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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
86/1990, de 29.10.1992
Data do Parecer: 
29-10-1992
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Indústria e Energia
Relator: 
LUCAS COELHO
Descritores e Conclusões
Descritores: 
EMPRESA DE DESENVOLVIMENTO MINEIRO
CONSELHO FISCAL
VOGAL
MEMBRO DO GOVERNO
GABINETE MINISTERIAL
CHEFE DE GABINETE
ACUMULAÇÃO DE CARGOS
ACTIVIDADE PRIVADA
CARGO PÚBLICO
FUNCIONÁRIO PÚBLICO
DEVERES GERAIS DOS FUNCIONÁRIOS
DEVERES ESPECIAIS DOS FUNCIONÁRIOS
INCOMPATIBILIDADE
PRINCÍPIO DA IMPARCIALIDADE
Conclusões: 
1 - Por força da revogação da versão original do n 2 do artigo 1 da Lei n 9/90, de 1 de Março, operada mercê da redacção introduzida nesse número pelo artigo 1 da Lei n 56/90, de 5 de Setembro, os chefes dos gabinetes dos membros do Governo - compreendidos no elenco categorial de sujeitos definido no mesmo dispositivo, em virtude do estatuto estabelecido no Decreto-Lei n 262/88, de 23 de Julho - não estão sujeitos ao regime de incompatibilidades estatuído naquela Lei;
2 - Os chefes dos gabinetes dos membros do Governo ficam subordinados, na previsão do normativo citado na anterior conclusão 1., a lei especial, que, todavia, não foi ainda citada;
3 - De harmonia com o disposto no artigo 8, n 1, do Decreto-Lei n 262/88, os chefes dos gabinetes, assim como os restantes membros dos gabinetes governamentais, estão sujeitos aos deveres gerais que impendem sobre os funcionários e agentes da Administração Pública, entre os quais sobreleva o dever de imparcialidade a que se referem o artigo 266, n 2, da Constituição, o artigo 3, n 3, do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei n 24/84, de 16 de Janeiro, e o artigo 6 do Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n 442/91, de 15 de Novembro;
4 - O dever de imparcialidade implica para os chefes dos gabinetes, enquanto não for editada a lei própria mencionada na anterior conclusão 2., a sujeição ao sistema de incompatibilidades aplicável aos funcionários e agentes da Administração pública, conforme o artigo 9 do Decreto-Lei n 323/89, de 26 de Setembro, e os artigos 31 e 32 do Decreto-Lei n 427/89, de 7 de Dezembro;
5 - A observância deste regime de incompatibilidades corresponde, aliás, a um dever geral do funcionalismo público e, portanto, dos chefes dos gabinetes;
6 - Dos preceitos citados na anterior conclusão 4. deriva uma incompatibilidade meramente relativa entre o exercício cumulativo de funções públicas e de actividades privadas, susceptível de ser removida mediante autorização do membro do Governo competente, com subordinação aos pressupostos aí definidos;
7 - O cargo de vogal do conselho fiscal da EDM - Empresa de Desenvolvimento Mineiro, S.A., configurado nos termos resultantes do Decreto-Lei n 313/89, de 21 de Setembro, dos estatutos por este diploma aprovados e demais legislação conexa, não deve qualificar-se como cargo ou função pública, caracterizando-se antes como actividade de natureza privada nos termos e para os efeitos dos normativos aludidos na anterior conclusão 4.;
8 - Existe, pois, incompatibilidade relativa, susceptível de ser afastada nos termos definidos na conclusão 6., entre o desempenho do cargo de chefe de gabinete de um membro do Governo e o exercício do cargo de vogal do conselho fiscal a que se reporta a conclusão 7.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Secretário de Estado da Energia,
Excelência:



I
O Senhor Chefe do Gabinete de Vossa Excelência colocou ao Senhor Presidente da Assembleia Geral da EDM-Empresa de Desenvolvimento Mineiro, S.A., a questão da compatibilidade, face à Lei nº 9/90, de 1 de Março, entre o exercício daquelas funções e o desempenho do cargo de vogal do conselho fiscal da empresa aludida, declarando que até ao esclarecimento da situação existente se absteria de praticar qualquer acto relacionado com este último e solicitando do mesmo passo a suspensão do respectivo mandato ou a substituição no mesmo cargo.
O Senhor Presidente da Assembleia Geral da EDM despachou no sentido de ser dado conhecimento a Vossa Excelência "enquanto representante do accionista Estado" e Vossa Excelência dignou-se solicitar o parecer deste Conselho sobre a efectiva possibilidade de acumulação na situação exposta.
A dilucidação da problemática posta aconselha em primeiro lugar a análise da natureza e conteúdo funcional dos cargos hipoteticamente conflituantes 1), e, seguidamente, a ponderação da compatibilidade no seu exercício cumulativo à luz das disposições legais aplicáveis, nomeadamente os normativos da citada Lei nº 9/90, de 1 de Março.
Cumpre, nestes termos, emitir parecer.

II

1. Vejamos então o cargo de vogal do conselho fiscal da EDM.

1.1. A EDM - Empresa de Desenvolvimento Mineiro, S.A. resultou da transformação, operada pelo Decreto-Lei nº 313/89, de 21 de Setembro, da empresa pública com a mesma denominação 2) em "pessoa colectiva de direito privado, sob a forma de sociedade anónima, com maioria de capitais públicos" (artigo 1º, nº 1) 3).

Rege-se, além do Decreto-Lei nº 313/89, pela Lei nº 84/88, de 20 de Julho, pelos seus estatutos, aprovados mediante aquele diploma e ao mesmo anexos, e pelas normas de direito privado aplicáveis às sociedades anónimas (artigos 1º, nº 2, e 8º, nº 1).
Tem como órgãos sociais "a assembleia geral, o conselho de administração e o conselho fiscal, com as competências fixadas na lei e nos estatutos" (artigo 4º).
Anote-se, desde já, que o conselho fiscal deve enviar "trimestralmente aos Ministros das Finanças e da Indústria e Energia um relatório sucinto em que se refiram os controlos efectuados, as anomalias detectadas e os principais desvios em relação às previsões" (artigo 5º, nº 2).
Consigna-se expressamente que os "direitos do Estado, como accionista da sociedade, são exercidos através de representante designado por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Indústria e Energia, salvo quando a gestão das acções tenha sido cometida a outra entidade, nos termos do nº 3 do presente artigo" (artigo 5º, nº 6) 4)

E os "funcionários do Estado, de institutos públicos e de autarquias locais, bem como os trabalhadores de empresas públicas ou de sociedades anónimas de capitais públicos, podem ser autorizados a exercer quaisquer cargos ou funções na sociedade, em regime de requisição, conservando todos os direitos e regalias inerentes ao seu quadro de origem, incluindo antiguidade, reforma e outras regalias" (artigo 6º, nº 2) 5)

1.2. À sombra dos dispositivos do diploma fundacional se acolhe a disciplina estatutária da EDM, que agora interessa analisar nas suas coordenadas essenciais.
Nos termos do artigo 3º, nº 1, dos estatutos, a sociedade tem por objecto principal:
Artigo 3º - 1 - (...)
a) A prospecção, pesquisa, extracção, beneficiação e processamento de substâncias minerais metálicas e não metálicas, bem como a comercialização das mesmas e dos produtos e subprodutos resultantes do seu tratamento;
b) O exercício de actividades de investigação aplicada e desenvolvimento tecnológico, visando directamente o investimento produtivo, através de iniciativas empresariais por si comparticipadas;
c) A gestão das participações sociais cuja titularidade lhe pertença ou cujos poderes de gestão lhe hajam sido confiados por contrato em sociedades que tenham por objecto as actividades referidas na alínea a);
d) A promoção de projectos de investimento e da constituição de sociedades com objectos relacionados com a indústria extractiva, fomentando, em especial, a associação de interesses públicos e privados."
Acessoriamente - acrescenta o nº 3 do mesmo artigo 3º - "pode ainda a sociedade exercer outras actividades industriais, comerciais e de serviços, quer directamente, quer em associação com terceiros".
Os órgãos sociais são, como já resultava do Decreto-Lei nº 313/89, a assembleia geral, o conselho de administração e o conselho fiscal (artigo 7º, nº 1), e o mandato dos respectivos titulares tem a duração de três anos renováveis uma ou mais vezes (nº 2).
Ao conselho fiscal, composto por um presidente e dois vogais efectivos e um suplente, eleitos pela assembleia geral, compete, principalmente, "a fiscalização da sociedade" (artigos 9º, nº 1, alínea b), e 17º, nº 1) 6)

Manifestação relevante desta actividade de fiscalização, o parecer, que lhe compete emitir anualmente, sobre o relatório do conselho de administração, o balanço e as contas, com vista à sua apreciação, discussão e votação em assembleia geral (artigo 9º, nº 1, alínea a)), órgão, aliás, a cujas reuniões deverão os membros do conselho fiscal estar presentes, podendo participar nos trabalhos sem direito a voto nessa qualidade (artigo 8º, nº 1).
Instrumentalmente, compete ainda ao conselho fiscal requerer a convocação da assembleia geral e do conselho de administração aos respectivos presidentes (artigos 11º, nº 1, e 15º, nº 1).
As suas deliberações são tomadas por "maioria dos votos expressos e estando presente a maioria dos membros em exercício" 7), assistindo ao presidente voto de qualidade (artigo 18º).
Embora nada se diga especificamente da remuneração dos titulares do conselho fiscal, admite-se que essa remuneração seja de preceito. Por isso dispõe o artigo 9º, nº 1, alínea d) competir à assembleia geral "deliberar sobre as remunerações dos membros dos corpos sociais, podendo designar, para o efeito, uma comissão de vencimentos".

1.3. Em conformidade com o artigo 1º, nº 2, do Decreto-Lei nº 313/89, de 21 de Setembro, a EDM rege-se também pela Lei nº 84/88, de 20 de Julho, e pelas normas de direito privado aplicáveis às sociedades anónimas.

1.3.1. A Lei nº 84/88 regulou em geral a transformação das empresas públicas em sociedades anónimas. Daí que as regras passadas em revista dêem de algum modo tradução aos imperativos dessa Lei, em cujo contexto inexistem, de resto, outros normativos com relevo na temática do parecer 8)


1.3.2. Por seu turno, as normas de direito privado relativas às sociedades anónimas constam fundamentalmente do Código das Sociedades Comerciais, havendo a considerar sobretudo os normativos que integram o seu Título IV, "Sociedades anónimas" (artigos 271º a 464º) 9)

Interessa-nos a Secção II ("Conselho fiscal", artigos 413º a 423º) do Capítulo VI ("Administração e fiscalização", artigos 390º a 466º) desse Título, podendo, no entanto, abstrair-se desde já de um determinado número de disposições neste momento menos importantes, ou que obtêm, "grosso modo", concretização no estatuto da EDM: os artigos 413º ("Composição do órgão de fiscalização"), 415º ("Designação e substituição"), 416º ("Nomeação oficiosa do revisor oficial de contas"), 417º ("Nomeação judicial a requerimento da administração ou de accionistas"), 418º ("Nomeação judicial a requerimento de minorias"), 419º ("Destituição") e 423º ("Reuniões e deliberações") 10)

Das restantes, o artigo 414º define os "requisitos e incompatibilidades" a que se encontram sujeitos os membros do conselho fiscal, sendo certo, porém, que nenhum dos seus dispositivos se reveste de relevo no problema que nos ocupa 11) 12)
Já importará, porventura, atentar na competência e poderes do conselho e nos deveres dos respectivos membros segundo o teor dos artigos 420º, 421º e 422º:

"Artigo 420º
(Competência do conselho fiscal)
1 - Compete ao conselho fiscal:
a) Fiscalizar a administração da sociedade;
b) Vigiar pela observância da lei e do contrato de sociedade;
c) Verificar a regularidade dos livros, registos contabilísticos e documentos que lhe servem de suporte;
d) Verificar, quando o julgue conveniente e pela forma que entenda adequada, a extensão da caixa e as existências de qualquer espécie dos bens ou valores pertencentes à sociedade ou por ela recebidos em garantia, depósito ou outro título;
e) Verificar a exactidão do balanço e da demonstração dos resultados;
f) Verificar se os critérios valorimétricos adoptados pela sociedade conduzem a uma correcta avaliação do património e dos resultados;
g) Elaborar anualmente relatório sobre a sua actividade fiscalizadora e dar parecer sobre o relatório, contas e propostas apresentados pela administração;
h) Convocar a assembleia geral, quando o presidente da respectiva mesa o não faça, devendo fazê-lo;
i) Cumprir as demais atribuições constantes da lei ou do contrato de sociedade.
2 - Os membros do conselho fiscal devem proceder, conjunta ou separadamente e em qualquer época do ano, a todos os actos de verificação e inspecção que considerem convenientes para o cumprimento das suas obrigações de fiscalização.
3 - O revisor oficial de contas (...) (...);.

"Artigo 421º
(Poderes do conselho)
1 - Para o desempenho das suas funções, podem os membros do conselho fiscal, conjunta ou separadamente:.
a) Obter da administração a apresentação, para exame e verificação, dos livros, registos e documentos da sociedade, bem como verificar as existências de qualquer classe de valores (...);
b) Obter da administração ou de qualquer dos administradores informações (...);
c) Obter de terceiros que tenham realizado operações por conta da sociedade as informações (...);
d) Assistir às reuniões da administração, sempre que o entendam conveniente;
2 - (...)
"Artigo 422º
(Deveres dos membros do conselho fiscal)
1 - Os membros do conselho fiscal têm o dever de:
a) Participar nas reuniões do conselho e assistir às assembleias gerais e bem assim às reuniões da administração para que o presidente da mesma os convoque ou em que se apreciem as contas do exercício;
b) Exercer uma fiscalização conscienciosa e imparcial;
c) Guardar segredo dos factos e informações de que tiverem conhecimento em razão das suas funções, sem prejuízo do dever enunciado no nº 3 deste artigo;
d) Dar conhecimento à administração das verificações, fiscalizações e diligências que tenham feito e do resultado das mesmas;
e) Informar, na primeira assembleia que se realize, de todas as irregularidades e inexactidões por eles verificadas, e bem assim se obtiveram os esclarecimentos de que necessitaram para o desempenho das suas funções.
2 - Os membros do conselho fiscal não podem aproveitar-se, salvo autorização expressa e por escrito, de segredos comerciais ou industriais de que tenham tomado conhecimento no desempenho das suas funções.
3 - Os membros do conselho fiscal devem participar ao Ministério Público os factos delituosos de que tenham tomado conhecimento e que constituam crimes públicos; desta participação não pode resultar responsabilidade para os participantes, salvo se for caluniosa.
4 - Perdem o seu cargo os membros do conselho fiscal que, sem motivo justificado, não assistam, durante o exercício social, a duas reuniões do conselho ou não compareçam a uma assembleia geral ou a duas reuniões da administração previstas na alínea a) do nº 1 deste artigo."

2. Bosquejada a natureza e função do cargo de vogal do conselho fiscal da EDM, interessa adquirir idêntica noção acerca do cargo de chefe de gabinete.
O regime dos gabinetes dos membros do Governo foi recentemente revisto pelo Decreto-Lei nº 262/88, de 23 de Julho 13).

2.1. A nota preambular esclarece as intenções que presidiram à edição do diploma.
Constatada, por um lado, "a dispersão legislativa referente à composição, orgânica e regime dos gabinetes dos membros do Governo", impunha-se "a reunificação num único diploma daquelas normas, bem como a sua actualização" 14)

Estando confiadas aos gabinetes "tarefas de coadjuvação dos membros do Governo", interessava, por outro lado, "adequar a sua composição à amplitude e diversidade de funções dos seus titulares", sem que com estas medidas "se pretendam substituir os serviços da Administração Pública".
"Importa ainda considerar - prossegue-se no exórdio - a multiplicidade de tarefas cometidas aos membros do Governo, pelo que se criam novas condições e se melhoram condições de actuação dos respectivos gabinetes, permitindo, designadamente, o recurso ao regime de prestação de serviços quando a especificidade do interesse público em causa assim o exija".
E, após alusão ao "funcionamento, junto dos gabinetes governamentais, de responsáveis pelo acompanhamento de assuntos de interesse comum aos vários departamentos", conclui-se acerca do estatuto do pessoal dos gabinetes: "(...) contemplam-se, em letra de lei, os deveres respectivos, garantindo-se ainda que os membros dos gabinetes, nos termos do artigo 50º da Constituição da República Portuguesa, não possam ser prejudicados na sua colocação, emprego, carreira profissional e benefícios sociais a que tenham direito em virtude do desempenho de cargos públicos, o que permite criar melhores situações de alargamento da respectiva área de recrutamento."

2.2. Na intencionalidade apontada o artigo 1º, procurando delimitar o âmbito de aplicação do diploma, dispõe que este "estabelece a composição, a orgânica e o regime dos gabinetes dos membros do Governo" (nº 1), os quais "têm por função coadjuvar o membro do Governo respectivo no exercício das suas funções" (nº 2) 15)

No tocante à composição, estipula o artigo 2º que os gabinetes "são constituídos pelo chefe do gabinete, pelos adjuntos do gabinete e pelos secretários pessoais" (nº 1).
Para assuntos interdepartamentais podem ser nomeados "conselheiros técnicos", equiparados a adjuntos para todos os efeitos (nº 2), e, para a realização de estudos, trabalhos ou missões de carácter eventual ou extraordinário, podem ser chamados "especialistas", nomeados por despacho do membro do Governo respectivo, no qual se estabelecem a duração, termos e remuneração dos estudos, trabalhos ou missões (nºs 3 e 4).
As competências e o número dos membros do gabinete vêm definidos nos artigos 3º, 4º e 5.
Interessa-nos apenas o artigo 3º referente ao chefe do gabinete 16):


"Artigo 3º
Competências dos chefes de gabinete
1 - Ao chefe do gabinete compete a coordenação do gabinete e ligação aos serviços integrados ou independentes do respectivo departamento ministerial, bem como aos outros departamentos do Estado.
2 - É atribuída ao chefe do gabinete competência para a prática de actos ao abrigo de delegação de poderes do membro do Governo respectivo.
3 - Nas suas ausências ou impedimentos, o chefe do gabinete será substituído por um dos adjuntos designado pelo membro do Governo respectivo."
"Os membros dos gabinetes são livremente nomeados e exonerados pelo membro do Governo de que dependem" (artigo 6º, nº 1), considerando-se, "para todos os efeitos, em exercício de funções a partir da data do despacho que os tiver nomeado, com dispensa do visto do Tribunal de Contas e independentemente de publicação no Diário da República" (nº 2).
A nomeação dispensa, aliás, "a autorização do membro do Governo de que depende o respectivo serviço público de origem, sem prejuízo da audição de outras entidades, quando legalmente exigível" (nº 3).
Quando "os nomeados sejam membros das forças Armadas, magistrados, funcionários ou agentes da administração central, regional ou local, de institutos públicos e empresas públicas ou privadas exercerão os seus cargos em regime de comissão de serviço ou de requisição, conforme os casos, e com a faculdade de optar pelas remunerações correspondentes aos cargos de origem" (nº 4).
O artigo 7º define nos seus seis números as "garantias dos membros dos gabinetes" em aspectos como os seguintes: estabilidade do seu emprego, carreira profissional e regime de segurança social de que beneficiem; tempo de serviço; direitos, subsídios, regalias sociais, remuneratórias e outras, correspondentes ao lugar de origem; concursos e promoções; regalias dos serviços sociais dos departamentos respectivos.
Os deveres dos membros dos gabinetes são referidos no artigo 8º:

"Artigo 8º
Deveres dos membros dos gabinetes
1 - Os membros dos gabinetes estão sujeitos aos deveres gerais que impendem sobre os funcionários e agentes da Administração Pública, nomeadamente aos deveres de diligência e sigilo sobre todos os assuntos que lhes forem confiados ou de que tenham conhecimento por causa do exercício das suas funções.
2 - Os membros dos gabinetes estão isentos de horário de trabalho, não lhes sendo, por isso, devida qualquer remuneração a título de horas extraordinárias."
O "vencimento dos membros dos gabinetes é o que se encontra fixado na lei para as respectivas categorias, podendo ser atribuído ao chefe do gabinete e aos adjuntos um abono mensal para despesas de representação de montante não superior a metade do atribuído aos secretários de Estado", mediante despacho do Primeiro-Ministro (artigo 9º, nºs 1 e 2) 17)

Encerram o articulado, além do artigo 13º já referido, preceitos relativos a apoio técnico e administrativo aos gabinetes (artigos 10º e 11º) e disposições específicas dos gabinetes e das auditorias jurídicas junto dos ministros da República (artigo 12º) que, pelo seu menor interesse no âmbito da consulta, tanto mais que está em causa o cargo de Chefe do Gabinete de Vossa Excelência, nos dispensamos de analisar.

2.3. Diga-se, aliás, que também a Lei Orgânica do Ministério da Indústria e Energia, aprovada pelo Decreto-Lei nº 206/89, de 27 de Junho, não contém normativos relativos aos gabinetes governamentais respectivos 18), ou outros, nomeadamente respeitando a incompatibilidades, susceptíveis de aplicar-se aos membros daqueles gabinetes.

III
1. A Lei nº 9/90, de 1 de Março, definiu o regime de incompatibilidades de cargos políticos e de altos cargos públicos.
Ao universo dos titulares de semelhantes cargos referia-se o artigo 1º:
"Artigo 1º
Âmbito
1 - São considerados titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, para os efeitos da presente lei:
a) Primeiro-Ministro e membros do Governo;
b) Ministro da República para as regiões autónomas;
c) Membro de governo regional;
d) Alto-Comissário contra a Corrupção;
e) Membros da Alta Autoridade para a Comunicação Social;
f) Governador e vice-governador civil;
g) Governador e secretário adjunto do governador de Macau;
h) Presidente e vereador a tempo inteiro das câmaras municipais;
i) Governador e vice-governador do Banco de Portugal;
j) Gestor público ou presidente de instituto público autónomo;
k) Director-Geral ou equiparado.
2 - São equiparados a titulares de altos cargos públicos todos aqueles cuja nomeação, assente no princípio da livre designação pelas entidades referidas nos números anterior, se fundamente em razões de especial confiança ou responsabilidade e como tal sejam declarados por lei."
As incompatibilidades vêm definidas no artigo 2º:

"Artigo 2º
Incompatibilidades
A titularidade dos cargos enumerados no artigo antecedente implica, durante a sua pendência, para além das previstas na Constituição, as seguintes incompatibilidades:
a) O exercício remunerado de quaisquer outras actividades profissionais ou de função pública que não derive do seu cargo e o exercício de actividades de representação profissional;
b) A integração em corpos sociais de empresas ou sociedades concessionárias de serviços públicos, instituições de crédito ou parabancárias, seguradoras, sociedades imobiliárias ou quaisquer outras empresas intervenientes em contratos com o Estado e demais pessoas colectivas de direito público;
c) O desempenho de funções em órgão executivo de fundação subsidiada pelo Estado;
d) A detenção de partes sociais de valor superior a 10% em empresas que participem em concursos públicos de fornecimento de bens ou serviços no exercício de actividade de comércio ou indústria, em contratos com o Estado e outras pessoas colectivas de direito público."
O artigo 3º estabelecia, por seu turno, determinados impedimentos aplicáveis aos titulares dos cargos:

"Artigo 3º
Impedimentos
Os titulares dos cargos descritos no artigo 1º estão impedidos de servir de perito ou árbitro, a título remunerado, em qualquer processo em que sejam parte o Estado e demais pessoas colectivas de direito público, no prazo de um ano após a sua exoneração do cargo."
E o artigo 4º prevenia excepções ao regime geral de incompatibilidades:

"Artigo 4º
Excepção
1 - As actividades de mera administração do património pessoal e familiar existente à data de início de funções referidas no artigo 1º não estão sujeitas ao disposto no artigo 2º, salvo a participação superior a 10% em empresas que contratem com a entidade pública na qual desempenhe o seu cargo.
2 - Não se consideram sujeitos ao regime de incompatibilidade e impedimentos previstos nos artigos anteriores os docentes do ensino superior e os investigadores científicos ou similares que exerçam a título gratuito as suas funções.
3 - O disposto na presente lei não exclui a possibilidade da participação das entidades referidas na alínea k) do nº 1 do artigo 1º em conselhos consultivos, comissões de fiscalização ou outros organismos colegiais, quando previstos na lei e no exercício de fiscalização ou controlo de dinheiros públicos.
4 - Não é excluída a possibilidade de o gestor de empresa pública ou empresa de capitais maioritariamente públicos desempenhar funções em órgãos sociais de empresas a ela associadas."
Os artigos 5º a 9º contêm normas instrumentais e de tutela do sistema de incompatibilidades, sem interesse no contexto deste parecer - sanções, dispositivos processuais, declaração de inexistência de incompatibilidades.
O artigo 10º estabelece um regime transitório do seguinte teor:

"Artigo 10º
Regime transitório
1 - Os titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos em exercício à data da publicação da presente lei cumprirão as obrigações nela previstas nos 60 dias posteriores à respectiva entrada em vigor.
2 - Os titulares dos cargos indicados nas alíneas f) e h) do nº 1 do artigo 1º da presente lei não estão abrangidos pelas incompatibilidades referidas na alínea a) do artigo 2º até ao fim do seu actual mandato.
3 - Enquanto não tiver lugar a extinção do Conselho de Comunicação Social, nos termos da Constituição e da lei, são aplicáveis aos respectivos membros as disposições da presente lei."
Por último, o artigo 11º remete para lei especial a disciplina de incompatibilidades aplicável aos deputados da Assembleia da República, enquanto o artigo 12º pretende providenciar acerca da data de entrada em vigor da lei - "no prazo de 60 dias após a sua publicação".

2. Ainda antes do início de vigência do diploma, o Partido Social Democrata, tendo em vista a sua alteração, apresentou na Assembleia o Projecto de Lei nº 524/V, com a motivação seguinte 19):

"(...) A Lei nº 9/90, de 1 de Março, que aprovou o novo regime de incompatibilidade de cargos políticos e altos cargos públicos, constitui um passo muito relevante na política de transparência, isenção e rigor que deve reger o exercício de tais cargos, quer pela dignificação das funções que ao Estado estão cometidas, quer pela salvaguarda do prestígio e da independência dos respectivos titulares. Reconhece-se, no entanto, que nem sempre a forma externa das normas reflectiu suficientemente bem a verdadeira intenção do legislador, pelo que, sem se pôr em causa a evidente bondade material das mesmas, se afigura necessário proceder a alguns ajustamentos formais, de modo que a letra da lei não induza a situações equívocas. Na verdade, nalguns casos pontuais, a lei peca simultaneamente por defeito e por excesso, havendo assim que delimitar correctivamente tais situações.
"(...) Ao incluir os directores-gerais no âmbito dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, a Lei nº 9/90, de 1 de Março, inibiu-os de exercer qualquer outra actividade remunerada, de natureza pública ou privada, com excepção das que derivam do seu cargo e das que derivam da representação profissional.
Com esta norma, a Lei nº 9/90 afastou o regime que pouco tempo antes tinha sido definido no Decreto-Lei nº 323/89, de 26 de Setembro, que aprovou o estatuto do pessoal dirigente da função pública, e que coincidia, no essencial, com aquele que vinha vigorando desde 1979: a exclusividade de funções dirigentes como regra, admitindo-se como excepções aquelas que o interesse público viesse justificando, nomeadamente as funções docentes nos estabelecimentos de ensino superior.
"(...) Por outro lado, corrigem-se ainda alguns lapsos técnicos, como a referência autónoma ao governador e vice-governador do Banco de Portugal, os quais são também gestores públicos, estando, em consequência, já integrados noutra previsão normativa mais genérica.
Da mesma forma, não se justificava nem a omissão relativamente aos vogais da direcção de institutos públicos e aos subdirectores-gerais, nem tão pouco a falta de equiparação dos gestores públicos aos administradores de sociedades anónimas de capitais exclusivamente públicos; por outro lado, não faz também sentido a extensão do regime de incompatibilidades aos gestores públicos e similares que exerçam funções não executivas.
Noutro ponto susceptível de interpretações contraditórias clarifica-se ainda o regime aplicável aos gabinetes ministeriais e equiparados, o qual deve continuar a ser aquele que já consta da legislação própria 20).

"(...) Finalmente alarga-se o âmbito do regime transitório aos gestores públicos e aos directores-gerais, ou equiparados, por se entender que não devem alterar-se as condições do exercício dos actuais mandatos até estes findarem".
A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias emitiu em 3 de Maio de 1990 o seguinte parecer sobre o Projecto 21):

"O diploma em apreço excepciona ao regime de incompatibilidade da presente lei o pessoal dos gabinetes dos membros do Governo, remetendo a sua disciplina para legislação própria.
"A solução delineada coloca-nos perante a dúvida sobre se o exercício de certas funções, cujo poder prático é de assinalável amplitude, pela delegação efectiva de poderes que representa, não justifica uma colocação idêntica à da entidade sob cuja confiança e responsabilidade exercem o poder (cfr. nº 2 do artigo 1º da Lei nº 9/90).
"Foi a esta filosofia que a Assembleia da República aderiu, por consenso, não extractando dela os membros dos gabinetes ministeriais.
(...)
(...)
"(...) O diploma agora em apreço considera não abrangidos pelo regime de incompatibilidade os actuais governadores e vice-governadores civis e presidente e vereador a tempo inteiro das câmaras municipais, tal como já o previa a lei vigente (ponto em relação ao qual a oposição se manifestou desfavoravelmente), mas alarga essa não incompatibilidade aos presidentes de institutos públicos autónomos, de empresa pública ou de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, gestores públicos, membros do conselho de administração de sociedades anónimas de capitais exclusivamente públicos e vogais da direcção de institutos públicos autónomos, desde que exerçam funções executivas (cargos que agora especificam a anterior referência genérica a gestor público ou presidente de instituto público), director-geral e subdirector-geral ou equiparado.
"(...) (...)"
O Partido Social Democrata emitiu relativamente ao parecer da Comissão a seguinte declaração de voto 22):

"1 - O PSD votou favoravelmente a Lei nº 9/90, de 9 de Março, aquando da sua discussão e apreciação na Assembleia da República.
"2 - Porém, após a publicação do referido diploma, constataram-se alguns efeitos perversos, que importa corrigir, e algumas dúvidas, que importa esclarecer.
"3 - A delicadeza da matéria impunha, pois, nova iniciativa legislativa que atendesse às questões surgidas, o que se concretiza, agora, com o projecto de Lei nº 524/V.
"4 - Tais questões são fundamentalmente as seguintes:
a) Julgou-se necessário esclarecer que os membros dos gabinetes ministeriais e equiparados não estão abrangidos pela Lei nº 9/90, mas por legislação especial, o que é, aliás, a única solução razoável face às consequências penais da infracção ao regime estabelecido por este diploma;
b) O tempo decorrido desde a publicação da lei deixou compreender que se está em risco, em virtude de algumas das suas disposições, de que muitos docentes de ensino superior optem por abandonar tais funções, o que terá consequências muito negativas;
c) O âmbito geral da aplicação da lei necessitou manifestamente de algum alargamento, por argumento de igualdade de razão (administrador de sociedades de capitais públicos, vogais de direcção de institutos públicos autónomos e subdirectores-gerais), e do esclarecimento de que não é aplicável a gestores em regime não executivo.
"5 - Não se compreendem, assim, alguns dos considerados (nºs 4 a 7) do parecer ora votado, enquanto indiciários ou reveladores de discordância relativamente ao projecto de Lei nº 524/V e soluções nele consagradas".

3. O Projecto de Lei aludido deu origem à Lei nº 56/90, de 5 de Setembro.
O artigo 1º deste diploma introduziu nova redacção nos artigos 1º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º da Lei nº 9/90; o artigo 2º revogou expressamente os artigos 9º, 10º e 11º da mesma Lei; o artigo 3º incluiu normas de cujo teor daremos conta dentro de momentos.
Em consequência, a configuração da lei nº 9/90, com as modificações introduzidas pela Lei nº 56/90, ficou como segue.

"Artigo 1º
Âmbito
1 - Para os efeitos da presente lei são considerados titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos:
a) Presidente da República;
b) Primeiro-Ministro e membro do Governo;
c) Ministro da República para as regiões autónomas;
d) Membro de governo regional;
e) Alto-Comissário contra a Corrupção;
f) Membro da Alta Autoridade para a Comunicação Social;
g) Governador e vice-governador civil;
h) Governador e secretário-adjunto do governador de Macau;
i) Presidente e vereador a tempo inteiro das câmaras municipais;
j) Presidente de instituto público autónomo, de empresa pública ou de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos;
l) Gestor público, membro de conselho de administração de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos e vogal da direcção de instituto público autónomo, desde que exerçam funções executivas;
m) Director-Geral e subdirector-geral ou equiparado.
2 - O Governo deve definir, por decreto-lei, no prazo de 90 dias, o regime de incompatibilidades aplicável àqueles cuja nomeação, assente no princípio da livre designação pelas entidades referidas no número anterior, se fundamente por lei em razões de especial confiança e que exerçam funções de maior responsabilidade de modo a garantir a inexistência de conflitos de interesses."
Anote-se, sobretudo, a modificação introduzida no nº 2 do artigo 1º 23), que dentro em pouco será objecto de atenção, e recorde-se que o artigo 2º permaneceu na sua versão original.
"Artigo 3º
Impedimentos
1 - Os titulares dos cargos descritos no nº 1 do artigo 1º estão impedidos de servir de árbitro ou de perito, a título remunerado, em qualquer processo em que sejam parte o Estado e demais pessoas colectivas de direito público.
2 - Nos casos previstos nas alíneas a), b), c), d) e h) do nº 1 do artigo 1º, o impedimento verifica-se mesmo que a participação não seja remunerada.
3 - O impedimento mantém-se até ao fim do prazo de um ano após a cessação de funções.

"Artigo 4º
Excepção
1 - As actividades de mera administração do património pessoal e familiar existente à data do início das funções referidas no artigo 1º não estão sujeitas ao disposto no artigo 2º, salvo no caso de participação superior a 10% em empresas que contratem com a entidade pública na qual o titular desempenhe o seu cargo.
2 - Nos casos previstos nas alíneas e), f), g), i), j), l) e m) do nº 1 do artigo 1º, o disposto na alínea a) do artigo 2º não obsta ao exercício de funções de docente do ensino superior e de investigador científico ou similar, nos termos previstos à data da entrada em vigor da presente lei.
3 - O disposto na presente lei não exclui a possibilidade da participação das entidades referidas na alínea m) do nº 1 do artigo 1º em conselhos consultivos, comissões de fiscalização ou outros organismos colegiais, quando previstos na lei, no exercício da fiscalização ou controlo de dinheiros públicos.
4 - Não é excluída a possibilidade de o gestor de empresa pública ou empresa de capitais maioritariamente públicos desempenhar funções em órgãos sociais de empresas a ela associadas.
5 - Não é incompatível a participação dos titulares de cargos políticos referidos na alínea i) do nº 1 do artigo 1º nos órgãos sociais de empresas que prossigam fins de reconhecido interesse público local em que a respectiva autarquia ou associação de municípios participe, desde que o exercício de funções não seja remunerado.
6 - Os vereadores em regime de meio tempo encontram-se sujeitos às incompatibilidade previstas na presente lei, com as seguintes excepções:
a) Não são aplicáveis as incompatibilidades previstas na alínea a) do artigo 2º e no nº 1 do artigo 3º da Lei nº 29/87, de 30 de Junho;
b) É admissível a participação de vereadores em regime de meio tempo em órgãos sociais de empresa que prossiga fins de reconhecido interesse público local em que a respectiva autarquia ou associação de municípios participe e a remuneração percebida no exercício de tais cargos acumulada com a de vereador a tempo parcial não exceda a de vereador a tempo inteiro".
O artigo 5º define em moldes diferentes o "regime sancionatório"; o artigo 6º regula a apresentação da declaração de incompatibilidades; o artigo 7º reenvia para lei especial o sistema de incompatibilidades aplicável aos deputados à Assembleia da República (nº 1), e submete a esse mesmo sistema os deputados ao Parlamento Europeu (nº 2).
O regime transitório que antes constava do artigo 10º passa a figurar no novo artigo 8º:

"Artigo 8º
Regime transitório
1 - Os titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos em exercício à data da publicação da presente lei devem cumprir as obrigações nela previstas nos 60 dias posteriores à sua entrada em vigor.
2 - Os titulares, aquando da entrada em vigor da presente lei, dos cargos referidos na alínea g) do nº 1 do artigo 1º, bem como, até ao fim do respectivo mandato, os então titulares dos cargos referidos nas alíneas i), j), l) e m), não estão abrangidos pelas incompatibilidades referidas na alínea a) do artigo 2º, continuando sujeitos ao regime de incompatibilidades vigente à data da entrada em vigor da presente lei.
3 - Enquanto não tiver lugar a extinção do Conselho de Comunicação Social, nos termos da Constituição e da lei, são aplicáveis aos respectivos membros as disposições da presente lei."
E o artigo 3º, rematando o articulado da Lei nº 56/90, dispõe:
"Art. 3º - 1 - O nº 2 do artigo 8º da Lei nº 9/90, de 1 de Março, é aplicável aos presidentes e membros do conselho de administração de sociedades anónimas de capitais exclusivamente públicos, aos vogais da direcção de institutos públicos autónomos, e aos subdirectores-gerais e equiparados, titulares de tais cargos à data da publicação da presente lei.
2 - Os efeitos da presente lei reportam-se à data da entrada em vigor da Lei nº 9/90, de 1 de Março, quanto aos titulares de cargos já abrangidos por aquela lei.
3 - Quanto aos restantes titulares, a presente lei só produz efeitos no prazo de 60 dias após a sua publicação."

4. Centre-se a atenção no nº 2 do artigo 1º:
"(...)
2. O Governo deve definir, por decreto-lei, no prazo de 90 dias, o regime de incompatibilidades aplicável àqueles cuja nomeação, assente no princípio da livre designação pelas entidades referidas no número anterior, se fundamente por lei em razões de especial confiança e que exerçam funções de maior responsabilidade de modo a garantir a inexistência de conflitos de interesses."
Anote-se, em primeiro lugar, não poderem restar dúvidas de que os membros dos gabinetes governamentais, pelo menos os chefes do gabinete, estão compreendidos no âmbito de aplicação pessoal deste normativo.
Vimos, à face do Decreto-Lei nº 262/88, de 23 de Julho (supra, II, 2.2.), como são "livremente nomeados e exonerados pelo membro do Governo de que dependem" (artigo 6º, nº 1), considerando-se "para todos os efeitos, em exercício de funções a partir da data do despacho que os tiver nomeado, com dispensa do visto do Tribunal de Contas e independentemente de publicação no Diário da República" (artigo 6º, nº 2).
A sua nomeação dispensa, inclusive, autorização das entidades de que originariamente dependam (artigo 6º, nºs 3 e 4).
Este regime singularíssimo só pode explicar-se pela importância das funções assinadas ao gabinete, que vão, desde a quotidiana coadjuvação ao membro do Governo respectivo (artigo 1º, nº 2), até à "prática de actos ao abrigo de delegação de poderes" desta entidade, que a lei possibilita ao chefe do gabinete (artigo 3º, nº 2).
Competências cuja concreta radicação na esfera de determinados sujeitos tem necessariamente razão de ser em virtude de uma relação de especial confiança entre o membro do Governo e os titulares do seu gabinete.
De resto, na discussão parlamentar do projecto que esteve na base da Lei nº 56/90 ninguém duvidou de que os membros dos gabinetes governamentais eram precisamente visados pela citada disposição - os nºs 2 e 3 do artigo 1º, na versão primitiva do projecto -, revelando-se o debate, aliás, substancialmente mobilizado e dinamizado em torno dessa ideia 24)

Posto isto, compare-se, por outro lado, o teor do nº 2 do artigo 1º da Lei nº 9/90 na sua redacção original (supra, III, 1.) e na redacção introduzida pela Lei nº 56/90.
Ali, os chefes do gabinete eram equiparados a titulares de altos cargos públicos e ficavam, mercê da equiparação, submetidos ao regime de incompatibilidades definido na mesma Lei.
Agora, eliminando-se a equiparação, e remetendo-se para lei própria a disciplina das respectivas incompatibilidades, deixaram de ficar submetidos àquele regime 25)

O nº 2 do artigo 1º da Lei nº 9/90, na sua primitiva versão, foi, por outras palavras, revogado pela Lei nº 56/90 (artigo 7º, nº 2, do Código Civil) 26).

Os chefes de gabinete enquanto tais não estão, portanto, sujeitos às incompatibilidades estabelecidas na Lei nº 9/90, tendo o Governo recebido a incumbência de "definir, por decreto-lei, no prazo de 90 dias, o regime de incompatibilidades" que lhes é aplicável.
Não foi especificada a data a partir da qual se conta o aludido prazo de 90 dias.
Quer, porém, se conte da data da publicação da Lei nº 56/90, quer mesmo a partir do termo do prazo de 60 dias fixado no seu artigo 3º, nº 3 (supra, III, 3.), o certo é que, em qualquer dos casos, o prazo já se esgotou sem que tenha vindo à luz o diploma governamental 27).

Não se encontra, pois, definido actualmente, mediante lei especial, o regime de incompatibilidades aplicável aos chefes dos gabinetes.

5. Vem, todavia, ao espírito a norma do artigo 8º, nº 1, do Decreto-Lei nº 262/88, de 23 de Julho (supra, II, 2.2.):
"Os membros dos gabinetes estão sujeitos aos deveres gerais que impendem sobre os funcionários e agentes da Administração Pública, nomeadamente aos deveres de diligência e sigilo sobre todos os assuntos que lhes forem confiados ou de que tenham conhecimento por causa do exercício das suas funções."
Quais são estes "deveres gerais" dos funcionários e agentes da Administração Pública a que os membros dos gabinetes estão sujeitos?
"Uma vez empossado no cargo, o funcionário iniciou a prestação do seu serviço. Os termos em que deve prestá-lo conhece-os pelo exame directo da lei, ou pelas ordens e instruções dos superiores hierárquicos 28)

"Há funcionários que pautam o seu serviço (ou pelo menos a actividade fundamental do seu serviço) exclusivamente pela lei: são os agentes independentes (...) (...).
"Mas a regra na Administração Pública é a de que os deveres de serviço são determinados pela via hierárquica: os agentes estão hierarquizados (...) Por isso em geral o funcionário hierarquizado tem o dever de obediência aos seus legítimos superiores (-).
"Conjuntamente com esse dever (...), o funcionário contrai, porém, outros deveres que terá de observar escrupulosamente como conteúdo ou consequência da sua função.
"É impossível enumerar todos os deveres dos funcionários, porque, a par de um certo número de deveres comuns, há numerosos deveres especiais de cada serviço, de cada categoria e de cada cargo. As obrigações do professor não são as mesmas do magistrado e ambas diferem das do chefe de repartição; as dos dirigentes são maiores que as dos subalternos, etc.".
Deixando de lado os "deveres especiais", o autor que vimos citando procura classificar os "deveres comuns a todos os funcionários" em três grupos: os deveres profissionais, propriamente ditos; os deveres da vida privada; os deveres de carácter político.
"Deveres profissionais são os que estão ligados ao exercício da função e, portanto, só existem na sua plenitude quando o funcionário está em actividade (...).
"Os deveres de conduta na vida privada ou de natureza política (...) pesam sobre o funcionário pelo facto da sua especial vinculação à Administração Pública e, portanto, têm de ser observados quer esteja em actividade, quer não."
Entre os deveres profissionais analisa-se o seguinte elenco não exaustivo 29): o dever de obediência; o dever de residência; o dever de assiduidade; o dever de zelo e aplicação; os deveres de sigilo e de informação; dever de urbanidade e respeito pelos superiores; dever de probidade.
Os deveres na vida privada reconduzem-se à moralidade e à dignidade cívica e social da conduta do funcionário.
Sublinha, porém, a propósito, o mesmo autor 30), que o funcionário tem também "o dever de não exercer actividade privada que impeça de servir convenientemente a função pública ou que pela sua natureza possa comprometer o prestígio desta ou criar riscos para a eficiência ou honestidade do seu exercício. Por isso, em regra, a lei declara a incompatibilidade relativa (isto é, dependente de autorização dos superiores) da função pública com actividades privadas."
No tocante, por último, aos deveres de natureza política apontam-se, por exemplo, o dever de lealdade ao país e o de respeito pelas instituições do Estado.
As análises teóricas dos deveres dos funcionários não andam longe da estrutura bosquejada, embora com especificidades que não nos interessa aqui escalpelizar 31)

Classificação a que a doutrina confere saliência 32), a partir do artigo 3º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei nº 24/84, de 16 de Janeiro, reparte-os em duas categorias: "deveres gerais", comuns à generalidade dos funcionários e agentes, e "deveres especiais", privativos dos funcionários de certos serviços ou de certos extractos de pessoal 33).
.
Dispõe, com efeito, aquele normativo, na parte com interesse:

"Artigo 3º
(Infracção disciplinar)
1 - Considera-se infracção disciplinar o facto, ainda que meramente culposo, praticado pelo funcionário ou agente com violação de algum dos deveres gerais ou especiais decorrentes da função que exerce.
2 - (...)
3 - É dever geral dos funcionários e agentes actuar no sentido de criar no público confiança na acção da Administração Pública, em especial no que à sua imparcialidade diz respeito.
4 - Consideram-se ainda deveres gerais:
a) O dever de isenção;
b) O dever de zelo;
c) O dever de obediência;
d) O dever de lealdade;
e) O dever de sigilo;
f) O dever de correcção;
g) O dever de assiduidade;
h) O dever de pontualidade.
5 - O dever de isenção consiste em não retirar vantagens directas ou indirectas, pecuniárias ou outras, das funções que exerce, actuando com independência em relação aos interesses e pressões particulares de qualquer índole, na perspectiva do respeito pela igualdade dos cidadãos.
6 - O dever de zelo consiste em conhecer as normas legais regulamentares e as instruções dos seus superiores hierárquicos, bem como possuir e aperfeiçoar os seus conhecimentos técnicos e métodos de trabalho de modo a exercer as suas funções com eficiência e correcção.
7 - O dever de obediência (...)
8 - O dever de lealdade (...)
9 - O dever de sigilo consiste em guardar segredo profissional relativamente aos factos de que tenha conhecimento em virtude do exercício das suas funções e que não se destinem a ser do domínio público.
10- O dever de correcção (...)
11- O dever de assiduidade (...)
12- O dever de pontualidade (...)"
São, portanto, os deveres gerais aludidos, ou deveres da mesma natureza 34), que impendem sobre os membros dos gabinetes governamentais por força do artigo 8º, nº 1, do Decreto-Lei nº 262/88, de 23 de Julho.
Referem-se neste preceito enfaticamente os deveres de sigilo e de diligência - "grosso modo" o dever de zelo mencionado no Estatuto Disciplinar -, mas desses exemplos nenhuma ilação inequívoca se extrai com relevo na dilucidação da questão que nos ocupa.
O enunciado de deveres gerais, por seu turno, do mesmo Estatuto, igualmente não refere explicitamente a sujeição dos membros dos gabinetes a um determinado sistema de incompatibilidades, designadamente aquele a que se encontram subordinados os funcionários em geral.
Mas não será que a aplicação de um tal sistema vai de algum modo implicada no dever de isenção, ou, mais ainda, no dever de imparcialidade a que aludem o nº 3 e o nº 4, alínea a), do Estatuto?

6. Debrucemo-nos, apenas, sobre o dever da imparcialidade, a que, aliás, a Constituição de 1976 pretendeu emprestar a dignidade de princípio fundamental da Administração Pública:

"Artigo 267º
(Princípios fundamentais)
1. A Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.
2. Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar com justiça e imparcialidade no exercício das suas funções."35)


6.1. VIEIRA DE ANDRADE preconizara, pouco antes, a constitucionalização do princípio, escrevendo )

"A elevação da imparcialidade da Administração a princípio constitucional, que de certo modo se defende neste trabalho, corresponde à descoberta de um espaço próprio, não ocupado, na economia do contrato pelo qual os cidadãos do nosso tempo pretendem definir as linhas fundamentais do sistema que enquadra a vida política da comunidade."
E, interrogando-se sobre se não "será supérflua, por desnecessária, a autonomização de um princípio com semelhante conteúdo", um princípio de imparcialidade administrativa, quando "a moderação, a segurança e a liberdade estão asseguradas na separação (ou combinação) dos poderes e das potências que se limitam mutuamente, prevenindo o despotismo", acrescenta:
"Veremos, porém, numa análise sumária e geral, que uma mesma potência pode, hoje, dominar as funções legislativa (ou política) e administrativa, o que abre caminho a arbitrariedades.
"Que a igualdade formal e abstracta corre o risco grave de não ser mais do que uma fórmula vazia de sentido num ambiente de forte intervenção conformadora por parte do aparelho do Estado, onde a diferença é a regra de um universo social complexificado e o indivíduo não é já o ponto de partida absoluto.
"Que a legalidade condiciona cada vez menos positivamente a actuação administrativa, transformando-se, em muitos casos, em programação vaga de fins, e não satisfaz as exigências, mais latas, da justiça como ideia normativa.
"Por isso se demarca, ao que supomos nitidamente, o campo próprio de um princípio constitucional de imparcialidade.
"Este princípio, que integra um preceito jurídico e não uma mera disposição programática, pretende referir uma valoração e permitir, em consequência, um controle do conjunto da actividade administrativa, especialmente nos seus momentos discricionários. Não impõe, no entanto, um determinado comportamento à Administração, tem apenas em vista estabelecer um padrão para as suas formas de comportamento - não é uma regra, mas um verdadeiro princípio.
"Entendido numa perspectiva dinâmica, não quer estabelecer uma obrigação para os sujeitos administrativos, mas um hábito de dever na escolha dos comportammentos funcionalmente adequados aos fins públicos.
"Procura dignificar a função administrativa, quer condenando o arbítrio e reprimindo o "contrabando" de motivos que favoreça ou prejudique indevidamente interesses parciais (de pessoas, de grupo ou de partido), quer impregnando a actividade administrativa de um sentido jurídico-público, que retire a discricionaridade à "lei da selva" e a introduza no mundo civilizado do Estado de Direito.
"A razão de ser constitucional do princípio da imparcialidade vai deste modo entroncar na ideia-mestra do bem público. A liberdade contra o arbítrio, a igualdade real dos cidadãos e dos grupos nas condições concretas da sociedade técnica, a justiça como ideia condutora resumem-se na imparcialidade como acentuação eficaz do carácter público da actividade administrativa."
Todavia, a teleologia política do princípio da imparcialidade transcende o significado concreto e específico do princípio, vindo a situar-se num círculo mais amplo definido pela "intenção de permitir a determinação da existência autónoma e modo-de-ser característico das funções estaduais, em particular da função administrativa." 37).

A separação dos poderes, na pureza inicial do ideário da Revolução Francesa e mesmo na experiência posterior, assegurava esse objectivo, mas a realidade introduz na cena política elementos novos que vêm perturbar os esquemas tradicionais, determinando o surgimento, nalguns sistemas políticos em particular, de situações de "monopólio potencial" de largos sectores do aparelho do Estado, criando a necessidade de recorrer a "factores de compensação" para obviar à manipulação da vida política.
Um desses factores consistiria, precisamente, no "respeito pela autonomia das várias funções estaduais", exigência particularmente intensa no tocante à função administrativa, normalmente confiada a "uma organização hierarquizada, cuja cúpula exerce simultaneamente a função do governo."
E é neste quadro de preocupações que se manifesta, segundo VIEIRA DE ANDRADE, o significado e alcance político do princípio da imparcialidade.
"Ao postular a independência da administração em face dos interesses concretos do governo e ao ligar intimamente aquele vasto sector de actividade ao interesse público, limita a força das maiorias (ou das minorias maioritárias) e desencoraja o aproveitamento do aparelho estadual por interesses partidários, contribuindo para a definição da função administrativa e para a sua articulação com as restantes funções do Estado, em termos de preservar-lhe a autonomia e de garantir que o seu desempenho se concretiza de acordo com as características próprias do papel específico que lhe cabe na realização do bem comum."
Abstraindo, porém, do plano político, observa-se que a imparcialidade administrativa, no seu "sentido jurídico concreto" é uma imparcialidade meramente relativa 38).

Com efeito, a actividade administrativa será imparcial sempre que as suas decisões se determinem exclusivamente por "critérios próprios, adequados ao cumprimento das suas funções específicas no quadro da actividade geral do Estado", os quais não podem ser "substituídos ou distorcidos por influência de interesses alheios à função, sejam estes interesses pessoais do funcionário, interesses de indivíduos, de grupos sociais, de partidos políticos, ou mesmo interesses políticos concretos do Governo x).
Tais critérios consistem na prossecução de "interesses públicos específicos predeterminados nas leis - em leis formais ou em leis materiais que juridicamente ou de facto emanem do Governo."
Por isso a imparcialidade da Administração não é total ou absoluta, uma vez que esta deve "orientar a sua conduta para a realização de determinados interesses, que concebe ou recebe como seus."
Compreendendo-se perfeitamente que uma "posição de neutralidade" não possa aí assumir, particularmente "numa época de intensa intervenção do Estado na vida económica e social."
Daí que a Administração seja, nesta ordem de ideias, encarada como "parte" e, portanto, como "parcial", falando-se, para traduzir o fenómeno, em "relativa imparcialidade" ou "parte imparcial", por contraposição à imparcialidade judicial, característica de uma posição "super partes".
Como quer que seja, a Administração do nosso século preenche, em grande parte, "uma função conformadora da sociedade", concretizando "um projecto de futuro social", e não pode por tal exigir-se que a sua imparcialidade, "ainda que vinculada a um princípio de justiça, seja a imparcialidade dos juízes, cuja actividade é fundamentalmente de conservação".
Pode entender-se que a distinção se esbateu, mas, por mais difícil que seja distinguir, mesmo só tendencialmente, entre a função administrativa e a função jurisdicional, anota-se ser a justiça, na actuação administrativa (discricionária) "um valor que concorre com a oportunidade e conveniência, política e técnica, das decisões", ao passo que, na actividade dos juízes, constitui "o momento essencial."
Enquanto aos juízes cabe "definir a solução do direito (a solução justa) para o caso que lhes é submetido", a Administração, por seu lado, "pode escolher, entre uma pluralidade de soluções igualmente válidas, aquela que julgue (autonomamente) mais adequada ao interesse público normativamente estabelecido" X1 )

E é este poder de escolha, este "espaço de autonomia relativa" característico da função administrativa, que dá uma "coloração específica" à sua imparcialidade.
Pode neste momento dispensar-se, a nosso ver, o aprofundamento do tema das relações entre o princípio da imparcialidade e os princípios da igualdade e da legalidade 39)

Sem esquecer, porém, a este propósito, que o princípio não se dirige apenas aos órgãos e agentes administrativos, tendo como "primeiro destinatário o próprio legislador" 40), interessa, contudo, precisar, quanto à sua incidência na Administração, que ele se refere apenas à "actividade administrativa, dependente, executiva, funcionalmente vinculada às decisões políticas emanadas dos órgãos de soberania competentes"41)
.
Actua, por isso, "dentro do sistema, pressupõe a sua bondade, de modo que as eventuais desigualdades institucionalizadas ao nível político poderão projectar-se ou repercutir-se ao nível da actividade administrativa, sem que este princípio lhe sirva de remédio."
A imparcialidade administrativa é, assim, também nestoutra "dimensão axiológico-política", uma imparcialidade relativa.
Tal como fica descrito, constitui um "momento de transformação", apontando para o "desbloqueamento jurídico-legal do sistema" e permitindo que a "normação antecipada da lei seja substituída por um controle aposteriorístico, ainda jurídico, baseado num novo entendimento do bem público como ideia normativa jurídico-constitucional."

6.2. O princípio da imparcialidade da Administração foi, pois, elevado à dignidade constitucional e tem o seu assento, como vimos, no actual artigo 266º (supra, nota 35).
Ponderou-se, mais recentemente, em comentário a este normativo 42)

"O princípio da imparcialidade (nº 2) constitui igualmente um limite material interno da actividade administrativa. A imparcialidade respeita essencialmente às relações entre a administração pública e os particulares, podendo circunscrever-se a dois aspectos fundamentais: (a) o primeiro, relacionado com os princípios constitucionais consagrados no nº 1, consiste em que no conflito entre o interesse público e os interesses particulares, a administração deve proceder com isenção na determinação da prevalência do interesse público, de modo a não sacrificar desnecessária e desproporcionalmente os interesses particulares (imparcialidade na aplicação do princípio da proporcionalidade); (b) o segundo refere-se à actuação da administração em face dos vários cidadãos, exigindo-se igualdade de tratamento dos interesses dos cidadãos através de um critério uniforme de prossecução do interesse público. O princípio da imparcialidade deve relacionar-se, embora não se confunda, com o princípio da igualdade (cfr. art. 13º); deve, por outro lado, distinguir-se do princípio da neutralidade, pois a administração não pode conceber-se como neutral em relação à prossecução do interesse público.
"A garantia da imparcialidade da administração implica, entre outras coisas, o estabelecimento de impedimentos dos titulares de órgãos da administração para intervirem em assuntos em que tenham interesse pessoal, directo ou indirecto."

6.3. Em cumprimento do nº 2 do artigo 266º, visando declaradamente dar concretização ao "princípio da imparcialidade na acção da Administração Pública", foi publicado o Decreto-Lei nº 370/83, de 6 de Outubro, que pretendeu consagrar - se nos ativermos à motivação consignada na nota preambular - "um sistema tanto quanto possível minucioso de situação de colisão entre interesses particulares dos mencionados titulares de órgão públicos ["da administração central, regional e local ou dos institutos ou empresas públicas"] e o desempenho das funções públicas que lhes cabem."
No entanto, o diploma limitou-se a definir um sistema de impedimentos, escusas e suspeições dos citados titulares, abstendo-se de regular de todo a matéria das incompatibilidades e acumulações.
Mais. O Decreto-Lei nº 370/83 foi expressamente revogado pelo artigo 4º do Decreto-Lei nº 442/91, de 15 de Novembro, que aprovou o Código de Procedimento Administrativo já em vigor, e os seus dez artigos substancialmente reproduzidos na Secção VI ("Das garantias de imparcialidade", artigos 44º a 51º), do Capítulo I, da Parte II do Código, não contendo, porém este instrumento legal, do mesmo passo, normas específicas relativas a incompatibilidades, ainda que o princípio da imparcialidade se encontre claramente afirmado no artigo 6º:

"Artigo 6º
(Princípios da justiça e da imparcialidade)
No exercício da sua actividade, a Administração Pública deve tratar de forma justa e imparcial todos os que com ela entrem em relação."
Será, por isso, inviável estabelecer relações entre incompatibilidades e imparcialidade administrativa?
Uma semelhante conclusão extravasaria, a nosso ver, das premissas e seria manifestamente excessiva.
As aludidas abstenções legislativas não devem, em derradeiro termo, impressionar decisivamente o intérprete.
Pondere-se, na verdade, se um sistema de impedimentos não concretiza finalísticamente a imparcialidade a um nível terminal de especialidade de certo modo mais elaborado que o sistema de incompatibilidades.
Se o impedimento a não concretiza como que na iminência da parcialidade - quando os interesses hipoteticamente conflituantes se definiram já no âmbito de determinado processo, acto ou contrato administrativo -, enquanto a incompatibilidade intervém num plano mais remoto de prevenção em que o conflito é antevisto como meramente virtual ou potencial.
Dir-se-ia então que o sistema de impedimentos consome de alguma maneira, na óptica dos valores postulados na imparcialidade, a protecção implicada na disciplina das incompatibilidades.
O que, se serve para de algum modo explicar a atitude subjacente aos diplomas legais há pouco aludidos, não bastará para inutilizar e furtar justificação a um sistema de incompatibilidades, de resto, teleologicamente complexo.
Inclinamo-nos realmente a pensar não ser possível dissociar a pretensão normativa de imparcialidade da Administração, abstraindo por completo de um sistema de incompatibilidades e acumulações dos agentes que diariamente a protagonizam.
"A pureza do desempenho das funções públicas, preservando, naqueles que as exercem, a sua liberdade de decisão, independência e isenção - escreveu-se em parecer deste corpo consultivo 43) a propósito de incompatibilidades -, relaciona-se, sem dúvida, com o dever de imparcialidade que recai sobre os órgãos e agentes administrativos."
E a doutrina adverte, como vimos, que a actividade administrativa só é imparcial se as decisões da Administração se determinarem por critérios próprios, definidos pelos específicos interesses públicos, pré-determinados na lei, cuja prossecução lhe compete.
De modo que a sua imparcialidade será posta em causa se esses critérios forem substituídos ou distorcidos por interferência de interesses alheios à função, interesses, justamente, que podem emigrar de áreas onde os agentes administrativos exerçam cumulativamente outras actividades.
É evidente que a incompatibilidade elimina na raiz toda a hipótese de parcialidade a favor desses interesses.
Observar-se-á, em contraponto, que as incompatibilidades em geral não garantem por si a imparcialidade.
Mas não deixe de se aceitar que constituem momento relevante, quiçá decisivo, na concretização do princípio.
A imparcialidade e o sistema de incompatibilidades podem não se encontrar estritamente conexionados por uma relação de garantia exclusiva e absorvente, mas estão, inclusivamente, em afinidade solidária na sua aptidão instrumental e complementar para a realização dos fins e interesses públicos que constituem o escopo da Administração e enformam a actuação dos seus agentes.
Só que, procurando agora precisar a ideia aflorada há instantes, a teleologia de um regime de incompatibilidades não se esgota na consideração da imparcialidade.
Comenta-se, a propósito, na esteira do artigo 269º da Constituição, que precisamente veio plasmar a exigência de um semelhante regime 44):
:
"A prescrição do nº 5 45) traduz-se numa imposição legiferante de estabelecimento do sistema de incompatibilidades, de modo a garantir, não só o princípio da imparcialidade da administração (cfr. art. 266º-2), mas também o princípio da eficiência (boa administração). Trata-se de impedir o exercício de actividades privadas que, pela sua natureza ou pelo empenhamento que exijam, possam conflituar com a exclusiva dedicação ao interesse público ou com o próprio cumprimento dos horários e tarefas da função pública."
"MARCELLO CAETANO 46) definiu incompatibilidade como a "impossibilidade legal do desempenho de certas funções públicas por indivíduo que exerça determinadas actividades ou que se encontre em alguma das situações, públicas ou particulares, enumeradas na lei"..
"Depois de afirmar que as incompatibilidades ou são comuns a todas as funções públicas ou especiais de certo cargo ou função, classificou-as aquele autor em naturais e morais por um lado, e absolutas e relativas por outro.
"Definiu incompatibilidades naturais "as que resultam da impossibilidade material de desempenhar simultaneamente dois cargos ou duas actividades dentro das mesmas horas de serviço, em diferentes localidades ou dentro da mesma hierarquia", e, morais, "as que resultam da necessidade de impedir que o agente possa ser suspeito de utilizar a função pública para favorecer interesses privados em cuja dependência se encontrasse, em virtude de prestar serviços remunerados a particulares ou por estar ligado por laços de parentesco a quem possa influir na marcha dos negócios públicos, para seu proveito pessoal".
"Caracterizou, finalmente, as incompatibilidades absolutas e relativas, respectivamente, como sendo "as que não podem ser removidas, forçando o funcionário a optar por um dos cargos incompatíveis", e "as que podem ser removidas mediante obtenção de autorização, dada pela autoridade competente, para o exercício dos dois cargos ou de um cargo e de uma actividade privada..." X2)

"As normas que provêem sobre incompatibilidades funcionais em relação aos titulares de cargos políticos e da administração pública, cominam-lhes deveres de natureza negativa que constituem limites à acumulação. Se a incompatibilidade não for legalmente susceptível de remoção, vedada está a possibilidade de acumulação X3)

"A motivação das normas legais sobre incompatibilidades relativas ao exercício de cargos assenta, fundamentalmente, na ideia de que duas ou mais funções não podem ser exercidas, convenientemente, pela mesma pessoa.
"A este propósito referiu-se, em parecer deste corpo consultivo: "pretende-se, em resumo, proteger a independência das funções e, do mesmo passo, manter na acção administrativa a normalidade, objectividade e serenidade que lhe deve imprimir o cariz indiscutível do interesse geral e que mais não é do que a afloração, no Estado democrático de direito, do princípio segundo o qual os agentes públicos não devem encontrar-se em situação de confronto entre o interesse próprio, de natureza pessoal, e o interesse do Estado ou dos entes públicos que representam e lhes cumpre defender" X4)

7. Propendemos, nos termos expostos, para o entendimento de que a sujeição dos chefes dos gabinetes ao dever geral de imparcialidade, a que se refere o nº 3 do artigo 3º do Estatuto Disciplinar, aponta no sentido da sua subordinação ao regime de incompatibilidades aplicável aos funcionários em geral.
A alternativa, que os dados oportunamente coligidos obrigam a equacionar, consistiria em não os considerar submetidos a quaisquer incompatibilidades, possibilidade, no entanto, dificilmente aceitável e inviabilizada, inclusivamente, pela natureza das coisas em determinadas situações.
Pudemos mesmo surpreender uma reflexão doutrinária que induz a submissão a incompatibilidades como dever geral, profissional ou funcional, negativo, do funcionário, ou seja "o dever de não exercer actividade privada que impeça de servir convenientemente a função pública ou que pela sua natureza possa comprometer o prestígio desta ou criar riscos para a eficiência ou honestidade do seu exercício." 47) .
Resta conhecer o regime geral de incompatibilidades dos funcionários, para se apurar em seguida se os dois cargos indicados na consulta se encontram nele abrangidos.

IV

1. Na definição desse regime há a considerar fundamentalmente os Decretos-Leis nº 184/89, de 2 de Junho, nº 323/89, de 26 de Setembro, e nº 427/89, de 7 de Dezembro.

1.1. O Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, veio, nos termos expressos do seu artigo 1º, estabelecer e definir "princípios gerais em matéria de emprego público, remunerações e gestão de pessoal da função pública."
O artigo 12º, subordinado à epígrafe "Princípio da exclusividade de funções", consignava regras relativas a acumulação e incompatibilidades, mas não nos importa apreciá-las uma vez que foi tacitamente revogado pelos artigos 31º e 32º do Decreto-Lei nº 427/89 48)

1.2. O Decreto-Lei nº 323/89, de 26 de Setembro, por seu turno, teve como objectivo estabelecer "o estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, local do Estado e regional, bem como, com as necessárias adaptações, dos institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos." (artigo 1º, nº 1).
A disciplina das incompatibilidades impendentes sobre o pessoal dirigente - círculo definido no artigo 2º - consta do artigo 9º 49)

"Artigo 9º
Regime de exclusividade
1- O pessoal dirigente exerce funções em regime de exclusividade, não sendo permitido, durante a vigência da comissão de serviço, o exercício de outros cargos ou funções públicas remunerados, salvo os que resultem de inerências ou de representação de departamentos ministeriais ou de serviços públicos e, bem assim, do exercício de fiscalização ou controlo de dinheiros públicos.
2- O disposto no número anterior não abrange as remunerações provenientes de:
a) Direitos de autor;
b) Realização de conferências, palestras, acções de formação de curta duração e outras actividades de idêntica natureza;
c) Actividade docente em instituições de ensino superior, não podendo o horário em tempo parcial ultrapassar um limite a fixar por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Educação;
d) Participação em comissões ou grupos de trabalho, quando criados por resolução ou deliberação do Conselho de Ministros;
e) Participação em conselhos consultivos, comissões de fiscalização ou outros organismos colegiais, quando previstos na lei e no exercício de fiscalização ou controlo de dinheiros públicos.
3- Não é permitido o exercício de actividades privadas pelos titulares de cargos dirigentes, ainda que por interposta pessoa, excepto em casos devidamente fundamentados, autorizados pelo membro do Governo competente, o qual só será concedido desde que a mesma actividade não se mostre susceptível de comprometer ou interferir com a isenção exigida para o exercício dos mencionados cargos.
4- A violação do disposto neste artigo constitui fundamento para dar por finda a comissão de serviço, nos termos da alínea a) do nº 2 do artigo 7º".
1.3. Finalmente, o Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro, visou também definir "o regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública" (artigo 1º), dedicando o seu Capítulo V ("Acumulação de funções", artigos 31º e 32º) à matéria que nos interessa:

"Artigo 31º
Acumulação de funções
1- Não é permitida a acumulação de funções ou cargos públicos remunerados, salvo quando devidamente fundamentada em motivo de interesse público e no disposto nos números seguintes.
2- Há lugar à acumulação de funções ou cargos públicos nos seguintes casos:
a) Inerências;
b) Actividades de representação de departamentos ministeriais ou de serviços públicos;
c) Actividades de carácter ocasional e temporário que possam ser consideradas complemento do cargo ou função;
d) Actividades docentes, não podendo o respectivo horário ultrapassar o limite a fixar em despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Educação.
3- O disposto no nº 1 não é aplicável às remunerações provenientes de:
a) Criação artística e literária, realização de conferências, palestras, acções de formação de curta duração e outras de idêntica natureza;
b) Participação em comissões ou grupos de trabalho, quando criados por resolução ou deliberação do Conselho de Ministros;
c) Participação em conselhos consultivos, comissões de fiscalização ou outros órgãos colegiais, quando previstas na lei e no exercício de fiscalização ou controlo de dinheiros públicos.
4- A acumulação prevista nas alíneas b) e c) do nº 2 é autorizada por despacho do membro do Governo competente.
5- No caso previsto na alínea d) do nº 2, a acumulação depende de requerimento do interessado e só pode ser autorizada se o horário a praticar como docente for compatível com o que competir ao cargo ou função principal.
6- É permitida a acumulação de cargos públicos não remunerados quando fundamentada em motivo de interesse público.

"Artigo 32º
Acumulação de funções privadas
1- O exercício em acumulação de actividades privadas carece de autorização prévia do membro do Governo competente, a qual pode ser delegada no dirigente máximo do serviço.
2- O disposto no nº 1 não abrange a criação artística e literária e a realização de conferências, palestras, acções de formação de curta duração e outras actividades de idêntica natureza.
3- A autorização referida no nº 1 só pode ser concedida se se verificarem as seguintes condições:
a) Se a actividade a acumular não for legalmente considerada incompatível;
b) Se os horários a praticar não forem total ou parcialmente coincidentes;
c) Se não ficarem comprometidas a isenção e a imparcialidade do funcionário ou agente no desempenho de funções;
d) Se não houver prejuízo para o interesse público e para os direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.
4- A recusa de autorização para o desempenho de funções públicas em acumulação com actividades privadas carece de fundamentação, nos termos gerais."

1.4. Os artigos 31º e 32º, estabelecendo um regime de incompatibilidades relativo aos funcionários e agentes da Administração Pública em geral revogou tacitamente, como se deixou dito, o artigo 12º do Decreto-Lei nº 184/89, que possuía os mesmos conteúdo material e âmbito pessoal de aplicação.
Por outro lado, o regime do artigo 9º do Decreto-Lei nº 323/89, respeitante apenas ao pessoal dirigente, é especial relativamente ao dos artigos 31º e 32º do Decreto-Lei nº 427/89.
Razão por que, em recente parecer desta instância consultiva 50), se entendeu "concluir pela coexistência, nesta sucessão de leis no tempo, dos regimes jurídicos diversos de acumulação e de incompatibilidade no exercício de funções na Administração Pública do artigo 9º do Decreto-Lei nº 323/89, aplicável ao pessoal dirigente ou equiparado e do dos artigos 31º e 32º do Decreto-Lei nº 427/89, aplicável aos restantes funcionários e agentes da Administração Pública."

1.5. O regime desses preceitos é, em essência, idêntico no tocante ao desempenho de actividades privadas.
Define-se, quanto a esse exercício, uma incompatibilidade meramente relativa, susceptível, portanto, de ser removida mediante autorização do membro de Governo competente, a qual só pode ser outorgada verificados certos pressupostos, "grosso modo" reconduzíveis a um mesmo parâmetro deontológico-normativo: a conciliabilidade, em suma, com o interesse público, aferida à luz das exigências formuladas nos preceitos e diplomas citados 51) 52)

2. Esclareça-se, a propósito, que o cargo de vogal do conselho fiscal da EDM, tal como o deixámos oportunamente caracterizado, não deve, a nosso ver, qualificar-se como cargo ou função pública, se considerarmos este conceito, no âmbito dos citados normativos, com referência à "administração central do Estado, incluindo os institutos nas modalidades de serviços personalizados do Estado e de fundos públicos, bem como a administração pública local e regional" - assim se entendeu recentemente nesta instância consultiva 53)
É, portanto, de concluir que a incompatibilidade aludida inibe, em princípio, o Senhor Chefe do Gabinete de Vossa Excelência de exercer, em acumulação, as funções de vogal do referido conselho fiscal, salvo autorização de Vossa Excelência nas condições legais, circunstância de cuja verificação não se tem, aliás, conhecimento.

V
Do exposto se conclui:
1. Por força da revogação da versão original do nº 2 do artigo 1º da Lei nº 9/90, de 1 de Março, operada mercê da redacção introduzida nesse número pelo artigo 1º da Lei nº 56/90, de 5 de Setembro, os chefes dos gabinetes dos membros do Governo - compreendidos no elenco categorial de sujeitos definido no mesmo dispositivo, em virtude do estatuto estabelecido no Decreto-Lei nº 262/88, de 23 de Julho - não estão sujeitos ao regime de incompatibilidades estatuído naquela Lei;
2. Os chefes dos gabinetes dos membros do Governo ficam subordinados, na previsão do normativo citado na anterior conclusão 1., a lei especial, que, todavia, não foi ainda editada;
3. De harmonia com o disposto no artigo 8º, nº 1, do Decreto-Lei nº 262/88, os chefes dos gabinetes, assim como os restantes membros dos gabinetes governamentais, estão sujeitos aos deveres gerais que impendem sobre os funcionários e agentes da Administração Pública, entre os quais sobreleva o dever de imparcialidade a que se referem o artigo 266º, nº 2, da Constituição, o artigo 3º, nº 3, do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei nº 24/84, de 16 de Janeiro, e o artigo 6º do Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei nº 442/91, de 15 de Novembro;
4. O dever de imparcialidade implica para os chefes dos gabinetes, enquanto não for editada a lei própria mencionada na anterior conclusão 2., a sujeição ao sistema de incompatibilidades aplicável aos funcionários e agentes da Administração pública, conforme o artigo 9º do Decreto-Lei nº 323/89, de 26 de Setembro, e os artigos 31º e 32º do Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro;
5. A observância deste regime de incompatibilidades corresponde, aliás, a um dever geral do funcionalismo público e, portanto, dos chefes dos gabinetes;
6. Dos preceitos citados na anterior conclusão 4. deriva uma incompatibilidade meramente relativa entre o exercício cumulativo de funções públicas e de actividades privadas, susceptível de ser removida mediante autorização do membro do Governo competente, com subordinação aos pressupostos aí definidos;
7. O cargo de vogal do conselho fiscal da EDM- Empresa de Desenvolvimento Mineiro, S.A., configurado nos termos resultantes do Decreto-Lei nº 313/89, de 21 de Setembro, dos estatutos por este diploma aprovados e demais legislação conexa, não deve qualificar-se como cargo ou função pública, caracterizando-se antes como actividade de natureza privada nos termos e para os efeitos dos normativos aludidos na anterior conclusão 4.;
8. Existe, pois, incompatibilidade relativa, susceptível de ser afastada nos termos definidos na conclusão 6., entre o desempenho do cargo de chefe de gabinete de um membro do Governo e o exercício do cargo de vogal do conselho fiscal a que se reporta a conclusão 7.




1) Pese a circunstãncia de tudo se ignorar acerca do condicionalismo que rodeou a investidura do interessado nas referidas funções. Com efeito, do processo constam unicamente dois documentos: a carta sumariada no texto com os despachos referidos, e o ofício de remessa à Procuradoria-Geral da República.

2) EDM - Empresa de Desenvolvimento Mineiro, E.P., criada pelo Decreto-Lei nº 148/86, de 18 de Junho, por fusão das empresas públicas EDMA-Empresa de Desenvolvimento Mineiro do Alentejo. E.P., e FERROMINAS, E.P..

3) Trata-se de 51%, pelo menos, do capital social existente em cada momento, representado por acções da categoria A - acções nominativas de que apenas podem ser titulares o Estado, pessoas colectivas de direito público ou outras entidades que, por imposição legal, pertençam ao sector público (artigo 3º, nº 2).

4) Não será este o caso do interessado na consulta, pois seria descabido que o normativo transcrito se relacionasse com a titularidade de um cargo social. Basta ler o artigo 8º, nº 5, dos Estatutos: "O Estado, quando a gestão das acções não pertença a outra entidade, é representado na assembleia geral pelo representante que for designado por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Indústria e Energia."

5) Como resulta dos termos da anterior nota 1, não se sabe se será este o caso do interessado na consulta.

6) Um dos vogais efectivos e o suplente devem ser revisores oficiais de contas (artigo 17º, nº 2), podendo o conselho fiscal, ademais, "ser coadjuvado por técnicos especialmente designados ou contratados para esse efeito e ainda por empresas especializadas em trabalhos de auditoria" (nº 3).

7) São evidentes as dificuldades de ordem prática que semelhantes regras podem ocasionar..

8) A Lei nº 84/88 foi revogada pela Lei nº 11/90, de 5 de Abril, salvaguardando-se, de certo modo, a conclusão, ao abrigo da lei revogada, dos processos desencadeados no seu domínio de vigência (artigos 27º e 28º).

9) Os preceitos da "Parte Geral" (Título I, artigos 1º a 174º), pela sua natureza, aplicam-se a todos os tipos de sociedades regulados no Código e, por conseguinte, também às sociedades anónimas, mas assumem na economia do presente parecer um interesse secundário. O mesmo se diga dos dispositivos compendiados no Título VI ("Sociedades coligadas", artigos 481º a 508º) e no Título VII ("Disposições penais e de mera ordenação social", artigos 509º a 529º), estes não configuráveis, de resto, como "normas de direito privado", bem como no Título VIII ("Disposições finais e transitórias", artigos 530º a 545º).

10) Registe-se em todo o caso o teor do artigo 423º, nº 1, segundo o qual deve o conselho fiscal reunir pelo menos trimestralmente.

11) Transcreve-se a título elucidativo:
"Artigo 414º
(Requisitos e incompatibilidades)
1 - Os membros do conselho fiscal e os fiscais únicos podem não ser accionistas, mas devem ser pessoas singulares com capacidade jurídica plena, excepto se forem sociedades de advogados ou sociedades de revisores oficiais de contas.
2 - O fiscal único, um membro efectivo do conselho fiscal e um dos suplentes têm de ser revisores oficiais de contas ou sociedade de revisores de contas.
3 - Não podem ser eleitos ou designados membros do conselho fiscal ou fiscal único:
a) Os beneficiários de vantagens particulares da própria sociedade;
b) Os que exercem funções de administração da própria sociedade ou as exerceram nos últimos três anos;
c) Os membros dos órgãos de administração e fiscalização de sociedade que se encontre em relação de domínio ou de grupo com a sociedade fiscalizada;
d) O sócio de sociedade em nome colectivo que se encontre em relação de domínio com a sociedade fiscalizada;
e) Os que prestem serviços remunerados com carácter permanente à sociedade fiscalizada ou sociedade que com esta se encontre em relação de domínio ou de grupo;
f) Os que exerçam funções em empresa concorrente;
g) Os cônjuges, parentes e afins na linha recta e até ao 3º grau, inclusive, na linha colateral, de pessoas impedidas por força do disposto nas alíneas a), b), c), d) e f), bem como os cônjuges das pessoas abrangidas pelo disposto na alínea e);
h) Os que exerçam funções de administração ou de fiscalização em cinco sociedades, exceptuando as sociedades de advogados, as sociedades de revisores oficiais de contas e os revisores oficiais de contas, aplicando-se a estes o regime do artigo 9º do Decreto-Lei nº 519-L2/79, de 29 de Dezembro;
i) Os revisores oficiais de contas em relação aos quais se verifiquem outras incompatibilidades previstas na respectiva legislação;
j) Os interditos, os inabilitados, os insolventes, os falidos e os condenados a pena que implique a inibição, ainda que temporária, do exercício de funções públicas.
4 - A superveniência de algum dos motivos indicados no número anterior importa caducidade da designação.
5 - É nula a designação de pessoa que não possua a capacidade exigida pelo nº 1 ou relativamente à qual se verifique alguma das incompatibilidades estabelecidas no nº 2.
6 - A sociedade de revisores oficiais de contas que fizer parte do conselho fiscal deve designar até dois dos seus revisores para assitir às reuniões dos órgãos de fiscalização e de administração e da assembleia geral da sociedade fiscalizada.
7 - A sociedade de advogados que fizer parte do conselho fiscal deve, para os efeitos do número anterior, designar um dos seus sócios.
8 - Os revisores designados nos termos do nº 6 e os sócios de sociedades de advogados, designados nos termos do nº 7, ficam sujeitos às incompatibilidades previstas no nº 3."

12) Em conexão com os dispositivos do artigo 414º, o artigo 447º do Código previne formas de publicidade relativas à titularidade de acções e obrigações por parte dos membros do conselho fiscal, ou de pessoas que com eles se encontrem em relações determinantes de incompatibilidade, bem como à celebração de negócios respeitantes a esses títulos, tanto da sociedade fiscalizada como de sociedades que com esta estejam em relação de domínio ou de grupo.

13) Rectificado no "Diário da República", I Série, 2º Suplemento, de 30 de Setembro de 1988.

14) Revogaram-se expressamente, por conseguinte (artigo 13º), os Decretos-Leis nº 267/77, de 2 de Julho; nº 332/78, de 14 de Novembro; nº 71-A/84, de 29 de Fevereiro; nº 306-A/83, de 30 de Junho; nº 250/84, de 24 de Junho.

15) "Aos gabinetes dos ministros da República aplicam-se, com as adaptações necessárias, as disposições que disciplinam os gabinetes ministeriais, sem prejuízo do disposto no artigo 13º" (artigo 1º, nº 3) - a norma revogatória a que há momentos se aludiu -, enquanto a disciplina do gabinete do Primeiro-Ministro é remetida para "legislação própria" (nº 4).
.
16) Aos adjuntos e secretários pessoais compete prestar ao membro do Governo o apoio técnico e o apoio administrativo, respectivamente, que lhes for determinado (artigos 4º, nº 1, e 5º, nº 1).
O número de adjuntos não pode ser superior a 5, a 3 ou a 1, nos gabinetes dos ministros, secretários e subsecretários de Estado, respectivamente (artigos 4º, nº 2, e 5º, nº 2).

17) O nº 3 do artigo 9º providencia acerca dos vencimentos dos membros dos gabinetes dos ministros da República que prestam serviço nas regiões autónomas.

18) O artigo 26º, nº 5 prevê, porém, que o quadro de pessoal da Secretaria-Geral seja "dimensionado tendo em conta as necessidades de apoio em pessoal administrativo e auxiliar aos gabinetes dos membros do Governo e estruturas de missão dele dependentes".

19) Extractamos do parecer deste Conselho nº 54/90, de 11 de Outubro de 1990, publicado no "Diário da República", II Série, nº 161, de 16 de Julho de 1991 (ponto III, 15.).

20) Consequentemente, rezavam os nºs 2 e 3 do artigo 1º do projecto:
"(...)
2 - São equiparados a titulares de altos cargos públicos todos aqueles cuja nomeação, assente no princípio da livre designação pelas entidades referidas nas alíneas do número anterior, se fundamente em razões de especial confiança ou responsabilidade e como tal sejam declaradas por lei.
3 - O pessoal do Gabinete e da Casa Civil do Presidente da República do Gabinete do Primeiro-Ministro e dos gabinetes dos membros do Governo e equiparados rege-se por legislação própria."

21) Parecer nº 54/90, que continuamos a seguir (ponto III, 16.).

22) Parecer nº 54/90, (ponto III, 17.).

23) Modificação em relação ao artigo 1º da Lei nº 9/90 e em relação à própria versão deste artigo que figurava no Projecto da Lei nº 56/90 - cfr., supra, nota 20.

24) "Diário da Assembleia da República", V Legislatura, 3ª Sessão Legislativa (1989-1990), I Série, nº 71, de 5 de Maio de 1990, págs. 2391 a 2407; nº 89, de 22 de Junho de 1990, págs. 3058 e seguinte.
Cfr., ademais, no mesmo sentido, a exposição de motivos, o parecer e a declaração de voto transcritos supra, III, 2.

25) Que foi esta a intencionalidade legislativa ressalta exuberantemente da discussão parlamentar registada no "Diário" citado na nota precedente.
Por isso, exactamente, a controvérsia suscitada entre a maioria e a oposição acerca do mérito político-legislativo da exclusão.

26) "Artigo 7º (Cessação da vigência da lei) (...) 2. A revogação pode resultar de declaração expressa, de incompatibilidade entre as novas disposições e as regras precedentes ou da circunstância de a nova lei regular toda a matéria da lei anterior. (,...)"
É, na realidade, irrecusável a incompatibilidade entre as duas versões do nº 2 do artigo 1º que se sucederam uma à outra.
.
27) O esgotamento do prazo e o próprio comando nele implicado são ricos de significado em domínios que, todavia, se pensa irrelevantes quanto ao concreto tema da consulta.
Registe-se apenas, por um lado, que o nº 2 do artigo 1º da Lei nº 9/90 poderia ler-se numa tónica autorizativa em matéria de reserva relativa de competência da Assembleia da República. Com o esgotamento do prazo, a autorização haveria caducado - uma autorização, quiçá, "juridicamente irrelevante", susceptível de situar-se apenas no plano do "relacionamento político" entre os dois órgãos de soberania.
Contudo, a matéria respeitante à organização e funcionamento do Governo compreende-se na exclusiva competência legislativa deste órgão de soberania (artigo 201º, nº 2, da Constituição; registe-se, não obstante, que o Decreto-Lei nº 262/88 foi editado ao abrigo do artigo 201º, nº 1, alínea a)). E, nessa outra óptica, pôr-se-ia o problema da constitucionalidade da injunção dirigida em semelhante domínio ao Executivo pelo órgão parlamentar. A injunção não possuiria, pelo menos, "a virtualidade constitucional" de vincular juridicamente o Governo à emissão do diploma; tratar-se-ia então, novamente, de injunção com "alcance político", desprovida de "carácter juridicamente vinculativo", cuja inobservância não produziria, fora daquele âmbito, "qualquer efeito jurídico-normativo".
No tema, cfr. os acórdãos do Tribunal Constitucional , nº 461/87, "Diário da República", I Série, nº 12, de 15 de Janeiro de 1988, págs. 132 e ss.; nºs 242/88 e 67/88, "Diário da República" citado, II Série, nº 23, de 22 de Janeiro de 1989; págs. 959 e s. e 964 e s., respectivamente; nº 7/89, "Diário", II Série, nº 86, de 13 de Abril de 1989, págs. 3702 e ss.; nº 330/89, "Diário", II Série, nº 141, de 22 de Junho de 1989, págs. 6131 e ss.

28) MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, tomo II, 10ª edição, 4ª reimpressão revista e actualizada por FREITAS DO AMARAL, Coimbra, 1991, págs. 729 e segs. que ora vamos acompanhar.

29) MARCELLO CAETANO, op. cit., págs. 731 e segs.

30) MARCELLO CAETANO, op. cit., pág. 752.

31) Uma ampla panorâmica bibliográfica a este respeito pode ver-se em VINÍCIO RIBEIRO, Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos, Coimbra, 1990, págs. 76 e segs.

32) JOÃO ALFAIA, Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico do Funcionalismo , vol. I, Coimbra, 1985, págs. 440 e segs.; VINÍCIO RIBEIRO, ibidem.

33) JOÃO ALFAIA, op. cit., pág. 441.

34) Observa, com efeito, JOÃO ALFAIA, ibidem, "que a enumeração dos deveres gerais contida no aludido artigo 3º, nº 3 - terá, porventura, querido escrever nº 4, ou, inclusivamente, nºs 3 e 4 - não é exaustiva pois omite obviamente outros deveres da mesma natureza, que resultam de outras disposições do referido estatuto disciplinar, como se verá oportunamente."
Em complemento da asserção, considera, de facto, noutros passos da mesma obra, como "deveres comuns a todas as situações de pessoal", o "dever de conduta digna na vida privada" (págs. 465 e segs.), deduzido dos artigos 25º, nº 1 - que pune com a pena de inactividade o procedimento que atente gravemente contra a dignidade e prestígio do funcionário ou agente ou da função -, 26º, nº 4, alíneas c) - demissão para os que comparticiparem em oferta ou negociação de emprego público - e e) - ou tomarem parte ou interesse, directamente ou por interposta pessoa, em qualquer contrato celebrado ou a celebrar por qualquer organismo ou serviço da Administração; ao lado do dever de sigilo em sentido estrito, o "dever de confidência" (págs. 469 e segs.), cuja violação é punida autonomamente com suspensão pelo artigo 24º, nº 1, alínea g); o "dever de lealdade ao Estado" (págs. 475 e segs), plasmado no artigo 26º, nº 2, alíneas b) - aposentação compulsiva para os actos de grave insubordinação ou de indisciplina, ou de incitamento à sua prática - e d) - demissão para a prática ou tentativa de actos que lesem ou contrariem os superiores interesses do Estado em matéria de relações internacionais; o "dever de colaboração com a justiça" (págs. 476 e seg.) .
E, com respeito à situação de serviço efectivo", alude ao "dever de comando", em reciprocidade ao dever de obediência (págs. 509 e segs.); ao "dever de competência ou aptidão profissional" (págs. 522 e segs.), complementar do dever de zelo, cuja violação pode dar lugar a aposentação compulsiva, conforme o artigo 26º, nº 3, do Estatuto; ao "dever de cooperação com outros órgãos do Estado" (págs. 543 e segs.).
Acrescente-se que o artigo 25º, nº 2, alínea c) pune disciplinarmente a violação, com dolo ou culpa grave, do dever de imparcialidade em exercício de funções.

35) Na 1ª revisão (1982) o artigo sofreu apenas uma modificação de número, passando a figurar como artigo 266º, com a mesma precisa redacção.
Já na 2ª revisão (1989) recebeu, porém, alterações no nº 2, despiciendas, segundo se crê, quanto ao tema agora em causa:
"Artigo 266
(Princípios fundamentais)
1. (...)
2. Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade."

36) J.C. VIEIRA DE ANDRADE, A Imparcialidade da Administração como Princípio Constitucional, Separata do vol. XLIX (1974) do "Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra", págs. 5 e segs. que vamos seguir por momentos.

37) VIEIRA DE ANDRADE, op. cit., págs. 7 e ss., que continuamos a acompanhar.

38) VIEIRA DE ANDRADE, op. cit., págs. 10 e ss.

x) "Há que distinguir entre interesses políticos concretos das forças que dominam o governo e interesses colectivos interpretados pelo governo - estes conseguem-se no âmbito do sistema político, através de mecanismos constitucionais adequados e dispondo das necessárias garantias, e integram regras jurídicas (legais) que se impõem, naturalmente, à Administração."

x1) "É claro que também a Administração tem o dever jurídico de procurar obter a decisão mais acertada e adequada ao caso concreto. Simplesmente, entende-se que as características específicas da função administrativa levam a que, cumpridos os pressupostos objectivamente fixados, só através dos vícios tipificáveis se possa demonstrar o erro da decisão. Nessa medida subsiste uma margem de "subjectividade" atribuída a quem tem competência para decidir, ao contrário do que defendem alguns autores que vêem na discricionaridade (mesmo administrativa) uma forma de aplicação do direito "normativo-material e individual-concreta", apontando para uma única decisão justa e, portanto, válida do caso. Sobre o assunto, v. CASTANHEIRA NEVES, Questão-de-facto, Questão-de-direito, p.p. 362 e ss. O que podemos dizer é que a fixação de um princípio de imparcialidade contribuirá para diminuir essa margem, constituindo um momento jurídico vinculativo (um outro"limite interno") da actividade discricionária."

39) Sobre o ponto, veja-se VIEIRA DE ANDRADE, op. cit., págs. 14 e ss. e 18 e ss., respectivamente.

40) VIEIRA DE ANDRADE, op. cit., págs. 23 e ss.

41) VIEIRA DE ANDRADE, op. cit., pág. 31.

42) GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 2ª edição revista e ampliada, 2º volume, Coimbra, 1985, pág. 420, anotando, obviamente, a versão da 1ª Revisão (cfr. supra, nota 35).

43) Parecer nº 52/84, de 24 de Janeiro de 1985, inédito. Na mesma linha o parecer nº 75/89, citado infra, nota 47 (ponto 5.2.), acolhendo-se ao parecer nº 251/78, "Diário da República", II Série, nº 95, de 24 de Abril de 1979, e "Boletim do Ministério da Justiça", 288, pág. 176.

44) GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, op. cit., pág. 441.
:
45) Artigo 269º
(Regime da função pública)
1. (...)
2. (...)
3. (...)
4. Não é permitida a acumulação de empregos ou cargos públicos, salvo nos casos expressamen- te admitidos por lei.
5. A lei determina as incompatibilidades entre o exercício de empregos ou cargos públicos e o de outras actividades."

46) Apud parecer nº 54/90, citado supra, nota 19 (ponto III, 1.), que transcrevemos.

x2) "Manual de Direito Administrativo", tomo II, Coimbra, 1983, págs. 720 a 722.
Cfr. os pareceres deste conselho consultivo nº 61/84, de 20 de Dezembro de 1984, e 75/89, de 22 de Fevereiro de 1990, aquele publicado no "Boletim do Ministério da Justiça", nº 346, págs. 54 a 87, e este (ainda) não publicado."

x3) "JOÃO ALFAIA, "Conceitos Fundamentais do Regime Jurídico de Funcionalismo Público", vol. 1º, Lisboa, 1985, págs. 171 e segs.".
3.

x4) "Parecer nº 100/82, de 22 de Julho de 1982, publicado no "Diário da República", II Série, de 25 de Junho de 1983, e no "Boletim do Ministério da Justiça", nº 326, págs. 224 e segs."4 .
47) MARCELLO CAETANO, op. cit., supra, notas 28 e 30 (cfr. supra, no texto, III, 5.).
Nesta linha, o Estatuto Disciplinar, abstendo-se embora de enunciar explicitamente no artigo 3º esse dever geral, como houve o ensejo de notar, não deixa, todavia, de sancionar, em certas condições, o exercício de actividades privadas incompatíveis com os deveres do cargo legalmente estabelecidos (artigo 25º, nº 2, alínea d)).
Também no parecer deste Conselho nº 75/89, de 22 de Fevereiro de 1990, "Diário da República", nº 127, de 4 de Junho de 1991, se afirmou (ponto 4.) que as incompatibilidades "(...) geram, em relação aos funcionários ou agentes, por elas atingidos, deveres negativos, ou seja a omissão de preenchimento de novo lugar ou desempenho de outras funções." Cfr., identicamente, o parecer nº 45/87, de 28 de Janeiro de 1988 (ponto II, 1.2.), "Diário", II Série, nº 289, de 16 de Dezembro de 1988, e "Boletim do Ministério da Justiça", nº 382, pág. 144.

48) Assim se concluiu no parecer nº 54/90, citado supra, nota 19 (ponto III, 9.).

49) Exceptuando-se deste regime, obviamente, o pessoal dirigente que veio a ficar abrangido pela Lei nº 9/90 - maxime, os directores-gerais e subdirectores-gerais.

50) Parecernº 54/90, citado na nota 19 (ponto III, 9.).

51) O parecer nº 75/89, citado supra, nota 47 (ponto 6.2.), após sublinhar que a autorização só pode ser concedida se se verificarem as condições enunciadas no nº 3 do artigo 32º do Decreto-Lei nº 427/89, rematava: "Ou seja: o desempenho contemporâneo de um cargo ou emprego público e de qualquer actividade privada só será possível em termos da sua conciliação com o interesse público, a apreciar face ao estatuído no referido nº 3 do artigo 32º, assim se permitindo ao respectivo Ministro assegurar-se de que aquele desempenho não afecta a isenção, independência, dignidade ou eficiência com que o agente da Administração exerce o seu cargo e concluir ou não pela inocuidade desse desempenho em relação à função pública".
52) No parecer nº 26/90, de 28 de Junho de 1990 (ponto 3.2.), inédito, aceitou-se não haver incompatibilidade nos termos do artigo 9º, nº 3, do Decreto-Lei nº 323/89, entre o exercício do cargo de Inspector-Geral de Finanças e o desempenho autorizado das funções de vogal do Conselho Administrativo da Fundação da Casa de Bragança, caracterizando-se esta como pessoa colectiva de direito privado, embora de utilidade pública (ponto 5.2.), apesar da sua estreita ligação ao Estado e da especial forma de intervenção do Ministério das Finanças na administração do respectivo património (cfr. os pontos 2.4. e 5.4.3.).

53) Parecer nº 54/90 (ponto III, 22. e 25.). Aquela caracterização foi, inclusivamente, afirmada quanto ao domínio próprio da Lei nº 9/90 (ponto 22.), e ao segmento, nomeadamente, do seu artigo 2º, alínea a), "(...) outras actividades profissionais e de função pública (...)". Isto permitiu, aliás, unanimemente recusar a qualidade de "função pública" aos cargos de presidente da Comissão de Fiscalização da empresa pública AGA - Administração Geral do Açúcar e do Álcool, EP, e de vogal do Conselho Fiscal da Trandingpor - Empresa de Comércio Externo de Portugal, S.A., uma sociedade anónima com capital social realizado na sua maioria pelo sector público, e antes qualificá-los, à luz do citado normativo, como actividades profissionais privadas (ponto 25. e conclusão 7ª ), não obstante concluir-se que os investimentos de capital realizados pelo Estado nas aludidas empresas são subsumíveis ao conceito de "dinheiros públicos" usado no artigo 4º, nº 3, da citada Lei, pelo que as aludidas actividades se traduziam "na fiscalização e/ou controlo" desses dinheiros (cfr. o ponto 22. in fine e a conclusão 7ª)..
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART266.
DL 313/89 DE 1989/09/21 ART1 ART2 ART3 ART4 ART5 ART6 ART7 ART8 ART9 ART11 ART15 ART17 ART18.
L 84/88 DE 1988/07/20. L 11/90 DE 1990/04/05.
CSC86 ART414 ART420 ART421 ART422.
DL 262/88 DE 1988/07/23 ART1 ART2 ART3 ART6 ART8 ART9 ART10 ART11 ART12 ART13. DL 206/89 DE 1989/06/27 ART26 N5.
L 9/90 DE 1990/03/01 ART1 ART2 ART3 ART4 ART8 ART10 ART11 ART12.
L 56/90 DE 1990/09/05 ART1 ART2 ART3. EDF84 ART3
DL 370/83 DE 1983/10/06. CPADM91 ART6.
DL 184/89 DE 1989/06/02 ART1 ART12.
DL 323/89 DE 1989/09/26 ART1 ART9.
DL 427/89 DE 1989/12/07 ART1 ART31 ART32.
Referências Complementares: 
DIR ADM * ADM PUBL * FUNÇÃO PUBL.
Divulgação
Número: 
DR244
Data: 
18-10-1993
Página: 
10871
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