitual: em Portugal, nos termos do artigo 7º, nº 2 do De-creto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, e artigo 1º, nº 1 do Decreto-Lei nº 391/88, de 26 de Outubro, por aquele conceito pressupor «uma permanência regular e continuada, estabilizada no plano social e profissional, pelo período mínimo dum ano:;
Acresce que a redacção do nº 2 do artigo 1º daquele Decreto-Lei nº 391/88 revela tratar-se, por um lado de norma especial, que faculta a protecção jurídica a quem já disponha de estatuto de refugiado, pese embora permanecer no País há menos dum ano, e por outro, de uma norma que não quis abranger, ao lado dos beneficiários do estatuto de refugiado, os simples candidatos a tal estatuto.
Falham portanto in casu os pressupostos do direito a apoio judiciário, que se reclamem quer do nº 1, quer do nº 2, do artigo 1º do Decreto-Lei citado.
Quanto à posição que o S.T.A. vem assumindo, somos informa-dos de que «nuns casos, os pedidos têm sido indeferidos, por despacho do relator, na linha da argumentação aduzida pelo Mº.Pº.. Noutros casos têm sido deferidos, também por despacho, com base na presunção de insuficiência económica, sem qualquer abordagem interpretativa dos dispositivos legais citados:.
Segundo a informação a que nos vimos referindo, a juris-prudência que tem concedido apoio judiciário, depois de se debruçar sobre a questão levantada pelos Magistrados do Mº. Pº. naquele S.T.A., segue três linhas de fundamentação diferentes. Em síntese:
Ou se recusa a aplicação das normas do artigo 7º, nº 2 do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro e artigo 1º, nº 1, do Decreto-Lei nº 391/88 citado, considerando-se que a exigência do pressuposto da «residência habitual: está contra o disposto nos artigos 15º e 20º da C.R.P., violando-se naqueles normativos o princípio constitucional da equiparação de nacionais a estrangeiros e apátridas (3);
Ou se considera «que o caso dos estrangeiros em situação indefinida pendente de decisão administrativa, como é o caso dos requerentes do asilo, não se encontra expressamente contemplado na lei: surgindo pois uma lacuna que deve ser suprida por analogia com o disposto no nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 391/88 (4);
Ou, ainda, se entende que «a autorização de residência provisória, emitida nos termos do nº 1 do artigo 16º, da Lei nº 38/80, confere ao titular a qualidade de residência habitual no País, para efeitos de concessão de apoio judiciário, uma vez que, em face das disposições conjugadas dos artigos 4º, nº 2 e 8º, nº 1 da mesma Lei, passam a gozar dos direitos e dos deveres inerentes ao estrangeiro residente em Portugal (5):.
Por último, a posição pessoalmente defendida pelo subscritor da informação em análise vai no sentido de se deverem rejeitar as teses da existência duma lacuna, ou da equiparação da situação dos requerentes
à dos estrangeiros habitualmente residentes no País. E já que o efeito suspensivo do recurso contencioso previsto no artigo 19º, nº 4 da Lei nº 38/80, em nada viria alterar os dados do problema, «no quadro legal vigente, a posição favorável à pretensão dos requerentes, nos processos de nomeação prévia de patrono, só é sustentável, se se defender a inconstitucionalidade das normas dos artigos 7º, nº 2, do Decreto-Lei nº 387-B/87 e 1º, nºs 1 e 2, do Decreto-Lei nº 391/88, na linha de orientação jurisprudencial traçada pelo Acórdão de 18 de Dezembro de 1993 (6):.
Esta a conclusão, a que chega, pois, aquele Magistrado do Mº. Pº. na informação a que vimos fazendo referência.

III

Isto dito, podemos então delimitar a questão fulcral, posta pelo Conselho Português para os Refugiados e demais organizações referidas, do seguinte modo:
Formulado um pedido de asilo por parte dum estrangeiro ou dum apátrida, poderá o interessado beneficiar de protecção jurídica, concretamente na modalidade de apoio judiciário enquanto aguarda a decisão definitiva do seu pedido? (7)
Face à resposta que vier a ser dada, ver-se-á em que medida é que o facto de se alegar uma presença em Portugal há mais dum ano, à data do pedido de apoio judiciário, poderá influir na posição assumida.
Depois, curar-se-á de abordar a invocada necessidade de traduzir a notificação que é feita aos candidatos, para que se pronunciem sobre a posição assumida pelo Mº. Pº., e bem assim se, a existência ou inexistência da reciprocidade do nº 3 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387- B/87, de 29 de Dezembro, pode ser simplesmente presumi-da, para efeito de concessão ou negação de apoio judiciário.
A fim de se tratar a questão nuclear posta, passar-se-á em revista o essencial da disciplina referente ao apoio judiciário (IV), à condição de estrangeiro (V) e ao pedido de asilo e condição de refugiado (VI), que se mostre pertinente. Ver-se-á em seguida qual o apoio judiciário de que goza o candidato a refugiado (VII). Para por fim se atender à necessidade de tradução e regra de reciprocidade antes mencionadas (VIII).

IV

1. A protecção jurídica do cidadão na dupla modalidade de «con-sulta jurídica: e «apoio judiciário: (8) tem antecedentes remotos que poderiam fazer-se ascender à democracia ateniense, e encontrou expressão variada na história europeia e do nosso País (9). Está-lhe subjacente uma preocupação igualitária, visando banir, ou pelo menos minorar, a situação de desvantagem em que se encontram todos quantos, cultural, social e sobretudo economicamente, são mais desfavorecidos, isto no tocante ao acesso á justiça e ao direito.
Retomando uma tradição já presente nas Ordenações, foi a Lei de 21 de Julho de 1899 que entre nós se debruçou de forma sistemática sobre «assistência judiciária:. O regime desta lei viria a transitar, com alterações, para o Estatuto Judiciário aprovado pelo Decreto nº 13809 de 22 de Junho de 1927, modi-ficado a 10 de Abril do ano seguinte pelo Decreto nº 15344. A partir daí a matéria foi sucessivamente tratada no Decreto-Lei nº 33548, de 23 de Fevereiro de 1944, na Lei nº 7/70 de 9 de Junho, que estabelecia as bases gerais da assistência judiciária, no Decreto nº 562/70, de 18 de Novembro que regulamentava tal assistência nos tribunais ordinários, e no Decreto-Lei nº 44/77, de 2 de Fevereiro, que se reportava à jurisdição do trabalho.
Hoje, o sistema de acesso ao direito e aos tribunais, tanto na modalidade de informação jurídica como de protecção jurídica, está basicamente estabelecido no Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, certo que, o Decreto-Lei nº 391/88, de 26 de Outubro veio, a seu turno, regulamentar o sistema de apoio judiciário e seu regime financeiro (10).
2. O ponto de partida da disciplina vigente do acesso ao direito e aos tribunais há-de encontrar-se no artigo 20º da C.R.P. que se transcreve:
«1.A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.
2.Todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consulta jurídica e ao patrocínio judiciário:.
Trata-se dum preceito que traduz o princípio constitucional do acesso ao direito e aos tribunais, princípio que, juntamente com o da universalidade consagrado no artigo 12º da C.R.P., e o da igualdade, previsto no artigo 13º também da C.R.P., integra o regime geral de todos os direitos fundamentais. Antes do mais, o princípio assume uma natureza garantística ou defensista, já que se apresenta como um instrumento de efectivação de todos os direitos. No entanto, como adverte GOMES CANOTILHO,
«a garantia do acesso aos tribunais pressupõe também dimen-sões prestacionais, na medida em que o Estado deve criar tribunais e processos adequados (direitos fundamentais dependentes da organização e procedimento) e assegurar prestações («apoio judiciário:, «patrocínio judiciário:, dispensa total ou parcial de pagamento de custas e preparos), tendentes a evitar a denegação da justiça por insuficiência de meios económicos (CRP, artigo 20º).
O acesso à justiça é um acesso materialmente informado pelo princípio da igualdade de oportunidades:(11).
A garantia constitucional do acesso ao direito, por outro lado, sintoniza-se perfeitamente com o disposto na Declaração Universal dos Direitos do Homem (Declaração U.D.H.), no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 16 de Dezembro de 1966 (Pacto D.C.P.), e na Convenção Europeia dos Direitos do Homem (Convenção EDH) (12).
3. O Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro abre com uma declaração relativa aos objectivos do sistema de acesso ao direito e aos tribunais, e pautada na promoção de que, «a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, de conhecer, fazer valer ou defender os seus direitos: (cfr. artigo
1º, nº 1). Para tanto, dispor-se-á por um lado da «Informação Jurídica:, proporcionada nomeadamente, por «acções tendentes a tornar conhecido o direito e o ordenamento legal, através de publicações e de outras formas de comunicação:, (cfr. artigo 4º), e, por outro lado, da «Protecção Jurídica:. Esta, como já se viu, reveste as modalidades da «Consulta Jurídica: e do «Apoio Judiciário:.
A «Consulta Jurídica: será assegurada pelo Ministério da Justiça em cooperação com a Ordem dos Advogados, através do funcionamento de gabinetes de consulta jurídica, que poderão facultar, em determinados moldes, a prestação de serviços por solicitadores, a realização de diligências extra-judiciais, ou comportar mecanismos informais de conciliação (cfr. artigos 6º, 11º e 13º).
Quanto ao «Apoio Judiciário:, tem ele o respectivo âmbito objectivo definido no artigo 15º do diploma, e compreende «a dispensa total ou parcial de preparos e do pagamento de custas, ou o seu diferimento, assim como do pagamento dos serviços do advogado ou solicitador:. Segundo o artigo 16º, o regime do apoio judiciário aplica-se em todos os tribunais, qualquer que seja a forma do processo, e pelo artigo 17º se vê que ele é independente da posição processual que o requerente ocupe na causa, podendo ser requerido em qualquer estado da mesma. Acresce que o artigo 39º faculta sempre «agravo, independen-temente do valor, com efeito suspensivo, quando o recurso for interposto pelo requerente:, das decisões proferidas sobre apoio judiciário. Estando em causa o S.T.A., haverá que ter em conta o disposto no artigo 41º, sempre do Decreto-Lei nº 387-B/87, segundo o qual, as competências que o diploma atribui ao juiz da causa, serão desempenhadas pelo relator, nos tribunais supe- riores. No S.T.A., da decisão do relator que aprecia o pedido de apoio judiciário poderá haver reclamação para a conferência da subsecção, e, da decisão desta, recurso para o plenário da secção (cfr. artigos 24º, alínea a) e 30º, alínea c) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais ETAF e artigo 9º, nº 2 da Lei de Processo dos Tribunais Administrativos LPTA.
Está em causa no presente parecer, primacialmente, a conces-são de apoio judiciário a estrangeiros, pelo que, assume especial relevo o âmbito subjectivo da protecção jurídica, e com ele do apoio judiciário.
Transcreve-se pois, na íntegra, a disposição pertinente do diploma a que vimos referindo:
Artigo 7º
«1.Têm direito a protecção jurídica nos termos da presente lei, as pessoas singulares que demonstrem não dispor de meios económicos bastantes para suportar os honorários dos profissionais forenses, devidos por efeito da prestação dos seus serviços, e para custear, total ou parcialmente, os encargos normais de uma causa judicial.
2.Os estrangeiros e os apátridas que residam habitualmente em Portugal gozam do direito à protecção jurídica.
3.Aos estrangeiros não residentes em Portugal é reconhecido o direito à protecção jurídica, na medida em que ele seja atribuído aos portugueses pelas leis dos respectivos Estados.
4.As pessoas colectivas e sociedades têm direito a apoio judi-ciário, quando façam a prova a que alude o nº 1 (13).
4. Já se viu que ao Decreto-Lei nº 391/88, de 26 de Outubro, coube a tarefa de regulamentar o sistema de apoio judiciário, resultante do Decreto-Lei nº 387- B/87, de 29 de Dezembro. Trata-se dum diploma dividido em três capítulos, sendo os dois últimos epigrafados de «Regime Financeiro: e «Disposições Gerais e Finais:. O capítulo primeiro reporta-se à «Protecção Jurídica:, e dele destacaremos só, pela sua importância para a economia do parecer, o artigo 1º, que se passa a transcrever:
Artigo 1º
1. Para efeito de protecção jurídica, a residência habitual de estrangeiros ou apátridas titulares de autorização de resi-dência válida, a que se refere o nº 2 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, implica a sua per-manência regular e continuada em Portugal, por período não inferior a um ano, salvo regime especial decorrente de trata-do ou convenção internacional que Portugal deva observar.
2. O estrangeiro a quem for concedido asilo ou que goze de estatuto de refugiado pode usufruir de protecção jurídica a partir da data da concessão do direito de asilo ou de reconhecimento do estatuto de refugiado.

V

1. A C.R.P., tal como ocorrera já com as Constituições de
1911 e 1933, limita-se a uma abordagem meramente formal da cida-dania, ao dizer, no seu artigo 4º, que
«são cidadãos portu-gueses todos aqueles que como tal sejam considerados pela lei ou por convenção internacional« (14) (15). O estabelecimento dos critérios através dos quais se detém, passa a deter, ou se perde a cidadania portuguesa, é pois remetido para o legislador ordinário, o qual se pautará sempre pela existência ou inexis-tência duma conexão relevante entre o indivíduo e Portugal. Relevam fundamentalmente os critérios clássicos da filiação, o jus sauguinis, bem como o do local do nascimento, o jus soli.
Presentemente, é a Lei nº 37/81, de 3 de Outubro que rege sobre a atribuição da cidadania portuguesa, e, dessa atribuição, resulta a possibilidade de se exercerem certos direitos funda-mentais, porque «pode entender-se, com efeito, que certos direitos ou funções se apresentam de tal sorte inerentes à participação na soberania ou no núcleo essencial da identidade do Estado, que só aquelas pessoas que à comunidade política pertençam pelo nascimento, ou por facto equiparado, devem ter a sua titularidade ou o seu exercício; ou que, pelo menos, é necessário decorrer um prazo de dilação antes de os cidadãos não originários os poderem alcançar«(16).
Os indivíduos a quem não é atribuída a cidadania portuguesa, mas estão sujeitos à nossa ordem jurídica, participam então da condição de estrangeiro (17), a qual há-de ser moldada a partir de duas linhas de força: a ideia de equiparação aos nacionais, e a da aceitação generalizada, pela comunidade internacional, de que lhe podem ser negados direitos de cariz político.
A condição de estrangeiro no direito interno português tem uma tradição que aponta para a equiparação aos cidadãos portugue-ses pelo menos a partir da Constituição de 1911, em cujo artigo 3º se estabelecia:
«A Constituição garante a portugueses e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade nos termos seguintes: (...):.
Após a sua última revisão, a Constituição de 1933 dispunha no seu artigo 7º, §2º que «os estrangeiros gozam em Portugal dos direitos e garantias reconhecidos pela Constituição aos portu-gueses, se a lei não determinar o contrário (...): (18). Por último,
é o seguinte, o texto do artigo 15º da C.R.P.:
«1.Os estrangeiros e os apátridas que se encontrem ou residam em Portugal gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadão português.
2.Exceptuam-se do disposto no número anterior os direitos políticos, o exercício das funções públicas que não tenham carácter predominantemente técnico e os direitos e deveres reservados pela Constituição e pela lei exclusivamente aos cidadãos portugueses.
3.Aos cidadãos dos países de língua portuguesa podem ser atribuídos, mediante convenção internacional e em condi-ções de reciprocidade, direitos não conferidos a estrangei-ros, salvo o acesso à titularidade dos órgãos de soberania e dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas, o serviço nas forças armadas e a carreira diplomática.
4.A lei pode atribuir a estrangeiros residentes no território nacional, em condições de reciprocidade, capacidade eleito-ral activa e passiva para a eleição dos titulares de órgãos de autarquias locais.
5.A lei pode ainda atribuir, em condições de reciprocidade, aos cidadãos dos Estados-membros da União Europeia resi-dentes em Portugal o direito de elegerem e serem eleitos Deputados ao Parlamento Europeu:.
O actual preceito constitucional sobre a condição de estrangeiro tem uma abertura verdadeiramente universalista e que se explica à luz do nº 2 do artigo
16º também da C.R.P.. Porque, nos termos deste normativo, «os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpre- tados e integrados de harmonia com a declaração Universal dos Direitos do Homem:. E assim, não só se estabeleceu uma regra de equiparação sendo a discriminação excepção, como se trata duma equiparação entre todos os indivíduos e não só entre «cidadãos:
(). Essa concessão de direitos sem acepção de cidadania resulta aliás também do artigo 14º da Convenção E.D.H. quanto aos direitos nela consagrados (20).
2. Ao nível da legislação ordinária, interessa ao estatuto jurídico do cidadão estrangeiro, para além dos princípios de equiparação e reciprocidade, consagrados no artigo 14º do Código Civil, para o gozo de direitos civis, toda a legislação relativa à entrada, per-manência, saída e expulsão de estrangeiros (21). O Decreto-Lei nº 264-B/81, de 3 de Setembro, veio reunir num só diploma a legislação sobre o sector, antes dispersa, dividindo-se em nove capítulos, epigrafados sucessivamente do seguinte modo: «En-trada e saída do território nacional:.
«Vistos:, «Documentos de viagem:, «Autorização de residência:, «Boletim de alojamento:, «Expulsão do território nacional:, «Taxas: e «Disposições fi-nais:.
À economia do parecer, interessa no diploma, sobretudo, a matéria referente à autorização de residência e à expulsão de estrangeiros. Assim, depois de no artigo 30º se considerar residente «o estrangeiro a quem tenha sido concedida auto-rização para residir em Portugal: e de no artigo 33º, nº 1 se dizer que «aos estrangeiros a quem for concedida autorização para residir será passada uma autorização de residência:, distinguem-se três tipos de autorização de residência, A, B, e C, com pressupostos diferentes e durações também diversas. Por um ano, por cinco, ou vitalícias, respectivamente, sendo as duas primeiras renováveis por períodos iguais.
À expulsão de estrangeiros se reporta em primeiro lugar o artigo 42º, cujo texto é o seguinte:
«1.Sem prejuízo das disposições constantes de tratado ou convenção internacional de que Portugal seja parte, serão expulsos do território nacional os cidadãos estrangeiros: a) Que entrem irregularmente no País; b) Que atentem contra a segurança nacional, a ordem pública ou os bons costumes; c) Cuja presença ou actividade no País constitua ameaça aos interesses ou à dignidade do Estado Português ou dos seus nacionais; d) Que interfiram por qualquer forma na vida política portuguesa sem para tanto estarem devidamente auto-rizados pelo Governo; e) Que não respeitem as leis portuguesas referentes a estrangeiros; f) Que tenham praticado actos que se fossem conhecidos pelas autoridades portuguesas teriam obstado à sua entrada no País.
2. O disposto no nº 1 deste artigo não prejudica a respon-sabilidade criminal em que o estrangeiro haja incorrido.
3. Aos refugiados aplicar-se-á sempre o regime mais benéfico que resulte da lei ou acordo internacional a que o Estado Português esteja obrigado:.
Depois do Decreto-Lei nº 264-B/81, de 3 de Setembro, a que nos vimos referindo, foi publicado o Decreto-Lei nº 59/93, de 3 de Março, que o revogou. Porém, em tudo o que não contrariasse o dito Decreto-Lei nº 59/93, manter-se-ia em vigor o Decreto-Lei nº 264-B/81, até publicação da legislação regulamentar ali prevista. A
15 de Dezembro de 1993 é publica-do o Decreto Regulamentar nº 43/93, com aquele propósito (22).
O Decreto-Lei nº 59/93 é hoje o diploma que disciplina a entrada, permanência, saída e expulsão de estrangeiros, e segue uma sistematização semelhante à do seu antecedente.
No que toca ao conceito de residente prevê o artigo
2º:
«Considera-se residente o estrangeiro que seja titular de auto-rização válida de residência em Portugal:.
O artigo 56º, nº 1 do diploma volta a afirmar que «aos estrangeiros a quem for concedida autorização para residir será passado um título de residência:. Por último, os tipos de título de residência ora previstos são exactamente os mesmos que o Decreto-Lei nº 264-
B/81 previa. Passaram a chamar-se, no en-tanto, títulos de residência «anual:, «temporário: e «vitalício:.
Aos fundamentos da expulsão se reporta agora o artigo
67º, que reproduz o artigo 42º do Decreto-Lei nº 264-
B/81 atrás transcrito, apenas com duas mudanças na redacção das alíneas a) e d) do nº 1 do preceito.
Quando antes se falava de cidadãos estrangeiros «que entrem irregularmente no País:, refere-se, agora, «que penetrem ou permaneçam irregularmente no terri-tório nacional:. Na alínea d), a expressão que passou a utilizar-se é: «que interfiram de forma abusiva no exercício de direitos de participação política reservados aos cidadãos nacionais:.
A propósito da detenção, e elaboração do processo de expulsão de estrangeiros, será de destacar o disposto no nº 5 do artigo 84º do Decreto-Lei nº 59/93, quando ressalva que,
«Não será organizado processo de expulsão contra o estrangeiro que, tendo entrado irregularmente no território nacional, se apresente às autoridades, solicitando a concessão de asilo político, dentro de quarenta e oito horas após a sua entrada:.
E, segundo o nº 6 do preceito,
«O estrangeiro nas condições referidas no número anterior aguardará em liberdade a decisão do seu pedido, devendo permanecer à disposição do serviço de Estrangeiros e Frontei-ras, que lhe indicará as obrigações a que fica sujeito: (23).
Refira-se, por último, que o direito de petição previsto no artigo 52º da C.R.P. e a que se reporta a
Lei nº 43/90, de 10 de Agosto, é atribuído aos estrangeiros nos termos do artigo 4º desta lei, com o texto seguinte:
«1.O direito de petição, enquanto instrumento de participação política democrática, é exclusivo dos cidadãos portugueses.
2.Os estrangeiros e os apátridas que residam em Portugal gozam do direito de petição para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.
3.O direito de petição é exercido individual ou colectivamente.
4.Gozam igualmente do direito de petição quaisquer pessoas colectivas legalmente constituídas:.
VI
1. Se bem que Portugal não possa considerar-se o destino dos principais movimentos de refugiados que têm tido lugar neste século, assumiu alguma importância enquanto país de acolhi-mento, sobretudo em duas ocasiões: durante e depois da Segunda Guerra Mundial, e na sequência da descolonização, que teve lugar depois de 25 de Abril de 1974 (24).
Num período que vai de 1983 a 1992 contam-se um total de 4300 pedidos de asilo formulados entre nós, sobretudo por parte de cidadãos africanos e sul- americanos (25). A fim de dar cobertura jurídica a tais pedidos dispôs-se sobretudo a partir dos anos oitenta, da pertinente legislação ordinária, certo que a C.R.P. e o direito pactício internacional a que Portugal se vincu-lou, já antes forneciam instrumentos jurídicos decisivos. Come-cemos exactamente pela abordagem breve da evolução do direito internacional relativo aos refugiados.
A noção de refugiado como emigrante de tipo muito particular reclama-se, segundo JEAN-YVES CARLIER, de três elementos principais:
«1.A fuga dum Estado ou dum local onde a pessoa tinha a sua residência permanente.
2.As causas desta fuga que são causas forçadas e não voluntárias, que se prendem com a relação entre o indivíduo e esse Estado ou esse local de residência permanente.
3.Tendo por consequência a ruptura das relações entre o indivíduo e esse Estado de origem, suprimindo-se a protec-ção que dele podia esperar:
(26).
A nota dominante é a da ruptura entre um indivíduo e um determinado Estado surgindo outro Estado como refúgio. Ou seja, acolhimento e protecção.
«A protecção internacional dos refugiados inscreve-se num quadro de promoção e de defesa dos direitos das pessoas que foram obrigadas a romper com o seu país de origem. Essas pessoas sabem que no seu país não podem esperar nem protecção da polícia nem justiça equitativa, nem reparação dos prejuízos sofridos, nem a perseguição de quem viola os seus direitos, nem auxílio algum dos seus serviços consulares quando se encontram no estrangeiro. Ora essas diversas formas de protecção social e jurídica, cujo conjunto constitui a «protecção nacional:, são exactamente as que um governo deve exercer em relação com os seus nacionais, tanto no interior do país como no estrangeiro. Para os refugiados, desprovidos de toda a protecção nacional, e que também não podem invocar as normas de direito internacional de que se reclamam as pessoas fora do seu país de origem, houve que definir normas inter- nacionais específicas (27).
Foi com as convulsões subsequentes à Primeira Guerra Mundial que se interiorizou a necessidade de não deixar a protecção dos refugiados à iniciativa dos governos dos vários países ou de organizações de assistência não governamentais. A protecção da comunidade internacional, enquanto tal, vai então surgir sob a égide da Sociedade das Nações (S. N.).
No período entre as duas guerras mundiais, a S. N. criou organizações e fez acordos pontuais, que se ocupavam de grupos considerados em risco. Face ao seu país de origem: russos, assírios, turcos, gregos, arménios, espanhóis, judeus alemães ou austríacos. A protec-ção tinha um carácter predominantemente colectivo e jurídico, visando o fornecimento de documentos de identificação ou títulos de viagem.
Depois da Segunda Guerra Mundial criou-se no seio da Organização das Nações Unidas (O.N.U.), a Organização Inter-nacional para os Refugiados, cujo mandato implicava a protecção, para além do mais, de cerca de
21 milhões de refugiados criados com a Segunda Guerra Mundial. Duraria até 1951, data em que é substituída pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados. Nesse ano surge também a chamada Convenção de Genebra relativa aos refugiados (28). Esta Convenção abrangia inicialmente apenas os indivíduos já anteriormente classificados de refugiados, ou que o viessem a ser em virtude de acontecimentos ocorridos antes de 1951. O Protocolo Adicional de 1967 generalizou a aplicação da Convenção sem limites temporais (29). Trata-se duma Conven-ção que desloca a noção de refugiado duma perspectiva de grupo específico para a de indivíduo, seja ele quem for.
Para além de «individualista:, a Convenção também ultrapassa, com a protecção que fornece, o âmbito meramente jurídico, fixando mesmo normas de tratamento do refugiado, relativas a empre-go e ao respectivo bem- estar. Tem pois uma tónica jurídico-so-cial.
Destacaremos, da Convenção, o artigo 16º relativo ao acesso aos tribunais. É o seguinte o texto do preceito:
«1.Todos os refugiados, nos territórios dos Estados Contratan-tes, terão livre e fácil acesso aos tribunais:
2.Os refugiados, no Estado Contratante onde têm a residência habitual, beneficiarão do mesmo tratamento que os nacio-nais no que diz respeito ao acesso aos tribunais, incluindo a assistência judiciária e a isenção da caução judicatum solvi.
3.Nos Estados Contratantes que não aqueles em que têm residência habitual, e no que diz respeito às questões men-cionadas no parágrafo 2º, os refugiados beneficiarão do mesmo tratamento que os nacionais do país no qual têm a residência habitual:.
No âmbito europeu (30) surgiriam posteriormente o «Acordo Europeu Relativo à supressão de Vistos para os Refugiados: (31) e o «Acordo Europeu sobre a Transferência de Respon-sabilidade Relativa a Refugiados: (32).
Finalmente, ao «asilo noutros países:, pressuposto da condição de refugiado, refere-se o artigo 14º da Declaração U.D.H., do seguinte modo:
«1.Toda a pessoa sujeita a perseguição tem o direito de procurar e de beneficiar de asilo em outros países.
2.Este direito não pode, porém, ser invocado no caso de processo realmente existente por crime de direito comum ou por actividades contrárias aos fins e aos princípios das Nações Unidas:.
2. O direito de asilo está consagrado na C.R.P. no artigo
33º do Capítulo I (Direitos, liberdades e garantias pessoais), do Título II (Direitos, Liberdades e garantias), da Parte I (Direitos e deveres fundamentais), juntamente com a matéria da extradição e da expulsão do território nacional, com ele intimamente conexas. É o seguinte o respectivo texto:
«1.Não são admitidas a extradição e a expulsão de cidadãos portugueses do território nacional.
2.Não é admitida a extradição por motivos políticos.
3.Não há extradição por crimes a que corresponda pena de morte segundo o direito do Estado requisitante.
4.A extradição só pode ser determinada por autoridade judicial.
5.A expulsão de quem tenha entrado ou permaneça regular-mente no território nacional, de quem tenha obtido autoriza-ção de residência ou de quem tenha apresentado pedido de asilo não recusado só pode ser determinada por autoridade judicial, assegurando a lei formas expeditas de decisão.
6.É garantido o direito de asilo aos estrangeiros e aos apá-tridas perseguidos ou gravemente ameaçados de perse-guição, em consequência da sua actividade em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana.
7.A lei define o estatuto do refugiado político:.
Enquadrado sistematicamente tal como se encontra, o «direito de asilo: é a nosso ver, antes do mais, o «direito subjectivo do perseguido a obter refúgio e asilo noutro Estado e a não ser remetido para o país de onde provém: (33). Assume no entanto, também, «uma dimensão internacional, enquanto direito dos Estados a acolher e a dar refúgio, a quem seja perseguido ou ameaçado de perseguição por outro Estado:.
Ou, ainda, «uma dimensão constitucional objectiva, enquanto meio de protecção dos valores constitucionais:, referidos no nº 6 do preceito (34). A saber, a defesa da democracia, da liberta-ção social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana.
A garantia constitucional do direito de asilo está pois confinada aos casos de perseguição ou ameaça grave de perseguição, e é necessário que na base de tal perseguição esteja uma luta por valores ou ideais, de cariz fundamentalmente político. Nada impede porém, obviamente, que por força da legislação ordinária o âmbito do direito de asilo se alargue a situações, que estejam para além do núcleo restrito da garantia constitucional.
3. Ao nível da legislação ordinária, o direito de asilo e o correspectivo estatuto de refugiado não eram tratados em nenhum diploma, mesmo após a consagração constitucional do direito de asilo,bem como da adesão de Portugal à Convenção de Genebra e respectivo Protocolo Adicional. A fim de ser colmatada tal omissão legislativa, foi elaborado o Despacho Normativo nº 9-S/80, de 9 de Janeiro, contendo «providências transitórias tendentes a acautelarem os interesses dos candida-tos ao asilo do refugiado, que se encontram em Portugal ou futuramente demandem o nosso País:.
Entretanto, a Lei nº 38/80, de 1 de Agosto, acabaria por regular a matéria do direito de asilo e do estatuto do refugiado. Fê-lo de forma mais generosa que a C.R.P., porque para além do pressuposto da perseguição ou da simples ameaça de perseguição «em consequência da (...) actividade em favor da democracia, da liberdade social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana, exercida, respectivamente, no Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual:, (35) além disso, poderá haver fundamento para a concessão do dito asilo em mais duas situações. A saber, para os «estrangeiros e os apátridas que, receando com razão ser perseguidos em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas ou integração em certo grupo social, não possam ou em virtude desse receio, não queiram voltar, respectivamente, ao Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual:
(36).
E ainda no tocante aos que invoquem, para não voltarem ao Estado da nacionalidade ou residência «motivos de insegurança devida a conflitos armados, ou da sistemática violação dos direitos humanos que ali se verifiquem (37).
Neste último caso, de asilo por razões humanitárias, o bene-ficiado fica em «situação análoga à de refugiado:, se lhe for concedido o asilo.
Nas outras situações mencionadas a concessão de asilo confere ao beneficiado o estatuto de refugiado (38).
Ao pedido de asilo se referem os artigos 15º e 16º da
Lei nº 38/80, importando para a economia do parecer transcrever apenas o último. É o seguinte o respectivo texto:
«1.A autorização de residência provisória cujo modelo será fixado por portaria do Ministro da Administração Interna, é valida pelo período de
120 dias, contados da data da apresentação do pedido, renovável por períodos de 30 dias, até decisão final do mesmo ou, no caso previsto no artigo 20º, até expirar o prazo ali estabelecido.
2.Os menores de 14 anos devem ser mencionados, por aver-bamento, na autorização de residência do requerente.
3.Enquanto estiver pendente o processo de pedido de asilo, ao requerente é aplicável o disposto no nº
2 do artigo 4º: (39).
2. De acordo com o dito nº 2 do artigo 4º,
«A concessão do direito de asilo nos termos do artigo
2º confere ao beneficiado situação análoga à de refugiado, sujei-tando-o ao preceituado nesta lei e na legislação sobre estran-geiros:.
Ora a situação jurídica do refugiado está contemplada no artigo 8º, da lei, do seguinte modo:
«1.O refugiado goza dos direitos e está sujeito aos deveres dos estrangeiros residentes em Portugal, na medida em que não contrariem o disposto neste diploma, na Convenção de 1951 e no Protocolo de 1967, cabendo-lhe designadamente a obrigação de acatar as leis e os regulamentos, bem como as providências destinadas à manutenção da ordem pública.
2.O refugiado tem direito, nos termos da Convenção de 1951, a que lhe seja passado título de identidade compro-vativo da sua qualidade, que lhe será passado pelo M.A.I. segundo modelo a estabelecer em portaria:.
Quanto à decisão que defere ou indefere o pedido de asilo, provê o artigo 19º, do seguinte modo:
«1.Proferida a decisão, o Serviço de Estrangeiros notificá-la-á ao requerente, dela dando conhecimento ao delegado do Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados.
2.Em caso de decisão negativa, mencionar-se-á na notificação o direito de recurso para o Supremo Tribunal Administra-tivo, com a indicação expressa do prazo em que deverá ser interposto.
3.O recurso previsto no número anterior tem efeito suspen-sivo:(40).
A Lei nº 70/93, de 29 de Setembro, revogou a Lei nº 38/80, a que nos vimos a referir. Inclui uma disposição transitória nos termos da qual as novas regras se aplicam «aos pedidos de asilo pendentes:, e, tendo entrado em vigor a 29 de Outubro de 1993 (41), interessará analisar de seguida, a disciplina dos pre- ceitos que correspondem aos antes mencionados e pertencen-tes à Lei nº 38/80 (42).
Vê-se então que as situações em que pode ser concedido asilo estão circunscritas ao artigo 2º do diploma, o qual retoma a redacção do artigo 1º da Lei nº 38/80, na redacção do Decreto-Lei nº 415/83, de 24 de Novembro. Na verdade, a Lei nº 38/80 contemplava ainda como forma de asilo o «asilo por razões humanitárias: do seu artigo 2º. Face à Lei nº 70/93, em substituição daquele, criou-se no respectivo artigo 10º um «regime excepcional por razões humanitárias: do teor seguinte:
«Aos estrangeiros e aos apátridas a quem não sejam aplicáveis as disposições do artigo 2º e que sejam impedidos ou se sintam impossibilitados de regressar ao Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual por motivos de insegurança devida a conflitos armados ou da sistemática violação dos direitos humanos que ali se verifiquem pode ser aplicado o regime excepcional previsto no artigo 64º do Decreto-Lei nº 59/93, de 3 de Março (43).
Assim, se por força do nº 2 do artigo 4º da Lei nº 38/80, o assim chamado asilo por razões humanitárias, implicava a atribuição ao beneficiário duma «situação análoga à de refugiado:, a nova lei quis evitar tal equiparação.
A «concessão do direito de asilo: continua a conferir ao beneficiado o estatuto de refugiado (44).
A matéria do pedido de asilo está agora integrada no Capítulo III da Lei nº 70/93 epigrafado «Do processo:.
A Secção I reporta-se ao «processo normal:, a Secção
II ao «processo acelerado:, e a Secção III ao «pedido de reinstalação de refugiados:. Passa-se a transcrever o texto do artigo 14º da Lei nº 70/93, que corresponde ao artigo 16º da Lei nº 38/80, também antes transcritoe que agora se enquadra no processo normal de concessão de asilo:
«1.Recebido o pedido de asilo, o serviço de Estrangeiros e Fronteiras emite a favor das pessoas nele abrangidas uma autorização de residência provisória, do modelo fixado por portaria do Ministro da Administração Interna, válida pelo período de 60 dias contados da data da apresentação do pedido, renovável por períodos de
30 dias até decisão final do mesmo ou, no caso previsto no artigo 18º, até expirar o prazo ali estabelecido.
2.Os menores de 14 anos devem ser mencionados, por aver-bamento, na autorização de residência do requerente.
3.Enquanto estiver pendente o processo de pedido de asilo, ao requerente é aplicável o disposto na presente lei e na legislação sobre estrangeiros:
(45).
O artigo 17º, da Lei nº 70/93, corresponde agora ao artigo 19º da Lei nº 38/80, que antes se reproduziu, mas com duas alterações: se primeiro se dizia, que na notificação da decisão que indefere o pedido de asilo, havia que indicar o prazo em que o recurso para o S.T.A. podia ser interposto, agora estipula-se concretamente o prazo de 20 dias para interposição de tal recurso. Por outro lado, desapareceu qualquer referência ao efeito suspensivo do recurso em questão.
No tocante ao processo acelerado, agora introduzido, regem os artigos 19º e 20º da Lei nº 70/93. O primeiro preceito reporta-se às situações em que se pode optar por tal forma de processo, e que, muito resumidamente, assentam numa falta de fundamento para o pedido evidente e manifesta, no facto do requerente ser oriundo de país seguro ou país terceiro de acolhimento, segundo a definição do artigo 1º do diploma, ser obrigado a deixar o país por ter sido expulso, ter cometido crime grave no território dos Estados-membros com referência aos casos previstos no artigo 1º-F da Convenção de Genebra, ou haver que ponderar, a seu respeito, sérios motivos de segurança tanto interna como externa.
A tramitação do processo acelerado vem referida no artigo 20º que se transcreve:
«1.Nos casos previstos no artigo anterior, o pedido deve ser objecto duma informação a elaborar no prazo de vinte e quatro horas pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e a submeter imediatamente a parecer do Comissário Nacional para os Refugiados.
2.Decorridos os prazos referidos no número anterior, o parecer do Comissário Nacional para os Refugiados é afixado nas instalações do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
3.Se o pedido obtiver parecer favorável do Comissário, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras emite a favor das pessoas nele abrangidas uma autorização de residência provisória nos termos do artigo 14º, seguindo-se a instrução do processo.
4.Se o parecer for desfavorável, o requerente pode pronunciar-se, por escrito, no prazo de quarenta e oito horas a contar da afixação referida no nº 2, após o que o pedido é submetido à decisão do Ministro da Administração Interna, que resolve sobre a sua admissibilidade ou rejeição, seguindo- se no primeiro caso os termos do número anterior.
5. Recusada a admissão do pedido, com base na verificação das condições referidas no artigo anterior, o requerente deve abandonar o País no prazo que for fixado, não superior a 15 dias, sob pena de expulsão:.
A terminar, uma referência a preocupações de ordem social reveladas pela Lei nº 70/93. Tal como ocorria com a Lei nº 38/80, o artigo 38º da lei vigente garante a isenção de selo, a gratuitidade e o carácter urgente dos processos de concessão ou de perda do direito de asilo (46) (47).
Instituiu-se além disso um regime de apoio social diferente do que antes se previra. A ele se referem os artigos 35º, 36º, e 37º, da Lei nº 70/93, epigrafados efectivamente de «Apoio social:, «Apoio da segurança social:, e «Regime de concessão de aposio social:.
Transcreveremos o referido artigo 35º, de que os seguintes são mero desenvolvimento:
«É concedido apoio social para alojamento e alimentação ao peticionário, em situação de carência económica e social, e ao respectivo agregado familiar, de acordo com o disposto no artigo 5º, até à decisão final do pedido de asilo: (48).
VII
1. Feito este excurso pela disciplina mais directamente ligada com a questão central posta, e concernente a apoio judiciário, condição de estrangeiro, pedido de asilo e estatuto de refugia-do, estaremos já habilitados a ensaiar uma resposta. Recorde-se que o que começou por estar em causa, foi saber se o requerente de asilo que viu indeferido o seu pedido pela autoridade administrativa, pode usufruir de apoio judiciário na modalidade de patrocínio no recurso que queira interpor daquela decisão para o S.T.A..
Ou, posta a questão de forma mais abrangente, interessará apurar qual a situação dos estrangeiros em Portugal, na sequência dum pedido de asilo, no que diz respeito ao benefício da protecção jurídica, na vertente de apoio judiciário e especificamente de patrocínio.
Importará atentar, antes do mais, em que o nosso ponto de vista vai no sentido de que se não está perante uma falsa questão, que seria directamente resolvida pela conjugação dos artigos 16º, nºs 1 e 3, 4º, nº 2 e 8º da Lei nº 38/80 (49).
Consoante se viu, (supra, VI, 3), «enquanto estiver pendente o processo de pedido de asilo:, o requerente
é aplicável o disposto no nº 2 do artigo 4º do diploma, nos termos do qual este «goza dos direitos e está sujeito aos deveres dos estrangeiros residentes em Portugal:. Conforme também se referiu, a Lei nº 70/93 passou a dizer apenas que ao requerente é aplicável o disposto naquela Lei e na legislação sobre estrangeiros. Ora, mesmo em face da disciplina veiculada pela Lei nº 38/80, sempre será possível defender, que a atribuição aos candidatos a refugiado dos direitos dos estrangeiros em Portugal, constitui uma disciplina geral, que por si não impede, que no campo do apoio judiciário surjam normas especiais. E estas poderão por exemplo contemplar como situações distin-tas a do simples residente, e a do residente habitual em Portugal, para do facto se extraírem diferentes consequências. Poderia ser o caso dos artigos 7º, nº 2 e 1º, nº 1, respectivamente dos Decretos-Leis nºs 391/88 e 387-B/87 (supra, IV, 3).
2. A nosso ver, a tarefa a realizar consiste em compatibilizar um princípio constitucional de equiparação entre nacionais e estrangeiros, extensível ao direito ao apoio judiciário, com as normas de direito ordinário que discriminassem para aquele efeito, os residentes habituais, nos termos da definição legal, em relação aos residentes não habituais.
O artigo 15º da C.R.P. consagra no seu nº 1 a regra da equi-paração entre nacionais e estrangeiros para o efeito de gozo de direitos e cumprimento de deveres, nem sequer exigindo a res-pectiva residência em Portugal, bastando-se com o facto dos estrangeiros se encontrarem em Portugal, (supra, V.,1). As ex-cepções àquela regra de equiparação são o exercício de direitos políticos, o exercício de funções públicas que não tenham ca-rácter predominantemente técnico, e os direitos e deveres que a C.R.P. e a lei reservem exclusivamente aos cidadãos portugue-ses.
Estando em causa o direito ao apoio judiciário, que por natureza nada tem que ver com direitos políticos ou exercício de funções públicas, interessará tão-só apurar se se trata dum direito que a C.R.P. ou a lei reservem só a portugueses. A resposta é eviden-temente negativa, porque tal reserva não a faz a C.R.P. no seu artigo 20º, (supra, IV.,2), nem o faz a lei ordinária.
Como se viu, tanto o Decreto-Lei nº 387-B/87 como o Decreto-Lei nº 391/88 conferem o direito à protecção jurídica, explicitamente, também a estrangeiros.
3. Aproximemos então o princípio constitucional da equiparação entre nacionais e estrangeiros do âmbito subjectivo do direito à protecção jurídica.
O artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87 (supra, IV, 2), que elenca os beneficiários de protecção jurídica, contempla no seu nº 1 os nacionais portugueses. Pelo nº 2 é conferido o direito à protecção jurídica aos «estrangeiros e apátridas que residam habitualmente em Portugal:, tratando o nº 3 dos «estrangeiros não residentes em Portugal:. Como se viu, o conceito de residência habitual para efeito de protecção jurídica
é dado pelo artigo 1º, nº 1, do Decreto-Lei nº 391/88, e passa pela «permanência regular e continuada em Portugal, por período não inferior a um ano:.
Ora, assim sendo, abrir-se-ão duas possibilidades de interpre-tação do nº 2 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87.
Segundo a primeira, os estrangeiros e apátridas que se encontrem a residir em Portugal só beneficiarão de protecção jurídica se forem de considerar «habitualmente residentes:, nos termos da definição dada pelo nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 391/88.
E se deixarmos agora de lado o regime dos não residentes, expressamente previsto no nº 3 do artigo
7º do Decreto-Lei nº 387-B/87, ficariam então privados de qualquer protecção jurídica os estrangeiros ou apátridas que não pudessem considerar-se residentes habituais.
Em alternativa, poderia encarar-se o nº 2 do artigo 7º citado, em termos meramente declarativos, de tal modo que, o facto de se atribuir na lei protecção jurídica aos «residentes habituais:, não arrastaria que o legislador tivesse pretendido, que se não pudesse atribuir aquela protecção , também, a todos quantos juridicamente, ou de facto, fossem de considerar meramente residentes entre nós.
No primeiro caso, o nº 2 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87, bem como aliás o nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 391/88, estariam, em parte, feridos de inconstitucionalidade. No segundo, seríamos confrontados com uma lacuna da lei. Na verdade, ter-se- ia previsto a protecção para residentes habituais, previra-se em determinados moldes para não residentes, mas omitira-se a disciplina referente aos estrangeiros e apátridas que se não pudessem encaixar nestas duas categorias. Vejamos então como poderá desenvolver-se a tese da inconstitucionalidade.
4. O nº 1 do artigo 15º da C.R.P. estabelece um princípio de equiparação dos estrangeiros e apátridas aos nacionais, que, como se viu, sofre as excepções previstas no nº 2 do preceito. Dentre estas, interessa reter, para a economia do parecer, a que se reporta aos «direitos e deveres reservados pela Constituição e pela lei exclusivamente aos cidadãos portugueses:.
Ora, com propriedade se pode referir, que surgindo o acesso ao direito elencado no âmbito dos direitos e garantias fundamentais, os preceitos a ele referentes na C.R.P., e desde logo no seu artigo 20º, devem ser interpretados, se dúvidas houver, em consonân-cia com a Declaração U.D.H. e portanto, como já se disse, sem acepção de cidadania (50).
Acresce que, conforme refere J. J. GOMES CANOTILHO,
«... a distinção entre «direitos dos portugueses: e «direitos de todos:, carece sempre de justificação ou fundamento material, não devendo esquecer-se o relevo dos standards mínimos fixados pelo direito internacional relativamente à determinação deste fundamento material. No direito constitucional português esta fundamentação material resulta claramente do artigo 16º, nº 2. É, seguramente, a inexistência de qualquer fundamento material justificador da discriminação que explica a extensão de certos direitos a prestações a cidadãos estrangeiros ...:(51).
A excepção relativa aos deveres e direitos reservados exclusivamente aos portugueses, parece ter querido salvaguar-dar as situações, em que a atribuição de certos direitos ou deveres a não portugueses seja impossível ou inconveniente, pelo simples facto de serem não portugueses. Mas sempre que à condição de estrangeiro ou apátrida não repugne a atribuição dum direito, então o gozo dele haverá que processar-se nos mesmos termos por parte de nacionais ou estrangeiros e apátridas, sob pena de se esvaziar o conteúdo fundamental do nº 1 do artigo 15º da C.R.P..
O princípio geral de equiparação obriga não só a uma contenção nas discriminações a decretar entre portugueses e estrangeiros, contenção a observar designadamente no domínio dos direitos fundamentais, como as condições de que se faz depender o exercício dos direitos, só por parte de estrangeiros, não podem redundar na denegação desses direitos na prática.
Na linha do raciocínio que vimos desenvolvendo, as limitações ao acesso ao direito, que a lei ordinária impusesse em relação a estrangeiros, haveriam de submeter-se ao regime dos nºs 2 e 3 do artigo 18º da C.R.P.. De acordo com o primeiro destes normativos, «a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos:.
E nos termos do segundo, «as leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais:.
Recorde-se que no caso em apreço haveria que compaginar uma disposição da lei ordinária segundo a qual pode ser negada protecção jurídica só pelo facto do estrangeiro residente não o ser há pelo menos um ano, com um princípio constitucional geral de equiparação, que nem sequer exige a residência no país, e é extensivo aos estrangeiros que simplesmente se encontrem em Portugal.
Se da banda dos imperativos constitucionais parece não poder admitir-se um regime discriminatório nos termos apontados, resta agora apurar se a lei ordinária efectivamente consagra esse regime discriminatório.
Como já se viu, a resposta positiva a esta questão passa por uma interpretação do nº 2 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87, de tipo enunciativo, com recurso ao argumento a contrario sensu. Se a lei atribui protecção jurídica aos estrangeiros residentes habituais, estarão privados dessa protecção os não residentes, ou residentes não habituais, salvo se outra disposição lha conceder expressamente, como de facto acontece com o nº 3 do preceito, mas só para os não residentes.
Em abono desta posição poderá trazer-se à colação, decisivamente, um elemento sistemático de interpretação, que contempla sobretudo o artigo 1º do Decreto-Lei nº 391/88. Na verdade, este diploma teve por objectivo expresso a regulamentação do sistema do apoio judiciário e do seu sistema financeiro, e abre logo no nº 1 do seu artigo 1º, com a indicação do que deve entender-se por «residência habitual:, para efeitos de apoio judiciário. Com esse propósito, fica então a saber-se que o estrangeiro habitualmente residente em Portugal terá que ser titular de autorização de residência válida, e que ter permanecido em Portugal de forma regular e continuada por período não inferior a um ano. «Salvo regime especial decorrente de tratado ou convenção internacional que Portugal deva observar.
Tanto o artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87 como o nº
1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 391/88 reportam a protecção jurídica a estrangeiros ou apátridas, residentes habituais ou não residentes, sem qualquer referência aos indivíduos que tenham pedido asilo em Portugal, sejam candidatos a refugiados, ou refugiados já como tal considerados. A contemplação dos refugiados ou dos beneficiários de asilo surge só no nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 391/88, e para estipular que a sua protecção jurídica surge com a concessão do asilo ou o reconhecimento do estatuto de refugiado.
Havendo uma menção expressa na lei aos beneficiários de asilo e a refugiados, não parece crível que o legislador tivesse ignorado pura e simplesmente a situação dos candidatos aos estatuto de refugiado, ou dos candidatos á situação análoga aos refugiados, no caso de asilo por razões humanitárias.
O legislador terá então pretendido, que a protecção jurídica dos nacionais só deveria ser facultada aos estrangeiros, que mantivessem com Portugal uma ligação suficientemente forte, para, em tal domínio, poderem ser equiparados aos nacionais. Tal ligação poderá consubstanciar-se, quer no facto do requerente de apoio judiciário ter em Portugal residência habitual, quer no facto de, independentemente de estarem preenchidos os requisitos estipulados a tal propósito, ter sido conferido asilo ao estrangeiro ou beneficiar ele do estatuto de refugiado. Se nenhuma dessas situações se configurar, os laços que unem o estrangeiro ou apátrida a Portugal serão de tal modo ténues, que não legitimarão, segundo o legislador ordinário, uma prestação do Estado de carácter social, como é a protecção jurídica, nos mesmos termos que é prestada aos nacionais.
Interpretando-se o artigo 7º, nºs 2 e 3 do Decreto-Lei nº 387-B/87 e o artigo 1º do Decreto-Lei nº 391/88, conjugadamente, no sentido de só beneficiarem de protecção jurídica os estrangeiros ou apátridas residentes habitualmente em Portugal, os não residentes se satisfeita a regra de reciprocidade, e os beneficiários do asilo ou de estatuto de refugiado, ficariam privados de protecção todos os estrangeiros e apátridas em diversa situação, incluindo nomeadamente os candidatos a asilo que na expectativa da sua concessão permanecem em Portugal, embora há menos dum ano. Se assim se entender, como parece dever ser entendido, o nº 2 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87, e nº 2 do artigo 1º, do Decreto-Lei nº 391/88, violam, na medida apontada, o disposto no nº 1 do artigo 15º e artigo 20º da C.R.P..
Ora, se se pretender que, deixando por ora de lado o caso dos não residentes em Portugal, só têm acesso à protecção jurídica os estrangeiros habitualmente residentes em Portugal, então estará ferida de inconstitucionalidade desde logo a norma do nº 2 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87. Na verdade, ficariam privados de protecção jurídica todos os estrangeiros que se encontrem e residam em Portugal, mas face à definição legal pertinente não se possam considerar aqui habitualmente residentes. O que colide com o disposto nos artigos 15º e 20º da C.R.P.. Mas também o nº 2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 391/88 padeceria de tal vício por impedir a protecção jurídica aos requerentes de asilo antes da concessão deste ou do benefício do estatuto de refugiado, se não forem considerados residentes habituais.
Acresce que, travando-se estas, de normas referentes à matéria dos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consa-grados garantia de equiparação dos nacionais aos estrangeiros e apátridas, e acesso ao direito e aos tribunais por-se-
á em relação a elas a questão, de se saber se só aos tribunais competirá sindicar a respectiva constitucionalidade. A resposta deverá ser negativa.
Na linha da posição que este corpo consultivo vem seguindo, bem explanada por exemplo no parecer nº 80/89, homologado a 12 de Março de 1990, e publicado no «Diário da República:, II Série, nº 158, de 11 de Julho de 1990.
5. Em alternativa à posição que defende a inconstitucionalidade daqueles preceitos, poder-se-ia ensaiar uma interpretação dos artigos 7º e 1º referidos em conformidade com a C.R.P.. Segundo tal interpretação, o nº 2 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87 não esgotaria o universo dos estrangeiros residentes em Portugal que podem beneficiar de protecção jurídica (52).
O artigo 82º do Código Civil a propósito do «domicílio voluntário geral: refere-se à noção de «residência habitual: ao lado da de «residência ocasional:, sem porém as definir. Tem-no feito no entanto a doutrina, e assim, segundo MOTA PINTO, por exemplo, a residência
é o local onde a pessoa está a viver com alguma permanência. A residência será ocasional se a pessoa aí vive com alguma permanência mas temporária ou acidentalmente, e será habitual se se trata do local onde a pessoa vive normal-mente, onde costuma regressar após ausências mais curtas ou mais longas (53).
Para CASTRO MENDES,«residência é o sítio preparado para servir de base de vida a uma pessoa singular:
(54).
A aplicação dos conceitos de residência, residência habitual ou residência ocasional tal como vêm tratados no direito civil, à situação dos requerentes de asilo, não implicaria que estes tivessem que considerar-se não residentes. E porque o conceito de residência habitual não é feito depender da permanência durante um lapso de tempo determinado num certo local, também não seria incompatível com a situação dos requerentes de asilo, o considerá-los, face à lei civil, se fosse o caso, habitualmente residentes no País. Crê-se porém, que estando em causa candidatos a refugiados ou a beneficiários de um regime paralelo, e estrangeiros, haverá necessariamente que trazer à colação o disposto no artigo 2º do Decreto-Lei nº 59/93, de 3 de Março, ou no artigo 30º do Decreto-Lei nº 264-B/81, de 3 de Setembro, que o precedeu na regulamen-tação da «entrada, permanência, saída e expulsão de estrangeiros do território nacional:.
Recorde-se que segundo aquele primeiro normativo,
«conside-ra-se residente o estrangeiro que seja titular de autorização válida de residência em Portugal:.
E já antes, o segundo preceito, estipulava:
«Considera-se residente o estrangeiro a quem tenha sido concedida autorização para residir em Portugal:.
Ora, como se viu, face ao processo normal de pedido de asilo, aos requerentes deve ser passada uma autorização de residência provisória válida até decisão final do pedido, mas que até pode prolongar-se para além dessa decisão. E aos candidatos a refugiado
é aplicável a legislação relativa a estrangeiros por força do nº 3 do artigo 14º da Lei nº 70/93 ou nº 1 do artigo 8º da Lei nº 38/80.
Parece então que, se for observado o processo normal de pedido de asilo que a Lei nº 70/93 introduziu, e em qualquer hipótese face à Lei nº 38/80, uma vez formulado o pedido de asilo deverá o requerente ficar a ser titular duma autorização de residência, que embora provisória lhe confere a condição de residente face à legislação sobre estrangeiros. Acresce que, nos casos em que não esteja prevista ou não tenha tido lugar a concessão daquela autorização de residência provisória, mas o requerente de asilo alimente expectativas de o seu pedido ser deferido, para tanto permanecendo regularmente em Portugal, criou-se manifestamente um vínculo ao Estado português, que distancia a situação do requerente de asilo, da do simples estrangeiro não residente, e que apenas se encontre em Portugal. Esse vínculo, traduzido numa permanência regular, e certificado por um qualquer título, permitirá considerar o requerente de asilo de facto residente em Portugal.
Donde, ser legítimo concluir, que face à nossa legislação relativa a estrangeiros e especificamente relativa a refugiados, haverá requerentes de asilo, que haverão de ter-se por residentes em Portugal, juridicamente, ou tão só de facto..
Assim sendo, poderia defender-se, que na economia dos preceitos referentes ao apoio judiciário a conceder a estrangeiros, ao lado dos «não residentes em Portugal: e daqueles que para efeito de protecção jurídica se consideram «residentes habituais: no país, ficou de fora a categoria dos simples residentes entre nós.
Isto porque, fundamentalmente, na definição de residência habitual se introduziu uma condicionante temporal de pelo menos um ano, de permanência regular e continuada em Portugal (55), e esse tempo pode não ter decorrido em relação a titulares de autorização provisória de residência, ou simples requerentes de asilo, que aguardam a sua concessão, permanecendo legalmente em Portugal.
A não contemplação daqueles que para efeitos de apoio judiciário deverão ser considerados simples residentes, poderia então revelar, não a intencionalidade da lei de lhes negar protecção jurídica mas antes uma lacuna da própria lei.
Se se configurasse nos termos referidos uma lacuna da lei, interessaria supri-la com recurso ao disposto no artigo 10º do Código Civil (56). Não haveria então justificação material bastante para se conceder protecção jurídica aos estrangeiros residentes habituais, na definição do Decreto-Lei nº 387-B/87, negando-a aos outros estrangeiros residentes em Portugal, sendo comum o restante condicionalismo de que depende a protecção. Mais, as razões que militam pela concessão de protecção no primeiro caso militariam à mesma ou por maioria de razão no segundo (57).
Ser-se-ia então levado a aplicar analogicamente, a norma do nº 2 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87, a todos os estrangei-ros simplesmente residentes em Portugal (58).
Como já se afirmou, não é esta a posição para que nos inclinamos.
6. Por tudo quanto fica dito estará prejudicada a questão lateral, posta de início, de se saber qual o efeito que pudesse ter o facto de os requerentes do pedido de asilo, aquando da interposição de recurso para o S.T.A. já residirem de facto em Portugal há mais dum ano.
Sempre se dirá no entanto, que se o requerente do pedido de asilo beneficia de autorização válida de residência provisória em Portugal, há mais dum ano, também terá que ser considerado residente habitual no País, se tal ocorreu de forma regular e continuada.
Face ao que dispõe o nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 391/88.
VIII
1. Para além da questão nuclear a que procurámos dar resposta, outras duas se formularam, relacionando-se a primeira com a necessidade de traduzir a notificação que é feita aos candidatos a refugiado, para que se pronunciem sobre a posição assumida pelo Mº. Pº., quanto aos pedidos de apoio judiciário que tenham feito.
A Lei de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovada pelo Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho, refere-se no seu artigo 10º a «citações e notificações:, do seguinte modo:
«1.A citação de autoridade e pessoas colectivas de direito público ou de utilidade pública administrativa para intervenção em recursos contenciosos ou em acções e sua notificação em quaisquer processos são feitos por via postal, mediante carta subscrita pelo secretário do tribunal, excepto nas acções sobre contratos administrativos e sobre responsabilidade.
2.Nos casos previstos no número anterior são feitas sob registo do correio as citações, bem como as notificações que se destinem a facultar a prática de actos processuais.
3.As restantes citações e notificações são feitas nos termos da lei de processo civil, podendo o juiz ou o relator determinar que sejam efectuadas por agente de autoridade administrativa ou policial:.
O Código de Processo Civil (C.P.C) não contém nos artigos 228º a 269º, relativos à citação e às notificações, qualquer referência à língua em que devem ser feitas, mesmo ao ser contemplada, pelos artigos 244º e 245º, a citação do réu residente em país estrangeiro. Na falta de qualquer tratado ou convenção que imponha a necessidade de tradução, (59) haverá que recorrer ao estatuído no artigo 139º do C.P.C. cujo texto é o seguinte:
«1.Nos actos judiciais usar-se-á a língua portuguesa.
2.Quando hajam de ser ouvidos, os estrangeiros podem, no entanto, exprimir-se em língua diferente, se não conhece-rem a portuguesa, devendo nomear-se um intérprete, quando seja necessário, para, sob juramento de fidelidade, estabelecer a comunicação. A intervenção do intérprete é limitada ao que for estritamente indispensável:.
Em face destas disposições legais parece pois ser de concluir que as notificações em questão não têm que ser acompanhadas de tradução na língua do destinatário.
2. A outra questão também posta, reporta-se à regra da reciprocidade estabelecida no nº 3 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87, que, recorde-se, estatui:
«3.Aos estrangeiros não residentes em Portugal é reconhecido o direito à protecção jurídica, na medida em que ele seja atribuído aos portugueses pelas leis dos respectivos Esta-dos:.
E o que se perguntava era se a existência ou inexistência da dita reciprocidade poderia ser simplesmente suposta ou presu-mida, para o efeito de se conceder ou negar apoio judiciário. Face à posição assumida a respeito da protecção jurídica de que devem beneficiar os candidatos a refugiado, mostra-se claro que os titulares dos interesses que desencadearam a presente con-sulta não caberão na categoria de não residentes. Daí não lhes ser aplicável o referido nº 3 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87.
De qualquer modo, ocorre a este propósito referir que o pedido de asilo deve especificar os factos que o fundamentam bem como indicar as provas pertinentes, tanto por força do nº 2 do artigo 15º da Lei nº 38/80 como por força do nº 2 do artigo 13º da Lei nº 70/93.
O interessado que invoque pois o nº 3 do artigo 7º, do Decreto-Lei nº 387-B/87, deverá proporcionar, com o pedido de asilo, o conhecimento do direito estrangeiro nos termos do qual, seria atribuída protecção jurídica aos portu-gueses que se encontrassem em situação equivalente à sua, no Estado de que é nacional.
E na falta de fornecimento do direito estrangeiro por quem o invoca, sempre seria de recorrer ao regime do artigo 348º do Código Civil, que é do teor seguinte:
«1 Àquele que invocar direito consuetudinário, local, ou estrangeiro compete fazer prova da sua existência e conteú-do, mas o tribunal deve procurar, oficiosamente, obter o respectivo conhecimento.
2.O conhecimento incumbe também ao tribunal, sempre que este tenha que decidir com base no direito consuetudinário, local, ou estrangeiro e nenhuma das partes o tenha invocado, ou a parte contrária tenha reconhecido a sua existência e conteúdo ou não haja deduzido oposição.
3.Na impossibilidade de determinar o conteúdo do direito aplicável, o tribunal recorrerá às regras do direito comum português:.
IX
Termos em que se conclui:
1. Das disposições conjugadas dos nºs 2 e 3 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro, e artigo 1º do Decreto-Lei nº 391/88, de 26 de Outubro, resulta que os estrangeiros e apátridas só beneficiarão de protecção jurídica, nos seguintes casos se forem considerados residentes habituais nos termos da lei, se no caso de serem não residentes existir uma reciprocidade de tratamento pelo país de que são nacionais, se beneficiarem de estatuto de refugiado, ou lhes for deferido o pedido de asilo;
2. Segundo aquelas normas não beneficiam de protecção jurídica os estrangeiros ou apátridas que não se encontrem em qualquer daquelas situa-ções, como é o caso dos requerentes de asilo que permaneçam regularmente em Portugal, aguardando o deferimento daquele pedido, sem poderem ser considerados residentes habituais;
3. O artigo 15º da C.R.P. estabelece uma regra de equiparação entre portugueses e estrangeiros quanto ao exercício de direitos e cumprimentos de deveres, revelando-se o acesso ao direito como garantia fundamental consagrada no artigo 20º da C.R.P. de que devem beneficiar todos os indivíduos, e não abrangida pelas excepções previstas no nº 2 daquele artigo 15º;
4. O nº 2 do artigo 7º do Decreto-Lei nº 387-B/87 e o nº
2 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 391/88 violam o disposto nos artigos 15º e 20º da Constituição da República Portuguesa, na parte em que recusam protecção jurídica a estrangeiros ou apátridas que permaneçam de forma continuada e regularmente em Portugal, aguardando a decisão definitiva do pedido de asilo que formularam;
5. Por força das disposições combinadas do nº 3 do artigo
10º do Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho, e nº 1 do artigo 139º, do Código de Processo Civil, não têm que ser traduzidas na língua do destinatário as notificações a fazer, no âmbito do processo administrativo, aos candidatos à condição de refugiado.
_______________________________
(1)Vide ofício entrado a 13.12.93 e registado nesta Procuradoria-Geral com o nº 112 a fls. 9, Proc. nº 163/93, que integra o acervo documental de que dispomos.
(2)Vide ofício nº 24, de 19.1.94 do S.T.A., que faz parte da documentação disponível.
(3)Assim o Acórdão de 18 de Novembro de 1993 lavrado no Procº nº 32832, cuja cópia foi junta.
(4)Neste sentido o Acórdão de 7 de Dezembro de 1993 proferido no Processo nº 32938, cuja cópia também consta do acervo documental.
(5)É a posição defendida no processo nº 32848 no despacho do Relator, de 24 de Novembro de 1993, com cópia que foi junta.
(6)O Acórdão é de facto de 18 de Novembro de 1993.
(7) Muito embora a presente consulta diga respeito a uma situação vivida por cidadãos oriundos do Zaire e portanto estrangeiros, valerá do mesmo modo para indivíduos apátridas. Por outro lado, houve que ter em conta na circunscrição do âmbito da consulta, o facto de, como já se viu, haver alguma incerteza factual quanto à autorização de residência dos requerentes de asilo. Se o magistrado do Mº. Pº. que prestou a pertinente informação sobre o caso, fala de autorização de residência provisória possuída pelos candidatos, a exposição inicial refere tratar-se de pessoas no país há mais dum ano, e portadoras de «Declaração emitida pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (S.E.F.) que confirmava a sua candidatura a Asilo e que impedia a sua expulsão do País, o que significa, que se encontravam numa situação de perfeita regularidade e legalidade:. Acresce que, a Lei nº 70/93, de 29 de Setembro relativa ao direito de asilo, introduziu uma forma de processo acelerado de concessão de asilo, que no caso de recusa do pedido de asilo não prevê a emissão de qualquer autorização de residência provisória.
Assim sendo, achou-se por bem abranger no âmbito da questão os casos em que houve efectivamente um pedido de asilo, os requerentes permanecem em Portugal esperando que esse asilo lhes seja concedido, e portanto existe um vínculo ao Estado português, assente não só no facto da sua estadia, em território nacional, como de alimentarem expectativas de que cá possam permanecer em termos definitivos.
(8)É o seguinte o texto do artigo 6º do Decreto-Lei nº 387-B/87, de 29 de Dezembro: «A protecção jurídica reveste as modalidades de consulta jurídica e de apoio judiciário:.
Por outro lado, a concessão da protecção jurídica, juntamente com a informação jurídica, constituem as duas vias de acesso ao direito e aos tribunais (cfr. nº 2 do artigo 1º daquele Decreto-Lei).
(9)Para uma síntese dessa evolução histórica poderá consultar-se SALVADOR DA COSTA in «Apoio Judiciário:,
Lisboa, Rei dos Livros, 1990, pág. 15 e segs..
(10)Este Decreto-Lei nº 391/88 viria a sofrer alterações na respectiva tabela anexa, operadas pelo Decreto-Lei nº 112/89, de 13 de Abril, e pelo Decreto-Lei nº 102/92, de 30 de Maio, no tocante à tabela de honorários dos advogados, advogados estagiário e solicitadores.
(11)In «Direito Constitucional:, Almedina, Coimbra, 1992, pág. 668.
(12)Segundo o artigo 8º da Declaração UDH,
«Toda a pessoa tem direito a recurso efectivo para as jurisdições nacionais competentes contra os actos que violem os direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição e pela lei:.
E segundo o artigo 10º também da Declaração UDH,
«Toda a pessoa tem direito em plena igualdade a que a sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial que decida dos seus direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusação em matéria penal que contra ela seja deduzida:.
Nos termos do artigo 14º do Pacto DCP,
«Todos são iguais perante os tribunais de justiça.
Todas as pessoas têm direito a que a sua causa seja ouvida equitativa e publicamente por um tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido pela lei, que decidirá quer do bem fundado de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra elas, quer das contestações sobre os seus direitos e obrigações de carácter civil (...):.
E o artigo 6º da Convenção EDH tinha já nessa parte um texto depois retomado pelo artigo 14º citado, do Pacto
DCP, acrescentando-se ali o direito a que a causa seja examinada «num prazo razoável:.
Por último, diz-nos o artigo 13º da Convenção E.D.H.:
«Qualquer pessoa, cujos direitos e liberdades reconhecidos na presente Convenção tiverem sido violados, tem direito a recurso perante uma instância nacional, mesmo quando a violação tiver sido cometida por pessoas que actuaram no exercício das suas funções oficiais:.
(13)Todos os sublinhados são nossos.
(14)A Constituição Política da República Portuguesa de
1933 estabelecia no seu artigo 87º: «A lei determina como se adquire e como se perde a qualidade de cidadão português (...):. E o artigo 74º da Constituição de
1911 dispunha:
«São cidadãos portugueses, para o efeito do exercício dos direitos políticos, todos aqueles que a lei civil considere como tais:.
(15)Segundo JORGE MIRANDA, «Cidadania é a qualidade de cidadão. E por este motivo, a palavra «nacionalidade embora mais corrente e não sem conexão com o fundo do Estado nacional deve ser afastada porquanto menos precisa. «Nacionalidade: liga-se a nação, revela a pertença a uma nação, não a um Estado. Ou, se se atender a outras utilizações consagradas, trata-se de termo com extensão maior que cidadania: nacionalidade têm as pessoas colectivas e nacionalidade pode ser atribuída a coisas (navios, aeronaves), mas cidadania só possuem as pessoas singulares: in «Manual de Direito Constitucional:, tomo III, Coimbra Editora,
1988, págs. 88 e segs.
(16)In ob. cit., na nota anterior, págs 117 e segs..
(17)À condição de estrangeiro equipararemos, mesmo não o mencionando expressamente, a de indivíduos que não sejam cidadãos de nenhum estado soberano, ou seja, apátridas.
O artigo 1º do Decreto-Lei nº 59/93, de 3 de Março, relativo à entrada, permanência, saída e expulsão de estrangeiros do território nacional, considera estrangeiro para efeitos do diploma em causa «todo aquele que não prove possuir a nacionalidade portuguesa:.
(18)O §3º do referido artigo 7º previa a possibilidade duma equiparação dos portugueses e brasileiros de que só ficariam excluídos certos direitos previstos no nº
1º, que tinham a ver com o exercício dos principais cargos políticos. Com a abertura proporcionada pela redacção daquele §3º, viria a celebrar-se a Convenção de Brasília de 7 de Setembro de 1971 que criou uma equiparação de direitos e deveres dos portugueses no Brasil e dos brasileiros em Portugal, aos nacionais do Estado.
(19)É o seguinte o texto do artigo 2º da Declaração U.D.H.:
«Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, da fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação.
Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autónomo ou sujeito a alguma limitação de soberania:.
(20)Transcreve-se o texto do dito artigo 14º:
«O gozo dos direitos e liberdades reconhecidos na presente Convenção deve ser assegurado sem quaisquer distinções, tais como as fundadas no sexo, raça, cor, língua, religião, opiniões políticas ou outras, a origem nacional ou social, a pertença a uma minoria nacional, a riqueza, o nascimento ou qualquer outra situação:.
(21)Subalterniza-se face ao teor da consulta a legislação respeitante ao regime legal de passaporte (Decreto-Lei nº 438/88, de 29 de Novembro), ou à identificação civil e criminal (Lei nº 12/91, de 21 de Maio) que aguarda regulamentação para entrada em vigor, apesar de aí se prever a passagem, a estrangeiros, de passaporte ou bilhete de identidade, respectivamente.
Do mesmo modo não interessará curar do disposto nos Decretos-Leis nº 212/92, de 12 de Outubro e nº 63/93, de 5 de Março, referentes à regularização da situação de emigrantes clandestinos tendo em conta os pressupostos dessa regularização. Por último, face à informação de que estarão in casu cidadãos zairenses, não é de atender ao regime especial de entrada, permanência e saída de nacionais de países membros da União Europeia, que resultava do Decreto-Lei nº 267/87, de 2 de Julho, a que sucedeu o Decreto-Lei nº 60/93, de 3 de Março.
(23)No Decreto-Lei nº 264-B/81 tal ressalva estava prevista, com disciplina correspondente, no artigo
52º, nºs 2 e 3, que nos dispensamos de transcrever.
(24)Cfr. LUÍS SILVEIRA, Le régime juridique des étrangers en droit portugais, in «Le Régime Juridique des étrangers en Droit National et International: Max Planck Institut fÿr ausländisches öffentliches Recht und Völkerrecht, 1987, Springer-Verlag Berlin.
(25)São os seguintes os números para cada ano: 1500(1983),
400(1984), 100(1985), 300(1986), 500(1987), 400(1988),
200(1989), 100(1990), 300(1991), e 700(1992). Ao total de 4300 pedidos de asilo reportados a Portugal, corresponde para a Alemanha e a França, por exemplo, no mesmo período, um total respectivamente de 1.397.700 e 508.300 pedidos (Fonte: «Les réfugiés dans le monde-1993: Haut Commissariat des Nations Unies pour les Réfugiés, 1993, Paris, Éditions la Découverte, pág. 157).
(26)Cfr. Les refugiés in «Le Droit des Étrangers: sous la direction de Pierre Jadoul et Eric Mignon,
«Publications des Facultés Universitaires Saint-Louis:
Bruxelles, 1993, pág. 63.
(27)Ob. cit. na nota (25), pág. 11.
(28)A «Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados: assinada em Genebra a 28 de Julho de 1951 foi aprovada entre nós para adesão pelo Decreto-Lei nº 43201, de 1 de Outubro de 1960. Portugal depositou o respectivo instrumento de adesão, segundo o Diário do Governo nº
17 de 20.1.61.
(29)O «Protocolo Adicional à Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados: assinado em Nova Iorque a 31 de Janeiro de 1967, foi aprovado para adesão, por Portugal, através do Decreto nº 207/75, de 17 de Abril de 1975. A Carta de Adesão ao protocolo foi depositada por Portugal a 13 de Julho de 1976.
(30)Poderão mencionar-se ao nível africano a «Convenção da O.U.A.. Relativa aos Aspectos Próprios dos Refugiados em África: de 1969, e, quanto à América, a «Declaração de Cartagena sobre os Refugiados:, de 1984, adoptada por países da América Central.
(31)Assinado em Estrasburgo a 30 de Novembro de 1960 e aprovado entre nós para ratificação pelo Decreto nº 75/81, de 16 de Junho. Portugal depositou o respectivo instrumento de ratificação, em Estrasburgo, consoante Aviso publicado no «Diário da República:, I Série, nº
259, de 10.11.81.
(32)Assinado em Estrasburgo a 16 de Outubro de 1980 e aprovado para ratificação pelo Decreto nº 140/81, de
15 de Dezembro. Portugal depositou o respectivo instrumento de ratificação, em Estrasburgo, consoante Aviso publicado no «Diário da República:, I Série, nº
97, de 27.4.82.
(33)A expressão é de J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, In Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra, Almedina, 1993, pág. 211.
(34)Ibidem.
(35)Cfr. o nº 1 do artigo 1º da Lei nº 38/80 na redacção do Decreto-Lei nº 415/83, de 24 de Novembro.
(36)Cfr. o nº 2 do artigo 1º da Lei nº 38/80.
(37)Cfr. o artigo 2º da Lei nº 38/80.
(38)Cfr. o artigo 4º da Lei nº 38/80.
(39)No nº 1 do preceito remete-se para o «caso previsto no artigo 20º:. Trata-se da situação dos requerentes de asilo a quem este tenha sido recusado, e beneficiem dum prazo até 60 dias, para permanecer em Portugal por um período transitório, para procurar asilo noutro país, ou regressar àquele que já lho tenha concedido.
Por outro lado, o texto do nº 1 do preceito transcrito corresponde à redacção do Decreto-Lei nº 415/83, de 24 de Novembro.
A redacção originária desse nº 1 era a seguinte:
«1.Recebido o pedido, o Serviço de Estrangeiros emitirá a favor das pessoas nele abrangidas uma autorização de residência provisória, do modelo anexo à presente lei, válida até decisão final do pedido ou, no caso previsto no artigo 20º, até expirar o prazo ali estabelecido:.
Quanto ao modelo de autorização de residência provisória viria a ser fixado pela Portaria nº 38/84, de 19 de Janeiro:.
(40)A redacção dos nºs 2 e 3 é do Decreto-Lei nº 45/83, de
27 de Novembro.
(41)Cfr. os artigos 10º e 41º da Lei nº 70/93.
(42)Nos termos da exposição que desencadeou o presente parecer as decisões que recusaram o asilo foram proferidas em Outubro e Novembro de 1993.
(43)O referido artigo 64º tem o seguinte texto:
«1.Em casos excepcionais de reconhecido interesse nacional verificados por despacho do Ministro da Administração Interna pode ser concedida ou renovada autorização de residência a estrangeiros com dispensa dos requisitos exigidos no presente diploma.
2.A competência para a renovação poderá ser delegada no director do serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
3.O título de residência a emitir nos termos deste artigo é válido por um período máximo de cinco anos, podendo ser renovado por períodos idênticos aos da emissão.
4.O modelo do título de residência referido no número anterior será aprovado por portaria do Ministro da Administração Interna:.
(44)O artigo 3º da Lei nº 70/93 reproduz o texto do nº 1 do artigo 4º da Lei nº 38/80.
(45)É o seguinte o texto do artigo 18º mencionado no nº 1 do artigo 14º da Lei nº 70/93:
«1.No caso de decisão final de recusa de asilo, o requerente pode permanecer em território nacional durante um período transitório, até 30 dias, para o efeito de procurar asilo noutro país ou regressar àquele que já lho tenha concedido.
2.Findo o período referido no número anterior, o requerente fica sujeito à legislação sobre estrangeiros:.
(46)O texto do artigo 38º da Lei nº 70/93 coincide com o texto do artigo 30º da Lei nº 38/80.
(47)De referir que, mesmo considerando que a gratuitidade do processo envolve não só a fase administrativa do pedido de asilo, como uma fase contenciosa em sede de recurso, essa gratuitidade limita-se à dispensa do pagamento de custas. Vem sendo regularmente entendido, na verdade, que a literalidade da expressão «processo gratuito: aponta, apenas, para o não pagamento de despesas, inerentes de tal modo ao processo, que aí são contadas.
(48)O artigo 5º referido, tem o seguinte texto:
«Os efeitos do asilo podem ser declarados extensivos ao cônjuge e aos filhos menores solteiros ou incapazes do peticionário ou, sendo este menor de 18 anos, ao pai e à mãe:.
(49) Vide, supra, nota (5).
(50)Vide nota (12).
(51)Ob. cit. na nota (11), págs. 568 e segs.
(52)Àcerca do princípio da interpretação das leis em conformidade com a Constituição, diz-nos J. J. GOMES CANOTILHO:
«Este princípio é fundamentalmente um princípio de controlo (tem como função assegurar a constitucionalidade da interpretação) e ganha relevância autónoma quando a utilização dos vários elementos interpretativos não permite a obtenção de um sentido inequívoco dentre os vários significados da norma. Daí a formulação básica para este princípio: no caso de normas polissémicas ou plurisignificativas deve dar-se preferência à interpretação que lhe dê um sentido em conformidade com a Constituição in ob. cit. na nota (11), pág. 235.
(53)In Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra Editora,
1992, pág. 258.
(54)In Teoria Geral do Direito Civil, vol. I, Lisboa,
A.A.F.L., 1978, pág. 204.
(55)Refira-se aliás, que a estipulação dum tempo certo mínimo de permanência, não é indispensável ao conceito de residência habitual, e que a introdução desse tempo certo, onde for feita, releva de uma parcela de discricionariedade do legislador. Assim, no referente
à obrigatoriedade de bilhete de identidade, por parte de estrangeiros, por exemplo, a alínea h) do nº 1 do artigo 3º da Lei nº 12/91, de 21 de Maio, diz-nos que
«a posse de bilhete de identidade é obrigatória ... para estrangeiros com residência habitual em Portugal há mais de seis meses:. O que desde logo implica poder haver residência habitual há menos de seis meses.
(56)Cujo texto é o seguinte:
«1.Os casos que a lei não preveja são reguladas segundo a norma aplicável nos casos análogos.
2. Há analogia sempre que no caso omisso procedam as razões justificativas da regulamentação do caso previsto na lei.
3. Na falta de caso análogo, a situação é resolvida segundo a norma que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema.
(57)Segundo BAPTISTA MACHADO, «dois casos dizem-se análogos quando neles se verifique um conflito de interesses paralelo, isomorfo ou semelhante de modo a que o critério valorativo adoptado pelo legislador para compor esse conflito de interesses num dos casos seja por igual ou maioria de razão aplicável ao outro.: (In ob. cit. na nota (56), pág. 202.
(58) Para além do Acórdão referido na nota (4) entenderam também, que havia uma lacuna na legislação referente a apoio judiciário, quando aplicada aos requerentes de asilo, os Acórdãos do S.T.A., de 18.11.93 (Recurso nº 32832), e de 27.1.94 (Recurso 32968).
(59)Assim designadamente em relação às Convenções da Haia de 17 de Julho de 1905, e de 1 de Março de 1954 sobre comunicação de actos judiciais, (cfr. Ac. do S.T.J. de 10.3.77, in B.M.J., nº 265, pág. 175).
Note-se que, por outro lado, o artigo 6º, nº 3, alínea a), da Convenção E.D.H. se situa no âmbito do processo penal, porque fala explicitamente de «acusação:, e, só impõe, que dela o arguido seja informado em língua que entenda. Não é pacífica a necessidade de haver sempre tradução da dita acusação.
(Sobre o tema cfr. IRENEU BARRETO, in Análise do artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem
à luz da jurisprudência da Comissão e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, «Documentação e Direito Comparado:, nº 49/50, 1992).
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART4 ART15 ART16 N2 ART18 N2 N3 ART20 N1 ART33 ART52 ART268 N4. CCIV66 ART10 ART14 ART82 ART348.
CPC67 ART139. LPTA ART10.
DL 43201 DE 1960/10/01.
DL 207/75 DE 1975/04/17. D 140/81 DE 1981/12/15.
DN 9-S/80 DE 1980/01/09. D 75/81 DE 1981/06/16.
L 38/80 DE 1980/08/01 ART1 N1 ART4 N2 ART8 ART15 ART16 ART19.
DL 264-B/81 DE 1981/09/03 ART30 ART33 N1 ART42.
DL 387-B/87 DE 1987/12/19 ART7 ART15 ART16 ART17 ART39 ART41.
DL 391/88 DE 1988/10/26 ART1. L 43/90 DE 1990/08/10 ART4.
L 12/91 DE 1991/05/21 ART3 N1 H.
DL 59/93 DE 1993/03/03 ART2 ART56 N1 ART64 ART67 ART84 N5 N6.
L 70/93 DE 1993/09/29 ART2 ART10 ART14 ART17 ART19 ART20 ART35.
DRGU 43/93 DE 1993/12/15.
Jurisprudência: 
AC STA DE 1993/11/18.
AC STA DE 1993/12/07.
Referências Complementares: 
DIR CIV * TEORIA GERAL / DIR CONST * DIR FUND / * CONT REF/COMP*****
CONV RELATIVA AO ESTUTO DOS REFUGIADOS GENEBRA 1951/07/28 ART16
PROT AD CONV RELATIVA AO ESTATUTO DOS REFUGIADOS NOVA IORQUE 67/01/31 AC EUR RELATIVA À SUPRESSÃO DE VISTOS PARA OS REFUGIADOS ESTRASBURGO 1960/11/30
AC EUR SOBRE TRANSFERÊNCIA DE RESPONSABILIDADE RELATIVA A REFUGIADOS ESTRASBURGO 1980/10/16
CEDH ART6 ART14 * CONT REF/COMP*****
* CONT ANJUR
DIR ESTR / DIR INT PUBL * DIR HOMEM.
* CONT REFINT
DUDH ART2 ART8 ART10 ART14.
PIDCP ART14.
* CONT DESC
RESTRIÇÃO DE DIREITOS.
INCONSTITUCIONALIDADE.
INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO.
LACUNA.
ANALOGIA.
ACTO JUDICIAL.
CITAÇÃO.
NOTIFICAÇÃO.
LÍNGUA PORTUGUESA.
LÍNGUA ESTRANGEIRA.
Divulgação
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