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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
30/1991, de 29.05.1991
Data do Parecer: 
29-05-1991
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Unanimidade
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério do Ambiente
Relator: 
SALVADOR DA COSTA
Descritores e Conclusões
Descritores: 
TELEVISÃO
PUBLICIDADE
CONCURSO TELEVISIVO
PATROCINIO PUBLICITARIO
DIREITOS DOS CONSUMIDORES
PRINCIPIO DE IDENTIFICABILIDADE
PRINCIPIO DA SEPARABILIDADE
ACTIVIDADE PUBLICITARIA
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
DIREITO A INFORMAÇÃO
REVOGAÇÃO DE LEI
CONCURSO DE NORMAS
CONTRA-ORDENAÇÃO
COMPETENCIA
Conclusões: 
1 - O artigo 27 da Lei n 58/90, de 7 de Setembro, foi revogado, em 24 de Outubro de 1990, pelo Codigo da Publicidade, aprovado pelo Decreto-Lei n 330/90, de 23 Outubro (artigo 7, n 2, do Codigo Civil, e 3, n 1, do Decreto-Lei n 330/90);
2 - Os artigos 28, 30 e 31 da Lei n 58/90 são revogados, em 1 de Outubro de 1991, pelo Codigo da Publicidade (artigos 7, n 2, do Codigo Civil e 3, n 1, do Decreto-Lei n 330/90);
3 - O regime legal do patrocinio publicitario televisivo e, ate 1 de Outubro de 1991, o previsto nos artigos 30 e 31 da Lei n 58/90 (artigos 7, n 2, do Codigo Civil, e 3, n 1, do Decreto-Lei n 330/90);
4 - E publicidade, para efeitos do Codigo de Publicidade, qualquer forma de comunicação feita no ambito de uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, com o objectivo de promover o fornecimento de bens ou serviços, bem como a comunicação que vise promover ideias, principios, iniciativas ou instituições, com exclusão da propaganda politica (artigo 3, ns 1 a 3, do Codigo da Publicidade);
5 - E patrocinio publicitario a participação de pessoas singulares ou colectivas no financiamento de quaisquer programas com vista a promoção do seu nome, imagem, ou das suas actividades (artigo 30, n 1, da Lei n 58/90);
6 - O patrocinio publicitario traduz-se numa forma especial de publicidade;
7 - E proibido o incitamento, em programas patrocinados, a compra ou locação de bens ou serviços do patrocinador ou de terceiros, particularmente atraves da inserção de referencias promocionais especificas (artigo 30, n 3, da Lei n 58/90);
8 - O concurso televisivo "O Preço Certo" e um programa de diversão patrocinado;
9 - No programa referido na conclusão anterior são feitas referencias promocionais especificas a bens e/ou serviços dos respectivos patrocinadores e de terceiros idoneas ao incitamento a sua aquisição;
10- As referencias promocionais indicadas na conclusão anterior integram o ilicito contra-ordenacional previsto no artigo 30, n 3 da Lei n 58/90;
11- Compete a Direcção-Geral da Comunicação Social, por iniciativa propria ou no seguimento de participação da Alta Autoridade para a Comunicação Social, a verificação do ilicito indicado na conclusão anterior (artigo 52, n 2, da Lei n 58/90);
12- E da competencia da Direcção-Geral da Comunicação Social o processamento relativo aquele ilicito (artigo 52, n 2, da Lei n 58/90;
13- A aplicação da sanção correspondente ao referido ilicito compete ao membro do Governo responsavel pela area da comunicação social (artigo 52, n 1, da Lei n 59/90).
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Secretário de Estado do
Ambiente e Defesa do Consumidor,
Excelência:



1. Uma técnica do Instituto Nacional de Defesa do Consumidor INDC (1 informou, em 29 de Outubro de 1990, que o concurso televisivo "O preço certo" infringia o disposto nos artigos 27º, nº 1, e 30º, nºs. 1 e 3 da Lei nº 58/90, de 7 de Setembro de 1990, que no interior do próprio programa ser feita publicidade a propósito de cada jogo ou dos prémios a atribuir sem que tais anúncios sejam claramente diferenciados pelo olho-separador de RTC, e propôs a participação dos factos à Alta Autoridade que a Comunicação Social (AACS), que ocorreu.

2. A AACS pronunciou-se, em 20 de Dezembro de 1990 no sentido de não haver lugar à aplicação da sanção referido pelo INDC, por fazer parte da natureza do próprio concurso o "o .... " e referência e produtos e mesmo nele inseridos e ser feito, no início do programa o aviso contendo referência a marcas e produtos, salvaguardando-se a boa fé da estação emissora e respeitando-se o espírito da lei no tocante à defesa dos direitos do consumidor (2.
3. Um técnico superior do INDC elaborou uma informação sobre as questões apreciadas pela AACS, concluir nos termos da anterior informação, e sugeriu o pedido de prever sobre esta matéria à Procuradoria-Geral da República (3

(1O texto integral da referida informação é o seguinte:
"O novo mapa-tipo adoptado pela televisão inclui uma série de concursos. Num deles .... publicidade a vários produtos e serviços duma forma escandalosa.
Trata-se do concurso "O preço certo", o qual infringe claramente o disposto nos artigos 27º, nº 1 e 30º, nºs. 1 e 3 da Lei nº 58/90, de 7/9/90.
Com efeito, no interior do próprio programa é feita inúmera publicidade a propósito de cada jogo que aparece ou dos prémios a atribuir, sem que tais anúncios sejam claramente diferenciados do programa pelo tal olho-separador da R.T.C., que os telespectadores se habituaram a ver como indicativo de publicidade e que é exigido pelo referido artigo 27º, nº 1.
Se tal acontecesse, por exemplo, no dia 15/10/90, a 1ª parte do concurso teria sido interrompido 7 vezes, com uma duração aproximada de 3,30", a 2ª parte, interrompida 9 vezes, num total aproximado de 5,28", e na 3ª parte, e apenas no início a Cruz Vermelha e a Nestlé gastam logo 3,00".
Também certamente, os locutores (...) e (...) não poderiam ser, nos termos em que o fazem, os veículos daqueles discursos publicitários, uma vez que a sua condição de apresentadores do programa disso os haveria de impedir, precisamente para se evitar a confusão entre programa e publicidade.
Por outro lado, se se entendesse que se tratava de patrocínio, então as empresas patrocinadoras (e não produtos patrocinadores) deveriam limitar-se a inserir o seu nome e/ou logotipo no início e no fim do programa (artigo 30º, nº 1) e não poderiam incluir referências promocionais específicas aos seus produtos e serviços nem ter afixadas, em publicidade publicidade estática, as suas marcas no decorrer da emissão (artigo 30º, nº 3) - caso, por exemplo, do balcão e do emblema identificador dos concorrentes que servem de suporte ao serviço do Banco Comercial Português, que e a sua Nova Rede).
No dia em referência, 15/10/90, foram os seguintes os produtos publicitados ilicitamente.
Na 1ª parte: Nova Rede (+ ou - 50"); interpass (+ ou - 1,25") Brinquedos BB (+ ou - 16"); Wang (+ ou - 16"); Frigorífico Singer (+ ou - 20"); Snucker (+ ou - 16"); Molin (+ ou - 10").
Na segunda parte: Oura-Hotel (+ ou - 16"); Swing da Mother care (+ ou - 45"); Petas Zetas (+ ou - 10"); Schneider (+ ou - 20"); Moulinex (+ ou - 15"); Molin (+ ou - 8"); Choco Bom (+ ou - 50").
Na 3ª parte: Cruz Vermelha e Nestlé (Kit-Kat, Lion, Nuts, Toffee Crisp (+ ou - 3,00"); Nova Rede...
Faz-se notar que este programa foi interrompido igualmente por 2 vezes pelos habituais bloco publicitários da R.T.C..
Una vez que o INDC não é, nos termos da Lei nº 58/90, competente em relação ao processamento das contra-ordenações resultantes de infracção a referida lei propõe-se a participação do facto à Alta Autoridade para a Comunicação Social para os efeitos previstos no nº 2 do artigo 52º da mesma lei".

(2É o seguinte o texto da deliberação de AACS:
I - Os FACTOS
I.1 - No dia 13 de Novembro de 1990, deu entrada nesta Alta Autoridade um ofício do Gabinete do Secretário de Estado do Ambiente e Defesa do Consumidor, que inclui, "para ops efeitos e conhecimento", fotocópia de uma informação/proposta do Instituto Nacional de Defesa do Consumidor.
I.2 - A referida informação/proposta diz respeito à publicidade no concurso da RTP-Canal 1 "O Preço Certo", o qual infringiria o disposto nos artigos 27º, nº 1 e 30º, nºs. 1 e 3, da Lei nº 58/90, de 7/9/90, que regula a actividade de televisão. O INDC propõe, assim, o processamento de contra ordenação nos termos do artigo 52º da mesma lei.
I.3 - A fim de que a RTP_Canal 1 informasse o que tivesse por conveniente sobre o assunto, foi enviado ao respectivo Director cópia da referida informação/proposta, dando-se-lhe um prazo de oito dias para responder.
I.4 - No dia 5 de Dezembro, foi recebida a resposta da RTP-Canal 1, em que se alega não haver qualquer violação da Lei com a emissão do concurso "O Preço Certo" (Anexo 3.
II - ANÁLISE
II.1 - Esta Alta Autoridade é competente para apreciar o assunto, tendo em vista o estabelecido na alínea l), nº 1, artigo 4º, nº 15/90, de 30 de Junho.
Igualmente deverá ter-se em conta, neste caso, o previsto no nº 2 do artigo 52º da Lei nº 58/90, de 7 de Setembro (Lei da Televisão):
"O processamento das contra-ordenações compete à Direcção-Geral da Comunicação Social, sendo a infracção verificada por iniciativa própria ou no seguimento de participação da Alta Autoridade para a Comunicação Social".
II.2 - A informação do INDC refere que o concurso em causa "infringe claramente" disposições da Lei da Televisão, datada de 7 de Setembro passado.
As disposições invocadas são:
"A publicidade difundida através da televisão deve ser facilmente identificável como tal, e claramente separada dos programas, por meio ópticos ou acústicos" (artigo 27º, nº 1);
"Os programas que recolham qualquer financiamento do patrocínio publicitário devem conter uma referência expressa a tal facto, no seu início e termo, limitada à inserção do nome e logotipo da entidade patrocinadora" (artigo 30º, nº 1);
"Os programas patrocinados não devem incitar à compra ou locação de bens ou serviços do patrocinador ou de terceiros, particularmente através da inserção de referências promocionais específicas" (artigo 30º, nº 3).
Tais disposições incluem-se no Capítulo IV - Publicidade e Patrocínio - da referida lei, cujo primeiro artigo, o 26º, no seu nº 1, diz serem "aplicáveis à televisão as normas gerais reguladoras da publicidade comercial e da actividade publicitária".
É, pois, o próprio diploma regulador da actividade de televisão que remete para legislação especial a definição do regime jurídico aplicável à publicidade televisiva. Com efeito, a Lei da Televisão não define, sequer, o conceito de patrocínio publicitário no invocado artigo 30º.
II.3 - A actividade publicitária rege-se pelo Decreto-Lei nº 330/90, de 23 de Outubro (Código da Publicidade), posterior, portanto, à Lei d Televisão, e que, aliás, integra as Directivas nºs. 84/450 e 89/552 da CEE, bem como a Convenção Europeia sobre a Televisão sem Fronteiras, conforme vem expressamente referido no respectivo preâmbulo.
Aquele Código dedica o Cap. III à "Publicidade na televisão", pelo que as suas normas, uma vez que o diploma é posterior e, além de posterior, é especial, devem prevalecer, em caso de contradição, sobre as normas contidas na Lei da Televisão.
II.4 - Sobre o princípio da identificabilidade, o artigo 8º, nº 2, do Código da Publicidade diz que "a publicidade efectuada na rádio e na televisão deve ser claramente separada da restante programação por sinais acústicos ou ópticos".
Ora, no início do concurso "O preço Certo" é feito sempre o aviso prévio de que o mesmo contém referências a marca, bens ou serviço, podendo considerar-se desta forma acautelada a boa-fé da estação emissora e preservado, no essencial, o espírito da lei no que toca ao respeito dos direitos do consumidor.
II. 5 - Quanto à inscrição da publicidade na televisão, o citado Código diz no artigo 25º:
"A publicidade televisiva deve ser inserida entre programa" (nº 1);
"A publicidade só pode ser inserida durante os programas, desde que não atente contra a sua integridade e tenha em conta as suas interrupções naturais, bem como a sua duração e natureza, e de forma a não lesar os direitos de quaisquer titulares" (nº 2);
Ora, faz parte da natureza dos consursos televisivos, em Portugal e em qualquer outro país, a referência a marcas e produtos inseridos nos próprios concursos.
Recorde-se, aliás, e a propósito, o que sucede com as transmissões desportivas, onde se verificam referências publicitárias por todo o lado, desde os equipamentos dos atletas aos próprios recintos.
III - CONCLUSÃO
A Alta Autoridade para a Comunicação Social entende não haver lugar à aplicação da sanção reclamada na informação do Instituto Nacional de Defesa do Consumidor, uma vez que, relativamente ao concurso da RTP-Canal 1 "O Preço Certo":
a) É sempre feito, no início do mesmo, o aviso de que contém referências a marcas e produtos, salvaguardando-se assim a boa-fé da estação emissora e respeitando-se o espírito da lei no tocante à defesa dos direitos do consumidor;
b) Faz parte da natureza do próprio concurso a referência aos produtos e marcas nele inseridos".

(3Eis o texto significativo da referida informação:
2. Na Inf/Prop. nº 82/DET/PUB/90 sobre publicidade em concurso, que aqui se dá por inteiramente reproduzida (Doc.2), o INDC havia levantado a questão da conformidade legal do concurso "O Preço Certo", adiantando que o mesmo infringia o disposto nos artigos 27º, nº 1 e 30º nºs. 1 e 3 da Lei nº 58/90, de 7/9/90 (Lei da Televisão). Nela se propunha que dos factos fosse dado conhecimento à AACS, com vista a posterior instrução de processo pela Direcção-Geral da Comunicação Social, nos termos do nº 2 do artigo 52º da referida lei.
3 - A Inf/Prop. referida em 2. suscitou a deliberação da AACS, de 20/12/90, que entendeu não haver lugar à aplicação da sanção reclamada pelo INDC, invocando para o efeito nomeadamente, os seguintes argumentos:
3.1 - "A actividade publicitária rege-se pelo Decreto-Lei nº 330/90, de 23 de Outubro (Código da Publicidade) posterior, portanto, à Lei da Televisão (...). Aquele Código dedica o Cap.III à "Publicidade na Televisão", pelo que as suas normas, uma vez que o diploma e posterior e, além de posterior, é especial, devem prevalecer, em caso de contradição, sobre as normas contidas na Lei da Televisão".
3.2 - "No início do concurso "O Preço Certo" é feito sempre o aviso de que o mesmo contém referência a marca, bens ou serviços, podendo considerar-se desta forma acautelada a boa-fé da estação emissora e respeitando-se o espírito da lei no tocante à defesa dos direitos do consumidor".
3.3 - Faz parte da natureza dos concursos televisivos a referência a marcar e produtos inseridos no próprios concursos".
4 - Atentos os fundamentos invocados mo texto deliberativo e os factos denunciados, impõe-se uma análise atenta das seguintes questões:
- Legislação aplicável?
- "O Preço Certo" - Publicidade ou patrocínio?
- A alegada natureza dos concursos
- Identificação do patrocínio e da publicidade
- Existência de contra-ordenação
- Entidade competente para a instrução.
5 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
5.1 - O nº 1 do artigo 26º da Lei nº 58/90, de 7 de Setembro, diz que são aplicáveis à televisão as normas gerais reguladoras da publicidade comercial e da actividade publicitária.
Os artigos seguintes (27º a 31º), incluídos no capítulo IV sobre Publicidade e Patrocínio, consagram normas específicas sobre identificação da publicidade, restrições à publicidade, patrocínio e restrições ao patrocínio. Ou seja, entendeu o legislador, sem prejuízo da aplicação das normas gerais sobre publicidade, erigir na Lei da Televisão, na sequência e a exemplo, aliás, da pretérita da Lei nº 75/79, de 29 de Novembro, um regime próprio de publicidade e do patrocínio. Tal regime está claramente marcado pelos ditames da Directiva 89/552/CEE, de 3/10/89, relativa ao exercício de actividades de radiodifusão televisiva.
5.2 - O Decreto-Lei nº 303/83, de 28 de Julho,repositário das normas gerais sobre publicidade, ao tempo em que foi publicada a Lei da Televisão, veio a ser revogado pelo Decreto-Lei nº 330/90, de 23 de outubro, que aprovou o chamado Código da Publicidade.
5.3 - Ao contrário do que se afirma no parecer da AACS, o Código da Publicidade não constitui, em face da Lei da Televisão, legislação especial. É o próprio legislador que no citado artigo 26º, nº 1, da Lei da Televisão, classifica as normas do "Código d Publicidade" como gerais, afirmando, assim, implicitamente, a especialidade das normas constantes do diploma regulador da actividade de televisão.
Como especial, as normas acabadas de referir prevalecem sobre as normas gerais, como é de boa doutrina.
E não se diga, como o faz a AACS, noutro passo da sua deliberação, que é indicativo de especialidade do Código da Publicidade o facto de este conter uma definição de patrocínio que a Lei da Televisão não tem. Antes de mais, o revogado Decreto-Lei nº 303/83, de 28 de Junho, não continha qualquer definição de patrocínio, pelo que era impossível manter a respeito dele tal afirmação. Entretanto, discorda-se que o artigo 30º da Lei da Televisão não contenha uma definição de patrocínio. Dele resulta, para o intérprete uma definição de patrocínio, como sendo o financiamento de programas com fins publicitários.
5.4 - Por outro lado, quanto à revogação da Lei da Televisão, implicitamente alegada, sempre se dirá que "a lei geral não revoga a lei especial«, excepto se outra for a intenção inequívoca do legislador", conforme dispõe o nº 3 do artigo 7º do Código Civil.
Já que o legislador não o fez expressamente, resultará tal inequivocidade do facto de o Código da Publicidade conter, quer nos artigos 8º, 9º e 24º, quer no Cap. III, normas sobre a publicidade na televisão?
A questão assim posta leva a considerar tais normas como especiais, embora com assento num diploma geral, como acima foi caracterizado.
A contradição entre normas especiais conduziria æ aplicação das normas posteriores. Ora, no caso em apreço não se verifica qualquer contradição de regimes, uma vez que as normas constantes do Código da Publicidade seguem quase literalmente as normas respectivas da Lei da Televisão. Quando muito regista-se alguma complementaridade.
Propendemos, pois, a afirmar à guisa de conclusão, que no conteúdo da mensagem publicitária aplica-se o Código da Publicidade e à forma de inserção da publicidade em televisão aplicar-se-á o disposto na respectiva Lei, salvo no que for contrariado pelas normas especiais constantes do Código da Publicidade.
6 - "O Preço Certo" - Publicidade ou Patrocínio
6.1 - O conceito de publicidade aparece no nº 1 do artigo 3º do Código da Publicidade:
"Qualquer forma de comunicação feita no âmbito de uma actividade comercial, industrial, artesanal, com o objectivo de promover o fornecimento de bens ou serviços, incluindo direitos e obrigações".
É a definição utilizada na Directiva da Publicidade Enganosa (84/450/CEE).
6.2 - O conceito de patrocínio vem no nº 1 do artigo 24º:
"Participação de pessoas singulares ou colectivas no financiamento de quaisquer obras audio-visuais, programas, reportagens, edições, adiante designados abreviadamente por programas independentemente do meio utilizado para a sua difusão, com vista à promoção do seu nome ou imagem, bem como das suas actividades, bens ou serviços".
E também uma definição que segue de perto a adoptada pela Directiva 89/552/CEE, de 3 de Outubro de 1989, para o patrocínio em televisão.
6.3 - Das definições resulta uma completa distinção entre publicidade e patrocínio. Enquanto este consiste no financiamento de um programa com vista à promoção genérica do patrocinador, aquela consiste numa comunicação feita no âmbito de uma actividade económica, com vista a promover o fornecimento de bens ou serviços.
6.4 - Quando no programa se diz que o mesmo tem a participação das empresas A ou B, ou que os prémios são oferecidos pelas empresas C ou D, que revelência tem essa participação ou ofertas para efeitos de classificação do programa em face das normas sobre publicidade e patrocínio?
As empresas "participantes" pagam. Em o "Expresso" de 26/1/91 (Doc. 3), pode ler-se: (...) o seu maior sucesso é "O Preço Certo",, cujo volume mínimo de publicidade atinge, por emissão, cerca de 40 000 contos, com uma audiência recorde que ultrapassa os 70 por cento, sendo de longe, o programa mais visto na RTP".
Por seu turno, quer o apresentador do programa, quer o apresentador dos prémios, utilizam uma linguagem encomiástica e proporcional, reproduzindo inclusivamente slogans publicitários dos bens e serviços em causa. Vejam-se dois exemplos:
1º - (...): Muito obrigado. Sejam todos bem-vindos... a assistir a mais uns representação do nosso Preço Certo que tem a participação da Nova Rede do Banco Comercial Português. Nova Rede, não apenas porque é recente mas porque vai ao encontro das necessidades do cidadão médio. Sabem o que é que isto quer dizer? Não?! Então experimentem ir a uma dependência da Nova Rede e perceberão o que é que isto quer dizer. Porque todos nós somos cidadãos médios. Depois há aqueles muito importantes que vão a bancos assim muito importantes. Não. Na Nova Rede são recebidos como pessoas normais e por pessoas normais normais. E, por isso, um banco normal onde se sente que não há distanciamento entre você e o seu banco. Ao entrar em qualquer dependência da Nova Rede do Banco Comercial Português, você, não só encontra a maior banca de produtos financeiros como descobre a eficácia e simpatia e fica surpreendido com a rapidez de soluções para as suas necessidades. Nova Rede inovação e rapidez. Mais uma vez: sejam bem-vindos...
2º - (...): Antes de eu lhe renovar os conhecimentos acerca do contra relógio, vou pedir ao (..) que nos diga quem é que oferece este jogo esta semana e que eu diga que é a Snucker, mas ele tem mais coisas a dizer.
(...): Edredons, colchas, cortinas, almofadas, conjuntos de banho, roupões, senhorinhas, tudo isto e muito mais você encontra no novo catálogo Snucker. Há mais de 10 anos: prestígio, bom gosto e qualidade.
(...):... E um de vocês, incluindo o Luís que é um de vocês, pode ganhar este prémio.
(...):... Um frigorífico combinado SC 350, da Singer: 350 litros, 2 motores, arca com 3 gavetas; à venda nas lojas Singer, que comercializam as melhores marcas de electrodomésticos aos melhores preços e com as melhores facilidades de aquisição. Quando precisar de comprar um electrodoméstico, pense bem pense Singer!
6.5 - Se há que classificar para efeitos do Código da Publicidade, todos estes factos, não temos dúvida de que se trata de um programa patrocinado, ou mais profundamente de uma série de jogos patrocinados, ainda que o financiamento seja feito por via do pagamento das "referências publicitárias".
7 - A ALEGADA "NATUREZA DOS CONCURSOS"
7.1 - A AACS alega porém, que "faz parte de natureza dos concursos televisivos, em Portugal e em qualquer outro país, a referência a marcas e produtos inseridos nos próprios concursos". Os concursos seriam, assim, um "tertium genus", diferente do patrocínio, diferente também da publicidade normal, transmitida em blocos. Porém, a discussão posta nestes termos é mais uma vez irrelevante face ao Código da Publicidade e às normas especiais sobre publicidade e patrocínio da Lei da Televisão.
7.2 - Terá a AACS razão, por outro lado, quando faz apelo ao artigo 25º do Código da Publicidade para demonstrar e justificar a possibilidade de inserção de publicidade no interior do programa? Cremos que não. Vejamos o texto legal (ainda que o masmo só entra em vigor a partir de Outubro de 1991).
1 - A publicidade televisiva deve ser inserida entre programas.
2 - A publicidade só pode ser inserida durante os programas, desde que não atente contra a sua integridade e tenha em conta as suas interrupções naturais, bem como a sua duração e natureza e de forma a não lesar os direitos de quaisquer titulares.
O nº. 1 estabelece, pois, um princípio geral segundo o qual os programas não são interrompidos para se fazer publicidade, em homenagem ao princípio da completa separação entre programação e publicidade, e o nº 2 fixa as condições em que excepcionalmente é permitido interromper os programas para passagem de publicidade, obviamente de publicidade identificada, nos termos da lei.
Essas condições são:
- não atentar contra a integridade dos programas
- ter em conta:
- as suas interrupções naturais
- a sua duração
- a sua natureza
- não lesar os direitos de quaisquer titulares.
7.3 - A natureza dos programas poderá, portanto, ditar que os mesmos possam ou não ser interrompidos por publicidade. Os serviços religiosos, por exemplo, não podem ser interrompidos por publicidade (nº 3 do artigo 25º do Código da Publicidade).
O que a natureza do programa não pode é conduzir, como defende a AASC, à promiscuidade entre programação e publicidade, pois isso constituiria grosseira violação do já referido princípio da identificabilidade.
7.4 - Impõe-se, pois, concluir que concursos como "O Preço Certo", ainda que tenham natureza recreativa ou de passatempo, ainda que em tais programas seja uso oferecer prémios aos concorrentes, ainda assim, uma tal natureza não permite mais do que interromper o programa para emitir um ou mais blocos publicitários, devidamente identificados. Aliás, no extremo do posicionamento da AASC teríamos "O Preço Certo" identificado como um programa publicitário, o que, se por um lado contendia com as normas sobre tempo de emissão consagrados à publicidade (artigo 28º da Lei da Televisão e 26º do Código da Publicidade), por outro tornava injustificada e inexplicável a interrupção do programa para passagem de diversos blocos publicitários, como acontece.
7.5 - De resto, programa publicitário, a exigir tratamento excepcional, o legislador apenas consagrou o da televenda (nº 2 do artigo 26º do Código da Publicidade), pelo que os concursos obedecem ao regime geral.
7.6 - Concluindo, ou o concurso há-de ter-se como patrocínio e, como tal, obedecer às normas do patrocínio ou, por hipótese meramente académica, o concurso é um programa que não colheu financiamento do patrocínio e toda a publicidade feita no interior do mesmo deve ser cotejada com as normas sobre identificação da publicidade em televisão (nº 1 do artigo 27º da Lei da Televisão e nº 2 do artigo 8º do Código da Publicidade). Ou seja, tal publicidade deverá ser identificada com o separador em uso na televisão.
8 - AS TRANSMISSÕES DE ACONTECIMENTOS DESPORTIVOS
8.1 - O exemplo das transmissões desportivas não colhe na situação em apreço. O apelo que a AACS faz a tal situação é totalmente desprovido de sentido.
Nas transmissões desportivas, a televisão leva aos tele-espectadores um acontecimento - o jogo - e não a publicidade. A existência de publicidade estática no campo de jogos é facto que aquele meio não domina. E porque assim é, está-lhe vedada a focagem directa e exclusiva da publicidade aí existente (nº 2 do artigo 9º do Código da Publicidade).
E não se diga que o posicionamento da Televisão no concurso O Preço Certo ou no Estádio das Antas - passe a publicidade - é o mesmo. Nestes, a televisão transmite um acontecimento, cuja organização lhe é alheia, que existe independentemente da transmissão televisiva. Naquele, a televisão transmite um programa (não propriamente um acontecimento) a cuja organização não é totalmente alheia, porquanto a empresa organizadora, se não for a própria televisão, terá que garantir "ab initio" a respectiva transmissão, sem a qual o concurso não se realizaria.
O financiamento não aconteceria sem a transmissão televisiva do concurso - convenhamos.
Se, porém, a AACS está a referir-se à publicidade feita através da inserção de caracteres sobre a transmissão, então está a justificar uma ilegalidade com outra ilegalidade, pois, também essa é uma forma ilegal de fazer publicidade, constituindo publicidade oculta.
8.2 - "A latere" se dirá que a norma do nº 2 do artigo 9º do Código da Publicidade quando equipara em termos de regime, os acontecimentos ou situações reais com os simulados se afigura discutível, senão mesmo inconstitucional. Nestes, nos "acontecimentos simulados", mormente quando o próprio agente da transmissão tem o domínio do facto, é criticável a possibilidade oferecida ao agente de inundar a cena com publicidade.
O revogado Decreto-Lei nº 303/83 consagrava lapidarmente a situação que julgamos normal e compreensível: "Não é ilícita a transmissão televisiva ou fotográfica de quaisquer acontecimentos pelo simples facto de no local em causa, existir publicidade, sendo apenas vedada a focagem directa e expressa dessa publicidade" (nº 3 do artigo 6º).
O regime actual, tendo equiparado, em termos de regime, acontecimentos ou situações reais com os simulados, contende com os princípios da identificabilidade e completa separação entre programação e publicidade, ou com o regime do patrocínio quando for esta a situação subjacente. Mais, tal regime afigura-se mesmo inconstitucional, na medida em que permite a publicidade oculta (artigo 60º, nº 2 da CPP).
9 - IDENTIFICAÇÃO DO PATROCÍNIO E DA PUBLICIDADE
9.1 - Se programa patrocinado, o concurso "O Preço Certo" deveria conter no seu início o termo, uma referência expressa a tal facto, limitada à inserção do nome e logotipo da entidade patrocinadora (nº 1 do artigo 30º da Lei da Televisão).
9.2 - Se mera publicidade, as "referências publicitárias" deveriam ser objecto de identificação, com o separador em uso na televisão.
9.3 - Em qualquer dos casos o aviso prévio feito no início do programa de que o mesmo contém referências a marcas, bens ou serviços, não satisfaz as exigências legais de identificação do patrocínio ou da publicidade. Por atípico, é irrelevante e, ao contrário do que pretende a AACS, não prova a boa-fé da estação emissora nem preserva no essencial o espírito da lei no que toca ao respeito dos direitos do consumidor.
Aliás, a ter-se por suficiente e legal um tal aviso, então nada obstaria a que a televisão fizesse incluir aviso semelhante na abertura da emissão, para obter deste modo o efeito de identificação de toda e qualquer publicidade emitida ao longo do dia. Ora, se isto é impensável é também por identidade de razões, que se julgue identificada a publicidade feita no decurso de "O Preço Certo" por efeito de inserção do referido aviso, no início.
9.4 - Consequentemente, as "referências publicitárias" - leia-se publicidade - feitas no interior do programa, constituem, num caso, grosseira violação do nº 3 do artigo 30º da Lei da Televisão onde se proíbe expressamente a inserção de referências promocionais específicas e de um modo geral qualquer incitamento à compra ou locação de bens ou serviços do patrocinador ou de terceiros, noutro caso grosseira violação dos nºs 1 e 3 do artigo 27º da Lei da Televisão, ou do artigo 8º do Código da Publicidade, para quem entenda ser esta a legislação aplicável.
10 - EXISTÊNCIA DE CONTRA-ORDENAÇÃO
A existência de contra-ordenação no concurso "O Preço Certo" já foi demonstrada.
Verifica-se uma infracção ao disposto no nº 1 do artigo 30º do Decreto-Lei nº 58/90 de 7 de Setembro, na medida em que o patrocínio ou patrocínio não são identficados na forma legal, através de referência expressa ao facto, no início e termo do programa, limitando à inserção do nome e logotipo da entidade ou entidades patrocinadoras.
Verifica-se também uma infracção ao disposto no nº 3 do mesmo artigo, porquanto quer o apresentador do programa, quer o apresentador dos patrocínios e prémios, fazem publicidade de diversos bens e serviços.
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART37 N1 ART60.
L 58/90 DE 1990/09/07 ART27 N1 ART30 N1 N3 ART26 ART28 ART31 ART52.
L 29/81 DE 1981/08/22 ART9.
DL 85-C/75 DE 1975/02/26 ART1 N4 C.
L 75/79 DE 1979/11/29 ART11 N1 N2 ART12 A.
L 87/88 DE 1988/07/30 ART13 ART14.
DL 330/90 DE 1990/10/23 ART3 N1 N3 ART4 ART8 ART9 ART24 ART25 ART26 ART39 N3.
CCIV66 ART7.
Referências Complementares: 
DIR ECON.*****
DIR CONS CEE 84/450/CEE ART1 ART2
DIR CONS CEE 89/522/CEE ART1*****
DUDH ART19
CEDH ART10
PIDCP ART19
REC 952(1982) AP CE
CONS EUR SOBRE A TELEVISÃO TRANSFRONTEIRAS
Divulgação
Número: 
DR239
Data: 
17-10-1991
Página: 
10362
Pareceres Associados
Parecer(es): 
2 + 7 =
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