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Dados Administrativos
Número do Parecer: 
11/2016, de 25.05.2016
Data do Parecer: 
25-05-2016
Número de sessões: 
1
Tipo de Parecer: 
Parecer
Votação: 
Maioria
Relator: 
Luís Armando Bilro Verão
Descritores e Conclusões
Descritores: 
ESTABELECIMENTOS DO ENSINO PARTICULAR E COOPERATIVO DE NÍVEL NÃO SUPERIOR
CONTRATO DE ASSOCIAÇÃO
CONTRATO ADMINISTRATIVO
INTERPRETAÇÃO
DECLARAÇÃO NEGOCIAL
LEI DE VALOR REFORÇADO
LEI DE BASES
DECRETO-LEI DE DESENVOLVIMENTO
Conclusões: 
1.ª Os contratos de associação celebrados entre o Estado Português, através da Direção-Geral da Administração Escolar e as entidades titulares de estabelecimentos do ensino particular e cooperativo de nível não superior revestem a natureza de contratos administrativos.

2.ª A Administração não detém o poder de fixar com obrigatoriedade o sentido dos contratos administrativos, sendo as declarações do contraente público sobre a interpretação destes contratos meras declarações negociais – Cfr. artigo 307.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos.

3.ª Estando em causa a celebração de contratos de associação para os anos letivos de 2015/2016, de 2016/2017 e de 2017/2018 precedida de procedimento concursal em que o número de turmas colocadas a concurso o foi, em cada área geográfica, por ciclo de ensino e ano de escolaridade, sendo contemplados o 2.º ciclo e o 3.º ciclo do ensino básico e o ensino secundário, ocorre que, quer o 3.º ciclo do ensino básico, quer o ensino secundário, têm a duração de três anos, mas o 2.º ciclo do ensino básico tem a duração de apenas dois anos (5.º e 6.º anos de escolaridade).

4.ª Assim, sendo os contratos trienais, o 3.º ciclo do ensino básico e o ensino secundário ajustam-se perfeitamente ao período de vigência dos contratos, sendo certo que, de acordo com o n.º 2 da cláusula 2.ª dos contratos, «nos termos do n.º 2 do artigo 17.º do EEPC, o PRIMEIRO OUTORGANTE garante a manutenção do contrato até à conclusão do ciclo de ensino das turmas por ele abrangido.».

5.ª Mas tal já não sucede relativamente ao 2.º ciclo do ensino básico, dado que, no ano letivo de 2017/2018, ainda abrangido pelos contratos, terá de iniciar-se novamente o 5.º ano de escolaridade.
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6.ª Ora, tendo sido fixados, no aviso de abertura do concurso, idênticos números de turmas para os três anos letivos abrangidos e reportando-se o apoio financeiro ao período compreendido entre 1 de setembro de 2015 e 31 de agosto de 2018, sendo nos contratos de associação contemplado o pagamento do financiamento de turmas do 2.º ciclo do ensino básico durante o ano letivo de 2017/2018, ter-se-á de concluir que, em tais contratos, se contempla o funcionamento de turmas do 5.º ano de escolaridade (primeiro do dois anos que integram o 2.º ciclo do ensino básico) nesse ano letivo, sendo certo que, nos termos do artigo 13.º, n.º 2, da Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho, «no final do contrato, os seus efeitos mantêm-se até à conclusão do correspondente ciclo de ensino».

7.º Não se contemplando em tais contratos, no que ao 3.º ciclo do ensino básico e ao ensino secundário concerne, o direito de os estabelecimentos de ensino particular e cooperativo iniciarem novos ciclos de ensino - 7.º e 10.º anos de escolaridade.

8.ª Nos termos do artigo 164.º, alínea i), da Constituição da República Portuguesa, integra-se na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República legislar sobre as bases gerais de ensino, sendo as leis de bases leis de valor reforçado (artigo 212.º, n.os 2 e 3, da Constituição).

9.ª E, nos termos do artigo 198.º da Constituição, no exercício de funções legislativas, compete, designadamente, ao Governo fazer decretos-leis de desenvolvimento dos princípios ou das bases gerais dos regimes jurídicos contidos em leis que a eles se circunscrevam [n.º 1, alínea c)], devendo estes decretos-leis de desenvolvimento invocar expressamente a lei de bases ao abrigo da qual são aprovados (n.º 3).

10.ª Foi o que o Governo fez ao editar o Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro, que aprovou o Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior invocando expressamente que o fazia no desenvolvimento do disposto no artigo 17.º da Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo, aprovada pela Lei n.º 9/79, de 19 de março, no qual se prescrevera, designadamente, «dever o Governo publicar, por decreto-lei, o Estatuto dos Ensinos Particular e Cooperativo, de acordo com os princípios estabelecidos nesta lei».

11.ª E não poderia o Governo, em tal decreto-lei de desenvolvimento, pôr em causa o disposto na Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo.

12.ª Ora, estabelecendo-se no artigo 6.º, alínea i), do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior que compete ao Ministério da Educação e Ciência «permitir o acesso das famílias às escolas particulares e cooperativas, através da celebração de contratos e da concessão de apoios financeiros, bem como zelar pela sua correta aplicação, permitindo progressivamente o acesso às escolas particulares em condições idênticas às das escolas públicas», ocorre que, nos termos do artigo 6.º, n.º 2, alínea d), da Lei n.º 9/79, é atribuição do Estado «conceder subsídios e celebrar contratos para o funcionamento de escolas particulares e cooperativas, de forma a garantir progressivamente a igualdade de condições de frequência com o ensino público nos níveis gratuitos e a atenuar as desigualdades existentes nos níveis não gratuitos.»

13.ª E, para efeitos do disposto no artigo 6.º da Lei n.º 9/79, o Estado celebra contratos e concede subsídios a escolas particulares e cooperativas, celebrando, designadamente, contratos não só «com estabelecimentos que, integrando-se nos objetivos e planos do Sistema Nacional de Educação e sem prejuízo da respetiva autonomia institucional e administrativa, se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar», mas também «com estabelecimentos que obedeçam aos requisitos anteriores mas que se encontrem localizados em áreas suficientemente equipadas de estabelecimentos públicos» (artigo 8.º, n.º 2, alíneas a) e b), respetivamente, da Lei n.º 9/79), sendo concedida prioridade à celebração de contratos e atribuição de subsídios aos estabelecimentos que se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar (n.º 3 do mesmo artigo).

14.ª Ser concedida prioridade é, pois, o que se estabelece na Lei n.º 9/79, sendo certo que no artigo 14.º, n.º 1, Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro (anterior Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo) é que se estabelecia que «os contratos de associação são celebrados com escolas particulares situadas em zonas carecidas de escolas públicas».
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15.ª Sendo certo que no n.º 4 do artigo 10.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior, que tem por epígrafe Princípios da contratação, se estabelece que, na celebração dos contratos, o Estado deve ter em conta as necessidades existentes.

16.ª Por seu turno, a Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho, limitou-se a fixar as regras e procedimentos aplicáveis à atribuição de apoio financeiro pelo Estado a estabelecimentos de ensino particular e cooperativo de nível não superior, previstos na alínea c) (contratos de associação) do n.º 1 do artigo 9.º do mesmo Estatuto e, nos termos do n.º 2 do artigo 9.º dessa Portaria, o aviso de abertura dos procedimentos, fixando as condições e os termos em que podem ser apresentadas as candidaturas, contém, obrigatoriamente, «a área geográfica de implantação da oferta» [alínea d)], mais contendo, também obrigatoriamente, «o número de vagas para alunos ou turmas postas a concurso» [alínea b)] e «os ciclos de ensino abrangidos, com a correspondência com o número de turmas postas a concurso» [alínea c)].

17.ª Sendo na opção pelo número de turmas postas a concurso e pelos ciclos de ensino abrangidos, nas áreas geográficas que forem indicadas, que se coloca a questão de ter em conta as necessidades existentes.

18.ª Assim sendo, nem o Decreto-Lei n.º 152/2013, nem a Portaria n.º 172-A/2015, ostentam incompatibilidade com a Lei n.º 9/79, devendo ser aplicados em conformidade com o nela estabelecido e tendo especialmente em consideração o disposto nos seus artigos 6.º e 8.º.
Texto Integral
Texto Integral: 
Senhora Secretária de Estado Adjunta e da Educação,
Excelência:





I

Dignou-se Vossa Excelência solicitar à Senhora Conselheira Procuradora-Geral da República a emissão de parecer urgente deste corpo consultivo sobre o objeto dos contratos de associação celebrados com os estabelecimentos de ensino particular e cooperativo para o triénio escolar 2015/2018, nos termos que se passam a transcrever:

«Compete ao Estado organizar anualmente a rede escolar, devendo para tal tomar “em consideração as iniciativas e os estabelecimentos particulares e cooperativos, numa perspetiva de racionalização de meios, de aproveitamento de recursos e de garantia de qualidade” (cfr. artigo 58.º, n.º 2, da Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovada pela Lei n.º 46/86, de 14 de outubro, na redação que lhe foi dada por último pela Lei n.º 49/2005, de 30 de agosto).
As reuniões anuais de definição da capacidade de acolhimento de alunos na rede escolar para o ano letivo 2016/2017 deverão concluir-se em breve, com vista a permitir a abertura de matrículas e renovações de matrícula que já se encontram em curso desde 15 de abril.
Neste sentido, solicita-se a V. Ex.ª urgência na emissão do parecer, no sentido de permitir responder às seguintes duas questões:

1. O objeto dos novos contratos de associação celebrados em 2015 - tal como descritos na exposição em anexo - compreende o direito dos estabelecimentos do ensino particular e cooperativo de iniciar novos ciclos de ensino (5.º, 7.º e 10.º anos de escolaridade), em todos e cada ano letivo de duração do contrato, podendo constituir para o efeito outras tantas turmas que irão cumular com as turmas constituídas no(s) ano(s) anterior(es) ou, diversamente, apenas compreende as turmas de início de ciclo no primeiro ano contratual e as respetivas turmas de continuidade nos dois remanescentes anos de duração do contrato (2015/2018)?

2. Os artigos 10.º, n.º 6 e 16.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, bem como os artigos 3.º, n.º 1, e 9.º, n.º 3, da Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho, ao não condicionarem a celebração dos contratos de associação à verificação de carência de rede pública escolar na respetiva área geográfica conflituam com o preceituado no artigo 8.º, n.º 2, alínea a), n.os 3 e 4 da Lei de Bases do Sistema Educativo, sendo ilegais, por violação de lei de valor reforçado, nos termos do artigo 112.º, n.os 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa?»

Tendo o Senhor Conselheiro Vice-Procuradora-Geral da República proferido, em 21 de abril passado, despacho no sentido de pronúncia, com caráter de urgência, deste corpo consultivo.

Cumpre, pois, emitir parecer.

II


1. Na exposição que Vossa Excelência se dignou anexar pode ler-se, no concernente à primeira questão, designadamente, o seguinte:

«1. Os contratos de associação apresentam-se como uma solução de financiamento do Estado aos estabelecimentos particulares e cooperativos de ensino não superior que se integrem nos objetivos e planos do Sistema Nacional de Educação. Encontram-se atualmente regulamentados essencialmente pelos seguintes diplomas:
i. Lei de Bases do Sistema Educativo, Lei n.º 46/86, na redação que lhe foi dada, por último, pela Lei n.º 49/2005 (LBSE);
ii. Lei de Bases do ensino particular e cooperativo - Lei n.º 9/79, de 19 de março, alterada pela Lei n.º 33/2012 (LBEPC);
iii. Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo (EEPC), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro;
iv. Portaria n.º 172-A/2015, que regulamentou o disposto no art.º 17.º do EEPC;
v. Resolução de Conselho de Ministros n.º 42-A/2015, de 11 de junho;
vi Portaria n.º 482/2015, de 15 de junho[1].

2. A Lei de Bases do Sistema Educativo determina no seu art.º 58.º o seguinte:
“1 - Os estabelecimentos do ensino particular e cooperativo que se enquadrem nos princípios gerais, finalidades, estruturas e objetivos do sistema educativo são considerados parte integrante da rede escolar.
2 - No alargamento ou no ajustamento da rede o Estado terá também em consideração as iniciativas e os estabelecimentos particulares e cooperativos, numa perspetiva de racionalização de meios, de aproveitamento de recursos e de garantia de qualidade.”

3. Por sua vez, a Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo determina no número 2 do seu art.º 6.º que “são, designadamente, atribuições do Estado: (…) d) Conceder subsídios e celebrar contratos para o funcionamento de escolas particulares e cooperativas, de forma a garantir progressivamente a igualdade de condições de frequência com o ensino público nos níveis gratuitos e a atenuar as desigualdades existentes nos níveis não gratuitos”.

4. Neste sentido, o atual Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo determina no número 1 do seu art.º 9.º que “os contratos a celebrar entre o Estado e as escolas particulares podem revestir as seguintes modalidades:
a) Contratos simples de apoio à família.
b) Contratos de desenvolvimento de apoio à família;
c) Contratos de associação;
d) Contratos de patrocínio;
e) Contratos de cooperação.”

5. No que respeita aos contratos de associação, determina o número 6 do art.º 10.° do EEPC que “são sujeitos às regras concursais definidas em portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da educação”, a qual deverá aprovar também a respetiva minuta (cf. art.º 10.º, n.º 8, b) e ainda os termos de atribuição do respetivo apoio financeiro (cf. art.º 17.º do EEPC).

6. Tal portaria conjunta só foi publicada em 5 de junho de 2015 (Portaria n.º 172-A/2015), tendo então regulamentado os termos de atribuição do respetivo apoio financeiro através de contratos de associação, prevendo quatro possibilidades de contratualização:
a) Contratos novos, na sequência de procedimento de concurso aberto trienalmente (art.º 9.º, números 1 a 5 e 3.º)
b) Extensão de contratos existentes a um novo ciclo de ensino, na sequência de procedimento de concurso aberto trienalmente (art.º 9.º, número 6 e 3.º);
c) Renovação de contrato, por uma única vez (art.º 15.º);
d) Continuidade de contratos vigentes à data de publicação da Portaria n.º 172-A/2015, até final do respetivo ciclo (art.º 22.º - regime transitório).

7. Ao abrigo do disposto nos art.º 9.º, n.os 1 a 5 e art.º 3º da referida Portaria n.º 172-A/2015, foi aberto, em junho de 2015, um procedimento de concurso para os anos letivos de 2015 a 2018, nos termos do “Aviso de abertura ao regime de acesso ao apoio financeiro a conceder em 2015/2016, no âmbito do contrato de associação” (…).

8. Em tal aviso ficaram fixados: “a) Os prazos para o procedimento; b) O número de vagas para alunos ou turmas postas a concurso; c) Os ciclos de ensino abrangidos, com a correspondência com o número de turmas postas a concurso; d) A área geográfica de implantação da oferta; e) A duração do contrato; 1) Os critérios e subcritérios de seleção das candidaturas e as correspondentes ponderações” (cfr. art.º 9.º, n.º 2 da Portaria n.º 172-A/2015).

9. Em conformidade, foram apresentadas candidaturas pelos estabelecimentos interessados, as quais, de acordo com o previsto no número 1.4 da secção II do Aviso foram acompanhadas dos seguintes documentos: “resumo do projeto de intervenção (no máximo duas páginas A4) com indicação das ações de intervenção, apresentação da metodologia do Projeto, objetivos definidos e indicadores de medida, modelo de avaliação, recursos alocados ao projeto para o 2.º ciclo, 3.º ciclo e secundário, com indicação, para estes níveis de ensino, do n.º total de docentes e de alunos.” (sublinhado nosso).

10. O resultado final do procedimento foi publicado em lista definitiva homologada em 12.08.2015 pelo Secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar».

(…)

«14. O apoio financeiro disponibilizado no procedimento aberto ao abrigo da Portaria n.º 172-A/2015, segundo Informação da Direção-Geral da Administração Escolar, abrangia até 1968 turmas, no total dos 3 anos.

15. Concluído o procedimento, para o ano letivo de 2015/2016 foram validadas, pela Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares, 637 turmas de 5.º, 7.º e 10.º anos, o que, a multiplicar pelos três anos de prazo contratual, permite concluir por um máximo de 1911 turmas.

16. Todos os contratos de associação celebrados ex novo ao abrigo do concurso de 2015 iniciaram novos ciclos de ensino, na medida em que foi esse o objeto do concurso, nos termos do respetivo aviso. Por força do disposto no art.º l7.º/2 do EEPC, estes contratos asseguram ainda continuidade e conclusão dos respetivos ciclos de ensino abrangidos, no prazo contratual estipulado. (…) As continuidades dos ciclos em curso ao abrigo de outros contratos de associação, celebrados em anos anteriores (6.º, 8.º, 9.º, 11.º e 12.º), foram asseguradas em contratos paralelos.

17. Em conformidade, cada contrato de associação (novo) determina o número máximo de turmas a financiar em toda a vigência do contrato e os respetivos ciclos de ensino abrangidos. O número de turmas contratado por cada ano de cada ciclo, por sua vez, decorre da candidatura do estabelecimento e da aprovação final da mesma.»

Sendo depois, nesta informação, tomado como exemplo padrão um contrato de associação celebrado em 20 de agosto de 2015 relativamente a área geográfica em relação à qual, no supramencionado aviso, se havia estabelecido o seguinte número de turmas em concurso, por ciclo de ensino e ano de escolaridade:
2.º ciclo, 5.º ano – 7 turmas.
3.º ciclo, 7.º ano – 7 turmas.
Ensino secundário, 10.º ano – 3 turmas.

E, consignando-se, a propósito de tal contrato, na exposição em apreço, o seguinte:

«19. No respetivo contrato (…) ficou previsto o seguinte:
“Clausula 1.ª
Objeto
1 - O presente Contrato de Associação tem por objeto a concessão, pelo PRIMEIRO OUTORGANTE ao SEGUNDO OUTORGANTE, do apoio financeiro necessário à constituição do número máximo de 51 (cinquenta e um) turmas, do 2.º CEB, 3.º CEB e Ensino Secundário a funcionarem (…) nos anos letivos de 2015/2016, 2016/2017, 2017/2018, nas mesmas condições de gratuitidade do ensino público.
2 - O apoio a conceder durante a execução do contrato é atribuído ao número de turmas que efetivamente venham a ser constituídas e validadas, em cada ano letivo.”
Cláusula 2.ª
Obrigações do PRIMEIRO OUTORGANTE
1 - São obrigações do PRIMEIRO OUTORGANTE:
(...)
c) Pagar ao segundo outorgante, através de transferência bancária, o apoio financeiro contratado por este instrumento, no valar de 4105500 € (quatro milhões cento e cinco mil e quinhentos euros) em prestações mensais, correspondente a 51 (cinquenta e uma) turmas, relativo ao período de 1 de setembro de 2015 e 31 de agosto de 2018 para o número de identificação bancária (NlB) indicado pela SEGUNDO OUTORGANTE.
(...)
2 - Nos termos do n.º 2 do artigo 17.º do EEPC, o PRIMEIRO OUTORGANTE garante a manutenção do contrato até à conclusão do ciclo de ensino das turmas por ele abrangido.”

20. No exemplo dado, o pagamento assumido na cláusula 2.ª, n.º 1, alínea c) de €4.105.500, dividido pelo valor/turma, estabelecido no art.º 16., n.º 1 da Portaria 172-A/2015 de € 80.500, perfaz exatamente o valor de 51 turmas.

21. Isto parece significar que, encontrando-se contratualizado o máximo de 17 turmas para o ano letivo inicial de 2015/2016 (7+7+3), o valor em causa de € 4.105.500 garante cabalmente o financiamento do máximo das mesmas 17 turmas em cada ano de vigência do contrato de associação, pois a soma de 17 turmas por cada ano letivo perfaz 51 turmas.

22. Nestes termos, o apoio financeiro contratado assegurará a continuidade e a conclusão dos ciclos de ensino das 17 turmas iniciais abrangidas pelo contrato, até ao termo da sua vigência em 2018, em cabal cumprimento do preceituado no art.º 17.º, n.º 2, do EEPC e da cláusula 2.ª, número 2 do contrato.

23. Ressalve-se porém que, neste caso em concreto, (…) apenas seriam financiadas 44 turmas, na medida em que as 7 turmas de 2.º Ciclo do Ensino Básico (5.º e 6.º anos) concluem o respetivo ciclo em 2016/2017. Assim, no último ano de contrato, o ano letivo 2017/2018, financiam-se menos 7 turmas, nos termos previstos no n.º 2 da cláusula 1.ª, que tem correspondência no art.º 9.º, n.º 2, do EEPC e 17.º, n.º 2 da Portaria n.º 172-A/2015, que determina que “o apoio a conceder durante a execução do contrato é atribuído ao número de turmas que efetivamente venham a ser constituídas e validados, em cada ano letivo.”»

2. E, no que à segunda questão concerne, consignou-se, na exposição em apreço, designadamente, o seguinte:

«29. (…) A Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo determina, no seu art.º 8.º, o seguinte:
“1 - Para efeitos do disposto no artigo 6.º, o Estado celebra contratos e concede subsídios a escolas particulares e cooperativas.
2 - Na celebração de contratos entre o Estado e as escolas particulares e cooperativas são consideradas as seguintes modalidades:
a) Contratos com estabelecimentos que, integrando-se nos objetivos e planos do Sistema Nocional de Educação e sem prejuízo da respetiva autonomia institucional e administrativa, se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar; (sublinhado nosso)
b) Contratos com estabelecimentos que obedeçam aos requisitos anteriores mas que se encontrem localizados em áreas suficientemente equipados de estabelecimentos públicos;
c) Contratos com estabelecimentos em que, para além dos planos oficiais de ensino aos vários níveis, sejam ministradas outras matérias no quadro de experiências de atualização pedagógica e educativa.
3 - É concedida prioridade à celebração de contratos e atribuição de subsídios aos estabelecimentos referidos na alínea a) do n.º 2, bem como a jardins de infância e a escolas de ensino especial, nomeadamente em áreas geográficas carenciadas.
4 - Aos alunos de qualquer nível ou ramo de ensino que frequentem as escolas referidas na alínea a) do n.º 2 é garantida igualdade com os alunos do ensino oficial no que se refere a despesas com propinas e matrículas. (sublinhado nosso)
5 - Incumbe ao Governo estabelecer a regulamentação adequada para a celebração dos contratos e concessão dos apoios e subsídios previstos neste artigo, com especificação dos compromissos a assumir por ambas as partes, bem como a fiscalização do cumprimento dos contratos estabelecidos.”

30. O anterior Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 555/80, (última redação conferida pela Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto), determinava no seu art.º 12.º o seguinte:
“1 - O Estado celebrará contratos com escolas particulares que, integrando-se nos objetivos do sistema educativo, se localizem em áreas carecidas de escolas públicas. (sublinhado nosso)
2 - O Estado também celebrará contratos com estabelecimentos de ensino que, obedecendo ao requisito da primeira parte do número anterior, se localizem noutras áreas.
3 – O Estado pode ainda celebrar contratos com estabelecimentos de ensino em que, para além dos planos oficiais de ensino aos vários níveis, sejam ministradas outras matérias no quadro de experiências pedagógicas e, bem assim, com escolas que se proponham a criação de cursos com planos próprios (…)”.

31. Adicionalmente, no número 1 do artigo 14.º, deste diploma foi estipulado que “os contratos de associação são celebrados com escolas particulares situadas em zonas carecidas de escolas públicas, pelo prazo mínimo de um ano.” O conceito de zona encontra-se ainda definido no art.º 6.º do Decreto-lei n.º 108/88, de 31 de março, como “um espaço delimitado por um círculo de raio igual a 4km, a contar da localização da escola.” (sublinhado nosso)

32. O Decreto-Lei n.º 555/80 foi revogado pelo Decreto-Lei n.º 152/2013 que, aprovando um novo Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, veio estabelecer no seu art.º 16.º o seguinte:
“1 - Os contratos de associação têm por fim possibilitar a frequência das escolas do ensino particular e cooperativo em condições idênticas às do ensino ministrado nas escolas públicas, no respeito pela especificidade do respetivo projeto educativo. (sublinhado nosso)
2 - Os contratos de associação são celebrados com escolas particulares ou cooperativas, com vista à criação de oferta pública de ensino, ficando estes estabelecimentos de ensino obrigados a aceitar a matrícula de todos os alunos até ao limite da sua lotação, seguindo as prioridades idênticas às estabelecidas para as escolas públicos.
3 - Os contratos e as inerentes condições de frequência previstos no presente artigo podem abranger apenas uma parte da lotação da escola.”

33. Nem neste artigo nem em qualquer outro deste novo estatuto se refere a exigência de carência de rede pública escolar para efeitos de celebração de contratos de associação.

34. No seu artigo 10.º, n.º 6, o EEPC determina ainda que “os contratos destinados à criação da oferta pública de ensino, adiante designados como contratos de associação, são sujeitos às regras concursais definidas em portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da educação.”

35. Ora, a Portaria n.º 172-A/2015, que veio regulamentar este novo EEPC, igualmente omite qualquer referência à exigência de carência de rede pública escolar apenas determinando no número 1 do seu art.º 3.º que “tendo em conta a necessidade de garantir a oferta educativo aos alunos que pretendam frequentar as escolas do ensino particular e cooperativo em condições idênticas às do ensino ministrado nas escolas públicas, realiza-se com uma periodicidade trienal, um procedimento administrativo nos termos da presente portaria, destinado à celebração de contratas de associação ou extensão dos contratos existentes a um novo ciclo de ensino.” (sublinhado nosso)

36. Acresce que, de acordo com o preceituado no número 3 do art.º 9.º daquela portaria, os critérios e subcritérios de seleção das candidaturas em tal procedimento são os seguintes:
“a) Os resultados escolares dos alunos, com ênfase para os resultados obtidos nas provas e exames nacionais;
b) O projeto de intervenção para os alunos e turmas a concurso, com realce para os objetivos definidos para a promoção do sucesso, a prevenção e combate ao insucesso e abandono e a melhoria dos resultados escolares;
c) Estabilidade do corpo docente do estabelecimento de ensino;
d) A qualidade das instalações e equipamentos.”

37. Como se vê, a Portaria n.º 172-A/2015 não condiciona a celebração dos contratos de associação à verificação de carência de rede pública escolar na respetiva área geográfica mas garante a igualdade de condições de frequência com os alunos do ensino oficial.»

Vejamos.

III
Os parâmetros constitucionais

1. Nos termos do artigo 43.º da Constituição da República Portuguesa, que tem por epígrafe Liberdade de aprender e ensinar:

«1. É garantida a liberdade de aprender e ensinar.
2. O Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer diretrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas.
3. O ensino público não será confessional.
4. É garantido o direito de criação de escolas particulares e cooperativas.»

Cumprindo salientar que a garantia constitucional do direito de criação de escolas particulares e cooperativas foi introduzida pela revisão de 1982[2].

E no artigo 75.º da Constituição, que tem por epígrafe Ensino público, particular e cooperativo, dispõe-se o seguinte:

«1. O Estado criará uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população.
2. O Estado reconhece e fiscaliza o ensino particular e cooperativo, nos termos da lei.»

Sendo certo que a redação originária deste preceito constitucional era a seguinte:

ARTIGO 75.º
(Ensino público e particular)
1. O Estado criará uma rede de estabelecimentos oficiais de ensino que cubra as necessidades de toda a população.
2. O Estado fiscaliza o ensino particular supletivo do ensino público.»

Tendo a caracterização do ensino particular como supletivo do ensino público sido eliminada pela revisão de 1982[3].

E havendo a revisão de 1989 vindo estabelecer que o Estado não só fiscaliza, como reconhece o ensino particular e cooperativo, nos termos da lei[4].

Esta evolução tem tido, porém, diversas leituras.

Assim e por exemplo, Jorge Miranda[5] expende, designadamente, o seguinte:

«O termo supletivo cairia em 1982 e em 1989 estabelecer-se-ia, no n.º 2, que o Estado não só fiscalizaria como reconheceria o ensino privado e cooperativo. Donde, agora, com mais clareza, uma ideia de complementaridade e de competitividade com vista à prossecução das finalidades constitucionais. Donde, o direito à escola pública - com a inerente incumbência do Estado (do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais e, eventualmente, de outras entidades públicas) de criar escolas de todos os graus e áreas em todo o país; e, em simultâneo, o direito de frequentar a escola particular ou cooperativa que se pretenda frequentar.»

Mas, para J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira[6]:

«O ensino particular e o cooperativo são livres; mas, hão de ser, constitucionalmente, uma solução alternativa ou paralela da solução propiciada pelo ensino público, carecendo de fundamento constitucional o recorte de um dever jurídico do Estado garantir um hipotético princípio de equiparação entre o ensino público e o ensino privado. Desde logo, porque continua a existir uma diferença fundamental: os estabelecimentos de ensino público prestam um serviço público e no interesse público; as escolas privadas, mesmo com reconhecimento de interesse público, prestam serviço privado no interesse dos seus titulares. O facto de numa determinada área de ensino ou região já haver uma escola privada ou uma escola cooperativa, sem que exista uma escola pública, não é motivo para não criar esta; é, antes, prova de que há uma necessidade pública de ensino que não encontra resposta, como devia, no sistema público de ensino.»

E, adversamente, para Vieira de Andrade[7] a norma do n.º 1 do artigo 75.º da Constituição deve ser «objeto de restrição teleológica no contexto global da Constituição», defendendo que «este preceito, interpretado à letra, seria de tal modo absoluto que implicaria a criação de um monopólio do Estado (ou das entidades públicas) na prestação do serviço de ensino, e de um monopólio que, em rigor, não seria sequer suscetível de concessão ou de parcerias com entidades privadas».

2. Face ao disposto no artigo 112.º da Constituição da República Portuguesa, que tem por epígrafe Atos normativos:

As leis e os decretos-leis têm igual valor, sem prejuízo da subordinação às correspondentes leis dos decretos-leis publicados no uso de autorização legislativa e dos que desenvolvam as bases gerais dos regimes jurídicos (n.º 2).
Têm valor reforçado, além das leis orgânicas, as leis que carecem de aprovação por maioria de dois terços, bem como aquelas que, por força da Constituição, sejam pressuposto normativo necessário de outras leis ou que por outras devam ser respeitadas (n.º 3).
Nenhuma lei pode criar outras categorias de atos legislativos ou conferir a atos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos (n.º 5).
E os regulamentos devem indicar expressamente as leis que visam regulamentar ou que definem a competência subjetiva e objetiva para a sua emissão (n.º 7).

Sendo certo que, nos termos do artigo 164.º, alínea i), da Constituição da República Portuguesa, integra-se na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República legislar sobre as bases do sistema de ensino.

E que, nos termos do artigo 198.º da Constituição, no exercício de funções legislativas, compete, designadamente, ao Governo fazer decretos-leis de desenvolvimento dos princípios ou das bases gerais dos regimes jurídicos contidos em leis que a eles se circunscrevam [n.º 1, alínea c)], devendo estes decretos-leis de desenvolvimento invocar expressamente a lei de bases ao abrigo da qual são aprovados (n.º 3).

Tal como acentua Jorge Miranda[8]:

No elenco das leis reforçadas incluem-se as «leis de bases [arts. 112°, n.º 2, 198.°, n.º 1, alínea c) e n.º 3, e 227.°, n.º 1, alínea c)] - porque os decretos-leis e os decretos legislativos regionais de desenvolvimento têm, pela natureza das coisas, de se mover no âmbito precetivo das bases».
Não definindo a Constituição o que sejam bases gerais, «parece seguro que nelas se há de incluir aquilo que em cada ato constitua as opções político-legislativas fundamentais».
«Se são publicadas leis de bases e se, de seguida, são emitidos decretos-leis de desenvolvimento, não pode o Governo, a esse título, a título ou com função de desenvolvimento, pôr em causa o disposto em tais leis.»
«Seria absurdo que, simultaneamente, vigorassem uma lei de bases e um decreto-lei autoqualificado como de desenvolvimento e que dela fosse discrepante.»

Como se disse no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 39/84, de 11 de abril de 1984[9] «só se desenvolve aquilo que se respeita».

Acórdão em que consignou que, já existindo, então (na sequência da revisão de 1982), preceito constitucional a estatuir «claramente uma regra de prevalência da lei de bases sobre os respetivos decretos-leis de desenvolvimento»[10], «a ideia da subordinação dos decretos-leis às respetivas leis de bases já era defendida à face do texto originário da Constituição da República Portuguesa (v., por exemplo, J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1978, pp. 388-389)».

IV

1. Os artigos 57.º, 58.º e 61.º da Lei de Bases do Sistema Educativo[11], inseridos no seu Capítulo VIII – Ensino particular e Cooperativo são do seguinte teor:

«Artigo 57.º
Especificidade
1 - É reconhecido pelo Estado o valor do ensino particular e cooperativo como uma expressão concreta da liberdade de aprender e ensinar e do direito da família a orientar a educação dos filhos.
2 - O ensino particular e cooperativo rege-se por legislação e estatuto próprios, que devem subordinar-se ao disposto na presente lei.»

«Artigo 58.º
Articulação com a rede escolar
1 - Os estabelecimentos do ensino particular e cooperativo que se enquadrem nos princípios gerais, finalidades, estruturas e objetivos do sistema educativo são considerados parte integrante da rede escolar.
2 - No alargamento ou no ajustamento da rede o Estado terá também em consideração as iniciativas e os estabelecimentos particulares e cooperativos, numa perspetiva de racionalização de meios, de aproveitamento de recursos e de garantia de qualidade.»

«Artigo 61.º
Intervenção do Estado
1 - O Estado fiscaliza e apoia pedagógica e tecnicamente o ensino particular e cooperativo.
2 - O Estado apoia financeiramente as iniciativas e os estabelecimentos de ensino particular e cooperativo quando, no desempenho efetivo de uma função de interesse público, se integrem no plano de desenvolvimento da educação, fiscalizando a aplicação das verbas concedidas.»

Por seu turno, os artigos 1.º, 2.º, 6.º e 8.º da Lei n.º 9/79, de 19 de março - Bases do ensino particular e cooperativo[12] são do seguinte teor:

«ARTIGO 1.º
1 - É direito fundamental de todo o cidadão o pleno desenvolvimento da sua personalidade, aptidões e potencialidades, nomeadamente através da garantia do acesso à educação e à cultura e do exercício da liberdade de aprender e de ensinar.
2 - Ao Estado incumbe criar condições que possibilitem o acesso de todos à educação e à cultura e que permitam igualdade de oportunidades no exercício da livre escolha entre pluralidade de opções de vias educativas e de condições de ensino.
3 - É reconhecida aos pais a prioridade na escolha do processo educativo e de ensino para os seus filhos.»

«ARTIGO 2.º
As atividades e os estabelecimentos de ensino enquadrados no âmbito do sistema nacional de educação são de interesse público.»

«ARTIGO 6.º
1 - O Estado apoia e coordena o ensino nas escolas particulares e cooperativas, respeitando inteiramente os direitos consignados no artigo 1.º desta lei, de modo que as desigualdades sociais, económicas e geográficas não possam constituir entrave à consecução dos objetivos nacionais de educação.
2 - No âmbito desta competência são, designadamente, atribuições do Estado:
a) Conceder a autorização para a criação e assegurar-se do normal funcionamento das escolas particulares e cooperativas, segundo critérios a definir no Estatuto dos Ensinos Particular e Cooperativo, o qual deve salvaguardar a idoneidade civil e pedagógica das entidades responsáveis e os requisitos técnicos, pedagógicos e sanitários adequados;
b) Proporcionar o apoio pedagógico e técnico necessário ao seu efetivo funcionamento, nos termos previstos por lei;
c) Garantir o nível pedagógico e científico dos programas e métodos, de acordo com as orientações gerais da política educativa;
d) Conceder subsídios e celebrar contratos para o funcionamento de escolas particulares e cooperativas, de forma a garantir progressivamente a igualdade de condições de frequência com o ensino público nos níveis gratuitos e a atenuar as desigualdades existentes nos níveis não gratuitos.»

«ARTIGO 8.º
1 - Para efeitos do disposto no artigo 6.º, o Estado celebra contratos e concede subsídios a escolas particulares e cooperativas.
2 - Na celebração de contratos entre o Estado e as escolas particulares e cooperativas são consideradas as seguintes modalidades:
a) Contratos com estabelecimentos que, integrando-se nos objetivos e planos do Sistema Nacional de Educação e sem prejuízo da respetiva autonomia institucional e administrativa, se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar;
b) Contratos com estabelecimentos que obedeçam aos requisitos anteriores mas que se encontrem localizados em áreas suficientemente equipadas de estabelecimentos públicos;
c) Contratos com estabelecimentos em que, para além dos planos oficiais de ensino aos vários níveis, sejam ministradas outras matérias no quadro de experiências de atualização pedagógica e educativa.
3 - É concedida prioridade à celebração de contratos e atribuição de subsídios aos estabelecimentos referidos na alínea a) do n.º 2, bem como a jardins de infância e a escolas de ensino especial, nomeadamente em áreas geográficas carenciadas.
4 - Aos alunos de qualquer nível ou ramo de ensino que frequentem as escolas referidas na alínea a) do n.º 2 é garantida igualdade com os alunos do ensino oficial no que se refere a despesas com propinas e matrículas.
5 - Incumbe ao Governo estabelecer a regulamentação adequada para a celebração dos contratos e concessão dos apoios e subsídios previstos neste artigo, com especificação dos compromissos a assumir por ambas as partes, bem como a fiscalização do cumprimento dos contratos estabelecidos.»

Cumprindo salientar, no que ao artigo 6.º, n.º 2, alínea d) concerne, que a relevante atribuição de que se ocupa não tinha o mesmo alcance no supramencionado projeto de lei n.º 108/I, em cuja alínea a) do n.º 2, se contemplava apenas o seguinte:

«Conceder subsídios e celebrar contratos com entidades para o funcionamento de escolas particulares e cooperativas»[13].
E mais cumprindo salientar que o Conselho da Revolução, na sua Resolução n.º 64/79, de 16 de fevereiro de 1979[14], precedendo parecer da Comissão Constitucional, não se pronunciou pela inconstitucionalidade do supramencionado «Decreto da Assembleia da República n.º 196/I, de 18 de janeiro de 1979, sobre as Bases Gerais do Ensino Particular e Cooperativo».

Tendo a Comissão Constitucional, em tal parecer[15], face à - então vigente e atrás transcrita - redação originária do artigo 75.º da Constituição, considerado, designadamente, o seguinte:

«O primeiro problema de legitimidade constitucional levantado consiste em saber se o preceito do artigo 8.° do decreto da Assembleia da República respeita ou não o princípio da supletividade do ensino particular, na sua relação com o ensino público, consagrado no artigo 75.º da Constituição.
O artigo 8.º referido, no seu n.° 2, alínea b), permite que o Estado celebre contratos mesmo com escolas particulares e cooperativas que, integrando-se embora nos objetivos e planos do Sistema Nacional de Educação (sempre sem prejuízo da respetiva autonomia institucional e educativa), se situem em “áreas suficientemente equipadas de estabelecimentos públicos”.»
«Se o conceito de supletividade adotado na Constituição for um conceito concebido em termos meramente geográficos, a citada alínea b) do n.º 2 do artigo 8.° do decreto aprovado pela Assembleia da República será inconstitucional.
Poderia parecer, ao primeiro exame do artigo 75.°, que, sendo obrigação do Estado criar uma rede de estabelecimentos oficiais de ensino suficientes, digamos, para cobrir as necessidades de toda a população, o ensino particular já existente ou a criar no futuro teria de desaparecer e ser integrado no ensino público sempre e à medida que ele já não fosse necessário, em certa área ou localidade, cuja população escolar o não justificasse. Não faria, então, sentido que se permitissem e subsidiassem estabelecimentos de ensino particular que à partida estariam condenados a desaparecer por não haver superlotação nos estabelecimentos de ensino público.
Seria mesmo em tal orientação que chegou a propor-se na Assembleia Constituinte que “O Estado procederá à progressiva integração dos estabelecimentos do ensino particular no ensino oficial... ” (n.º 3 do artigo 29.° do projeto apresentado pela respetiva Comissão).
Simplesmente, tal conceção não prevaleceu na Constituinte, tendo-se preferido uma solução maleável que permitisse ao futuro legislador ordinário adotar as soluções que melhor se adaptassem à evolução da política social e educativa em cada momento histórico.
Nem se foi para sistema de um ensino particular como simples “dado da organização política e social” e, por isso, condenado a desaparecer, nem se foi para a consagração expressa de uma ideia de supletividade radicada no princípio da liberdade de ensino “como consequência direta da liberdade de consciência, da liberdade de pensamento, da liberdade religiosa, da liberdade de associação e finalmente garantia do pluralismo político e ideológico e fator de criatividade cultural”, usando a linguagem de certo deputado interveniente na discussão travada à volta desse tema e, portanto, com uma maior vocação à perdurabilidade.
Deste modo, o conceito de supletividade ficou na Constituição por definir, assim se ultrapassando o antagonismo das duas teses em presença sem se negar ou afirmar a validade de qualquer delas.
E sendo assim ambíguo o conceito constitucional, o legislador ordinário ficou com uma margem de liberdade suficiente para, em tal aspeto, adotar, como adotou, uma conceção ampla de supletividade que abarque não só a supletividade de rede, como a supletividade pedagógica e educativa, para usar as expressões (que nos parecem adequadas) da declaração de voto do Partido Socialista (Deputada Teresa Ambrósio).
Não pode, pois, censurar-se, em sede de simples legitimidade constitucional, a solução adotada no artigo 8.°, alínea b).»

E em sede de considerações coadjuvantes e atinentes à «evolução do sistema jurídico português», também se salientou, designadamente, o seguinte:

«A Assembleia da República aprovou para ratificação, há pouco, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem. No artigo 2.° do seu Protocolo n.º 1 à Convenção de Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais lê-se que “a ninguém deve ser negado o direito à instrução” e que “o Estado, no exercício das funções que tem de assumir no campo da educação e do ensino, respeitará o direito dos pais a assegurar aquela educação e ensino consoante as suas convicções religiosas e filosóficas”, desenvolvendo, assim, o que já se continha no artigo 26.° da Declaração Universal dos Direitos do Homem, bem como no artigo 13.º, maxime n.º 3 do Pacto Internacional dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais, de 16 de dezembro de 1966, igualmente já ratificados por Portugal.»

Tendo, assim, a Comissão Constitucional sido de parecer que o Conselho da Revolução se não deveria pronunciar pela inconstitucionalidade do «Decreto da Assembleia da República n.º 196/1, de 18 de janeiro de 1979, sobre “Bases Gerais do Ensino Particular e Cooperativo”».

Sendo certo que Jorge Miranda, tendo votado favoravelmente, anexou declaração em que, para além do mais, consignou, visualizando a escassez de recursos, o seguinte:

«A mesma consciência das limitações de recursos financeiros terá levado a Assembleia da República a não estabelecer a igualdade de condições económicas dos alunos das escolas particulares e das escolas públicas em áreas onde estas não faltem. Mas também aqui, na lógica da lei, se trata de uma solução a curto ou a médio prazo, uma vez que o artigo 8.º aparece subordinado à intenção manifestada no artigo 6.° de garantir progressivamente a igualdade de condições de frequência com o ensino público, nos níveis gratuitos e de atenuar as desigualdades existentes, nos níveis não gratuitos.»

2. O supramencionado Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro[16] foi editado «no desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pelo n.º 2 do artigo 57.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovada pela Lei n.º 46/86, de 14 de outubro, alterada pelas Leis n.os 115/97, de 19 de setembro, 49/2005, de 30 de agosto, e 85/2009, de 27 de agosto, bem como do disposto no artigo 17.º da Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo, aprovada pela Lei n.º 9/79, de 19 de março, alterada pela Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto[17], e nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição»[18], dispondo-se no artigo 1.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior aprovado em anexo a esse decreto-lei o seguinte:

«O presente Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, doravante designado por Estatuto, rege, nos termos da Lei n.º 9/79, de 19 de março, alterada pela Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto, a constituição, a organização e o funcionamento dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo de nível não superior.»

E, sendo certo que no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 152/2013 se salientou que o mesmo se alicerça «em grandes vetores estruturantes, que estão em linha com a última alteração legislativa efetuada ao Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, através da Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto, por força da necessidade de o adaptar à Diretiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro, relativa aos serviços no mercado interno».

Para, seguidamente, se consignar o seguinte:

«São eles, em primeiro lugar, a liberdade de ensino e a inerente liberdade de criação de escolas particulares, e o consequente compromisso de acompanhamento e supervisão do Estado, tendo por referência a tipologia de contratos existentes e a nova nomenclatura que, entretanto, foi sendo consolidada na ordem jurídica.
Pretende-se, assim, partindo do modelo existente, aprofundar e concretizar o princípio da integração na rede de oferta pública de educação, numa lógica de articulação de toda a rede de ensino, de forma a melhor atender às necessidades dos alunos, a otimizar o investimento público e aproveitar as capacidades instaladas, não constituindo prioridade do Estado a construção de equipamentos escolares nas zonas onde existe oferta.
Além dos contratos de associação, de patrocínio e dos contratos simples de apoio à família, são agora incorporados os contratos de desenvolvimento, destinados à promoção da educação pré-escolar e os contratos de cooperação, destinados a apoiar a escolarização de alunos com necessidades educativas especiais.
Em segundo lugar, o Estatuto aperfeiçoa o modelo de financiamento criado pelo Decreto-Lei n.º 138-C/2010, de 28 de dezembro, e até aqui existente para os contratos de associação. Os contratos de associação, a regular por portaria, integram a rede de oferta pública de ensino, fazendo parte das opções oferecidas às famílias no âmbito da sua liberdade de escolha no ensino do seu educando.»

Ora, o Decreto-Lei n.º 138-C/2010 havia regulado o apoio do Estado às escolas particulares e cooperativas de ensino não superior, alterando o supramencionado Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro (anterior Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo)[19], designadamente o seu artigo 15.º, cujo n.º 2 revogou e passando, então, os n.os 1, 3 e 4, alínea a), do mesmo, a ter a seguinte redação:

«1 - O Estado concede às escolas que celebrem contratos de associação um apoio financeiro, que consiste na atribuição de um subsídio, nos termos a fixar por portaria do membro do Governo responsável pela área da educação.»
«3 - O Estado assegura que o contrato de associação é mantido até à conclusão do ciclo de ensino pelas turmas por ele abrangidas.»[20]
«4 - A portaria a que se refere o n.º 1 deve:
a) Fixar o valor do apoio financeiro, com base no princípio do financiamento anual por turma, tendo em consideração os custos das turmas das escolas públicas de nível e grau equivalentes.»

Passando, assim, o modelo de financiamento a basear-se no princípio do financiamento por turma e assegurando-se a estabilidade das condições oferecidas aos alunos, sendo o financiamento a cada turma assegurado até à conclusão do respetivo ciclo de ensino[21].

Por outro lado, estabelecendo-se no artigo 6.º, alínea i), do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior que compete ao Ministério da Educação e Ciência «permitir o acesso das famílias às escolas particulares e cooperativas, através da celebração de contratos e da concessão de apoios financeiros, bem como zelar pela sua correta aplicação, permitindo progressivamente o acesso às escolas particulares em condições idênticas às das escolas públicas», ocorre que, como se viu, nos termos do artigo 6.º, n.º 2, alínea d), da Lei n.º 9/79, é atribuição do Estado «conceder subsídios e celebrar contratos para o funcionamento de escolas particulares e cooperativas, de forma a garantir progressivamente a igualdade de condições de frequência com o ensino público nos níveis gratuitos e a atenuar as desigualdades existentes nos níveis não gratuitos.»

E importando, sobretudo, salientar que o atrás mencionado artigo 10.º deste Estatuto é do seguinte teor:

«Artigo 10.º
Princípios da contratação
1 - O apoio do Estado aos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo obedece aos princípios de transparência, equidade, objetividade e publicidade.
2 - O Estado celebra contratos com escolas particulares e cooperativas integradas nos objetivos do sistema educativo.
3 - A celebração destes contratos tem como objetivo a promoção e a qualidade da escolaridade obrigatória e o acesso dos alunos ao ensino em igualdade de condições.
4 - Na celebração destes contratos, o Estado tem em conta as necessidades existentes e a qualidade da oferta, salvaguardado o princípio da concorrência.
5 - Sem prejuízo dos demais critérios estabelecidos, a renovação dos contratos entre o Estado e as escolas do ensino particular e cooperativo deve ter em conta os resultados obtidos pelos alunos.
6 - Os contratos destinados à criação da oferta pública de ensino, adiante designados como contratos de associação, são sujeitos às regras concursais definidas em portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da educação.
7 - O Estado pode celebrar contratos com estabelecimentos de ensino que se proponham criar cursos com planos próprios e com estabelecimentos de ensino em que sejam ministrados cursos vocacionais, ensino especializado e experiências pedagógicas inovadoras.
8 - Os contratos devem:
a) Especificar os direitos e as obrigações assumidas pelas escolas e pelo Estado;
b) Respeitar a minuta aprovada por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da educação.
9 - As escolas particulares que celebrarem contratos com o Estado ficam sujeitas às inspeções administrativas e financeiras dos serviços competentes do Ministério da Educação e Ciência que se mostrem necessárias em função das obrigações contratuais assumidas.»

Sublinhando-se que no n.º 4 deste artigo se estabelece que, na celebração dos contratos, o Estado deve ter em conta as necessidades existentes.

Por seu turno e no que ao disposto n.º 6 deste artigo concerne, ocorre que o artigo 9.º da também atrás referida Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho[22], que fixou as regras e procedimentos aplicáveis à atribuição de apoio financeiro pelo Estado a estabelecimentos de ensino particular e cooperativo de nível não superior, previstos na alínea c) (contratos de associação) do n.º 1 do artigo 9.º do mesmo Estatuto, é do seguinte teor:

«Artigo 9.º
Procedimentos
1 - Os procedimentos com vista à celebração de contratos são abertos pelo Diretor-geral da Administração Escolar no mês de fevereiro do ano letivo anterior àquele no qual se inicia a vigência dos contratos, mediante aviso de abertura publicado na página eletrónica da DGAE.
2 - O aviso de abertura dos procedimentos fixa as condições e os termos em que podem ser apresentadas as candidaturas, contendo, obrigatoriamente:
a) Os prazos para o procedimento;
b) O número de vagas para alunos ou turmas postas a concurso;
c) Os ciclos de ensino abrangidos, com a correspondência com o número de turmas postas a concurso;
d) A área geográfica de implantação da oferta;
e) A duração do contrato;
f) Os critérios e subcritérios de seleção das candidaturas e as correspondentes ponderações.
3 - Os critérios referidos na alínea f) do número anterior são os seguintes:
a) Os resultados escolares dos alunos, com ênfase para os resultados obtidos nas provas e exames nacionais;
b) O projeto de intervenção para os alunos e turmas a concurso, com realce para os objetivos definidos para a promoção do sucesso, a prevenção e combate ao insucesso e abandono e a melhoria dos resultados escolares;
c) Estabilidade do corpo docente do estabelecimento de ensino;
d) A qualidade das instalações e equipamentos.
4 - As candidaturas são dirigidas ao Diretor-geral da DGAE através de formulário próprio disponibilizado pela DGAE.
5 - As listas referidas nas alíneas e) e f) do n.º 1 do artigo 7.º são divulgadas até ao final do mês de maio, na página eletrónica da DGAE.
6 - À extensão dos contratos existentes a um novo ciclo de ensino, aplicam-se os procedimentos previstos no presente artigo.»

Sublinhando-se que, nos termos do n.º 2 deste artigo, o aviso de abertura dos procedimentos, fixando as condições e os termos em que podem ser apresentadas as candidaturas, contém, obrigatoriamente, a área geográfica de implantação da oferta [alínea d)].

Ora, in casu, no «Aviso de abertura ao regime de acesso ao apoio financeiro a conceder em 2015/2016, no âmbito do contrato de associação», mencionado na supramencionada exposição, consignou-se, designadamente, o seguinte:

«Por despacho de Sua Excelência o Secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar, proferido em 15.06.2015, nos termos do número 1 do artigo 5.º da Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho, foi autorizada a abertura do concurso de atribuição de apoio financeiro do Estado destinado à seleção das entidades proprietárias dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo que, no âmbito do Decreto-lei n.º 152/2013, de 4 de novembro, que aprovou o Estatuto do Ensino Particular é Cooperativo (EEPC), reúnem as condições e requisitos necessários à celebração de contratos de associação para os anos letivos 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018, tal como consignado no n.º 1 do art.º 3.º da Portaria n.º 172-A/2015 e anos subsequentes nos termos do número 2 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro.»

Mais se havendo consignado que as áreas geográficas identificadas no seu anexo I foram definidas «através da divisão territorial da freguesia» e que consta desse anexo «a definição das áreas geográficas, o número de turmas a concurso e os correspondentes ciclos de ensino», mais nele se indicando ser um dos requisitos de admissão das candidaturas que os seus estabelecimentos «se localizem nas áreas geográficas das turmas a que concorrem, identificadas no anexo I»[23].

Neste «Anexo I – Áreas geográficas de implantação da oferta, número de turmas colocadas em concurso, ciclos de ensino e anos de escolaridade abrangidos» indicam-se as «áreas geográficas de implantação da oferta» e o «número de turmas em concurso por ciclo de ensino e ano de escolaridade», sendo este item (número de turmas) integrado por três colunas, das quais uma se reporta ao 2.º ciclo – 5.º ano, outra se reporta ao 3.º ciclo – 7.º ano e a terceira se reporta ao ensino secundário - 10.º ano, sendo inscritos em cada coluna os números de turma correspondentes a cada área geográfica.

Mais se estabelecendo, designadamente, na Portaria n.º 172 -A/2015 que, no final do contrato de associação, os seus efeitos se mantêm «até à conclusão do correspondente ciclo de ensino» (artigo 13.º, n.º 2) e que «o pagamento do apoio fica sujeito à verificação da manutenção dos requisitos necessários à sua atribuição, definidos no EEPC e na presente portaria» (artigo 17.º, n.º 2), sendo a minuta do contrato de associação publicada no seu anexo I (artigo 20.º).

E, devendo, como se viu, os contratos de associação respeitar aquela minuta (artigo 10.º, n.º 8, alínea b), do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior), ocorre que as cláusulas 1.ª e 2.ª desta minuta são do seguinte teor:

«Cláusula 1.ª
Objeto
1 - O presente Contrato de Associação tem por objeto a concessão, pelo PRIMEIRO OUTORGANTE[24] ao SEGUNDO OUTORGANTE, do apoio financeiro necessário à constituição de (indicar o número de turmas) turmas, do (indicar o nível de ensino) a funcionarem no (indicar o nome do estabelecimento), nos anos letivos (indicar os três anos letivos a que respeitam o contrato), nas mesmas condições de gratuitidade do ensino público.
2 - O apoio a conceder durante a execução do contrato é atribuído ao número de turmas que efetivamente venham a ser constituídas e validadas, em cada ano letivo.»

«Cláusula 2.ª
Obrigações do PRIMEIRO OUTORGANTE
1 - São obrigações do PRIMEIRO OUTORGANTE:
a) Proceder à análise dos elementos necessários à organização dos processos de concessão do apoio financeiro decorrente do presente contrato;
b) Desencadear os mecanismos correspondentes à execução do contrato de financiamento por parte do Estado;
c) Pagar ao segundo outorgante, através de transferência bancária o apoio financeiro contratado por este instrumento, no valor de € *(indicar o valor – numeral e por extenso)* em prestações mensais, correspondente a *(indicar o número)* turmas, relativo ao período de *(indicar a data de início)* a *(indicar a data de fim)* para o número de identificação bancária (NIB) indicado pelo SEGUNDO OUTORGANTE;
d) Solicitar a intervenção da Inspeção-Geral da Educação e Ciência ou de outros serviços e órgãos de controlo, para que, no uso das atribuições e competências que lhe são legalmente cometidas, proceda à fiscalização do cumprimento dos termos do presente contrato, sempre que tal se afigure necessário.
2 - Nos termos do n.º 2 do artigo 17.º do EEPC, o PRIMEIRO OUTORGANTE garante a manutenção do contrato até à conclusão do ciclo de ensino das turmas por ele abrangido.»

3. Os contratos de associação celebrados entre o Estado Português, através da Direção-Geral da Administração Escolar (DGAE) e as entidades titulares de estabelecimentos do ensino particular e cooperativo de nível não superior revestem a natureza de contratos administrativos.

Tal como referem Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos[25]:

«O contrato administrativo é um acordo de vontades que visa a produção de efeitos sobre uma relação jurídica administrativa».
«A articulação entre a noção de contrato administrativo implícita no CCP e as diversas alíneas do art. 1.º, 6, do CCP[26] segue (…) o modelo de cláusula geral com exemplos padrão, em que estes contribuem para a interpretação da primeira e são por ela simultaneamente esclarecidos e limitados. Pode haver contratos administrativos não previstos em qualquer das alíneas do art. 1.º, 6 CCP, bastando para isso que eles visem produzir efeitos sobre relações jurídicas administrativas.»

Autores que elencam entre os contratos administrativos do direito administrativo especial e na área dos contratos administrativos no âmbito do direito da educação, os contratos de associação celebrados entre o Estado e as escolas particulares e cooperativas[27].

E, no sentido de que estamos em presença de contratos administrativos de colaboração se pronunciam, designadamente, José Manuel Sérvulo Correia[28], Pedro Costa Gonçalves[29], Maria João Estorninho e Alexandra Leitão[30], bem como João Carlos Loureiro[31].

Ora, tal como acentuam Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos[32], «só a interpretação jurisdicional dos contratos administrativos é dotada de força vinculativa, estando a administração impedida de praticar atos administrativos na matéria em causa, sob pena de usurpação de poder (art. 307.°, 1 CCP)».

De facto a regra estabelecida no artigo 307.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos, que tem por epígrafe Natureza das declarações do contraente público, é a de que «as declarações do contraente público sobre interpretação e validade do contrato ou sobre a sua execução são meras declarações negociais».

Expendendo Pedro Costa Gonçalves[33], a este propósito, o seguinte:

«A regra é a de que as declarações do contraente público são “meras declarações negociais”. Regra essa que não conhece qualquer exceção relativamente às declarações sobre a interpretação e a validade do contrato».

E, já em 1987, José Manuel Sérvulo Correia[34] salientava o seguinte:

«Tanto o poder de fixar com obrigatoriedade o sentido do contrato como o de declarar com força obrigatória a sua validade ou invalidade integram-se materialmente no exercício da função jurisdicional que a presente Constituição reserva aos tribunais».

4. Pela Resolução n.º 26/2016 - Racionalização dos contratos de associação com o ensino privado e cooperativo onde existe oferta pública, aprovada em 22 de janeiro de 2016[35], a Assembleia da República resolveu recomendar ao Governo que:

«1 - Promova e divulgue um relatório sobre os atuais contratos de associação, os seus fundamentos, as verdadeiras carências de cobertura territorial e as necessidades educativas da escola pública.
2 - De acordo com o princípio da complementaridade e com a exigência constitucional de criação de uma «rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população», redimensione a rede de ensino particular e cooperativo financiada pelo Estado.
3 - Sem prejuízo dos compromissos contratuais assumidos pelo Estado e da necessária preservação da estabilidade das escolas, restrinja a existência de contratos de associação em zonas em que exista oferta e capacidade instalada não utilizada nas escolas públicas, procedendo às alterações legislativas necessárias neste âmbito.»

V

Enunciado que foi o enquadramento jurídico (constitucional e infraconstitucional) essencialmente relevante para a dilucidação da matéria em apreciação, cumpre tomar posição sobre as questões formuladas.

É o que se passará a fazer.

1. Questão de saber se o objeto dos novos contratos de associação celebrados em 2015 compreende o direito dos estabelecimentos do ensino particular e cooperativo de iniciar novos ciclos de ensino (5.º, 7.º e 10.º anos de escolaridade), em todos e cada ano letivo de duração do contrato, podendo constituir para o efeito outras tantas turmas que irão cumular com as turmas constituídas no(s) ano(s) anterior(es) ou, diversamente, apenas compreende as turmas de início de ciclo no primeiro ano contratual e as respetivas turmas de continuidade nos dois remanescentes anos de duração do contrato (2015/2018).

Nos termos do artigo 236.º do Código Civil:

«1. A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.
2. Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida.»

Acentuando António Menezes Cordeiro[36] o seguinte:

«A primeira diretriz legal apela para a denominada impressão do declaratário.»
«Em termos práticos, quem invoque um negócio e apresente o seu texto, faz o essencial. Caberá à outra parte, quando não aceite a mera letra, explicar-se e levar ao processo elementos que a contradigam.»
Sendo regra «a da validação da interpretação mais direta, perante fórmulas muito claras e evidentes.»
«O artigo 236.°/1 foi implacável, na via objetiva: validou, ad nutum, o sentido que, à declaração, daria o declaratário (com um perfil normativamente fixado), no âmbito do seu horizonte», não havendo «jurisprudência ilustrativa de situações em que o sentido acolhido pelo declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, não possa ser imputado, razoavelmente, ao declarante.»

Ora, in casu e tal como se consignou na exposição que acompanhou o pedido, no contrato que nela se mencionou exemplificativamente [37], «o pagamento assumido na cláusula 2.ª, n.º 1, alínea c) de €4.105.500, dividido pelo valor/turma, estabelecido no art.º 16., n.º 1 da Portaria 172-A/2015 de € 80.500, perfaz exatamente o valor de 51 turmas».

Exposição em que se reconheceu que «isto parece significar que, encontrando-se contratualizado o máximo de 17 turmas para o ano letivo inicial de 2015/2016 (7+7+3), o valor em causa de € 4.105.500 garante cabalmente o financiamento do máximo das mesmas 17 turmas em cada ano de vigência do contrato de associação, pois a soma de 17 turmas por cada ano letivo perfaz 51 turmas».
Nela também se consignando que «concluído o procedimento, para o ano letivo de 2015/2016 foram validadas, pela Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares, 637 turmas de 5.º, 7.º e 10.º anos, o que, a multiplicar pelos três anos de prazo contratual, permite concluir por um máximo de 1911 turmas».

E, como se viu, o número de turmas colocadas a concurso foi-o, em cada área geográfica, por ciclo de ensino e ano de escolaridade, sendo contemplados o 2.º ciclo e o 3.º ciclo do ensino básico e o ensino secundário.
Ocorrendo que, quer o 3.º ciclo do ensino básico, quer o ensino secundário, têm a duração de três anos, mas o 2.º ciclo do ensino básico tem a duração de apenas dois anos (5.º e 6.º anos de escolaridade)[38].
Assim, sendo os contratos trienais, o 3.º ciclo do ensino básico e o ensino secundário ajustam-se perfeitamente ao período de vigência dos contratos, sendo certo que, de acordo com o n.º 2 da cláusula 2.ª dos contratos, «nos termos do n.º 2 do artigo 17.º do EEPC, o PRIMEIRO OUTORGANTE garante a manutenção do contrato até à conclusão do ciclo de ensino das turmas por ele abrangido.».

Mas tal já não sucede relativamente ao 2.º ciclo do ensino básico, dado que, no ano letivo de 2017/2018, ainda abrangido pelos contratos, terá de iniciar-se novamente o 5.º ano de escolaridade.

Ora, tendo sido fixados, no aviso de abertura do concurso, idênticos números de turmas para os três anos letivos abrangidos e reportando-se o apoio financeiro ao período entre 1 de setembro de 2015 e 31 de agosto de 2018, sendo nos contratos de associação contemplado o pagamento do financiamento de turmas do 2.º ciclo do ensino básico durante o ano letivo de 2017/2018, ter-se-á de concluir que, em tais contratos, se contempla o funcionamento de turmas do 5.º ano de escolaridade (primeiro dos dois anos que integram o 2.º ciclo do ensino básico) nesse ano letivo.
Sendo certo que, nos termos do artigo 13.º, n.º 2, da Portaria n.º 172 -A/2015, «no final do contrato, os seus efeitos mantêm-se até à conclusão do correspondente ciclo de ensino».

Não se contemplando em tais contratos, no que ao 3.º ciclo do ensino básico e ao ensino secundário concerne, o direito de os estabelecimentos de ensino particular e cooperativo iniciarem novos ciclos de ensino - 7.º e 10.º anos de escolaridade.


2. Questão de saber se os artigos 10.º, n.º 6 e 16.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, bem como os artigos 3.º, n.º 1, e 9.º, n.º 3, da Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho, ao não condicionarem a celebração dos contratos de associação à verificação de carência de rede pública escolar na respetiva área geográfica conflituam com o preceituado no artigo 8.º, n.º 2, alínea a), n.os 3 e 4 da Lei n.º 9/79, de 19 de março - Bases do ensino particular e cooperativo[39], sendo ilegais, por violação de lei de valor reforçado, nos termos do artigo 112.º, n.os 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa.

Como se viu, nos termos do artigo 6.º, n.º 2, alínea d), da Lei n.º 9/79, é atribuição do Estado «conceder subsídios e celebrar contratos para o funcionamento de escolas particulares e cooperativas, de forma a garantir progressivamente a igualdade de condições de frequência com o ensino público nos níveis gratuitos e a atenuar as desigualdades existentes nos níveis não gratuitos».
E, para efeitos do disposto neste artigo 6.º, o Estado celebra contratos e concede subsídios a escolas particulares e cooperativas, celebrando, designadamente, contratos não só «com estabelecimentos que, integrando-se nos objetivos e planos do Sistema Nacional de Educação e sem prejuízo da respetiva autonomia institucional e administrativa, se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar», mas também «com estabelecimentos que obedeçam aos requisitos anteriores mas que se encontrem localizados em áreas suficientemente equipadas de estabelecimentos públicos» (artigo 8.º, n.º 2, alíneas a) e b), respetivamente, da Lei n.º 9/79), sendo concedida prioridade à celebração de contratos e atribuição de subsídios aos estabelecimentos que se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar (n.º 3 do mesmo artigo).

Ser concedida prioridade é, pois, o que se estabelece na Lei n.º 9/79, sendo certo que no artigo 14.º, n.º 1, Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro (anterior Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo) é que se estabelecia que «os contratos de associação são celebrados com escolas particulares situadas em zonas carecidas de escolas públicas».

Sendo certo que, como se viu, nos termos do artigo 164.º, alínea i), da Constituição da República Portuguesa, integra-se na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República legislar sobre as bases do sistema de ensino, sendo as leis de bases leis de valor reforçado (artigo 212.º, n.os 2 e 3, da Constituição).
E, nos termos do artigo 198.º da Constituição, no exercício de funções legislativas, compete, designadamente, ao Governo fazer decretos-leis de desenvolvimento dos princípios ou das bases gerais dos regimes jurídicos contidos em leis que a eles se circunscrevam [n.º 1, alínea c)], devendo estes decretos-leis de desenvolvimento invocar expressamente a lei de bases ao abrigo da qual são aprovados (n.º 3).
Foi o que o Governo fez ao editar o Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro, invocando expressamente que o fazia no desenvolvimento do disposto no artigo 17.º da Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo, aprovada pela Lei n.º 9/79, de 19 de março, no qual se prescrevera, designadamente, «dever o Governo publicar, por decreto-lei, o Estatuto dos Ensinos Particular e Cooperativo, de acordo com os princípios estabelecidos nesta lei».
E não poderia o Governo, em tal decreto-lei de desenvolvimento, pôr em causa o disposto na Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo.

Ora, estabelecendo-se no artigo 6.º, alínea i), do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior que compete ao Ministério da Educação e Ciência «permitir o acesso das famílias às escolas particulares e cooperativas, através da celebração de contratos e da concessão de apoios financeiros, bem como zelar pela sua correta aplicação, permitindo progressivamente o acesso às escolas particulares em condições idênticas às das escolas públicas», ocorre que, como se viu, nos termos do artigo 6.º, n.º 2, alínea d), da Lei n.º 9/79, é atribuição do Estado «conceder subsídios e celebrar contratos para o funcionamento de escolas particulares e cooperativas, de forma a garantir progressivamente a igualdade de condições de frequência com o ensino público nos níveis gratuitos e a atenuar as desigualdades existentes nos níveis não gratuitos.»

E já se sublinhou que no n.º 4 do artigo 10.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior, que tem por epígrafe Princípios da contratação, se estabelece que, na celebração dos contratos, o Estado deve ter em conta as necessidades existentes.

Por seu turno, a Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho, limitou-se a fixar as regras e procedimentos aplicáveis à atribuição de apoio financeiro pelo Estado estabelecimentos de ensino particular e cooperativo de nível não superior, previstos na alínea c) (contratos de associação) do n.º 1 do artigo 9.º do mesmo Estatuto e, consoante já se sublinhou, nos termos do n.º 2 do artigo 9.º dessa Portaria, o aviso de abertura dos procedimentos, fixando as condições e os termos em que podem ser apresentadas as candidaturas, contém, obrigatoriamente, «a área geográfica de implantação da oferta» [alínea d)], mais contendo, também obrigatoriamente, «o número de vagas para alunos ou turmas postas a concurso» [alínea b)] e «os ciclos de ensino abrangidos, com a correspondência com o número de turmas postas a concurso» [alínea c)].

Sendo na opção pelo número de turmas postas a concurso e pelos ciclos de ensino abrangidos, nas áreas geográficas que forem indicadas, que se coloca a questão de ter em conta as necessidades existentes.

Assim sendo, nem o Decreto-Lei n.º 152/2013, nem a Portaria n.º 172-A/2015, ostentam incompatibilidade com a Lei n.º 9/79, devendo ser aplicados em conformidade com o nela estabelecido e tendo especialmente em consideração o disposto nos seus artigos 6.º e 8.º.

VI

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1.ª Os contratos de associação celebrados entre o Estado Português, através da Direção-Geral da Administração Escolar e as entidades titulares de estabelecimentos do ensino particular e cooperativo de nível não superior revestem a natureza de contratos administrativos.

2.ª A Administração não detém o poder de fixar com obrigatoriedade o sentido dos contratos administrativos, sendo as declarações do contraente público sobre a interpretação destes contratos meras declarações negociais – Cfr. artigo 307.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos.

3.ª Estando em causa a celebração de contratos de associação para os anos letivos de 2015/2016, de 2016/2017 e de 2017/2018 precedida de procedimento concursal em que o número de turmas colocadas a concurso o foi, em cada área geográfica, por ciclo de ensino e ano de escolaridade, sendo contemplados o 2.º ciclo e o 3.º ciclo do ensino básico e o ensino secundário, ocorre que, quer o 3.º ciclo do ensino básico, quer o ensino secundário, têm a duração de três anos, mas o 2.º ciclo do ensino básico tem a duração de apenas dois anos (5.º e 6.º anos de escolaridade).

4.ª Assim, sendo os contratos trienais, o 3.º ciclo do ensino básico e o ensino secundário ajustam-se perfeitamente ao período de vigência dos contratos, sendo certo que, de acordo com o n.º 2 da cláusula 2.ª dos contratos, «nos termos do n.º 2 do artigo 17.º do EEPC, o PRIMEIRO OUTORGANTE garante a manutenção do contrato até à conclusão do ciclo de ensino das turmas por ele abrangido.».

5.ª Mas tal já não sucede relativamente ao 2.º ciclo do ensino básico, dado que, no ano letivo de 2017/2018, ainda abrangido pelos contratos, terá de iniciar-se novamente o 5.º ano de escolaridade.
.
6.ª Ora, tendo sido fixados, no aviso de abertura do concurso, idênticos números de turmas para os três anos letivos abrangidos e reportando-se o apoio financeiro ao período compreendido entre 1 de setembro de 2015 e 31 de agosto de 2018, sendo nos contratos de associação contemplado o pagamento do financiamento de turmas do 2.º ciclo do ensino básico durante o ano letivo de 2017/2018, ter-se-á de concluir que, em tais contratos, se contempla o funcionamento de turmas do 5.º ano de escolaridade (primeiro do dois anos que integram o 2.º ciclo do ensino básico) nesse ano letivo, sendo certo que, nos termos do artigo 13.º, n.º 2, da Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho, «no final do contrato, os seus efeitos mantêm-se até à conclusão do correspondente ciclo de ensino».

7.º Não se contemplando em tais contratos, no que ao 3.º ciclo do ensino básico e ao ensino secundário concerne, o direito de os estabelecimentos de ensino particular e cooperativo iniciarem novos ciclos de ensino - 7.º e 10.º anos de escolaridade.

8.ª Nos termos do artigo 164.º, alínea i), da Constituição da República Portuguesa, integra-se na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República legislar sobre as bases gerais de ensino, sendo as leis de bases leis de valor reforçado (artigo 212.º, n.os 2 e 3, da Constituição).

9.ª E, nos termos do artigo 198.º da Constituição, no exercício de funções legislativas, compete, designadamente, ao Governo fazer decretos-leis de desenvolvimento dos princípios ou das bases gerais dos regimes jurídicos contidos em leis que a eles se circunscrevam [n.º 1, alínea c)], devendo estes decretos-leis de desenvolvimento invocar expressamente a lei de bases ao abrigo da qual são aprovados (n.º 3).

10.ª Foi o que o Governo fez ao editar o Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro, que aprovou o Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior invocando expressamente que o fazia no desenvolvimento do disposto no artigo 17.º da Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo, aprovada pela Lei n.º 9/79, de 19 de março, no qual se prescrevera, designadamente, «dever o Governo publicar, por decreto-lei, o Estatuto dos Ensinos Particular e Cooperativo, de acordo com os princípios estabelecidos nesta lei».

11.ª E não poderia o Governo, em tal decreto-lei de desenvolvimento, pôr em causa o disposto na Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo.

12.ª Ora, estabelecendo-se no artigo 6.º, alínea i), do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior que compete ao Ministério da Educação e Ciência «permitir o acesso das famílias às escolas particulares e cooperativas, através da celebração de contratos e da concessão de apoios financeiros, bem como zelar pela sua correta aplicação, permitindo progressivamente o acesso às escolas particulares em condições idênticas às das escolas públicas», ocorre que, nos termos do artigo 6.º, n.º 2, alínea d), da Lei n.º 9/79, é atribuição do Estado «conceder subsídios e celebrar contratos para o funcionamento de escolas particulares e cooperativas, de forma a garantir progressivamente a igualdade de condições de frequência com o ensino público nos níveis gratuitos e a atenuar as desigualdades existentes nos níveis não gratuitos.»

13.ª E, para efeitos do disposto no artigo 6.º da Lei n.º 9/79, o Estado celebra contratos e concede subsídios a escolas particulares e cooperativas, celebrando, designadamente, contratos não só «com estabelecimentos que, integrando-se nos objetivos e planos do Sistema Nacional de Educação e sem prejuízo da respetiva autonomia institucional e administrativa, se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar», mas também «com estabelecimentos que obedeçam aos requisitos anteriores mas que se encontrem localizados em áreas suficientemente equipadas de estabelecimentos públicos» (artigo 8.º, n.º 2, alíneas a) e b), respetivamente, da Lei n.º 9/79), sendo concedida prioridade à celebração de contratos e atribuição de subsídios aos estabelecimentos que se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar (n.º 3 do mesmo artigo).

14.ª Ser concedida prioridade é, pois, o que se estabelece na Lei n.º 9/79, sendo certo que no artigo 14.º, n.º 1, Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro (anterior Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo) é que se estabelecia que «os contratos de associação são celebrados com escolas particulares situadas em zonas carecidas de escolas públicas».
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15.ª Sendo certo que no n.º 4 do artigo 10.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior, que tem por epígrafe Princípios da contratação, se estabelece que, na celebração dos contratos, o Estado deve ter em conta as necessidades existentes.

16.ª Por seu turno, a Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho, limitou-se a fixar as regras e procedimentos aplicáveis à atribuição de apoio financeiro pelo Estado a estabelecimentos de ensino particular e cooperativo de nível não superior, previstos na alínea c) (contratos de associação) do n.º 1 do artigo 9.º do mesmo Estatuto e, nos termos do n.º 2 do artigo 9.º dessa Portaria, o aviso de abertura dos procedimentos, fixando as condições e os termos em que podem ser apresentadas as candidaturas, contém, obrigatoriamente, «a área geográfica de implantação da oferta» [alínea d)], mais contendo, também obrigatoriamente, «o número de vagas para alunos ou turmas postas a concurso» [alínea b)] e «os ciclos de ensino abrangidos, com a correspondência com o número de turmas postas a concurso» [alínea c)].

17.ª Sendo na opção pelo número de turmas postas a concurso e pelos ciclos de ensino abrangidos, nas áreas geográficas que forem indicadas, que se coloca a questão de ter em conta as necessidades existentes.

18.ª Assim sendo, nem o Decreto-Lei n.º 152/2013, nem a Portaria n.º 172-A/2015, ostentam incompatibilidade com a Lei n.º 9/79, devendo ser aplicados em conformidade com o nela estabelecido e tendo especialmente em consideração o disposto nos seus artigos 6.º e 8.º.



ESTE PARECER FOI VOTADO NA SESSÃO DO CONSELHO CONSULTIVO DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA, DE 25 DE MAIO DE 2016.


Maria Joana Raposo Marques Vidal – Luís Armando Bilro Verão (Relator) – Eduardo André Folque da Costa Ferreira – Maria de Fátima da Graça Carvalho (Com declaração de voto anexo) – Fernando Bento – Maria Manuela Flores Ferreira (Com voto de vencida anexo) – Paulo Joaquim da Mota Osório Dá Mesquita.


(Maria de Fátima da Graça Carvalho)

DECLARAÇÃO DE VOTO

Votei o parecer, mas relevaria ainda, no âmbito da 14.ª conclusão, a norma do no n.º 4 do artigo 8.º da Lei de bases do ensino particular e cooperativo (Lei n.º 9/79), nos termos da qual, a garantia dada quanto a uma igualdade de condições no que se refere a despesas com propinas e matrículas reporta-se às situações previstas na alínea a) do n.º 2 do mesmo artigo, ou seja, a contratos celebrados com estabelecimentos situados em áreas carenciadas de rede pública escolar.
Conjugando esta norma com as normas do Estatuto do ensino particular e cooperativo de nível não superior, aprovado pelo Decreto-lei n.º 152/2013, designadamente, o artigo 10.º, n.º 6, e o artigo 16.º, n.º 1 e 2 (donde resulta que os contratos de associação – um dos tipos contratuais pelo qual se concretiza o apoio do Estado ao ensino particular – se destinam “à criação da oferta pública de ensino” e se baseiam na frequência das escolas o ensino particular e cooperativo em “condições idênticas” às do ensino ministrado nas escolas públicas), afigura-se-me admissível a interpretação segundo a qual a celebração destes contratos específicos constitui cumprimento da garantia assumida no citado n.º 4 do artigo 8.º, tendo assim em vista os estabelecimentos situados em áreas carenciadas.

Maria Manuela Flores Ferreira – votei vencida nos termos e pelas razões que a a seguir sinteticamente se expõem[40].

1. Quanto à 1.ª questão colocada, não se aceita, como se conclui na 6.ª conclusão, que os contratos celebrados para o período compreendido entre 1 de setembro de 2015 e 31 de agosto de 2018 contemplem o funcionamento de turmas do 5.º ano de escolaridade no ano letivo de 2017/2018.

Como, aliás, não se aceita que aqueles contratos incluam qualquer início de ciclo de ensino para além do ano de início de vigência dos contratos.

Com efeito, para além do mais, afigura-se-nos decisivo que se tenha estabelecido a duração dos contratos por três anos letivos.

E tal deve-se obviamente ao desiderato legal de que se completem os ciclos de ensino.

Ora, se se permitisse que ao abrigo dos contratos em questão se iniciassem novos ciclos nos anos letivos de 2016/2017 e 2017/2018, o prazo de duração estabelecido nos contratos não seria respeitado, e, consequentemente, o número de turmas a considerar seria muito diferente do colocado a concurso.

Mas atentemos nas seguintes cláusulas de um dos contratos celebrados[41]:

«Cláusula 1.ª

Objeto

1 – O presente Contrato de Associação tem por objeto a concessão, pelo PRIMEIRO OUTORGANTE ao SEGUNDO OUTORGANTE, do apoio financeiro necessário à constituição do número máximo de 51 (cinquenta e um) turmas, do 2.º CEB, 3.º CEB e Ensino Secundário, a funcionarem no […], nos anos letivos de 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018 nas mesmas condições de gratuitidade do ensino público.
2 – O apoio a conceder durante a execução do contrato é atribuído ao número de turmas que efetivamente venham a ser constituídas e validadas, em cada ano letivo.»

«Cláusula 10.ª

Produção de efeitos

Este contrato produz efeitos de 1 de setembro de 2015 a 31 de agosto de 2018.»

Temos, pois, que do contrato não resulta um número fixo de turmas a financiar, já que apenas se estabelece um teto (cfr. n.º 1 da Cláusula 1.ª), e isto, porventura, porque, de acordo com o n.º 2 da cláusula 1.ª, «[o] apoio a conceder durante a execução do contrato é atribuído ao número de turmas que efetivamente venham a ser constituídas e validadas, em cada ano letivo».

Mas já quanto à duração dos contratos resulta claramente que o apoio financeiro visa os anos letivos de 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018, produzindo os contratos efeitos desde 1 de setembro de 2015 a 31 de agosto de 2018.

Destarte, entendemos que a vigência para além daquele período temporal está vedada nos contratos celebrados[42].

Aliás, relativamente à hipótese considerada na 6.ª conclusão do parecer – turmas de início do 2.º ciclo do ensino básico no ano letivo de 2017/2018 –, é matéria que só pode ser devidamente apreciada em 2017[43].

E frisa-se, de novo, a duração dos contratos permitirá a conclusão dos ciclos de ensino iniciados.


2. No que concerne à questão da celebração dos contratos de associação estar dependente da “verificação de carência de rede pública escolar”, não nos merece também concordância a interpretação que resultará do parecer no sentido de que podem ser celebrados contratos de associação em áreas carenciadas de rede pública escolar e bem assim em áreas suficientemente equipadas de rede pública escolar, apenas se estabelecendo prioridade quanto à celebração de contratos com estabelecimentos localizados em áreas carenciadas.

Não pode, desde logo, deixar-se de observar que a ser assim, então, o anterior Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo (Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro) violava a Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo (Lei n.º 9/79, de 19 de março), quando estabelecia no n.º 1 do artigo 14.º que «[o]s contratos de associação são celebrados com escolas particulares situadas em zonas carecidas de escolas públicas, […]».

Ora, afigura-se-nos que tal não se verificava e, aliás, nunca tal questão foi colocada, que saibamos, ao Tribunal Constitucional.

Por outro lado, aceitando tratar-se tão-somente de uma questão de prioridade[44] haveria que proceder-se à densificação dessa aceção.

Mas atentemos no atual Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro, que à semelhança do que fazia o Decreto-Lei n.º 553/80, invoca no seu preâmbulo o desenvolvimento do disposto no artigo 17.º[45] da Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo[46].

E, com efeito, no Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior, doravante Estatuto, em vigor, não se faz referência à verificação de carência de rede pública.

De todo o modo, e independentemente das considerações tecidas sobre a emissão do Decreto-Lei n.º 152/2013, apresentando-se este como desenvolvimento da Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo, não pode violar o estatuído nesta Lei, como, aliás, se consigna no Parecer.

A Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo consagra, em geral, diversas formas de apoio às escolas particulares e cooperativas, na alínea d) do n.º 2 do artigo 6.º, estabelecendo, depois, no artigo 8.º, uma tipologia das modalidades de contratos com uma determinada gradação.

Assim, estatui-se prioridade à celebração de contratos e atribuição de subsídios aos estabelecimentos que se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar e a jardins de infância e a escolas de ensino especial, nomeadamente em áreas geográficas carenciadas [cfr. n.os 2, alínea a), e 3 do artigo 8.º].

E aos alunos de qualquer nível ou ramo de ensino que frequentem as escolas localizadas em áreas carenciadas é garantida a igualdade com os alunos do ensino oficial no que se refere a despesas com propinas e matrículas (cfr. n.º 4 do artigo 8.º).

Ora, são estes contratos, que nos diplomas que desenvolvem a Lei de Bases, designadamente, no que agora interessa, elencando e regulando os diversos tipos de contratos, surgem como contratos de associação.

Destarte, contratos que devem ser celebrados com escolas localizadas em áreas carenciadas de rede pública escolar.

Dir-se-á que a alínea b) do n.º 2 do artigo 8.º da Lei de Bases faz referência a contratos com estabelecimentos localizados em áreas suficientemente equipadas de estabelecimentos públicos.

Porém, há aqui que considerar que o Estado pode celebrar diversos tipos de contratos, não se dispondo de nenhum elemento interpretativo que permita apoiar a celebração de contratos de associação na norma constante daquela alínea b) do n.º 2 do artigo 8.º

Como vimos, no domínio do Decreto-Lei n.º 553/80 referia-se expressamente que os contratos de associação eram celebrados com escolas particulares situadas em zonas carecidas de escolas públicas.

Ora, o atual Estatuto, conquanto não faça essa referência expressa, refere-se aos contratos de associação como os contratos destinados à criação da oferta pública de ensino (cfr. n.º 6 do artigo 10.º), explicitando mesmo no n.º 2 do artigo 16.º que «[o]s contratos de associação são celebrados com escolas particulares ou cooperativas, com vista à criação de oferta pública de ensino, ficando estes estabelecimentos de ensino obrigados a aceitar a matrícula de todos os alunos até ao limite da sua lotação, seguindo as prioridades idênticas as estabelecidas para as escolas públicas».

Estamos, pois, no campo de aplicação do estatuído nos n.os 2, alínea a), e 4 do artigo 8.º da Lei de Bases que tem de ser respeitado.

A interpretação do Estatuto em conformidade com a Lei de Bases conduz-nos, consequentemente, a que os contratos de associação só podem ser celebrados com estabelecimentos que se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar.

A razão de ser dos apoios financeiros do Estado através da celebração de contratos de associação é justamente a criação de oferta pública e não apoiar as escolas particulares ou cooperativas enquanto tal.

Aliás, o entendimento de que seria permitida a celebração de contratos de associação em áreas suficientemente equipadas de estabelecimentos públicos colocaria, além do mais, em causa o princípio da concorrência, princípio mencionado no artigo 10.º do Estatuto, atinente aos princípios da contratação[47].

Com efeito, não se vislumbra qualquer fundamento para em zonas em que não haja insuficiência da oferta pública de ensino o Estado financiar na totalidade turmas em algumas escolas em detrimento das restantes escolas particulares ou cooperativas.

É certo que o Estado pode apoiar escolas particulares ou cooperativas em áreas em que não haja carência da rede pública escolar, mas são outros tipos de apoio que não os realizados mediante os contratos de associação, conforme já se referiu[48].

E, não será despiciendo recordar aqui os dizeres de Gomes Canotilho/Vital Moreira, em anotação ao artigo 43.º da Constituição[49]: «[o] direito de criação de escolas particulares ou cooperativas não engloba um direito ao apoio estadual, o qual, sendo concedido, não poder ser discriminatório».

Regressando aos contratos de associação, o Estatuto tem, pois, de ser interpretado nesta matéria em conformidade com o estabelecido na Lei de Bases e, naturalmente, com o consagrado na Constituição[50].

Assim, em suma, entendo que tal implica que o Estado só pode celebrar contratos de associação com escolas particulares ou cooperativas que se localizem em áreas carenciadas de estabelecimentos públicos de ensino.







[1] Ter-se-á querido aludir à Portaria n.º 483/2015, de 15 de junho, publicada no Diário da República, 2.ª série, n.º 119, de 22 de junho de 2015.

[2] O artigo 34.º da Lei Constitucional n.º 1/82, de 30 de setembro aditou o atual n.º 4 ao artigo 43.º da Constituição.
[3] A redação introduzida pelo artigo 62.º da Lei Constitucional n.º 1/82, de 30 de setembro, era a seguinte:
«ARTIGO 75.º
(Ensino público, particular e cooperativo)
1. O Estado criará uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população.
2. O Estado fiscaliza o ensino particular e cooperativo.»
[4] O artigo 44.º da Lei Constitucional n.º 1/89, de 8 de julho, veio substituir o n.º 2 do artigo 75.º da Constituição.

[5] Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2010, pág. 1421.
[6] Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, 4.ª edição revista, 2007, Coimbra Editora, pág. 904.
[7] “O Papel do Ensino Privado na Atual Constituição Portuguesa”, em Temas de Direito da Educação, Almedina, Coimbra, 2006, páginas 23 e 24.
[8] Manual de Direito Constitucional, Volume III, Tomo V, Coimbra Editora, 2014, páginas 379 e seguintes.
[9] In Diário da República, 1.ª série, n.º 104, de 5 de maio de 1984.
[10] Tratava-se, então, da norma do n.º 2 do artigo 115.º da Constituição, em que já dispunha que «as leis e os decretos-leis têm igual valor, sem prejuízo da subordinação às correspondentes leis dos decretos-leis publicados no uso de autorização legislativa e dos que desenvolvam as bases gerais dos regimes jurídicos».

[11] Lei n.º 46/86, de 14 de outubro, alterada pelas Leis n.os 115/97, de 19 de setembro, 49/2005, de 30 de agosto, que procedeu à sua republicação e renumeração e 85/2009, de 27 de agosto.

[12] Alterada pela Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto.
Teve origem no projeto de lei n.º 108/I, apresentado pelo Partido Socialista, que, tendo sido aprovado na generalidade em Reunião Plenária da Assembleia da República de 1 de junho de 1978, com os votos a favor do PS, CDS e PCP e do Deputado independente Aires Rodrigues e o voto contra do PSD, baixou à Comissão de Educação, Ciência e Cultura cujo texto relativo ao projeto de lei n.º 108/I foi aprovado, em votação final global, «com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e do Deputado independente Galvão de Melo e votos contra do PCP, da UDP e do Deputado independente Aires Rodrigues», em Reunião Plenária de 18 de janeiro de 1979 - Diário da Assembleia da República, I Série, n.º 24 - I Legislatura, de 19 de janeiro de 1979.
Consoante se alcança deste Diário, o Deputado Vital Moreira (PCP) considerou, designadamente, que «o texto votado em comissão traduz um privilegiamento das escolas particulares e das camadas sociais que nelas estão fundamentalmente interessadas», que «o projeto foi essencialmente alterado em alguns pontos, designadamente no que respeita ao financiamento das escolas privadas, que «aquilo que era no projeto de lei uma mera possibilidade ou faculdade governamental, é agora, segundo o projeto de decreto, uma obrigação do Estado» e que «o projeto de decreto deixa uma tal margem de discricionariedade ao Governo que a lei se poderá transformar num meio de intolerável privilegiamento das escolas particulares face ao ensino público».
A aprovação da iniciativa legislativa consubstanciou-se no Decreto n.º 196/I - Bases do ensino particular e cooperativo, de 18 de janeiro de 1979 - in Diário da Assembleia da República, II Série, n.º 29 - I Legislatura, de 31 de janeiro de 1979.



[13] O artigo 6.º do projeto de lei n.º 108/I, apresentado em março de 1978, era do seguinte teor:
«1- Ao Estado compete apoiar e coordenar o ensino nas escolas particulares e cooperativas, respeitando inteiramente os direitos consignados no artigo 1.° da presente lei e os objetivos nacionais de educação.
2 - No uso desta competência, são, designadamente, atribuições do Estado, nos termos da lei:
a) Conceder subsídios e celebrar contratos com entidades para o funcionamento de escolas particulares e cooperativas;
b) Conceder a autorização de criação e assegurar-se do normal funcionamento das escolas particulares e cooperativas segundo critérios, a definir no Estatuto dos Ensinos Particular e Cooperativo, que salvaguardem a idoneidade civil e pedagógica das entidades responsáveis e os requisitos técnicos, pedagógicos e sanitários indispensáveis;
c) Proporcionar meios pedagógicos e financeiros necessários ao efetivo funcionamento, nos termos previstos por lei;
d) Garantir o nível pedagógico e científico dos programas e métodos de acordo com as orientações gerais da política educativa.»
Cfr. Diário da Assembleia da República, II Série, Suplemento ao n.º 49 - I Legislatura, de 16 de março de 1978.

[14] In Diário da República, 1.ª série, n.º 53, de 5 de março de 1979.

[15] Parecer n.º 4/79, de 13 de fevereiro de 1979, in Pareceres da Comissão Constitucional, 7.º volume, Imprensa Nacional – Casa da Moeda, Lisboa, 1980, páginas 235 e seguintes.

[16] Pela Declaração n.º 1/2014 da Assembleia da República, in Diário da República, 1.ª série, n.º 7, de 10 de janeiro de 2014, declarou-se caduco o processo relativo à Apreciação Parlamentar n.º 69/XII ao Decreto-Lei n.º 152/2013 «apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, uma vez que as propostas de alteração apresentadas foram rejeitadas pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, tendo o Plenário sido informado do facto».

[17] Neste artigo 17.º prescreveu-se, designadamente, «dever o Governo publicar, por decreto-lei, o Estatuto dos Ensinos Particular e Cooperativo, de acordo com os princípios estabelecidos nesta lei e integrando, na medida do possível, a regulamentação prevista no âmbito dos diversos artigos».
[18] Como se viu, nos termos desta alínea c), compete ao Governo, no exercício da função legislativa, «fazer decretos-leis de desenvolvimento dos princípios ou das bases gerais dos regimes jurídicos contidos em leis que a eles se circunscrevam».

[19] O Decreto-Lei n.º 553/80 foi revogado, nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 152/2013, sem prejuízo do disposto n.º 4 do artigo 6.º do mesmo diploma, em que se dispôs o seguinte:
«Até à aprovação de um novo regime sancionatório, mantêm-se em vigor as disposições dos artigos 99.º a 99.º-M do Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro, na redação dada pela Lei n.º 33/2012, de 23 de agosto, considerando-se feitas para as normas do Estatuto aprovado em anexo ao presente decreto-lei que tratem da mesma matéria as remissões para diplomas revogados.»
Sendo certo que, pelo artigo 105.º do Decreto-Lei n.º 553/80, havia sido revogado o Estatuto do Ensino Particular promulgado pelo Decreto n.º 37.545, de 8 de setembro de 1949, o qual, por sua vez, fora precedido pelo Decreto-lei n.º 23.447, de 5 de janeiro de 1934 e pelos Decretos n.os 20.613, de 11 de dezembro de 1931 e 19.244, de 16 de janeiro de 1931.


[20] Nos termos do n.º 2 deste artigo, então objeto de revogação, o subsídio era fixado anualmente pelo Ministro da Educação e Ciência.
[21] Isso mesmo se salientou no preâmbulo da Portaria n.º 1324-A/2010, de 29 de dezembro, editada de acordo com a redação dada ao mencionado artigo 15.º pelo Decreto-Lei n.º 138-C/2010.

[22] Objeto da Declaração de Retificação n.º 32/2015 - Diário da República, 1.ª série, n.º 133, de 10 de julho de 2015.

[23] Deste anexo constam 69 áreas geográficas, das quais, por exemplo, seis se situam no concelho de Coimbra, situando-se quatro no concelho de Leiria e igualmente quatro no concelho de Pombal, enquanto que apenas duas se situam em concelhos do Alentejo (Beja e Odemira) e nenhuma área geográfica se situa no Algarve, não fornecendo o processo elementos sobre “as necessidades existentes” a ter em conta nos termos do artigo 10.º, n.º 4, do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior.

[24] Estado Português, através da Direção-Geral da Administração Escolar.
[25] Direito Administrativo Geral, Tomo III, Atividade Administrativa, Contratos Públicos, 2.ª Edição, Dom Quixote, Lisboa, 2009, páginas 19 e seguintes.
[26] Nos termos do artigo 1.º, n.º 6, do Código dos Contratos Públicos:
«Sem prejuízo do disposto em lei especial, reveste a natureza de contrato administrativo o acordo de vontades, independentemente da sua forma ou designação, celebrado entre contraentes públicos e cocontratantes ou somente entre contraentes públicos, que se integre em qualquer uma das seguintes categorias:
a) Contratos que, por força do presente Código, da lei ou da vontade das partes, sejam qualificados como contratos administrativos ou submetidos a um regime substantivo de direito público;
b) Contratos com objeto passível de ato administrativo e demais contratos sobre o exercício de poderes públicos;
c) Contratos que confiram ao cocontratante direitos especiais sobre coisas públicas ou o exercício de funções dos órgãos do contraente público;
d) Contratos que a lei submeta, ou que admita que sejam submetidos, a um procedimento de formação regulado por normas de direito público e em que a prestação do cocontratante possa condicionar ou substituir, de forma relevante, a realização das atribuições do contraente público.»

[27] Op. cit., página 80.

[28] Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, Almedina, Coimbra, 1987, página 421.

[29] Entidades Privadas com Poderes Públicos, Almedina, Coimbra, 2005, nota 258 a páginas 503 a 505.

[30] “Contratos de Associação entre o Ministério da Educação e os Estabelecimentos Particulares e Cooperativos de Ensino”, em Revista de Contratos Públicos, n.º 5 (maio-agosto de 2012), páginas 5 e seguintes.
[31] “Contratos de Associação e Financiamento”, em Revista da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, Vol. 86, 2010, páginas 611 e seguintes.
[32] Op. cit., página 133.
[33] Direito dos Contratos Públicos, Almedina, Coimbra, 2015, página 534.
[34] Op. cit., página 730.
[35] Diário da República, 1.ª série, n.º 27, de 9 de fevereiro de 2016.
Neste Diário da República também se publicou a Resolução n.º 25/2016 - Recomenda a adoção de medidas urgentes para o financiamento às escolas do ensino artístico especializado de música e de dança que assegurem a sua estabilidade, na qual a Assembleia da República resolveu recomendar ao Governo que:
«1 - Analise as consequências e pondere formas de compensação às escolas de ensino artístico pelos prejuízos causados pelos atrasos nas transferências do financiamento, previstas para 2015/2016, cumprindo escrupulosamente os prazos legalmente previstos.
2 - Apresente, a curto prazo, uma reformulação do número de alunos financiados por região e instituição, com base num processo de discussão e auscultação das escolas de ensino artístico e de outras entidades sobre um novo modelo de financiamento que respeite as reais necessidades do ensino artístico em Portugal, contemplando o direito ao acesso ao ensino especializado da música e da dança como primeiro critério.
3 - Realize, a curto prazo, um estudo aprofundado sobre o ensino artístico especializado, a sua identidade e objetivos, a organização de uma rede pública para este ensino, as habilitações para a docência, os currículos e as cargas horárias.»

[36] Tratado de Direito Civil, II, 4.ª edição, Almedina, Coimbra, 2014, páginas 717 e seguintes.
[37] O qual, tal como os restantes contratos de associação, foi celebrado em conformidade com a minuta constante do anexo I da Portaria n.º 172 -A/2015.

[38] «O ensino básico compreende três ciclos sequenciais, sendo o 1.º de quatro anos, o 2.º de dois anos e o 3.º de três anos» - Artigo 8.º, n.º 1, da Lei de Bases do Sistema Educativo e «os cursos do ensino secundário têm a duração de três anos» - Artigo 10.º, n.º 2, da mesma Lei.

[39] E não da Lei de Bases do Sistema Educativo.

[40] Não pode naturalmente deixar-se de referir que a delicadeza e complexidade da matéria sob consulta impunham um aprofundamento que a urgência e bem assim a natureza do voto de vencido obstaculizam.
[41] De acordo com os elementos remetidos pela entidade consulente, cumprindo ressalvar que, obviamente, não se teve acesso a todo o procedimento concursal e a todos os contratos celebrados.
[42] Recorde-se que também no respetivo aviso de abertura do concurso se consignava que «[o]s Contratos de atribuição de apoio financeiro do Estado são celebrados pelo prazo de três anos letivos».
[43] De todo o modo, entendemos dever referir que o n.º 1 do artigo 3.º da Portaria n.º 172-A/2015 parece merecer uma clarificação.
[44] Adiante-se já que a prioridade imposta é entre os diversos tipos de contratos e não entre os contratos do tipo associação, de acordo com a designação dos Estatutos.
[45] Preceito que estatuía:
«Artigo 17.º

No prazo de cento e oitenta dias a contar da data da publicação desta lei, deve o Governo publicar, por decreto-lei, o Estatuto dos Ensinos Particular Cooperativo, de acordo com os princípios estabelecidos nesta lei e integrando, na medida do possível, a regulamentação prevista no âmbito dos diversos artigos, ouvidos os órgãos dos representantes dos estabelecimentos particulares e cooperativos e os sindicatos dos professores.»
[46] E não pode aqui deixar-se de aludir, ainda que muito brevemente, à problemática da inconstitucionalidade orgânica do Decreto-Lei n.º 152/2013, como já fizemos no voto apresentado no Parecer n.º 23/2015, sendo que tal matéria havia sido desenvolvida no atinente projeto por nós apresentado e que não obteve aprovação deste Conselho Consultivo.
Com efeito, afigura-se-nos ser de transpor para o Decreto-Lei n.º 152/2013 a análise que o Tribunal Constitucional fez a propósito do Decreto-lei n.º 553/80 (cfr., designadamente, o Acórdão n.º 398/2008, de 29 de julho de 2008) e que apenas não declarou inconstitucional in totum por a inconstitucionalidade orgânica ser, por definição, sempre originária.
Ora, foi com a revisão constitucional de 1982 que o direito à criação de escolas privadas passou a ser um direito fundamental reconhecido como direito, liberdade e garantia e, consequentemente, matéria da exclusiva competência da Assembleia da República, salvo autorização ao Governo [cfr. alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição].
E o Decreto-Lei n.º 152/2013 não foi emitido ao abrigo de uma lei de autorização legislativa, sendo que a existência de uma lei de bases não supre a eventual necessidade de existência de uma lei de autorização legislativa.
De todo o modo, há que considerar o entendimento que, maioritariamente, se firmou na doutrina no sentido de se recusar, como regra geral, a desaplicação pela Administração de normas que considere inconstitucionais.
[47] Princípios, sublinhe-se, que se aplicam a todas as modalidades de contratos celebrados ao abrigo da Lei de Bases e do Estatuto.
[48] De acordo com o previsto na Lei de Bases e depois desenvolvido nos Estatutos.
[49] Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição revista, Coimbra Editora, pág. 250.
[50] Nos termos do n.º 1 do artigo 75.º da Constituição, «[o] Estado criará uma rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população».
Portanto, conquanto haja também no ensino liberdade de iniciativa privada e cooperativa, existe aqui «uma imposição constitucional de completude do sistema público de ensino» (ver Gomes Canotilho/Vital Moreira, ob. cit., pág. 369).
Anotações
Legislação: 
CONST76 ART43 ART75 ART112 ART164 I) ART198 N1 C) N3 ART212 N2 N3 ART227 N1 C); L 46/86 DE 14/10 ART8 N1 ART10 N2 ART57 ART58 ART61; L 115/97 DE 19/09; L 49/2005 DE 30/08; L 85/2009 DE 27/08; L 9/79 DE 19/03 ART1 ART2 ART6 ART8 N2 A) N3 N4 ART17; L 33/2012 DE 23/08; RES 64/79 DE 16/02; DL 152/2013 DE 04/11 ART1 ART6 I) ART9 N1 C) N2 ART10; DECL 1/2014 DE 10/01; DL 553/80 DE 21/11 ART14 N1 ART15; DL 138-C/2010 DE 28/12; PORT 1324-A/2010 DE 29/12; PORT 172-A/2015 DE 05/06 ART13 N2 ART17 N2 ART20; RET 32/2015 DE 10/07; CCP ART6 N1 ART307; RES 26/2016 DE 22/01; CCIV66 ART236
Jurisprudência: 
AC TCONST N39/84
Referências Complementares: 
DIR ADM*ADM PUBL/DIR ENS/DIR CONST*****
DIR 2006/123/CE PE E CONS, DE 12/12*****
PJL 108/I
DECRETO 196/I
PARECER N4/79, DE 13/02/1979, DA COMISSÃO CONSTITUCIONAL
Divulgação
Data: 
01-06-2016
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