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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
137/2001, de 00.00.0000
Data de Assinatura: 
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Maioria
Iniciativa: 
Governo
Entidade: 
Ministério da Saúde
Relator: 
ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Descritores e Conclusões
Descritores: 
SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE
HOSPITAL
HOSPITAL DO PROFESSOR DOUTOR FERNANDO FONSECA
CENTRO DE SAÚDE
SERVIÇO FUNCIONALMENTE AUTÓNOMO
ESTABELECIMENTO PÚBLICO
CONTRATO ADMINISTRATIVO
EMPREITADA DE OBRAS PÚBLICAS
CONCESSÃO DE OBRAS PÚBLICAS
CONCESSÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS
CONTRATO DE GESTÃO
DEVER DE ACTUALIZAÇÃO
ALTERAÇÃO
ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL
PODER DE MODIFICAÇÃO UNILATERAL
MODIFICAÇÃO BILATERAL
CONCURSO PÚBLICO
AJUSTE DIRECTO
Conclusões: 
1.ª - No desenvolvimento de autorização conferida pela Lei de Bases da Saúde, Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto, o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde (SNS), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro, veio prever, no seu artigo 28.º, n.º 2, que o Ministro da Saúde pode autorizar a entrega da gestão de instituições e serviços de saúde integrados no SNS, ou parte funcionalmente autónoma, a entidades públicas ou privadas, com a faculdade de realizar obras ou adquirir equipamentos, mediante a retribuição das prestações de saúde;

2.ª - O contrato de gestão celebrado ao abrigo de tais dispositivos tem por objecto a gestão de um concreto estabelecimento público ou serviço, ou parte funcionalmente autónoma deles, e tem a natureza de contrato administrativo;

3.ª - Segundo o disposto no artigo 28.º, n.º 2, do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, o co-contratante tem a faculdade de realizar obras ou adquirir equipamentos, o que se deve entender como compreendendo o necessário para prover à administração ordinária e extraordinária do estabelecimento público ou serviço que constitui o objecto do contrato;

4.ª - Ainda nos termos da alínea c) do n.º 3 do artigo 29.º do mesmo Estatuto, o contrato deve definir obrigatoriamente as obras a realizar pela entidade gestora para a exploração da instituição ou serviço;

5.ª - O Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca, criado pelo Decreto-Lei n.º 382/91, de 9 de Outubro, dotado de personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira, a funcionar na Amadora, é um instituto público, na espécie estabelecimento público;

6.ª - O contrato celebrado em 10 de Outubro de 1995 entre a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo e a Sociedade Amadora/Sintra – Sociedade Gestora, S.A. “tem por objecto a gestão integral do Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca” (cláusula 5.ª);

7.ª - O contrato referido na precedente conclusão prevê, nomeadamente nas alíneas h), i), e j) do n.º 2 da cláusula 14.ª, a competência da Sociedade Gestora em matéria de obras;

8.ª - A concepção, planeamento, financiamento e construção pela Sociedade Gestora de uma nova unidade hospital em Sintra, com as características assinaladas em 5.8. deste parecer, não se enquadra nos poderes de modificação unilateral do conteúdo das prestações, por parte da Administração;

9.ª - Configurará uma nova relação contratual aquela em que a Administração e a Sociedade Gestora acordem na prestação enunciada na conclusão anterior;

10.ª - O juízo formulado nas duas precedentes conclusões aplica-se à extensão da gestão a outros estabelecimentos públicos, designadamente a centros de saúde de Amadora e Sintra;

11.ª - A atribuição a outra entidade, pública ou privada, diferente da Sociedade Gestora, da responsabilidade de conceber, planear, financiar e construir a futura unidade hospitalar de Sintra não determina, por si, uma alteração de circunstâncias do actual contrato de gestão, com consequências indemnizatórias para o Estado;

12.ª - Nos termos dos nºs 1 e 2 do artigo 29.º do Estatuto, a celebração de contrato de gestão é precedida de concurso público, ainda que, a título excepcional e observados os requisitos enunciados no n.º 2, possa a entrega ser feita por ajuste directo, mediante prévia resolução do Conselho de Ministros.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhor Ministro da Saúde ,
Excelência:



1.


Dignou-se Vossa Excelência solicitar a emissão por este Conselho Consultivo de parecer, com carácter de urgência, sobre um conjunto de questões relacionadas com eventual modificação do contrato de gestão respeitante ao Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca.

Cumpre emiti-lo, com as limitações inerentes à urgência requerida.


2.


Para situar resumidamente o contexto em que a problemática surge, e que vem descrito, com maior extensão, no ofício em que o pedido é formulado [1], deve dizer-se que nele se informa, designadamente, que:

- “A Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo celebrou, em 10 de Outubro de 1995, um contrato de gestão com o Hospital Amadora/Sintra-Sociedade Gestora S.A., tendo como objecto a gestão do Hospital Fernando da Fonseca”;

- Encontra-se proposta a “renegociação do contrato de gestão”, no seio da qual se coloca “um complexo conjunto de questões jurídicas” sobre a possibilidade de ser celebrado um contrato modificativo contemplando a concepção, planeamento, financiamento, construção e gestão de “uma nova unidade hospitalar em Sintra, bem como atribuir à sociedade Gestora, outorgante no contrato referido, a responsabilidade de gerir Centros de Saúde na área da Amadora e Sintra”;

- “A prestação de cuidados de saúde na área da Amadora e Sintra aconselha um aumento da capacidade do Serviço Nacional de Saúde”.


É neste quadro, e tendo em conta que o “Ministro da Saúde terá de definir qual deve ser a melhor forma de prosseguir o interesse público depois de ponderar as posições da Administração Regional de Saúde e de outras estruturas do Ministério em termos técnicos, económicos e financeiros”, e que “entre as opções possíveis encontra-
-se a proposta de contrato modificativo”, que vem solicitada, com carácter de urgência, a emissão de parecer sobre o seguinte:

"I. A concepção, planeamento, financiamento, construção e gestão de uma nova unidade hospitalar do Serviço Nacional de Saúde em Sintra, no valor estimado de Esc.: 8.600.000.000$00, a amortizar durante vinte anos, exige o recurso a um procedimento concursal, ou pode ser levado a cabo pela Sociedade Gestora no âmbito do contrato inicial com as alterações propostas no contrato modificativo;

"II. A eventual outorga do contrato modificativo, ao contrário do contrato inicial, precedido de concurso público, determina a prévia intervenção do Conselho de Ministros ao abrigo do artigo 29.º do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde para autorizar o ajuste directo;

"III. Podem ser concedidos à Sociedade Gestora, no âmbito de um contrato modificativo do acordo inicial, celebrado em 1995, a responsabilidade pela gestão de Centros de Saúde na área da Amadora e Sintra, independentemente de Ihe ser confiada a construção da referida unidade hospitalar de Sintra;

"IV . A atribuição a outra entidade, pública ou privada, diferente da Sociedade Gestora, da responsabilidade de conceber, planear, financiar, construir e gerir, ou somente gerir, da futura unidade hospitalar de Sintra, determina uma alteração de circunstâncias do actual contrato de gestão, com consequências indemnizatórias para o Estado.”

Como se verá, a resposta à primeira pergunta irá condicionar a solução das restantes. Será, pois, não por uma questão de ordem na enumeração, mas por uma questão de natureza metodológica, que a procura da resposta a essa primeira pergunta centrará grande parte da procura de solução.


3.


Deveremos dar por conhecidas todas as disposições legais e contratuais que interferem directa ou indirectamente com o problema. Sem prejuízo desse ponto de partida, crê-se que permitirá uma melhor compreensão dos resultados a que se chegar, a explicitação daquelas disposições, passos prévios ao contrato e cláusulas do contrato que mais imediatamente é necessário trazer à colação na discussão.


3.1. A Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto, constitui a Lei de Bases da Saúde.

No capítulo II, integrado pelas bases XII a XXII, trata-se das entidades prestadoras dos cuidados de saúde em geral.

Não se deverá confundir sistema de saúde, Serviço Nacional de Saúde e a rede nacional de prestação de cuidados de saúde.

Estes três conceitos vêm explicitados nos n.ºs. 1, 2 e 3 da base XII, que se transcreverá na íntegra por conter outro normativo que virá a ser objecto de referência.

"Base XII
Sistema de saúde
1 - O sistema de saúde é constituído pelo Serviço Nacional de Saúde e por todas as entidades públicas que desenvolvam actividades de promoção, prevenção e tratamento na área da saúde, bem como por todas as entidades privadas e por todos os profissionais livres que acordem com a primeira a prestação de todas ou de algumas daquelas actividades.
2 - O Serviço Nacional de Saúde abrange todas as instituições e serviços oficiais prestadores de cuidados de saúde dependentes do Ministério da Saúde e dispõe de estatuto próprio.
3 - O Ministério da Saúde e as administrações regionais de saúde podem contratar com entidades privadas a prestação de cuidados de saúde aos beneficiários do Serviço Nacional de Saúde sempre que tal se afigure vantajoso, nomeadamente face à consideração do binómio qualidade-custos, e desde que esteja garantido o direito de acesso.
4 - A rede nacional abrange os estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde e os estabelecimentos privados e os profissionais em regime liberal com quem sejam celebrados contratos nos termos do número anterior.
5 - Tendencialmente, devem ser adoptadas as mesmas regras no pagamento de cuidados e no financiamento de unidades de saúde da rede nacional da prestação de cuidados de saúde.
6 - O controlo de qualidade de toda a prestação de cuidados de saúde está sujeito ao mesmo nível de exigência."

É no capítulo III, directamente dedicado ao Serviço Nacional de Saúde, bases XXIV a XXXVI, que se detecta o preceito, exactamente a última base, que mais implicado se encontra em toda a problemática em análise.

“Base XXXVI
Gestão dos hospitais e centros de saúde
1 - A gestão das unidades de saúde deve obedecer, na medida do possível, a regras de gestão empresarial e a lei pode permitir a realização de experiências inovadoras de gestão, submetidas a regras por ela fixadas.
2 - Nos termos a estabelecer em lei, pode ser autorizada a entrega, através de contratos de gestão, de hospitais ou centros de saúde do Serviço Nacional de Saúde a outras entidades ou, em regime de convenção, a grupos de médicos.”

Observe-se, desde já, que os contratos de gestão permitidos no n.º 2 nada têm a ver com a possibilidade de celebração de contratos com entidades privadas, prevista na base XII, n.º 3 – aí, são contratos para a prestação de cuidados de saúde em entidades privadas; aqui, é a gestão de unidades do Serviço Nacional de Saúde. Retenha-se, igualmente, que o objecto das convenções celebradas no quadro desse n.º 3 e da base XLI [2], nada tem a ver com o das convenções para gestão.


3.2. No desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pela Lei n.º 48/90, tendo em conta, em especial, o n.º 2 da base XII, foi publicado o Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro, que aprova o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, adiante também designado por Estatuto.

Logo o artigo 1.º, dedicado à natureza do Serviço Nacional de Saúde, que, na lei como aqui, também poderá ser apenas designado por SNS, o define como "um conjunto ordenado e hierarquizado de instituições e de serviços oficiais prestadores de cuidados de saúde, funcionando sob a superintendência ou a tutela do Ministro da Saúde".

O SNS organiza-se em regiões de saúde, que, por sua vez, se dividem em subregiões de saúde, integradas por áreas de saúde -(artigo 3.º).

As instituições e serviços bem como as suas formas organizativas têm evoluído desde a versão original do Estatuto até ao presente.

Por exemplo, o artigo 13.º previa a integração dos centros de saúde em grupos de centros de saúde dotados de personalidade jurídica, mas o novo regime dos centros de saúde, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 157/99, de 10 de Maio, eliminou essa forma organizatória.

E o artigo 14.º, também já revogado, previa o seguinte:



"Artigo 14.º
Unidades de saúde
1 - Os hospitais e os grupos personalizados de centros de saúde agrupam-se em unidades de saúde, de dimensão a definir, caso a caso, em despacho do Ministro da Saúde, sob proposta do conselho de administração das ARS.
2 - Às unidades de saúde cabe assegurar a continuidade da prestação de cuidados, com respeito pelas atribuições das instituições que as integram.
3 - Em cada unidade de saúde há um conselho interno, composto por representantes dos hospitais e dos grupos personalizados de centros de saúde, presidido pelo coordenador sub-regional de saúde da área respectiva.
4 - O exercício de funções no conselho interno não dá lugar a qualquer remuneração suplementar.
5 - Os regulamentos internos das unidades de saúde são aprovados por portaria do Ministro da Saúde.”

Convém, desde já, notar a terminologia: instituições e serviços oficiais do SNS, unidades de saúde, grupos personalizados de centros de saúde, hospitais e centros de saúde.

Esta terminologia não é sempre empregue com significado uniforme [3] mas, para o que nos interessa, facilmente se dará conta


que há uma escala decrescente de amplitude – a primeira engloba a segunda mas não se esgota nela, a segunda compreende os grupos personalizados e os hospitais, os grupos personalizados só englobam os centros de saúde.

A chamada de atenção para a terminologia importa à compreensão do âmbito possível do contrato de gestão ou do regime de convenção.

Como vimos, a base XXXVI autoriza esses contratos para a gestão de hospitais ou centros de saúde mas não se pode dizer que esteja formulado em termos exclusivistas.

Ora, o Capítulo V do Estatuto tem redacção diversa, que há, no entanto, que interpretar em conjugação com aquela base habilitante.

Também o conceito de unidade de saúde, para os efeitos do Estatuto, isto é, o conceito definido no artigo 14.º, não deve ser esquecido. Na verdade, só ele nos permitirá compreender quer o ponto 3. do caderno de encargos do concurso, quer a cláusula 5.ª do contrato, quando previnem que a actividade a desenvolver pelo hospital deverá ser efectuada na óptica da sua integração na Unidade de Saúde da sua área de influência.

Entretanto, referimo-lo, foi revogado o artigo 14.º, pelo Decreto-Lei n.º 156/99, de 10 de Maio, o qual cria os sistemas locais de saúde (SLS).



“Artigo 2.º
Definição
1 - Um SLS é constituído pelos centros de saúde, hospitais e outros serviços e instituições, públicos e privados, com ou sem fins lucrativos, com intervenção, directa ou indirecta, no domínio da saúde, numa determinada área geográfica de uma região de saúde.
2 - Aos SLS cabe assegurar, no âmbito da respectiva área geográfica, a promoção da saúde, a continuidade da prestação de cuidados e a racionalização da utilização dos recursos.”

Os SLS sucedem, pois, às unidades de saúde do artigo 14.º do Estatuto na incumbência de assegurar a continuidade da prestação de cuidados na respectiva área geográfica.


3.3. Retomemos o Estatuto, com atenção especial para todo o seu capítulo V.

"Capítulo V
Contrato de gestão, convenção e contrato-programa

"Artigo 28.º
Gestão de instituições e serviços do SNS por outras entidades
1 - A gestão de instituições e serviços do SNS pode ser entregue a outras entidades mediante contrato de gestão ou a grupo de médicos em regime de convenção.
2 - Através do contrato de gestão o Ministro da Saúde pode autorizar a entrega da gestão de instituições e serviços de saúde integrados no SNS, ou parte funcionalmente autónoma, a entidades públicas ou privadas, com a faculdade de realizar obras ou adquirir equipamentos, mediante a retribuição das prestações de saúde.
3 - O conjunto de cláusulas a que, em regime de convenção, deve obedecer a gestão de instituições e serviços ou a prestação de cuidados de saúde no âmbito do SNS por grupos de médicos, mediante a retribuição das prestações de saúde, é aprovado por portaria do Ministro da Saúde.
4 - As instituições e serviços de saúde geridos nos termos dos números anteriores integram-se no SNS, estando as entidades gestoras obrigadas a assegurar o acesso às prestações de saúde nos termos dos demais estabelecimentos."

"Artigo 29.º
Contrato de gestão
1 - A celebração do contrato de gestão é precedida de concurso público.
2 - Quando o interesse público ou a natureza da instituição ou do serviço de saúde o exija, ou quando sejam necessárias especiais garantias relativas à entidade gestora, pode, a título excepcional, a entrega ser feita por ajuste directo, mediante resolução do Conselho de Ministros.
3 - O contrato de gestão deve definir, obrigatoriamente:
a) A instituição ou serviço de saúde objecto do contrato;
b) As prestações de saúde que a instituição ou serviço devem garantir;
c) As obras a realizar pela entidade gestora para a exploração da instituição ou serviço;
d) Forma e prazos de pagamento à entidade gestora, incluindo eventuais subsídios para os fins previstos no presente diploma;
e) Prazo de entrega e possibilidade de renovação;
f) As obrigações da entidade gestora relativamente à manutenção do serviço de saúde;
g) Garantias para o Estado do cumprimento do contrato;
h) Sanções para a inexecução do contrato por parte da
entidade gestora;
i) Formas de extinção do contrato, incluindo a rescisão unilateral por imperativo de interesse público.
4 - O programa do concurso e o caderno de encargos tipo são aprovados por portaria do Ministro da Saúde."

"Artigo 30.º
Gestão por grupos de médicos em regime de convenção
1 - É aplicável à convenção o disposto quanto ao contrato de gestão, com as especificidades decorrentes dos números seguintes.
2 - A convenção deve ser estabelecida com os médicos que exercem funções na instituição ou serviço de saúde, mediante adesão individual.
3 - Por despacho do Ministro da Saúde, é fixado o número mínimo de médicos que para cada estabelecimento devem aderir à convenção, sendo aplicável ao restante pessoal que não aceite a convenção o disposto no artigo 32.º
4 - Em casos excepcionais, reconhecidos por despacho do Ministro da Saúde, podem aderir à convenção médicos não pertencentes ao estabelecimento de saúde.
5 - Podem aderir à convenção outros profissionais de saúde que acordem com os médicos a sua participação, em termos a definir no despacho que autorize a convenção.
6 - Os médicos que assegurem a gestão de um serviço de saúde em regime de convenção devem constituir, para esse efeito, uma pessoa colectiva, sob qualquer das formas previstas na lei."

"Artigo 31.º
Regime
1 - As entidades gestoras regem-se nas suas relações com terceiros por regras de direito privado.
2 - A ARS é responsável pelo pagamento dos cuidados de saúde prestados aos seus beneficiários, de acordo com as tabelas de preços fixadas para a respectiva região nos termos do artigo 25.º ou com tabelas específicas a aprovar por despacho do Ministro da Saúde.
3 - Sem prejuízo da celebração de acordos específicos, a entidade gestora pode facturar, nos mesmos termos das outras instituições ou serviços do SNS, a entidades públicas ou privadas responsáveis legal ou contratualmente pelo pagamento de cuidados de saúde, nomeadamente subsistemas de saúde ou entidades seguradoras.
4 - O Estado ou outra pessoa colectiva pública pode subsidiar a entidade gestora para os seguintes fins:
a) Renovação de equipamentos e remodelação de instalações;
b) Investigação científica;
c) Formação profissional.
5 - Os bens adquiridos pela entidade gestora nos termos da alínea a) do número anterior revertem para o Estado findo o contrato, sem prejuízo do direito a compensação relativamente à parte não subsidiada.
6 - São da responsabilidade da entidade gestora todas as despesas motivadas pela prática de actos de administração ordinária indispensáveis ao normal funcionamento e conservação do estabelecimento."


3.4. O programa de concurso e o caderno de encargos tipo para a celebração de contratos de gestão vieram, nos termos do n.º 4 do artigo 29.º do Estatuto, a ser aprovados pela Portaria n.º 704/94, de 29 de Julho.

Poderemos descurar, atenta a economia, dir-se-ia, a máxima economia deste parecer, uma descrição dos termos deste regulamento, tanto mais quanto os procedimentos seguidos no concurso que levou à celebração do contrato, pelo menos na parte que aqui vai ser descrita, os parecem ter respeitado.

3.5. Tomemos nota, agora, de aspectos nucleares, sempre na perspectiva da consulta, do caderno de encargos do concurso e do negócio celebrado.

Trata-se do Concurso Público n.º 8/94.

“Caderno de Encargos
(...)
“3. Objecto e âmbito do contrato
O contrato tem por objecto a gestão integral do Hospital do Professor Doutor Fernando da Fonseca, garantindo a prestação continuada de cuidados de saúde globais, correspondentes ao exercício, em urgência, internamento e ambulatório, das valências constantes do programa funcional do Hospital do Professor Doutor Fernando da Fonseca, (constando do anexo I)(...).
A actividade a desenvolver deverá ser efectuada na óptica da integração do hospital na Unidade de Saúde da sua área de influência, nomeadamente através do relacionamento funcional com os Centros de Saúde e outras instituições de saúde da mesma ou outras áreas, assegurando prioritariamente os actos médicos referenciados pelos Médicos de Família da Unidade de Saúde que o Hospital integra. Deverá ainda garantir-se a continuidade dos cuidados para os quais o hospital possa não estar habilitado, em termos da sua diferenciação técnica em conjugação com outras instituições de saúde.
A actividade esperada deverá ser proposta pelos concorrentes e constar do cronograma e estratégia de implementação das diversas valências ou áreas de actividade do hospital.
4. (...).
5. Instalações e equipamentos
5.1. A ARSLVT disponibiliza à sociedade, o Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca, imóvel com respectiva área envolvente (ANEXO II) bem como todo o equipamento existente (ANEXO III).
5.2. O equipamento de Obstetrícia/Ginecologia deve ser apresentado pelos concorrentes sem prejuízo de o mesmo poder ser disponibilizado pela ARSLVT, nos termos do n.º 9 do Programa de Concurso.
5.3. Quaisquer remodelações que a sociedade considere necessárias, carecem de autorização do Conselho de Administração (CA) da ARSLVT e serão suportadas por aquela entidade.
5.4. A sociedade não pode onerar, por qualquer forma, os bens e direitos que integram o estabelecimento.
5.5. A sociedade, disponibilizará os meios adequados ao exercício de funções de autoridade de saúde, enquanto necessário.
5.6. As reparações, manutenção, renovação e substituição do equipamento é da inteira responsabilidade da sociedade, que suportará os respectivos custos, de acordo com o referido no art.º 51.º do Programa de Concurso e Cadernos de Encargos Tipo, aprovado pela Portaria 704/94, de 29 de Julho”.


3.6. O contrato de gestão para o Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca foi celebrado em 10 de Outubro de 1995, entre a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo – primeiro outorgante - e a Sociedade Hospital Amadora /Sintra – Sociedade Gestora, SA, com o número de identificação de pessoa colectiva 973266023 – segunda outorgante.

De acordo com a cláusula 4.ª, com a epígrafe “Entidade Gestora”, a segunda outorgante "obriga-se a ter ao longo de todo o período em que gerir o Hospital, como objecto social exclusivo o do presente contrato."

É na cláusula 5.ª que vem fixado o objecto do contrato:

"Cláusula 5.ª
(Objecto)
1. O presente contrato tem por objecto a gestão integral do Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca, por parte da SEGUNDA CONTRATANTE.
2. A gestão integral da referida unidade hospitalar deve garantir a prestação continuada de cuidados de saúde globais, correspondentes ao exercício, em urgência, internamento e ambulatório, das valências constantes do Anexo V, incluindo o respectivo apoio das especialidades de meios auxiliares de diagnóstico, assim como os necessários serviços e de apoio geral.
3. A actividade do Hospital será desenvolvida tendo em vista a prestação de cuidados de saúde globais na óptica da integração deste na Unidade de Saúde da sua área de influência, nomeadamente através do relacionamento funcional com os centros de saúde e outras instituições de saúde, da mesma ou de outra áreas, assegurando prioritariamente os actos médicos referenciados pelos médicos de família da unidade de saúde que o Hospital integra."

"Cláusula 6.ª
1. A SEGUNDA CONTRATANTE obriga-se a garantir o acesso aos cuidados de saúde prestados no Hospital a todos os utentes do SNS, nos mesmos termos dos demais estabelecimentos integrados no Serviço Nacional de Saúde (SNS), de acordo com a capacidade instalada e com o disposto nos números seguintes.
2. A SEGUNDA CONTRATANTE obriga-se a garantir a prestação de cuidados, em urgência e ambulatório, aos utentes do SNS residentes na área de influência do Hospital, a que corresponde os concelhos da Amadora e de Sintra.
3 (...)
4 (...)
5. (...)”

“Cláusula 8.ª
1. A SEGUNDA CONTRATANTE deve assegurar a continuidade dos cuidados de saúde para os quais o Hospital não esteja habilitado em termos de diferenciação e capacidade técnicas, recorrendo a outras instituições de saúde
2 - [...]
3. Para efeitos de garantir a continuidade de cuidados a SEGUNDA CONTRATANTE pode nomear um representante no conselho regional da PRIMEIRA CONTRATANTE e no conselho interno da unidade de saúde em que se integra, tendo em vista a articulação funcional.”

“Cláusula 13.ª
Entrada em vigor. Duração
1. O presente contrato entra em vigor no primeiro dia do mês subsequente à data da sua assinatura.
2 O presente contrato é válido pelo prazo de um ano, renovável, por iguais períodos, não sendo denunciável nos primeiros cincos anos, salvo existindo justa causa.
3. Qualquer das contratantes poderá denunciar o presente contrato, por escrito dirigido à outra contratante com a antecedência mínima, de onze meses com relação ao sexto ano de vigência e, seis meses com relação a todos os restantes períodos de prorrogação.”


"Cláusula 14.ª
Competências da SEGUNDA CONTRATANTE
1.
2. À SEGUNDA CONTRATANTE compete ainda:
(...)
h) Efectuar os estudos e projectos necessários à definição detalhada de todos os aspectos técnicos relativos à realização de obras e aquisição de equipamentos;
i) Contratar e gerir todas as obras de serviços e de fornecimentos necessários para o normal funcionamento do Hospital;
j) Contratar e gerir todas as obras, serviços e fornecimentos extraordinários que, solicitados por ela, hajam sido aprovados pela PRIMEIRA CONTRATANTE;
l) Manter actualizado o programa de manutenção e segurança das instalações e equipamentos."


"Cláusula 17.ª
Contratos de trabalho e prestação de serviços
[...]
4. A PRIMEIRA CONTRATANTE obriga-se a exigir, no âmbito de nova adjudicação com vista à celebração de contrato de gestão do Hospital, que a nova entidade gestora assuma o pessoal ao serviço da SEGUNDA CONTRATANTE à data do facto que determinar a extinção do presente contrato, com o limite constante do mapa de referência em vigor nos termos dos n.º 3,4 e 5 da cláusula 15.
5 (...)";


"Cláusula 24.ª
Bens e equipamentos afectos à gestão
1. A PRIMElRA CONTRATANTE cede à SEGUNDA CONTRATANTE, o imóvel do Hospital Doutor Fernando Fonseca, bem como a respectiva área envolvente e equipamento existente, identificados, respectivamente, nos Anexos III e IV, comprometendo-se a assegurar a sua aptidão para o desempenho da função específica a que está destinado, sem prejuízo do disposto na cláusula seguinte.
2. A SEGUNDA CONTRATANTE logo que detecte qualquer falta, ausência de peças ou elementos ou deficiência no funcionamento de qualquer equipamento ou que o mesmo não satisfaz o normal funcionamento do Hospital, avisará a PRIMElRA CONTRATANTE, que se obriga a, no mais curto espaço de tempo possível, suprir a falta, corrigir o vício ou completar o equipamento.
3. Se no prazo de cinco dias, salvo maior prazo a acordar pelas partes de acordo com critérios de razoabilidade, não tiverem sido tomadas as medidas necessárias à regularização da situação, fica a SEGUNDA CONTRATANTE, com o direito a regularizá-la, também de acordo com critérios de razoabilidade, debitando a PRIMElRA CONTRATANTE pelo preço e demais custos havidos, que lhe serão pagos no prazo de trinta dias, contados a partir da data da interpelação para pagamento.
4. O disposto nos pontos anteriores 2. e 3. caduca decorridos que sejam 3 meses sobre a última das datas correspondentes a um dos factos seguintes:
a) Abertura efectiva das valências a que os equipamentos estão associados;
b) Cessação de funções da Comissão Instaladora.
5. A cedência dos bens e equipamentos está indissociavelmente ligada ao presente contrato, não podendo a SEGUNDA CONTRATANTE invocar a qualquer título direito de retenção sobre os mesmos.
6. Os bens e direitos que integram o Hospital não poderão ser onerados, por qualquer forma, pela SEGUNDA CONTRATANTE.
7. Os materiais consumíveis existentes em stock ou já encomendados à data do início da vigência do presente contrato poderão ser adquiridos pela SEGUNDA CONTRATANTE, pelo preço e nas condições a negociar."


"Cláusula 25.ª
[...]
4. As benfeitorias efectuadas nas instalações e nos equipamentos bem como os novos equipamentos ou os adquiridos em substituição, reverterão para o Estado, no termo do contrato, sem prejuízo das compensações equivalentes aos valores ainda não amortizados."

"Cláusula 26.ª
Renovação de equipamentos
1. As reparações ou modificações estruturais ou reparações extraordinárias e de substituição de instalações e equipamento devem ter o acordo prévio do Conselho de Administração da PRIMElRA CONTRATANTE, podendo ser subsidiada ao abrigo da alínea a) do no 4 do art.º 31° do Estatuto do SNS.
2. As obras realizadas e bens adquiridos pela SEGUNDA CONTRATANTE nos termos do número anterior revertem para o Estado no termo do contrato, sem prejuízo do direito a compensação na parte não subsidiada. Não haverá direito a compensação ou indemnização, no caso de rescisão fundada em incumprimento do contrato pela SEGUNDA CONTRATANTE.
3. Quaisquer outros actos de administração extraordinária devem merecer a anuência prévia da PRIMElRA CONTRATANTE.
4. A PRIMElRA CONTRATANTE pode determinar, a todo o tempo, a aquisição ou trabalhos de manutenção de equipamento que se tornem necessários ao cabal cumprimento do contrato, segundo critérios de evolução científica e tecnológica, de qualidade e segurança, sem prejuízo das correspondentes contrapartidas financeiras."

"Cláusula 27.ª
Danos ou destruição
1. São da responsabilidade da SEGUNDA CONTRATANTE todas as reparações, reconstruções e demais despesas relativas ao Hospital e seu equipamento, motivados por mau uso, avaria ou perda culposa, a ela imputáveis ou imputáveis a terceiros, ainda que dela não dependentes.
2. Se o Hospital ou parte dele, for danificado ou destruído durante o período de vigência do presente contrato em consequência de facto fortuito ou força maior nos termos do n.º 3 da Cláusula 40.ª a SEGUNDA CONTRATANTE não é responsável pela sua reparação ou reconstrução."

"Cláusula 38.ª
Modificações objectivas
1. Quando o interesse público o exija, a PRIMElRA CONTRATANTE poderá indicar à SEGUNDA CONTRATANTE alterações, nomeadamente quanto ao tipo de prestações que o Hospital deva realizar no âmbito do SNS, devendo para o efeito comunicar à SEGUNDA CONTRATANTE com uma antecedência razoável o tipo de alteração a introduzir, sem prejuízo da reposição do equilíbrio financeiro do contrato.
2. A SEGUNDA CONTRATANTE pode solicitar a revisão das condições financeiras do contrato, quando se verifique um excesso significativo relativamente à actividade esperada."

"Cláusula 41.ª
Reposição do equilíbrio financeiro do contrato
1. Haverá lugar à reposição do equilíbrio financeiro global do contrato, sempre que a prestação da SEGUNDA CONTRATANTE se torne excessivamente onerosa, por facto que não lhe seja imputável, nomeadamente por:
a) acontecimentos supervenientes que eram razoavelmente imprevisíveis aquando da conclusão do contrato
b) alterações da iniciativa da PRIMEIRA CONTRATANTE, designadamente quanto a prestação de novas valências, ainda que com fundamento em interesse público, conforme o previsto na Cláusula 38.ª;
c) alterações normativas, com impacto directo e significativo sobre os custos e ou receitas respeitantes no presente contrato.
(...)”.


3.7. Ter-se-á notado já que, constituindo elemento central do debate o Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca ainda não tenhamos visto como surgiu ele na ordem jurídica. Não se poderá adiar mais essa informação. Ele foi criado pelo Decreto-Lei n.º 382/91, de 9 de Outubro [4], com o seguinte articulado:

“Artigo 1.º
1 - É criado o Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca, dotado de personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira, que funcionará na Amadora.
2 - Ao Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca é atribuída a classificação de hospital distrital de valências básicas e intermédias de nível 2.”

“Artigo 2.º
O Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca reger-se-á, na parte não prevista neste diploma, pelas disposições legais aplicáveis aos estabelecimentos hospitalares integrados no Serviço Nacional de Saúde.”


“Artigo 3.º
Ao Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca é aplicável o regime de instalação previsto nos artigos 79.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 413/71, de 27 de Setembro, a partir da data da nomeação da comissão instaladora.” [5]

Dispondo deste elementos legislativos e factuais estaremos em condições de começar a percorrer uma a uma as etapas que nos deverão permitir, finalmente, tomar posição sobre os temas em debate.



4.


Começaremos por detectar a natureza do contrato previsto na lei, e prosseguiremos tentando destacar a espécie a que pertence dentro da natureza considerada; depois, debruçar-nos-emos sobre os problemas da modificação do contrato; finalizaremos com um olhar mais em pormenor sobre o contrato efectivamente celebrado.


4.1. Para MARCELLO CAETANO, “é contrato administrativo, no Direito português, o contrato celebrado entre a Administração e outra pessoa com o objecto de associar esta por certo período ao desempenho regular de alguma atribuição administrativa, mediante prestação de coisas ou de serviços, a retribuir pela forma que for estipulada, e ficando reservado aos tribunais administrativos o conhecimento das contestações, entre as partes, relativas à validade, interpretação e execução das suas cláusulas” [6].

Esta definição é, como se vê, uma definição enquadrada no tempo e lugar a que se reporta. Era ela tributária do regime consagrado no artigo 815.º, § 2.º, do Código Administrativo, que continha uma enunciação fechada de contratos administrativos.

O artigo 9.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de Abril, veio permitir novos desenvolvimentos da noção.

SÉRVULO CORREIA sugere a seguinte definição: “o contrato administrativo é um contrato que constitui um processo próprio de agir da Administração pública e que cria, modifica ou extingue relações jurídicas, disciplinadas em termos específicos do sujeito administrativo, entre pessoas colectivas da Administração ou entre a Administração e os particulares” [7].

Com o Código do Procedimento Administrativo (CPA), mantém-se através do artigo 178.º, a linha legal do artigo 9.º do ETAF, que representa acolhimento da visão doutrinária, por exemplo, de FREITAS do AMARAL para quem, "do ponto de vista do direito substantivo, são contratos administrativos todos aqueles que tiverem um regime de direito Administrativo; designadamente, serão contratos administrativos todos aqueles dos quais resultar a criação, modificação ou extinção de uma relação jurídica administrativa” [8].

Ressalta a nuclear importância da noção de relação jurídica de direito administrativo, que, para o mesmo autor, é “aquela que confere poderes de autoridade ou impõe restrições de interesse público à Administração perante os particulares ou que atribui ou impõe deveres públicos aos particulares perante a Administração” [9], e, por exemplo, para SÉRVULO CORREIA é “um sistema complexo de situações jurídicas activas e passivas, interligadas em termos de reciprocidade, regidas pelo direito Administrativo e tituladas pela Administração e por particulares ou apenas por diversos pólos finais de imputação pertencentes à própria Administração” [10].

Pode sustentar-se, pois, que “é inequívoca a qualificação como contrato administrativo, já que, nele, intervém a Administração Pública prosseguindo interesse público em termos tais de prevalência sobre o interesse privado da contraparte que legitima um regime específico de claro pendor juspublicista” [11].

Esta prevalência do interesse público resulta logo do disposto na base XXXVI da Lei de Bases, no artigo 29.º do Estatuto, bem como na Portaria que o executou.

E com efeito, vários dos traços do regime do contrato em causa apontam no sentido da natureza de direito público: “Assim, prevê-se a possibilidade de rescisão unilateral do contrato quando o interesse público o exija, a densificação regulamentar do regime legal remete expressamente para a legislação administrativa, a propósito da resolução de litígios advenientes do contrato e o contrato em concreto, refere, por exemplo, o interesse público à contratação pela entidade gestora do pessoal com relação jurídica de emprego público, o que naturalmente comprova, pelo tipo de faculdades que confere, a qualidade de Administração Pública com que um dos sujeitos participa no contrato” [12].

Da celebração do contrato derivou a criação de uma relação jurídica de direito administrativo.

Crê-se não suscitar dúvidas que o contrato de gestão previsto na Lei de Bases e no Estatuto é um contrato administrativo, e essa é a natureza do contrato efectivamente celebrado.

Tratando-se de ponto incontroverso, não haverá razões para nos determos noutros aprofundamentos da noção de contrato administrativo.


4.2. Indicámos que a uma fase de, pelo menos para certa doutrina, rígida fixação dos tipos de contratos administrativos admissíveis em direito português se seguiu uma postura aberta do nosso ordenamento, de modo a ir encaixando naquela noção e no seu regime as realidades contratuais que substancialmente nele se subsumem.

Por isso, o n.º 2 do artigo 178.º do CPA apresenta uma enunciação meramente exemplificativa de contratos administrativos.

“São contratos administrativos, designadamente, os contratos de:
a) Empreitada de obras públicas;
b) Concessão de obras públicas;
c) Concessão de serviços públicos;
d) Concessão de exploração do domínio público;
e) Concessão de uso privativo do domínio público;
f) Concessão de exploração de jogos de fortuna ou azar;
g) Fornecimento contínuo;
h) Prestação de serviços para fins de imediata utilidade pública.”

Ora, SÉRVULO CORREIA, fazendo a distinção dos contratos em razão da sua causa-função, indicava entre os contratos de colaboração, e para além dos agora previstos nas alíneas a), b), c), f), g) e h) do número e preceito acabados de citar, os contratos de associação entre o Estado e escolas particulares e cooperativas, os acordos de gestão, celebrados entre o Estado e os gestores públicos, os contratos de arrendamento de imóveis para a instalação provisória e urgente de serviços públicos; e entre os contratos de atribuição, para além dos ora enunciados nas alíneas d) e e) do mesmo número, destacava os contratos-programa, em que incluía os contratos de desenvolvimento, e indicava, ainda, os contratos de investimento estrangeiro, os contratos de entrega para exploração de prédios expropriados ou nacionalizados no âmbito da reforma agrária, de arrendamento de bens imóveis do domínio privado do Estado, de transferência e alienação de imóveis do domínio público do Estado afectos às administrações portuárias e outros mais [13].

Haverá, pois, toda a conveniência em perceber, dentro dos contratos administrativos, em que espécie ou tipo se integra o contrato previsto na Lei de Bases e no Estatuto, e efectivamente celebrado.

É grande, como já se viu, a variedade de contratos administrativos, pelo que apenas haverá interesse e ocasião para uma breve discussão sobre as razões que nos conduzem a afastar a inserção numa ou noutra espécie que pode suscitar alguma controvérsia, procedendo-se, concomitantemente, ao enunciado das razões que nos conduzirão à opção que se julga adequada.

A dúvida vem de o contrato de gestão não aparecer entre os elencados na enumeração exemplificativa do CPA, nem em designações precedentes de outros contratos administrativos.

Sabendo-se, porém, que não é o nomen juris o decisivo, se bem que na análise se deva compreender, pelo menos, quais as razões por que se vem a utilizar um nome jurídico diverso dos consagrados e disponíveis para o legislador, poderíamos concentrar-nos em cinco tipos:

O contrato de empreitada de obras públicas;
O contrato de concessão de obras públicas;
O contrato de concessão de serviços públicos;
O contrato de prestação de serviços;
O contrato de cessão de exploração do domínio público.

A distinção destes dois últimos contratos face ao de gestão será feita mais à frente no ponto em que, ao decidirmo-nos pela qualificação a realizar, nos serviremos textualmente de posições já doutrinariamente expressas.

Dos três iniciais, os dois primeiros obtêm no nosso direito uma definição legal. Conquanto as definições de lei tenham as suas limitações poderemos considerá-las como uma aproximação que pode ser bastante para os fins da consulta.

Dispõe o Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março de 1999:

"Artigo 2.º
[...]
3 – Entende-se por empreitada de obras públicas o contrato administrativo, celebrado mediante o pagamento de um preço, independentemente da sua forma, entre um dono de obra pública e um empreiteiro de obras públicas e que tenha por objecto quer a execução quer conjuntamente a concepção e a execução das obras mencionadas no n.º 1 do artigo 1.º, bem como das obras ou trabalhos que se enquadrem nas subcategorias previstas no diploma que estabelece o regime do acesso e permanência na actividade de empreiteiro de obras públicas, realizados seja por que meio for e que satisfaçam as necessidades indicadas pelo dono da obra.
4- Entende-se por concessão de obras públicas o contrato administrativo que, apresentando as mesmas características definidas no número anterior, tenha como contrapartida o direito de exploração da obra acompanhado ou não do pagamento de um preço."

Como se vê, na empreitada, o empreiteiro concebe e executa ou só executa uma certa obra sendo por esse trabalho pago por um preço estabelecido. Executada, a obra é entregue ao dono dela.

Na concessão, o concessionário também concebe e executa ou só executa a obra mas, para além de poder ser pago por um preço estabelecido, a contrapartida necessária desse trabalho é o direito de exploração da obra executada.

Nada disto se passa no contrato de gestão. Se bem que o gestor tenha a faculdade de realizar obras, não lhe é imposta a concepção nem a execução de qualquer obra especificada, que entregará após terminada, nem ele vai explorar uma obra. Ao contrário, ele recebe para gestão não só um património já existente, uma universalidade, como também uma organização, destinados à prestação de serviço público.


4.3. Impõe-se que nos detenhamos mais demoradamente no contrato de concessão de serviços públicos.

Trata-se de um contrato, pois, que embora nominado não dispõe de um regime legal.

Para FREITAS do AMARAL, concessão de serviços públicos “é o contrato administrativo pelo qual um particular se encarrega de montar e explorar um serviço público, sendo retribuído pelo pagamento de taxas de utilização a cobrar directamente dos utentes” [14].

Ora, logo se vê, comparando a definição com a realidade sob apreciação, que não estaremos face a um contrato de concessão, na óptica da referida definição.

É que, nem a lei nem o contrato celebrado supõem que o gestor deva montar o serviço, nem supõem que o principal da retribuição seja o pagamento das taxas de utilização.

A lei, ao invés, impõe-se a si própria a criação do meio, a criação da pessoa colectiva - o hospital ou o centro de saúde com personalidade jurídica -, ou do serviço simples, ou de uma unidade funcionalmente autónoma deste tipo de instituições ou serviços. E são estas pessoas colectivas ou serviços simples, necessariamente identificados no contrato, e destinados a satisfazer necessidades colectivas de saúde, estas pessoas ou serviços, com as suas competências e atribuições definidos por lei, ou apenas com as suas competências, no caso dos serviços simples, que se entregam para gestão.

Centra-se, assim, o âmbito do contrato, na gestão de um centro de saúde, de um hospital, ou de parte autónoma destes, e não na gestão da satisfação de certas necessidades colectivas em determinada área.

Por outro lado, conforme o n.º 2 do artigo 31.º do Estatuto, é a Administração Regional de Saúde a responsável pelo pagamento dos cuidados de saúde prestados aos seus beneficiários, de acordo com as tabelas de preços fixadas para a respectiva região nos termos do artigo 25.º ou com tabelas específicas a aprovar por despacho do Ministro da Saúde.

E é na concretização deste imperativo legal que as cláusulas 9.ª e 10.ª do contrato celebrado dispõem que a remuneração da Sociedade Gestora assenta no pagamento de um preço global por parte da Administração Regional de Saúde em prestações mensais.

Estas fugas de um modelo normal de contrato de concessão, designadamente quanto à retribuição, são reconhecidas nos pareceres de PEDRO MADEIRA de BRITO [15] e SÉRVULO CORREIA [16].

Não obstante, porque se trata de contrato sem definição legal, não é impertinente admitir a evolução do conceito, com uma actualização dos seus limites, uma redefinição dos seus parâmetros, o que conduz, igualmente, a não se poder considerar desprovida de forte sustentação a integração que nele se poderá entender fazer do contrato em análise [17].

Sobre esta vertente remuneratória, escreve PEDRO GONÇALVES:

"Ora, ao contrário do que se verifica noutros ordenamentos jurídicos (v.g., francês e espanhol), não há no direito português nenhum princípio ou norma jurídica que impeça de qualificar como concessão de serviço público o acto que «concede» a uma entidade o «direito de gerir um serviço público» e que estabelece como contrapartida do gestor uma remuneração suportada exclusivamente pelo concedente. Desde que o acto em causa efectue a «concessão» de um «serviço público» e seja a fonte de uma «relação jurídica administrativa», aquela qualificação não só se recomenda como se impõe (-).

“Aceitando-se, como aqui se aceita, que a remuneração do concessionário pode consistir exclusivamente numa retribuição a cargo do concessionário, exclui-se também que a concessão pressuponha a assunção de um risco económico-financeiro por parte do concessionário."

Mas logo acrescenta o mesmo autor:

"O facto de se expurgarem esses elementos da «essência do conceito de concessão de serviços públicos, não significa que eles não sejam no entanto elementos normais, frequentes ou até «naturais» no negócio de concessão. Em regra as várias concessões de serviços

públicos existentes continuam a poder ser caracterizadas segundo o critério tradicional da remuneração (pelos utentes) e pela álea financeira do concessionário. O que aqui se sustenta é apenas que esses elementos não são elementos essenciais do conceito de concessão de serviços públicos" [18].

E tenha-se em atenção que, ainda recentemente, intentando a Comissão da Comunidade Europeia obter uma caracterização da concessão de serviços, para efeitos do direito comunitário, servindo-se de abundante elaboração prévia, considerou:

"Efectivamente, tal como para as concessões de obras, o critério da exploração constitui uma característica essencial para determinar se se está em presença de uma concessão de serviços. Segundo este critério, uma concessão existe quando o operador suporta os riscos ligados ao serviço em causa (estabelecimento do serviço e sua exploração), sendo remunerado pelo utente, nomeadamente através da cobrança de taxas, sob qualquer forma que seja. O modo de remuneração do operador é, como na concessão de obras, um elemento que permite determinar a assunção do risco de exploração" [19].


Todos estes elementos de perturbação de um normal contrato de concessão, mas que não impediriam, por si, a integração nessa categoria, poderão ser observados, de um outro ponto de vista, já não como perturbadores, antes normais, se caminharmos, como pensamos que é possível e ajustado, no sentido de uma caracterização diversa do contrato, no que não seremos inovadores, aliás.

Vejamos.

4.4. Deveremos relembrar que, tipicamente, a concessão de serviços públicos opera-se “em relação aos serviços públicos económicos e consiste em confiar a exploração do serviço a uma empresa privada que actuará, durante o prazo estipulado, por sua conta e risco, como se fora o concedente" [20].

E mesmo recentemente, aceitando a distinção entre serviços públicos económicos, serviços públicos sociais e serviços públicos culturais, PEDRO GONÇALVES, sem proceder a qualquer exclusão, afirma que é nos primeiros "que a concessão de serviços públicos tem (...) o seu espaço preferencial" [21].

Já para serviços sociais ou de assistência ocorreria a gestão por delegação.

E qual a diferença entre a delegação e a concessão?

No "caso de delegação a entidade pública cria o serviço e conserva a responsabilidade pelo seu financiamento bem como total ou parcialmente, a titularidade dos riscos que o desempenho da actividade possa acarretar, conferindo à entidade privada apenas a competência necessária para conservar a organização e assegurar o regular e eficaz funcionamento do serviço. Ao passo que na concessão a pessoa colectiva de direito público transfere temporariamente para a entidade privada o exercício dos direitos exclusivos de exploração do serviço, passando este a correr por conta e risco do concessionário" [22].

Presentemente, o Estatuto prevê que o Ministro da Saúde pode autorizar a celebração de contratos-programa entre ARS e autarquias locais, misericórdias ou outras instituições particulares de solidariedade social, com vista a recuperar e a gerir instituições ou serviços prestadores de cuidados de saúde (artigo 34.º).

Note-se, in casu, que se trata da gestão de instituição integrada no SNS. Não é, portanto, que a prestação de cuidados de saúde não possa ser efectuada com um sentido puramente económico. Um hospital privado reger-se-á por uma lógica puramente económica, mas não as instituições do SNS, sem prejuízo de também estas na medida do possível deverem seguir regras de gestão empresarial, como estipula a Lei de Bases [23].


4.5. Anotámos, atempadamente, que não existe uma identidade de formulação gramatical entre a Lei de Bases e o Estatuto.

A Lei de Bases autoriza a entrega, através de contratos de gestão, de hospitais ou centros de saúde do SNS a outras entidades, ou em regime de convenção a grupos de médicos; o Estatuto possibilita a entrega da gestão de instituições e serviços do SNS a outras entidades mediante contrato de gestão.

O termo serviços estará utilizado no sentido dos “organismos simples, sem personalidade jurídica, dotados, ou não, de autonomia administrativa e financeira”, o termo instituições, no sentido de “organismos dotados de personalidade jurídica” [24].

Aparentemente, pois, o Estatuto estende a possibilidade de contratos para gestão de outros entes que não só hospitais ou centros de saúde [25].

Mas seja como for, o que se entrega para gestão, através do respectivo contrato, é uma instituição ou serviço oficial, que tem, aliás, uma classificação própria, segundo a natureza das responsabilidades e o quadro de valências (artigo 12.º do Estatuto). O Hospital do Professor Doutor Fernando da Fonseca é, de acordo com o seu diploma criador, um hospital distrital de valências básicas e intermédias de nível 2.
Não se entrega para gestão o fim que essas instituições ou serviços devem prosseguir, ou, dito de outra forma, não se concessiona o serviço público enquanto actividade administrativa, entrega-se uma instituição ou serviço para que (este é o pressuposto da lei) a actividade que eles devem realizar com vista à satisfação das necessidades colectivas, in casu, de saúde, seja mais bem prosseguida e atingida.

Este ponto parece-nos de suma importância.

Na concessão de serviços públicos, o determinante para a distinção entre uma concessão e outra é saber qual a actividade pública que é concedida, qual o serviço público como função, “o modo de actuar da autoridade pública a fim de facultar, por modo regular e contínuo, a quantos deles careçam, os meios idóneos para satisfação de uma necessidade colectiva individualmente sentida” [26], que é colocado à disposição do particular.

Como diz um Autor, “o serviço público não é qualquer actividade da Administração, sendo antes a qualificação de um certo tipo de tarefas administrativas cujo elemento essencial se encontra no conceito de prestação. O serviço público é, pois, uma tarefa administrativa de prestação, que não deve confundir-se com outras tarefas da Administração, como sejam as tarefas de polícia ou regulação, de fomento ou promoção, de planeamento ou de infra-estruturas” [27].

No contrato de gestão de que cuidamos [28], a identificação do instituto público (estabelecimento público) ou unidade funcional desse instituto público é que é o essencial para a distinção entre um contrato de gestão e outro. Não há contrato sem o referente do concreto instituto público entregue.

Não poderá, por isso, confundir-se a actividade e fim prosseguidos pela instituição hospitalar ou centro de saúde, a prestação de certos cuidados de saúde, com o hospital, centro de saúde, pessoa colectiva. É o hospital X, é o centro de saúde Y que pode ser gerido por particulares, ou por outras entidades públicas que não as titulares, através do contrato de gestão.

O centro de saúde, o hospital, preexiste pois ao contrato, por isso que é entregue para gestão.

Mas não impõe o Estatuto que tenha que ser toda a instituição ou serviço objecto do contrato. É que pode ser celebrado contrato só para gestão de “parte funcionalmente autónoma”.

Digamos que o Estatuto toma em conta a lei de gestão hospitalar que incentivava os centros de responsabilidade e de custos (artigo 9.º) e se antecipa ao que vem mais tarde a ser estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 347/99, de 18 de Setembro.

Este diploma estabelece o regime geral a que deve obedecer a criação dos centros de responsabilidade integrados (CRI), nos hospitais e centros hospitalares do SNS. Os CRI constituem estruturas orgânicas de gestão intermédia, agrupando serviços e ou unidades funcionais homogéneas e ou afins (artigo 2.º).

E também os centros de saúde nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 157/99, de 10 de Maio, se estruturam em unidades funcionalmente autónomas.

Quer dizer, pois, que o contrato de gestão pode ser celebrado para a gestão total dum hospital, dum centro de saúde, ou para a gestão de parte funcionalmente autónoma de um ou de outro daqueles entes.

É neste contexto que se deverá interpretar o objecto do contrato quando na cláusula 5.ª se enuncia que o objecto do contrato é a gestão integral do Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca.

Não se trata da gestão de uma unidade funcionalmente autónoma do hospital, por exemplo, o serviço de urgência, o serviço de cardiologia, ou outro. Trata-se da gestão completa do hospital. Não se poderá, pois, retirar qualquer outra significação à expressão gestão integral nomeadamente extrair dela que o objecto do contrato é a prestação de cuidados de saúde [29].


4.6. Dito isto, é indiscutível que a prestação de cuidados de saúde é o serviço público que o hospital exerce, e é para a garantia da prestação desses cuidados que o contrato é celebrado. Mais, a obrigação de prestação de cuidados integra a relação obrigacional complexa que o contrato de gestão constitui. E no sentido de evitar quaisquer dúvidas sobre a determinação dessa prestação o contrato isola-a, como isola várias outras, na cláusula 6.ª e também na cláusula 8.ª [30], nas quais se cumpre a concretização exigida pelo disposto na alínea b) do n.º 3 do artigo 29.º do Estatuto.

É tendo por desiderato uma boa prestação de cuidados de saúde que se procede ao concurso para a gestão do hospital, que é o meio existente para o efeito. O concorrente que demonstrar que melhor gerirá o meio, isto é, que através daquele meio melhor prestará os cuidados de saúde deverá ser o vencedor do concurso.

Em rigor, aliás, a hierarquização das propostas apresentadas, de acordo com a melhor garantia da satisfação do interesse público, obedece, face ao artigo 27.º, n.º 1, da Portaria n.º 704/94, aos seguintes critérios:

“a) Capacidade para gerir estabelecimentos de saúde;
b) Grau de satisfação dos requisitos técnicos do concurso, nomeadamente quanto à operacionalidade em termos de recursos humanos, médico, enfermagem, técnico e técnico de administração, apresentado para assegurar a gestão;
c) Garantias da prestação continuada de cuidados de saúde, incluindo o respeito pelo funcionamento das valências previsto, bem como os actos médicos a praticar através de outras instituições;
d) Valores apresentados para o conjunto das prestações de cuidados de saúde definidas nas condições especiais;
e) Outros requisitos a estabelecer no programa do concurso, de harmonia com o disposto no n.º 2 do artigo 9.º”.

Uma boa gestão, pois, conduzirá a boa prestação de cuidados, mas a gestão não se confunde com esse dever de prestar, pois envolve aspectos organizativos, administrativos, económicos, financeiros que não respeitam directamente a esse dever.


4.7. Na caracterização legal do contrato de gestão há-de notar-
-se ter existido um especial cuidado normativo em não deixar que ele pudesse vir a ser encarado como o típico contrato de concessão de serviço público, em que o predominante é a cessão da actividade administrativa que a Administração Pública deve desenvolver, enquanto serviço público, a qual é colocada sob gestão de outros que não o seu titular público.

Entrega de hospitais, através de contratos de gestão, prevê a Lei de Bases (base XXXVI), entrega da gestão, prevê o artigo 28.º do Estatuto; e o n.º 3 do artigo 29.º do mesmo impõe que o contrato de gestão deve definir, obrigatoriamente, a instituição ou serviço de saúde objecto do contrato [31].


Quer dizer, o conjunto de normativos que se ocupam deste negócio jurídico (novo?) são constantes na afirmação do objecto do contrato como sendo a gestão de uma instituição ou serviço de saúde, ou seja um hospital, centro de saúde, ou serviço funcionalmente autónomo. Jamais aparece a ideia do objecto desfocada de uma concreta unidade hospitalar, de um concreto centro de saúde ou de uma concreta parte funcionalmente autónoma destes estabelecimentos.

Compreendem-se as cautelas do legislador. Estamos em sede de experiência pioneira, são os cuidados de saúde que estão em causa, cuidados de saúde prestados por entidades integradas no SNS e nos seus vários patamares organizativos.

A Lei não se sentiu (e não podia), em condições de tratar a saúde, neste quadro do SNS, como uma mera actividade económica, pois se assim tivesse sido, não teria tido dificuldades em adoptar o nome jurídico concessão. Não o adopta, e tão evidente parece ter sido essa distinção para os próprios outorgantes do contrato, que também em nenhum ponto do clausulado é a sociedade gestora designada de concessionária ou a ARS de concedente.


4.8. O grupo de razões que acabámos de enunciar inclina-
-nos a julgar que o contrato de gestão deverá ser considerado distinto do contrato de concessão de serviços públicos; é um novo tipo de contrato administrativo inscrito na nossa ordem jurídica.

No que não se trará uma posição original, dissemo-lo.

PEDRO GONÇALVES, que recentemente foi quem entre nós mais desenvolvidamente estudou o contrato de concessão de serviços públicos, admitindo que nesse conceito caibam diversos tipos contratuais que não se encaixariam na noção tradicional [32], inclina-se, no entanto, e igualmente, no sentido da distinção, incluindo o que ora analisamos no tipo de “contratos de gestão de estabelecimentos públicos”. Diz:

"O exemplo mais destacado deste tipo contratual parece-nos ser o dos contratos de gestão de instituições e serviços do Serviço Nacional de Saúde. Do que se trata nesses contratos é de atribuir a uma entidade (ou a um grupo de médicos) «a gestão de instituições e serviços de saúde inte­grados no SNS, ou parte funcionalmente autónoma (...), com a faculdade de realizar obras ou adquirir equipamentos, mediante a retribuição das prestações de saúde». Não está aqui em causa um contrato com eficácia meramente bilateral, de prestação de serviços da entidade gestora à Administração, já que aquela assume o dever de prestar serviços («prestações de saúde») a terceiros; trata-se portanto de um contrato com uma estrutura muito semelhante à do contrato de concessão de serviços públicos (com uma componente ad intra, nas relações entre a Administração e a entidade gestora, e outra ad extra, nas relações entre a entidade gestora e os utentes).

"Não obstante a sua semelhança estrutural com a concessão de serviços públicos, o objecto dos contratos em causa não é a gestão de um serviço público (pelo menos, em sentido funcional); de resto, a Administração não «dispõe» do serviço hospitalar (mantendo, por exemplo, todas as suas responsabilidades em matéria de instalações e pessoal), mas apenas da gestão ou administração da instituição ou serviço de saúde que é, aliás, o objecto do contrato. O gestor do serviço de saúde não explora nem gere uma «actividade administrativa»; ele administra ou gere um estabelecimento público.” [33].

Na linha deste autor segue VIEIRA de ALMEIDA [34].

É esta posição de autonomia que perfilham NOGUEIRA da ROCHA e PEDRO MADEIRA de BRITO [35]:

Reportando-se ao contrato de gestão e à convenção referem:

“Encontramo-nos perante contratos administrativos nominados e típicos, em função do regime jurídico estabelecido na lei. Nominados por terem uma designação dada por lei. Típicos, por terem um regime jurídi­co que os identifica.

“5.2.Distinção de figuras afins

“Quer o contrato de gestão quer a convenção com grupo de médicos têm particularidades que os distinguem de outras figuras, nomeadamente da concessão de serviço público e da cessão de exploração de direito público.

“Quanto à concessão, a entidade gestora não assegura a exploração do serviço em função da cobrança de tarifas ou taxas pelos serviços prestados aos utentes. Em segundo lugar existem especialidades decorrentes da interligação entre a prestação de cuidados da instituição ou serviço entregue a gestão de outras de entidades e os outros estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde, o que quer dizer que a exploração não é autónoma. Por outro lado, as relações contratuais estendem-se para além do acto que confere a qualidade de concessionário em função da retribuição das prestações de Saú­de pela Administração.

“As figuras jurídicas em análise também não constituem uma cessão de exploração de direito público porque o objecto do contrato vai além da mera fruição temporária do estabelecimento, hospital ou centro de saúde, abrangendo a prestação de cuidados enquanto com-teúdo do serviço público. Por outro lado, não há pagamento de um valor pela cessão de exploração, nem a exploração é feita com total autonomia pois está parcialmente cerceada pela integração no SNS.”[36]

A caracterização do contrato como contrato de gestão de estabelecimentos públicos não será despicienda para uma tomada de posição sobre as questões que nos são colocadas.

De todo o modo, retenha-se que muito do seu regime tem similitude com o do contrato de concessão de serviços públicos.


5.


Prossigamos a nossa indagação, agora sobre os aspectos relacionados com a alteração do contrato administrativo.


5.1. Por brevidade, começaremos por destacar algumas reflexões de MARCELLO CAETANO:

“O objecto individualiza o contrato, de tal forma que a sua substituição corresponderia à extinção de uma relação contratual e à formação de outra nova.

Mas desde que se respeite o objecto do contrato é juridicamente possível modificar as prestações estipuladas, nem sempre, de resto, especificadas desde início, visto poderem ser genericamente indicadas.

Naturalmente que tal modificação pode fazer-se por acordo das partes mediante um contrato adicional, ou por apostilha ou por suplemento ao contrato.

Nos contratos administrativos prevê-se, muitas vezes, a modificação por acordo, sobretudo para regular os casos em que a iniciativa parta dos particulares; mas o problema mais interessante que se põe é o de saber se a Administração tem ou não o direito de impor unilateralmente ao outro contraente tais modificações, e se esse direito constitui uma prerrogativa característica do seu regime jurídico.” [37]

Ora, este também denominado pela doutrina “ius variandi”, "fait du Prince” ou “factum principis” [38] tem presentemente uma resposta indiscutível na lei, que não corresponde senão ao que efectivamente já era um princípio aceite na ordem jurídica.

Nos termos do corpo e alínea a) do artigo 180.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), salvo quando outra coisa resultar da lei ou da natureza do contrato, a Administração Pública pode modificar unilateralmente o conteúdo das prestações, desde que seja respeitado o objecto do contrato e o seu equilíbrio financeiro.

A questão, a verdadeira questão, reside, no fundo, em saber quando se está em sede de modificação substancial, seja unilateralmente pela Administração, seja por acordo, isto é, em qualquer caso, quando é que há ofensa do objecto do contrato.


5.2. É absolutamente imprescindível ter presente que a ofensa do objecto do contrato não é sem consequências mesmo quando realizada por acordo entre a Administração e o co-contraente. É certo que o problema tem sido estudado principalmente a propósito dos limites do poder de modificação unilateral pela Administração, mas assume cada vez maior importância aquele outro.

Como se sabe, no chamado regime jurídico exorbitante do contrato administrativo, uma das cláusulas mais significativas é a do condicionamento da Administração segundo certas regras quer na formação da vontade quer na escolha dos co-contraentes. Com efeito, no momento da formação do contrato “a Administração está sujeita a «limitações e restrições que não têm paralelo com aqueles que os particulares enfrentam no exercício da sua capacidade privada de contratar»” [39].

Esta condicionamento é bem patente em toda a pormenorizada regulamentação conducente, por exemplo, à escolha dos contraentes nos contratos de empreitadas de obras públicas [40] e nos contratos de realização de despesas públicas com locação e aquisição de bens e serviços, bem como da contratação pública relativa à locação e aquisição de bens móveis e serviços [41], entre tantos outros.

Ademais, dispõe presentemente o Código do Procedimento Administrativo, no artigo 183.º, que ressalvado o disposto nas normas


que regulam a realização de despesas públicas ou em legislação especial, os contratos administrativos devem ser precedidos de concurso público.

Este crescendo de relevo da problemática da ofensa consensual do objecto do contrato vem de par com a também crescente exigência de submissão da Administração, nos procedimentos conducentes à celebração de contratos administrativos, aos princípios da não-discriminação, da igualdade de tratamento, da transparência, do reconhecimento mútuo e da proporcionalidade. São princípios afirmados independentemente da regulação estrita de cada contrato em particular.

Uma das expressões mais evidentes da importância destes princípios pode recolher-se ao nível do direito comunitário. Num recente caso, o Tribunal de Justiça, depois de reconhecer que o contrato que analisava não estava submetido a qualquer directiva comunitária, concluiu:

“2 – (...) as entidades adjudicantes que os celebram estão, no entanto, obrigadas a respeitar as regras fundamentais do Tratado em geral e o princípio da não discriminação em razão da nacionalidade em particular; este princípio implica, nomeadamente, uma obrigação de transparência que permite à entidade adjudicante assegurar-se que o referido princípio é respeitado. 3 - Esta obrigação de transparência a cargo da entidade adjudicante consiste em garantir, a favor de todos os potenciais concorrentes, um grau de publicidade adequado para garantir a abertura à concorrência dos contratos de serviços, bem como o controlo da imparcialidade dos processos de adjudicação” [42].

Ora, não faria qualquer sentido se o condicionamento da Administração só relevasse para o primeiro contrato que celebrasse com determinado contraente, podendo a partir daí e por acordo das partes prolongar-se esse contrato para objecto(s) outro(s) que não aquele para o qual se tinham seguido os trâmites adequados.

A denominação pois que Administração e co-contraente possam dar a um certo acordo não é o decisivo na verificação sobre se se contém nos limites do objecto.

Como diz FREITAS do AMARAL: “Naturalmente, quando a modificação de um contrato administrativo tenha lugar pela via bilateral, o limite mais importante que se ergue aí à autonomia das partes é o respeito pelo objecto do contrato - presume-se que o particular será capaz de livremente ajuizar se a alteração em causa serve ou não financeiramente os seus interesses. E, por outro lado, está claro que, neste cenário, não é também a protecção do particular - que até poderia estar de acordo com uma modificação do objecto do contrato -, mas sim a salvaguarda dos princípios da publicidade e da concorrência, que justificam a existência daquele limite. É que, se tal limite não existisse, as partes, a pretexto da modificação do contrato, poderiam, no fundo, proceder ao mútuo dissenso da relação original e, seguidamente, à celebração, por ajuste directo, de um novo acordo - desrespeitando a exigência legal do concurso público (ou de qualquer outro procedimento concorrencial) para a formação de contratos desse tipo. A manutenção de uma identidade fundamental entre os objectos dos contratos inicial e alterado é, assim, crucial para assegurar o respeito das regras da concorrência, posto que, repete-se, estas de nada valeriam se fosse concedida às partes uma liberdade ilimitada para a conclusão de contratos «modificativos» do contrato inicial (...). Neste mesmo sentido, justamente a propósito do contrato de concessão de serviços públicos, diz de modo sugestivo, do Brasil, Celso Bandeira de Mello que: «mesmo que o concessionário concordasse na modificação do objecto da concessão, o concedente não poderia pretendê-la, sob pena de burlar o princípio da licitação, sem abrir a terceiros a possibilidade de concorrerem a ela e demonstrarem, eventualmente, que prestariam o serviço em condições mais favoráveis para o Poder Público» (-). Em suma, quando a vontade do particular concorre co-constitutivamente com a da Administração para a alteração de um contrato administrativo em curso tem de entender-se estar subtraída à liberdade de estipulação das partes a possibilidade de substituição do objecto do contrato original” [43].

É por isso que, para a opinião que nos incumbe formular às questões sob consulta, o que importa é determinar se as novas prestações, que aparentemente são também do interesse da contraente particular, integram o objecto do contrato em vigor. Se o integrarem deverá passar-se a uma outra fase, qual seja a do relacionamento entre essas prestações e todo o demais a clausular. Mas se o não integrarem será inútil proceder a qualquer outra indagação.

Ora, ainda para a determinação dos limites da modificação contratual, seguiremos a linha tradicional de se observarem os limites da modificação unilateral. O resultado, em todo o caso, será o mesmo que se optássemos por outra via. É que, tendo a modificação unilateral, por limite, o objecto do contrato, e não estando para já em equação outras decorrências dessa atitude unilateral da Administração, qual seja, por exemplo, a da reposição do equilíbrio financeiro, se concluirmos que determinada nova prestação estará fora do objecto, deveremos concluir que a mesma prestação, embora consensualmente aceite, o excederá igualmente.


5.3. Estudado já pela doutrina “o delicado problema de saber se é possível apurar um critério geral que permita distinguir entre as modificações que ofendem o objecto do contrato e as que o não ofendem” foram apontados casos típicos de violação do objecto, chegando-se à conceptualização de “ultrapassagem do dever natural de actualização do serviço concessionado”, à “perda da natureza da concessão”, quanto à concessão de serviços públicos, ao conceito de “obra nova”, quanto às empreitadas.

E diz AUGUSTO de ATAÍDE na obra que estamos a citar:

“A ideia pouco trabalhada de «desvirtuamento da concessão», se assim lhe podemos chamar, e essa outra um pouco mais evoluída de «obra nova» são tudo o que temos neste domínio. Há que reconhecer que é pouco e que não nos dá uma base muito grande para a tentativa de formulação do critério geral que estamos a buscar. Na verdade, mais seguro será não construir um que, embora logicamente perfeito, não conduza na prática senão a resultados pouco seguros, a um subterfúgio que apenas nos leve a abordar a dificuldade por um ângulo diferente” [44].

Conscientes da debilidade de critérios gerais não será despropositado trazer à colação, como o fazem alguns dos pareceres já mencionados, as considerações de MENEZES CORDEIRO sobre a alteração ou manutenção da identidade duma obrigação: “A manutenção da identidade duma obrigação depende, fundamentalmente, da conservação da prestação. (...) Não quer isso dizer que a própria prestação não possa sofrer alterações. Simplesmente, essas alterações não podem ser tais que conduzam a que da mesma prestação se não possa falar. O único critério possível para determinar, no caso concreto, se se está perante a mesma prestação, modificada, ou se, pelo contrário, a prestação já é outra, é extra-jurídico. O senso comum terá de indicar a solução no caso concreto. Salvo qualquer disposição normativa que comine solução diferente, o regime acomodar-se-á, depois, à solução extra-juridicamente indiciada” [45].

Prossigamos, então, se possível, com uma visão ainda mais analítica do caso. Vamos proceder a uma combinação simultânea da


verificação do objecto do contrato celebrado, de prestações modificáveis, e da admissibilidade da alteração equacionada na consulta.


5.4. Antes de mais, a necessidade de uma outra observação.

Temos dado por adquirida a noção de hospital público. A sua explicitação, no entanto, será útil para evitar dificuldades no entendimento da linha discursiva deste parecer.

Os hospitais do Serviço Nacional de Saúde são, nos termos do artigo 2.º da lei de gestão hospitalar, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 19/88, de 21 de Janeiro, pessoas colectivas de direito público, dotadas de autonomia administrativa e financeira, compreendendo a sua capacidade jurídica todos os direitos e obrigações necessários à prossecução dos seus fins definidos na lei.

São os hospitais, numa classificação comummente aceite, estabelecimentos públicos, ou seja “institutos públicos de carácter cultural ou social, organizados como serviços abertos ao público, e destinados a efectuar prestações individuais à generalidade dos cidadãos que delas careçam”. Eles são estabelecimentos públicos de carácter social: “os hospitais do Estado: têm personalidade jurídica e autonomia, são serviços abertos ao público, e efectuam prestações a quem delas careça, isto é, prestam cuidados médicos aos doentes ou acidentados" [46].
Por vezes, utilizar-se-á neste parecer a expressão estabelecimento, que não deve confundir-se com estabelecimento público. Designa-se, então, o conjunto de bens fixos de cuja existência depende o funcionamento de um serviço público, in casu, de um hospital.

“Este conjunto de bens fixos forma então o que se chama o estabelecimento do serviço, o qual, juntamente com os bens móveis acessoriamente nele empregados, constitui uma universalidade.

Em todas as classes de serviços públicos existem alguns em que o estabelecimento é essencial. Assim, (...) nos serviços assistenciais, os hospitais” [47].

Também em vários momentos do clausulado no contrato surge o termo hospital ora para designar a pessoa colectiva, ora para designar o estabelecimento, o que impõe algum cuidado na revelação do real significado em cada momento.


5.5. Recordemos a primeira questão.

“I. A concepção, planeamento, financiamento, construção e gestão de uma nova unidade hospitalar do Serviço Nacional de Saúde



em Sintra, no valor estimado de Esc.: 8.600.000.000$00, a amortizar durante vinte anos, exige o recurso a um procedimento concursal, ou pode ser levado a cabo pela Sociedade Gestora no âmbito do contrato inicial com as alterações propostas no contrato modificativo."

Retenha-se: concepção, planeamento, financiamento, construção e gestão de uma unidade hospitalar em valor a amortizar durante vinte anos.

Para MARCELLO CAETANO, na hipótese do serviço concessionado carecer de instalações que ainda não existem, recebendo o concessionário o encargo de por sua conta e risco criar essas instalações junta-se à concessão de serviço público a concessão de obras públicas [48].

Não obstante, merece toda a ponderação a linha dos que entendem que “a concessão de construção de obras e de serviços públicos será a figura que traduz com mais fidelidade a situação jurídica do concessionário de serviços públicos que assume a obrigação de instalar o estabelecimento da concessão, executando as obras necessárias para o efeito; sucede que a concessão de construção de obras públicas não é uma figura autónoma, nem no direito português nem no direito europeu (...), razão por que supomos que pode aceitar-se que a fase de construção seja concebida como uma obrigação contratual que o concessionário de serviços públicos assume, que não implica, para todos os efeitos legais, que o contrato de concessão deixe de se considerar um contrato de concessão de serviços públicos” [49]

Propendendo para a classificação autónoma do contrato de gestão, evidentemente que sérias dúvidas se colocam sobre a possibilidade de retirar do quadro dos respectivos dispositivos legais a autorização para a celebração de um contrato que envolva a própria construção do estabelecimento a gerir.

O contrato de gestão pressupõe não só uma realidade jurídica, o estabelecimento público, mas, outrossim, o substracto material dessa realidade, que nos surge, pois, como um prius. Este prius pode ser mais ou menos completo, mas não poderá ser absolutamente inexistente [50].

Por conseguinte, será necessário primeiro a edificação do hospital, a realizar através da celebração de contrato de empreitada de obras públicas e dos demais necessários à sua efectiva montagem, e, só depois, haverá a celebração de contrato de gestão, então, sim, em termos a discutir conforme a natureza que o estabelecimento venha a ter.

A hipótese que nos é dada a debate é, todavia, algo particular, visto que se pretende arrancar não de um zero edificado, mas, até, de um edificado principal para um outro menor, a construir.

Não se exige, pois, em rigor, saber se um contrato complexo [51] do tipo estudado por aqueles autores para as concessões é admissível no ambiente dos contratos de gestão em geral, mas antes se é possível a introdução de clausulado, para a realização de algo similar, é certo - mas não exactamente o mesmo -, no seio de precedente contrato de gestão, in casu, no contrato de gestão do Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca.

Na vertente que especialmente nos vai conduzir à resposta, poderemos centrar-nos nas prestações inerentes a tudo o que precede a gestão.

Desvalorizaremos, para já, pois, tudo o que acontecerá ulteriormente, isto é, após edificado o imóvel, montados os equipamentos, após se ter efectivamente o que se possa chamar uma unidade hospitalar, ainda que sem estatuto jurídico definido. Esse é um posterius, aí começa a gestão propriamente dita, mas, por ora, o mais relevante será verificar se o caminho que levará a esse ponto pode ser percorrido dentro do contrato existente.

É, portanto, decisivo verificar se, na hipótese de não acordo, a Administração poderia impor à sociedade gestora aquilo que aparentemente é para ser realizado por acordo. É que, se concluirmos que a Administração não poderia impor essa prestação, porque fora do objecto do contrato, também teremos de concluir que o nome modificativo que possa ser dado ao acordo entre a entidade gestora e a Administração para o efeito não corresponderá ao seu conteúdo, tratar-se-á, efectivamente, de um contrato novo e não de um contrato modificado.

Depois se verá se é possível esse contrato novo sem concurso.


5.6. Pergunta-se, assim, poderá a Administração impor unilateralmente à Sociedade Gestora a hipotizada prestação complexa respeitante à unidade hospitalar de Sintra, o que significa que se a Sociedade Gestora não cumprir tem a Administração Pública o direito de rescisão?

Já vincámos que o contrato celebrado é um contrato de gestão de um estabelecimento público, isto é, do Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca.

Mas a gestão implica, evidentemente, que o gestor tenha de realizar obras, de maior ou menor dimensão. E nem seria necessário que essa possibilidade estivesse prevista na lei. Em qualquer edifício, em qualquer prédio, as reparações, as pequenas obras de manutenção são essenciais à manutenção da sua funcionalidade. Sem elas a degradação ocorrerá e deixarão de servir os objectivos para que foram edificados. O mesmo acontece no ou nos imóveis que integram as partes fixas de um hospital.

A um contrato de gestão do tipo em discussão, caracterizado com autonomia, aplica-se, sem margem para dúvidas, o dever de actualização do serviço, tal como nas concessões.

E tem de haver a actualização, a renovação constante do serviço, face ao progresso tecnológico e flutuação da procura e das exigências da procura.

Aliás, um dos poderes que em geral se entende caber ao concedente é "a faculdade de assegurar a regularidade, a continuidade e a comodidade das prestações, bem como de zelar pela sua actualização nos termos geralmente exigidos para os serviços públicos.(...)”

"Está implícita na concessão (se o acto constitutivo não a clausular) a obrigação que o concessionário assume de manter o serviço actualizado" [52].

E afinal isso está clausulado.

Mas não transparece, nem da lei, nem do contrato, que esteja configurada uma actualização da pessoa colectiva gerida de modo a fazer face a mudanças, designadamente de procura, que vão para além do que a modernização dos seus equipamentos, a renovação das suas instalações permita satisfazer.

Essas mudanças terão de ser encaradas pelas entidades públicas responsáveis.

O hospital sob gestão está, nesse particular, nas mesmas condições que o hospital público em gestão directa, não passa a ser mais nem menos responsável pela prestação de cuidados de saúde do que seria se não estivesse a ser gerido dessa forma. É o que dispõe o n.º 4 do artigo 28.º do Estatuto:

“As instituições e serviços de saúde geridos nos termos dos números anteriores integram-se no SNS, estando as entidades gestoras obrigadas a assegurar o acesso às prestações de saúde nos termos dos demais estabelecimentos.”

Ora, também a um hospital em gestão directa se não pode exigir que conceba, planeie e construa um novo hospital, tudo em nome da melhor prestação de cuidados de saúde, ou da sua continuidade, em nome do melhor exercício do serviço público.

A criação de um novo hospital é poder da entidade do SNS com condições para o decretar, não é poder de cada hospital, escapa à sua capacidade.

Ademais, é aos serviços locais de saúde (SLS), no âmbito da respectiva área geográfica, que cabe assegurar a continuidade da prestação de cuidados de saúde (artigo 2.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 156/99), no que sucederam às unidades de saúde, figura da redacção original do artigo 14.º do Estatuto.


5.7. É claro que se pode pretender contornar esta dificuldade com a perspectiva de que a nova unidade hospitalar ficará funcionalmente dependente da precedente. Mas há que observar a substância das coisas. Ou bem se está perante uma nova unidade hospitalar, ou num mero complemento, da anterior. Neste último caso, será possível encaixar nos poderes de modificação, por não alteração do objecto do contrato, mas só de algumas prestações dele, no primeiro caso, não.

Estaremos, então, já fora do dever de actualização, que corresponde, aliás, a um dever de manter a qualidade, ele também aplicável indiscutivelmente a todas as entidades que prestam cuidados de saúde como revela a base XII: "O controlo de qualidade de toda a prestação de cuidados de saúde está sujeito ao mesmo nível de exigência".

Parece axiomático que o "limite natural do dever de actualização do serviço (...) está no objecto da concessão. (...)

“Portanto: a actualização só é dever do concessionário enquanto corresponder à evolução do próprio processo de exploração do serviço que haja sido especificado no objecto da concessão" [53].

Afinal, todas as vicissitudes, em sede de actualização ou outra, não podem ultrapassar a identidade da obrigação constituída, o respeito do objecto do contrato, como vem prevenido no referido artigo 180.º do CPA.

É no respeito do objecto do contrato que se configuram várias cláusulas do contrato de gestão do Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca.

Por exemplo, na cláusula 26.ª, prevê-se que a primeira contratante, isto é a ARS, pode determinar, a todo o tempo, a aquisição ou trabalhos de manutenção de equipamento que se tornem necessários ao cabal cumprimento do contrato, segundo critérios de evolução científica e tecnológica, de qualidade e segurança, sem prejuízo das correspondentes contrapartidas financeiras.

E pode igualmente a primeira contratante determinar, quando o interesse público o exija, "alterações, nomeadamente quanto ao tipo de prestações que o Hospital deva realizar no âmbito do SNS" (cláusula 38.ª), incluindo "a prestação de novas valências", o que implicará a reposição do equilíbrio financeiro global do contrato sempre que a prestação da segunda contratante se torne excessivamente onerosa por tal facto (cláusula 41.ª).

Retenhamos a hipótese de novas valências.

O Anexo V do contrato contém a estruturação da actividade por valências. São descritas as diversas valências médicas, cirúrgicas, materno/infantis, a prestar. Ora aí está um campo de poder de modificação unilateral, com respeito do objecto do contrato. Entende a Administração que deve ser prestada uma nova valência, ela deve ser prestada. A essa decisão apenas poderá contrapor a sociedade gestora a necessidade de reposição do equilíbrio financeiro global se a prestação dos cuidados se tornar excessivamente onerosa por essa imposição.

Claro que a criação de uma nova valência, a melhoria da qualidade técnica das prestações, tudo pode implicar obras, aquisição de equipamentos, formação.

As obras podem, até, exigir a actualização de um bloco operatório, alterações estruturais nesse bloco, alargamento mesmo, ou novo desenho das instalações, isto é do estabelecimento. Mas em tudo não há mudança da realidade objecto do contrato.


5.8. Hipótese diversa ocorre quando não se trata de uma nova valência, de um novo bloco, mas verdadeiramente de um novo estabelecimento, de uma nova unidade hospitalar. Nesta situação deixamos de estar em diferença de grau para nos situarmos em diferença de natureza.

É isto que se afigura estar em equação.

A unidade hospitalar que se pretende criar em Sintra obedeceria, de acordo com o ofício n.º 9124/LN da ARS, junto em anexo ao expediente inicial, às seguintes características:

“Capacidade de cerca de 170 camas.
Existência de camas de Medicina e Especialidades Médicas (+- 90 camas), Cirurgia e Especialidades Cirúrgica (+- 50 camas), ficando o internamento de todas as outras especialidades e subespecialidades concentrado no H.F.F.
Consultas externas em todas as especialidades existentes no H.F.F., bem como dos respectivos exames especiais que deverão sempre que possível ser realizados na Unidade de Sintra através da desconcentração dos meios necessários.
Existência de Cirurgia do Ambulatório.
Meios complementares de diagnóstico a definir, sendo os restantes assegurados pelos serviços do H.F.F.
Os serviços de apoio serão os mínimos necessários, sendo os restantes assegurados pelos serviços do H.F.F.”

O hospital a criar ainda é só apresentado nos seus contornos gerais, havendo muitas zonas de indefinição que só o próprio processo irá precisar. Mas estes elementos permitem-nos apesar de tudo, saber se se está perante uma mera unidade funcionalmente autónoma, ainda que separada geograficamente, ou perante um verdadeiro hospital.

Tenha-se em atenção o seguinte:

Pelo despacho n.º 10/86, do Ministro da Saúde [54], com o objectivo de caracterizar os Hospitais de nível I, noticiava-se que de entre os hospitais distritais antes designados por concelhios se verificavam muito diferentes situações: “É também sabido que estes 23 hospitais são por vezes bastante diferentes uns dos outros com dimensões que vão das 156 camas da Póvoa de Varzim, 130 de Amarante ou 147 do Montijo, às 58 de Lagos ou 70 de Vila do Conde ou Tondela”.

Quer dizer, as 170 camas previstas para a unidade hospitalar de Sintra superam as camas do hospital concelhio ali identificado como de maior dimensão.

Também o número de camas previsto para o hospital de Sintra para a medicina interna e para a cirurgia excede o número que por despacho posterior, n.º 23/86 [55], para elas se previa: para a medicina interna a “dimensão desejável para um verdadeiro serviço deverá ser de, pelo menos, 60 camas”, admitindo-se que nos hospitais “mais pequenos a dimensão mínima possa atingir cerca de 30 camas”; para a cirurgia geral a “dimensão mínima que o serviço deverá ter será próxima das 30 camas”.

Por sua vez, ainda no primeiro despacho se referia no que toca ao internamento: “O que distingue o hospital da unidade de internamento do centro de saúde é essencialmente a existência de valências cirúrgicas e a prática de cirurgia”.

E os hospitais de nível I não deixam de ser unidades autónomas pelo facto de terem de recorrer aos hospitais de nível superior. Nesse mesmo primeiro despacho se prevê imediatamente que certas consultas externas serão asseguradas por “médicos do hospital de nível superior, mediante protocolos a estabelecer caso a caso”, o mesmo acontecendo nas urgências: “As necessidades que não possam ser satisfeitas pelo SAP (Serviço de Atendimento Permanente serão canalizadas para o(s) hospital(is) de nível superior”.

Aliás, tudo num regime de complementaridade, o que, referia então o despacho, “não deve ser entendido como conduzindo à criação de centros hospitalares, de que a experiência em Portugal tem sido em regra desastrosa, mas antes a criar ligações funcionais precisas entre estabelecimentos diferentes”.

Pois bem, se esquecermos todas as referências a uma futura integração da unidade hospitalar de Sintra no Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca, não teremos dificuldade em afirmar que esta unidade hospitalar de Sintra, este Hospital de Sintra, não vem caracterizado como mera unidade funcional de um preexistente estabelecimento público, antes será um verdadeiro novo hospital, uma unidade hospitalar por si, a que só falta a criação legal.

Ora, a gestão contratada tem como objecto a unidade hospitalar Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca situado na Amadora, e não a unidade hospitalar Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca, mais uma unidade hospitalar, ainda sem nome, em Sintra.

Parece que eventual determinação unilateral para a concepção, planeamento, financiamento, construção deste novo hospital ultrapassaria o objecto do contrato, o que significaria que a ela se poderia opor a segunda contratante.

Do mesmo modo, a celebração de acordo entre a Administração e a contraente não muda a natureza estranha ao contrato que a prestação representa. Por isso, será necessário percorrer o iter adequado à celebração do negócio como negócio novo.


5.9. Tudo isto pode ser observado mais directamente sob o prisma da determinação do conteúdo da faculdade conferida à entidade gestora para realizar obra.

Não há dúvida, está expresso logo no n.º 2 do artigo 28.º do Estatuto, que a gestora terá a "faculdade de realizar obras ou adquirir equipamentos", e a alínea c) do n.º 3 do artigo 29.º impõe que o contrato deve definir obrigatoriamente as obras a realizar pela entidade gestora para a exploração da instituição ou serviço.

Nessa conformidade, a cláusula 14.ª confere à sociedade gestora a competência para: efectuar os estudos e projectos necessários à definição detalhada de todos os aspectos técnicos relativos à realização de obras e aquisição de equipamentos; contratar e gerir todas as obras de serviços e de fornecimentos necessários para o normal funcionamento do Hospital; contratar e gerir todas as obras, serviços e fornecimentos extraordinários que, solicitados por ela, hajam sido aprovados pela primeira contratante; manter actualizado o programa de manutenção e segurança das instalações e equipamentos (cfr. alíneas h) a l)).

Afigura-se que se trata de todas as obras implicadas ou na conservação do estabelecimento ou na sua actualização, mas sempre do estabelecimento entregue.

Estas obras têm, aliás, um diverso regime de responsabilidade pelas despesas.

É que se encontra previsto na alínea a) do n.º 4 do artigo 31.º do Estatuto, que o Estado ou outra pessoa colectiva pública pode subsidiar a entidade gestora para o fim de “Renovação de equipamentos e remodelação de instalações”.

E o n.º 5 do artigo 31.º, em alusão clara apenas aos equipamentos (não é contemplável qualquer hipótese de aquisição de bens imóveis), revela que os bens adquiridos pela entidade gestora nos termos da alínea a) do número anterior revertem para o Estado findo o contrato, sem prejuízo do direito a compensação relativamente à parte não subsidiada.

Depois, estes n.ºs. 4 e 5 têm de ser conjugados com o disposto no n.º 6.

Com efeito, a abertura do n.º 4, a subdiação, não se estende a todas as obras, nem todas são subsidiáveis - as despesas inerentes ao normal funcionamento e conservação do estabelecimento, e a normal conservação de um estabelecimento implica obras, de maior ou menor dimensão, são da responsabilidade da entidade gestora.

Mas sejam obras de conservação e manutenção - administração ordinária – sejam obras de remodelação – administração extraordinária - estamos em sede do objecto do contrato, a gestão do Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca.

A gestora remodela instalações, pode mesmo ampliar, demolir e construir de novo, mas estamos em sede do estabelecimento do serviço ou instituição que está a gerir.

É a esta faculdade de realizar obras ou adquirir equipamentos que se reporta, igualmente, o n.º 2 do artigo 28.º do Estatuto.

E bem se compreende, pode uma boa gestão implicar a construção de um novo bloco, de um novo serviço de urgência, tudo, no entanto, no âmbito da melhoria de um serviço existente e instalado.

Se se tratar de mera administração ordinária, normal funcionamento e conservação, não há qualquer subsídio; se se tratar de remodelação, de ampliação, “de reparações ou modificações estruturais ou reparações extraordinárias e de substituição de qualquer equipamento na instituição, serviço ou parte funcionalmente autónoma” (artigo 51.º, n.º 3, da Portaria n.º 704/94, itálico nosso), há possibilidade de subvenção e na parte não subvencionada o direito a compensação findo o contrato (correspondendo em certa medida ao regime das benfeitorias necessárias e úteis, artigo 1273.º do Código Civil, já que não existe o direito de levantamento).

Ora, parece bem patente que uma obra de raiz com a envergadura da que é trazida à consulta só com um entendimento no limite do possível poderia considerar-se estar inserida no sentido da norma legal que admite a subvenção da remodelação de instalações.

É, afinal, atentando no conteúdo da faculdade de realizar obras, prevista no Estatuto, embora sem extrair as consequências que nos parecem adequadas, que PEDRO MADEIRA de BRITO escreve [56]:

“VI - Fica ainda por tratar o segundo dos factores mencionados quanto a compreensão do tipo contratual na gestão de instituições e serviços do Serviço Nacional de Saúde, relativo à previsão legal que afirma fazer parte do objecto do contrato a faculdade de realizar obras (...). Ao contrário do que poderia resultar deste inciso legal, a faculdade de realizar obras não transforma este contrato numa concessão de obras públicas, pois a possibilidade que a lei assim confere ao concessionário é a de, no contexto da exploração do serviço publico, poder realizar obras nas estruturas físicas existentes, mesmo que seja para além delas, mas dentro e no quadro da obra já existente que serve de suporte à concessão (...). A faculdade de realizar obras não constitui o concessionário no dever de realizar a obra que servirá de suporte à exploração do serviço público, caso em que se estaria perante uma verdadeira concessão de obras públicas, mas antes na mera faculdade de, no âmbito da gestão que lhe cabe efectuar, poder realizar as obras eventualmente necessárias, por exemplo, à ampliação das estruturas físicas de suporte da concessão” (o itálico é da nossa responsabilidade).

Também MARQUES dos SANTOS, dá conta de perplexidade ao proceder à comparação da proposta de contrato modificativo com o contrato de gestão [57]:

“as cláusulas 3.ª e 4.ª - tratam das novas instalações a construir, constituem o principal aspecto da «modificação» e não têm paralelo no anterior contrato" (o itálico é da nossa responsabilidade).

Acompanham-se, pois, várias das considerações expostas ao longo da Informação do Instituto de Gestão Informática e Financeira da Saúde, anexa ao pedido, e nomeadamente o seu ponto 17, quando, a objectar à possibilidade de integrar a concepção e construção da nova unidade hospitalar na faculdade de realização de obras por parte da gestora, discorre:

“Na verdade, não se trata de uma reparação ou modificação estrutural, nem de uma reparação extraordinária ou de substituição de instalações ou equipamentos, mas sim da construção de uma Unidade nova, sita em local distinto dos meios físicos objecto do contrato de gestão”.


5.10. Tendem algumas das posições expressas a retirar da determinação de uma área de influência do Hospital algo que essa fixação parece não albergar.

Efectivamente, como que supõem essas posições que a Administração não poderia criar na área de influência traçada em determinado momento para o hospital sob gestão novos hospitais ou que, criando-os, os teria necessariamente que conceder à mesma gestora. Mas essa é a técnica da concessão de serviços públicos de natureza meramente económica, em que a exclusividade do concessionário é a regra [58].

Ora, a prestação de cuidados de saúde é, em termos constitucionais, uma actividade aberta (artigo 64.º, n.º 3, alínea d)), sendo que as entidades privadas e os profissionais em regime liberal podem mesmo integrar o sistema de saúde e a rede nacional de prestação de cuidados de saúde (base XII, n.º 3 e base XLI).

Na perspectiva da lei não poderia, pois, a prestação de cuidados de saúde ser erigida em exclusivo de um hospital, mesmo na sua área de influência, já que ele, como se repetiu, interage com as demais instituições que os prestam nessa mesma área.

Toda esta interacção está patente, por exemplo, na cláusula 5.ª, nomeadamente no seu ponto 3: “A actividade do Hospital será desenvolvida tendo em vista a prestação de cuidados de saúde globais na óptica da integração deste na Unidade de Saúde da sua área de influência, nomeadamente através do relacionamento funcional com os centros de saúde e outras instituições de saúde, da mesma ou de outras áreas, assegurando prioritariamente os actos médicos referenciados pelos médicos de família da unidade de saúde que o Hospital integra".

Repare-se, relacionamento funcional com os centros de saúde e outras instituições de saúde, o que quer dizer, desde logo, que não tem exclusividade na prestação de cuidados e, depois, que não há uma estaticidade das instituições, o relacionamento deverá fazer-se com as que existem no momento da celebração do contrato, como com as que vierem a existir no decurso da vigência do mesmo.

Não existe qualquer exclusivo da prestação de cuidados na área de influência de qualquer hospital, nem, no caso, é concedida a exclusividade do hospital para a sua área de influência [59].

Conforme o Anexo X do contrato, área de influência é um “Termo comum no vocabulário do sector da saúde que advém de moldes de funcionamento que as instituições tiveram no passado, na sequência do planeamento centralizado nos órgãos de tutela. Corresponde a uma área geográfica definida como a que alberga os cidadãos residentes que têm, naturalmente, acesso aos cuidados prestados em determinado estabelecimento de saúde.

"Nesta perspectiva a área de influência do Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca, corresponde à área geográfica das freguesias referidas no quadro que se apresenta a seguir, cujos residentes são utentes naturais do estabelecimento, sem prejuízo do princípio da liberdade de acesso aos cuidados de saúde.”

Ou seja, a área de influência serve para marcar os limites geográficos do dever especial de prestação de cuidados de saúde aos utentes do SNS residentes nessa área, o que se encontra estipulado na cláusula 6.ª, não serve para instituir qualquer direito.

Dir-se-á que a exclusividade, que é, não se deverá esquecer, uma noção que encaixa na perfeição para a concessão de serviço público económico, nem poderia existir, pois era como se um hospital sob gestão directa também pudesse reivindicar a exclusividade numa certa área de influência, de sorte que, sempre que o Governo decidisse criar e criasse uma nova unidade hospitalar tinha que dar contas à administração do hospital que até aí tinha servido a área que o novo instituto ia passar a assumir.

Retenha-se que o hospital sob gestão privada não perde nenhuma característica de hospital oficial, de hospital público, mais exactamente de pessoa colectiva de direito público, de maneira que no momento em que se decida pôr termo à gestão privada não é necessário qualquer novo acto legislativo a recriar o hospital público.

Esta não exclusividade é tanto mais patente quanto os centros de saúde da área de Amadora/Sintra não foram objecto do contrato e agora se pergunta se podem ser. A Administração tem que ser, evidentemente, livre de criar todas as unidades de saúde que entenda virem a permitir a melhor satisfação dessa necessidade colectiva. A Administração Pública deve criar, afectar e desafectar zonas sempre que entenda conveniente, e cada hospital criado poderá ser ele objecto de contrato.

É certo que a Administração antecipa que a nova unidade de saúde será afecta ao existente hospital. Seja como for, trata-se de uma nova unidade, não perspectivável nas obrigações de manutenção, melhoria, actualização, optimização, do estabelecimento, ou mesmo melhor da instituição entregue para gestão.

Inequivocamente nos parece que o hospital criado pelo Decreto-Lei n.º 382/91, de 9 de Outubro, situado na Amadora, como nele se diz, é uma única unidade hospitalar. É uma única unidade hospital, na Amadora, e não duas, uma na Amadora e outra em Sintra. Nem sequer é já relevante a noção de pequena ou grande unidade hospitalar. A concepção, planeamento, financiamento e construção de uma nova unidade hospitalar em Sintra, com as características assinaladas não está, claramente, no âmbito das prestações passíveis de ser exigidas à entidade gestora do Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca visto que não se enquadra nos deveres de actualização desse estabelecimento público, nem cabe na faculdade de concepção e realização de obras previstas na lei e no contrato; do mesmo modo, a definição de tal prestação não é susceptível de ser operada por modificação consensual do contrato celebrado, pois que fora do seu objecto.



6.


Por questão de encadeamento temático, abordaremos as demais questões pela ordem inversa da sua formulação. Passemos assim, à última questão.

Recordemo-la:

“IV . A atribuição a outra entidade, pública ou privada, diferente da Sociedade Gestora, da responsabilidade de conceber, planear, financiar, construir e gerir, ou somente gerir, da futura unidade hospitalar de Sintra, determina uma alteração de circunstâncias do actual contrato de gestão, com consequências indemnizatórias para o Estado.”

A resposta dada à primeira pergunta antecipou a resposta a estoutra.

Com efeito, tendo concluído que a atribuição da responsabilidade de conceber, planear, financiar e construir não se subsume a uma modificação do contrato vigente, porque fora do seu objecto, não poderemos reconhecer em abstracto qualquer direito indemnizatório que possa advir do acto de atribuição dessa mesma responsabilidade a uma terceira entidade.

Situação que não poderá obter uma imediata resposta é da entrega para gestão dessa futura unidade hospitalar. Essa resposta dependerá do estatuto jurídico que venha a obter.

Em plano diferente se situarão os reflexos da criação de uma nova unidade hospitalar cobrindo parcialmente uma área de influência inicialmente cometida na globalidade ao existente hospital, nomeadamente no que toca a eventual alteração na actividade esperada e contratualizada.

A criação de um novo hospital poderia integrar-se nos factos não imputáveis à Sociedade Gestora que tornando excessivamente onerosa a sua prestação daria lugar à reposição do equilíbrio financeiro do contrato, conforme a cláusula 41.ª.

Não se descortina que no presente caso tal venha a suceder.

Na verdade, o único efeito que poderá resultar do novo estabelecimento é uma diminuição da actividade esperada. Ora, nos termos do clausulado, a sociedade gestora está protegida contra os riscos de alteração da actividade esperada. Na cláusula 39.ª prevê-se o regime a aplicar nas alterações para mais e para menos da actividade esperada:

- As alterações à actividade esperada na urgência em mais de 10% são pagas unitariamente pela Administração de acordo com cálculos predefinidos; no fim de cada anuidade serão revistos e fixados para cada valência os valores da actividade esperada na urgência, na consulta externa e no internamento, e ao mesmo tempo são fixados os valores das anuidades subsequentes que passam a integrar um valor correspondente ao acréscimo da actividade esperada [60];

- Se houver diminuição da actividade esperada e contratualizada não há qualquer diminuição da remuneração convencionada a pagar pela Administração.

Além disto, na presente situação do contrato, nem sequer verdadeiramente o problema se coloca, pois está ultrapassado o período de vigência não denunciável; ora, o contrato extingue-se pela chegada do termo do prazo convencionado, sendo apenas de respeitar o prazo para manifestação da vontade dessa extinção, nos termos do ponto 3 da cláusula 13.ª.



7.


É a vez de nos debruçarmos sobre a terceira questão:

“III. Podem ser concedidos à Sociedade Gestora, no âmbito de um contrato modificativo do acordo inicial, celebrado em 1995, a responsabilidade pela gestão de Centros de Saúde na área da Amadora e Sintra, independentemente de Ihe ser confiada a construção da referida unidade hospitalar de Sintra”.

Cremos ter ficado patente o sentido da inseparabilidade do objecto do contrato de gestão do estabelecimento a que se reporta.

Conforme o Estatuto várias vezes observado, o contrato de gestão deve definir obrigatoriamente a instituição ou serviço de saúde objecto do contrato – artigo 29.º, 3, a).

Na área de Amadora/Sintra existiam, segundo o anexo X do contrato de gestão, nove centros de saúde: Amadora, Algueirão, Cacém, Perro Pinheiro, Queluz, Reboleira, Rio de Mouro, Sintra, Venda Nova.

O regime de criação, organização e funcionamento dos centros de saúde é presentemente o estipulado no Decreto-Lei n.º 157/99, de 10 de Maio.

Os centros de saúde e as associações de centros de saúde são, nos termos do artigo 3.º, “pessoas colectivas de direito público, integradas no Serviço Nacional de Saúde e dotadas de autonomia técnica, administrativa e financeira e património próprio, sob superintendência e tutela do Ministro da Saúde” (n.º 1); a “criação de centros de saúde e de associações de centros de saúde, bem como a definição da respectiva área geográfica, fazem-se por portaria do Ministro da Saúde, sob proposta dos conselhos de administração das ARS, de acordo com os critérios definidos no presente diploma” (n.º 3).

Os centros de saúde “têm como atribuições, em geral, a promoção da saúde, designadamente através de acções de educação para a saúde e a prestação de cuidados na doença, quer na primeira linha de actuação do Serviço Nacional de Saúde, quer garantindo a continuidade dos cuidados sempre que houver necessidade de recurso a outros serviços e cuidados especializados (n.º 1 do artigo 4.º).

Tal, pois, como os hospitais públicos, os centros de saúde são institutos públicos, na espécie estabelecimentos públicos.

O Estatuto, ao desenvolver a Lei de Bases, não apresenta uma previsão sobre os contratos de gestão a celebrar que imponha que cada contrato de gestão só possa ter por objecto um estabelecimento público.

É perfeitamente configurável um contrato de gestão envolvendo a entrega para gestão de vários estabelecimentos. Pode, portanto, ser celebrado um contrato de gestão de vários centros de saúde. E poderá também, parece, ser celebrado um contrato de gestão tendo por objecto um hospital e um ou mais centros de saúde”. Afigura-se que a lei contém normação suficientemente flexível de modo a admitir a junção num mesmo contrato de estabelecimentos diferentes.

Mas, evidentemente, determinados quais os estabelecimentos entregues para gestão a extensão do contrato a outros representará uma alteração substancial do mesmo.

Nem se vê que se possa considerar estar-se em sede do mesmo objecto.

Suponha-se que em áreas confinantes está entregue a gestão de X centros de saúde a uma entidade gestora e de X outros a outra. Como se poderá afirmar que a extensão a uma delas de outro estabelecimento é ainda objecto do contrato e não é objecto do contrato da outra gestora. E se é objecto de uma poderá ser objecto das duas ou mais entidades gestoras?

A fixação do objecto pelo estabelecimento entregue parece-
-nos, assim, essencial, pelo que não será possível considerar que em contrato modificativo se estenda a centros de saúde o objecto do contrato celebrado para a gestão do Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca.



8.


Atentemos, agora, no último problema que nos falta encarar.

“II. A eventual outorga do contrato modificativo, ao contrário do contrato inicial, precedido de concurso público, determina a prévia intervenção do Conselho de Ministros ao abrigo do artigo 29.º do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde para autorizar o ajuste directo”.

A modificação ocorre sempre que a obrigação “sofra qualquer alteração que não acarrete quebra de identidade” [61]; está-se, então, no campo da mesma obrigação e não da extinção da primitiva.

Desde que nos situemos perante mero contrato modificativo não se suscita o problema da modalidade tendente a escolher as partes do negócio – concurso público, negociação particular, ajuste directo, qualquer outra – as partes já estão determinadas, pelo que só se se pretendesse a alteração dos sujeitos, o que não é a circunstância, é que o problema se poderia colocar.

Todos os obstáculos que se têm apresentado para as várias modificações sugeridas na consulta só têm razão de ser na medida em que não estamos em sede de liberdade procedimental para a celebração dos negócios respectivos, em especial para a escolha do contraente com quem a Administração Pública os celebrará.

Dito de outro modo, se vigorasse a liberdade procedimental, seria relativamente indiferente saber-se se as alterações propostas se integravam em mera modificação, se em novação contratual, ou em contrato completamente novo. Essa seria matéria para apreciação em sede da discussão sobre o estipulado, direitos e deveres resultantes para as partes do estipulado.

Mas não é isso o que se passa. A entidade pública está sujeita, como sublinhámos, a uma das "cláusulas exorbitantes" mais significativa dos contratos administrativos, que é o seu condicionamento pela lei na escolha dos contraentes.

Exactamente, nos termos dos n.º 1 do artigo 29.º do Estatuto a celebração de contrato de gestão é precedida de concurso público. Apenas a título excepcional, e no preenchimento dos requisitos enunciados no n.º 2, pode a entrega ser feita por ajuste directo, mediante resolução do Conselho de Ministros.

E, claro, a verificação do preenchimento desses requisitos compete ao Conselho de Ministros.




9.

1.ª - No desenvolvimento de autorização conferida pela Lei de Bases da Saúde, Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto, o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde (SNS), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro, veio prever, no seu artigo 28.º, n.º 2, que o Ministro da Saúde pode autorizar a entrega da gestão de instituições e serviços de saúde integrados no SNS, ou parte funcionalmente autónoma, a entidades públicas ou privadas, com a faculdade de realizar obras ou adquirir equipamentos, mediante a retribuição das prestações de saúde;

2.ª - O contrato de gestão celebrado ao abrigo de tais dispositivos tem por objecto a gestão de um concreto estabelecimento público ou serviço, ou parte funcionalmente autónoma deles, e tem a natureza de contrato administrativo;

3.ª - Segundo o disposto no artigo 28.º, n.º 2, do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, o co-contratante tem a faculdade de realizar obras ou adquirir equipamentos, o que se deve entender como compreendendo o necessário para prover à administração ordinária e extraordinária do estabelecimento público ou serviço que constitui o objecto do contrato;

4.ª - Ainda nos termos da alínea c) do n.º 3 do artigo 29.º do mesmo Estatuto, o contrato deve definir obrigatoriamente as obras a realizar pela entidade gestora para a exploração da instituição ou serviço;

5.ª - O Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca, criado pelo Decreto-Lei n.º 382/91, de 9 de Outubro, dotado de personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira, a funcionar na Amadora, é um instituto público, na espécie estabelecimento público;

6.ª - O contrato celebrado em 10 de Outubro de 1995 entre a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo e a Sociedade Amadora/Sintra – Sociedade Gestora, S.A. “tem por objecto a gestão integral do Hospital do Professor Doutor Fernando Fonseca” (cláusula 5.ª);

7.ª - O contrato referido na precedente conclusão prevê, nomeadamente nas alíneas h), i), e j) do n.º 2 da cláusula 14.ª, a competência da Sociedade Gestora em matéria de obras;

8.ª - A concepção, planeamento, financiamento e construção pela Sociedade Gestora de uma nova unidade hospital em Sintra, com as características assinaladas em 5.8. deste parecer, não se enquadra nos poderes de modificação unilateral do conteúdo das prestações, por parte da Administração;

9.ª - Configurará uma nova relação contratual aquela em que a Administração e a Sociedade Gestora acordem na prestação enunciada na conclusão anterior;

10.ª - O juízo formulado nas duas precedentes conclusões aplica-se à extensão da gestão a outros estabelecimentos públicos, designadamente a centros de saúde de Amadora e Sintra;

11.ª - A atribuição a outra entidade, pública ou privada, diferente da Sociedade Gestora, da responsabilidade de conceber, planear, financiar e construir a futura unidade hospitalar de Sintra não determina, por si, uma alteração de circunstâncias do actual contrato de gestão, com consequências indemnizatórias para o Estado;

12.ª - Nos termos dos nºs 1 e 2 do artigo 29.º do Estatuto, a celebração de contrato de gestão é precedida de concurso público, ainda que, a título excepcional e observados os requisitos enunciados no n.º 2, possa a entrega ser feita por ajuste directo, mediante prévia resolução do Conselho de Ministros.


VOTO

(António Silva Henriques Gaspar) Reconhecendo o esforço de abordagem das questões suscitadas revelado pela construção do Parecer, não acompanho, no entanto, o resultado alcançado quanto à primeira das questões suscitadas.
Voto, pois, vencido nessa parte (conclusões 8ª e 9ª), com os fundamentos que, de modo sucinto, passo a expor.

1. Não atribuo especial relevância metodológica à tentativa de qualificação contratual da espécie a que se refere a consulta. Não configurando a lei uma qualquer tipicidade própria dos contratos administrativos, não releva o nomen do contrato, mas os efeitos que determinado contrato produza e a construção dos termos contratuais definidos pelo objecto. E, de todo o modo, no caso concreto, existe um nome, uma espécie definida na lei (contrato de gestão) e com objecto delimitado, quer pelos termos contratuais específicos, quer por Regulamento que define, em geral, o Programa do concurso e o caderno de encargos tipo para os contratos de gestão, aprovado pela Portaria nº 704/94, de 29 de Julho, que, nesta dimensão do problema, constitui um elemento fundamental de interpretação a ter em conta.

2. E por aqui - no que condiz com as cláusulas do contrato de gestão a que a consulta se refere - se pode aferir qual o objecto: o núcleo esssencial do contrato (cuja modificação, se ocorrer, lhe alterará a substância ou a natureza) e as prestações instrumentais, necessárias, possíveis ou acessórias que, integrando o objecto, não lhe definem, contudo, a natureza ou a substância.
Para determinar o objecto há que interpretar o contrato - os termos contratuais - de acordo com as regras e os princípios de interpretação do negócio jurídico. Tarefa aqui porventura facilitada pela estrutura objectiva resultante da fixação regulamentar do tipo das prestações contratuais e das obrigações mutuamente assumidas pelos contraentes, com tradução necessária na espécie contratual em concreto.
O objecto do contrato (tanto os efeitos jurídicos do contrato como o "quid" sobre que incidem tais efeitos), que verdadeiramente caracteriza o contrato no seu núcleo essencial e sem o qual não se poderia conceber tal tipo contratual, considerada a finalidade prosseguida por este meio pela Administração, é a "prestação de cuidados de saúde" que o adjudicatário tem de assegurar através da entrega da gestão. Esta prestação, objecto imediato e conteúdo essencial do contrato, está delimitada e definida pelo caderno de encargos, com a indicação da actividade esperada, incluindo valências e actos médicos, directamente ou por protocolo com outras instituições, e atendimento para prestação de cuidados de saúde imediatos.
Para desenvolvimento e execução deste objecto essencial, o tipo contratual contém uma série de deveres e prestações, nomeadamente da entidade gestora (o co-contraente da Administração), que são instrumentais e que, conforme as circunstâncias ou precisas exigências, podem ou não ser necessárias ou executadas.
Do lado da Administração, a cedência da "instituição", no sentido de cedência da infraestrutura material e organizacional de determinada instituição de saúde, compreendendo a utilização de terrenos, edifícios e outros bens - artigo 42º do contrato-tipo.
Por seu lado, a entidade gestora deve contratar e gerir todas os obras, serviços e fornecimentos extraordinários para o normal funcionamento da instituição e efectuar os estudos e projectos necessários à realização das sobras e aquisição de equipamentos.
Este objecto-tipo tem completa tradução, entre outras, nas cláusulas 25, 26 e 38 e do contrato de gestão em causa.
O contrato estabelece, também, as prestações de natureza financeira (a retribuição), e contém regras sobre o prazo de duração. No caso concreto, estabeleceram-se as formas e os níveis de contrapartidas financeiras a satisfazer à entidade gestora; a duração não está prédefinida em termos determinantes com a fixação de uma duração máxima, prevendo-se que o contrato é anual e renovável, sem limite, mas podendo igualmente, salvo nos primeiros cinco anos, ser denunciado por qualquer das partes.

3. Pressuposto, pois, do contrato de gestão é a existência de uma unidade de saúde, designadamente hospitalar, com todos os seus elementos físicos e organizacionais (edifícios, infraestruturas, equipamentos fixos) através dos quais a entidade gestora exercerá a actividade (prestação de cuidados de saúde numa determinada área territorial definida) que constitui o objecto contratual.
Mas, como é da natureza das coisas e os termos contratuais indiciam (interpretação), rectius, expressamente prevêm, a gestão como objecto e as prestações em que se concretiza, não podem ser física ou quantivamente estáticas, mas devem adaptar-se, necessariamente, à evolução da procura dos cuidados que a gestora se comprometeu a prestar. A evolução demográfica, por exemplo, pode exigir que o nível das prestações (urgências; valências médicas ou cirúrgicas) aumente correspondentemente à procura dos cuidados de saúde, com a consequente afectação de meios, quer físicos (instalações), quer técnicos (equipamentos) ou de pessoal. A dinâmica própria do objecto do contrato prevê tais modificações no que respeita a pessoal e equipamentos; mesmo no que respeita a obras, prevê-se a realização pela gestora de obras não apenas de reparação mas também de beneficiação. Não está, pois, fora do objecto do contrato ou, dito de outro modo, o objecto do contrato não exclui nem fica descaracterizado com a realização, pela entidade gestora, de obras que se revelem necessárias ou convenientes à criação das condições adequadas ou exigidas para a eficaz e esperada realização da prestação essencial e nuclear do contrato de gestão. Desde que, como é próprio do contrato administrativo, seja mantido o equilíbrio financeiro do contrato.

4. Definido e assim interpretado o objecto contratual, a metodologia que se me afiguraria mais adequada para uma aproximação, redutora da complexidade, à primeira questão suscitada, passa pela interpretação da pretendida modificação contratual, para determinar, ainda no domínio da interpretação do objecto do contrato, se esta modificação constitui ou não alteração essencial ou substancial do objecto.
Na interpretação que faço dos termos da modificação pretendida, o que se tem em vista não é a criação (total) de uma "instituição" nova, de uma nova pessoa colectiva pública, de um novo hospital (hoc sensu), mas apenas a construção física de uma outra infraestrutura; neste sentido, a construção de um "novo" hospital não será mais do que a construção de edifícios e a instalação do respectivo equipamento, sem alteração do status quo jurídico, e com integração jurídica e funcional na instituição já existente, objecto do contrato e gestão.
Com este sentido, o que verdadeiramente se propõe não é a criação de um novo hospital, mas uma espécie de extensão física do actual hospital (na concepção institucional), segundo as conveniências e a adequação aconselhadas pelas necessidades de gestão - desconcentração física, melhor proximidade, maior comodidade para os utentes, melhor capacidade de resposta, mas, como é essencial, dentro da mesma área geográfica (e jurídica) de intervenção, que no domínio do objecto do contrato constitui um elemento fundamental de referência.
Como se referiu, a realização de obras de beneficiação, ainda compatíveis com esta interpretação, integra ou pode integrar prestações da entidade gestora e sem desconsideração essencial do objecto e da natureza do contrato.
Mas, sendo assim, a nova realidade a construir pode incluir-se ainda no objecto do contrato de gestão; não parece haver diferença jurídicamente essencial, que produza resultados diversos, entre a construção de uma infraestrutura fisicamente separada das actuais instalações e um eventual aumento, em continuidade ou contiguidade física, da actual infraestrutura. E neste caso certamente se não questionaria que a realização das obras se poderia integrar no objecto do contrato.

5. O elemento que muito poderá ter impressionado a tese que fez vencimento tem a ver com a modificação (mais aparente que real, poder-se--á dizer) do prazo contratual, que na modificação pretendida seria de 20 anos, em lugar do regime actual do contrato que permite a denúncia após os cinco primeiros anos.
Todavia, este elemento, só por si, está à margem do essencial do objecto do contrato (a prestação de cuidados de saúde), e, nas circunstâncias do caso, reflecte apenas o modo de repôr ou realizar o equilíbrio financeiro do contrato.
Por um lado, no actual contrato de gestão não se estabelece qualquer prazo máximo de duração que, uma vez decorrido, impusesse a cessação da vigência e a abertura de um novo procedimento concursal para a celebração de novo contrato. Por isso, nestas circunstâncias, a duração não é elemento essencial, nem releva determinantemente no ponto em que a modificação do contrato administrativo está subtraída ao consenso dos contraentes: garantia da transparência e da concorrência.
Por outro, no que estes princípios importam no caso - a construção de uma obra - , estão garantidos através da submissão da obra a executar ao regime das empreitadas de obras públicas, como resulta da sua natureza e as partes expressamente acordam.
Mas este é um problema colateral ao contrato de gestão e ao seu objecto, que, na interpretação que faço, parece poder comportar a pretendida modificação.


NOTAS



[1] Ofício n.º 7710, de 25 de Setembro de 2001, com anexo composto por: “1 - Aviso do Concurso; 2 - Programa do Concurso e Caderno de Encargos; 3 - Relatório de apreciação do júri de concurso; 4- Contrato de Gestão e respectivas alterações; 5 - Ofício n° 9124/LN da ARSL VT; 6 - Despacho do Secretário de Estado da Saúde de 7 de Outubro de 1999; 7 - Ofício n° 9945/LN da ARSL VT; 8 - Proposta de Contrato Modificativo; 9 - Informação sobre a revisão do contrato, de 22 de Janeiro de 2001, do Instituto de Gestão Informática e Financeira da Saúde; 10 - Informação jurídica, de 25 de Janeiro de 200I, do Instituto de Gestão Informática e Financeira da Saúde; 11 - Despacho, de 21 de Fevereiro de 2001, da Ministra da Saúde; 12 - Parecer do Prof. Doutor Marcelo Rebelo de Sousa; 13 - Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia e do Dr. Bernardo Ayala; 14 - Parecer do Mestre Madeira de Brito; 15 - Parecer do Dr. Vasco Vieira de Almeida; 16 - Nota informativa do Dr. A. Marques dos Santos”.
[2] Dispõem sobre estas convenções o artigo 37.º do Estatuto e o Decreto-Lei n.º 97/98, de 18 de Abril.
[3] SÉRVULO CORREIA dá conta da imprecisão terminológica da Lei de Bases no ponto 6. de As Relações Jurídicas de Prestação de Cuidados pelas Unidades de Saúde do Serviço Nacional de Saúde, em "Direito da Saúde e Bioética", Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1996.
[4] Rectificado pela Declaração n.º 235/91, de 31 de Outubro.
[5] O regime de instalação foi pela última vez prorrogado até 31 de Dezembro de 1995, já na vigência do contrato de gestão – cfr. Decreto-Lei n.º 10/96, de 17 de Fevereiro.
[6] "Manual de Direito Administrativo", 10ª edição, 5.ª reimpressão, Vol. I, pág. 588.
[7] "Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos", Almedina, 1987, pág. 396.
[8] "Direito Administrativo", vol. III, Lisboa 1989, pág. 429.
[9] Ibidem, págs. 439,440.
[10] As Relações Jurídicas de Prestação de Cuidados de pelas Unidades de Saúde do Serviço Nacional de Saúde, em "Direito da Saúde e Bioética", Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1996, pág. 18.
[11] MARCELO REBELO DE SOUSA, no Ponto 3 do parecer junto, e socorrendo-se da noção que defende nas suas "Lições de Direito Administrativo", I, Lisboa, 1999, págs. 55 e 77.
[12] PEDRO MADEIRA de BRITO, no parecer anexo, Ponto 1.2.IV, com referências ao artigo 29.º, n.º 3, alínea i) do Estatuto, artigo 53.º da Portaria n.º 704/94, de 29 de Julho e cláusula 16.º, n.º 4, do contrato vigente.
[13] Ob. cit., págs. 420/8.
[14] "Direito Administrativo", vol. III, pág. 443. E é partindo desta definição que MARCELO REBELO de SOUSA, SÉRVULO CORREIA e MADEIRA de BRITO se pronunciam, nos pareceres anexos ao pedido, no sentido de estarmos perante um contrato de concessão de serviços públicos. Posteriormente, em oficio entrado a 8 de Outubro 2001, foram juntos dois pareceres de DIOGO FREITAS do AMARAL, emitidos a pedido de José de Melo-Saúde, SGPS,S.A, no mesmo sentido.
[15] Cfr. Parecer anexo, nota 15.
[16] Cfr. Parecer anexo, págs. 6 e 7.
[17] Sobre a evolução do conceito no que toca ao aspecto da retribuição veja-se, por ex., o parecer deste Conselho n.º 1/94, de 24 de Março, ponto 5.6.5.
[18] "A Concessão de Serviços Públicos", Almedina, 1999, págs. 141,2. Também FREITAS do AMARAL, no acabado de editar “Curso de Direito Administrativo”, Vol. II, Almedina, Outubro, 2001, indica que na definição que vinha defendendo há que actualizar pelo menos o modo de remuneração do concessionário: “a cobrança de taxas não pode mais ser apresentada como o modo exclusivo de remuneração (...). Será porventura o principal modo de remuneração do concessionário, mas já não é, de todo, o único” – págs. 539,40.
[19] Comunicação interpretativa da Comissão sobre as concessões em Direito Comunitário n.º 2000/C 121/02”, em Jornal Oficial das Comunidades Europeias, de 29 de Abril de 2000, págs. 121/2 e segts., ponto 2.2.
[20] MARCELLO CAETANO, “Manual de Direito Administrativo”, tomo II, 10.ª edição, 4.ª reimpressão, 1991, pág. 1072.
[21] Ob. cit., pág. 38.
[22] Ibidem, pág. 1096.
[23] Há já estabelecimentos hospitalares que se regem subsidiariamente pelas “normas aplicáveis às entidades que revistam natureza, forma e designação de empresa pública” – cfr. o artigo 1.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 151/98, de 5 de Junho, que determina o regime jurídico do Hospital de S. Sebastião, e o artigo 1.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 76/2001, de 27 de Fevereiro, que cria o Hospital do Barlavento Algarvio.
[24] Assim, J.J. NOGUEIRA da ROCHA, Natureza Jurídica das Instituições e Serviços de Saúde que Integram o Sistema de Saúde Português, em "Direito da Saúde e Bioética", LEX, 1991, pág. 57.
[25] O que se entende, na medida em que ao mesmo nível que aqueles há outras instituições ou serviços que não tendo a designação de hospital ou centro de saúde prestam igualmente cuidados de saúde.
[26] MARCELLO CAETANO, “Manual de Direito Administrativo”, tomo II, 10.ª edição, 4.ª reimpressão, 1991, pág. 1067.
[27] PEDRO GONÇALVES, ob. cit., págs. 36/7.
[28] Sobre a utilização da designação contrato de gestão para abranger diferentes técnicas e modalidade de gestão, noutros ordenamentos jurídicos, cfr. NOGUEIRA da ROCHA e PEDRO MADEIRA de BRITO, Cessão de Exploração de Instituições Públicas de Saúde na Lei de Bases da Saúde, em "Direito da Saúde e Bioética", Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1996, pág. 269, nota 5.
[29] Divergindo-se, pois, directamente, do ponto 10 do parecer de MARCELO REBELO de SOUSA.
[30] Sobre a distinção entre as relações obrigacionais simples e complexas, cfr., v.g., JOÃO de MATOS ANTUNES VARELA, “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, 9.ª edição, Almedina, págs. 65/9.
[31] Nem na Proposta de Lei, nem em nenhum dos projectos de Lei de Bases era contemplada a concessão – cfr. Proposta de Lei n.º127/V, em Diário da Assembleia da República, II, Série –A, de 24 de Janeiro de 1990, e Projectos n.º 481/V (PS), n.º 484/V, (PRD), n.º 485/V (PCP) e 486/V (CDS), em Diário da Assembleia da República, II Série –A, de 17 de Fevereiro de 1990.
[32] Ob. cit., em especial págs. 143/6.
[33] Ob. cit., pág. 161/2. No já referido “Curso de Direito Administrativo”, Vol. II, Almedina, FREITAS do AMARAL não se pronuncia directamente sobre este contrato mas, na nota 1009, pág. 540, menciona: “Existem outras modalidades de gestão privada de um serviço público para além da concessão. Sobre o tema, cfr. LAURENT RICHER, Droit des contrats Administatifs, pp. 356 e segs. e, entre nós, PEDRO GONÇALVES, [ob. cit.], pp. 143 e segs.”
[34] Cfr. Parecer anexo, pág. 5.
[35] Embora este último expressamente reveja a sua posição no parecer junto.
[36] Cessão de Exploração de Instituições Públicas de Saúde na Lei de Bases da Saúde, em "Direito da Saúde e Bioética", Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1996, págs. 278/9
[37] "Manual de Direito Administrativo", 10ª edição, 5.ª reimpressão, Vol. I, pág. 588, pág. 618.
[38] Cfr. MARIA JOÃO ESTORNINHO, "Requiem pelo Contrato Administrativo", Almedina, 1990, pág. 130.
[39] MARIA JOÃO ESTORNINHO, ob. cit., pág. 121, e com referência a FREITAS do AMARAL; cfr. a mesma autora em "Princípio da Legalidade e Contratos da Administração", Separata do Boletim do Ministério da Justiça, n.º 368, pág. 26, remetendo para ANDRÉ de LAUBADÈRE.
[40] Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março.
[41] Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho.
[42] Acórdão do Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia, de 7 de Dezembro de 2000, P. C-324/98. Ver a anotação a este Acórdão por BERNARDO DINIZ DE AYALA em O método de escolha do co-contratante da Administração nas concessões de serviços públicos, “Cadernos de Justiça Administrativa”, n.º 26, pág.15; O Acórdão pode ser lido, também, em www.curia.int.; procedendo igualmente a uma análise histórica e dando já relevo a este Acórdão, veja-se BARBARA MAMELI, Concessioni e publici servizi, em “Rivista Italiana di Diritto Pubblico Comunitario”, n.º 1/2001, págs. 63/94.
[43] Em ponto 11. do parecer anexo.
[44] Para a Teoria do Contrato Administrativo: Limites e Efeitos do Exercício do Poder de Modificação Unilateral pela Administração, em "Estudos de Direito Público em Honra do Professor Marcello Caetano", Separata, Ática 1973, pág. 14.
[45] "Direito das Obrigações", 2 Volume, AAFDL, 1986, Reimpressão, pág. 136.
[46] DIOGO FREITAS do AMARAL, "Curso de Direito Administrativo", 2.ª edição, Vol. I, Almedina, 1998, pág. 352.
[47] MARCELLO CAETANO, “Manual de Direito Administrativo”, tomo II, 10.ª edição, 4.ª reimpressão, 1991, pág. 1078.
[48] Ob. cit., pág. 1117, e, depois, a discussão de todas as consequências, nomeadamente quanto ao prazo da concessão, e a propriedade dos bens.
[49] PEDRO GONÇALVES, ob. cit., pág.155.
[50] Um outro tipo de contrato “vizinho” da concessão, em que também se supõe a prévia existência do estabelecimento, é, para FREITAS do AMARAL, a arrematação (affermage), em França: “distingue-se da tradicional concessão de serviços públicos pelo facto de o particular não ter de construir nem de financiar o estabelecimento da concessão – que já existe” - “Curso de Direito Administrativo”, Vol. II, Almedina, pág. 542. L’affermage é “nomeadamente praticada no sector da distribuição de água sempre que a rede já está criada”, LAURENT RICHER, “Droit des Contrats Administratifs”, L.G.D.J., 1995, pág. 362. Sobre este tipo de contrato, categorizando-o diversamente, no entanto, PEDRO GONÇALVES, ob. cit., pág. 145, nota 133. Note-se um aspecto, o da remuneração, que, em nossa opinião, contribuirá para distingui-lo de qualquer das modalidades que temos analisado. É que, “dans le cadre de l’affermage, le fermier verse une redevance à la personne publique et la diférence entre cette redevance et les recettes qu’il tire de l’exploitation constitue sa rémunération”, em página da I.S.U.P.E. – Initiative pour des Services d’Utilité Publique en Europe – http://www.isupe.com/lexique/lex/lex4.html.
[51] Dizemos contrato complexo e não contrato misto. Não se toma posição, pois, face à disputa sobre se se trata de acumulação de contratos (junção ou coligação), contrato misto, ou contrato unitário.
[52] MARCELLO CAETANO, ob. cit., pág. 1087.
[53] MARCELLO CAETANO, ibidem, pág. 1111.
[54] Diário da República, II Série, de 5-5-1986, pág. 4273.
[55] Diário da República, II Série, de 16-7-1986, pág. 6513.
[56] Ponto 1.1.VI do parecer anexo.
[57] Ponto IV.14 da Nota Informativa anexa ao ofício inicial.
[58] Veja-se o caso, temporalmente mais próximo, das bases anexas para a concessão de construção, apetrechamento e exploração, em regime de serviço público, do Estaleiro Naval de Olhão, aprovadas pelo Decreto-Lei n.º 266/2001, de 2 de Outubro: “Base II – Exclusivo 1 – Na área da concessão, é atribuído à concessionária o exclusivo da indústria de construção e reparação navais. 2 – A concessionária goza do direito de opção na instalação e exploração de quaisquer novas instalações, tipo estaleiro naval, na zona do porto de Olhão.”
[59] Curiosamente, em França, num quadro completamente diverso, a Lei de 30 de Dezembro de 1970 prevê (ia), que os estabelecimentos hospitalares privados com fim lucrativo pudessem concluir com o Estado “contrats de concession pour l'exécution du service public hospitalier”. Segundo o artigo 42.º, 1.º, o contrato comporta para o Estado “l’engagement de n'autoriser ou de n'admettre, dans une zone et pendant une période déterminée, la création ou l'extension d'aucun autre établissement ou service d'hospitalisation de même nature aussi longtemps que les besoins déterminés par la carte sanitaire demeurent satisfaits” (aparentemente, agora, corresponde-lhe o artigo L. 6161-9, 1.º do novo Code de la Santé Publique, em articulação com o artigo R. 715-10 do antigo Code de la Santé Publique) - Conforme ANDRÉ de LAUBADÈRE, JEAN-CLAUDE VENEZIA e YVES GAUDEMET, apesar do nome, não se trata de contrato de concessão de serviço público, “Traité de Droit Administratif”, Tomo I, L.G.D.J., 11.ª edição, 1990, págs. 715/6, e, de acordo com os dois primeiros autores, aquela fórmula contratual “não obteve qualquer sucesso”, “Traité de Droit Administratif”, Tomo 3, L.G.D.J., 4.ª edição, 1990, págs. 240/1. Pela sua estrutura, estes contratos estão próximos das convenções das bases XII, n.º 3, e XLI, do artigo 37.º do Estatuto, e do Decreto-Lei n.º 97/98, de 18 de Abril.
[60] Para além desta, a cláusula 38.ª prevê que a sociedade gestora pode solicitar a revisão das condições financeiras do contrato quando se verifique um excesso significativo relativamente à actividade esperada.
[61] MENEZES CORDEIRO, ob. cit., pág. 135.
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART64 N3 D
L 48/90 de 1990/08/24 B XII N3 B XXXVI B XLI
DL 11/93 de 1993/01/15 ART1 ART2 ART3 ART9 ART13 ART14 ART25 ART28 N2 ART29 N3 A B C H I J L ART30 ART31 N1 N2 N4 N5 N6 ART34
DL 157/99 de 1999/05/10 ART2 N2 ART3 N1 N3 ART4 ART7
PORT 704/94 DE 1994/07/29 ART27 N1 ART51 N3
DL 382/91 DE 1991/10/09
CADM896 ART815 § 2
ETAF84 ART9
CPADM91 ART178 N2 ART180 A ART183
DL 59/99 de 1999/03/02 ART2 N3 N4
DL 347/99 de 1999/09/18 ART2
DL 19/88 de 1988/01/21 ART2
CCIV66 ART1273
Referências Complementares: 
DIR ADM * ADM PUBL
Divulgação
Data: 
05-01-2002
Página: 
235
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